#14 - A Natureza Jurídica dos Caminhos

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newsletter #14 Julho de 2016

Neste número: Notícias \\ Novo Site Geojustiça \\ Jornadas Solicitadores e Agentes de Execução Instituição \\ Arquivo Histórico da Secretaria Geral do Ministério da Economia

A Natureza Jurídica dos Caminhos todo o caminho conduz a um destino...

Tema de capa \\ A Natureza Jurídica dos Caminhos Conceito \\ Cômoro Parcerias \\ iBase \\GisGeo

GEOJUSTIÇA Centro de Negócios Ideia Atlântico, Caixa 003 Av. General Carrilho da Silva, 4719-005 Braga

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Notícias

\\ Geojustiça lança novo site institucional A Geojustiça, pela comemoração dos seus 6 anos de existência, lançou um novo site institucional com uma imagem renovada e com novos serviços. Visite-nos em: http://geojustica.pt/

\\ Jornadas de Estudo dos Solicitadores e dos Agentes de Execução 2016 A Geojustiça esteve representada pela Dra. Carla Freitas nas Jornadas de Estudo dos Solicitadores e dos Agentes de Execução 2016 no painel de oradores que debateram o tema “O Cadastro – O Projecto Geopredial” Esta comunicação, feita no segundo dia das jornadas, pretendeu salientar a importância de um cadastro em Portugal e o papel do Geopredial como contributo para a sua execução. Veja o resumo deste dia das Jornadas em: http://osae.pt/pt/detalhe/noticias/jornadas-de-estudo-2016— segundo-dia-marcado-por-debate-com-olhos-postos-no-futur o/1/1/1/11124

Instituição

\\ Arquivo Histórico da Economia O Arquivo Histórico da Economia é composto pelos diferentes fundos documentais das extintas Secretaria-Geral da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, da Secretaria-Geral do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Inspeção Geral das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Mais informação em: http://arquivohistorico.min-economia.pt/arqui vohistorico/

Atualmente dispõe de dois grandes acervos: o Acervo do Ministério da Economia e o Acervo das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Destaca-se este último acervo por possuir diversa informação relevante, como são o caso, por exemplo, da informação sobre a divisão dos concelhos, informação sobre a construção de estradas, construção de obras públicas, entre outros documentos pertinentes para diversas utilizações.

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Tema de capa

\\ A Natureza jurídica de caminhos Perante um local de passagem que é utilizado por um conjunto mais ou menos determinado de pessoas podemos estar face a um/a: - Caminho público; - Servidão de passagem. - Atravessadouro; O que distingue o caminho público dos restantes é que a passagem é feita por “chão” que é público, ou seja, a via é dominial e está desintegrada do prédio ou prédios que atravessa, enquanto, no atravessadouro ou na servidão de passagem, esta é feita por caminho com leito próprio passando sobre prédio particular, o “chão” é por isso, particular, ou de todo o modo “chão” alheio. A doutrina e a jurisprudência têm vindo a esclarecer tais conceitos, definindo os caminhos públicos como aqueles cuja propriedade pertence ao Estado ou às autarquias locais sendo mantidos sob a sua administração, afetos ao uso público, sem oposição de ninguém. Neste caso é lícito a todos os cidadãos utilizarem-nos, apenas com as restrições impostas pela lei ou pelos regulamentos administrativos. Diferentemente, os caminhos particulares são privados. Pertencem a pessoas, singulares ou coletivas, e, por isso, só podem ser usufruídos pelos respetivos proprietários ou por terceiros desde que aqueles lho consintam ou tolerem.

Atravessadouros Está na palavra “atravessadouro” implícita a ideia de que se atalha ou atravessa um prédio particular, abandonando-se o caminho iniciado, para atingir mais fácil e rapidamente o ponto de destino, que poderá ser outro caminho, outro sector do mesmo caminho, ou até um imóvel pertencente a dono diferente. O Código Civil considera, contudo, abolidos os atravessadouros, por mais antigos que sejam, desde que não se mostrem estabelecidos em proveito de prédios determinados, constituindo servidões (art. 1383º).

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Não obstante abolidos, são admitidas duas exceções: uma, relativa aos que, com posse imemorial, se dirijam a uma ponte ou fonte de manifesta utilidade (pública), enquanto não existam vias públicas destinadas à utilização ou aproveitamento de uma ou outra; a outra exceção é a dos atravessadouros admitidos em legislação especial (art. 1394º). Servidões de passagem É comum existirem prédios cuja saída direta para a via pública ou não existe ou está severamente limitada, designando-se aqueles por prédios encravados. De acordo com artigo 1550º, do Código Civil, os proprietários de prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem condições que permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a faculdade de exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios rústicos vizinhos. De igual faculdade goza o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a via pública, por terreno seu ou alheio. Contudo, prevê o artigo 1553º que a passagem deve ser concedida através do prédio ou prédios que sofram menor prejuízo, e pelo modo e lugar menos inconvenientes para os prédios onerados. Caminho público

Exemplo da representação de caminhos na Carta Militar de Portugal 1:25000 Fonte: IGEOE

O “Assento” do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de abril de 1989 fixou o entendimento de que são públicos os caminhos que, desde tempos imemoriais, estão no uso direto e imediato do público. A Jurisprudência do STJ, no entanto, passou a interpretar restritivamente o mencionado “Assento”, exigindo que, além da afetação ao trânsito das pessoas com imemorialidade, essa utilização corresponda a satisfação de interesses coletivos com atendível grau e relevância, numa clara adesão aos critérios do destino e do carácter. Donde se entenda que, por muitas que sejam as pessoas que utilizem um determinado caminho ou terreno para passar, só se poderá sustentar a relevância desse uso geral para conduzir à classificação de caminho público se o fim visado pela utilização for comum à generalidade dos respetivos utilizadores, por o destino dessa utilização ser a satisfação da utilidade pública e não de uma soma de utilidades individuais.

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julho 2016 A posse imemorial remete para a seguinte ideia fundamental: é imemorial a posse se os vivos não sabem quando começou, não o sabem por observação direta, nem o sabem pelas informações que lhes chegaram dos seus antecessores – uma posse tão antiga que excede a memória das pessoas que ainda estão vivas. Outra importante característica do caminho público é a sua integração no sistema viário, que, em princípio, permitirá a cada um atingir todos os destinos possíveis, pois todos os caminhos comunicam entre si. Os caminhos vicinais passaram a integrar a natureza de caminhos públicos, ainda que constituam ligações de interesse local secundário, vocacionadas para o trânsito rural, também conhecidos por “caminhos rurais”. Estes caminhos, por regra, não são adaptáveis à circulação automóvel (só viaturas de lagartas ou carroças ou tratores) e podem alterar-se, com alguma facilidade, por exemplo, depois de uma forte chuvada.

Disposição das pedras a indicar o leito do caminho

Marca dos rodados - evidência do uso

Fonte e procedimentos utilizados que contribuem para a aferição da natureza de um caminho Existem várias cartas e plantas nas quais se encontram representados os caminhos. Destaca-se pela sua antiguidade a Carta Corográfica de Portugal, na escala 1:100000, de 1856-1904, de Filipe Folque. A cartografia militar é igualmente uma referência nesta matéria, sobretudo as primeiras edições da Carta Militar de Portugal, na escala 1:25000, série M888. Esta série cartográfica, apesar da escala, é extremamente rica em informação, sendo até hoje utilizada como base para inúmeros projetos de natureza nacional e regional. Vários municípios dispõem ainda de importantes peças de cartografia topográfica, que variam em termos de escala e datas. Por regra, a maior parte da cartografia não diferencia os caminhos representados quanto à sua natureza pública ou particular, mas sim quanto ao seu tipo de uso e respectivas características: “caminho de pé posto”, “caminho carreteiro”, “Caminho dando acesso a automóveis”, “caminho com 3 metros de largura”, “caminho com menos 3 m de largura”, ... Mais recentes, mas igualmente pertinentes, são as secções cadastrais respeitantes aos concelhos que possuem Cadastro Geométrico da Propriedade Rústica, em vigor. Nestes, além de distinguirem os caminhos de “pé posto ou vereda”, dos caminhos “para carros”, representam os limites cadastrais, o que facilita a análise sobre se o caminho delimita ou atravessa os prédios ao longo do seu percurso.

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As fotografias aéreas e os ortofotomapas são fontes igualmente fundamentais quando se pretende alargar a análise espacial a questões como as características da área envolvente ao caminho “… a área em análise é predominantemente florestal (arvoredo denso) e agrícola, tendo os caminhos representados um interesse agro-florestal” ou para averiguar se determinado prédio não tem, nem teve, comunicação com a via pública, qual o acesso mais próximo, menos oneroso e inconveniente, ao prédio encravado, atendendo, por exemplo ao uso do solo dos prédios confrontantes, a presença de construções, benfeitorias, … Algumas servidões de passagem como as constituídas por usucapião, ou as constituídas por destinação do pai de família, têm que se revelar por “sinais visíveis e permanentes”, sendo importante a comparação de fotografias aéreas de diferentes datas que podem facultar informações fundamentais. A informação geográfica pode ser complementada com informação documental, de que se destaca o Decreto‐Lei n.º 45 552. D.G. I Série, 25 Suplemento (30‐01‐1964) que classifica provisoriamente os caminhos municipais do Continente. De qualquer modo, uma análise destes elementos ficaria sempre incompleta sem o trabalho de campo, onde a presença de evidências no local é igualmente fundamental para perceber indícios ligados ao uso e intemporalidade “… que nele há uma ponte de pedra, formada por duas pedras, sobre um ribeiro, a qual é antiquíssima de manifesta utilidade pública…”, “a existência de uma rodeira, formada pelo constante pisoteio de um determinado espaço de passagem”, “a presença de pedras, indicadoras do local de passagem, colocadas de forma a evitar que a passagem se realizasse de uma forma dispersa pelos terrenos”,… Exemplo da representação de um caminho nas secções cadastrais do Cadastro Geométrico da Propriedade Rústica (sinalização nossa) Fonte: DGT

É a análise dos trilhos cartografados, em complemento com outra informação geográfica e documental e com trabalho de campo, que nos permite verificar se os caminhos analisados reúnem todas as características de um caminho público, como a sua intemporalidade, o traçado perfeitamente visível, estável e contínuo, se a sua utilização sempre serviu interesses coletivos e se manteve a ligação com outras vias principais.

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julho 2016 NOTA FINAL É aos tribunais judiciais que compete, perante uma situação concreta de conflito relativa ao direito de propriedade e à utilização de um caminho ou passagem por parte da população, determinar a natureza jurídica da situação em causa, nomeadamente, decidindo se se trata de uma servidão legal de passagem ou de um caminho, e, neste caso, decidir sobre a sua natureza pública ou particular. Exemplo da representação de caminhos e estradas na Carta Corográfica do Reino (ilustração nossa) Fonte: DGT

Bibliografia Almeida, Bettencourt de Faria Moitinho, 2005, Caminho público Atravessadouro, in: Revista n.º 394/05 - 2.ª Secção Pereira da Silva Boularot, Ana Paula, 2005, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 6865/2005-2, de 13 de outubro de 2005, (https://blook.pt/caselaw/PT/TRL/325683/?q=relator:%20Ana%20Paula%20 Boularot, consultado em 07-07-2016) Cordeiro, António Menezes, 1993, Direitos Reais, Lex-Edições Jurídicas: Lisboa. Justo, A. Santos, 2012, Direitos Reais, 4.ª Edição, Coimbra Editora: Coimbra. Martins, António Carvalho, 1999, Caminhos Públicos e Atravessadouros, Coimbra Editora: Coimbra. Moreira, Maria Alexandra, 2008, Parecer: ocupação de caminho rural e competências da freguesia, CCDR-Alentejo, (http://www.autarnet.com/news/190.html, consultado em 11-07-2017). Neto, Abílio, 2016, Código Civil Anotado, 19.ª Edição, Ediforum: Coimbra. Sousa, Martins, 2010, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.º 261/06.1TBSRT.C1, de 20-04-2010 (http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/4eecd0 3883f89e2e80257713004b1373?OpenDocument, consultado em 11-07-2016). Viana, Solano, 1989, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 073284, de 19-04-1989 (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ace51cb 6f7da9271802568fc00397c87, consultado em 11-07-2016).

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Conceito

\\ Cômoro A palavra cômoro vem do latim cumũlus que significa “matéria acumulada”, encontrando-se já documentada desde o século XVI através da designação de “combro”. Assim, cômoro refere-se à acumulação de terra, depositada artificialmente sobre a superfície do solo, causando uma elevação de terreno. Para além desta denominação é também conhecida como sendo um pequeno outeiro. Fontes: António Geraldo da Cunha, Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, 1º V, Nova Fronteira, 1982; Francisco António Fernandes da Silva Ferrão Diccionario Elementar Remisssivo ao Codigo Civil Portuguez, Imprensa Nacional, 1869; Cândido de Figueiredo, Novo dicionário da língua portuguesa, 1913;

Parcerias

\\iBase A Geojustiça estabeleceu um protocolo de parceria com a iBase, empresa especializada no desenvolvimento de softwares de apoio à actividade jurídica. Conheça melhor as suas soluções em: http://www.ibase.pt/

\\GisGeo A Geojustiça estabeleceu um protocolo de parceria com a empresa GisGeo no âmbito do projecto “O Património Imobiliário das IPSS - ao serviço de uma gestão eficaz e autossustentável”. Conheça melhor a GisGeo em: http://www.gisgeo.pt/

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Onde estamos

O Ideia Atlântico é uma rede de centros de negócios e incubadora de empresas com espaços em Braga, Lisboa e Rio de Janeiro. Dispõe de soluções de apoio ao alojamento empresarial, salas de reuniões, salas de formação, auditório e ainda soluções de apoio técnico como consultoria, formação executiva e tutoria empresarial. A Geojustiça tem a sua sede no Centro de Negócios Ideia Atlântico de Braga, mas reúne igualmente com clientes, parceiros e colaboradores nas instalações de Lisboa e do Rio de Janeiro. Centro de Negócios Ideia Atlântico, Caixa 003 Avenida General Carrilho da Silva 4719-005 Braga Coordenadas: 41º 33' 39'' N 8º 23' 09'' W Website: www.ideia-atlantico.pt

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