Uma vida conta se em segundos, um filme também

Page 1

UMA VIDA CONTA-SE EM SEGUNDOS, UM FILME TAMBÉM A curta-metragem nunca gozou do prestígio que merece — cf. o nosso artigo «Defesa da curtametragem», in A Grande Ilusão nº 4. Tanto os cineastas como os cinéfilos acalentam um velho complexo de castração que os leva a medir os filmes como no infantário se medem as pilinhas. É inútil repetir uma vez mais que não só alguns dos «maiores» filmes da história do cinema só duram escassos minutos como os maiores cineastas do nosso tempo realizaram curtas-metragens a par das suas longas-metragens. Manoel de Oliveira esteve, aliás, presente nesta 3ª edição do Festival, de Vila do Conde para o reafirmar. Todavia, este Festival, o único neste país, além do que se realiza na Figueira da Foz, a apresentar um programa digno, composto de filmes inéditos e reveladores da pesquisa expressiva no domínio do cinema — enquanto outras manifestações, a pretexto de restrições «temáticas», ora fazem o jogo dos distribuidores (não hesitando até em premiá-los), ora propõem um programa tipo balde do lixo sem qualquer selecção prévia, ora ainda funcionam em círculo fechado e reservado aos convidados... — possui certas qualidades que dele fazem um certame praticamente exemplar: divulgação, contactos e convites que garantem a participação dum público cinéfilo — essencialmente proveniente do norte do país, mas, visto que se trata do mesmo público que se desloca à Figueira da Foz, talvez possamos deduzir que a cinefilia se concentra nesta região —; organização acolhedora e dinâmica, capaz de resolver os problemas técnicos e humanos — que sempre surgem em todos os festivais — com uma rapidez notável; publicação em tempo útil de um catálogo completo dos filmes programados; e, por último, uma programação diversificada e restrita que permite ver todos os filmes em boas condições. Esta contenção ao nível do número de filmes programados implica também uma selecção — assumida — rigorosa, na qual os critérios estéticos dominam. A escolha deste ano, para comemorar o centenário do cinema, recorreu a cinco cineastas que levaram à tela as suas curtas--metragens favoritas e possibilitou o visionamento de selecções históricas europeias (Manoel de Oliveira trouxe-nos o SILÊNCIO de Louis Delluc, ENTR'ACTE de René Clair, A MENINA DOS FÓSFOROS de Jean Renoir, CHUVA de Joris Ivens e Mannus Franken, UM CÃO ANDALUZ de Luís Buñuel e Salvador Dali, CORREIO NOCTURNO de Basil Wright e Harry Wyatt, DOURO FAINA FLUVIAL do próprio Manoel de Oliveira, NAZARÉ, PRAIA DE PESCADORES de José Leitão Barros, A PROPÓSITO DE NICE de Jean Vigo, VIDRO de Bert Haanstra, NOITE E NEVOEIRO de


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.