Relatório Final de Arquitetura e Urbanismo Contemporâneos I

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Instituto de Arquitetura e Urbanismo - USP São Carlos

Relatório Final de Arquitetura e Urbanismo Contemporâneos I

Disciplina: IAU 727 - Arquitetura e Urbanismo Contemporâneos I Discentes: Miguel Antônio Buzzar Francisco Sales Trajano Filho Docente: Francine de Noronha Trevisan


Índice

Introdução .....................................................................................................................03 Filme “Playtime” (1967) ................................................................................................04 Movimento Moderno - crítica e revisão ........................................................................05 Continuidade e transformação na obra dos “mestres” no pós-Guerra .........................06 Movimento Moderno Crítica e revisão no pós-guerra ..................................................07 Dos CIAMs ao Team 10 ...............................................................................................08 Declaração de La Sarraz e os CIAM ............................................................................09 Continuação dos CIAMs ao Team 10 ...........................................................................11 A cena britânica no pós-Guerra ....................................................................................13 Os caminhos da arquitetura brasileira nos anos 1950 a 1960 .....................................19 Cultura arquitetônica latino-americana no pós-Guerra .................................................21 Arquitetura e paisagismo moderno no Brasil ................................................................25 Louis Kahn-arquitetura como disciplina perene ...........................................................26 Da crise do planejamento ao fragmento urbano ..........................................................27 As utopias urbanas e a apologia da técnica .................................................................30 A “escola paulista” e a radicalização do discurso ideológico .......................................33 Continuação da Arquitetura Nova ................................................................................34 Conclusão .....................................................................................................................35 Bibliografia ....................................................................................................................36


Introdução A disciplina Arquitetura e Urbanismo Contemporâneos I do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos tem como objetivo apresentar as principais expressões arquitetônicas e urbanísticas no período entre os anos 20, passando pelo pós segunda guerra mundial e suas consequências no âmbito urbano, social, econômico e cultural, até a contemporaneidade, por volta dos anos 80. Tais momentos são de extrema importância para compreender a arquitetura e o urbanismo nos dias atuais, pois passa pela negação, críticas e pontos importantes do modernismo para se chegar ao momento que compreendemos como contemporâneo. A crise da sociedade industrial gera discussões a respeito do pensamento modernista e seu impacto nas cidades e na vida do homem. Cada contexto cultural possui suas especificidades e relevância nos processos de transformação trazidos pela modernidade. O presente texto tem como objetivo apresentar os contextos das sociedades do mundo no geral durante o declínio do modernismo até o contemporâneo, mostrar os principais arquitetos desde o movimento moderno até a contemporaneidade e sintetizar as consequências desses movimentos para a sociedade contemporânea e seu reflexo na forma de pensar a arquitetura e o urbanismo. O pensamento arquitetônico não é dissociado de suas raízes europeias, mas de certa forma dialoga com questões de seu tempo e lugar específicos. A arquitetura moderna pretendia romper com os moldes clássicos e conservadores anteriores ao século XX. A negação do tradicional, dos adornos estéticos considerados superficiais deram espaço para a ideia de forma segue função. Os espaços passam a ser projetados e divididos por funções, traço que remete as características das máquinas. Porém o homem não se encontra nesses espaços funcionais, há uma perda da individualidade e da ideia de pertencimento no espaço. Esses pontos levam a arquitetura moderna a uma crise que abre espaço para a nova geração de arquitetos repensar as formas de se projetar tanto na escala privada, quanto na pública. A busca por uma identidade nacional é um ponto abordado em vários países, tirando o foco da Europa como berço dos movimentos culturais e descentralizando as ideias, de forma que cada país pudesse olhar para sua história e suas particularidades para criar uma identidade nacional propriamente dita. Com a evolução da tecnologia, várias formas de pensar a cidade foram sendo discutidas, o retorno às ideias rurais com as cidades-jardins, as utopias criadas pela geração Hi-tech e megaestruturas, traços que refletem o momento histórico de rápido desenvolvimento tecnológico que abriu espaço para vários movimentos, criando um caldo cultural que vai crescendo com a globalização.

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Filme “Playtime” (1967) O filme “Playtime” (1967) representa uma crítica ao impacto do modernismo na vida urbana. Os cenários são compostos por repetições e padronizações típicos do movimento moderno. Como pode-se observar no padrão dos cubículos de escritórios que são os mesmos da exposição comercial e dos apartamentos, estes denotam uma ideia de vitrine, como uma diluição dos limites entre vida privada e vida pública. O vidro representa a tecnologia, mas também a transparência e perda do individual. A ideia de que a burguesia fazia suas “tramóias” quando não estava sendo observada, ou seja, a casa burguesa é sinônimo de corrupção. Dessa forma, com a revolução industrial, o uso do vidro serve também para mostrar o que as pessoas estão fazendo e garantir o comportamento humano, porém a burguesia não muda seu comportamento e como consequência, há perda do individualismo. O protagonista, interpretado por Jacques Tati, se desloca como se estivesse perdido na cidade, nada depende dele, ele é conduzido pela narrativa e se relaciona com o espaço sem se identificar, envolvido pela existência que é maior que ele. Praticamente metade do filme se passa na cena do restaurante, onde mostra uma euforia alienada, o comportamento animalesco do ser humano em seu momento de lazer. Toda a lógica da primeira parte parece entrar em crise e se tornar humano, parece que fica melhor. O espaço e o sujeito se desdobram. Quanto mais caótica a situação, melhor eles se comportam. O caos faz com que as pessoas sejam elas mesmas. As cores predominantes são tons de cinza para representar rigidez e concreto. O filme marca uma certa relação de distração, no sentido de que nem tudo precisa ser elaborado todo momento na vida. O homem não mais ocupa o centro das atenções na modernidade. Há uma descentralização, qualquer ponto tem a importância equivalente aos outros na modernidade. O Homem moderno é desenraizado, a vida é dissociada de hábitos burgueses de posses. A sociedade industrial só espera dele o intelecto, outros elementos são considerados um peso, uma carga desnecessária, assim como a ideia de família. O homem poderia se mudar quando quisesse. A vida se resume ao que você consegue levar em uma mochila, mas tudo isso reflete uma pobreza existencial e emocional. A vida é mais que uma repetição, tem relação com o tempo e o lugar. Citando uma frase marcante do professor Francisco Salles: “No desandar do mundo, é que parece que o ser humano ganha espaço.”


Movimento Moderno - crítica e revisão A arquitetura moderna reuniu um conjunto de movimentos e ideias durante o século XX. A partir do século XVII com a revolução industrial, materiais como ferro, aço e concreto passam a ser produzidos em larga escala, expandindo as possibilidades na construção civil. Em 1919 Walter Gropius cria a Bauhaus, primeira escola de design do mundo. Os principais elementos característicos da escola eram vidraças amplas em fita, uso de pré-fabricados, priorização da simplificação dos volumes, geometrização das formas, predomínio de linhas retas, coberturas planas, paredes brancas e lisas, ausência de ornamentos, uso do concreto vidro e aço, entre outros. A arquitetura modernista passou a ser muito criticada devido ao funcionalismo excessivo que não atendia aos requisitos pessoais do ser. Os arquitetos mais jovens alegavam “monotonia” no estilo e espaços urbanos modernos, além da perda da individualidade, a formação de “espaços de ninguém”. Com as críticas ao modernismo e às ideias dos CIAMs, um grupo de arquitetos da nova geração foi formado, o Team X, com o objetivo de propor um novo olhar sobre a arquitetura moderna e inserir novos conceitos e ideias ao movimento.

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Continuidade e transformação na obra dos “mestres” no pós-Guerra Quatro grandes mestres da arquitetura moderna, segundo Ernesto N. Rogers, foram: Frank Lloyd Wright, Walter Gropius, Mies van der Rohe e Le Corbusier. Principalmente por suas formas únicas e pessoais de interpretar o contexto e traduzir em suas obras, nas palavras de Rogers (A arquitectura moderna desde a geração dos mestres. 1958. Caderno 1 - texto 4. Pg. 15): Quando projectam uma casa ou uma cidade, Wright, Gropius, Mies e Le Corbusier não copiam a inspiração de outras experiências. Não tentam iludir ou embelezar o seu trabalho com superestruturas. Não desenham nas suas memórias ou nas dos outros. O que fazem é extrair da verdadeira realidade que os rodeia uma réplica concreta ao problema inerente. Suas diferenças existem e são evidentes, mas suas contribuições para a arquitetura moderna são de extrema relevância. A sensibilidade para criar seus projetos considerando problemas estéticos e éticos, considerando o passado e tentando deixar uma diretriz para o planejamento futuro. Frank Lloyd Wright é apresentado por Mies van der Rohe, que diz ter grande influência deste, em uma exposição que havia feito em Berlim. Dessa forma, introduzindo os princípios espaciais de Wright na Europa - epicentro do movimento arquitetônico que depois se espalhou pelo mundo - por intermédio de Mies.


Movimento Moderno Crítica e revisão no pós-guerra. As transformações mundiais no final do séc. XIX e início do séc. XX como as grandes migrações, e o sistema capitalista, geraram reflexões sobre as mudanças tecnológicas desde a Revolução Industrial. Com a destruição das cidades causada pela primeira guerra, o arquiteto desse período coloca-se à frente nas responsabilidades para com a reconstrução das mesmas e protagoniza as discussões acerca das necessárias mudanças na forma de planejar as cidades. Já no cenário pós segunda guerra, os próprios arquitetos não se consideram mais os únicos agentes capazes de melhorar o mundo. Por volta da década de 20, o sentimento era de esperança e otimismo com relação ao desenvolvimento industrial. Porém a segunda guerra mundial deixou um rastro de desamparo e destruição. A máquina que iria trazer evolução e desenvolvimento foi usada para destruir cidades e vidas. O que refletiu em um sentimento de pessimismo, nas artes, houve uma tendência a mostrar o caos enquanto na arquitetura há uma tentativa de reorganizar o mundo pós guerra. A Europa foi o berço da arquitetura moderna, no entanto, a partir dos anos 30, com o regime comunista e a ascensão do fascismo e nazismo, o movimento é descentralizado e toma uma escala global. O movimento moderno busca romper com os moldes tradicionais. Possui um desejo de controlar a forma. Com o desenvolvimento tecnológico, possibilitou-se uma grande liberdade de criação e liberdade formal na construção civil. Procura criar elementos e projetos que podem ser feitos em larga escala com rapidez e eficiência, traço que fortalece o período industrial. O contexto pós segunda guerra é marcado pela falta de mão-de-obra, o que reflete na construção civil, dessa forma, o aspecto tátil do concreto ganha espaço. Discussões sobre o lugar, o contexto, as necessidades determinadas pelo lugar que se insere, entre outras, ganham espaço entre os arquitetos modernistas. Começavam a perceber que elementos usados na cultura europeia não faziam muito sentido em países tropicais e vice-versa. Em oposição à arquitetura fria centro-europeia, o estilo chega ao Brasil com os arquitetos da escola paulista, as curvas das serras tomam um tom livre e sensual, quase que uma identidade para a arquitetura moderna brasileira, principalmente com as obras de Oscar Niemeyer.

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Dos CIAMs ao Team 10 Durante o período entreguerras, Le Corbusier era mais purista. Dos anos 30 aos 40 ele cria um tipo de diálogo com apego à textura e densidade que não se pode perceber na época antes de 30. Um ponto é que ele começa a viajar para fora da Europa, o que despertou percepções com relação a lugar, elementos naturais, acessibilidade material (não tão forte, mas existente). Em meados dos anos 50, é possível observar certa ambiguidade e indecisão em suas obras, ele deixa as marcas da construção no concreto, fica mais rugoso, da forma “natural” que a tecnologia permitia. A Maisons Jaoul em Paris (1951 – 1955) de Le Corbusier é projetada com abóbadas, refletindo um pouco da arquitetura vernacular, materiais como tijolo (sem rebaixo), madeira de compensado naval e o uso de mão-de-obra de imigrantes argelinos (não qualificada) aponta para uma tentativa de pensar a arquitetura para o lugar onde ela se insere. Os traços tradicionais incorporados no método modernista não desqualificam a obra, pelo contrário. Ele expõe a tensão da sacada em balanço, ou seja, não esconde as forças atuantes. O interior da Maisons é moderno e cheio de acabamentos. Em seu projeto da Notre-Dame du Haut – Ronchamp (1950-1955) Le Corbusier se renova, o projeto era livre, as únicas questões trazidas pelo cliente foi a dificuldade de transportar água até o topo da colina e uma estátua da Virgem Maria, em madeira, que havia “sobrevivido” a um incêndio durante os bombardeios sofridos no local durante o nazismo. Dessa forma, Le Corbusier projeta captação de água da chuva pelo telhado de formas sinuosas para resolver a questão da água. A capela possui formas orgânicas, paredes curvas, janelas aleatórias e desalinhadas, com diferentes dimensões e formatos, tal fator junto com as paredes super grossas e a cobertura independente da vedação, deixando um vão de 10 centímetros por onde passa a luz, resultam em um jogo de iluminação interna muito interessante que passa a sensação de transcender. Para resolver a questão da Santa, o arquiteto cria dois ambientes, uma capela externa e uma interna, usando a mesma parede, onde, na parte superior, se encontra a escultura com mecanismos que possibilitam sua rotação, para que pudesse se voltar tanto para a capela externa quanto para a interna dependendo da necessidade e interesse dos usuários. Tal obra foi muito criticada por ser algo inesperado vindo de Le Corbusier, mas o que faz dela tão interessante é exatamente essa característica, pois expressa a ousadia do arquiteto mesmo após tantos anos de trabalho. Na Índia, Le Corbusier é convidado a projetar Chandigarh em 1950 – 1965. O que seria o centro da cidade. Dessa forma, foca a atenção nos edifícios que compõem o core. Entre eles o Secretariado (1951-1958); a Assembleia (1953-1961) e a Alta Corte (1951-1955). Observa-se a racionalidade mecânica, outro fator importante é a preocupação com o lugar, ele não descarta o passado e passa a dialogar com coisas novas. Ainda seguindo essa tendência à percepção do lugar, ele projeta a Shodan House em Ahmedabad, Índia (1951-1954), onde há maior preocupação com a composição climática. E o projeto de uma Associação também em Ahmedabad (19511954) expressando sua preocupação com o controle climático a partir de brises e filtros de chuva e a relação harmoniosa com o espaço onde se instala a obra. No Brasil houve o experimentalismo formal em meados de 50 por Niemeyer.


Declaração de La Sarraz e os CIAM Os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM) surgiram para definir objetivos comuns necessários para a arquitetura.1928 é marcado pela crise na Europa central que abre espaço para a ascensão dos regimes autoritários de extrema direita fascismo e nazismo. Os CIAM tiveram três fases notórias: a primeira, entre 1928 e 1933 foi protagonizada por arquitetos alemães com ideias de esquerda; a segunda, até 1947, onde se destacam as ideias de Le Corbusier; e a terceira, até 1956, quando se iniciam as críticas aos modelos até então seguidos, quando as discussões acerca das necessidades emocionais do ser humano com relação ao lugar e as soluções arquitetônicas para tais questões. As experiências particulares dos arquitetos nem sempre refletiam o pensamento coletivo. Em certos momentos as discussões nos CIAM foram tão acirradas que tornaram-se intoleráveis, não chegando a conclusões coesas. •

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CIAM I – Declaração de La Sarraz, Suíça 1928. Esse congresso serve para definir vários objetivos para a arquitetura moderna. Devido à destruição das cidades no pós primeira guerra, dão ênfase maior à produção industrial em larga escala a fim de resolver o problema pós guerra. Foi um grito contra o academicismo. Ideia de supressão de desejos individuais para o coletivo ganhar. A Declaração coloca o arquiteto acima do Estado, devido a grande demanda por construções como consequência da destruição das cidades pós primeira guerra mundial. CIAM II – Die Wohnung Für das Existenzminimum (unidade mínima de habitação) – Frankfurt-am-Main, 1929. Surge a ideia de célula de moradia devido aos debates sobre o mínimo necessário para se viver. CIAM III – Rationelle Bebauungsweisen (desenvolvimento racional do lote) – Bruxelas, 1930. Surgem questões como a massificação da cidade, a quadra, o lote, os espaços entre os blocos para promover boa ventilação e insolação nas edificações. CIAM IV – Die Funktionelle Stadt (a cidade funcional – carta de Atenas) (Marseilles FR) Atenas, Grécia, 1933. Publicação e difusão da Carta de Atenas. Nesta edição Le Corbusier passa a se destacar. O pensamento funcional é introduzido à escala da cidade. A divisão da cidade por funções (moradia, trabalho, lazer...) com espaço, insolação e áreas verdes, é debatida como a mais interessante para resolver as necessidades humanas. O contexto pós gripe espanhola trouxe estratégias racionais visando a diminuição dos impactos em momentos como tal, ou seja, espaços arejados, com iluminação e ventilação naturais ganharam destaques no pensamento racional. A Carta de Atenas é publicada 10 anos mais tarde, após a segunda guerra mundial, sendo um elemento importante para a reconstrução das cidades europeias. CIAM V – Logis et Loisirs (habitação e lazer) – Paris, 1937. CIAM VI – Reafirmação de Objetivos, Bridgwater, Inglaterra, 1947. Reafirmação dos CIAM. Após a segunda guerra mundial, a nova geração de arquitetos começa a questionar a racionalidade dos CIAM. Aldo van Eyck critica o “mecanicismo” (funcionalismo) na arquitetura, ideias que influenciam as ideias de J. M. Richards sobre o “homem comum” com base emocional, que não é especialista. Dessa forma, novos objetivos são definidos: “Trabalhar para a criação de um ambiente físico que satisfaça as necessidades materiais e emocionais do homem e estimule seu crescimento espiritual”. Entra em debate as necessidades subjetivas do homem, das quais a materialidade não é

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capaz de suprir, procura-se complementar o funcional com o emocional, nesse primeiro momento. CIAM VII – La Grille CIAM (sobre a cultura arquitetônica) – Bergamo, Itália, 1949. Procura discutir o “habitar”. Cria-se um documento quantitativo, uma tabela para organizar as funções da cidade, de forma a pensar as funções através dos diversos temas. CIAM VIII – The heart of the City – Hoddesdon, Inglaterra, 1951. O coração da cidade: a cidade tem um centro. A cidade funcional dividida em zonas necessita de um espaço central para reuniões. A ideia de encontro volta a ser importante, a arquitetura deveria pensar e criar espaços que permitissem o encontro. O plano de massas debatido no CIAM III era baseado em uma visão do espaço onde a perspectiva do olho humano estava ausente, gerando espaços ineficientes. CIAM IX – Aix-en-Provence (habitar), França, 1953. Carta do Habitat: Habitat, Cidade, Cultura e Práticas Cotidianas. O habitat é entendido além da concepção do espaço e seu uso, é a vida, o cotidiano, as práticas e vínculos comunitários que acontecem no espaço. É debatida a criação de espaços urbanos complexos e densos que possibilitam a interação. Pensar a cidade de acordo com suas práticas culturais. O arquiteto deixa de ser o sujeito que detém do conhecimento e que irá instruir os governos. Passam a experimentar o espaço a fim de conhecê-lo antes de projetar. Interações no lugar de reparações. Procuram aprofundar os debates visando a elaboração de um documento síntese sobre as questões do habitat. CIAM X - Carta do Habitat - Dubrovnik, Iugoslávia, 1956. E TEAM X: Identidade, lugar e cultura. A nova geração de arquitetos protagoniza as reuniões: Alison e Peter Smithson, Aldo van Eyck, Georges Candilis, Shadrach Woods e Jacok Bakema (Le Corbusier se afasta e manda uma carta) buscam pensar respostas para as questões do habitat. A fim de sintetizar as ideias para a arquitetura e o urbanismo com base na realidade presente.

O cenário pós segunda guerra mundial é composto pela ideia de homem real, que ocupa as ruas e habita as cidades. Há preocupação com o emocional, as necessidades subjetivas que o materialismo não supre. Enquanto que no CIAM de 1928 foi falado para suprimir as ideias individuais em prol dos coletivos enquanto que no pós guerra esse discurso muda completamente.


Continuação dos CIAMs ao Team 10 Por muito tempo, os CIAM procuraram respostas às questões da cidade na mesma estrutura de organização, com algumas mudanças internas pontuais. De forma que, o pensamento sobre funcionalidade fosse evoluindo com o tempo e a funcionalidade pragmática deixou de ser um dogma. Ou seja, os espaços nem sempre exercem a função a qual foram dados primeiramente. Durante a década de 50 as críticas ao modernismo visam superá-lo. A cidade funcional não possui centro, portanto a retomada do centro da cidade é colocada em debate. O coração da cidade como local de encontro. A discussão acerca do centro urbano ou falta dele e a quebra da monofuncionalidade, pois a cidade é viva, o uso misto é um fator indutor de uma certa vitalidade urbana. O centro naquele momento é denominado CORE pelo CIAM. A ideia de core é pensada como um centro cívico, com os poderes, o fórum como espaço para reuniões cívicas. O CIAM de 1951 coloca um pouco a ideia de um novo humanismo. Uma cidade que dê conta das necessidades humanas, buscando pensar a cidade para uma experiência de cidade de fato, a vida nas ruas, a vitalidade. Critica o tecnicismo e coloca as qualidades humanas em perspectiva. Tal transformação indica uma mudança sensível, de valores, que focam nas relações do sujeito com dimensão sensível. A ideia era dar mais vitalidade ao desenho urbano a ser criado posteriormente. Há grande reflexão sobre a ideia de habitat com a carta do habitat. Começam as questões sobre qual é a noção de habitat. A espacialidade deixou de ser o foco, passam a pensar a cultura, os vínculos cotidianos, a vida na cidade. Consideram as sobreposições entre usos e escalas, pensando em criar espaços urbanos mais complexos que pudessem transmitir e possibilitar maior dinâmica na vida urbana. As particularidades de um lugar estão relacionadas aos seres que ali habitam, ou seja, a cidade histórica que está ali tem suas peculiaridades, não existe o homem universal, existem ideias universais. Cada lugar é único e tem suas particularidades. A arquitetura tem que propiciar essas trocas no lugar. A arquitetura moderna possui um traço peculiar, o arquiteto tem que explicar para o homem como e onde ele deve habitar, cada coisa tem seu espaço para ser feita. A resposta a isso no pós guerra é entender a complexidade da cidade que vai muito além da mecanização e funcionalidade da vida. A realidade demanda acomodações e soluções que fogem ao dogmatismo. Dessa forma, os CIAM cada vez mais não conseguiam responder às necessidades com a estrutura padrão que tinham, sendo necessária uma ruptura de ideias e adaptações. A função continua existindo, ela é necessária na arquitetura, mas a ideia é projetar espaços mais mistos, mais complexos onde há possibilidade para a espontaneidade da vida, espaços não estritamente funcionais, espaços flexíveis, que tenham a mesma vitalidade que as cidades demonstram. A Grelha dos Smithson é um contraponto direto ao modelo da grelha do CIAM da Carta de Atenas, as categorias e termos técnicos são substituídos por termos não técnicos que aproximam o arquiteto e urbanista do espaço a ser pensado. A relação de pertencimento acontece por escalas de aproximação. Dessa forma, os arquitetos adotam um olhar mais subjetivo com relação ao espaço. Os Smithson respondem a mesma pauta de forma diferente da dos CIAM.

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O fim dos CIAM e início do Team X, cujas reuniões acontecem entre 1956 e 1983, eram encontros informais, sem estrutura hierárquica, onde não havia pretensão de divulgar um documento elaborado ao final com dogmatismos estipulados para os arquitetos, pelo contrário, haviam variações de ideias. É importante ressaltar que os arquitetos dessa nova geração foram formados pelos mestres modernos e por isso ainda carregavam vários conceitos da arquitetura moderna de vanguarda, mas com interpretações que se traduzem no projeto de formas diferentes. Em meados dos anos 50, o movimento contracultura e geração Bitch nos EUA ganham espaço. São movimentos não desconexos, mas também não esquematizados. É uma “ebulição” social e cultural do movimento contracultura. A própria ideia de “jovem” está ligada aos anos 50 para frente no pós guerra e como os Team X se relacionam com cultura pop europeia. No final de 1968 na França dizem: “não acredito em nada anterior”. As discussões que eles colocam vira pauta para as práticas posteriores. A ideia de uma cultura que cuida do lugar menor. Sempre com a ideia de associação.


A cena britânica no pós-Guerra A cena britânica no pós-Guerra era de uma grande falta de recursos materiais e devastação com a destruição que a guerra trouxe. Um olhar que se aproxima das ciências sociais vão pautar as discussões do Team X. A ideia era romper com o conceito de separação funcional estrita que vinha dos primeiros CIAM e a lógica de planejamento urbano. Le Corbusier faz uma crítica sobre o “caminho dos burros” visto que, racionalmente, para ir de um ponto a outro, o mais funcional seria uma linha reta, mas não é assim que os caminhos se formavam, eles seguiam uma estética e não a lógica da grelha moderna regular muito recorrente nos anos 50. Que era profundamente criticada logo após sua aplicação na reconstrução pós guerra. A ideia de racionalidade e cidade funcional era baseada em se locomover, trabalhar, habitar e o lazer. Os arquitetos então vão organizar a cidade em um gradiente de escalas: do mais individual e privado - a casa; seguindo pela rua - onde ainda se tem certo conhecimento e individualidade; passando pela escala do bairro onde também se encontram traços pessoais de cada indivíduo; até chegar à cidade em si - que é entendida como a junção dessa pluralidade. Tal escala de proximidade é vista como mais importante do que a funcionalidade para os arquitetos desse período, portanto procuram criar a partir do projeto, situações e espaços que privilegiem as relações criadas nessas etapas, permitindo a identidade e sensação de pertencimento nas cidades. A arquitetura é pensada na escala da cidade e se une com o plano, se diluem em uma mistura entre os espaços privados e públicos gerando um todo único. Pensam como se daria as expansões urbanas se o planejamento interferir o mínimo possível nos espaços pré-existentes. Começam também a se interessar pela arquitetura dos trópicos como uma forma de investigação de como solucionar as questões bioclimáticas na arquitetura de lugares quentes. Desenvolvem essas ideias, experimentam em projetos (nem sempre construídos) e as repensam várias vezes. A exemplo de experimentação há projetos no norte da África, como o caso de Chade. Territórios coloniais franceses no norte da África até os anos 60 serviram de espaços de experimentação dos “novos” modelos desenvolvidos pelos arquitetos. No contexto colonial ou se ignorava completamente o território pré existente e as arquiteturas ou se fazia um espaço separado em estilo europeu, cidades jardins, onde o poder colonial se instalava, formando duas estruturas autônomas entre colonos e nativos. O Chade, país no deserto do Saara, ao norte da África, foi um espaço de experimentação. Fazem propostas para a região onde apresentam o habitat nativo tradicional com uma proposta nova, criando uma conexão entre as duas condições de existência. O projeto possui cunho arquitetônico e político, mas não foi construído. Alison e Peter Smithson apresentam a ideia de Cluster - caule/tronco, que são estruturas centrais que articulavam elementos secundários. Nesse sentido, a estrutura urbana se diferencia do planejamento urbano racional histórico, formando uma ideia diferente de pensar a cidade onde ela seria um produto da arquitetura e não a arquitetura que chega para a complementar. A perspectiva de crescimento e expansão da cidade moderna na grelha era de possibilidade de crescimento “infinito”. Na nova lógica também há essa ideia, mas não como repetição da estrutura quadrangular como se vê muito nas cidades americanas. Mas sim a criação se daria seguindo um ritmo “natural” do desenho irregular. É um crescimento previsto, mas não limitado territorialmente, existe uma lógica de conceito aberto. Surge também o conceito de Web, sendo uma estrutura urbana permeável que segue certa repetição pelas atribuições que cada edifício desempenha, que se

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interligam formando uma rede (web) com coesão externamente e mais “livre” internamente, tanto esteticamente quanto funcionalmente com o programa interno. A estrutura em web se desenvolve em uma malha/rede que se expande horizontal ou verticalmente. Permite desenvolvimento ilimitado, mas permite homogeneidade. Possui muita repetição dos elementos, variando as escalas e criando ambientes que possibilitam o crescimento. Tal conceito foi usado na proposta da Universidade Livre de Berlim, onde cria vários tipos de ambiências, alguns abertos, outros fechados, procuram simular a complexidade do surgimento e uso dos espaços. Possui espaços maiores, menores, jardins que são acessíveis por caminhos e espaços que eles delimitam. Ao passo que o projeto é permeável/poroso, é também muito fechado externamente. Seguindo essa forma de pensamento, procuram planejar o crescimento espontâneo, porém entra em contraste, pois o espontâneo não pode ser planejado, já que a ideia de desenvolvimento espontâneo não está relacionada à planejamento e sim ao crescimento natural, ou seja, essa forma delimita como será o crescimento espontâneo, o que o torna planejado e não “natural”. Essas ideias se cruzam futuramente com as megaconstruções. A praça e o parque europeu são mais contemplativos da paisagem, (os instrumentos urbanos nesses espaços são pouco usados e difundidos) o sujeito não possui muita interação com o espaço, são espaços de contemplação, mas van Eyck, quando atua como arquiteto na prefeitura de Amsterdã, faz uma série de propostas utilizando espaços vazios e os transformando em espaços de lazer ativo, possibilitam maior interação, principalmente para crianças. A materialidade também é explorada de forma interessante, como por exemplo quando usa troncos de árvores em sequências dando formas e volumes à praça e possibilitando espaços de permanência. Esse tipo de experimentação vai além do funcional e das ideias dos CIAMs do pré guerra. Outra ideia formulada nos anos 60/70 foi o Mat-building (edifício esteira) que possui desenvolvimento horizontal e ambientes modulados e organizados entre si, tal modelo foi aplicado por van Eyck à Universidade Livre de Berlim e o orfanato Aldo van Eyck. Ambos os projetos são bem distintos entre si em escala e propostas, mas possuem um ponto comum, a intensa diversidade interna espacial e formalmente. O orfanato possui uma estrutura angular que ancora o projeto com espaços pontuais como salas de aulas, pátio interno, etc. novamente a ideia de uma trama que se desenvolve horizontalmente. Bem visível a ideia de modulação, produção seriada, montagem e pré fabricação, além da riqueza cromática e de materiais. Parte da premissa de pensar a escala de acordo com a necessidade do usuário. Ou seja, o orfanato é pensado para um público infantil, portanto possui dispositivos que instigam a apropriação, permite maior sensação de pertencimento para o sujeito e instiga à explorar o espaço, é um projeto que foge aos “depósitos de criança” mais comuns, no caso, elas assumem um protagonismo do espaço, garantindo uma forte relação e interação do projeto com o usuário. A lógica de van Eyck é a mesma, mas ele utiliza de diferentes aparatos para a consolidação dos projetos a fim de tornar o ambiente convidativo para a apropriação. Ao fim da segunda guerra mundial diversas cidades estavam destruídas, era preciso reconstrução física e econômica. Muitos países invadidos pela Alemanha tinham sua economia revertida para economia-de-guerra. Dessa forma recuperar a economia e os outros sistemas era uma grande demanda. Nesse período educação, saúde e segurança deixam de ser mercadoria e se tornam um direito. O nível de desemprego estava alto. As políticas de bem-estar social fizeram-se necessárias até mesmo nos governos da direita tradicional. Nesse sentido, a indústria da construção


civil foi muito importante, visto que, eram necessários projetos para as obras públicas. O Estado britânico passa a ser um grande agente de demanda da produção arquitetônica para atender às necessidades coletivas, com projetos de escolas, hospitais, habitações sociais, entre outras, por isso muitos arquitetos trabalharam para LCC (órgão responsável por governar Londres) refletindo em um maior engajamento nas questões políticas, diretamente ou indiretamente por meio da arquitetura. O Festival Britânico de 1951 marca a retomada da economia com uma Feira que apresentava as novidades tecnológicas e novas mercadorias utilitárias. A arquitetura produzida pelo LCC, apesar de seu traço racional, era vista pelos Smithsons como muito tradicional, a ideia de que a arquitetura antiga e a contemporânea dividiam o mesmo espaço irá proporcionar o novo empirismo com uma certa recusa a arquitetura moderna. O Realismo socialista: o Partido Comunista era quem promovia as transformações e não os construtivistas. A arte moderna dos construtivistas não era entendida pelos trabalhadores e por isso, os alienava, ela era vista como degenerada e elitizada. Dessa forma, o realismo socialista restaurou a arte neoclássica como oficial do governo. A pintura passou a ser retratista enaltecendo a grandiosidade do governo. Surge o questionamento: “como fazer arquitetura coletiva com linguagem tradicional se isso não existia antes?” Os anos 50 retrata uma grande dualidade. De um lado os Smithsons contra a arquitetura moderna, de outro, no contexto britânico, eram eles que defendiam a arquitetura moderna por se recusarem a fazer a arquitetura “tradicional” vista como populista. Após o fim da segunda guerra, a volta dos soldados, gera muitos casamentos e muitos filhos (baby boom), então era preciso promover habitações. Se aproximar da realidade torna-se uma dimensão ética. O homem comum. A banca de revistas é a porta para o mundo contemporâneo. A rua propiciando o encontro será uma das chaves para pensar os projetos, a ideia dos encontros que a circulação propicia será levado para dentro dos edifícios. As instalações aparentes devem evidenciar como os mecanismos acontecem. Não é a arquitetura moderna para os especialistas, mas sim feitas para o homem comum. Os Smithson e o contexto inglês no pós segunda guerra fermenta uma série de questões com origem no contexto inicial durante a guerra e mudanças no pós, no contexto espacial e principalmente social. A ideia de liberdade crescendo nesse período e a busca pelo novo no pós segunda guerra mundial. A geração pós segunda guerra é marcada fortemente por uma difusão de uma série de ideias existencialistas (genericamente). Principalmente a ideia do cultivo e busca da autenticidade, supõe uma relação do sujeito com o mundo que procura se confirmar em sua dimensão concreta, como uma tomada de consciência, quanto mais o sujeito tivesse essa relação direta com a realidade que ele vivencia de maneira tátil, mais plena sua consciência seria, estando mais apto a uma vida mais plena. Alison e Peter Smithson pertencem a essa nova geração com um certo teor existencialista, batendo de frente com a geração de Le Corbusier. Então quando os Smithson fazem a escola em Hunstanton, procuram trazer essa ideia de se apropriar do mundo de maneira mais plena, sob uma perspectiva de uma relação mais autêntica com o mundo que se dava pelo domínio do entorno. Muito explorado pelos Smithson na ideia de representar a realidade tal como ela se apresenta, como uma ideia realista, o novo brutalismo, apresentando a realidade em sua própria natureza, sem ilusões e

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dissimulações. Explorar a realidade de forma estética e também carregada de sentido, dessa forma, possibilitando dar ao sujeito um domínio maior da realidade no contexto que está inserido. Busca despertar o sujeito por meio da desfamiliarização (trazendo algo novo ou de uma nova forma inserido em um espaço ou ideia já existente e comum, fazendo com que a atenção se volte à esse elemento novo.) mostrando as coisas como elas são (como mostrar o caminho da água nos banheiros). Confirma uma abordagem estética e ética, pois tem o compromisso de trazer o sujeito para a realidade que ele vivencia. Busca de autenticidade. A relação se constrói entre o sujeito e o mundo material no existencialismo, perspectiva tátil. Supõe uma relação do sujeito com o mundo de forma mais direta com a realidade que ele vivencia, mais apto a uma vida mais plena. Domínio do entorno que as pessoas habitam. A ideia de trabalhar com a realidade tal como ela é, sem ilusões, dissimulações. Vai se confirmando no conceito de realidade “tal como encontrada”. Desde o cubismo na década de 10, com Picasso, já supunha uma apropriação da realidade querendo criar uma conexão entre a obra e a realidade do mundo no qual esta obra está inserida. Tentativa de trazer a realidade como ela é. Golden Lane: O projeto tinha intenção de ser uma crítica à Ville Radieuse e ao zoneamento das quatro funções, entretanto os Smithson se prenderam a um processo de racionalização ainda com muita relação com os projetos corbusianos, era uma lâmina mesmo que “quebrada”, que não dialoga com o pré-existente. A dimensão ética ali estava em dialogar com a realidade (até o edifício semidestruído é incorporado) mas não tinha ligação histórica. O projeto tem muita influência das obras de Henderson, nessa época o casal frequentava bastante a casa do artista e mantinha uma relação com suas obras que tinham a vida das ruas como tema. Golden Lane: o projeto tinha a intenção de ser uma crítica à Ville Radieuse e zoneamento das quatro funções, porém, os Smithson acabaram por entrar em um processo racionalista, com uma lâmina “quebrada” que apresenta relação formalmente (incorpora o edifício destruído no projeto) mas não historicamente com a área devastada de Londres onde se situa. É um edifício que se coloca diferente, não dialoga com a cidade. Chega a ser um raciocínio bem moderno. Ao mesmo tempo que querem se distanciar do modernismo, a resposta da criação é bem modernista. A estrutura exposta da escola é meramente estética. A Golden Lane não foi construída, mas ela fica como um estudo de cultura urbana. O Golden Lane tem uma relação oblíqua com a cidade. Ele tenta incorporar os resquícios do que tem ao redor, incorpora o ponto de vista da forma, não da arquitetura. Não tem uma ligação com a história, se relaciona com o que está ativo, o que foi destruído não é incorporado. A rua como elemento estruturador urbano é muito importante, mostra as pessoas exercendo funções, grande elemento urbanístico. A Robin Hood Gardens é projetada nos anos 60 e construída até os anos 70, em um momento onde a arquitetura moderna e o espaço de moradia já havia sido muito criticado. É demolida em 2017. Trazia a ideia de “Streets in the Sky”, que eram ruas elevadas. Os métodos não se distinguem muito de Marselha, pré fabricados, produção industrial, padronização de peças, etc. Mostra a intenção de potencializar os espaços de circulação como ativos na sociabilidade comunitária. Criam camadas internas no conjunto tentando criar um core, formando uma área de convívio e lazer em uma espécie de morro feito com restos da construção. Alguns traços da Robin Hood Gardens remetem levemente à Golden Lane. A solução dos Smithson de ruas elevadas é muito difundida e utilizada na Grã Bretanha, mas ao mesmo tempo essas


soluções acabam gerando uma série de críticas devido á insegurança dos espaços que essas tipologias criam. Á exemplo, o filme Laranja Mecânica se passa nos edifícios comunitários/habitações sociais dos anos 50 e aponta de maneira negativa a abertura para gerar espaços perigosos e mal vistos nessas soluções urbanas. Se a princípio a ideia era criar espaços seguros para convivência social e o lazer comunitário, essas ruas elevadas criavam espaços propícios para delitos. O Brutalismo ou Novo Brutalismo tinha um cunho ético e estético ligado ao fato de se projetar baseando-se na realidade, surge com um toque sarcástico, de autodepreciação. Assim como o cubismo surge como uma perspectiva crítica. Uma série de projetos nos anos 50 e 60 trouxeram o conceito de urbanismo em camadas e o “urbanismo vertical”, fazendo divisões entre os usos, para que pudessem circular carros nas ruas e os pedestres em outra camada acima, criando um tecido regular sobreposto. Serviu de estudo para críticas sobre a vida urbana. Sede do Jornal The Economist foi um projeto dos Smithson, apresentando uma linguagem brutalista, a proposta era criar um espaço único. A ideia dos Smithson era quebrar os espaços, implantam o edifício maior ao fundo do terreno, os pés-direitos possuíam diferentes alturas para dialogar com o entorno, elevam a praça com relação ao nível da rua, e fazem o acesso por rampas e escadas. A ideia era ser um projeto a ser replicado pela cidade a fim de criar uma grande malha caminhável acima do nível da rua. Uma estratégia de Vanguardas é o intuito de ganhar visibilidade, a grande proposta das vanguardas dos anos 20 é de diluir a arte na vida, criando um embaralhamento onde não há hierarquia entre vida e arte, uma não quer transformar ou limitar a outra, mas estão relacionadas e podem coexistir. Os Smithson se definem como uma Vanguarda, participaram da exposição Parallel of Life Art Exhibition Institute of Contemporary Art (ICA) em 1953, em sua exibição colocam várias imagens, elementos gráficos, recortes de livros infantis, revistas, cadernos escolares, etc. expostas de forma não ordenada, algumas penduradas, como em uma banca de revistas, com a intenção de envolver o observador em sua proposta de o quanto a arte está relacionada com a vida. De maneira geral essa é uma estratégia comum da Cultura Pop, ou seja, embaralhar esses âmbitos do cotidiano e caldo de culturas que começam a aparecer no pós guerra como um todo. Incluem elementos diversos da cultura em ebulição desse período. Os Smithson criam The House of the Future em 1956 para uma exposição de um jornal, com o intuito de mostrar a casa ideal do futuro, na qual montaram uma estrutura monolítica de plástico, com inovações futuristas, tais quais banheiro auto limpante, controles remotos, eletrodomésticos, com espaços retráteis e outras ideias que apontavam para uma grande curiosidade e entusiasmo pela ideia de futuro que seria em 1981. Seis meses depois os Smithson fazem a exposição “This is Tomorrow” e montam um pavilhão específico “patio and pavillion”, onde o pátio era entendido como um lugar no mundo e o pavilhão era o lugar do sujeito no interior desse pavilhão e nesse espaço estivesse presente o essencial para uma perspectiva do amanhã, coisas importantes para o futuro, de maneira simbólica, feito de madeira prensada e uma chapa metálica como cobertura, repleto de imagens e outras simbologias no interior. Carregando uma mensagem otimista com relação ao futuro enquanto a House of the Future seria entendida mais como uma apologia ao excesso da sociedade de consumo nos países desenvolvidos no pós segunda guerra. As exposições apontam para duas formas de ver o futuro, a primeira apresenta uma ideologia pop de como poderia vir a ser o futuro, e a segunda com resquícios de casas formando casas.

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Esses dois tipos coexistem, uma não anula a outra, existe a tecnologia, mas também existe a falta dela no mundo contemporâneo. The Sugden House do Smithson aponta para traços vernaculares com detalhes modernistas, uma tipologia de casa de campo da classe média inglesa. Ela aparenta algo mas é muito mais complexa. É uma releitura crítica da casa tradicional. Há um contraponto entre imagem externa, com a fachada trazendo aspectos convencionais e o interno, onde o interior não dialoga com os traços tradicionais, a ambientação é diferente do usual vernacular. Mas a visão dos Smithson sobre esse projeto é de uma moradia do homem comum, onde os materiais são tradicionais, mas é utilizado de uma maneira não convencional. De maneira geral, os Smithson capturam o momento de forma forte, são contraditórios, a dimensão de elementos e materiais que podem ter um passado, mas estão presentes da mesma forma que querem fazer o presente e negar o passado, os projetos induzem a uma análise crítica e reflexão. O mundo do séc. XX não é igual ao mundo do séc. XIX. Se abrem para a realidade do mundo como ela é.


Os caminhos da arquitetura brasileira nos anos 1950 a 1960 Arquitetura moderna brasileira e arquitetura no segundo pós-guerra Identidade Nacional Na disputa entre qual arquitetura representaria melhor a identidade nacional, o Neocolonial e o Moderno entram em disputa. José Mariano, grande defensor do Neocolonial, dizia que a arquitetura moderna era comunista, sionista e ainda exótica, ou seja, não era natural ao Brasil. Lucio Costa, já adepto do modernismo, em combate a essa “justificativa” irá defender que a arquitetura moderna tinha forte relação com a arquitetura nacional feita na colônia. Lucio Costa chega a relacionar o concreto armado como as construções em taipa de pilão. A arquitetura moderna brasileira seria a legítima porque dialoga com a matriz latino-europeia, a nossa cultura nasceu na bacia do mediterrâneo e a arquitetura moderna aqui se desenvolve como a cultura mediterrânea. A ideia de arquitetura moderna no Brasil e do Brasil irá marginalizar uma grande produção, por não ser vista como legítima brasileira, mas sim feita no Brasil. Como o caso de Warchavchik e Rino Levi. Gregori Warchavchik foi “atacado” por todos os lados: os tradicionalistas descrentes na arquitetura moderna, eram contra o arquiteto por discordar de seus ideais modernos. Apesar da arquitetura moderna não ser a apresentada na semana de arte moderna, Lucio Costa teve influência da semana de arte para formular seu discurso moderno. O discurso de Lúcio Costa está diretamente associado ao pensamento da época, criar um passado era necessária em diversas áreas. Surgia a “necessidade” de definir um herói, um artista principal. Dessa forma, Costa irá tentar relacionar a arquitetura de Niemeyer com as obras barrocas de Aleijadinho, porém, ambos faziam sua arte de maneira própria. em que artista tinha uma obra barroca própria, Niemeyer também fazia uma arquitetura moderna própria. O livro de Mindlin lançado em 1956 com uma versão em Português só na década de 90, irá apresentar várias obras de qualidade e a produção arquitetônica de arquitetos que não estavam no centro do debate. Funcionou como uma propaganda da arquitetura brasileira. No livro a arquitetura moderna de habitação social é mais explorada. O livro apresenta muitas obras de Oscar Niemeyer, como o Copan. Rino Levi também é apresentada de forma ampla no livro. Há também obras de arquitetos estrangeiros no Brasil. O hotel de Nova Friburgo de Costa é uma das obras apresentada no livro, tem como referência a obra Maison Errázuriz de Le Corbusier. Utilizando de materiais locais, madeira, telha, etc. A obra visa demonstrar que é possível fazer arquitetura moderna com materiais que vão além do concreto, aço e vidro, o que importa é a concepção. Foi sendo criada a ideia de uma hegemonia da arquitetura moderna brasileira. o Desenvolvimentismo ganhou forças após a segunda guerra mundial. Devido a possibilidade concreta de tornar executável aquilo que antes era difícil. O pensamento desenvolvimentista era baseado na CEPAL, já que o excedente do lucro do café de São Paulo, usado para montar as indústrias nacionais, não era suficiente para promover o desenvolvimento industrial esperado. O desenvolvimento industrial representa, ao invés de exportar matéria prima, ser exportador de mercadorias manufaturadas. O Partido comunista nesse momento apoiava o setor moderno, da burguesia, pois não era o momento para se contrapor ao industrial. Isso gerou uma crise, levando a diversas denúncias de corrupção no governo Vargas, que teve como consequência o suicídio de Getúlio Vargas e a crise governamental que se deu após

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tal fato. As políticas desenvolvimentistas só voltam com o governo de Juscelino Kubitschek. Vilanova Artigas, se formou como engenheiro arquiteto pela Politécnica. A primeira fase moderna de Artigas é Wrightiana. A arquitetura de Wright tem grande adesão na américa latina, pois era muito semelhante com o ideal de uma arquitetura “tropical”. Artigas se associa com o Partido Comunista e deixa de fazer arquitetura com características imperialistas com influência Wrightiana e começa a fazer arquitetura da escola carioca ligada as questões nacionais com influência Corbusiana. O Partido Comunista era contra a arquitetura moderna, criando um questionamento aos arquitetos modernos brasileiros. (PCB Manifesto de Agosto de 1952, chamando para a revolução.) Artigas se posiciona mais firmemente com o PCB, ocupando o cargo de formador. Foi um arquiteto moderno que opta pelo modernismo, mas entra em contradição com sua posição política que negava o modernismo. Picasso dizia que sua arte não podia ser discutida no âmbito político, pois sua posição política era diferente. Niemeyer irá defender a ideia de que, na sociedade capitalista não tinha como fazer uma arquitetura social. Em sua obra “A casa Baeta” de 1956, Artigas associa a casa com sua infância no interior do Paraná. Mesmo com o PC rompendo com o Realismo Socialista nesse momento, o arquiteto faz uma articulação entre o realismo e o modernismo. A partir dessa obra, Artigas supera sua contradição e começa a constituir a chamada Escola Paulista, caracterizada pelo concreto aparente, monobloco, ampliando os espaços comuns, trabalhando com desníveis, circulação, etc. fazendo da obra uma “mini cidade”. A casa é uma alternativa ao mundo agressivo e injusto, procura ensinar a morar de forma democrática. A arquitetura da escola paulista irá pensar o edifício como uma cidade, utilizando de elementos construtivos como forma de reformatar e reconstruir, por vezes, o natural, imbuir a arquitetura de uma complexidade urbana (ligação com o TEAM X). Artigas é quem repõe a discussão da função social da arquitetura, é o motivo do brutalismo brasileiro ser chamado de paulista, por ele ter desnudado. Ao mesmo tempo, Sérgio Ferro e o grupo Arquitetura Nova, fazem as críticas ao desenho como modificador, reconhecendo a história da arquitetura e da construção, levando a uma reflexão sobre a história das construções informais feitas nas periferias.


Cultura arquitetônica latino-americana no pós-Guerra A forma construída de uma casca de concreto com toda sua rugosidade representada nas obras aponta, de uma forma gráfica, a dimensão de uma etapa de desenvolvimento ainda em processo, denotam para uma técnica ainda em evolução e transformação, não consolidada ainda no Brasil. Em Artigas e também no caso de Redi e outros arquitetos modernos dos anos 50, o uso de concreto armado ganha maior visibilidade e a crueza do acabamento faz um paralelo muito fiel a ideia de um país ainda em desenvolvimento, como um momento de transição e transformação, não se pode considerar arcaico mas também não é inteiramente moderno. As obras de Niemeyer para Brasília apresentam um esforço para dissimular essa ideia de “em desenvolvimento”. Ao envolver uma grande estrutura branca de concreto com mármore polido, Niemeyer faz o oposto de Le Corbusier nos anos 50 quando explicita as técnicas construtivas - ele tenta esconder o processo e potencializar a obra final. Há uma tentativa de apagar o processo de produção e mãode-obra e tenta criar uma imagem de nação em que as tensões entre arcaico e moderno já estariam superadas, levando a uma visão otimista para o futuro em relação ao desenvolvimento do Brasil. Ou seja, dá a obra a concepção plástica e aponta para um país mais consolidado, maquiando uma certa perspectiva dualista do desenvolvimento do Brasil nesse período de modernização, principalmente nas obras do primeiro momento da construção. O que reflete em edifícios icônicos logo de início, com grande carga simbólica. Sendo este um traço forte de Niemeyer, criador de ícones ou obras icônicas. Brasília e a cultura moderna brasileira teve um rápido apelo popular, principalmente porque a arquitetura moderna se projeta como um fenômeno de massa e ganha essa dimensão usando como estratégia a publicidade e os meios de comunicação. A arquitetura brasileira nos anos 40 e 50 vai aparecer em inúmeras revistas pelo mundo, principalmente com a construção de Brasília até ir perdendo espaço no interesse internacional. Esse grande interesse no Brasil vai dar espaço para várias discussões internacionais, particularmente na américa latina possui um importante papel de trazer o olhar para a cultura arquitetônica brasileira, abrindo espaço mundialmente para arquitetos nacionais atuarem internacionalmente. A arquitetura formalista de Rino Levi e os irmãos Roberto e o paisagismo de Burle Marx ganham mais notoriedade com projetos no Chile e Uruguai do que o próprio Niemeyer. Em 1955 acontece a exposição Latin American Architecture Since 1945, no MoMA e tem como curador Hitchcock, o mesmo curador da exposição International Style em 1932. O Brasil tem um grande peso na exposição com seus aspectos principais, como a liberdade formal, a sensualidade formal, etc. além de fazer outras conexões como a dimensão tecnológica, a relação com a história, a relação com a indústria da construção civil norte-americana. Mas não é o foco, a exposição não coloca o Brasil em segundo plano, mas também não é o elemento central. Dessa forma, procura apresentar um leque de arquitetos, construindo uma outra narrativa visando o principal da arquitetura moderna por toda a América Latina. A recepção da arquitetura moderna brasileira é muito mais abrangente do que a exposição do MoMA mostra. A exposição apresenta desde o olhar do passado pré colombiano, passando pelo colonialismo e chegando no mundo moderno dos anos 50, a relação da arquitetura com a paisagem, que é um traço diferencial da arquitetura brasileira com relação a outros países, trazendo obras no México que continham esse traço, como a

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obra em Pedregal, são projetos que exprimem certa coexistência entre paisagem e a concepção formal do movimento moderno, pode-se dizer que é tal relação é um elemento construtivo como uma resposta cultural latino-americana e possui configurações diferentes em cada lugar. Nesse contexto a relação do homem com a natureza é bem típico. Enquanto as obras de Wright apresentam uma certa diluição do projeto na paisagem, Niemeyer e outros arquitetos mexicanos vão criar arquiteturas que variam o foco, alguns projetos estão inseridos na paisagem, outros mudam a paisagem a partir do mesmo, de certo modo capturam a paisagem mas também geram paisagem e não busca a neutralidade do projeto com relação à paisagem, há um certo jogo de domínio e submissão da paisagem. Paulo Mendes da Rocha, por exemplo, possui outra visão da paisagem, diz que “a natureza é um trambolho”, ou seja, é um elemento à qual se deve lidar e encontrar uma maneira de resolver, faz alguns projetos onde muda completamente a paisagem, esse traço é marcante em alguns arquitetos contemporâneos que seguem essa ideia da relação entre arquitetura e natureza onde tanto o arquiteto pode criar a paisagem, como é o caso do MuBE (Museu Brasileiro da Escultura, SP) de Paulo Mendes da Rocha, quanto ter uma posição de confronto com a natureza. Nas primeiras décadas do século XX a ideia de identidade nacional ganha uma grande relevância no mundo todo. Onde cada qual buscava construir sua identidade considerando traços históricos, culturais, tradicionais, etc. reinterpretado e acrescido de alguns traços modernos que encaixasse perfeitamente como a expressão arquitetônica de seu país. Na década de 20 e 30 começam a circular as ideias modernas e Paris era o centro cultural onde várias ideias do momento estavam sendo discutidas e experimentadas, de onde consequentemente, grande parte delas tomaram reconhecimento e foram difundidas pelo mundo, vários artistas, arquitetos e engenheiros do mundo todo passam por lá. Nesse período elementos secundários ganham um certo protagonismo, como escadas, rampas, sacadas e outros elementos que fazem parte da obra, mas na tradição ficavam em segundo plano, nessa nova fase ganham visibilidade e importância nos projetos, com a escadaria, sacada no estilo da Bauhaus. Tal fato possibilitou um leque maior de elementos a serem explorados pelos arquitetos. Na década de 50, Paris já não servia como único polo cultural difusor da arquitetura moderna já que a ideia era transpor os elementos desse estilo para o projeto de cada lugar com suas particularidades. Ou seja, a realidade social, política, econômica e cultural europeia não era a mesma na américa latina ou em outros lugares. Os elementos modernos são os mesmos, mas as formas com as quais as soluções são colocadas dependem de um estudo específico para cada lugar. Dessa forma, o Brasil acabou servindo como influência para países da américa latina, por meio de livros da arquitetura brasileira como Goodwin e Mindlin, revistas de arquitetura, além dos congressos pan-americanos que ocorreram até a década de 40. Nos anos 50, a Venezuela passava por várias mudanças sociais e políticas principalmente ligadas ao desenvolvimento do mercado de petróleo do país, como consequência, houve um grande desempenho econômico bastante revertido para questões de melhoria social, consequentemente, a indústria da construção civil foi muito beneficiada entre as décadas de 50 e 60, com um amplo aumento na produção de habitação. E a escola carioca nesse momento serviu como influência para o


pensamento arquitetônico, principalmente pela semelhança cultural, política, territorial, climática, entre outros fatores. Carlos Raúl Villanueva, é venezuelano, mas viveu muito tempo na Europa, inclusive se formou em Paris e volta para a Venezuela e começa a fazer vários projetos no país. Procura criar uma identidade nacional em seus projetos, considerando toda a história da colonização espanhola, tanto os traços dos colonizadores quanto dos nativos. Busca conectar a ideia de modernidade e tradição, principalmente por meio da experimentação, é possível observar uma certa influência de Lúcio Costa em seus projetos. Pelos anos 30, ele se afasta um pouco das práticas acadêmicas e segue uma linguagem mais moderna, como pode-se observar em seu projeto de 1939 da “Escuela Gran Colombia”, em Caracas que aponta para um traço moderno mais diluído, ou seja, possuía influência moderna mas também traços tradicionais, já que o movimento moderno ainda era visto como uma tendência que poderia ser passageira. Em suas obras ele tanto evidencia o uso dos materiais construtivos e formas da arquitetura moderna como terraço jardim e janela de canto, mas também possui influências de arquitetos franceses como Auguste Perret e Tony Garnier, como no caso da entrada marcante da “escuela Gran Colombia”. A arquitetura dos anos 40 de Villanueva apresenta uma liberdade bem maior. Em seu projeto da “Habitación Social El Silencio”, de 1941 observa-se certa diluição de linguagens, com toques clássicos na fachada pública e toques modernos na fachada posterior. Nos anos 50 sua mudança tem como marco o contato com a experiência brasileira, da escola carioca, que tem uma grande relação com o modelo que começava a ser difundido no Brasil e no mundo nesse período e apontava para a ideia de que era possível encontrar soluções modernas com os meios mais específicos de cada lugar. Muitos arquitetos dos anos 30 que vinham de um pensamento mais ligado à academia, buscavam se mostrar como modernos seguindo influências de arquitetos que não rompem abruptamente o laço com o tradicional, deixando essa mudança de estilo menos brusca, pois se ancoram em um traço que já é consolidado, diferentemente da forma como Le Corbusier, Gropius e Mies rompem com esse laço e se aventuram nessa nova tendência. Nesse período de busca pela identidade nacional, a arquitetura neocolonial ganha grande repercussão nos países colonizados. No caso do México, no começo do século XX, se deu a revolução mexicana (década de 10 a 20), promovendo várias mudanças no país, gerando uma preocupação social e coletiva do estado, dessa forma, foram construídos hospitais, escolas, instituições públicas, etc. Esse cenário causou grande impacto na forma de projetar dos arquitetos modernistas, onde estes assumem um compromisso com a modernidade no sentido de apresentar o país com uma nova cara pós revolução, lá pelos anos 20 e 30. A complexidade maior desse país também se deve à natureza da cultura mexicana, derivada de vários povos diferentes e esse caldo antropológico permeia muitos aspectos, tais quais cultura, arte, literatura e arquitetura, dessa forma, a criação da identidade nacional reflete essa grande pluralidade. Arquitetos como Juan Legarreta e Juan O’Gorman são destaques no cenário mexicano. Hannes Meyer foi um arquiteto socialista de extrema importância na Bauhaus, ele seguia a ideia de arquitetura moderna construtivista, foi quem introduziu a arquitetura como disciplina.

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Juan O’Gorman ganha destaque na década de 30 por sua conexão com a esquerda, buscando soluções para questões sociais ao mesmo tempo que se preocupava com a identidade nacional. Teve muita influência do arquiteto socialista Hannes Meyer, quem introduziu a arquitetura como disciplina na Bauhaus nos anos 20. O’Gorman não compactua com a ideia de arquitetura como arte mas sim como construção. Essa forma de pensamento está muito ligada à ideias europeias de Nova Objetividade, associadas à arquitetura holandesa, soviética, suíça, alemã, austríaca. Sua crítica à arquitetura moderna se assemelha às críticas de arquitetos de esquerda europeus que falam da falta de identidade regional no movimento devido à ideia de criar uma linguagem internacional. Dois dos projetos de O’Gorman de 1932 apontam para uma maior preocupação funcional e não artística de seu pensamento arquitetônico, na “casa para obreiros mexicanos” e na “escola primária Cuautepec”, cuja estética industrial e brutalista refletem a ideia de arquitetura como construção. O’Gorman era artista e arquiteto, então tinha ligação com várias figuras emblemáticas, como Frida Kahlo e Diego Rivera, para quem faz para cada um uma casa atelier e em cada uma o arquiteto buscou projetar de forma que a obra assumisse a personalidade da pessoa para quem estava sendo feita. A casa de Diego é marcada por tons terrosos, sua forma e caráter passa um ar mais rigoroso, duro, enquanto que a da Frida em tons azulados com detalhes em vermelho, possui um visual mais delicado, as duas casas são autônomas e se conectam por uma ponte. Os limites espaciais são delimitados por cactos, traço tradicional do México, dando o elemento tradicional e ao mesmo tempo bruto do projeto.


Arquitetura e paisagismo moderno no Brasil Burle Marx procura explorar as espécies nativas e suas características exuberantes, porém não de uma maneira natural, ou seja, não tenta reproduzir a natureza, há um planejamento da paisagem moderna, inclusive dando formas industriais, padronizadas e de repetição aos seus projetos paisagísticos, sua primeira fase de é marcada por uma naturalização artificial da paisagem, com espelhos d’água, ilhas artificiais (ilha do amor). Com o tempo outro traço começa a aparecer que é a artificialização do artificial, ou seja, começa a trabalhar com elementos artificiais como se fossem naturais, aos poucos os elementos materiais ganham mais presença ao invés dos elementos orgânicos, principalmente a partir dos anos 60. Em certo momento ele brinca com a organização geométrica delimitando o espaço e a interação das espécies com o meio de um lado e uma organização mais orgânica de outro, como se um lado fosse o modernismo pré segunda guerra mundial e o outro lado fosse o pós. Não apresenta tanto domínio da forma das espécies como o paisagismo francês, mas aponta para uma clara intenção de submeter a natureza à geometria do projeto. Suas formas mantêm um diálogo com as artes plásticas e o paisagismo internacional, principalmente em sua fase mineral. Expõe a ideia de que o jardim não é algo que se molda naturalmente como uma floresta, ele necessita de uma mediação criativa. Evidencia que na relação do homem com a natureza, o primeiro tem a capacidade de percepção e adequação da paisagem, onde a ação do homem se coloca de forma determinante nesse contexto. Um traço importante nas obras de Burle Marx é a autonomia, pode-se observar em projetos como a casa Olivo Gomes e Odette Monteiro a intenção de maquiar os limites entre o que é natural e o que é artificial para que tudo pareça ter sido planejado pelo paisagista, de certa forma, submetendo o natural ao controle do artificial. Burle Marx foi o principal paisagista da intervenção em Brasília, a solução que ele encontra é a usual, Palácio do Planalto, espelho d’água mas com uma configuração mais geometrizada e cria um contraponto em relação ao rigor extremo do desenho da arquitetura, principalmente escolhendo espécies secundárias e, dessa forma, enobrecendo as mesmas. No Parque dos Cristais ele faz referência à geologia local com formas remetendo a cristais saindo da água, a parte vegetal se resume a vegetação rasteira e árvores. Em alguns lugares o piso é delimitado de maneira a prevalecer o elemento mineral sobre o natural. Esse projeto em específico, a geometria parece conter a natureza, diferente da ideia geral das obras do paisagista. No caso de Copacabana, a solução gráfica de piso se implanta sob o lugar, revelando uma coexistência entre o projeto e o espaço mas sem que um interfira no outro, entretanto esse desenho pode ser implantado em qualquer outro lugar, como se a intenção fosse única e exclusivamente artística, sem ligação com nada específico do local que se insere. É apenas um grande lugar de passagem, como um quadro, sem outros elementos.

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Louis Kahn-arquitetura como disciplina perene. Louis Kahn no pós segunda guerra, procura buscar conciliações ao invés de rupturas, vai reivindicar a arquitetura como uma disciplina que possui uma história e uma construção, não só uma resposta que traduz um contexto específico que representa o desenvolvimento da cultura ocidental, suas obras possuem um diálogo constante com o tempo, como uma disciplina perene, que tem uma existência de longa duração e, dessa forma, tem uma relação com a história, de forma harmônica a fim de resolver questões. Luis Barragan faz uma leitura da arquitetura colonial e tenta integrar à arquitetura moderna, realizando uma leitura bem interessante das obras hispanoamericanas. Faz diversas experimentações com o elemento pátio. Na sua arquitetura, alguns conceitos neocoloniais ressurgem, explora o pátio, a madeira e, principalmente, a luz por meio da utilização de cores. Seu traço nas obras é a forma como a função humana é diluída em contraposição a plástica com uso de cor.


Da crise do planejamento ao fragmento urbano Paisagem informe estratégias para aprender (e transformar) a cidade. Apreensível como o próprio espaço. Tanto Lynch como Cullen procuram despertar para as qualidades urbanas existentes. Uma paisagem urbana qualificada, que leva em conta o espaço construído. A new Town não tem adensamento, tem natureza, não tem estresse nem poluição urbana. A ideia de multidão está relacionada a industrialização e modernidade, a maquinização do sujeito. Para que não houvesse a massificação do espaço. Estabelece-se um primeiro limite de crescimento da cidade, o cinturão verde. Contudo, depois dele, há criação de novos centros urbanos. Com a industrialização, as pessoas procuram outra forma de vida, mais saudável. A new Town apresenta soluções mais interessante para as necessidades comuns. As ideias de Jacobs, Lynch e Cullen circulavam e se rebatiam em outros contextos, cada um com suas particularidades, mas muito em comum. A ideia de cidade real, tal como ela existe, e foi de fato construída e organizada ao longo do tempo. No caso de Cullen, a maneira como vai se colocar ainda no contexto da primeira guerra mundial, pensando estratégias de conter o crescimento urbano em Londres. Logo após a guerra, vai ser aprovado um plano para a construção da new town ao redor da grande Londres, com a ideia de pensar as new towns orbitando a grande Londres para captar a população do núcleo de Londres. O modelo de cidades jardim começa a se expandir. Howard parte de uma grandeza muito radical da paisagem industrial urbana, que traz como modelo proposto as cidades-jardim, trazendo ideias para o contexto urbano e rural. Núcleos de cidades chamadas cidades-jardim, com crescimento controlado sobre o campo e não descontrolado, sem escassez de habitação, espaços urbanos e áreas verdes. A questão da metrópole é importante para a modernidade: por um lado o nascimento do urbanismo, uma disciplina que pensa a cidade, adquirindo uma série de funções centenárias as cidades (europeias). Esse descolamento traz uma reorganização social imposta pela indústria, a cidade regida pelo tempo natural é substituída por uma cidade que se reorganiza através de processos abstratos como jornada de trabalho e vai se perdendo a relação com a natureza, substituída por uma organização abstrata (dia com 24 horas), coisas bem abusivas do ponto de vista da exploração. Dessa forma, surge a ideia da metrópole. O texto de Simmel “metrópole e vida mental”, fala do impacto da cidademetrópole sobre o indivíduo e a forma com a qual este consegue resistir a isso (encontro com desconhecidos o tempo todo, impessoalidade, estranheza). Como preservar a ideia de manter a identidade na cidade contemporânea. A ideia do Howard traz a cidade sem os seus problemas negativos (ausência de relação de sociabilidade, poluição da indústria, etc.), a cidade é reduzida ao essencial, não é o retorno ao campo pré moderno. A cidade-jardim vira um movimento que ganha adesão rápida e estendida na Europa e nos EUA. E tem em Londres o seu maior investimento para cumprir a proposta ao longo dos anos com várias new towns e aprender com os casos concretos para ir melhorando sempre que possível. É muito criticada, chegando a um limite, até que ponto pode-se construir uma cidade artificial, a cidade se molda, se constrói com o tempo, com personalidades. Criam uma alternativa menos poluidora para a cidade moderna industrial. Nas cidades jardim não podia consumir álcool, tinha várias outras “normas”.

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Na década de 50 havia uma falta de urbanidade dessas cidades, a aposta em um novo tipo de vida da perspectiva dos new towers era contra essa vida urbana, esse tecido urbano concentrado em certos pontos e uma dispersão enorme do tecido urbano. Criam uma resposta controlada a isso, mas geram uma vida mais urbanorural, que não se compara com a vida urbana mesmo de cidades pequenas que crescem de maneiras gradativas e dão vigor a vida urbana. A crítica ao desenho da new town é “de que maneira é possível instigar para viabilizar a vitalidade urbana satisfatória em um lugar artificial.” A ideia de tentar criar variedade e evitar monotonia. Ian Nairn e Gordon Cullen lançam uma edição da architectural review com anotações que eles fazem em uma viagem. Pensar espaços urbanos das cidades inglesas, fazem uma leitura destas a fim de tentar aprender o que é a dimensão da cidade inglesa pós industrialização. Cada vez mais há uma tendência a diluição que se impõem, ela domina e passa a ser a norma e é contra isso que vão se posicionar. Há a mesma ausência de atributos na saída de Southampton e da chegada de Carlisle. A ideia de vida do campo da proposta das new towns é meramente utópica. Várias imagens que Cullen faz de repetições, perda daquilo que distinguia o que a cidade tinha como sua anteriormente, da vida urbana que se desenvolvia em cada contexto. Diluição das cidades sobre o campo que é sub-utópica, procura-se despertar a consciência para que esse processo não se expanda, na intenção de pensar a cidade já existente de forma a melhorar seus problemas. A penetração massiva da sociedade de consumo, com elementos que deturpam as qualidades urbanas do local. O pitoresco entra como a defesa de uma paisagem urbana com atributos, que aparece em Paisagem Urbana, 1996 Gordon Cullen. A condensação com liberação de espaço livre que cria um tecido urbano muito mais marcado por vazios do que por espaços construídos. Para Cullen, não há como igualar a paisagem urbana à paisagem natural. Ele sempre embebe os desenhos de natureza subjetiva, uma complementação da forma de pensar a cidade, essa dimensão subjetiva faz pensar nas possibilidades para a cidade. Há reivindicação de uma metrópole que procura reforçar o contraste, Cullen procura despertar o sujeito caminhante e observador para esse contraste, as sensações que explorar a cidade causam e o processo de descoberta deve saltar a vista de acordo com que o sujeito vai explorando a cidade. Opondo-se à ideia de visão serial. Cria-se possibilidades de percepções diferenciadas e apreensões gerais do todo. Todo o repertório anterior é baseado na ideia de funcionalidade, pensar a cidade como fragmentos e não um grande plano gera soluções interessantes para os detalhes contexto urbano e sua vivência. As paisagens urbanas criadas pelo acúmulo histórico onde o tempo é o protagonista no processo de moldar a cidade. Em “The image of the city” Kevin Lynch, 1960, há um esforço para tentar restituir o controle da imagem urbana, Lynch tem a intenção de que seu livro pudesse nortear, de uma forma generalizada, as pessoas a entenderem a cidade. Pensando na elaboração de um método mais abrangente possível. Ele coloca a arquitetura como uma arte passageira, fala da ideia da incorporação da história, mesmo uma cidade com temporalidade menor. No planejamento moderno, isto teve um desdobramento cheio de problemas, principalmente com relação a espacialidade na cidade, como em Brasília. Principalmente por não conciliar as dinâmicas políticas, sociais e econômicas, deixando tudo fragmentado ou setorizado.


Cria vĂĄrios mapas mentais e, a partir deles define uma imagem coletiva da cidade, que compĂľe-se individualmente. Faz entrevistas, mapas, formas visuais, etc. a fim de mapear elementos marcantes, comuns e outras caracterĂ­sticas.

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As utopias urbanas e a apologia da técnica Imagens de aparatos tecnológicos são transpostos para a sociedade, seria um pensamento futurista do uso da tecnologia. Soluções tecnológicas para a arquitetura e o urbanismo. São produções que existem na cultura pop da época, principalmente nos EUA e Europa, com a revista “popular mechanics”. Formando imaginários que existem na sociedade. Dois escritórios de arquitetura se unem e criam a revista archigram (Architecture + Telegram), que fala sobre arquitetura e tecnologia. Criam a ideia de walking city, que são grandes mecanismos tecnológicos que andam pelo mundo e se comunicam por tubos para se conectar. É a possibilidade de um mecanismo que supere uma situação de fixação do homem em um determinado local. A tecnologia nesse caso permite que se supere a ideia do sedentarismo de uma cidade. As walking cities podem ter rodinhas ou sapatas para se fixar ocasionalmente, além da possibilidade de flutuar. Outra ideia que surgiu nessa época foram grandes meios de locomoção com base de estruturas pneumáticas que levam cápsulas engastadas em torres, nas quais essas cápsulas são micro apartamentos. Todo esquematizado como isso acontece. Nesse ponto, a arte pop e a arte tecnológica começam a se juntar. O archigram passa a fazer várias propostas, desde a walking city até a instant city. O final dos anos 50 e início dos anos 60 é um caldo de culturas, juntando a tecnologia, cultura pop, contracultura, o que traz muitas críticas principalmente por meio de festivais como woodstock. Eles colocam uma grande estrutura no meio do nada e ficam por dias instalados, criando uma cidade instantânea. Não fica explícito o que acontece com o lixo, com a vida natural fora da walking city e o impacto ambiental que elas causam. Existe uma apropriação genérica da tecnologia para criar as walking cities, mas sem definição clara do funcionamento desses equipamentos. A questão da monumentalidade não é considerada nessa tecnologia, a própria ideia de tecnologia seria o foco da monumentalidade. Nas colagens que o archigram faz não existem velhos, as noções de propriedade e criar família são desmontadas, a organização social é desfeita, a ideia de família é repensada, sem necessidade de fixação. É uma crítica radical à cultura burguesa de posse, propriedade e domínio. Os anseios que a sociedade do consumo estava criando gera críticas que visam quebrar os padrões burgueses. Nos anos 20 há uma grande homogeneização entre as pessoas, a partir dos anos 50/60 com o consumo, a individualidade do sujeito foi permitida, a ideia de descarte era nova e foi muito elogiada, a pessoa usa, joga fora e a tecnologia faz outra. A relação com os objetos é profundamente alterada pelo consumismo. A noção de horizonte sobre a tecnologia era muito ingênua, era muito novo, não se pensava em reciclagem ou em lixo tecnológico. O foco era repensar a sociedade sem nenhuma crítica ao sistema. Sem nem perceber que o ponto principal era esse. Como se cada vez mais, as decisões fossem determinadas por uma perspectiva Tecno burocrático/científico, desenvolvido pela cibernética, o sujeito não tinha mais suas “picuinhas” era tudo produto da máquina. Tem todo um horizonte de ideias e esperanças ingênuas. Mudando as perspectivas de como mudaria a vida social, familiar e a relação com o território. A ideia do burguês é de um sujeito que se molda a partir dos objetos e coisas que possui. Dessa forma, na cultura do descartável tudo isso desaparece, o prato é descartável, a roupa é para um dia só, a comida do astronauta é uma pasta química,


não precisa mais da agricultura, não se falava da produção flexível, pensavam que tudo seria resolvido de forma tecnológica, as relações pessoas não acontecem mais como antes. Tudo o que depende de contato ou presença é minimizado ou subtraído. O sujeito e sua mente é o que basta, é a geração do LSD e tudo o que o ser necessita está nele mesmo, ele não necessita do outro. É um caldo cultural que não tem uma crítica ao sistema político e econômico. Mas as propostas permeiam de forma irregular, o descartável vai ser consumido sem ter fim. Não era pensado como um sistema cíclico ou um consumo cíclico, onde há possibilidade de trocas e transformações, a ideia de sustentabilidade não existia. A ideia de nação também passa a ser questionada, a tecnologia por si só leva a um grau de consciência que torna obsoleta a ideia que outros campos apresentam. Mesmo sendo um momento de muitos conflitos entre fronteiras. A relação com a natureza é totalmente deixada de lado, a luta do homem é a luta contra a natureza, as walking city estão lá para passar por cima de tudo, a necessidade humana de ver uma paisagem naturalmente bela se faz por uma tela, existe a ideia de que um mecanismo tecnológico possa substituir toda e qualquer necessidade de relação do sujeito com o meio, com o outro ou com qualquer outra coisa, ou seja, as necessidades do homem seriam resolvidas com a tecnologia. Os Shivering Sands Army Fort é uma linha de baterias antiaéreas no canal da mancha que a Inglaterra construiu para a segunda guerra mundial. A tipologia remete as walking city. Uma megaestrutura pode ser algo que tem história, como a ponte Vecchio e a ponte de Londres. São estruturas que podem ser modificadas ao longo do tempo sem que interfiram na estrutura principal, ela vai acoplando estruturas que podem ou não ser provisórias. A estrutura de Paolo Soleri é entendida como uma megaestrutura. Os anos 60/70 foram de grande expansão econômica. Em 1964 o mundo encontra-se no meio da corrida espacial, milhões de dólares foram gastos para mandar o homem para a lua, evidenciando o desenvolvimento tecnológico. Buckminster Fuller propõem um domo sobre Manhattan, era também a proposta para a lua, o domo serviria para criar um ambiente artificial em qualquer lugar do universo. Espaços feitos a partir do que se é dado pelo movimento tecnológico. O archigram, assim como os Smithsons, era muito interessado pela sociedade de consumo norte americana, existe um grande fascínio por esse modo de vida, o “American way of life”. O automóvel nessa época é o grande símbolo da ascensão social e recuperação econômica pós guerra, existiam várias cores de carros que estavam relacionado à personalização do automóvel. A relação do sujeito com as coisas nessa época era de mero suporte, a casa e o carro eram apenas suporte, é um módulo de sobrevivência para o sujeito, uma mudança de hábitos. A “instant city” é uma proposta de recursos mais leves para se montar uma cidade, com balões ou tendas. Que podem ser montadas rapidamente em qualquer lugar. A lógica da vida, nesse momento, se dá como arranjos urbanos que podem se desfazer rapidamente e facilmente. Mostra outra forma de existência que não se simplifica no habitar. A condição do homem moderno para os arquitetos dos anos 50/60 é de um homem sem habitação, pois não existe mais e nunca existirá novamente a ideia real de habitação.

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Muitas variações dessa tipologia de estrutura. O conceito de megaestruturas consiste em várias estruturas que podem ser compreendidas como megaestruturas. Associam a ideia de metabolismo com a estrutura, além da ideia de desgaste e descarte, era um ciclo – produção, consumo e descarte – pensando como a vida biológica, como pode ser observado com os metabolistas. A vida como um ciclo biológico, como um elemento de estrutura circular, não pensado na ideia de consumo como do archigram, mas de uma relação entre tecnologia, a dimensão biológica dos organismos e a concepção da sociedade. Há um diálogo que não se vê no archigram entre tradição e tecnologia, que é o que diferencia bastante os metabolistas com relação aos hi-techs. Cidades marinhas e universos subaquáticos que moldam o imaginário, principalmente para ocupações sobre a água e sob a água que revelam um desejo de que a tecnologia pode romper qualquer limite ambiental existente, seja a lua ou o fundo do mar, como se para o ser humano tecnologicamente desenvolvido não houvesse mais limites. Um dos principais metabolistas é o Kisho Kurokawa, ele propôs a Nakagin Capsule Tower, que foi construída, mas desmontada. Criando fragmentos reais de coisas utópicas. A ideia da cápsula é para passar a noite, mas com o tempo vira moradia e acaba por ter características pessoais.


A “escola paulista” e a radicalização do discurso ideológico A tragédia no Japão no final da guerra deixa vários resquícios. A ideia de país em reconstrução traz o movimento metabolista, em 1960 acontece um encontro em Tokyo chamado “metabolism”. O grupo de arquitetos vai propor e fundamentar a discussão dos metabolistas, vão lançar um manifesto dos metabolistas. O grupo era formado por arquitetos que já tinham experiência. A ideia de metabolistas veio de metabolismo, observado na natureza, a forma como acontece o metabolismo, a relação entre natureza e cultura da perspectiva budista, uma relação que não é de ruptura mas também não é de submissão, o metabolismo propõe pensar a tecnologia com ciclos vitais, tem muito a ver com outras propostas de megaestrutura, não tem a ver com a relação de uso e descarte como o archigram, mas que as coisas possuem um ciclo vital e metabólico, começo, meio e fim. Ao mesmo tempo procuram vencer as dificuldades que o meio impõe de uma forma não agressiva, respeitando a natureza e entendendo a sua magnitude. Alguns exemplos desse tipo de arquitetura são o Templo Hōryū-ji e o Templo da Lei Fluorescente. Sobre a Arquitetura Nova: escola paulista e escola carioca. Uma revela o processo de criação com sinceridade, enquanto a outra camufla a verdadeira face dos materiais. Há dicotomia entre a plasticidade, a conformação final da obra e o processo de produção. A contradição escamoteia não só os materiais, mas também a verdade do processo de construção. No caso de Brasília, as condições de trabalho são péssimas, aquilo que sustenta a construção civil brasileira, é um trabalho executado em péssimas condições e, se os arquitetos querem produzir algo que revela o processo de produção, então algo é omitido. A forma é fundamental na arquitetura brasileira. Niemeyer costumava dizer que resolvido a estrutura, a forma estaria pronta, mas é uma grande falácia. Na verdade, precisou mudar toda a forma de cálculo para calcular as colunas do palácio do planalto, ou seja, puramente, a forma submeteu a construção, o trabalho e todo o resto. A arquitetura pode dissimular a representação de uma realidade de um povo ou momento. É um contrassenso que existe entre arquitetura e sociedade. As formas são muito conhecidas na arquitetura brasileira. Os trabalhadores, no sol de 40 graus do distrito federal, com nenhuma tecnologia, tudo manual. Quando se vê as belas formas, se esconde o trabalho que houve ali. A condição de trabalho para chegar a bela forma é importante para se começar a crítica ao modernismo brasileiro. Esta solução formal é fruto de um processo falso, a técnica brasileira é desprovida de tecnologia naquele momento. Artigas coloca que os arquitetos, reconhecendo os problemas de produção, devem incentivar a melhoria da produção civil. Discutir o trabalho a fim de descobrir qual tecnologia é mais apropriada para se fazer arquitetura em massa. É como se usassem um material tradicional absorvendo e refinando o uso desses elementos, não é uma forma passiva de lidar com esses elementos. Aprofunda o pensamento tecnológico que se deve ter para usar os elementos tradicionais. No caso de Brasília, houve uma imposição da arquitetura e seus meios de construção. A arquitetura poderia ser uma forma de transformar essa relação. porém, os pensamentos naquele momento estavam ligados à autonomia política.

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Continuação da Arquitetura Nova Momento de indefinição no espaço político, depois de JK, Jânio e o que viria pela frente. Artigas criticava a construção de Brasília, como algo que fazia ele se sentir mal. A arquitetura de Artigas é a arquitetura que representa a desigualdade, a ideologia de Trotsky da Rússia, de desenvolvimento desigual. De uma hora para outra chega o desenvolvimento e tudo o que era arcaico vira desigual, o moderno se implanta mantendo formas arcaicas e o modernismo se dá dessa forma. A FAU é uma multiplicidade, é como uma catedral de um mundo novo e ali era onde se formava o coletivo. Do ponto de vista construtivo, tem uma diferença clara do concreto externo aparente e o interno, Artigas quer mostrar a solução do desenvolvimento do moderno para o arcaico, de forma que o moderno se sobreponha, nesse sentido, o interno é mais bem finalizado. Dando a ideia de que o arcaico será vencido pelo moderno, a fim de refletir o momento político que se encontra - o projeto começa em 1961 e termina em 1965, após o golpe de 64. Denota a ideia de que o Brasil iria superar esse momento e retomar o desenvolvimento. Na casa Elza Berquó, Artigas utiliza tijolos, a residência é sustentada por quatro troncos de madeira bruta, os pisos são várias colagens, possui nichos de santos, dando a ideia de que o arcaico poluísse o espaço Foi um projeto de 1967, época em que ele começa a ser perseguido, é preso e apesar de tudo, se reafirma no Partido Comunista e no ideal desenvolvimentista brasileiro, ainda em 67 começa o projeto do conjunto habitacional Zezinho Magalhães Prado em Guarulhos, usando mão-de-obra dos trabalhadores que vinham do nordeste e do campo, que era uma ideia do PC. Em 67 o PC e o Artigas diziam que o golpe era um soluço e tudo voltaria ao normal, porém em 69 vem o AI-5 e Artigas é afastado da FAU (inaugurada em 67), a FAU passa a ser a representação da subtração do desenvolvimento e da democracia, virou o espaço de liberdade (o mundo é a ditadura militar e a FAU é o espaço de liberdade). O projeto é a forma de interação política dos arquitetos. Retomar Artigas é importante para entender a crítica realizada pelo grupo Nova Arquitetura: Sérgio Ferro, Rodrigo Lefebvre e Flávio Império. A casa Boris Fausto, de Sérgio Ferro é um mix de brutalismo. Ele diz que nada corresponde a nada, os produtos não são nada do que o catálogo fala, não existe coordenação dos materiais nem padrão, tudo o que deveria ser prático e ajustável é muito mais difícil, os materiais são todos ruins, do ponto de vista da coordenação. Até hoje no Brasil, os azulejos devem ser cortados no canteiro de obra, é quase um segundo trabalho artesanal. A ideia então era de fazer a casa de modo a facilitar para o trabalhador. Na casa Bernardo Issler (1961) em Cotia, primeiro se projetou a abóbada – telhado. A construção interna foi pensada posteriormente. Nessa época eles passam a acoplar o mobiliário à obra arquitetônica, a residência possui lareira, um nicho ao lado, o sofá pré pronto e nichos na cozinha. O arquiteto faz política pela arquitetura contra o regime militar nesse período, falam que o projeto é o instrumento de dominação dos trabalhadores. Rodrigo Lefèvre faz um discurso em que diz que o arquiteto deve usar um instrumento mais contundente para lutar contra a ditadura além da lapiseira, no caso, a arma, nesse ponto começa a luta armada dos arquitetos contra a ditadura militar. Sérgio e Rodrigo também construíram várias escolas. Eles queriam que o trabalhador participasse da obra, ele passa a ser um cara que domina a obra e passa a ter uma autonomia de pensamento, essa liberdade de autonomia, para os arquitetos, serve como uma ideia de conscientização, dar autonomia ao trabalhador do canteiro, o trabalhador que era submisso passa a ser uma pessoa com voz ativa. As ideias de Sérgio e Rodrigo contra Artigas e Paulo Mendes era muito crítica. Artigas praticamente dedurou Sério e Rodrigo de ser da guerrilha durante a ditadura militar.


Conclusão A riqueza de possibilidades que os elementos da arquitetura moderna permitiram no projeto, no sentido espacial, formal, material e técnico é de extrema relevância até os dias de hoje. Foi um movimento que apresentou uma variedade considerável de tecnologias para o mundo, ou seja, é um movimento importante no sentido de mostrar o desenvolvimento tecnológico mundial. A funcionalidade excessiva do movimento moderno não correspondia aos anseios humanos de forma suficiente, o homem como ser complexo necessita de mais do que dormir, comer e trabalhar, é um ser emocional, necessita de espaços que acolham e possibilitam um sentimento de pertencimento. A destruição das cidades europeias nos pós guerras gera uma grande demanda por projetos de habitação, escolas, hospitais, entre outros. Nesse sentido, a arquitetura entra com um viés mais voltado para a rapidez na construção, utilizando de elementos pré-fabricados, aço, concreto e vidro, que são materiais que permitem maior agilidade na construção, em detrimento do tradicionalismo e elementos artesanais. Fatores diretamente relacionados com a maquinização na sociedade pós revolução Industrial. Os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM), têm como objetivo estabelecer metas a serem seguidas pelos arquitetos nos processos de criação arquitetônica naquele momento. Nesse sentido, vão surgindo discussões e questões acerca dessa sociedade moderna onde se perde a essência do ser, dando espaço para críticas aos CIAM pelos arquitetos da nova geração, que querem superar o movimento moderno. Forma-se o Team X, que visa discutir as questões da arquitetura do momento sem a pretensão de criar um documento síntese para ser seguido. Alguns arquitetos ganham visibilidade nesse processo de desenvolvimento do pensamento arquitetônico desde a modernidade. A princípio o centro difusor de movimentos estéticos e artísticos era a Europa central, com o movimento moderno e as trocas internacionais, há uma descentralização desses movimentos, abrindo espaço e dando visibilidade para arquitetos de outros continentes. A arquitetura latinoamericana ganha destaque no mundo todo, principalmente com figuras brasileiras. O Brasil se torna um polo gerador de tendências arquitetônicas por volta dos anos 50/60, refletindo a ideia de desenvolvimento do governo JK com a criação de Brasília. Seguindo o desenvolvimento tecnológico mundial, vários movimentos ganham espaço e discussões diferentes sobre a forma de se pensar o planejamento urbano, como os movimentos Hi-tech, que criam a ideia de que a tecnologia seria capaz de satisfazer todas as necessidades humanas, onde o homem não precisaria mais se fixar, pois a tecnologia permitiria levá-lo a qualquer lugar, como a lua ou o fundo do mar. Esses traços apontam para uma utopia com relação ao desenvolvimento tecnológico. As formas de pensar o espaço urbano vão ganhando outros elementos, que se traduzem a partir da interpretação do passado diluída nas necessidades do momento em que se encontra, o arquiteto passa a compreender a importância da história para o lugar, o espaço está diretamente relacionado com sua história ao longo do tempo, ele se molda a partir disso, negar o passado não é a solução para as questões da sociedade contemporânea, pelo contrário, incorporar os elementos tradicionais à forma contemporânea garante maior sensação de pertencimento do sujeito com o lugar, cria vínculos e situações que refletem o que é a dinâmica espontânea da vida cotidiana urbana.

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