CINEMA
Momento XXIV
CICLO O SABOR DO CINEMA 03 NOV – 08 DEZ 2013 Auditório
08 DEZ 2013 (Dom), 16h00
GREED (Aves de Rapina), Eric von Stroheim, 140’, 1924, EUA
Título original: GREED Título em português: GANÂNCIA Realização: Erich von Stroheim Argumento: Erich von Stroheim, June Mathis, a partir de um romance de Frank Norris Fotografia: William H. Daniels e Ben F. Reynolds Operador de imagem: Paul Ivano Montagem: J. W. Farnham (e outros, nomeadamente Grant Whytock) Produção Irving Thalberg, Louis B. Mayer Interpretação: Gibson Gowland, Zasu Pitts, Jean Hersholt, Dale Fuller, Tempe Pigott, Jack Curtis, Silvia Ashton, Chester Conklin, Joan Standing ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA 1924 Derradeira experiência vanguardista a tomar como fonte o naturalismo puro e duro (uma poética da tara, do vício, da hereditariedade, da fatalidade social) cruzando-se com os poderosos meios da estética expressionista (sucessivos confrontos entre a luz e as trevas e jogo de ambivalências que impede qualquer leitura mecânica dessa guerra aberta) e com a preocupação de apurar/depurar o vocabulário simbólico quando aplicado a um contexto socio-emocional (multiplicação dos planos de carácter metafórico), GREED apresenta-se-nos como um western sem índios onde, à falta das vítimas e dos bodes expiatórios do costume, os brancos são desvairados, doentes, desumanos. Inteiramente rodado em cenários naturais (embora o tratamento da luz amiúde neles introduza
uma densa e crua irrealidade), esta é a primeira vez que o cineasta Stroheim aborda, com satânica grandiloquência, um assunto americano (coisa que, aliás, lhe valeu uma péssima receção por parte da crítica e da opinião pública). E no entanto a produção reduziu drasticamente a duração do filme, de quarenta e duas bobinas (mais de sete horas) para dezoito bobinas, suprimindo, com o acordo do autor, as cenas mais hard, e depois para duas horas e vinte, desta feita sem o acordo de Stroheim. O filme não será mais bem acolhido em terras germânicas (pátria do cineasta). Após a estreia no UFA-Palast, templo do cinema berlinense, a 14 de Maio de 1926, o filme foi retirado do cartaz. Fiel à sua aura lendária de cineasta maldito, Erich Von Stroheim recusou-se, ao que parece, a visionar a versão mutilada da sua obra-prima. Filmar o McTeague (durante nove meses!!!) significou para o mestre do mudo rodar na rua e em casas particulares (grande parte da acção de GREED é citadina) uma versão quase exaustiva do romance naturalista de Frank Norris (escrito sob a influência de Zola). A distribuição privilegiou não as stars mas um leque de actores de segundo plano, bem como profissionais do burlesco capazes de assumir riscos e de corresponder às convicções de Stroheim em matéria de interpretação. A isto convém acrescentar que o realizador introduziu uma dose suplementar de subjetividade em GREED, ao partir das suas vivências pessoais de cidadão austro-húngaro para a construção da família marcadamente germânica da estranhíssima Trina. O filme descreve-nos o trajeto de um brutamontes entre duas experiências do inferno: a árdua labuta numa mina de ouro (sequência inaugural) e a caminhada para a morte no deserto articulada com o transporte do vil metal (sequência final). Entre a descida às profundezas e a infinita planura. Ora, essa trajetória corresponde a uma espécie de longo purgatório, que se desenrola sob o signo da catástrofe iminente, pois todos os protagonistas, ora sucessiva ora simultaneamente, vivem situações roçando o insustentável – motivo pelo qual no fim GREED nos deixa com a impressão de termos estado mais de duas horas em alta tensão. Excetuam-se (ou não) os raros momentos de ternura e/ou candura em curtos trechos da vida do casal Trina-Mac.
Não é impossível ler este filme como uma excêntrica adenda ao INTOLERÂNCIA de David Wark Griffith (em cuja rodagem Stroheim participou como assistente). Ou como uma alegoria acerca da construção do novo mundo, com os néscios Mac e Trina nos papéis de modernos Adão e Eva, rodeados de um Éden urbano-selvático, repleto de tentações, povoado de monstros, com o deus Sol a ter a última palavra na ficção. Se virmos em GREED um fresco sobre a «terra das oportunidades», governada pelo Rei Ouro, não podemos deixar de deplorar a falta de peças ao
ambicioso puzzle. Porque, a despeito de uma forte tipificação dos sentimentos, o génio de Stroheim consiste em não rechear o filme de inúteis gorduras, sendo toda a sua matéria icónica e dramática blindada de justificações. A seus e a nossos olhos. Falsamente épico (não se trata sequer de uma anti-epopeia, já que Mac vai de dead end em dead end) mas veramente trágico (em nenhum passo as personagens têm escolha, num universo em que o destino é substituído pelo instinto), GREED desmente radicalmente a ideia de que o cinema mudo não fala connosco.
PROGRAMAÇÃO ASSOCIAÇÃO “OS FILHOS DE LUMIÈRE” AUDITÓRIO Organização e Produção: Cristina Grande, Pedro Rocha, Ana Conde Coordenação Técnica e Som: Nuno Aragão Luz: Rui Barbosa Cinema/Vídeo: Carla Pinto
Apoio Institucional
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Fundação de Serralves / Rua D. João de Castro, 210 . 4150-417 Porto / www.serralves.pt / serralves@serralves.pt / Informações: 808 200 543 PARQUE Entrada pelo Largo D. João III (junto da Escola Francesa)