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PREVALÊNCIA DAS CONVICÇÕES NA CONDENAÇÃO DE LULA

PREVALÊNCIA DAS CONVICÇÕES NA CONDENAÇÃO DE LULA Valeir Ertle *

O Brasil assiste estarrecido ao discurso da prevalência, novo argumento utilizado pela classe dominante para impor seus interesses políticos e econômicos, contrariando garantias legais e constitucionais. No mundo do trabalho foi a prevalência do negociado sobre o legislado, que serviu de base para aprovar uma legislação retrógrada, que afronta os direitos conquistados em nosso longo e inconcluso processo civilizatório. No âmbito criminal é a prevalência das convicções, no caso políticas e ideológicas, sobre os direitos individuais e as garantias constitucionais. A condenação sem provas do melhor, mais popular e mais reconhecido presidente da República do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, revela como a prevalência das convicções político-ideológicas sobre a presunção de inocência até prova em contrário, prevista em nosso arcabouço jurídico, leva à condenação, sem provas, de inocentes. A aliança estratégica de um grupo de promotores, de potentes meios de comunicação e de facções partidárias com um juiz politicamente engajado tem resultado na destruição de empresas brasileiras que atuam em setores estratégicos para o país e à condenação de inocentes, enquanto os verdadeiros criminosos são beneficiados por delações sem provas. A referência fundamental destes senhores da Casa Grande está no direito penal do inimigo, do doutrinador alemão Günter Jakobs, que há mais de vinte anos vem sendo disseminada pelo mundo. Tendo como base esta teoria, Lula vem sendo tratado como inimigo do Estado e, como tal, recebe um tratamento discriminatório e diferenciado. Mas, Lula é vítima e inocente. Ao invés de ser condenado deveria ser condecorado pelas políticas públicas e pelo aparelhamento e fortalecimento da polícia federal que realizou durante seus governos. O ex-presidente não é tratado como um cidadão portador de direitos porque apesar da persistente, enfática e sistemática campanha da Globo - de forma articulada com promotores e Moro - contra suas realizações e sua reconhecida liderança política, as pesquisas o apontam em primeiro lugar na disputa para presidente. Tratam-no como um inimigo que precisa ser aniquilado para assegurar a dominação de uma classe proprietária gananciosa e submissa aos interesses do capital internacional. A intelectualidade de extrema-direita tem encontrado na teoria do direito penal do inimigo fonte de inspiração para suas ações contra seus adversários. O que o mundo tem presenciado no Brasil não é outra coisa do que a aplicação desta teoria de inspiração nazista e preconceituosa. Com base nesta teoria a punição do inimigo é antecipada, por isso sustentada em convicções e não por provas; é desproporcional e decorre da supressão das garantias processuais. Daí o sistemático uso de prisões prévias, das chantagens para forçar delações premiadas, cujos prêmios estão diretamente relacionados e dependentes do atendimento dos objetivos das forças políticas e econômicas que pretendem destruir Lula para que não precisem enfrentá-lo nas urnas. Neste contexto, a separação entre

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* Secretário Nacional de Assuntos Jurídicos da CUT.

quem investiga e quem julga é totalmente eliminada, cabendo ao último praticamente liderar os primeiros. Nesta atuação sustentada em interesses político-ideológicos o engajamento dos meios de comunicação é central. A perseguição motivada por uma condenação prévia e sem provas serve ao objetivo de aniquilar o inimigo, a desconstruí-lo política e socialmente. Em um país onde a Casa Grande se enriquece às custas do Estado, onde corruptos e larápios da elite não são punidos, o senso comum é presa fácil de investidas autoritárias, suportadas por ampla campanha nos meios de comunicação. Os americanos vem recorrendo ao direito penal do inimigo há tempos em suas investidas em todo o mundo. A prisão de Guantánamo é um exemplo, dentre tantos outros. As ditaduras militares usaram e abusaram desta forma particular de desconhecer os mais elementares direitos da pessoa humana. Declaram que determinado ser humano é inimigo do Estado, baseado em convicções e interesses políticos, ideológicos e financeiros e as mais elementares garantias legais são suprimidas. A tentativa de prisão de Lula e as formas como vêm sendo conduzidos os processos que contra ele foram abertos revelam a ampla adesão de promotores, juízes, meios de comunicação e facções de direita dos partidos a esta teoria. A utilizam visando aniquilar e inviabilizar a possibilidade de Lula ser candidato a presidente da República, porque sabem do seu reconhecimento e como seria difícil derrotá-lo nas urnas. Assim como as operações desencadeadas pela Polícia Federal recebem nomes adequados para as campanhas publicitárias, a condenação de Lula sem provas a 9 anos e meio tem tudo a ver com as ações de comunicação que a sucederam. Não é por acaso que circulam nas redes sociais piadas relacionando a condenação com a quantidade de dedos do ex-presidente. Na inquisição eram considerados inimigos quem não atendia aos ditames do Estado e da Igreja, e na Alemanha nazista os judeus eram presos e condenados à morte. Diferente não foi a postura das ditaduras latino-americanas, que prenderam, torturaram e mataram militantes por considera-los inimigos do Estado. Da mesma forma fazem com Lula, que tem sido vítima de uma perseguição sem trégua de setores da elite dirigente e empresarial e de partidos políticos capturados pela direita, que não querem o retorno à Presidência da República de um líder que não pertença a classe dominante, especialmente um metalúrgico nordestino, que fez mais pelo povo e pelo Brasil do que todos os governos que o antecederam. A perseguição e injusta condenação, portanto, se articula com o golpe que retirou a força Dilma Rousseff da presidência e colocou em seu lugar uma legião de corruptos, que, apesar de acusados, delatados, e da abundância de provas continuam soltos e ilesos. É impressionante a parcialidade de parte do Poder Judiciário, tendo Moro à frente, que não pune aqueles contra os quais há provas abundantes e condena Lula por convicção político-ideológica, sem qualquer prova. Aos amigos e adversários a presunção da inocência, a um cidadão respeitado, mas considerado seu inimigo de classe, a perseguição, a coação, a desconstrução, recorrendo-se a expedientes da guerra ininterrupta, até sua liquidação.

Outro aspecto relevante da perseguição a Lula é a velocidade. Absolutamente controlada e alinhada ao calendário e agenda dos partidos de direita. Lula foi condenado sem provas no processo do apartamento que nunca foi seu. Mas já preparam nova condenação sem provas, para que não haja tempo sequer de Lula respirar. Trata-se não de uma operação, mas de uma guerra com ataques sucessivos, pois não se trata apenas de punir, mas de desconstruir o que é, o que fez e o que poderá fazer Lula pelo povo brasileiro. O objetivo é impedir que Lula seja candidato a presidente. Não estamos diante de um processo movido visando instaurar a ordem social e acabar com a corrupção, mas a um processo no qual Lula é tratado não com ser humano portador de direitos, mas como uma ameaça a ser extirpada. Por isto, investigadores, julgador, meios de comunicação, e partidos interessados na condenação, juntam-se como se fossem um único exército. Algo em larga medida semelhante ao DOI CODI ou aos SSS de Hitler na Alemanha. Neste exército não cabe adotar os fundamentos do direito penal, separando quem investiga de quem julga. Todas as funções estão misturadas e obedecem a um único comando. Em um contexto como este, marcado e orientado pelo direito penal do inimigo, os fatos não são investigados e as provas não são recolhidas. A condenação é prévia, ocorre no momento em que o inimigo é declarado. Cabe apenas seguir uma agenda adequada aos objetivos políticos da desconstrução da imagem e das realizações que asseguram reconhecimento e liderança a Lula. O desgaste é cotidiano, podendo chegar à destruição física. Acusa-se sistematicamente e nada se prova. Cabe ao acusado provar que é inocente, mas tudo se faz para desconhecer as provas de inocência apresentadas, como ocorreu no caso do apartamento e da chácara. Submetidos à lógica da condenação prévia, o poder judiciário recorre à literatura do direito penal do inimigo para condenar. Enfim, parte-se de um pressuposto falso, de que quanto mais importante a liderança mais difícil a prova, para condenar por convicção. Mas, isto só vale para os inimigos. Pois provas contra políticos e empresários corruptos que pertencem à Casa Grande há em abundância. Mas contra eles nada vale, nem as provas. Já as convicções político ideológicas são utilizadas, nestes casos, em outra direção. A história já absolveu muitos acusados como Lula. Mais cedo ou mais tarde a inocência de nosso presidente será reconhecida. Resta ao povo brasileiro e aos democratas deste país conquistarem esta absolvição a tempo de Lula poder disputar e vencer as próximas eleições, questão essencial para que a classe trabalhadora e nosso Brasil possam retomar o rumo do desenvolvimento sustentável, com distribuição de renda e igualdade de direitos e oportunidades para todos e todas.

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