PROGRAMAÇÃO ASSOCIAÇÃO “OS FILHOS DE LUMIÈRE” AUDITÓRIO Organização e Produção Cristina Grande Pedro Rocha Ana Conde Coordenação Técnica e Som Nuno Aragão Luz Rui Barbosa Cinema/Vídeo Carla Pinto
PRÓXIMA SESSÃO
07 FEV 2010 (Dom) / 16h00 L’APPARTEMENT DE LA RUE DE VAUGIRARD / Christian Boltanski / m/12 O ANJO EXTERMINADOR / Luis Buñuel / m/12
Momento XVII
CICLO O SABOR DO CINEMA 31 JAN - 28 FEV 2010 Auditório
31 JAN (Dom), 16h00 LEARN BABY LEARN, Carina Rafael A RAIZ DO CORAÇÃO, Paulo Rocha
Informações: 808 200 543 Reserva Bilhetes: 226 156 584 Geral: 226 156 584 Rua D. João de Castro, 210 4150-417 Porto. Portugal www.serralves.pt | serralves@serralves.pt
m/12 APOIO INSTITUCIONAL
COM APOIO
LEARN BABY LEARN Realização, Fotografia e Montagem: Carina Rafael Intérpretes: Volpina e Targus PORTUGAL 2007 A curta-metragem de Carina Rafael - da qual tivemos conhecimento graças às actividades de animação em meio hospitalar que a sua autora também exerce - convida-nos a entabular conhecimento com Targus e Volpina. Verdadeiras encarnações do que seria um «vanitas», as duas irmãs e amantes, simultaneamente exuberantes e melancólicas, não dissimulam as dificuldades que vivem no embate quotidiano com um mundo que «precisa de salvação». O pequeno milagre que a curta-metragem LEARN BABY LEARN permite reside no facto de que - não obstante a distância que possamos sentir frente à estética de vida das protagonistas - volvido o visionamento das imagens, apetece dizer, em inglês como elas e glosando o herói de BLADE RUNNER: «And then again who doesn’t?». Entrecortadas a negro, as sucessivas situações de confronto com a câmara de Carina Rafael, em deambulação pelo antro do casal, constituem outros tantos límpidos apelos a que nos socorramos mutuamente, graças à afirmação de uma frágil condição comum. Esses apelos travestem-se de máscaras, entre as quais a aparência corporal e seus adereços, as músicas e a cenografia doméstica, as incontáveis imagens e outras tantas memórias retrospectivas e projectivas que lhe correspondem. Por fim, a própria língua de comunicação, o Inglês, esfarrapado mas mais apto do que o idioma materno a exprimir o desejo de exprimir. O que pode acontecer entre o espectador e as irmãs Targus e Volpina, perigosamente livres no dizer da primeira, é o reconhecimento de um corpo transpessoal, martirizado pela procura frequentemente pouco frutífera de uma voz própria e daquele bocadinho de amor que é ração mínima dos humanos enquanto permanecem humanos. E se isso pode acontecer é porque, perante a explosão do vocabulário plástico e dramático de Targus e Volpina, Carina Rafael soube, sagazmente, reduzir ao estrito mínimo os dispositivos de mediação, deixando-nos, por assim dizer, entre as mãos das suas protagonistas.
A RAIZ DO CORAÇÃO Realização: Paulo Rocha Argumento: Jeanne Waltz, Regina Guimarães, Paulo Rocha Fotografia: Elso Roque Som: Nuno Carvalho Música: José Mário Branco Montagem: Edgar Feldman Assistentes de realização: Paulo Guilherme, Ângela Sequeira, Amarante Abramovici Cenografia: Manuela Bronze Maquilhagem: Sano de Perpessac Produção: João Pedro Bénard Interpretação: Luís Miguel Cintra, Joana Bárcia, Isabel Ruth, Melvil Poupaud, Miguel Guilherme, António Durães, Filipe Cochofel, Bruno Schiappa, Fernando Heitor, José Manuel Rosado, Fernando Santos, Pedro Miguel Silva, Jenni La Rue, Paulo Julião, João Carlos Marques, Teresa Roby, José Manuel Mendes, Manuel Mozos, Baptista-Bastos, etc. PORTUGAL 2002
A RAIZ DO CORAÇÃO, comédia quase musical, com um travo quase milenarista, é um filme que tem como personagem central uma certa ideia de Lisboa, capital de um país ausente e, no fundo, divorciada desse país que nem espectralmente é convocado. Lisboa filmada como uma república italiana, pequeno reduto de deboche quase descarado e de rigorismo quase triunfante. Lisboa varrida pelos ventos do nacionalismo, e por outras nostalgias, menos perigosas mas igualmente significativas, todas elas profundamente dúbias, a mais aparatosa das quais é encarnada pelo bando de travestis, as Noivas ditas de Santo António, numa óbvia alusão ao evento salazarista e populista inventado por Leitão de Barros, que as autarquias democráticas não se coibiram de reciclar. A RAIZ DO CORAÇÃO assume-se como um filme visionário. Repousa num dispositivo do tipo «aconteceu amanhã» para colocar o espectador perante um fogo de artifício de imagens de dor e glamour, que partem e regressam à personagem de Catão, cuja construção resulta da observação de um conhecido político português e da sua carreira em território lisboeta. Assim como O DESEJADO OU AS MONTANHAS DA LUA, um filme mal amado e pouco visto de Paulo Rocha, é provavelmente uma das mais belas metáforas pós-Abril sobre a orfandade intrínseca da portugalidade - e correlativa busca desvairada de pais e países de substituição -, A RAIZ DO CORAÇÃO apresenta-se como uma alegoria intensamente subjectiva acerca do elo entre o desejo e o terror. Livro de amores e medos made in Portugal, Fellini na lombada e Renoir em rodapé, o filme tem sido por alguns considerado um «passo em falso» na carreira do mestre Paulo Rocha. Impossível será contudo ser insensível ao gosto pelo risco que marca a postura do cineasta, apostado em estender-nos os seus espelhos deformantes sem ceder, como Almodóvar, à tentação de fabricar uma moral ad hoc e respectivos figurinos alternativos. Aquilo que as águas turvas da RAIZ DO CORAÇÃO reflectem - porque não tentam ocultá-lo - é a imensa capacidade que Paulo Rocha tem e mantém de se aventurar por terreno inseguro. E, como diria José Mário Branco, autor da música deste filme, «essa coisa é que é linda».