presépio um auto de Natal para 13 actores a saber: uma virgem Maria, um S. José, um menino Jesus nas palhinhas, uma estrela, aliás cometa, uma vaca, um burro, um pastor, uma pastora, uma ovelha, três reis magos, Baltazar, Melchior e Gaspar, um narrador decorrendo a acção única numa noite única e num lugar único, um curral da cidade de Belém, na Palestina, ou porventura em Porto, Portugal Acto I Cena Única A Estrela (uma menina de cinco pontas, brilhante como um festão, com cauda de lava de vulcão e pouco tento na língua): Que maçada! Não me prenderam bem, daqui a nada malho ao chão e ainda esborracho o menino. (Suspirando) Seja como for, eu sou a artista principal... de todos a mais bem colocada, cá em cima, com vista panorâmica. A mais bem vestida também... os outros, tirando os Reis que ainda não chegaram, são uma cambada de pobretanas. (Revirando os olhos) Foi es-pec-ta-cu-lar este nascimento. Numa terra de jeito, eu teria conduzido multidões até este curral e o feliz acontecimento era transmitido por todos canais, em directo. Ai desculpem, como eu vivo anos e anos-luz, já me ia esquecendo que, nesta época, ainda não existe televisão. A Ovelha (encostada à perna da pastora que olha o menino, boquiaberta, como se nunca tivesse visto uma criança): Ó estrela, cala essa boca, ainda acordas o menino. E a mãe... não vês que a mãe é muito novinha, ficou toda a tremer dos pés à cabeça, de susto e de emoção, e está mesmo a precisar de descansar!!!??? A Estrela (agastada): Sois uns mal-agradecidos. Não fui eu que vos guiei até aqui? Não fui eu que, em pleno solstício de Inverno, varri todas as nuvens e banhei de luz o firmamento, por forma a que o céu ficasse de um azul tão puro como no pino de Agosto? A Pastora (muito comovida): Obrigada, estrela nova, obrigada. Mas agora a luz vem toda daquele monte de palha onde o menino dorme. Parece abrasada, a palha. Até os olhos me doem de olhar para lá. O Pastor (pigarreando antes de falar): Baixa os olhos, mulher, ou fecha-os. Fecha os teus olhos incréus. Este menino não é do nosso mundo. E aos homens só é dado olhar o que podem compreender.