Fundos e superfícies

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FUNDOS E SUPERFÍCIES Romain Goupil ficou na mó de cima com o seu primeiro filme Mourir à trente ans. A segunda fita, La java des ombres foi um fiasco. Apesar de Goupil parecer desinteressado das razões deste acolhimento desigual, uma análise que não resolva esse problema por atacado invalidase à partida. Mourir à trente ans é uma fita de montagem composta por filmes rodados por Goupil durante a adolescência, por imagens filmadas durante os acontecimentos de Maio de 68, por reconstituições dessas rodagens e por entrevistas. O protagonista é o próprio R. Goupil que não morreu aos trinta anos e que enterra o seu amigo Michel Recanati. A vivência militante e revolucionária toca-nos independentemente da qualidade cinematográfica do trabalho. Daí adveio em grande parte o seu sucesso, sem que tenha sido aprofundada a verdadeira posição de Goupil, soldadinho na reserva, nem de facto se conseguir chegar ao cerne da questão — a morte de Recanati aos trinta anos. Aprofundado o discurso de Goupil, revela-se que o compromisso político de Recanati é, pela sua prática, um substituto da actividade sexual: revolucionário = impotente (pelo menos sentimentalmente); R. Goupil, que não duvida da sua virilidade, a pretexto de desmontagem, condena este seu passado. Esta posição aparece claramente no segundo filme, ficção políticopolicial extremamente confusa, mas em tudo convencional na forma. Goupil explica: quer fazer o balanço da sua actividade como militante e denuncia o amor do poder que motiva, no fundo, o militante ou o terrorista (Goupil o militante, Recanati o terrorista?). Goupil é violento quando fala do fascismo intelectual. Constata que a maioria dos antigos militantes de Maio de 68 percorreram o mesmo caminho que ele, e trabalham hoje em dia no domínio da comunicação: jornalismo, publicidade, televisão, etc. Define este caminho como uma tomada de consciência e uma auto-crítica retrospectiva (os tiques do militante afloram à superfície). La java des ombres reclama pois o estatuto de filme para grande público, com um conhecimento «aprofundado» do tema logo menos simplista do ponto de vista do discurso. Goupil interpreta o fracasso como um erro de mira e concluí que o público é mais parvo do que ele imaginava devendo pois o realizador colocar-se à sua altura (baixar-se). Parece-nos, bem pelo contrário, que o poder dos dirigentes de Maio de 68, era evidentemente um poder da palavra e que, ao mudar a arma de ombro, Goupil e os seus pares asseguram a conservação destse poder, assumido definitivamente como uma manipulação prostituída do público, pessoa e coisa. O sucesso de Mourir à trente ans, foi um mal-entendido do qual Goupil tirou o melhor dos partidos; mas o público não pode passar por cima do absoluto desprezo e da pobreza de concepção à tona de La java des ombres. Goupil declara então que o seu próximo filme será mais comercial e mais «fácil»... Que se afogue em pouca água! S.


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