01 – Pierre Letourneur – 1737-1788 –, Chants d’Ossian (James Macpherson), 1777 (nova tradução em 1872, parcial e em verso, por Pierre Baour-Lormian – 1770-1854 –, e depois, em 1842, tradução completa e em prosa, por Auguste Lacaussade – 1815-1897, natural da ilha da Reunião) Os tempos «pré-românticos» caracterizam-se pelas contradições, tanto no plano dos valores cultivados como dos movimentos sociais, e desembocam na Revolução Francesa. Ao nível da super-estrutura, verifica-se uma crescente paixão pela História e pelo passado – que permite relativizar a perenidade do regime – e simultaneamente pelas ciências, viradas para o futuro e anunciadoras da Revolução Industrial. O êxodo rural e a expansão das cidades provocam, por reacção, o culto da «natureza» e do individualismo, numa era em que se desenvolvem as comunicações de massas e os movimentos de multidão. Há que situar neste quadro o sucesso dos Cantos de Ossian, vistos como uma Ilíada gaélica, e a voga do «ossianismo» que destronará o neo-classicismo. Pierre Letourneur é tradutor, não poeta. Deu a conhecer em França Edward Young e Shakespeare. Cinquenta anos depois, as suas traduções serão consideradas demasiado polidas, e submetidas ao gosto francês, mas o sucesso do texto mantém-se, pelo que novas traduções surgirão em 1827 e 1842. FIFFFFF 02 – Évariste de Parny – 1753-1814, natural da ilha da Reunião –, Chansons madécasses, 1787 O sucesso de Parny como poeta deve-se sobretudo às suas Poesias eróticas (1778), antes das Elegias (1784) de sua autoria que Chateaubriand declarava ter aprendido de cor. Oriundo duma família nobre e esclavagista, manifestou-se todavia contra a escravatura no tempo da revolução, porventura à custa da perda dos bens que lhe caberiam herança. Viajou muito, tendo ocupado postos militares durante a monarquia – dragão da rainha – e exercido cargos administrativos sob Napoleão – no ministério do Interior e depois no Teatro das Artes. Integrou por fim a Academia Francesa. O seu livro A guerra dos deuses, poemas em dez acantos, feroz crítica do cristianismo, foi proibido – mas amiúde reeditado clandestinamente. As Canções malgaxes foram recebidas como uma curiosidade exótica e só retrospectivamente seriam vistas como o primeiro poema em prosa, forma justificada, após os Cantos de Ossian, pelo alibi da tradução – que não passa, na verdade, de uma pseudo-tradução, já que Parny as escreveu na Índia... Algumas delas foram musicadas por Maurice Ravel. FF 03 – Alphonse Rabbe – 1784-1829 –, Le centaure, 1822 (em revista) – 1836 (Œuvres posthumes) Rabbe é conhecido pelo seu livro Álbum dum pessimista, publicado postumamente mas celebrado pelos seus amigos românticos, Victor Hugo e Sainte-Beuve, recolha de refexões tingidas de desengano acerca da morte e do suicídio que começa a redigir em 1923 e prossegue até pôr fim à vida. Tendo contraído a sífilis durante uma missão em Espanha, no ano de 1808, viu a doença devastar-lhe o corpo e o rosto, e foi obrigado a retirar-se, tendo ficado acamado durante os cinco últimos anos da sua vida. Antes disso, polemista activo, fundara na cidade de Marselha, em 1820, o jornal «Le phocéen» no qual atacava as posições monárquicas – e esclavagistas –, coisa que lhe valeu perseguições e condenação. Os aforismos do Álbum motivaram que Breton o citasse no Manifesto do surrealismo. O seu poema em prosa, O centauro, passou despercebido mas não é de excluir que Maurice de Guérin o tenha lido e apreciado a ponto de retomar o título e a inspiração – durante muito tempo, Guérin foi tido como iniciador da forma poema em prosa sem a justificação duma tradução. Não se conhece nenhum retrato de Rabbe. FFF 04 – Prosper Mérimée – 1803-1870 –, La Guzla, 1827 Um homem de 24 anos publica, sob o nome Joseph Lestrange, uma série de espanholadas intituladas O teatro de Clara Gazul e conhece um sucesso imediato até que a revista «Le Globe» acabe por revelar o nome do autor. Dois anos mais tarde, ainda a pretexto de traduções – desta vez da Ilíria –, assiste-se à publicação, sob o nome Hyacinthe Maglanovitch, de La Guzla, anagrama transparente de Gazul; Goethe denuncia imediatamente a fraude, pelo que a glória do autor fica assegurada. Mérimée ficará para posteridade como o inspector-geral dos Monumentos históricos que confiou a Viollet-le-Duc a reconstituição da arquitectura medieval, do monte SaintMichel à catedral de Notre-Dame, passando pela cidade de Carcassonne, e sobretudo como autor de novelas pitorescas – Colomba (Córsega), A vénus d’Ille (Pirinéus) e Carmen (Espanha) imortalizada por Bizet – antes de ter assento na Academia Francesa. Os poemas de La Guzla derramam complacentemente chavões do género «terror»: mau olhado, aparições diabólicas, vampiros... FFINFFF
05 – Xavier Forneret – 1809-1884 –, Vapeurs, ni vers ni prose, 1838 Xavier Forneret poderia ter sido totalmente esquecido se não tivesse sido um homem de escândalos. Tanto na sua vida privada – processo contra a mãe que pretende tirar-lhe a herança acusando-o de a dilapidar em vão, recusa de casar com a mãe dos seus três filhos que aliás morrem muito cedo – como na sua vida pública – dandy, publica os seus livros em edições de autor e produz às suas custas a representação das peças de teatro que escreve, sendo que os primeiros comportam mais espaço branco do que texto impresso (três linhas por páginas no máximo) e só são distribuídos pelas «pessoas que enviam o seu nome à tipografia (...) e após exame pelo autor das respectivas encomendas», e podendo as segundas conter uma personagem de comissário de polícia que autoriza os espectadores a rir... Muitos traços o aproximam de Raymond Roussel. A personagem – O homem negro – é rapidamente assimilada ao autor e diz-se que de noite se deitava num caixão. O teor dos seus aforismos tem tudo a ver com o «humor negro». A palavra «fim» nos seus livros – intitulados: Sem título, mais um ano de sem título – pode introduzir um «após fim». F 06 – Maurice de Guérin – 1810-1839 –, Le centaure, 1840 Exceptuando a sua brevidade, a vida de Maurice de Guérin, fidalgo do campo que rumou a Paris, não apresenta nada de notável. É George Sand que, aquando do seu falecimento, faz dele o protótipo do poeta romântico representativo da «geração perdida», vitimado pelo «mal du siècle» – a tuberculose – e, garantindo a publicação dos escritos que ele deixou – em vida recusou a oferta dum editor e queimou os seus rascunhos –, assegura a sua glória póstuma. Sintomaticamente, cometeu um lapso no que diz respeito ao nome do jovem poeta e intitulou o seu artigo «George de Guérin» comparando a Werther que, escapado à ficção de Goethe, se teria tornado de carne e osso. O sucesso do Centauro, e depois da Bacante – este último é um texto inacabado –, contribuiu para que o interesse dedicado à Antiguidade da História romana passasse a focar-se na mitologia grega – A bacante é a primeira reconstituição do culto dionisíaco que assombrará o imaginário romântico até Nietzsche – e levou os críticos do século XIX a fazerem de Maurice de Guérin o inventor dessa nova forma: o poema em prosa. FI 07 – Aloysius Bertrand – 1807-1841, nascido no Piemonte –, Gaspard de la nuit, 1842 Outro provinciano de Borgonha que migrou para Paris, a carreira de Bertrand é quase a antítese da de Forneret: nunca provocou nenhum escândalo, tendo pelo contrário passado despercebido; por duas vezes encontrou um editor para publicar os seus textos – em 1829 e 1839 – mas ambos faliram antes de imprimir o livro; os directores de teatro parisienses recusaram, todos eles, as suas peças; viveu numa miséria envergonhada, morreu tuberculoso no hospital e a mãe deixou o seu cadáver na fossa dos indigentes. Sainte-Beuve, a quem ela confiara os seus manuscritos, e o escultor David d’Angers, que ele encontrara por acaso no hospital onde viera visitar um outro doente, asseguraram a edição póstuma – defeituosa em mais de um trecho (só passados 150 anos uma edição definitiva, correspondente aos seus meticulosos desígnios, verá a luz) – do seu livro. Baudelaire e a seguir Max Jacob reconheceram nele o iniciador da forma, assumindo terem querido afastar-se, tanto pela inspiração – Idade Média e fantasmagorias – como pela estrutura – imitação das baladas medievais. F 08 – Jules Lefèvre-Deumier – 1797-1857 –, Le Livre du promeneur, ou Les Mois et les jours, 1854 Jules Lefèvre não foi reconhecido pelo público em vida nem postumamente. Romântico ardente – fundador e redactor da Muse française –, quis partir no encalço de Byron e, lutando pela independência da Polónia, fez-se médico na prisão e, ferido em combate, prisioneiro dos austríacos, acabou por se tratar e curar do tifo. De regresso a França, tomou o nome Lefèvre-Deumier em sinal de gratidão a uma tia que, ao elegê-lo como herdeiro universal, lhe permitiu realizar o desejo de abrir um salão e receber os seus «pares» – «homens de letras» – à mesa. Tendo escrito uma carta de felicitações a Louis-Napoléon pela sua eleição, o novo Presidente fez dele seu bibliotecário – e conservou-o nesse posto quando proclamou o segundo império. Zeloso e diplomata, soube não criar inimigos e, podendo consagrar-se às Letras, mostrou-se prolífico – todavia, os inúmeros retratos de celebridades nunca foram reunidos e publicados após a sua morte. O Livro do passeante, obra tardia, consiste em curtas meditações acerca das novidades trazidas pelo século. FFF F
09 – Judith Walter (Judith Gautier) – 1845-1917 –, Le livre de jade, 1867 A filha Théophile Gautier – defensor da «arte pela arte», membro fundador do «clube dos haschischins» e anfitrião à cabeça de uma mesa aberta na sua casa de Neuilly – aos dezoito anos inicia-se no chinês com Ding Dunling. «O chinês de Gautier», Ding Dunling, era um refugiado que seu pai recolhera. Aos dezanove anos, publica o seu primeiro artigo, celebrando a tradução de Eureka (de Poe) por Baudelaire – que frequentava assiduamente a casa. Aos vinte anos, publica o seu primeiro livro, O livro de jade, pseudo-tradução de poemas chineses – dois terços são de sua autoria. O seu casamento, aos 21 anos, com Catulle-Mendes causará a separação de seus pais. Só ao cabo de trinta anos conseguirá romper legalmente esse matrimónio infeliz a que Théophile se opunha. Ao longo de toda a sua vida foi mantendo a sua relação com a inspiração oriental, tornou-se musa, ou pelo menos amante, de Richard Wagner e Victo Hugo. Foi a primeira mulher a entrar na Academia Goncourt – sucedendo a Jules Renard que a odiava. Após a sua primeira e precoce experiência, nunca mais praticou o poema em prosa. F 10 – Charles Baudelaire – 1821-1867 –, Le spleen de Paris, 1869 A vida de Baudelaire caracteriza-se pelas contradições. Herdeiro afortunado, após uma viagem marítima interrompida à ilha da Reunião, é acusado de dilapidar as suas posses e colocado sob tutela. Dandy, vê-se reduzido a viver miseravelmente, mudando constantemente de domicílio, mas sustentando Jeanne Duval, a quem transmitiu a sífilis que acabará por vitimá-lo. Crítico agudo, leva a introspecção até definir a imaginação como capacidade de se projectar em outrem. Em 1847, descobre a obra de Edgar Poe e decide traduzi-la. Maltratando a versificação clássica – a ponto de inventar uma «rima normanda», visual mas não fonética –, aprimora os seus poemas durante anos. As flores do mal são judicialmente condenadas mal são publicadas em 1857. Sobrevivendo graças a alguns artigos nos jornais, concebe, em teoria e na prática, a modernidade e o poema em prosa. Endividado, parte em 1864 para a Bélgica, onde se manifestam as primeiras crises de afasia. Morre internado em Paris. O spleen de Paris é editado a título póstumo. F 11 – Isidore Ducasse – 1846-1870, nascido no Uruguay –, Les chants de Maldoror, 1869 Não possuímos muitas informações sobre a vida de Ducasse – foi encontrada uma fotografia sua em 1977. Enviado aos treze anos de Montevideu, onde seu pai ocupava um posto na chancelaria do Consulado, para França onde devia prosseguir estudos – em Tarbes, a seguir em Pau, onde se revelou medíocre aluno –, instala-se em Paris em 1867, após uma curta viagem ao Uruguai. Em edição de autor, começa por publicar um primeiro Canto de Maldoror em Paris, no ano de 1868, depois a obra completa – seis Cantos – na Bélgica, no ano seguinte. Por fim, em Paris, dois opúsculos de Poesias, compostos de aforismos, sendo que o primeiro critica impiedosamente os poetas contemporâneos e o segundo desvia Pensamentos morais de autores clássicos – Pascal, La Rochefoucauld, Vauvenargues. As obras, depositadas na livraria, não são distribuídas. Os cantos de Maldoror serão descobertos em 1885 por Max Waller, director da Jeune Belgique, que os dará a conhecer a Huysmans, Jarry e Rémy de Gourmont, as Poesias copiadas e publicadas por Breton em 1919 a partir do exemplar depositado na Biblioteca Nacional. F 12 – Jean Lahor (Henri Cazalis) – 1840-1909 –, Le livre du néant, 1872, L’illusion, 1875 Henri Cazalis começa por publicar poemas sob o nome Jean Caselli e depois, a partir de 1875, sob o nome Jean Lahor. Médico, tem como paciente – e amigo – Maupassant. Frequenta os poetas parnasianos e, apaixonado pela filosofia e a mística indiana e persa – de que tenta aplicar as concepções – ganha a alcunha de «Hindu do Parnaso contemporâneo». Publica em 1888 uma História da literatura hindu. No seu livro A glória do nada, uma espécie de diário íntimo, aproxima certos enunciados d’A Ilusão – que reveste todavia, em certos trechos, um carácter autobiográfico – da sua fonte indiana. Navega entre considerações metafísicas e notas de natureza quase clínica sobre o cérebro, e desagua em reflexões acerca da poesia. Contudo só é conhecido por artistas – poetas, pintores, músicos – e se alguns dos seus poemas foram musicados – «Sérénade» (Serenata) por Gabriel Fauré, «Chanson triste» (Canção triste) por Henri Duparc, «La danse macabre» (A dança macabra) por Camille SaintSaëns –, o seu nome – os seus nomes – não passaram à posteridade. Não existe nenhuma biografia sua. F
13 – Joris-Karl Huysmans – 1848-1907 –, Le drageoir aux épices, 1874, Croquis parisiens, 1880 Huysmans soube separar a sua vida socioprofissional – funcionário exemplar no Ministério do Interior – da sua vida intelectual e artística. Depois de um livro de poesias em que os versos regulares, os versos livres e os poemas em prosa coexistem, passa a consagrar-se unicamente ao romance – excepto, em 1880, Croquis parisiens onde, por entre cenas e descrições realistas, se encontram alguns poemas em prosa – e à crítica – de arte (elenca as características dos pintores impressionistas e simbolistas em A arte moderne, 1883, e Alguns, 1889, antes de revelar Três primitivos, 1905) e também literária: começa por défender o naturalismo, participando nos «saraus de Medan» organizados por Zola, e a seguir o simbolismo. Os seus romances dão conta dessa evolução, de Acasalamento, 1881, a Ao arrepio, 1884, e O Castelo do homem ancorado, 1887. A partir de 1895 – e do seu romance A caminho –, Huysmans converte-se e torna-se oblata, antecipando a afirmação de autores católicos nas letras francesas no início do século XX – Paul Bourget, Charles Péguy, Paul Claudel, Léon Bloy, etc. – que fundam o «naturalismo espiritualista». FF 14 – Arthur Rimbaud – 1854-1891 –, Illuminations, 1873-1875 (publicado em 1886) Aos 15 anos, o encontro com com um professor – Georges Izambard, que lhe revela Os Miseráveis de Victor Hugo – desperta a vocação poética do adolescente. Rimbaud envia os seus primeiros poemas a Théodore de Banville e depois foge para Paris. Preso à chegada por viajar sem bilhete, pede ao seu professor que lhe pague a multa e refugia-se em Douai, onde febrilmente escreve novos poemas. Apaixona-se pela Comuna de Paris e, a convite de Verlaine a quem enviou alguns poemas novos, regressa à capital em Setembro de 1871. Acolhido pelos poetas da boémia – Cros, Ghil, Cabaner –, multiplica escândalos e provocações. Em 1872, abandonando a esposa, Verlaine foge com ele para Inglaterra. Esta relação tumultuosa acabará com um tiro em Bruxelas. Em 1873, isola-se na quinta da família e escreve Uma estação no inferno que manda imprimir – a irmã propagará, via Claudel, a lenda da destruição desse livro, promovido a «testamento» literário, até ao dia em que os exemplares por pagar foram encontrados na oficina do tipógrafo. Volta a partir para Inglaterra, com Germain Nouveau, que o ajuda a passar a limpo Iluminações. Após o que Rimbaud, que em escassos cinco anos revolucionou todas as formas poéticas – Roubaud analisa a sua prática de destruição sistemática do alexandrino –, inventou as formas novas do verso livre e do poema em prosa, renuncia à literatura e consagra-se às viagens. A partir de 1875, percorre a Europa, alista-se no exército holandês, parte para Java, viaja até ao Egipto, torna-se comerciante – pontualmente traficante de armas – até Áden e ao Harar, e só volta a França para ser amputado de uma perna em 1891. Depois de uma curta estada no seio da família, quer abalar de novo mas morre em Marselha. Entretanto tornara-se uma lenda, graças à publicação, por Verlaine, dos Poetas malditos (1884) e a seguir, sem que o autor disso fosse informado, em 1886, das Iluminações. FF 15 – Germain Nouveau – 1851-1920 –, Notes parisiennes, 1875 (publicado em 1922) Após um ano de ensino em Marselha, em 1872, o jovem Germain Nouveau viaja até Paris onde conhece Cros e descobre no Album zutique os poemas de Verlaine e Rimbaud, que partiram para Inglaterra. Conhece o poeta adolescente em 1874 – numa altura em que Verlaine, que disparou sobre o amigo, está preso em Mons – e juntos partem para Londres onde Nouveau vai ajudar Rimbaud a passar a limpo as Iluminações. Mais tarde travará conhecimento com Verlaine, de quem ficará amigo e a quem entregará o manuscrito que Rimbaud lhe confiara com vista a uma publicação. Após uma passagem pelo Ministério da Instrução Pública, volta a viajar, mudando frequentemente de posto – professor de Francês ou de Desenho. De Beirute (1883-84), traz os seus Sonetos do Líbano. Na sequência duma crise de loucura mística, é internado em 1891. Faz a pé peregrinações até Roma e Santiago de Compostela, imitando São Bento de Labre, «vagabundo de Deus», volta à sua Provença natal e mendiga em Aix. Escreve sob mais de 15 pseudónimos de pena, mas nunca aceitou ser publicado. F 16 – Charles Cros – 1842-1888 –, Le coffret de santal, 1879 É um dos pilares da boémia parisiense. Grande bebedor de absinto, fundador do Círculo dos Zutistes (Cercle des Zutistes), des Hidropatas (Hydropathes), des Homenzinhos Ruins (Vilains Bonhommes), criador a partir de 1874 de monólogos – precursores da stand-up comedy – para o actor Coquelin cadet, os seus amigos poetas vêem nele essencialmente o folião e ignoram tanto o poeta inovador como o inventor de génio – comunica sucessivamente à Academia das Ciências um telégrafo automático (1867), o processo da tricromia para a fotografia a cores (1869) e um aparelho de reprodução de
sons («paléophone», em 1877, um ano antes do fonógrafo de Edison). Porém, perpetuamente falido, obrigado a mudar de casa de três em três meses, sobrevivendo à custa dos saraus da sua amante Nina de Villard, nunca conseguiu realizar nenhuma das suas invenções. Foi contudo em casa dele que Verlaine alojou Rimbaud quando este último chegou a Paris – não se encontraram durante a curta estada do adolescente durante a Comuna que Cros defendeu pelas armas. Morreu alcoólico . F 17 – Théodore de Banville – 1823-1891 –, La lanterne magique, 1883 Amigo de Gautier, Hugo e Baudelaire – que lhe chama «o poeta da felicidade» –, é líder das hostes parnassianas. Poeta precoce – publica As cariátides em 1842 –, preconiza o culto da beleza e combate tanto a poesia realista como a decadência simbolista. Após a consagração do seu livro Odes funambulescas em 1857 – que serão seguidas, em 1869, de Novas odes funambulescas –, consagra-se ao teatro. Em 1871, recebe em sua casa Rimbaud que, de Charleville, anteriormente lhe enviara alguns poemas que o parodiavam – O que se diz ao poeta a propósito de flores. Formalista, em 1872 escreve um Pequeno tratado de poesia francesa, pouco original mas onde afirma que a rima deve ser o motor do pensamento – o poeta fala mesmo (e Aragon lembrar-se-á disso) da «imaginação da rima». Condena formalmente o poema em prosa. No entanto, consagrando-se cada vez mais frequentemente à prosa – narrativas de viagem, retratos literários, recordações e até, por fim, um romance – publica, em 1883, A lanterna mágica, uma série de crónicas que, a diversos títulos, se aparentam a poemas em prosa. FFF 18 – Paul Verlaine – 1844-1896 – Mémoires d’un veuf, 1886 Verlaine, aos 22 ans, com a ajuda da sua prima Elisa, junto de quem cresceu e por quem está apaixonado não obstante ela ser casada, publica os Poemas saturnianos. No ano seguinte, Elisa morre na sequência de um parto e Verlaine refugia-se no álcool. Casa com Mathilde en 1870 , alista-se na Garde Nationale para defender a Comuna, antes de conhecer Rimbaud. A sua tempestuosa relação com o jovem poeta acaba por levá-lo à cadeia onde vai purgar uma pena de dois anos e reencontrar a fé católica. Em 1877, no quadro da sua actividade lectiva de explicador, apaixona-se por um rapaz seu aluno com quem vai viver durante cinco anos – Lucien morre de tuberculose em 1883. Alcoólico, leva uma vida de vagabundo pontuada por algumas conferências, e apaga-se vitimado pela sífilis e por uma pneumonia. Verlaine faz a ponte entre parnasianos e simbolistas. Preocupado com a versificação francesa, defende na sua Arte poética (1884) uma métrica ímpar e um léxico impreciso, preconizando a sugestão em lugar da nomeação. Escreveu uns poucos poemas em prosa que se encontram reunidos com outras crónicas na sua obra semi-autobiográfica Memórias dum viúvo. FFF 19 – Éphraïm Mikhaël – 1866-1890 –, Poésies, 1890 Morre de tuberculose com 23 anos e pouco dele se sabe... Em 1881, migra para Paris com a sua família, publica em várias revistas de poesia e frequenta as «terças-feiras de Mallarmé». Edita uma plaquette em 1886 – com 20 anos de idade – e escreve duas peças de teatro que são representadas no Théâtre Libre em 1888. Decide escrever uma terceira em parceria com Catulle-Mendès mas fina-se antes de a acabar. Nos seus papéis serão encontrados alguns poemas em prosa, publicadas no volume Poesias de sua autoria. F 20 – Stéphane Mallarmé – 1842-1898 –, Vers et prose, 1893 Quando os seus primeiros poemas são publicados em revistas, compreende que não poderá viver da poesia e escolhe o ensino – do inglês. Professor gozado pelos discentes, atravessa uma crise interior, perde a fé e concebe uma estética do nada segundo a qual só o Livro sobreviverá. Mantém relações epistolares com poetas parisienses antes de se instalar na capital após o nascimento do filho – cuja morte, com 8 anos de idade, assombrará toda a sua poesia – e de organizar, em sua casa, uma reunião literária regular, às terças-feiras, onde se cruzam os poetas ditos «simbolistas». Concebe a escrita como uma actividade fundamental mas confidencial, baseada na alusão e na sugestão, assumindo o hermetismo e o «risco de não agradar», ou até «a exclusão da multidão profana». Traduz os poemas de Edgar Poe em prosa. En 1884, Verlaine revela-o ao público n’Os poetas malditos e Huysmans faz dele o poeta preferido do seu herói, des Esseintes, em Ao arrepio. Em 1887 será publicada a primeira edição do seu Álbum de versos e de prosa, numa tiragem de quarenta exemplares. F FIN
21 – Saint-Pol-Roux 1861-1940 –, Les reposoirs de la procession, 1893 André Breton dedicou-lhe o seu primeiro livro de poemas, Luz da terra, 1923, e «àqueles que, como ele, oferecem a si mesmos o Magnífico (título que o poeta atribuíra a si próprio) prazer de se fazer esquecer». Tendo migrado de Marselha para Paris, frequentado as terças-feiras de Mallarmé e fundado com Éphraïm Mikhaël a revista La Pléiade, não tarda a desiludir-se ao constatar a vacuidade dos meios literários e a mediocridade da crítica. Retira-se por vezes para escrever nas Ardenas e na Bretanha até decidir abandonar definitivamente a capital. Instala-se em Camaret-sur-mer onde, em 1905, transforma uma cabana de palha em mansão com vista para o oceano. Escreve sobretudo poemas em prosa: três volumes dos Repositórios da procissão (1893, A Rosa e os espinhos do caminho; 1904, Da pomba ao corvo passando pelo pavão; 1907, As Fantasmagorias interiores). O «mago de Camaret» tem um fim trágico : em 1940, os soldados alemães invadem a sua mansão, ferem os habitante – um deles viola Divine, filha do poeta –, pilham e queimam os seus manuscritos («a obra futura»). Nunca virá a recompor-se do sucedido. F 22 – Marcel Schwob – 1867-1905 –, Mimes, 1893 Primeiro seu pai, depois seu irmão, dirige o jornal Le Phare de la Loire, na cidade de Tours, onde publicará regularmente os seus artigos. Aluno brilhante – no ano em que chumba no concurso de entrada para a École Normale Supérieure, obtém uma Licence de Lettres, ficando classificado em primeiro lugar –, interessa-se por todos os aspectos da escrita, da linguística – frequenta as aulas de Saussure e estudará o calão em Villon –, descobre Stevenson com quem corresponde e cuja obra elogia – mais tarde irá até Samoa para lhe prestar homenagem. Nos livros que escreveu, trata os seus temas sob diferentes ângulos, em capítulos autónomos, como contos narrando a mesma história cada um à sua maneira – variações sobre o visível e o oculto em O rei da máscara de ouro (1892), diversas facetas do despertar para a sensualidade em O livro de Monelle (1894), pontos de vista distintos acerca da Cruzada das crianças (1896) –, pelo que Max Jacob considerou que se tratava de poemas em prosa. Jarry dedicou-lhe Ubu rei, Borges confessa a sua influência. Doente dos intestinos, foi várias vezes operado (1896-97), e passa a viver sob morfina. Morreu vitimado pela gripe. F 23 – Hugues Rebell – 1867-1905 –, Les chants de la pluie et du soleil, 1894 Herdeiro de uma família de armadores e banqueiros, aos 19 anos publica, em edição do autor, um livro de poemas – As quintas-feiras santas - Os desdenhosos. Faz muitas viagens – Alemanha, 1888 e 1891, Holanda, 1889, Inglaterra, 1890, Itália (Veneza e Nápoles), 1892-93, onde escreve Os cantos da chuva e do sol, e um romance, Nichina. Requintado, arrogante e hedonista, ostenta convicções monárquicas e reaccionárias, e, reivindicando a sua ligação a Nietzsche, publica em 1894 União das Três Aristocracias, – as do nome, do dinheiro e do talento –; colecciona os livros raros e as mulheres. Os pais de uma menor que seduziu em Nápoles começam a exercer chantagem sobre o sedutor... Arruína-se aos poucos e, apesar dos seus sucessos de venda em livraria – a partir de 1898 escreve sobretudo romances eróticos (A Meiga, 1899, Entre pele e couraça, 1901, As noites quentes do Cabo francês, 1902) –, assediado pelosa credores, acaba por viver, rodeado dos seus precisos livros, uma existência sórdida, saindo tão-somente após o cair da noite, alimentando-se mal e acabando falecer vitimado por uma peritonite. FF 24 – Pierre Louÿs – 1870-1925, né en Belgique –, Les chansons de Bilitis, 1894 Oriundo duma família de altos funcionários – o seu irmão é diplomata e será embaixador na Rússia – amigo de Gide, de Valéry – de quem publica poemas na luxuosa revista que fundou, intitulada La conque –, de Oscar Wilde – que lhe dedica a edição francesa de Salomé –, militante anti Dreyfus, bibliófilo, erudito e provocador, Louÿs é antes de tudo um escritor erótico, cuja produção vai do realismo maneirista (Afrodite, 1896) à psicologia picante (A mulher e o fantoche, 1898), do picaresco licencioso (As Aventuras do rei Pausole, 1901) à paródia transgressiva (Manual de civilidade para meninas, 1919), do sugestivo para colegiais (As Canções de Bilitis, 1894) à pornografia (Três filhas de sua mãe, publicado clandestinamente em 1926). As Canções de Bilitis, dadas como traduções de uma poetisa grega da antiguidade, rival de Safo, adoptam a forma do poema em prosa. A partir de 1906, praticamente pára de escrever; em 1914, retira-se numa solidão preenchida por livros, arruinado, paralisado e quase cego. F