PROGRAMAÇÃO ASSOCIAÇÃO “OS FILHOS DE LUMIÈRE” AUDITÓRIO Organização e Produção Cristina Grande Pedro Rocha Ana Conde Coordenação Técnica e Som Nuno Aragão Luz Rui Barbosa Cinema/Vídeo Carla Pinto
Momento XVIII
CICLO O SABOR DO CINEMA 10 OUT - 07 NOV 2010 Auditório
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10 OUT 2010 (DOM), 16H00 4 AVENTURAS DE REINETTE E MIRABELLE Eric Rohmer
©Günther Dippe
4 AVENTURAS DE REINETTE E MIRABELLE
Título original: 4 Aventures de Reinette et Mirabelle Título em português: 4 Aventuras de Reinette e Mirabelle Realização: Eric Rohmer Argumento: Eric Rohmer, a partir de uma ideia de Joëlle Miquel Fotografia: Sophie Maintigneux Som: Pascal Ribier, Pierre Camus Montagem: Maria Luísa Garcia Música: Ronan Girre, Jean-Louis Valéro Produção: Marguerite Ménégoz Interpretação: Joëlle Miquel, Jessica Forde, Haydée Caillot, Béatrice Romande, Gérard Courant, David Rocksavage, Yasmina Aury, Marie Rivière, Jacques Auffray, Fabrice Luchini, Françoise Valier, Marie Bouteloup FRANÇA, 1987 Estamos na década de oitenta do século XX, em pleno triunfo da ética dos ganhadores, do money is beautiful, num maravilhoso mundo novo povoado de yuppies engravatados e de glamourosas top models. O cinema, claro está, não é de modo nenhum indiferente ao vento das modas e das mentalidades. É neste contexto que Eric Rohmer, enquanto espera por densidades luminosas e atmosféricas satisfatórias com vista ao acabamento do seu RAIO VERDE, filma, em 16mm e a todo o vapor, este inesperado 4 AVENTURAS DE REINETTE E MIRABELLE, totalmente a contra-corrente dos novos padrões das artes e das vidas. Diga-se de passagem que o conservado-
rismo muito peculiar e provocatório de Rohmer o levará, nessa mesma altura, desafiando todos quantos, perante a proliferação do vídeo clube e a força massificadora das televisões todaspoderosas, proclamavam a morte iminente do cinema, a decidir estrear o dito RAIO VERDE (Leão de Ouro no Festival de Veneza) simultaneamente nas salas e no pequeno ecrã... Sem se desinteressar pelos subtis dilemas morais que afectam os humanos ao sabor das suas vidas cruzadas, Rohmer parece apostado numa observação ainda mais aproximada dos desconcertos, desfasamentos e deslizes, numa postura que privilegia a transformação do banal e do irrisório no sublime. Mas, principalmente, em lugar de perorações tagarelas, por vezes vizinhas do tom do vaudeville e do teatro de boulevard, o cineasta focaliza-se agora em tropismos e pequenas excentricidades inscritas no quotidiano
que parecem tanto mais inquietantes quanto são protagonizados por duas muito jovens protagonistas, ambas portadoras de nomes de frutos: a ácida e perfumada maçã reineta e a dulcíssima pequena ameixa, micro sol em vias de extinção. Ora, sem retirar a menor frescura às suas personagens, dotando-as de igual grau desenvoltura e de inépcia, Rohmer faz-nos sentir que a tenra idade das duas raparigas não as torna mais adaptadas aos cânones absurdos da vida contemporânea. Muito pelo contrário... Mais fiel do que os seus companheiros de geração a certos princípios da Nova Vaga – como sejam as filmagens em cenários naturais e correlativa busca da luz que ilumina o espírito dos lugares, ou a rejeição de stars e starlettes, bem como dos corpos formatados que elas habitam – a sagacidade de Rohmer exprime-se aqui pela via de uma superlativa simplicidade e comicidade. Uma mão cheia de figuras algo excêntricas
mas ainda assim tipicamente parisienses – tais como o empregado de café, o pedinte, a cleptómana e o marchand de arte – atravessam as quatro aventuras, indiciando o desejo de convocar tipos raramente presentes no ecrã e de abraçar um olhar sobre o mundo de inspiração popular, pese embora o requinte aristocrático que tempera sempre o estilo do realizador. Estamos muito longe da formatação televisiva e do pronto-avestir psicológico que ela propaga. Respirar l’air du temps é sentir-se como peixe fora de água, eis o que nos parece dizer este pequeno grande filme de sketches (outra opção fora de moda, repare-se...), em que cada episódio acrescenta pinceladas decisivas ao quadro anterior. A despeito de algumas incursões importantes em épocas outras – de PERCEVAL aos AMORES DE ASTREIA E CELADON, passando pela MARQUESA D’O, pela INGLESA E O DUQUE ou pelo TRIPLO AGENTE –, a assumida ancoragem no presente deste recentemente desaparecido cineasta revela-nos que ele foi construindo a sua obra sem se preocupar demasiado com a posteridade. Arabescos de borboleta, os filmes de Rohmer, acentuadamente debruçados sobre o efémero, emanam por isso um indiscutível encanto. pois embora o «nosso desejo» careça de «música sábia» nada impede quem se empenha em afirmar, como música primeira e fundadora, a respiração produzida pelos próprios corpos de «perder a vida» por excesso de «delicadeza».