Para além do paraíso ou como não retratar o vasto mundo

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PARA ALÉM DO PARAÍSO OU COMO NÃO RETRATAR O VASTO MUNDO O belo filme de Jarmusch permaneceu nos ecrãs uma escassa meia semana. O nome e a cara do jovem cineasta não nos eram desconhecidos; recordamos a sua passagem por Nick's movie, a sua presença junto de Nicholas Ray, à «direita» do pai adoptado. Tanto não bastou para despertar a atenção do bando cinéfilo espantado pelo vendaval, ou talvez simplesmente «a ares» lá pelas areias de Tróia. Amigos, sois uns judas! a) A ideia de partir. A fita começa e acaba sem outro arrebatamento que o prazer leviano (e por isso aceitável) de pregar uma partidinha ao espectador. Para satisfazer este modesto objectivo, o cineasta tem de conter a vontade de rir como um bom contador de anedotas. A contenção é a todos os níveis regra de ouro na construção dos espaços do filme, numa lógica de poda. Os personagens de Jarmusch, vindos do frio, roçam-se na sordidez das clausuras, das pequenas lufadas de ar glacial, do desconforto das palavras numa aparente insuficiência heróica, isto apesar de serem utentes do mito e representantes de geração. Jannusch faz dos seus protagonistas — o filme não tem personagens secundários — o que o jardineiro oriental faz às árvores: bonsai. A montagem funciona como tesoura de podar. As fusões intervêm invariavelmente quando a comoção ameaça instalar-se, quando se pressente uma subida de temperatura. Todas as cenas — sempre constituídas por um só plano — acabam com uma fusão. A constância deste processo permite a Jarmusch dar uma base de equivalência às imagens atiradas para o ecrã, e, paralelamente, testar a penetração dramática da sua encenação a ser reflectida pela adesão do espectador. Talhados à medida do anedótico, os personagens ficam fiéis a um modelo programado mas ganham uma graça miniatural. O autor responde ao desejo por eles expresso de serem transplantados, contemplados por um golpe inesperado do destino. Mudar de sítio não basta, como Billy confessa em tom de desabafo, tanto mais que a América parece uma cópia brincalhona dos países de leste. A oportunidade existe, contudo, venha ela ou não nas abas dum chapéu. A boa estrela dos personagens redistribui as suas cartas astrais num lapso de tempo muito curto e nesta timidez hábil se resume a componente passional do filme. A descoberta do ponto de desequilíbrio que aperfeiçoa a ficção (tão conseguido como em Monika de Bergman, ainda que num registo diferente), a saturação de todo aquele preto-e-branco de estufa, a qualidade dos diálogos completamente sintonizados com a paródia do hard em paralelo dão o relevo necessário a este retrato filmado dos tiques da solidão. Jim Jarmusch merece fazer mais filmes; seja onde for… R. G.


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