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PROGRAMAÇÃO ASSOCIAÇÃO “OS FILHOS DE LUMIÈRE” AUDITÓRIO Organização e Produção Cristina Grande Pedro Rocha Ana Conde Coordenação Técnica e Som Nuno Aragão

PRÓXIMA SESSÃO

25 NOV 2012 FRANÇA L’Ambassade, Chris Marker, 20’, 1973 Tout Va Bien, Jean-Luc Godard e Jean-Pierre Gorin, 95’, 1972

Momento XXII

CICLO O SABOR DO CINEMA 21 OUT-02 DEZ 2012

Luz Rui Barbosa

Auditório

Cinema/Vídeo Carla Pinto

18 NOV 2012 (Dom), 16h00 Apoio Institucional

Apoio

USA The Eternal Frame, Ant Farm e T.R. Uthco, 23’50’’, 1975 Ice, Robert Kramer, 130’, 1970 Os filmes em língua estrangeira são legendados em português.

Fundação de Serralves / Rua D. João de Castro, 210 / 4150-417 Porto / www.serralves.pt / www.facebook.com/fundacaoserralves Informações: 808 200 543 / Reserva Bilhetes: 226 156 584 / Geral: 226 156 584


THE ETERNAL FRAME Realização: T.R. Uthco and Ant Farm: Doug Hall, Chip Lord, Doug Michels, Jody Procter Produção Vídeo: Skip Blumberg, Bart Friedman, Alan Shulman, Pepper Molser, Bill Harlan, Jim Newman, T.L. Morey, Optic Nerve Montagem: Editors: Doug Hall, Chip Lord, Doug Michels, Jody Proctor Com: Ant Farm, T.R. Uthco, Stanley Marsh III ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 1975 Coleção da Fundação de Serralves - Museu de Arte Contemporânea O grupo ANT FARM foi um coletivo californiano de designers que, nos idos de 70, se notabilizou por ações que será pertinente inscrever no quadro mais geral dos movimentos de contra-cultura. Fundado em 1968 pelos arquitetos Chip Lord e Doug Michels, a quem mais tarde se virá juntar Curtis Schreier, a ANT FARM inventou estruturas insufláveis e casas biomórficas inovadoras, tendo por outro lado participado em eventos psicadélicos e happenings. A sua abordagem do vídeo teve como objetivo criticar as visões do mundo, estreitas e dominantes, difundidas pela televisão. THE ETERNAL FRAME é uma espécie de clássico do vídeo experimental. Amiúde etiquetado de «mockumentary», utiliza o «estilo» da mise en scène documental e cenas de «bastidores» para reforçar o efeito de comicidade. Trata-se de questionar as distorções operadas pelas representações mediáticas, nomeadamente a manipulação que decorre das misturas entre realidade e ficção. THE ETERNAL FRAME resulta da colaboração entre ANT FARM e um outro coletivo, T. R. UTHCO. Situa-se algures entre a performance, o novo teatro de rua e a agit-prop. O vídeo gira em torno de uma reconstituição do assassínio do presidente estadunidense JFK, no ano de 1975, 12 escassos anos após esse acontecimento. Explorando irreverentemente o trauma ainda palpável, os autores repetem obsessivamente as imagens da reconstituição. Os mirones e turistas filmados no local da reencenação mostram-se pasmados com a fidelidade da reconstituição, horrorizados com o mau gosto, mas sobretudo divertidos. Perante essa reação, o actor-presidente (que encarna JFK) interroga-se sobre os motivos que os espectadores podem ter para se sentirem divertidos – estamos no cerne da questão da formatação da psique e da memória coletiva, ambas fortemente marcadas pelas construções de verdade que os media divulgam e massificam.

João Fernandes fala-nos desta obra da coleção de Serralves: The Eternal Frame (1975) Ant Farm/T.R. Uthko Este vídeo é uma das obras fílmicas exemplares do modo como muitos artistas, nas décadas de 60 e de 70, protagonizaram nos seus trabalhos uma análise crítica radical do mundo seu contemporâneo, aproveitando os espaços de apresentação e de circulação da obra de arte (museus, centros de arte, associações comunitárias, etc.) enquanto espaços de contestação alternativos à dominância de uma cultura que encontrava no cinema comercial e na televisão alguns dos utensílios essenciais do seu totalitarismo ideológico e manipulador. O próprio modo de fazer e de produzir este trabalho é resultado de um processo associativo, distante de uma visão individualista do processo criativo: dois coletivos de artistas da Costa Oeste dos Estados Unidos juntam-se para interrogarem as imagens e os discursos produzidos a partir de um dos acontecimentos mais traumáticos da história recente norte-americana: o assassinato do Presidente J.F. Kennedy e a sua documentação através do célebre filme amador Super 8 feito então por Abraham Zapruder, uma das testemunhas involuntárias desse acontecimento. Trabalhos como este foram capítulos importantes de dissidência artística e ideológica numa sociedade então cada vez mais condicionada pelo que Noam Chomsky denominou como a “fabricação do consenso”, opondo deste modo a intervenção artística ao consumo acrítico da informação promovido pelos órgãos de comunicação social dominantes. ICE Realização: Robert Kramer Fotografia: Robert Machover Produção: David C. Stone Com: Robert Kramer, Leo Braudy, Tom Griffin, Paul Mclsaac ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 1970

Saudado por Jonas Mekas como sendo «o mais original e significativo filme narrativo americano do final dos anos sessenta», ICE de Robert Kramer (1939-1999) – não deixa de lembrar a utilização do P&B e a poética dos espaços arquitetónicos de ALPHAVILLE de Godard bem como o terno pincel de John Cassavetes. Mas, antes de qualquer outra emoção ou associação de carácter cinéfilo, ICE cria no espectador a estranha impressão de uma aventura de cinéma-vérité rodada num planeta muito

distante no tempo e muito próximo no espaço, pois se, por um lado, reconhecemos a trama cenográfica nova-iorquina, utilizada com um dramatismo muito negro, por outro, as preocupações, os discursos, os gestos e os projetos dos grupos anarco-hippies protagonistas do filme parecem a anos-luz dos modos atuais de envolvimento na política dos jovens ocidentais. Melhor dizendo: ainda que ICE seja porventura um retrato único, no género épico, do pensamento e comportamento da extrema-esquerda defensora da ação armada, da guerrilha urbana, do terrorismo revolucionário contra o terrorismo de estado em idos de 60/70 e, a esse título, possa funcionar como «filme de culto», algo faz com que a convicção eivada de paranóia dos heróis do filme, claramente inscrita num contexto anterior à queda do muro de Berlim, se nos afigure muito diferente da paleta de posturas altermundialistas, soft ou hard, em voga. E isto quanto mais não seja porque a escolha entre «ser uma parte da solução» ou «ser uma parte do problema», assim formulada numa conjuntura de capitalismo imperialista, jamais se colocaria com a mesma brutalidade nos «nossos» contextos de esquerda radical, corroídos pelo bichinho da dúvida. Não quer isto dizer que ICE não acolha em si próprio a declinação do argumentário anti-ação armada – de resto, no início do último terço do filme abre-se um parêntese em que, sobre imagens fixas, várias vozes off enunciam objeções e reservas, matizando o discurso psico-rígido dos ativistas da suposta «ofensiva de primavera», exprimindo cinismos, deceções, cansaços. Porém, o fôlego geral do filme – que hoje pode, de facto, passar por ser apenas um objeto retro-futurista, inspirado em achados do film noir e do filme de espionagem – e a sua construção interna – de um engate de bar à captura de Ted abatido a tiro, prenúncio de um rosário de perdas, até ao telefonema final, em que um dos líderes anuncia a continuação da luta, tida como vitoriosa, apesar dessas mesmas perdas – apontam obviamente para objetivos que ficam bem além (ou aquém…) da parábola, da paródia ou do filme de género. As vivências e as sobrevivências em contextos subterrâneos são temas caros ao autor. O baralhar das fronteiras entre a ficção e o documentário é uma faceta relevante da sua pesquisa fílmica (veja-se a personagem de Doc em ROUTE ONE/USA e, neste ICE, a função que a prática do cinema desempenha no conjunto da estratégia revolucionária). A formação de comunidades desviantes relativamente ao devir que as classes dominantes desenham e impõem é um motivo que atravessa toda a obra de Kramer (o comovente MILESTONES, de 1975, retoma, pouco tempo depois de ICE, esse fio da meada). Recorde-se que o cineasta por duas vezes aceitou papéis importantes como ator em dois filmes rodados por outros realizadores – ambos datados de 1982 e rodados em Portugal, onde Kramer fizera as suas CENAS DA LUTA DE CLASSES – a saber: GESTOS E FRAGMENTOS de Alberto Seixas Santos e O ESTADO DAS COISAS de Wim Wenders. Resta averiguar se aqui e agora somos capazes de tirar o melhor proveito desta sua longa-metragem marciana e violentamente fraterna.

PRIMEIRA DECLARAÇÃO DO NEWSREEL, COLETIVO DE CINEASTAS A QUE ROBERT KRAMER PERTENCEU DEZEMBRO DE 1967 Consideramos que a cobertura existente da atualidade pela televisão não responde às nossas necessidades. O ponto de vista dos serviços de informação do establishment limita a sua capacidade de tratar eficazmente o que eles definem como «informações» e também impede uma redefinição constante do que é importante e pertinente naquilo que constitui a «informação». 1° Estamos empenhados num processo de libertação em relação às ideias preconceituosas da sociedade americana e envolvidos numa luta que visa mudar os seus sistemas de organização e de controlo; 2° A nossa solidariedade estende-se aos que tornam tangíveis esta libertação e esta mudança na América e noutros países, e temos a intenção de fazer filmes sobre estas pessoas e o seu trabalho; 3° A nossa conceção da informação é definida pela nossa experiência da sociedade americana, uma experiência próxima das pessoas que trabalham em prol dessa mudança. SOMOS CINEASTAS QUE TENTAM – ATRAVÉS DA FORMAÇÃO DE UMA ORGANIZAÇÃO CAPAZ DE FAZER E DISTRIBUIR RAPIDAMENTE VÁRIOS TIPOS DE FILMES – PÔR EM CONTACTO, NÓS MESMOS E O NOSSO TRABALHO, COM OUTRAS PESSOAS, AQUI E NO ESTRANGEIRO, EMPENHADAS COMO NÓS NA LUTA PELA MUDANÇA.


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