PROGRAMAÇÃO ASSOCIAÇÃO “OS FILHOS DE LUMIÈRE” AUDITÓRIO Organização e Produção Cristina Grande Pedro Rocha Ana Conde Coordenação Técnica e Som Nuno Aragão
próxima sessão
28 OUT 2012 URSS Le train en marche, Chris Marker, 32’, 1971 A felicidade, Alexandre Medvedkine, 70’, 1934
Momento XXII
Ciclo O Sabor do Cinema 21 OUT-02 DEZ 2012
Luz Rui Barbosa
Auditório
Cinema/Vídeo Carla Pinto
21 OUT 2012 (Dom), 16h00 Apoio Institucional
Apoio
Fundação de Serralves / Rua D. João de Castro, 210 / 4150-417 Porto / www.serralves.pt / www.facebook.com/fundacaoserralves Informações: 808 200 543 / Reserva Bilhetes: 226 156 584 / Geral: 226 156 584
PORTUGAL O Encoberto, Fernando Lopes, 11’, 1975 Gestos e fragmentos, Alberto Seixas Santos, 87’, 1982
Godard, ao género policial… Citando ainda João Bénard da Costa, a não presença de imagens em movimento da revolução – numa espécie de elevação da discussão à figura de substituição da imagem ausente – é porventura a faceta mais dura deste filme demasiado pouco complacente para apaziguar as consciências.
Fernando Lopes opta por nos dar a ver a sua laboriosa instalação, confiada a trabalhadores manuais, ou seja, sujeitos cuja missão é parente da «manufatura» e da «mão na massa» que o escultor assume como sendo definidora do seu ofício. Esse processo acaba com o embrulhar da estátua que é envolvida em panos protetores, cumprindo-se assim, densamente, o «encobrimento» do príncipe trágico, símbolo da nação mergulhada nas brumas do obscurantismo.
Coleção Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema
Coleção Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema
O ENCOBERTO Realização e Montagem: Fernando Lopes Fotografia: Manuel Costa e Silva Poema: Fernando Pessoa (lido por João Cutileiro) Produção: Maria Helena Vasconcelos PORTUGAL 1975 Para melhor discernirmos os cruzamentos de sentidos que este filme – estreado em 1975, mas rodado antes do 25 de Abril – nos propõe, é porventura indispensável reenquadrar o objeto – observação pelo olho da câmara e pelo olhar de transeuntes e mirones da montagem da estátua de D. Sebastião na praça Gil Eanes em Lagos – no contexto histórico-cultural em que tem lugar. A verdade é que a dita peça escultórica, da autoria de João Cutileiro, provocou, na época – o fim da ditadura estava, por assim dizer, à vista –, uma acesa polémica, tendo o então jovem escultor, recém-regressado a Portugal e instalado no Algarve, recebido críticas ferozes e rasgados elogios. Descrente dos valores académicos subjacentes aos comentários dos seus detratores, João Cutileiro reagiu com ironia combativa, assumindo-se como membro da classe burguesa intelectual, reivindicando a plena consciência de corresponder ao padrão de gosto dessa mesma classe, e desvalorizando o facto «natural» de outros grupos sociais rejeitarem, por incompreensão, as suas peças. Terá então afirmado, por provocação, que abandonara a criação de objectos artísticos para se transformar num “um fazedor de objectos decorativos destinados à burguesia intelectual do ocidente” – num fabricante/artesão, em suma. Há que sublinhar que a peça de Cutileiro se tornou, entretanto, um emblema da cidade de Lagos e o seu autor um escultor de sucesso no mercado da arte… Claro que a não aceitação desta obra de arte pública do escultor se prendia com outros factores e motivos que não apenas um desacerto de padrões de aferição, entre os quais uma delicada utilização dos mármores e não do nobre bronze e, principalmente, uma leitura da figura de D. Sebastião – frágil, efeminado, um tanto extra-terrestre – que ia contra a maneira tradicional de representar heróis e contra um «desejável» endeusamento do ícone do salvador da pátria. Para nos falar da inscrição de D. Sebastião na praça pública – revisto e corrigido pela mão de Cutileiro que dele faz uma espécie de parente do Principezinho de Saint-Exupéry (pelo menos do ponto de vista visual…) –,
GESTOS E FRAGMENTOS, ENSAIO SOBRE OS MILITARES E O PODER Realização e Argumento: Alberto Seixas Santos Produção: Grupo Zero Fotografia: Acácio de Almeida Montagem: Manuela Viegas Som: Maria Paola Porru Sonoplastia: Louis Hocher Música: Ludwig Van Beethoven Direcção de Produção: Octávio Espírito Santo Produção Executiva: Maria Paola Porru, Ferenc Karros Financiamento: Fundação Calouste Gulbenkian Com: Otelo Saraiva de Carvalho, Eduardo Lourenço, Robert Kramer PORTUGAL 1982 Relativamente a Gestos e Fragmentos diz Alberto Seixas Santos: «O Gestos é completamente pensado, plano a plano, ângulo a ângulo, com um rigor absolutamente milimétrico. Por exemplo, as entrevistas na própria casa de Otelo de Saraiva de Carvalho têm umas barras escuras nas paredes como se fossem grades, falso reflexo de janelas de marquise de alumínio, e a casa dele não tinha nada disso. Era uma teia de fita adesiva com projectores por detrás que faziam uma espécie de grelha, davam a sugestão de prisão, de grades de cadeia projetadas na parede. Estava tudo pensado desde o início. Os décors foram escolhidos milimetricamente» (…) «Tanto Brandos Costumes como Gestos e Fragmentos são ensaios. Eu tenho uma cabeça de ensaísta. Acho que isso vem de duas fontes. Uma é o cinema de Godard, evidentemente. O cinema de Godard tem um período que ele próprio chamava, se não me engano, de cinema do
quadro preto. Um cinema-ensaio. E isso fascinava-me bastante. Por outro lado, há a influência de textos teóricos e de peças de Brecht, que tiveram para mim uma grande importância». Ante-estreado na Cinemateca Portuguesa a 28 de Abril de 1984, GESTOS E FRAGMENTOS nunca teve exibição comercial, facto que não decorre apenas do carácter ensaístico, logo «irregular», deste trabalho de Alberto Seixas Santos. Trata-se, segundo João Bénard da Costa, do filme que «fecha Abril» pois que a revolução «esteve ainda presente em quase todos os filmes de ficção dos anos capitais de 76 a 82». Ora, o gesto de luto pela ocasião perdida não se traveste propriamente de melancolia, antes se configura como uma necessidade imperativa de compreender, uma sede de análise com todas as garras de fora, num tempo em que todos os quadrantes conservadores da sociedade portuguesa conspiravam no sentido de lançar um véu de esquecimento sobre Abril, frequentemente à custa de reescritas de um passado próximo que escaldava as mãos. O filme configura-se como uma orquestração de três narrativas: a do herói de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho, no seu próprio papel e no interior da sua própria casa, entre o mito e o seu esvaziamento, que discorre sobre a destruição da unidade no movimento das forças armadas e sobre a perda de controlo do processo revolucionário por parte da esquerda; a do filósofo Eduardo Lourenço, em pessoa, que lê, com desenvoltura professoral, trechos do seu «Ensaio sobre os Militares e o Poder» num cenário exterior verdejante; a do cineasta Robert Kramer, que encarna a personagem, ficcional, de um jornalista norte-americano envolvido numa tentativa de elucidação do complot urdido pelas fações conservadoras em estreita aliança com representantes do seu país, o qual resulta no contra-golpe do 25 de Novembro. Note-se que Kramer, realizador de CENAS DA LUTA DE CLASSES EM PORTUGAL, foi ele próprio observador participante do processo revolucionário português. Retomando a lição de Godard a figura de jornalista no filme opera em si mesma a junção entre a parte da realidade e a parte da ficção, já que, no seu godardiano apartamento com vista para placard de afixação repleto de «fragmentos», Kramer é simultaneamente muito ele próprio com as suas inquietações e um duplo jornalista que dele se distancia, sendo de realçar as numerosas referências, ainda via
Eduardo Lourenço