Dicionário cinema porto

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DICIONÁRIO/CENTENÁRIO DO CINEMA (À MODA DO PORTO) ABI — Não é o nome dum pássaro exótico, embora seja uma ave rara. Não sofre de provincianismo agudo. Cineasta de animação, fundou a única produtora do Porto com trabalho regular na área do cinema — a Filmógrafo. A qualidade da sua obra não tem passado desapercebida, pelo que toda a comunidade cinéfila espera que ele continue a dispor de meios para inventar, experimentar, animar, o que lhe parecer urgente. R. G. AGUSTINA — Grande e venenosa cronista do matriarcado do Norte de Portugal. Quando Manoel de Oliveira lhe pede argumentos, ela escreve romances de primeira água. O seu enxerto de Madame Bovary no éden duriense — Ema transformada na bela mutilada incapaz de sonhar — é a mais estimulante leitura que conhecemos do clássico de Flaubert. Mal querida de uns, temida por outros, nem sempre o peso da sua colaboração com Oliveira tem sido devidamente equacionado e reconhecido. A glória é vã e por vezes cega e avarenta. R. G. ALVES COSTA (Henrique) — Mais que os textos (nas páginas dos jornais, nomeadamente em «O Comércio do Porto», «Jornal de Notícias» e «O Jornal», ou em livros, por exemplo sobre Erich von Stroheim ou de crónicas de «Memórias do Cinema», publicados pela Afrontamento, ou de estudo da fase prévia ao Cinema Novo Português, na «Biblioteca Breve» do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, ou dos passos precursores precisamente do nascimento do cinema, «Da Lanterna Mágica ao Cinematógrafo», publicado pela Cinemateca Portuguesa) quase sempre elegantes, usando com sabor a ironia, a polémica, a familiaridade, com doses adequadas de pedagogia e divulgação, num evidente gosto de contar histórias, mas não se furtando, quando necessário, a uma análise mais estruturada, de Alves Costa, no entanto, ficou-nos principalmente a acção. Ele foi realmente um protagonista portuense do cinema: na Direcção do Cineclube do Porto, em tempos de resistência; mas muito especialmente na organização da Semana do Novo Cinema Português de 2 a 10 de Dezembro de 1967 — de que haveria de sair o texto «O Ofício do Cinema em Portugal» que vinte cineastas dirigiram à Fundação Calouste Gulbenkian, daí surgindo a criação do Centro Português de Cinema e o apoio de três anos da Fundação à produção do que foi a Segunda Vaga do Cinema Novo Português (de 1972, «o ano Gulbenkian», ao 25 de Abril). Nesse novo, e desde então duradouro, fôlego do Cinema Português, o Porto e principalmente Alves Costa desempenharam um papel que não pode ser esquecido. Por essas e muitas outras razões andou bem a então


Delegação Regional da Secretaria de Estado da Cultura a cargo de Marcelo Correia Ribeiro em dar o nome de Henrique Alves Costa à sala de cinema da Casa das Artes. R. T. ÂNGELO — Nasceu na Ilha de Moçambique mas vive e trabalha no Porto. As III Jornadas de Arte Contemporânea revelaram a sua obra de cineasta experimental a um público que poderia ter sido mais numeroso. Alerta-se «quem de direito e obrigação» para a necessidade urgente de conservar o trabalho cinematográfico de um artista cuja importância ninguém contesta. E para o interesse que haveria em encorajá-lo a prosseguir a sua pesquisa nesta área. R. G. ANIKI-BÓBÓ — A muitos evoca apenas o Sargent Becas Lonely Hearts Pub Band sito na rua da Fonte Taurina, o mais antigo bar-novo-estilo do Porto. A outros, a lengalenga do jogo de polícias e ladrões que serve de trama dramática ao filme homónimo de Oliveira. Era uma vez um menino que queria dar uma boneca de presente a uma boneca em carne e osso. Não posso deixar de pensar que é bonito alguém roubar e oferecer-nos algo que se parece connosco. R. G. ARNALDO SARAIVA — Poeta/professor entre outras artes e ofícios, o seu nome aparece ligado ao belíssimo documentário «A procissão dos Bêbados» e, mais recentemente, ao cinema de Joaquim Pinto (realizador e produtor que, por acaso, também é natural no Porto). Devido a uma óbvia parecença fisionómica com o imortal poeta, desempenhou o papel de Luís de Camões no reduzido plateau dos WC do Café Majestic. Até à data, os colegas da Faculdade ignoram certamente esta proeza do poeta de café. R. G. BEBÉ — Ao contrário do Coliseu é a sala de pequeníssima dimensão, que a falta de cuidado no projecto deixou que, contra todas as regras, seja maior em largura que em profundidade. Hoje decadente e sem qualquer unidade de programação, a Sala Bébé teve um período aúreo que sucedeu ao Estúdio, de Costa Cabral (do Perpétuo Socorro), na programação de um cinema de autor, que agora se pode novamente encontrar, por exemplo, na Casa das Artes. Nas intersecções da cinefilia e do mercado esta pequenina sala fez parte da rota, sem esquecer o Batalha, cujo «foyer» do piso inferior veio ocupar, das «sessões clássicas» e do Cineclube, e o restante conjunto de salas do Trindade a que esteve ligado o Dr. Luís Neves Real, das célebres «cartas aos deputados da nação» quando na Assembleia Nacional do regime anterior se simulava a discussão dos problemas do cinema. R. T.


BOTELHO (João) — Não é do Porto, mas aqui fez estudos universitários de Engenharia, e neste ambiente se encaminhou para o grafismo, para as capas de livros (muitos deles da Afrontamento) e numa sequência lógica para o cinema. O cinema o levou para a capital, mas foi no Porto e com a sua geração da cidade que realizou o seu primeiro filme «Alexandre e Rosa», com Jorge Alves da Silva, e aliás não fazendo justiça ao cineasta que com «Conversa acabada» finalmente começaria cinematograficamente a conversa. Foi nessa fase de transição que dinamizou a «M — Revista de Cinema», formalmente publicada por A Regra do Jogo, inicialmente sediada no Porto, com um primeiro número, em 1975, em que se associavam os também portuenses Bernardo Frey (Pinto de Almeida) e Manuela Viegas (nos números seguintes também Priscila Soares, Vítor Martins e Jacques D'Arthuys, nessa época no Instituto Francês do Porto), entrevistando (o ainda Manuel) Oliveira (antes de «Amor de Perdição»), e regendo-se pelas referências de Straub e Danielle Huillet e dos «Cahiers du cinéma» de J. L. Comolli («Técnica e ideologia»), cujas Semanas organizariam então em Portugal (não esquecendo o Porto), incluindo António Reis e Margarida Cordeiro e o Godard da época (do radicalmente crítico «Ici et Ailleurs», às reflexões sobre uma fotografia do Abril português de «Comment ça va?»). Oliveira e Reis apadrinhariam respectivamente «Conversa acabada» e «Um adeus português», numa filiação estética mas também portuense, em curtas aparições, significativamente em papéis de padre e de feitor (como veremos depois Paulo Rocha a falar sobre a música japonesa em «Três menos eu» de João Canijo). R. T. CIDADANIA — António Roma Torres, conhecido psiquiatra da nossa praça e redactor duma revista confidencial, mantém de há longos anos a esta parte uma crónica de cinema denominada «O cinema e a cidade» no matutino J.N. Dantes alternava com o Dr. José Henrique de Barros. Coisas de médicos. Declarou privada e publicamente que quando escreve um artigo sobre um filme de Coppola o faz com a convicção de que o cineasta o poderá vir a ler. Grandes ilusões. R. G. CINECLUBES — Se a história do cineclubismo em Portugal está por fazer, o Porto seguramente ocupará uma página importante. Foi aqui que nasceu o primeiro cineclube, inicialmente Clube Português de Cinematografia, depois Cineclube do Porto, com uma história rica, pela participação no movimento de resistência cultural ao regime salazarista, pelas várias campanhas a que esteve associado (a revitalização da Cinemateca Portuguesa, a recuperação de filmes que se julgavam perdidos, a Semana do Cinema Novo Português em 1967, etc.), pelo conjunto dos textos publicados nos programas das sessões, e pela sobrevivência que conseguiu até aos dias de hoje, apesar da dificuldade que a crise das salas de cinema (aparentemente já superada) e a crescente importância da televisão inevitavelmente trouxe ao velho modelo. É certo que talvez não tenha encontrado a resposta que urge, mas o prestígio mantém-se


inalterado. Outros cineclubes nasceram na cidade, o católico e extinto Cineclube da Boavista, o alternativo e afinal talvez replicado Cineclube do Norte, o matosinhense Cineclube Chaplin. E no Porto está ainda sediada a Federação Portuguesa de Cineclubes, que à falta talvez de um modelo novo de cineclubismo, que porventura ainda possa ter sentido hoje, e nomeadamente de um circuito alternativo de distribuição que liberte os cineclubes da contingência do mercado da exibição cinematográfica, vai publicando, sob a direcção de André Oliveira e Sousa, com regularidade, a revista «Cinema». R. T. CINEMA-JARDIM — O objecto imaginário proposto no nome deste espaço de muito breve existência não encontrou expressão adequada na sua concretização material. Nem o cinema achou ciclos de evolução natural ou o ar puro que necessita com urgência, nem o jardim se abriu à mutação onírica. Ainda bem que as altas esferas não rolaram muito pelo empreendimento e precipitaram a falência económica exigida pela falência moral. P. L. CINEMATECA DO PORTO — O assunto é tão velho como a Sé de Braga. Mandaram-nos repetidas vezes abaixo de Braga... e como nós até já lá estávamos!!!... Nunca ninguém pôs em causa o trabalho exemplar da Cinemateca sediada em Lisboa. Temos pois inveja e estamos cheios de razão neste nosso ciúme combativo. R. G. COLISEU — O fogo que nos tempos das cópias de nitrato sempre conviveu com o cinema deixou a sua marca no Centenário do Cinema, um mês antes das exibições que nessa sala estavam previstas. Um ano antes o fogo do fanatismo religioso ameaçara mas não fizera danos. Pelo contrário, da cidade levantaram-se os Amigos do Coliseu. A arquitectura de Cassiano Branco permanece como um valor, a dimensão da sala permite o ritual do Circo do Natal ou do Carnaval, mas a verdade é que também nenhuma outra sala da cidade está apetrechada para projectar filmes em 70 mm. E neste tempo de «multiplexes» e pipocas que invadiram a cidade, aumentando extraordinariamente a oferta cinematográfica, mas fragmentando-a em pequenas salas, o cinema não pode esquecer a nostalgia do tamanho das salas e dos ecrãs. Ao menos quando o cinema faz anos. R. T. COMBOIO — Havia uma anedota que dizia que o melhor do Porto era o comboio para Lisboa. Pois se o cenário da cidade no cinema português é quase invariavelmente Lisboa, António Pedro Vasconcelos em «O Lugar do Morto», talvez lembrado do surpreendente sucesso que o anterior «Oxalá» fizera na sala Lumière do Porto (mesmo comparado com os


resultados de bilheteira no resto do país), lembrou-se de fazer ir os personagens Ana Zanatti e Pedro Oliveira até ao Porto. E o resultado é uma dessas raras cenas no nosso cinema em que parece superar-se o artifício dos cenários, na carruagem restaurante do comboio rápido entre as duas cidades, nos anos oitenta. R. T. DORMINSKI (Mário) — Se fôssemos o Professor Nelo Vingada seleccionávamo-lo pela polivalência. Ora empresário, ora agente cultural; ora distribuidor de filmes e vídeo (quando o vídeo despontava e não havia ainda legislação adequada, rapidamente explorou o filão criando um Cine Clube Vídeo que escandalizou quem tinha um conceito menos instrumental do verdadeiro cineclubismo), ora crítico de cinema; ora jogando na livre concorrência, ora manejando a primor a subsídio-dependência; o fantástico Director do Fantasporto vai-se tornando imprescindível na capacidade de a cada hora, como no cinema fantástico, ser ele ou a sua própria criatura. Capaz de se rever na igual atenção com que trata Arnaldo Shwarzmúsculo a par com Sergei Paradjanov ou Jean Claude Carrière, Dorminski consegue que o Fantasporto agite cinéfilos e outros estratos de público. E principalmente tenha uma visibilidade fora de portas que outras iniciativas do Porto por vezes não conseguem. Mas não podemos deixar de pensar que poderia ser «rock», ou moda, ou ópera. Mas é cinema, e neste caso fantástico sempre, porque é da própria essência do cinema a fantasia. R. T. ESAP — Iniciais que designam um estabelecimento de ensino privado onde, mediante propinas King Size, os desocupados filhos da burguesia e alguns pobres diabos enganados e ofendidos podem integrar-se na movida estética que dá pelo nome de «Escola do Porto». Academismos. R. G. FRANCESES — Na Rotunda da Boavista a estátua celebra as guerras peninsulares, mas o leão sobre a águia não faz justiça às «invasões francesas» do cinema feito no Porto nos anos vinte. Se o cinema chegou ao Porto em Julho de 1896 pela mão do inglês Robert William Paul e do enigmático operador Rousby (e não directamente dos Irmãos Lumière), duas décadas depois, quando já não se tratava de uma curiosidade, mas de uma indústria de produção de filmes de ficção e não de meros registos de actualidades, a Invicta Film e a Caldevilla Film trouxeram para o Porto os franceses Georges Pallu («Frei Bonifácio», « A Rosa do Adro», «Os Fidalgos da Casa Mourisca», «Barbanegra», «Amor de Perdição», «O Destino», «O Primo Basílio», «Lucros Ilícitos», «Cláudia») e Maurice Mariaud («As Pupilas do Senhor Reitor», «Os Faroleiros», «O Fado»). Nessa época, o cineasta era mais um artesão que um autor e os filmes sofreram muitas influências onde o gosto francês se misturou com uma certa ideia rural


portuguesa que aproveitou Camilo Castelo Branco e Júlio Dinis, escritores aliás de conhecida ligação ao Porto. E naturalmente no Porto se descobriram filmes que se julgavam perdidos como «Amor de Perdição» e «As Pupilas do Senhor Reitor» (estes graças à atenção do Cineclube do Porto e de Alves Costa) ou «Os Faroleiros». O actual trabalho de restauro levado a cabo na Cinemateca Portuguesa, sob a direcção de João Bénard da Costa e particularmente de José Manuel Costa, permite hoje reavaliar este património cinematográfico português, inclusivamente como no caso de «Amor de Perdição» com a recuperação da partitura musical de Armando Leça pela especialista americana em música do cinema mudo, Gillian Anderson. R. T. FESTIVAIS — Dois à porta, um dentro de portas. Dois em cidades praia-e-porto — Vila do Conde, dedicado à curta-metragem, e Figueira da Foz, interessado no cinema de autor, periférico e independente — o terceiro no nosso soturno Albert Hall é de meter medo à gente. Talvez as cidades tenham os Festivais que merecem (ui!). Ou talvez os santos desta nossa casa não façam milagres. R. G. FILHA DA MÃE — Filme realizado por João Canijo, cineasta nascido no Porto. Os tripeiros da fita falam com a pronúncia do comentador Esteves. Estaremos perante uma metalíngua parida pelo filho da mãe do audiovisual, ou será que Canijo cospe no berço com desenvoltura, em sinal de contrição por ter vindo ao mundo tão longe da capital? R. G. FUTEBOL — A comédia portuguesa dos anos trinta e quarenta foi marcadamente lisboeta. Houve no entanto um filme em que o futebol trouxe os personagens ao Porto, a pretexto de um Porto — Sporting no tempo dos famosos «violinos». Mas melhor do que o jogo de que há algumas imagens em «O Leão da Estrela» de Arthur Duarte é a cena da antecipação-simulação das jogadas na sala de chá, protagonizada por António Silva, no papel protagonista de Anastácio, e Artur Agostinho (na época o mais popular relator desportivo da rádio), no do motorista Miguel. E, claro, nesse tempo era habitualmente o Sporting campeão. R. T. GUEDES (João) — Nascido em Matosinhos, foi um actor do Porto principalmente pela formação feita no Teatro Experimental do Porto, bastante moldado em torno de António Pedro. Mas contra o que poderiam ser as expectativas de uma carreira ligada à cidade, o seu nome teve uma projecção nacional, e no cinema participou em cerca de vinte filmes, com realce para «Uma abelha na chuva» de Fernando Lopes, «Os Demónio de Alcácer Kibir» de Fonseca e


Costa, «Velhos são os Trapos» de Monique Rutler, e «Silvestre» de João César Monteiro, onde a sua presença se pode considerar particularmente marcante. R. T. ILUSÃO — Demasiado cara para ser comprada, demasiado rara para ser chata, demasiado chata para ser amada, ainda tinha que ser grande e uma revista de cinema. Os textos assim sentenciados a um aparente naufrágio têm uma pertinência sobrevivente. As histórias inconciliáveis dos redactores não profissionais misturam-se efemeramente. P. L. LUGAR-COMUM — Dizer que o Porto possui cenários naturais duma incomparável fotogenia tem sido um lugar-comum. A cidade despenha-se pelas escarpas abaixo como uma espécie de instalação cripto-cubista a céu aberto, roída pela lepra e embrulhada numa mortalha de fumos. Se o cinema fosse uma arte da imagem, faziam-se muitos filmes no Porto. Mas não é. No Porto fazem-se poucos filmes. R. G. LUMIÈRE — No Porto são duas salas de cinema e não os irmãos que terão inventado o cinema há cem anos (e mais um português). Mas por causa dos Irmãos Lumière não são, como é usual, numeradas e designam-se por A (de Auguste) e L (de Louis). Quando abriram houve um concurso para as baptizar, mas o que as tornou únicas foi a programação, coerente que nessa época outras salas novas como o Foco, já sem Lauro António como conselheiro de programação, haviam perdido e haviam-se perdido. Enquanto Mário Pimentel, homem da Rádio, dirigiu a programação, subsistiu um projecto viável, em que a maior garantia comercial do filme de uma sala permitia a liberdade e o risco na outra, ao mesmo tempo sem estar na dependência directa dos distribuidores (característica que, aliás, durante algum tempo outras salas do Porto conseguiram manter). Assim se fidelizou um público que não era minoritário, como por vezes sucede a boas intenções desta natureza, e os muitos filmes portugueses que a sala ousou programar souberam que pelo menos tinham garantidas duas semanas de exibição, como condição mínima de visibilidade e de oportunidade. R. T. MANUEL ANTÓNIO PINA — «Não vi e não gostei». — a proverbial parcialidade deste grande-poeta-aqui-tão-perto dá-lhe quase sempre razão. O seu livro «Os Piratas» foi argumento duma fita de Raoul Ruiz. Guarda sonhos de filmes na gaveta que porventura não realizará porque, como excelente contador de histórias que é, já os viu cem vezes projectados no olhar de quem tem o privilégio de o ouvir narrá-las. R. G.


MÁRIO — Muitos aspirantes a cineastas do Porto fizeram as suas primeiras experiências audiovisuais graças ao Sr. Moutinho quando ele organizava os cursos do FAOJ. Entretanto aquilo passou a chamar-se Instituto da Juventude o que, para bom entendedor, é uma designação programática. A malta nova foi promovida a juventude institucional — com respectivos efeitos eleitorais — e o Sr. Moutinho fez de pai na novela do Andrades. Portugal não perdoa. R. G. MIRAGEM — Produziram uma série para TV em suporte película — o KLAXON. O arrojo deles surpreendeu. Mas a emergência de uma geração de novos produtores e a necessidade de descentralizar não faziam parte do programa da democracia de sucesso. E, ao que dizem, o audiovisual tem razões que o coração não conhece. O programa segue dentro de momentos. R. G. MEMÓRIAS DA EMIGRAÇÃO — No tempo em que o cinema virara costas ao Porto — o inefável Chico Fininho ainda não dera azo à longa-metragem de Sério Fernandes — o olhar de um estrangeiro escolheu o palco desta cidade bruta para encenar a alegoria da revolução mutilada — «Mudas Mudanças» terminado em 1980. Depois o emigrante dedicou-se à decifragem dos sinais do império perdido, transformando o Porto em museu do Eldorado e em mapa da sua própria errância — «Mourir un peu» terminado em 1985. No Verão de 86, enquanto Cavaco tomava de assalto eleitoral o trono do reino, Saguenail filmava o seu balanço crispado de uma época de desamor às causas e amor à camisola. Foi «Amour en Latin» subintitulado Fita Portuense. Significativamente. R. G. O PINTOR E A CIDADE — Primeiro filme a cores de Manoel de Oliveira, realizado numa época em que a utilização da cor ainda não se generalizara no cinema, esta pequena jóia encena o combate entre a câmara e a luz por intermédio do pincel e das aguarelas de António Cruz. Tal como o pintor tenta captar e registar as matizes de cor da cidade em perpétua mudança, o cineasta procura gravar na película a própria essência do tempo que passa. Foi a última vez que Oliveira filmou o Porto. R. G. OLIVEIRA (Manoel de) — É um lugar-comum dizer que é «o mais jovem cineasta português», de tal forma surpreende quando se perdoaria a simples gestão de uma carreira. De prémios e consagrações em festivais é difícil escolher, mas há pelo menos que referir o Leão de Ouro Especial de Veneza em 1985 e a Homenagem Especial do Júri de Cannes em 1990. É um mito dizer-se que não é popular, ou não é reconhecido na sua terra (poucos cineastas


portugueses, contudo, se poderiam gabar dos 75000 espectadores de «Non» ou dos cerca de 40000 de «Vale Abraão» ou «O Convento»). Quase aos 88 anos (nasceu no Porto em 12 de Dezembro de 1908, segundo o registo; na realidade terá nascido um ou dois dias antes), Oliveira revê agora em «Viagem ao princípio do Mundo» o seu próprio percurso de juventude, usando Marcello Mastroianni, o actor que desde Fellini parece constituir o «alter ego» preferido de qualquer cineasta. Se os astros podem dizer alguma coisa Oliveira é um Sagitário, com a energia do fogo da maturidade, meio animal pelo lado da sensualidade e do pragmatismo, meio humano na primazia do verbo e nas preocupações do espírito. Em actividade desde 1928 («Douro, faina fluvial») terá já ultrapassado os 67 anos da mais longa carreira de cineasta que o «Guiness» atribui a King Vidor, e todos queremos que em breve possa igualar Joris Ivens que detém o máximo da longevidade em actividade com «Une histoire de vent», realizado aos 89 anos. Projectos não parecem faltar-lhe. R. T. PAULO CASTRO — Actor, cineasta, cada vez mais encenador dramático. O seu último filme — Sacrifício no Castelo — glosa justamente o seu prematuro adeus à arte. Uma espécie de crucifixão quando a procissão ainda ia no adro. Escolheu Saguenail para o papel de Édipo numa outra curta-metragem sua, rodada em Panóias. Ceguinho e de bengala. Retratos de família... R. G. PAZ DOS REIS (Aurélio) — Era republicano e esteve com os revoltosos do 31 de Janeiro, contra a «paz dos reis». Fotógrafo (o seu espólio só agora se começará a conhecer) e floricultor, este portuense inscreveu o país na História do Cinema logo um ano depois das sessões dos Irmãos Lumière em Paris, e aliás curiosamente copiou o modelo, por exemplo, em «A chegada de um comboio americano a Cadouços» ou «Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança». A primeira exibição pública dos seus filmes fez-se no Porto, a 12 de Novembro de 1896, no Teatro Príncipe Real, no local onde hoje é o Teatro Sá da Bandeira. Quem cuidava de imagens e de flores não poderia ter deixado de semear o que então talvez não se pudesse imaginar como iria florir. R. T. PINA (Luis de) — Crítico de cinema portuense, à cidade talvez apenas ligado pela colaboração na fase inicial do extinto Cineclube da Boavista, deixou uma imagem de homem de convicções de formação católica, mas também de tolerância e diálogo. Nos anos sessenta, do Cinema Novo, embora num percurso distinto, deu corpo e alma ao que foi talvez o único projecto mais ou menos duradouro de uma revista de cinema aliando o rigor teórico e o interesse num público vasto, a revista «Filme» (consta que quando um número era quase totalmente escrito por ele se


desdobrava em nomes supostos para manter a ideia de um grupo redactorial que não se limitava ao seu constante dinamismo). Mais tarde mas não tarde demais, foi director da Cinemateca Portuguesa, depois do Dr. Félix Ribeiro, numa fase em que, depois de Abril, a Cinemateca pôde cumprir o seu destino e adquirir a justa dimensão que se exigia e prosseguiu, após a sua morte, com a direcção do antes subdirector Dr. João Bénard da Costa, sabendo aproveitar das diferentes experiências mas do igualmente incondicional gosto pelo Cinema. R. T. PIPOCAS — Só é lamentável a falta de imaginação. Sugerem-se: crepes chineses, bacalhau à Gomes de Sá e pastéis de Belém. Sugere-se ainda que se apaguem as imagens dos canastrões e que os espectadores subam ao palco para jogarem ao Karaoke. É preciso, contudo, ter cuidado com os filmes seleccionados nessas salas, não vão as iguarias ilusórias dar fome ao espírito. P. L. PRONÚNCIA DO NORTE — Vem duma canção do Reininho. É um lobby. Não há bons lobbies como também não há pronúncia do norte nos filmes portugueses. Quando os actores de pronúncia lisboeta se dedicam a imitar o sotaque nortenho, está o caldo verde entornado. Porém, mais importante do que esta questão de pronúncias é a da improvável língua dos media, ou seja da inexpressividade erigida em norma. R. G. PUBLICIDADE — As normas europeias estipulam que a publicidade no cinema deve ser projectada com a sala iluminada a média luz. Ninguém as cumpre. Ainda por cima os spots que nos impingem são chatos. Voar com a cerveja mais portuguesa de Portugal ou ser bem vindo ao submundo macdonalds?! Por amor de deus... R. G. RAPOSA PÁLIDA — Mais conhecido por Jean Rouch por estes indígenas. A retrospectiva da sua obra em atmosfera de pós 25 de Abril deixou fundas marcas na memória cinéfila. Era a própria conjuntura política que gerava um clima de particular abertura às propostas do «cinema do real». Porém o entusiasmo de Rouch não encontrou muitos seguidores. As últimas visitas ao Porto deste aventureiro do cinema foram menos badaladas, mas entretanto Rouch cumpriu a promessa formulada em entrevista que deu à «Grande Ilusão» e realizou um filme a «quatro mãos» de parceria com Manoel de Oliveira. R. G. REIS (António) — Primeiro poeta («de resto /o meu Cansaço/vive fazendo um Gesto /que eu não faço», in «Poemas do Escritório»). O cinema foi talvez o Gesto (preparado no cinema da


Secção de Cinema Experimental do Cineclube do Porto em «Auto de Floripes», ou na colaboração com Oliveira em «O Acto da Primavera» ou com Paulo Rocha em «Mudar de Vida») e fez, indo para a capital, com Margarida Cordeiro, numa enorme força afirmada logo em «Jaime». «Trás-os-Montes» (onde ainda pelo sentido poético da palavra cita o Kafka de «A Muralha da China», aliás não identificado, para afirmar o orgulho da periferia face aos poderes das capitais «onde não se sabe o rei que agora reina e mesmo o nome da dinastia é incerto»), «Ana» e «Rosa da Areia» constituem uma obra escassa para um talento tão grande, que se afirmou também na influência sobre novas gerações como professor da Escola de Cinema. R. T. REVISTAS — A imprensa cinematográfica teve também no Porto uma grande parte da sua história. Presentemente publicam-se na cidade, com regularidade, A Grande Ilusão e Cinema, da Federação Portuguesa de Cineclubes. Não muito longe no tempo, tiveram uma vida considerável a Cinema Novo, que daria origem à cooperativa com o mesmo nome que promove ainda ciclos de cinema e outras iniciativas, e a Cineclube, do Cineclube do Porto. Mas recuando no tempo é no Porto que aparece em 1912 a primeira revista de cinema portuguesa, a Cine-Revista, dirigida por Lopes Teixeira, e anterior a uma homónima lisboeta que apareceu em 1917 e foi durante muito tempo considerada a primeira (a correcção feita por Carlos Basto, de Barcelos, foi publicada na revista «Celulóide» nº 95). Mas entre 1919 e 1925 publicou-se ainda a Porto cinematográfico dirigida por Alberto Armando Pereira, entre 1923 e 1936, a Invicta cine, em que também colaborava Alberto Armando Pereira, que dirigiu ainda a Espectáculo, entre 1927 e 1930, e a Cinema, entre 1931 e 1935 (com o mesmo nome já se tinham publicado no Porto duas revistas de cinema, uma das quais em 1927, era o órgão oficial da Associação dos Amigos do Cinema, que de certa maneira foi precursora do cineclubismo). Finalmente deve-se ainda realçar a Movimento que publicou 27 números entre 1933 e 1934, dirigida por Armando Vieira Pinto, e onde Alves Costa lança a ideia da fundação de um cineclube no Porto. Aliás o cineclube do Porto, fundado em 1945, publicaria os cadernos Projecção, números temáticos onde os artigos são assinados por grande parte dos seus fundadores, Alves Costa, Fernando Condesso, F. Gonçalves Lavrador, Luís Neves Real, Manuel de Azevedo, Júlio Gesta, Mário Bonito, Ramos Pereira, António Brochado, etc., e ainda na forma de cadernos Carlos Rodrigues, Egito Gonçalves, José Cayolla e Domingos Vieira publicariam entre 1965 e 1976 Plano. R. T. RIBEIRA (I) — Parte antiga da cidade, em ligação com a zona das Caves do Vinho do Porto de Vila Nova de Gaia, que os impostos abusivos de um coevo Bispo do Porto colocaram fora da cidade, através da ponte férrea de D. Luís, semelhante à dos comboios actualmente desactivada e construída por Gustave Eiffel, é agora também uma das zonas da noite portuense. Curiosamente um dos seus mais famosos bares, «Aniki Bobó», tem o nome do filme que


Manoel de Oliveira aí rodou em 1942, estava então a Europa em guerra. Mas a sua verdadeira imagem cinematográfica está no «Douro, Faina Fluvial» também de Manoel de Oliveira. Como nota Manuel António Pina em «Aniki Bobó», no livro (em publicação) sobre o filme que escreveu para a série dos «classics» do British Film Institute, «a cidade onde se passa a acção de "Aniki Bobó" é, assim uma cidade inventada e estritamente "cinematográfica", construída para as necessidades expressivas, plásticas e dramáticas, do filme com imagens tomadas arbitrariamente de um lado e doutro do rio, no Porto e em Vila Nova de Gaia, sem qualquer preocupação de verismo ou rigor documental», segundo o chamado efeito Koulechov. «Por isso em nenhum momento se nomeia qualquer local, a cidade ou apenas o nome de uma rua que seja, muito embora os habitantes do Porto facilmente reconheçam e identifiquem cada um dos recantos dos bairros e dos cais ribeirinhos onde decorre o filme.» R. T. RIBEIRA (II) — Nem só ao grande cinema esta zona da cidade emprestou a beleza do seu casario, dos seus espaços típicos, do mercado, das cheias do Douro. Num dos menos interessantes períodos da história do Cinema Português, os finais dos anos cinquenta, dois filmes exploraram -o popular no estilo musical do teatro ligeiro tendo o Porto como cenário: «A Costureirinha da Sé» de Manuel Guimarães, em que Maria de Fátima Bravo substitui a Maria Clara da peça teatral, e «O Passarinho da Ribeira» de Augusto Fraga, em que se estreia Pedro Bandeira Freire como galã, um pouco como décadas antes o portuense Manoel de Oliveira fizera então em «A Canção de Lisboa» de Cotinelli Teimo. Mas nessa altura já o melhor período da comédia portuguesa, eminentemente lisboeta, tinha passado e pela via do nacional-cançonetismo ir-se-ia caminhar numa constante «Derrapagem» até 1974, fazendo jus precisamente ao último título desse ano, de Constantino Esteves, produzido e interpretado por Tony de Matos. R. T. RITA — O nome de Sérgio Godinho aparece ligado ao cinema de José Fonseca e Costa e Pierre Kast. Escreveu letras que são mini-guiões sem desperdício de película e legou-nos a única canção de filme com qualidades comparáveis às que as stars eternizaram. E o coração que nos conte quantas vezes já bateu para nada. R. G. RIVOLI — Ideia em obras. Espera-se que venha a acolher uma programação de alto risco em vários domínios da criação, inclusive o cinema. Espera-se que venha a ser local de todas as artes e de esbatimento das fronteiras que as separam. Nestas coisas convém sonhar de olhos abertos. E que não falte gente a abrir a boca. R. G.


ROCHA (Paulo) — Cineasta portuense, o seu cinema só regressa à cidade de origem para filmar «Oliveira, o Arquitecto». Oliveira já fora o mestre para quem pesquisara as imagens documentais de «O Acto da Primavera», que acompanhara na rodagem de «A Caça». Mas o cinema de Paulo Rocha é lisboeta particularmente no inicial «Verdes Anos», significativamente pelo olhar de quem chega à capital, embora num outro estrato social. O excelente «Mudar de vida» tem a força de um cinema que ainda não se cumpriu totalmente na sua obra posterior e foi de certa forma um regresso ao norte, nos conflitos do progresso, no litoral que vai de Matosinhos ao Furadouro. Agora prepara-se para filmar o Douro, num desafio a que não serão alheias as ressonâncias de Oliveira e Agustina. Paulo Rocha é de certa maneira a certeza do melhor cinema português depois de Oliveira, mas o seu espírito inquieto torna-o frequentemente um porta-voz do movimento cinematográfico português mais que o autor que o seu cinema raro deixa adivinhar. E exigir. R. T. R. R. — Tirou o curso de engenheiro de Som no Conservatório de Cinema de Lisboa. Foi responsável pela sonoplastia de alguns filmes de Saguenail. Emprestou a voz e a silhueta noutros. No Porto, é capitão de geração; em Lisboa, é malandro nas fitas de José Nascimento e Joaquim Leitão. R. G. SAGUENAIL — É como se uma espécie de Rimbaud tivesse parado de se perder no espaço. Talvez por isso, o realizador de origem francesa tenha, até ao recente «Ma's sin», filmado o mundo inteiro no Porto, devolvendo a cidade à liberdade dos mapas interiores, e revelando a sua evidência simbólica. Diz-se surrealista, e indubitavelmente cumpre o programa de l' amour fou ou de le surréalisme et la peinture de Breton. É um caso raro de investimento pessoal no cinema. Conhecido por andar descalço, ganhou calo onde ninguém o tem. É démodé o suficiente para desafiar o efémero. Mas, por favor, nunca o sentem em frente a um bilhar... P. L. SÃO PEDRO DA COVA — Zona portuense de minas e de futuro incerto, foi objecto de uma intervenção do SAAL imediatamente após o 25 de Abril. Na sequência disso a população local contactou directamente Rui Simões que infelizmente depois de «Deus, Pátria, Autoridade» e «O bom povo português» não teve grandes hipóteses de continuar a carreira cinematográfica que prometia. São Pedro da Cova, em 1976, é um conjunto de três filmes de 15 minutos, que ficou a constituir, com «Adeus até ao meu regresso» de António Pedro Vasconcelos (também em parte rodado perto do Porto) e «Barronhos — Quem teve medo do poder popular?» de Luís Filipe Rocha, um dos raros exemplos em que a ideia de «dar voz ao povo» não se acompanhava


de uma completa demissão da reflexão estética que mesmo o cinema documental e militante não dispensa. R. T. SÉRIO — Tem umas dúzias largas de gatos e gatas nos ex-escritórios da Beifilme (os vizinhos passam-se com o cheiro a jardim zoológico). Professa o plano fixo e a supressão do tripé no deserto da ESAP (os alunos, quais apóstolos, pasmam). Confunde Baudelaire com Jesus Cristo. Ama Pasolini e odeia Oliveira. Tudo isto a sério. R. G. TERÇO — No tempo em que o cinema era o ópio do povo, o Terço era o seu templo. Com projecções ao ar livre, tipo «walk-in». Depois, já entre quatro paredes, o Terço oferecia a uma vasta clientela popular, e a preços irrisórios, uma programação que saltava do melodrama para a coboiada, da fita de espiões para a comédia musical. O cinema de género produzia o efeito de número, por entre assobios, palmas e bocas obscenas. Porque o público em larga medida conhecia o filme que ia ver. Fumava-se, comia-se, bebia-se. Beijava-se no escuro. Este lupanar continua a ser o único cinema de reprise no Porto. R. G. THE BELLS ARE RINGING — O Caramelo é o dentista mais cinéfilo de Portugal e não trata apenas cáries dentárias. Na cadeira do destacado dirigente cineclubista tem-se sentado a numerosa hoste de portuenses amantes de cinema. No consultório dele discutem-se filmes. Vibrantemente. Mas, com tanto dente a chumbar, o Caramelo já quase não tem tempo para ir ao cinema. Por isso promete que vai abrir um restaurante. Antes o mal que a cura. R. G. TRIPAS — As da dobrada encontram-se provisoriamente proscritas. A faca é romba e o alguidar está roto. Mas dizem as boas almas que o Fantasporto tem a seu favor o facto de ser um certame de massas. Strictu sensu. Donde se prova que as massas nunca têm razão. R. G.


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