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TETÊ COM ESTILO
POR MARIA THEREZA LAUDARES
mtlaudares@gmail.com – @mtlaudares
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ZUZU ANGEL, PRESENTE!
Zuzu era mineira, era mãe, era guerreira e para sempre será moda. Homenagear Zuzu Angel no ano do centenário de seu nascimento é reconhecer a capacidade feminina de criar na alegria e na tristeza, pois brasileira nasce colorida e sabe falar de amor.
Devota de Santo Antônio, Zuleika nasceu no dia 5 de junho de 1921, em Curvelo, Minas Gerais. Ainda jovem, mudou-se para Belo Horizonte, onde se casou com o americano Norman Angel. O casal transferiu-se para Salvador e, de lá, para o Rio de Janeiro. Da união nasceram os filhos Stuart, Ana Cristina e Hildegard.
A estilista foi a primeira brasileira a ser reconhecida internacionalmente por sua originalidade na criação de moda ao levar para o mundo o que hoje entendemos como brasilidade. Zuzu Angel foi e sempre será a pioneira da moda como manifesto no Brasil.
Fotos: Instituto Zuzu Angel
DISRUPTIVA POR NATUREZA BRASILIDADE
A visão empreendedora da designer fez nascer sua marca, Zuzu Saias, em tempos de questionamento de poder, de um mundo marcado por movimentos que abalaram as estruturas da sociedade conservadora de controle. Stuart, filho de Zuzu, teve voz importante no movimento estudantil brasileiro. Em 1961, após separar-se do marido, Zuzu encarou o mundo como mulher desquitada (rótulo preconceituoso da época) e criou seus filhos com seu trabalho. Abaixar a cabeça e conformar-se com as etiquetas não fazia parte da personalidade nem da mãe nem do filho. Zuzu era independente e, nadando contra a corrente, criava para as mulheres que assim como ela superaram as grades do portão de casa e ganharam espaço profissional.
Zuzu era uma estilista completa, sabia criar, modelar, costurar, desenvolver produtos, analisar o público-alvo e, ainda, planejar seus desfiles. Ela levantava a bandeira da cultura brasileira, criando roupas em algodão estampado, florais que lembravam nossas chitas, inserindo rendas feitas à mão e bordados artesanais. Do período vivido em Salvador ficou a maestria da valorização das cores. Flores, borboletas e pássaros representavam nossa riqueza traduzida em materiais
Foto: Acervo Itaú Cultural
Batizado de International Dateline Collection, o desfile foi dividido em: As Baianas; Lampião e Maria Bonita; e As Rendeiras. Na passarela, os americanos tiveram contato com a nossa cultura ao conhecerem as rendas do Nordeste, o cangaço valorizado em estampas coloridas e, ainda, o frescor do nosso algodão de qualidade. Da sua terra natal, as Minas Gerais, vieram pedras semipreciosas que adornaram bordados em vestidos.
O sucesso foi tamanho que Zuzu voltou aos Estados Unidos com a International Dateline Collection II, uma coleção completa do biquíni ao vestido de noiva.
como contas, rendas, bordados, conchas e até mesmo pedras semipreciosas. Nossos ares tropicais combinados às referências de tendência de moda internacional fizeram nascer coleções com caráter único.
O Brasil de Zuzu influenciava e sabia traduzir em seus desfiles o nosso maior tesouro: nossa riqueza cultural. Adotar o Brasil como inspiração temática para suas coleções foi inovar em um país onde a cópia buscava especialmente reproduzir a elegância francesa.
“Zuzu Angel é um nome que se está impondo no campo da moda carioca, com criações da alta-costura cheias de bossa e requinte, tanto no que se refere à criação como à execução. É justamente o que faltava por aqui, pois sempre as mulheres nesse ramo se limitavam a copiar os grandes costureiros internacionais, deixando os louros da profissão para os homens” (Jornal do Brasil, 7 de agosto de 1966, p. 42).
Em 1967, sua coleção Fashion & Freedom (Moda e Liberdade, em português) foi vista como uma expressão de independência, mas, para outros, uma crítica ao regime militar. Liberdade era algo inexistente naqueles tempos quando a ditadura perseguia pessoas e controlava todos os meios de comunicação de informações.
A carreira internacional teve início com o convite para desfilar na loja de departamentos Bergdorf Goodman, em Nova York, onde suas criações foram vendidas.
Suas coleções eram divididas em dois, às vezes três momentos, sendo um dedicado ao dia a dia e, outro, à noite ou ocasiões. Se o dia buscava praticidade, a noite brilhava com tecidos sofisticados.
SUA ARTE, SEU PROTESTO
O ano de 1971 guardava um triste evento para Zuzu e sua família. Stuart, seu filho mais velho, estudante de Economia e militante ativo contra o governo militar ditatorial imposto pelo Ato Constitucional n.º 5 – AI5, de 13 de dezembro de 1968, desapareceu. Naquele tempo, desaparecer era sinônimo de ser preso e torturado. No caso de Stuart Angel não foi diferente. Ele foi torturado até a morte com todos os requintes de crueldade que o regime oferecia. Desolada com o desaparecimento de seu filho, em vez de calar-se, Zuzu arregaçou as mangas e fez daquilo que tinha nas mãos a sua maior força de expressão. Sim, Zuzu Angel usou sua arte para comunicar ao mundo as atrocidades que aconteciam no Brasil com todos aqueles que se posicionavam de forma considerada ofensiva ao governo.
Para a historiadora e professora da UFJF Maria Claudia Bonadio, “quando lançou a coleção Date Line Collection III, em Nova York, a estilista já sabia do “desaparecimento” de seu filho e percebeu que podia usar o espaço do desfile e as peças produzidas como denúncia e, assim, juntar moda e política. Zuzu não ergueu cartaz contra a ditadura, nem precisou”.
Foi com a coleção International Dateline Collection III – Holiday and Resort, desfilada em setembro de 1971, que a moda tomou corpo de protesto. O desfile, como de costume, foi dividido em três momentos: Holiday, Resort e, por fim, aquele que pegou todos de surpresa: “Protesto”.
As criações intituladas Holiday apresentaram Holiday apresentaram os símbolos da marca que já conquistara os Estados os símbolos da marca que já conquistara os Estados roupas leves, práticas para dias de verão; en- Unidos e o Canadá. Unidos e o Canadá. quanto a Resort se aproximava da sofistica- se aproximava da sofistica- Zuzu Angel seguiu em frente questio-Zuzu Angel seguiu em frente questio ção com vestidos em organza ou seda em ção com vestidos em organza ou seda em nando o regime de governo instaurado no nando o regime de governo instaurado no modelagens esvoaçantes. Brasil e abraçou a defesa das mulheres in-Brasil e abraçou a defesa das mulheres in
Quando a terceira parte do desfile Quando a terceira parte do desfile dependentes que buscavam voz em nossa dependentes que buscavam voz em nossa iniciou, os bordados em sua maioria iniciou, os bordados em sua maioria sociedade machista. sociedade machista. feitos em tons claros pareciam saídos feitos em tons claros pareciam saídos A Nova Mulher de Zuzu Angel, “A A Nova Mulher de Zuzu Angel, “A de desenhos infantis e pontuavam ca-de desenhos infantis e pontuavam ca- década de 70 trouxe uma nova mulher, década de 70 trouxe uma nova mulher, nhões e soldados em contraste com nhões e soldados em contraste com aquela que sai profissionalmente, a mu-aquela que sai profissionalmente, a mu pombas da paz. Os vestidos em linho pombas da paz. Os vestidos em linho lher que tem uma nova dimensão da lher que tem uma nova dimens branco comunicavam a pureza e neles branco comunicavam a pureza e neles vida, a mulher que realmente acredita vida, a mulher que realmente acredita os bordados desalinhados contavam os bordados desalinhados contavam no que diz. Éno que diz. esta a mulher que eu quea vida e a dor do filho desaparecido a vida e a dor do filho desaparecido ro que vista a minha roupa” (in ro que vista a minha roupa” (in A Nova como um menino soltando uma pipa como um menino soltando uma pipa Mulher de Zuzu Angel – Jornal do Bra-Mulher de Zuzu Angel – Jornal do Bra preta, barquinhos que faziam alusão ao preta, barquinhos que faziam alusão ao sil, 22 de agosto de 1972.). sil, 22 de agosto de 1972.). clube de regatas Flamengo, onde Stuart clube de regatas Flamengo, onde Stuart O ano seguinte assistiria a um grande O ano seguinte assistiria a um grande tinha remado. Cada ponto e cada linha tinha remado. Cada ponto e cada linha reconhecimento, pois ao abrir sua loja no reconhecimento, pois ao abrir sua loja no tinham seu significado e mensagem. tinham seu significado e mensagem. Leblon, Zuzu decidiu desfilar primeiro no Leblon, Zuzu decidiu desfilar primeiro no Apoiado em seu nome, Angel, os an-Apoiado em seu nome, Angel, os an- Brasil como forma de valorização à mu-Brasil como forma de valorização à mu jos ensanguentados, em luto, e também jos ensanguentados, em luto, e também lher brasileira que, segundo ela, estaria à lher brasileira que, segundo ela, estaria à os engaiolados povoaram as estampas os engaiolados povoaram as estampas altura da americana. E, assim, em 1973, altura da americana. E, assim, em 1973, que emocionaram a plateia da casa do que emocionaram a plateia da casa do vieram as coleções vieram as coleções International DateliConsul do Brasil em Nova York, onde o Consul do Brasil em Nova York, onde o ne Collection V e VI. ne Collection V e VI desfile ocorreu. O preto ocupou o espaço desfile ocorreu. O preto ocupou o espaço Nos anos de 1974 e 1975, vieram as Nos anos de 1974 e 1975, vieram as em forma de andorinhas, braçadeiras de em forma de andorinhas, braçadeiras de coleções coleções International Collection VII – luto, e o sol ficou quadrado. Contemporary Classic e a Brazilian Butter-
A dor de uma mãe que pedia notícias fly, respectivamente. As estampas recebedo paradeiro de seu filho fechou o desfile ram flores, borboletas e os anjos, símbolos quando Zuzu entrou na passarela vestida de da marca. luto, com vestido e xale pretos, no pescoço Once Zuzu, Always Zuzu (Uma vez um pingente de anjo e uma corrente carre- Zuzu, Sempre Zuzu, em português) foi a gada de crucifixos na cintura. A partir daí, coleção internacional lançada no início o luto faria parte da imagem pessoal da de- de 1976. A marca Zuzu Angel tinha o signer que militou por seu filho até a morte. chamado DNA de moda, elementos e sig-
A imprensa internacional compreen- nos que servem de referência para criadeu a mensagem enquanto a brasileira ig- ção e reconhecimento da marca. norou ou talvez tenha sido censurada. “A Com o passar dos anos, Zuzu soube percepção de que as roupas e os desfiles de moda po- que seu filho tinha sido assassinado sob tortura e, dem ser utilizados não apenas para exibir produtos, agora, ela clamava pelo corpo para poder dar-lhe um mas também ideias de contestação, foi a principal sepultamento digno. Zuzu incomodava, tanto que contribuição de Zuzu Angel. Ao fazer do desfile um passou a ser perseguida pelo regime e, assim, no dia ato político, muito antes que os protestos se tornas- 5 de abril de 1976, ao voltar para casa sozinha ao sem frequentes nas passarelas e de forma mais suave volante, teve seu carro empurrado da Estrada do Joá do que as camisetas com frase, usando a delicadeza abaixo. do bordado na denúncia, trouxe nova força para a Zuleika Angel se foi, mas Zuzu Angel vive até moda”, conclui Bonadio. hoje na imagem forte de sua moda apoiada em nos-
A International Dateline Collection IV – The Hel- sas raízes brasileiras sem medo de denunciar. Zuzu pless Angel foi lançada em Nova York em 1972, com Angel, presente!