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MORO E A MORTE DO DIREITO
MORO E A MORTE DO DIREITO
Wadih Damous *
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A decisão judicial que condenou o ex-presidente Lula pode ser analisada por três aspectos: o técnico-jurídico, o histórico e o psicanalítico. Os dois primeiros absolvem o acusado, o terceiro ajuda explicar aquilo que, na lição do jurista italiano Franco Cordero, se denominou de quadro mental paranoico do juiz. Do ponto de vista do rigor técnico-jurídico é importante afirmar que a sentença afronta a exigência constitucional de que fundamentadas sejam todas as decisões judiciais, ainda mais quando em jogo a vida e a liberdade alheias. Ou seja, só é legítima e válida a decisão judicial que indicar, concretamente, as suas premissas lógicas e o caminho racional percorrido pelo magistrado para resolver a contradição entre acusação e defesa. Resolver essa dialética implica, portanto, um trabalho rigoroso de análise da prova colhida durante o processo e se ela seria suficiente para comprovar o quanto alegado na denúncia. Alguns dados ajudam a compreender a absoluta nulidade da sentença que condenou o ex-presidente Lula. 30% da sentença, cerca de sessenta páginas, são utilizados pelo juiz para se defender de acusações de arbitrariedades por ele praticadas contra o acusado e nos processos em que atua. Só 8% cento dela, cerca de dezesseis páginas, são utilizados para rebater e se contrapor ao que o acusado afirmou em seu interrogatório e apenas 0,4% é dedicado às testemunhas da defesa, menos de uma página de um total de 218. A questão central do processo, a titularidade do imóvel que teria sido recebido em contrapartida aos atos que beneficiariam empresas, é tratada pelo juiz com absoluto desdém, a ponto de dizer que no processo “não se está, enfim, discutindo questões de Direito Civil, ou seja, a titularidade formal do imóvel, mas a questão criminal”. Ora, para resolver o processo era fundamental que o Ministério Público provasse ter o ex-presidente recebido o referido imóvel em troca de favorecimentos a terceiros e, para o Código Civil, a única forma disto acontecer é com a transferência da sua titularidade. Em resumo, a sentença pode ser caraterizada como uma expiação narcísica de atos autoritários do juiz sentenciante, preenchida pelo profundo desprezo aos argumentos da defesa e pela miséria jurídica intelectual. Lula estava condenado antes mesmo de ser julgado. A ânsia em condenar a maior liderança popular do Brasil fez com que o juiz furasse uma fila de quatro processos de outros acusados que estavam prontos para sentença desde o ano passado. Tudo isso pela vaidade de tentar recuperar um protagonismo perdido, fruto do crescimento das críticas de setores sociais que antes o apoiavam. O juiz que já havia favorecido Michel Temer ao criminosamente gravar a presidenta Dilma Rousseff e depois divulgar o conteúdo da gravação, novamente o faz, proferindo
* Deputado Federal (PT-RJ), Vice-Líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara e ex-Presidente da OABRJ.
sentença absolutamente ilegal, em meio ao julgamento pela Câmara dos Deputados da admissibilidade de denúncia oferecida perante o STF. É simbólico que a sentença contra Lula tenha sido proferida no dia seguinte à criminosa condenação dos direitos trabalhistas pelo governo ilegítimo que Moro ajudou a estabelecer e agora ajuda a se manter com suas estapafúrdias, ilegais e atabalhoadas decisões judiciais. A esperança é que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região possa, de forma imparcial, reformar a sentença e corrigir essa injustiça manifesta contra o ex-presidente e sua família. No julgamento da história, no entanto, Lula já foi absolvido.