Idiot Mag nº 25 MAR.14

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6 EDITORIAL J.M.Coutinho 14 ATUALIDADE Situação na Ucrânia 24 ATUALIDADE Slackline

10 VROTEIRO + VER, OUVIRE LER 18 ARTISTA DE CAPA Color Blind Collective 28 ATUALIDADE Zez

32 CINEMA 34 IDIOTA DE RUA 35 IDIOTAS AO PALCO 40 ELETRÓNICA Synopsys 48 HOMOGENEO I Just Want Simple Things 56 LA FOUINIGRAPHE 65 CRÓNICA Guia de Um Jovem...

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36 ISTO E AQUILO Jorge Teixeira 46 INTERVENÇÃO A Adolescência Acaba Quando? 54 INTERVENÇÃO Apenas Precisamos de 15 Minutos 62 PROVOC’ARTE Os Bordados da Joana


Direcção: João Cabral // Nuno Dias Textos: Ana Meira Ana Catarina Ramalho Ana Luísa Carvalho Bernardo Alves Bruno Manso Carmo Pereira Carolina HardCandy Mariana Vaz Nuno Dias Nuno Di Rosso Patrícia (Pseudónimo) Ricardo Branco Rui de Noronha Ozório Tiago Moura Tish Design: João Cabral // Nuno Dias IDIOT, Gabinete de Design® Capa: Color Blind Collective Fotografia: Aline Fournier Lígia Claro Video: CTRL N Rita Laranjeira

Todos os conteúdos são da responsabilidade de: IDIOT, Gabinete de Design ®

Cada redactor tem a liberdade de adoptar, ou não, o novo acordo ortográfico (*) NENHUMA ÁRVORE FOI SACRIFICADA NA IMPRESSÃO DESTA MAGAZINE!

www.IDIOTMAG.com NUNO@IDIOTMAG.COM CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 3


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DEDICAMOS ESTA EDIÇÃO A: J. M. Coutinho Ribeiro EU TENHO MUITOS TRAUMAS. MAS HÁ UM QUE ME PERTURBA SOBREMANEIRA: O NOME. MELHOR: O FACTO DE NÃO TER NOME. OU MELHOR AINDA: A DIFICULDADE COM QUE OS OUTROS ENFRENTAM O FACTO DE EU NÃO TER NOME. SE EU ME CHAMASSE MIGUEL, ERA MIGUEL E PRONTO. OU PEDRO. OU JOÃO. OU ERNESTO. MAS NÃO. OS MEUS PAIS, IMBUÍDOS DO MAIS SÃO DOS SENTIMENTOS, OLHARAM PARA MIM QUANDO EU NASCI E ACHARAM QUE EU TINHA CARA DE VAGAMENTE JOAQUIM E DE VAGAMENTE MANUEL. POR NÃO TEREM TEMPO PARA ESCOLHER, HÁ QUE REGISTAR-ME COMO JOAQUIM MANUEL. ELES NUNCA ME FALARAM SOBRE O ASSUNTO, MAS EU ACHO QUE FOI ASSIM. IMAGINE-SE: JOAQUIM MANUEL! NOS PRIMEIROS ANOS, A COISA RESOLVEU-SE COM ALGUMA FACILIDADE. EU ERA O QUIM MANEL. NEM SÓ QUIM, NEM SÓ MANEL. E AINDA HOJE, PARA OS AMIGOS QUE VÊM DE ENTÃO, EU SOU O QUIM MANEL. PARA A FAMÍLIA TAMBÉM, DESCONTANDO AS MINHAS TIAS MAIS NOVAS QUE RESOLVERAM O TRAUMA COM UM MANOLO. QUANDO SAÍ DO MARCO, ACHEI QUE NÃO DEVIA SER MAIS QUIM MANEL. O MANOLO TAMBÉM NÃO ME PARECIA. MAS NÃO FUI CAPAZ DE OPTAR ENTRE O JOAQUIM E O MANUEL. USAR OS DOIS NOMES ESTAVA FORA DE QUESTÃO, SOBRETUDO PORQUE COMECEI A ESCREVER NOS JORNAIS E ASSINAR COM JOAQUIM MANUEL COUTINHO RIBEIRO OCUPAVA DUAS LINHAS. NA DÚVIDA, APONTEI PARA COUTINHO RIBEIRO. ACHEI QUE ERA SUFICIENTEMENTE EXCLUSIVO PARA NÃO CRIAR CONFUSÕES, ATÉ PORQUE O MEU IRMÃO (QUE SE CHAMA JOÃO CÉLIO, MAS É O CÉLIO) NÃO ESTAVA NO SEGMENTO.

A PARTIR DAÍ, INSTITUCIONALIZOU-SE O COUTINHO. PASSOU A SER UMA ESPÉCIE DE PRIMEIRO NOME (COM ALGUMA VARIANTES: PEQUENO COUTO, DIZIA O FIEL; PETIT COUTAIN, DIZIA O KIKI). FICA MAL, EU SEI, MAS FOI ASSIM QUE ACONTECEU COM UMA ENORME NATURALIDADE. EM COIMBRA, EU ERA O COUTINHO. NO PORTO, TAMBÉM. PARA OS COLEGAS MAIS PRÓXIMOS, SOU O COUTINHO; PARA OS OUTROS, O COUTINHO RIBEIRO. CLARO QUE O PROBLEMA RESSURGE QUANDO A INTIMIDADE SE APERTA. OS HOMENS NÃO LIGAM MUITO A ISSO, MAS AS MULHERES SÃO MAIS DADAS A ESSES PRECIOSISMOS. E QUANDO A INTIMIDADE É MUITA, REALMENTE NÃO FICA MUITO BEM UM AMO-TE COUTINHO. É POUCO POÉTICO. DEMASIADO COMERCIAL, EU ACHO. A MINHA EXMULHER RESOLVEU O ASSUNTO TRATANDO-ME POR NI - TAL COMO EU A TRATAVA -, MAS ISSO FOI ANTES DE EU TER TODOS OS DEFEITOS DO MUNDO. AGORA, PARA ALGUMA AMIGAS, SOU O JOAQUIM. PARA OUTRAS O MANUEL. OU SÓ MANEL. E HÁ AINDA QUEM QUEIRA DAR UM TOM MAIS ÍNTIMO E ME TRATE POR MANÉ. GRRRRR. O TRAUMA CRESCE TODOS OS DIAS. O QUE É LEGÍTIMO. E SUGERE-ME UMA DÚVIDA: DEVO MUDAR DE NOME? QUE TAL HERMENEGILDO? É UM NOME FORTE, INCONFUNDÍVEL, É NOME DE COMANDANTE. E DE SANTO. E DE MÁRTIR. VÁ, MAS DEIXEM-SE DE COISAS: É HERMENEGILDO E PONTO FINAL. NÃO SE LEMBREM DEPOIS DE COMEÇAREM A TRATAR-ME POR DIMINUTIVOS, TIPO GIL OU COISAS DO GÉNERO, QUE EU NÃO ALINHO EM PALHAÇADAS. //J.M. COUTINHO

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Ana Catarina Ramalho

No âmbito do Porto de Encontro – À Conversa com Escritores da Porto Editora, Teolinda Gersão estará à conversa no dia 23 de março, pelas 17 horas, na Biblioteca Municipal Almeida Garrett.

Até 22 de março, o CALE-se – Festival Internacional de Teatro acontece em Gaia. Termina no mês do teatro com uma homenagem à atriz Fernanda Lapa.

A 30 de março tem lugar, pela primeira vez, no Europarque de Santa Maria da Feira, o Festival para Gente Sentada. Na sua 10ª Edição, podemos ver e ouvi You Can’t Win, Charlie Brown, The Veils, Walter Benjamin e Gisela João. Os Best Youth atuarão no dia 22 de março no Pequeno Auditório do Rivoli Teatro Municipal. O ciclo de música, O Som das Estrelas, que os recebe, irá fazer um ano de existência no próximo mês de abril. 10 // www.IDIOTMAG.com

O FANTAS está de volta até dia 9 de março. Serão exibidos mais de 200 filmes, sendo que 10 se tratam de antestreias mundiais. Serão exibidos, por celebrarem 75 anos da sua estreia, os filmes O Feiticeiro de Oz e Tudo

o Vento Levou. Para lá do cinema, também terão lugar exposições de artes plásticas, de fotografias e conferências. Durante todos os dias deste mês, no Teatro Campo Alegre, tem lugar o Ciclo Ingmar Bergman. Com um horário bem simpático: 18h30/ 22h (sábado), 15h30 (domingo).

Este mês não podes perder um dos maiores eventos do ano. A Idiot Mag faz dois anos de existência e, para comemorar com todos os leitores, abrirá as portas da Exponor de 13 a 16 de Março. Naquela que será a semana mais idiota de sempre, - leia-se idiota como referência para fazedores de ideias -, a Idiot Week contará com exposições, mostras, workshops de arte urbana, arte urbana ao vivo, street dance e dj’s, entre outros. A Idiot abre-te as portas, não hesites e entra! De 28 de fevereiro a 24 de junho está patente em Serralves a primeira retrospetiva da artista Mira Schendel, numa organização entre Serralves, o Tate Modern e a Pinacoteca do Estado de São Paulo. De 6 a 9 de março o Eros Porto – Salão Erótico do Porto está de volta à Exponor, com a promessa de trazer mais novidades e diferenças perante as anteriores edições. As Inaugurações Simultâneas em Bombarda surgem no dia 8 de março, serão as primeiras de 2014, e prometem uma ótima tarde entre novas exposições, performances, concertos. //


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NEBRASKA. Alexander Payne (As Confissões de Schmidt”, “Sideways”) traz-nos a aventura de Woody Grant numa viagem ao Nebraska para reclamar um prémio, contra a vontade da família. Relutante, o seu filho decide acompanhá-lo nesta viagem onde os laços fraternais se vão consolidar. Com Bruce Dern (premiado em Cannes como melhor actor, em 2013) Will Forte e June Squibb.

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Depois do primeiro single “Cold Day”, 4 de Março é o dia do lançamento do EP de Black Milk, “GLITCHES IN THE BREAK”. Esperem vibes soulfull e o storytelling do costume.

HISTÓRIAS ROCAMBOLESCAS DA HISTÓRIA DE PORTUGAL, de João Ferreira. “Milagres que nunca existiram, um filho que bate na mãe, um irmão que bate noutro irmão, execuções e assassinatos num país de brandos costumes, heróis que afinal não foram assim tão bonzinhos, reis loucos num país de loucuras, aliados piores que o pior dos inimigos, batalhas vitoriosas com uma mãozinha divina ou grandes desastres militares, traições e conspirações de vão de escada, um rei com gosto por freiras, outro impotente que não conseguia satisfazer a mulher, um governo que nem cinco minutos durou, um atentado onde tudo correu mal e o visado saiu ileso, um ditador temível que resistiu 40 anos no poder até cair de uma cadeira de lona... “ in Bertrand Livreiros // Tish CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 13


SITUAÇÃO NA

Ana Luisa Carvalho

A UCRÂNIA VIVE UMA DAS PIORES CRISES INSTITUCIONAIS DA SUA HISTÓRIA. OS PROTESTOS QUE OCORREM DESDE NOVEMBRO TÊM DEIXADO UM RASTO DE SANGUE, VIOLÊNCIA E DESTRUIÇÃO NO PAÍS.

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A Ucrânia declarou independência a 24 de Agosto de 1991, ainda na ressaca da derrocada do bloco soviético. O processo político de independência foi tranquilo, ao contrário do processo económico. Na década de 90, a Ucrânia viveu o maior processo de empobrecimento que um país (sem guerra) sofreu, ao longo do século XX. Foram dez anos de recessão económica. Um país empobrecido, em crise económica e dividido politicamente, era este o cenário em que se encontrava a Ucrânia no início do século XXI. Neste cenário, a divisão política oscila entre o nacionalismo extremo e os “russistas” extremos, que querem ver o país novamente sob domínio russo. A Rússia nunca viu com bons olhos a aproximação da Ucrânia ao ocidente, e exemplo disso foi a crise no fornecimento de gás natural da Rússia à Ucrânia em 2006 e em 2009, durante governos ucranianos pró-ocidente. No entanto, esses governos, de Yulia Tymoshenko e Yushchenko, foram marcados pela corrupção e pela crise económica de 2008. Foi neste cenário de crise que Viktor Yanukovich venceu as eleições presidenciais de 2010, quebrou com os governos pró-ocidente anteriores e promoveu a aproximação ao regime de Putin.

E chegamos a 2013 e à situação actual. A recusa de Yanukovich em assinar um acordo de livre comércio e associação política entre a Ucrânia e a União Europeia não caiu bem entre os ucranianos, porque ao não assinar o acordo Yanukovich preferiu aceitar o aceno que a Rússia de Putin lhe fez e virar costas à cooperação com a União Europeia que os ucranianos tanto desejam. Esta decisão desencadeou uma onda de manifestações e violência, com os manifestantes a ocuparem o centro de Kiev. Mas a reacção de Yanukovich às manifestações não poderia ter sido pior, pois reprimiu os protestos e conseguiu incentivos financeiros na ordem dos 11 mil milhões por parte do governo de Putin para além da promessa de uma redução no preço do gás. Esta situação provocou os nacionalistas ucranianos, e deu protagonismo aos sectores mais extremistas, porque para os nacionalistas de extrema-direita ucranianos, qualquer coisa é melhor que a Rússia. Para piorar a situação, em Janeiro, Yanukovich promulgou uma lei anti terrorismo para tentar reprimir as manifestações. O resultado foi que os protestos e a repressão policial foram-se tornando mais violentos, até se chegar ao estado actual, onde a possibilidade da Ucrânia viver uma guerra civil parece cada vez mais uma certeza. A onda de violência começou na terça-feira (18 de Fevereiro) quando os manifestantes começaram a marchar para o Parlamento. Os Berkut, as forças especiais da polícia ucraniana, bloquearam o possível assalto ao Parlamento e lançaram um contra-ataque para tomar o acampamento. Nessa noite morreram pelo menos 26 pessoas entre manifestantes e polícia. Na manhã seguinte, as forças especiais tinham conquistado metade do acampamento. A situação pareceu voltar a acalmar, com os Berkut a desmontarem as barricadas da zona que tinham conCULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 15


quistado enquanto, que do outro lado, os manifestantes gritavam que não recuariam mais. A situação agravou-se na manhã de quinta-feira (20 de Fevereiro). Em poucos minutos pelo menos 60 pessoas morreram e centenas ficaram feridas. As forças especiais tiveram que recuar e abandonaram as posições que tinham recuperado no dia anterior. Os dois lados voltaram às suas posições iniciais, três dias e 86 mortos depois. Mas, no meio disto tudo será que existem os bons e os maus? Não, existem os bárbaros e os bárbaros que recorrem a balas verdadeiras e a franco atiradores para fazer prevalecer o lado da sua facção. Ou seja, todos lutam com o que tiverem à mão, sem restrições nem preocupações perante quem lhes aparece pela frente, seja a polícia, sejam manifestantes ou apenas civis que nada têm a ver com este conflito. E ao contrário do que vem sendo dito, os manifestantes não são na sua maioria de extrema-direita. São simplesmente manifestantes descontentes e fartos dos partidos políticos, da corrupção e da falta de oportunidades. Neste conflito, para além desta questão política existe já quem defenda que esta batalha é agora entre a Rússia e o Ocidente. Apesar de a afirmação estar correcta, no conflito ucraniano existem já vários outros conflitos que se estão a sobrepor e a vários níveis. E são eles: >> O conflito entre a Rússia e o Ocidente pela influência na Ucrânia. >> O conflito nacional entre Yanoukovich e a oposição pelo controlo do país. >> O conflito social entre os políticos e os cidadãos que não se sentem representados nem pelo presidente nem pela oposição. >> E o conflito civil entre grupos da extrema-direita nacionalista e a população de língua russa da zona leste do país e da região autónoma da Crimeia.

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Relativamente ao presidente Yunukovich, este está desaparecido desde o dia 22 de Fevereiro, porque não só deixou de ter legitimidade dentro da Ucrânia, como fora dela. Mas o seu desaparecimento está também relacionado com o escalar de violência nas ruas de Kiev, onde “snipers” da polícia atiraram contra os manifestantes e provocaram dezenas de mortos e feridos. Por causa desta situação Viktor Yanukovich é agora procurado pela polícia sob a acusação de assassínio em massa de pessoas inocentes. Nos últimos dias, os deputados tomaram algumas decisões, como a da libertação da antiga primeira-ministra Yulia Timochenko e marcaram eleições para 25 de Maio. Não se sabe qual é o futuro das manifestações nem o que se irá passar daqui para a frente, mas sem a intervenção da comunidade internacional, qualquer cenário poderá vir a ser catastrófico. A Ucrânia é um país muito importante para a Europa, não só porque conta com a maior produção agrícola da Europa, mas sobretudo, porque 60% do gás que a Rússia transporta para a Europa passa por território ucraniano. A possibilidade de uma guerra civil colocaria em risco a produção agrícola do país, mas também os gasodutos que passam pelo país.


Com o banho de sangue que se viveu, a situação é imprevisível. Os confrontos continuam, apesar da assinatura de um acordo de paz. Será já tarde para conter a fúria dos opositores radicais do regime, que querem acabar com a influência russa que ainda existe na Ucrânia? A situação parece estar mais calma agora, mas ainda é cedo para dizer que tudo parece ter acabado. //

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ARTISTAS DE CAPA:

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ESTUDARAM NA ESAD DAS CALDAS, ELA É DE PORTIMÃO E VIVE EM LISBOA HÁ 4 ANOS. ELE É DA CAPITAL ONDE VIVE HÁ 33, APAIXONADO PELA LUZ, BOÉMIA E PELAS RUELAS. TAMARA ALVES, 30 ANOS, E JOSÉ CARVALHO SÃO O COLECTIVO COLORBLIND CONVIDADO A ILUSTRAR A EDIÇÃO PRIMAVERIL. E COR NÃO FALTA. NADINHA. Tish CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 19


Wool LX Factory Open Day, fotografia Pedro Seixo Rodrigues

Idiot – Quando é que se apaixonaram pela ilustração e pelo graffiti? Tamara - Desde que me lembro que desenho e pinto, os meus pais são artistas e cresci no melhor ambiente possível para experimentar, riscar e sujar-me com materiais. A minha avó costuma dizer que se eu tivesse dentro de um poço continuava a pintar. Praticamente não tive muita escolha, desenhar era só o que eu queria fazer desde sempre. Acho que a paixão pelo graffiti surgiu como a paixão que tenho pela cidade, pelo simples facto de parecer algo que me era distante, quase como um sonho (ir a NY por exemplo), tudo relacionado com a urbe, hip-hop, breakdance, graffiti, sempre foi algo que me aliciou. O facto de não o fazer nas ruas fez com que transportasse esse estilo para as telas e ilustração, e aos poucos (quando podia e arriscava) nas paredes, até que se tornou na principal área em que trabalho e o que mais gosto de fazer. Zé - O meu interesse surgiu por in20 // www.IDIOTMAG.com

fluência do meu pai, ele desenhava e fotografava bastante e essa vontade dele acabou por me contagiar de uma forma muito inocente e bastante novo. Comecei a pintar mais a sério a partir dos 15 anos, foi quando o graffiti entrou na minha vida e me mostrou um mundo para além do papel e das telas, embora gostasse e gosto bastante de desenhar em papel, o prazer que descobri ao pintar uma parede, fez com que encarasse uma vida de artista plástico de uma forma mais real e não como hobby. A aventura começou em 1996 com mais 2 amigos, decidimos invadir as paredes das cidades com a nossa vontade pictórica de nos afirmarmos num mundo que estava a despertar em Lisboa e subúrbios, artistas como Youth, Seven ou Obey foram uma grande influência para ter começado a pintar. Ainda hoje tenho memória de um tag do Youth em Algés que me mostrou o poder da caligrafia como arte.


Walk & Talk, Açores

diot - E um dia cruzam as vossas linguagens num colectivo artístico… Tamara - Depois de algumas pinturas em murais interiores e algumas intervenções exteriores, surgiu um convite quando me mudei para Lisboa (em 2010) para pintar um mural com mais 3 artistas, um dos quais era o José Carvalho. Percebemos que temos os dois um estilo parecido no que toca à nossa visão de arte urbana e de nos exprimirmos com as latas de spray e tentamos misturar trabalho (uma das nossas referências principais é o colectivo Herakut) e perceber até que ponto poderia funcionar e o resultado tem sido incrível. Além de que muito do que sei e faço devo-o ao Zé. Idiot - E bebem ambos das mesmas referências artísticas? Tamara – Eu admiro Bernard Buffet, Basquiat, Swoon, Conor Harrington, Herakut, entre muitos outros. Zé - A minha primeira referência foi sem dúvida Van Gogh, depois mais tarde fui-me deixando influenciar por outros artistas como Jasper Jonhs, Sheppard Farey, Swoon...

Idiot - E como colectivo, conseguem definir uma linguagem própria? Tamara - Acho que aos poucos começámos a perceber que o meu traço rígido e a audácia e talento como o Zé mistura as cores era o que nos diferenciava. Eu enquanto artista individual tenho um trabalho com pouca cor, mais rude, o Zé trabalha as cores como ninguém, muitas vezes nem sequer tem traço de contorno. Aos poucos acho que conseguimos a nossa fórmula de trabalho. Sempre representamos animais nos nossos trabalhos, usamos o “tag” como padrão e forma de preenchimento, e começamos por aí, usar um elemento em comum e o que melhor fazemos que nos diferencie. Zé - Acho que o que melhor define o meu estilo pessoal é o uso da cor para criar o caos Nunca fui muito agarrado a um traço que defina o meu desenho, penso que o meu trabalho vive substancialmente da cor e do ruído que gosto de criar nas minhas imagens. CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 21


Evento “Holy Spray”

Idiot - A quem tiram o chapéu? Tamara - Enquanto colectivo, a Herakut sem dúvida! É difícil juntar trabalho e fazê-lo tão bem como eles fazem, é de louvar. Zé - São muitos os nomes que posso citar, mas de momento tenho uma grande admiração em Portugal pelo Gonçalo Mar e o Korleone. Lá fora, artistas como Okuda ou Liquen têm tido uma grande influência no meu trabalho.

Idiot – E o que vos inspira? Zé - É um bocado cliché, mas o que mais me inspira é a vida, a minha e a dos outros. Tento expressar essa mesma vida que observo, as formas diferentes que temos de a percorrer, faço uso do retrato e da vida da natureza, para mim a vida é isso mesmo, uma natureza que experiencia e cresce a cada momento. Uma pessoa ou um animal nunca são iguais todos os dias.

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MR. DHEO 22 // www.IDIOTMAG.com

FEDOR

GOD MESS


Idiot – Querem partilhar com os idiotas os vossos planos e objectivos artísticos? Tamara - Enquanto criadores acho que a escala é sempre um desafio. O objectivo é trabalhar a uma escala cada vez maior e quanto mais viajarmos (para espalhar a cor pelo mundo) melhor! Zé - Pintar, pintar, criar, cada vez mais!

Idiot - Que eventos vos marcaram mais até hoje? Tamara - Enquanto Colorblind, acho que ir aos Açores foi sem dúvida marcante. Ninguém sai daquele festival indiferente (Walk & Talk). Pessoalmente foi uma experiência incrível, mas também porque tenho imensas vertigens (vai ficando melhor), mas trabalhámos Idiot – E Portugal está bem e recomenda- a uma altura de 8 m de altitude e a pri-se nesse sentido? meira meia hora foi terrível. Depois da Tamara - Portugal está a tornar-se ponte 25 de Abril isto não é nada, 12 num dos pontos de referência mundial metros e sem operador de grua... de arte urbana, isto é fantástico, mais trabalho, mais trabalho pago, respei- Idiot - Ilustrar a Idiot não deu vertigens to pelos artistas e mais respeito por mas foi no mínimo…. divertido? um estilo que sempre foi considerado Tamara - Ilustrar a Idiot é sempre divermarginal… (e não me levem a mal, mas tido, a malta é divertida e impecável. acho que faz parte do graffiti ser ilegal, Acho que Colorblind mostra que tem e vai sempre haver arte ilegal a surgir o estilo cada vez mais definido e estapelas parede, faz parte da sua nature- mos ansiosos por pegar numa destas za - é como a história da tartaruga e do ilustrações e ir pintá-la na rua! escorpião). Lisboa é o melhor sítio do Zé - Foi um bocado idiota, com canetas país de momento para ser artista urba- sem tinta e latas sem spray, foi especno, devido ao apoio da CML, dos vários tacular, espero poder voltar a repetir! // projectos existentes que dão oportunidade ao artista de trabalhar, mostrar trabalho e conhecer outros artistas. Zé – Eu acho que o fenómeno do graffiti e arte urbana foi o melhor que aconteceu ao panorama artístico português nos últimos 100 anos. CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 23


Mariana Vaz

É A PERGUNTA QUE CADA VEZ MAIS PESSOAS FAZEM E CUJA RESPOSTA PODEM ENCONTRAR DE 13 A 16 DE MARÇO DURANTE A IDIOTWEEK NA EXPONOR DESPORTO, HOBBY, ESTILO DE VIDA, TERAPIA, MEDITAÇÃO, O SLACKLINE É UMA ATIVIDADE COM VÁRIOS SABORES PARA DIFERENTES GOSTOS E DESCREVÊ-LA COMO ANDAR EM CIMA DE UMA CORDA PRESA A DUAS ÁRVORES, É TÃO ELUCIDATIVO COMO DIZER QUE UM IPHONE SERVE PARA FAZER CHAMADAS.

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Algo entre o desporto e a diversão, as origens do slackline são ainda um tanto ao quanto baças. A arte de se equilibrar em cima de uma linha é já um conceito antigo que remonta às artes circenses. Sabe-se no entanto que foi no começo dos anos 80 que a prática do Slackline enquanto modalidade urbana popular apareceu ligada a uma comunidade de praticantes de escalada que, quer por lazer quer para prática de equilíbrio, começa a montar entre postes, árvores ou qualquer outro objeto protuberante capaz de suportar o seu peso, cordas baixas para em cima delas se equilibrar percorrendo pequenos trajetos em linha reta. Com o tempo a atividade vai ganhando adeptos, evolui, e os pequenos passeios suspensos rapidamente se convertem num carnaval de saltos, acrobacias, rodopios, manobras, e mortais. As cordas, roldanas e arneses de escalada são substituídos por materiais menos técnicos e mais fáceis de montar por um leigo à medida que o desporto ganha um maior número de praticantes. Mais fáceis de montar e menos dispendiosas, as cintas de carga, convenientemente disponíveis em qualquer camião de transporte por perto, são adaptadas e o Slackline começa a espalhar-se um pouco por todo o mundo.

A modalidade chega então a Portugal há cerca 3 anos através de alguns pioneiros que se aventuram a trazer para fora de portas o que viram nos vídeos da internet. André Guedes Vaz não só foi um deles como é um dos fundadores da única loja nacional da modalidade, a Monkeybiz, que para alem de vender material específico ainda promove encontros, atividades e workshops. “Eu particularmente quando conheci o Slackline fiquei maluco, ia todos os dias para o parque da cidade sozinho porque não havia mais ninguém... Depois de abrir a loja comecei a trabalhar com as redes sociais o que permitiu que os outros praticantes isolados se fossem conhecendo e juntando. Hoje já temos um grupo de Slackline - Porto e quando publico no Facebook que vou para o Parque raramente acabo sozinho.” Parte do magnetismo deste desporto é a sua versatilidade. Há variantes para todos os gostos preferências e objetivos, como o Yogaline para quem o simples yoga já não constitui um desafio de equilíbrio e concentração suficiente, o Longline cuja dificuldade assenta em percorrer distancias cada vez maiores sobre a linha, passando pelo Waterline que consiste em camiCULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 25


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nhar ao longo da fita mas sobre água até ao mais aventureiro Trickline que trata a linha como um trampolim. A progressão é rápida e desenvolver cada vez mais estas artes torna-se facilmente um vício. André começou há 3 anos com simples passos e hoje já confortável no mais rebuscado Trickline cativa inúmeros iniciantes atuando em eventos desportivos como campeonatos de surf e escalada um pouco por todo o pais. “A sensação é de que estamos a voar ..Lembro-me de que experimentei a um Sábado, no Parque da Cidade e no dia seguinte às 9 horas da manhã estava a comprar o material para montar. Depois, para aí durante 3 meses acho que treinei todos os dias depois do trabalho porque assim que começas a dar os primeiros passos evoluis em todos os treinos. Ou porque consegues dar mais um passo, ou porque te consegues virar ou virar e baixar...é super gratificante.” Mas nem tudo é diversão , quem praticar slackline regularmente correr também o risco de estar a beneficiar a sua saúde física e mental. O tipo de exercício necessário a esta prática não só melhora o equilíbrio e postura como é conhecido por fortalecer os ligamentos nas articulações ao ponto de ser utilizado como fisioterapia em casos de rotura. Da mesma forma, o aumento da capacidade de concentra-

ção e alivio do stress parecem igualmente ser consequências colaterais destas andanças. “Isto permite evadires-te completamente, como obriga a muita concentração uma pessoa acaba por ter de esquecer os problemas. Para teres desempenho tens de te concentrar.” Para quem quer começar André Guedes Vaz sugere antes de mais a integração num dos muitos grupos de Slackline espalhados pelo pais. “Podes-te juntar a uma comunidade de slackline, como por exemplo o Slackline Porto, de certeza que serás bem recebida e assim podes experimentar com o material de outras pessoas antes de estares a comprar seja o que for.” Existem já comunidades espalhadas um pouco por todo o pais , Évora, Algarve, Setúbal, Lisboa, Castelo Branco, Covilhã... são apenas alguns exemplos do que se está a tornar cada vez mais uma tendência, mas para quem não tiver um núcleo perto de si, é possível adquirir uma linha de iniciação online por cerca de 50 eur na Monkeybiz assim como toda a informação necessária aos interessados na modalidade. Basta procurar em www.monkeybiz-slackline.com ou na página do Facebook . E para quem mal pode esperar para começar a andar na corda bamba é já de dia 13 a 16 a demonstração na IdiotWeek. na Exponor. //

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JÁ ALGUMA VEZ IMAGINARAM UM GATO A VOAR COM UMA LUVA DE BOX CALÇADA? SE A RESPOSTA É POSITIVA, LAMENTO INFORMARVOS QUE NÃO FORAM OS PRIMEIROS. HÁ CERCA DE DOIS MESES, A EMPRESA PORTUENSE ARTBIT LANÇOU NA APPLE STORE UM JOGO QUE PARTE PRECISAMENTE DESSA IMAGEM: CHAMA-SE ZEZ E JÁ ALCANÇOU OS TOPS EM 150 PAÍSES. Carolina Hardcandy 28 // www.IDIOTMAG.com


Para quem não conhece, os criadores descrevem-no, de modo bastante sumário: “É um gato que está no ringue, vai lutar contra um robô grandalhão, e é impulsionado para cima. Quantas mais combinações de três ou quatro robôs em linha fizeres mais sobes e depois mais explosivo é o teu murro”. O objetivo final é, então, o de ajudar o gatinho amarelo a dar uma tareia ao robô malvado e, para isso, embarcamos numa viagem de 60 segundos alucinantes entre fileiras de pequenos robôs coloridos que devemos combinar. Dito desta forma, parece simples. E é mesmo. Não são necessários grandes tutoriais ou truques rebuscados e, por isso, ZEZ é acessível para todos que tenham um iphone / ipad e um minuto para se divertirem. Fui conhecer os homens que inventaram o gato: Pedro Ribeiro, programa-

dor e fundador da Artbit e Zez Vaz, o animador que deu vida às personagens do jogo. Pedro trabalhava como engenheiro eletrotécnico quando começou a fazer alguns jogos para Android como passatempo. No entanto, “os jogos começaram a ficar cada vez melhores e mais complicados, a roubar mais tempo, e eu cheguei à conclusão que estava a gostar mais de fazer os jogos do que do meu trabalho mesmo, então decidi que ia despedir-me e dedicar-me a 100%. Lancei o primeiro jogo feito exclusivamente como programador e foi aí que decidi dar o nome Artbit a esta ‘coisa’”. Fundada a empresa, era necessário encontrar alguém que se encarregasse do aspeto visual, que “fizesse a coisa bonita”, e foi aí que se juntou o animador, “quando o Zez se juntou, posso dizer que a Artbit apareceu realmente”. Quando pergunto qual era a ideia inicial, dizem-me que pretendiam “fazer um jogo muito simples, muito rápido de desenvolver e que tivesse um apelo para toda a gente”. Aquilo que pensaram que demoraria três ou quatro meses a criar acabou por levar mais de um ano. Durante esse período, dedicaram-se inteiramente ao projeto e este teve tanto de gratificante quanto de exaustivo: “Fazer algo que apele a toda a gente é incrivelmente difícil, simplificar sem tornar uma experiência quase infantil é muito complicado e foi isso que sugou a maioria do tempo”. Apesar do processo extremamenCULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 29


te trabalhoso, confessam que, por vezes, queriam fazer alguns testes e às tantas reparavam que estavam a jogar apenas por prazer (“era aí que sabíamos que o jogo estava porreiro”). Quanto áquilo que os influencia, os criadores disparam em várias direções. Sobre jogos, referem aqueles simples e viciantes, como o Fruit Ninja. Também falam dos desenhos animados da Cartoon Network, do Dragon Ball, de comédia (“a comédia acabou por entrar ali, o jogo tem o seu humor”) e até do punk. Não é difícil identificar reminiscências da ética DIY na postura que assumem acerca do trabalho que desenvolvem. Pergunto-lhes se conseguem identificar-se com o rótulo que tanto tem sido usado no nosso país, o de “jovens empreendedores”. Pedro Ribeiro responde-me que, “no sentido de sair da nossa zona de conforto e arriscar um bocado, sim, é isso que estamos a fazer. Identifico-me com as pessoas que tentaram safar-se por si próprias”. Zez Vaz acrescenta: “Isto é a minha banda, agora. Um gajo faz estas coisas em vez de ter uma banda. Eu acho que não sei ser de outra maneira. A liberdade criativa é das melhores coisas que podes ter”. Assumem o seu amor pela cidade do Porto (“O Porto acabou por ter ali uma assinatura no jogo, não foi por acaso”), mas não escondem que o local também tornou o processo de desenvolvimento do jogo mais solitário, uma vez que não conheciam, à data, ninguém que estivesse por perto a trabalhar no mesmo. Saído da Invicta, ZEZ conservou o seu espírito e conquistou jogadores por todo o Mundo. O gato amarelo e os robôs que o acompanham parecem mesmo ter atingido um soft spot no coração daqueles que já os conhecem. Ss reviews são várias e são bastante positivas. Até o Kotaku, uma espécie de bíblia entre os gamers, declarou publicamente o seu fraquinho por ZEZ, numa entusiasta crítica intitulada “Forget The Candy Crush Clones, This Match Game Is Like No Other”. 30 // www.IDIOTMAG.com

O feedback favorável que estão a receber não significa, no entanto, que tenham dado o trabalho por terminado. Revelam que, embora existam já planos de projetos futuros, estão ainda concentrados no jogo que lançaram e prometem um update que irá “incluir uma componente social para partilhar pontuações e puxar pela vontade de bater a pontuação máxima”. Durante o processo de criação, pensavam que ZEZ seria “o início ou o fim da Artbit”.


Tudo indica que será apenas o princípio do sucesso, embora não escondam que o retorno financeiro “ainda tenha de sofrer uma reviravolta brutal” para compensar os esforços. Sobre o começo risonho junto do público, esclarecem: “tivemos algumas sortes, mas nós apontámos para isso. Acabámos por conseguir o que pretendíamos, foi planeado e correu bem”. Consideram que um dos melhores elogios que recebem é o de ouvir alguém

dizer “eu nunca jogo nada e adoro jogar ZEZ!” (situação onde, aliás, me incluo). Nunca escrevi sobre jogos e se o faço hoje não é por acaso. Num tempo em que ouvimos falar diariamente de crise, desemprego e falta de perspetivas e oportunidades para os mais jovens, é reconfortante saber que há aqui, tão perto de nós, quem arrisque fazer aquilo de que gosta e consiga cumprir os seus objetivos. ZEZ ainda agora começou e já é uma história com final feliz. // CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 31


Crítica por:

Ricardo Branco

A GRANDE BELEZA de Paolo Sorrentino (2013)

A câmara viaja em travellings e enquadramentos irreverentes, os actores gritam e fazem barulho, um coro e uma voz específica. Ostentação de riqueza, sítios belos e um azul do mar demasiado atraente. Um circo. O homem Feliniano. A herança nota-se, mas não resulta. A Grande Beleza figura nas listas de melhores filmes de 2013 e chega agora às salas de cinema portuguesas. Paolo Sorrentino queria criar La Dolce Vita dos tempos modernos - ele próprio fala dessa modernização durante o filme através duma escritora falhada - chamou-lhe La Grande Bellezza e encheu esta análise à sociedade de Roma de referências eruditas e imagens esplendo-

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rosas. Não pegou numa qualquer camada social, mas sim no créme de la créme: o verdadeiro estatuto do rico fare niente. A profissão é comum a todos: são ricos e presunçosamente - até falaciosamente vivem numa bolha de falsa superioridade porque têm dinheiro e leram Proust. O nosso protagonista vive à custa dos louros do único romance que escreveu, romance esse a que deu o nome de algo parecido com “o aparato do homem” e é precisamente isso que nos aparece nesta longa metragem: nada mais que o aparato; esse mesmo aparato que fez de Fellini (irrefutavelmente) um grande cineasta, em Sorrentino torna-se simplesmente pretensioso e demasiado artificial. Ele quer equiparar-se aos grandes, mostrar que pode reinventar os seus pais como Antonioni e Pasolini também, mas essa obsessão acaba por trai-lo e concluir naquilo que podíamos chamar de “A Vazia Vida”. Um protagonista que nos guia na sua linha de pensamento com uma narração castradora e um segredo que guarda até ao desenlace que afinal não era assim tão importante. Uma frustração, uma história de que Flaubert queria escrever um livro sobre nada, mas em vão; mas Paolo Sorrentino está de parabéns por isso, fez um bem filmado filme sobre nada.


UM NOVO FÔLEGO de Drake Doremus (2014)

Uma fixação oral, uma boca e uma respiração calma. Um piano, um violoncelo e uma vida virada de pernas para o ar. A paixão não se chega bem a sentir, trata-se antes da busca intensiva por uma mudança. Depois do aclamado Like Crazy, Doremus volta a trabalhar com Felicity Jones que dá de novo vida a uma estudante britânica que vem de intercâmbio estudar para a América. Neste novo filme o caso é diferente, trata-se de ser acolhida por uma família e tornar-se colega da filha de um casal de classe média alta - é precisamente aí que surge o conflito. Keith, o pai de família, (que é brilhantemente representado por Guy Pearce) está a passar por uma crise de meia idade - perfeitamente justificável quando percebemos que ele é um músico cujos sonhos falharam e se encontra aprisionado numa vida que a sua mulher desejou para ele: um emprego estável como professor que o agonia e que Keith despreza. O título em português Um Novo Fôlego

remete-nos para a clarificação da metáfora que o original Breathe In representava: referência a um exercício de respiração que Sophie (Felicity) o incita a fazer no intuito de o relaxar: é ela o novo fôlego na vida de Keith e não são os nervos que o sufocam, mas a sua mulher e a sua própria vida. Ela fica logo caída por ele como se por um complexo de Édipo: e o interesse dele aumenta a cada conversa que partilham - ela interessa-se por ele e pela felicidade dele. Ela orgulha-se dele duma forma que o resto da família não o faz. E a tentação é perigosa, a monotonia frustrante e o desejo está tão reprimido como a vida de Keith. Drake Doremus apresenta-nos um filme realizado nos mesmos tons indie do seu cinema americano - a cor é bonita como em Like Crazy, mas a emoção menos intensa e talvez uma história menos interessante. A crueldade continua lá e a preocupação narrativa parece semelhante: mexer no que está estanque metendo o dedo na ferida, para mais tarde nos trazer de volta ao início - completando um círculo perfeito, como num romance. Um realizador promissor, preocupado em captar a tensão com a sua câmara e a fazê-lo também ele com um fôlego novo. //

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A Idiot encontrou a Vanessa Silva de 22 anos no Modatex, uma escola de moda, onde muitos idiotas passeiam as suas ideias criativas nos corredores. A Vanessa está a estudar Alfaiataria e diz que está a adorar. mas o seu objetivo é estudar Design de Moda. Veio de comboio de Viana do Castelo para o Porto para poder estudar aquilo que mais gosta de fazer. Neste momento, só respira os ares de Viana aos fins de semana. Quer seguir uma vida profissional na área da moda e, quem sabe, não deixar morrer a tradição dos alfaiates. Outra das suas paixões é o desenho a caneta Bic, e posso-vos dizer que a caneta na sua mão desliza sobre o papel, onde deixa linhas desarrumadas mas bonitas, tendo um trabalho final interessante. Não se esqueçam do nome desta nossa idiota porque ainda vai dar muito que falar. // Bruno Manso

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A ARTE DA FÉNIX RENASCIDA NO MÊS PASSADO ASSISTI A UMA DAS RAZÕES PELAS QUAIS ME APAIXONEI PELO TEATRO – A CAPACIDADE QUE A MESMA PESSOA TEM DE CONSEGUIR ESCREVER PEÇAS EM DIFERENTES TONS, COM TEMAS E CENÁRIOS COMPLETAMENTE OPOSTOS.

Teatro Carlos Alberto fotografia João Tuna

Tal como anunciei no mês passado, estiveram em cena Coriolano e Como Queiram, ambos de Shakespeare, o que veio acentuar esta tendência última de encenação de textos do autor inglês. A que se deve, no entanto, esta tendência? Será causa dos tempos que correm ou será uma tentativa de chamar público ao teatro? É de conhecimento mundial que William Shakespeare é o pai da língua inglesa, mas a sua existência está envolta numa atmosfera de mistério, visto que nem todos concordam sobre a sua vida. A verdade é que, existindo ou não, foi um dos responsáveis pelo enriquecimento do léxico inglês, introduzindo cerca de seis mil novas palavras. Esta tendência que se tem vindo a gerar, de encenação de textos de grandes mestres, preocupa-me por duas razões. Uma porque é uma tentativa de chamar a atenção do público. Uma tentativa algo fútil esta de chamar a atenção através da sonância e importância de um nome, mas a verdade é que muitas vezes ainda se vive de aparência e ir ao teatro ver um ‘shakespeare’ acaba por nos tornar ‘chiques e inteligentes’ aos olhos dos outros. Por outro lado, esta tendência pode muito bem estar relacionada com a crise que atinge os bolsos de todos e da cultura em particular. Neste país onde nem um ministério da cultura existe, os que lutam por ela lutam com pouco. Uma das armas é, assim, contornar a situação e encenar autores cujos direitos estejam caducados e não se tenha de pagar a mais por isso. E, às

vezes, é mesmo isso o que faz de uma peça, ser uma grande peça. Já sem os ideais renascentistas de enaltecimento ao Homem, mas já na corrente modernista, este mês é de ressalvar a presença de Fernando Pessoa no teatro. Durante o mês de março será este o nome que irá ser ouvido e as perguntas acima assombram-me novamente. Será que se não houvesse esta crise na cultura, estaríamos agora a encenar textos de novos dramaturgos? Ou continuaríamos nesta tentativa de fazer do passado o novo presente? Certo é que o Mosteiro de São Bento da Vitória recebe, de 12 a 16 de março, O Segundo Raio de Luz de Luar que trabalha sobre a vida e obra de Fernando Pessoa através do teatro e dança. O Teatro Nacional São João apresenta a reposição da peça Turismo Infinito de António M. Feijó, de 13 a 26 de março, com uma encenação de Ricardo Pais. Os heterónimos e algumas personagens de Pessoa voltam ao palco, numa das peças mais profundas e espetaculares peças que já vi. E para celebrar o Dia Mundial do Teatro, Ricardo Pais encena Al Mada Nada a partir de Almada Negreiros, uma peça que promete ser dinâmica já que conta com a participação dos Momentum Crew. Neste dia de comemoração o Teatro Carlos Alberto recebe, em estreia absoluta, O Filho de Mil Homens, com base no romance homónimo de Valter Hugo Mãe, após um laboratório de criação proporcionado pelo Teatro Bruto. // Ana Catarina Ramalho CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 35


FOTOGRAFIA À LUZ DE JORGE TEIXEIRA texto: Mariana Vaz 36 // www.IDIOTMAG.com


DE CURIOSO A PROFISSIONAL, FOI COM A NOITE QUE JORGE TEIXEIRA VEIO À LUZ. FOTÓGRAFO AUTODIDATA HÁ 8 ANOS, PARTIU DA FOTOGRAFIA DE EVENTOS NOTURNOS PARA DAR INÍCIO A UM PORTEFÓLIO ÚNICO E ORIGINAL QUE TODOS OS DIAS ATRAI A ATENÇÃO DE NOVOS SEGUIDORES DENTRO E FORA DO PAÍS. Inevitável. Ao longo da história muitos foram aqueles que sentiram o chamamento do meio artístico... O enleio da serpente, o canto da sereia, aquele momento em que o padre deixa batina e crucifixo para seguir outras mais veementes paixões... “Nada disto estava planeado. O meu rumo era totalmente diferente... Quando disse aos meus pais que queria fazer fotografia nem me levaram a sério.” Acabado o 12º ano, Jorge Teixeira, ainda de tenra idade, visionava uma carreira promissora no campo da programação informática. Mas foi nessa altura que o seu caminho se cruzou com uma das primeiras máquinas fotográficas digitais. Fascinado pela tecnologia e dono de um olhar curiosamente peculiar, Jorge deixa-se levar pelas delícias da recém chegada. Tornam-se inseparáveis. Com todo o poder dos seus 4 Megapixeis, a sua nova câmara proporciona-lhe horas e horas de disparos gratuitos, sem mais nenhuma consequência ulterior que não a diversão, a aprendizagem e os aperfeiçoamentos técnicos. “Não ia para nenhum sítio sem a máquina. Comecei a fotografar concertos e bandas nacionais. Fazia umas coisas engraçadas para a altura: fotos com exposição lenta, arrastamentos... e depois a edição.” O seu estilo foi maturando com a prática e daí até à fotografia de eventos noturnos (clubbing) foi um pequeno salto. Jorge estreou-se como fotógrafo residente no clube Indústria, no Porto, o que lhe deu oportunidade para lidar mais de perto com novas caras, temas e situações. Seguem-se outras grandes casas noturnas - como o Pacha, através do qual começa a colaborar com a Idiot Mag, e

o Twins - que muito contribuem para a popularidade dos seus trabalhos. ”As pessoas gostam do resultado e passam a palavra. No clubbing a abordagem é mais fácil, mais direta, para além de que me dá oportunidade de fazer uma edição mais característica do meu estilo pessoal”. Nutrido por uma forte influência cinematográfica e por trabalhos de nomes nacionais e internacionais da fotografia como Orlando Gonçalves, Frederico Martins, José Ferreira, Mert & Marcus, Terry Richardson, entre outros, ao fim de 8 anos como fotografo profissional, Jorge Teixeira conta já com um portefólio bastante diverso. Reportagens de eventos, fotografia de moda, catálogos, editoriais, books, fotografia artística... tudo com o seu cunho pessoal que transforma cada vez mais clientes satisfeitos em fãs. “Não tenho nenhum marco especial na minha carreira. Quando depois de acabar um trabalho com um cliente, ele volta, isso para mim é que é especial.” Iluminação simples, natural, um look puro e clean... Luz, momento, tempo, tema, pessoas são a matéria prima do seu mundo, descodificados em aberturas, velocidades, distancias focais e outras tais especificações que, juntas, pugnam por uma imagética sincera e verdadeira, muito própria e característica do fotógrafo.

“TENTO FUGIR AO ESTÚDIO, O ESTÚDIO VAI CONTRA O MEU TRABALHO.” Mas que o trabalho artístico não são só rosas já todos o sabem e o trabalho artístico freelance, em época de criCULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 37


se, então só mesmo quem está nele é que pode ter o privilégio de apreciar por inteiro toda a gama de vicissitudes que se lhe opõem das mais variadas formas. “Trabalhos fotográficos em freelance nunca são fáceis, nem em Portugal nem em lado nenhum, aliás como qualquer trabalho artístico. O mais importante é ter os conhecimentos certos e ideias novas, passar a palavra e não desistir!” Na verdade, a madrasta da fotografia digital oferece com uma mão mas também esbofeteia avidamente de régua em punho com a outra. A vantagem de não existirem custos de material consumível (rolos de filme, papel fotográfico..) rapidamente se torna alvo de exploração, uma vez que muitos clientes exploram jovens fotógrafos para fazer trabalhos não pagos. “Não se começa a fotografar de borla. O cliente vai sempre retirar lucro do nosso trabalho e isso é altamente injusto.”

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Da mesma forma, a pandemia cibernáutica de fotógrafos amadores só vem acrescentar entropia a um mercado que ainda não percebe muito bem a diferença entre um trabalho profissional e outro amador, e que apenas está interessado no baixo custo. “Há muita gente que tem um filho ou sobrinho com uma boa máquina e que fotografa em automático. Não tiram partido da câmara e cortam qualquer possibilidade de desenvolver algo mais estilístico e criativo. Eu não faço trabalhos mais comerciais, como casamentos, porque também sei que não sou o melhor para os fazer. Não é o meu tipo de técnica. Para tudo é preciso uma técnica específica.” Há ainda muito para explorar no tra-

balho de Jorge Teixeira. Fotografia de viagem será o próximo passo. Inspirado pelo legado do fotografo português Joel Santos, também Jorge não consegue esconder a vontade de partir mundo fora ao encontro de novos lugares e expressões. ” Adoro viajar, e aliar isso à fotografia era fantástico! O simples facto de andar pela rua de máquina ao peito é incrível. Fotografar o dia-a-dia, as pessoas, fotografar isto e aquilo...” // Enquanto não perdemos Jorge Teixeira pelo mundo, encontrem-no online em:

- www.jorgeteixeira.com - www.facebook.com/JorgeTeixeira.Photography www.behance.net/JorgeTeixeiraDotCom CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 39


HÁ 3 ANOS COM O TECHNO NOS OUVIDOS

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MAIS DE 4 DÉCADAS SEPARAM O NASCIMENTO DO ESTILO ELETRÓNICO MAIS PURO DE SEMPRE E O SURGIMENTO DA SYNOPYS PROD. ASSIM COMO DE DETROIT CHEGOU AO RESTO DO MUNDO, O TECHNO PROPAGA-SE PELO NORTE DE PORTUGAL PELAS MÃOS DA PRODUTORA, QUAL AMBICIOSO JUAN ATKINS NOS CONFINS DAS SUAS PRODUÇÕES ENTRE SINTETIZADORES E SONS DE ALMA COMPUTADORIZADA. BENDITA SEJA ESSA TUA OUSADIA, Ó MESTRE ATKINS, QUE DO GÉLIDO CENÁRIO INDUSTRIAL DA CIDADE AMERICANA CRIASTE O QUE HOJE FAZ DANÇAR A 120 BPMS OS VERDADEIROS AMANTES DA MÚSICA MAIS VIBRANTE DE SEMPRE.

Na época em que o excesso de synths domina, o repetitivo diferencia-se e o trabalho da produtora e promotora bracarense ganha forma em espaços à medida da sua ambição mas sempre, de olhos postos nos artistas de verdadeiro espírito eletrónico. Desprovida de protagonismo comercial, a vontade de honrar a cultura techno é o que mais tem agitado o crescimento da Synopsys Prod pela equipa de Marisa Martins, a mentora do projeto. CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 41


Já lá vão 4 anos de trabalho intenso e festas regulares com artistas internacionais que ultrapassam o patamar do conceito mais tradicional da dancefloor para um nível mais profundo: o da real experiência musical. Assim têm sido os “arraiais eletrónicos” promovidos pela produtora, com nomes como Alberto Pascual, Jeroen Search , Hobo e a mais recente aposta para a próxima festa de dia 28 de março no Gare Porto, Exium, a transportar para outro universo a necessidade de dançar até que o corpo não possa mais. Outros conceitos são ainda o motor que faz mover a Synopsys Prod. As festas Music Makers e Subculture que presenteiam os mais diversos produtores nacionais e o agenciamento de talentos emergentes do mundo da techno e da house como Bruno Tinoco, Sepypes, João Ferraz, Whyzen e a mais recente parceria com Pedro Vasconcelos, são outras razões que tornam a Synopys Prod numa das promotoras com mais potencial dentro da atual cena eletrónica. // Filipa Nascimento

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palco:

Nuno carneiro 42 // www.IDIOTMAG.com

DJ DA NI

Nuno DI ROSSO

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Desde 2010 que Nuno Di Rosso comprova a ligação existente entre os vários estilos de música. todas as sextas a partir das 22 podemos contemplar a natural polivalência que define o registo do autor. São duas horas de uma viagem ao universo de Nuno di Rosso, que debita, propositadamente, os vários caminhos da busca incessante de um melómano, pela qual se tem vindo a pautar anos a fio.

Constrói e desconstrói a perspectiva histórica da música de dança, sem nunca descurar a importância de grandes rótulos indevidos, como a soul, o funk, o house, o hip-hop, o disco, o techno entre todos os outros que, de alguma forma, se conectam entre eles. Para quem já se habituou às suas actuações como dj, o resultado define-se pela provocação de uma verdadeira revelação àqueles que insistem em determinar fronteiras, e como uma ligação com os mais atentos.

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ESTAVA EU A LER UMA DAQUELAS REVISTAS DEDICADAS AO PÚBLICO FEMININO (AQUELA QUE É FELIZ NO NOME), QUANDO ME DEPAREI COM UM PEQUENO ARTIGO ONDE SE FALAVA DA ADOLESCÊNCIA. SEGUNDO O TAL ARTIGO, O PERÍODO DA ADOLESCÊNCIA AGORA VAI ATÉ AOS 25 ANOS, E NÃO ATÉ AOS ANTERIORES 18 ANOS. ORA CÁ ESTÁ UMA COISA QUE DESCONHECIA! ENTÃO AQUELA IDEIA QUE TODOS TEMOS DE QUE AOS 18 ANOS JÁ SOMOS ADULTOS, NÃO É REAL? Ana Luisa Carvalho 46 // www.IDIOTMAG.com


Está bem que ainda não me sustento sozinha, dependo dos meus pais, mas daí a ser considerada adolescente ainda vai muito. Seguindo a mesma linha de raciocínio, se aos 25 anos somos ainda adolescentes, então quando é que vamos entrar na chamada terceira idade? Aos 80, aos 90, ou até mesmo aos 100? A explicação para esta “nova descoberta” é que os psicólogos chegaram a esta conclusão após terem analisado a maturidade emocional, o desenvolvimento hormonal e a actividade cerebral dos jovens e perceberam que tudo se alterou. Como afirma a psicóloga britânica Laverne Antrobus: “Os jovens ainda precisam de uma quantidade considerável de apoio e ajuda para além dos 18 anos”. E por isso, resolveram fazer uma nova divisão da adolescência. Assim sendo, a adolescência agora divide-se em três fases: o início (entre os 12 e os 14 anos), o meio (entre os 15 e os 17 anos) e o final (entre os 18 e os 25 anos). Mas porquê os 25 anos? Segundo a tal psicóloga britânica, o desenvolvimento cognitivo das pessoas continua até aos 25 anos, assim como o desenvolvimento hormonal, a maturidade emocional e a imagem que cada um faz de si próprio. Só aos 25 anos é que o nosso cérebro está desenvolvido completamente. Na minha opinião, tudo depende da maturidade ou do sentido de responsabilidade de cada um. Hoje em dia, os jovens perderam a aspiração pela independência e tendem a ser cada vez mais infantilizados, o que faz com

que a permanência em casa dos pais dure até mais tarde, ao contrário do que se passava antigamente quando os jovens procuravam sair o mais depressa possível da casa dos pais, para terem a sua própria independência. Hoje em dia existem dois tipos de jovens: os que não querem deixar a adolescência para trás, e outros que querem romper com os pais e tornarem-se adultos, mas que têm muitas dificuldades em cortar os laços familiares. Neste sentido, a cultura da infantilização acabou por intensificar também, o sentimento da dependência passiva, prejudicando a condução dos relacionamentos adultos. Este efeito cumulativo da infantilização é visto como responsável por este fenómeno. Os pais “prendem” cada vez mais as suas crianças. É-lhes difícil deixá-las viver as experiências do mundo real, pelo contrário, tendem a isola-las dessas mesmas experiências por muito tempo. A perda da aspiração pela independência e o medo de viver sozinho originou uma mudança cultural que fez com que a adolescência agora se estenda até aos vinte e muitos anos. Mas isso pode vir a prejudicar os jovens de diversas maneiras. E é aqui que entra a psicologia, cujo papel é reforçar este tipo de passividade, impotência e imaturidade e tentar normalizar a situação. Mas agora deixo uma pergunta. Com tamanha actividade hormonal, e com a adolescência a durar mais do que se pensava, como é que iremos nós saber quando atingimos realmente a idade adulta? // CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 47


I JUST WANT THE SIMPLE THINGS

texto: Tiago Moura

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A CADEIA TELEVISIVA NORTE AMERICANA HBO ANUNCIOU RECENTEMENTE A RENOVAÇÃO CONTRATUAL DA LOOKING, SÉRIE DE ANDREW HAIGH QUE SEGUE OS DIAS DE TRÊS AMIGOS E AS SUAS AVENTURAS AMOROSAS. A SÉRIE TEM RECEBIDO CRÍTICAS POR SER MONÓTONA, MAS OUTROS LOUVAM A SUA HONESTIDADE EM MOSTRAR PERSONAGENS LGBT DIFERENTES DO QUE O ESPETADOR ESTÁ HABITUADO A ASSISTIR.

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Hoje em dia, devemos perguntar se é suficiente a simples inclusão ou se devemos questionar a qualidade da referência. Tanto no panorama norte-americano (o maior mercado televisivo ocidental) como na nossa própria televisão, a presença de figuras LGBT já não é uma montanha a escalar, mas uma situação que a repetição vem a suavizar o estranhamento. Entre a programação diária das principais estações, somos capazes de apontar (não literalmente, porque isso é feio) alguém pertencente à comunidade LGBT: de personagens de telenovelas ou séries, dos seus atores e atrizes, de apresentadores e apresentadoras e até concorrentes de reality shows, já não existe a questão de se poder ignorar a sua existência. Contudo, é altura de começar a questionar o modo como os meios de comunicação social, e principalmente os produtos de ficção, representam a comunidade LGBT. Se no mundo anglo-americano esta é já uma questão para qual os espetadores e a crítica estão mais sensibilizados (o que não significa que sejam mais sensíveis), é uma situação recente para a nossa cultura. Nos últimos dois anos, a SIC e a TVI colocaram em horário nobre (e em produções nacionais) diferentes personagens que são, em parte, exatamente isso: diferentes. Tanto em Sol de Inverno como em O beijo do escorpião, as principais telenovelas das duas estações, existe um casal gay em diferentes etapas da sua relação: na produção da SIC, Ângelo Rodrigues e Rui Neto desempenham um casal de jovens pais e a sua narrativa dentro da telenovela desenrolará num drama jurídico sobre a custódia da filha adotiva, após a morte de uma das personagens; por outro lado, na TVI, Vítor Silva e Costa e Pedro Carvalho interpretam um casal recluso, onde a sua narrativa passa por muitos encontros fortuitos e tórridos q.b. De sublinhar, também, Lourenço Cunha, concorrente da Casa dos Segredos 4, que ao revelar ser transexual deu uma enorme visibilidade ao tema. Não sendo estes os únicos casos de personagens LGBT, os casais homossexuais das telenovelas já referidas demonstram a bipolaridade no modo de representação a que estamos habituados, principalmente em produções fictícias: por um lado existe o lado pedagógico, em que o principal foco narratológico do casal 50 // www.IDIOTMAG.com

Ângelo Rodrigues e Rui Neto

de Sol de Inverno enfatiza o ato de exposição de uma realidade diferente, mas forçosamente normal. Não é uma estratégia errada, porque não nos podemos esquecer que o principal objetivo de um programa televisivo é obter audiências (e, na atual conjuntura, um casal gay com uma criança adotiva é algo capaz de chamar muitos espetadores), mas tal como acontece na produção da TVI, onde as personagens de Vítor Silva e Costa e Pedro Carvalho são ferramentas de choque através da sua sexualidade, acaba por ser uma representação redutiva, pois ambos concentram-se em pontos isolados. Podendo isto não passar por uma escolha deliberada dos argumentistas, pois normalmente estas personagens ocupam um papel secundário na ação e nunca há espaço suficiente para desenvolver eloquentemente todas as personagens, um problema que pode resultar da repetição destas escolhas criativas é a criação de chavões ou estereótipos em tor-


no da comunidade LGBT. Trata-se, então, novamente, de uma questão de espaço. Não um espaço reivindicativo da inclusão ou das suas diferenças (quase relembrando as vagas iniciais do feminismo), mas um espaço que permita a representação fluída da sua identidade. Ao virar do século, a RTP foi pioneira nesta questão, ao exibir séries focadas em personagens homossexuais, onde era dado espaço para mostrar mais que a sua sexualidade e questões com ela relacionada. Falamos de Sete Palmos de Terra, de Alan Ball, de Diferentes como nós e A letra L, todas transmitidas pela RTP2, onde as personagens não eram interessantes por serem homossexuais, mas por serem personagens multifacetadas. No início de 2014, a HBO estreou Looking. Criada por Andrew Haigh, realizador do aclamado filme Weekend, a série apresenta-nos o dia a dia de Patrick, Agustín e Dom, três amigos de São Francisco. Dada a sua estru-

tura, a série tem vindo a ser comparada a uma versão gay de Girls, mas enquanto que na série de Lena Dunham assistimos ao primeiro e duro choque com a idade adulta e as suas vicissitudes, em Looking acompanhamos personagens mais maduras (e Andrew Haigh tem vindo a saber tirar proveito dessa mesma maturidade). Looking, ainda sem data de estreia em Portugal, tem recebido críticas por ser monótona e as suas personagens não serem familiares aos seus espetador, mas não será isto resultado, também, da constante representação de personagens LGBT como escapes sexuais ou veículos vazios de propaganda política? Mesmo em séries como Diferentes como nós era dado um enorme ênfase aos encontros sexuais das personagens, por isso é surpreendente que seja dado espaço para mostrar que uma personagem homossexual gosta tanto de ficar sentado no sofá a comer porcaria, a um sábado, como o resto do mundo. Este tipo de retrato acaba por ser tão ou mais provocante, hoje em dia, que um episódio inteiro dedicado à exploração do fetiche de uma personagem em pedir que os seus companheiros urinem em cima dele. Mais, e tal como aconteceu em Weekend, Andrew Haigh tem consciência da existência de detalhes, naturais do universo LGBT, que são ferramentas enormes na construção de uma personagem credível ao espetador informado: descobrir se o companheiro é passivo ou ativo ou perguntar se a família sabe que é homossexual são alguns exemplos, mas que não são representados, e que a sua nova produção aborda sem aquela necessidade de quebrar a quarta parede, à la Alfie, e assegurar o espetador que aquilo é assim e que não deve ter medo. O fulgor do movimento LGBT em reclamar por igualdade de direitos deve passar, também, pela igualdade no modo como é representada ficcionalmente, uma vez que, e em relação aos moldes da televisão portuguesa, os casos atuais passam maioritariamente pelo estereótipo do camp ou de uma libido exacerbada. Não foi o realizador Stanley Kubrick que declarou que tudo o que possa ser imaginado pode ser filmado? Talvez a utopia da normalidade social possa ser mais rapidamente alcançada se primeiro for pintado o quadro aos que não são capazes de o imaginar. // CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 51


GALERIA DE STREET ART DE CEDOFEITA BY:

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Em exposição: Hazul | Fedor | Mots | Alma | Go Mes | Virus | Mr.Dheo | Youth One | Eime | Draw | Maniaks | Third | Laro Lagosta | Eky One

Galeria Street Art Cedofeita by Idiot Mag “Uma mostra permanente de arte urbana com alguns dos melhores criadores nacionais” in Time Out fev.14

http://www.youtube.com/watch?v=cZBS-OYcztw VÊ O VÍDEO AQUI:

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Ana Margarida Meira

“In the future everybody will be world famous for fifteen minutes”. Andy Warhol 54 // www.IDIOTMAG.com


Em 1968, quando Andy Warhol apresenta a sua primeira exposição retrospetiva internacional no Moderna Museer em Estocolmo, o catálogo da exposição continha a mais famosa apreciação do artista. Esta é a premissa que se transforma em introdução e conclusão da ideia exposta neste texto: hoje, já estamos no “futuro” de Warhol, em que qualquer pessoa é famosa, pelo menos uma vez na vida, durante um breve espaço de tempo. Bem, se estão a pensar que os nossos pais ou nossos avós não terão esse bright moment, desenganem-se. Quantos de vocês não puseram os vossos pais ou avós nas vossas redes sociais e os vossos amigos virtuais e/ou reais acharam certamente amoroso? Posto assim, pode dizer-se que sim; atualmente, vive-se na realidade que Warhol previu (e muito bem). Vai analisar-se esta situação por dois (e os únicos que existem como consequência de uma análise) prismas: o lado positivo e o lado negativo desta realidade. Por um lado, a liberdade de expressão. A tirada a ferro e fogo, suada e renhida, desejada e malfadada, o artigo 37º da Constituição da República Portuguesa, a nossa liberdade de expressão. Não é por isto que se lutou durante centenas de anos? Pela liberalização da comunicação e da informação, pela democratização dos meios, pela eliminação da censura por parte de organismos governamentais (ou pelo menos na maior parte dos países ocidentais). Foi exatamente por isto. É, exatamente, por isto que existem milhares de formas através das quais as

pessoas se podem expressar, manifestar os seus desejos mais sórdidos e os seus pensamentos mais contraditórios, a forma como veem o mundo, ou simplesmente partilhar íntimas partes do seu “eu” social num qualquer meio público, para que todos possam compartilhar do seu ser. Assim analisando, viva à democracia. Agora, a visão negativa. Globalização, democratização, liberalização. Conceitos demasiadamente abrangentes para que seja possível compreendê-los na essência da sua plenitude. Quantas pessoas utilizam as redes sociais como diário pessoal, quantos blogues existem com conteúdos desnecessariamente públicos, quantas pessoas utilizam a internet, a televisão, a rádio, para exprimir opiniões manifestamente preconceituosas, desinteressantes e muitas vezes castradoras. Numa tentativa desesperada, ainda que inconsciente muitas vezes, de virar os holofotes da fama para si mesmo (ainda que por apenas 15 minutos), a identidade social aparece-nos cada vez mais trabalhada, mais mascarada, mais “social” do que “individual”. Mas hoje, nós, queremos ser resultado de um extenso trabalho social, guiando as nossas orientações pela crítica pública que nos alimenta a “fama doméstica”? Qual é o limite que teremos que impor para delinear o limite do que somos, para o que os outros projetam que seremos? Warhol tinha toda a razão. Previdente, artista alimentado pelas luzes da ribalta, não coexistia com a possibilidade de genuinidade. E nós? // CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 55


Aline Fournier

www.lafouinographe.com

Kyle Cassel

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Sylvie Bourban, jazz vocalist Recording of “aussi pour les petits Vol. II” in New-York http://www.sylviebourban.com/ CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 57


Sylvie Bourban , Magda Giannikou

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TODOS OS MESES RECEBEMOS DA IDÍLICA SUIÇA AS FOTOS DE UMAS DAS MAIS PROMISSORAS FOTOGRAFAS DA ATUALIDADE. ALINE FOURNIER VEM A PORTUGAL EM ABRIL E VAI FOTOGRAFAR PARA A IDIOT MAG. TEMOS UM PASSATEMPO PARA PROCURA DE MODELOS EM: WWW.FACEBOOK.COM/IDIOTMAG.

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Kaleidoscope Sound Union City, New Jersey

Tuesday Sakura

https://www.facebook.com/tuesdaysakura

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Por Rui de Noronha Ozorio

OS BORDADOS DA JOANA!

fotografia: Horta do Rosário 62 // www.IDIOTMAG.com

JOANA VASCONCELOS NÃO PRECISA DE MUITAS APRESENTAÇÕES. SABEMOS QUE NASCEU EM PARIS, TEM POUCO MAIS DE 40 ANOS E É UMA CONSIDERADA ARTISTA CONTEMPORÂNEA NO PANORAMA NACIONAL E INTERNACIONAL.


É, para nós, portugueses, um orgulho imenso sabermos que uma Portuguesa (mesmo que parisiense) seja a primeira mulher a expor no Palácio de Versalhes e que leva (ao estilo grandioso da embaixada manuelina a Roma) um cacilheiro português para a Bienal de Veneza. Ficamos cheios de orgulho e de pátria e de tudo! Contudo, devo confessar, não aprecio a sua obra. Não obstante, fico feliz pelo sucesso que esta nossa compatriota conquista pelo mar e por terra nesta nossa Europa velhinha. E não gosto do seu trabalho por que razão? A Arte e os movimentos artísticos andam a par das sociedades. Como tal, hoje temos uma sociedade pobre, constantemente em crise, em que o verde do capitalismo tenta, arduamente, manter-se ligado às máquinas. Vivemos numa sociedade de relógios, horários, subsídios, de esgotamentos e depressões. Respiramos o ar poluído de um nevoeiro cerrado que não nos deixa ver o caminho, nem o precipício, nem o futuro e foscamente o presente. Habitamos numa comum sala de espelhos apontada ao nosso umbigo, cujo cordão não reconhece a própria mãe. Comemos e bebemos num estádio

de futebol, onde os jogos de fome são reais, cruéis e inevitáveis. Basicamente, a sociedade é um nado morto e um morto a nado, tão só pelo facto de não sabermos mais nascer, nem sabermos mais nadar! A Arte contemporânea, como lhe chamam (apesar das outras todas o terem sido nas suas épocas), é o reflexo mais fiel da sociedade que temos. Assim, é uma arte vazia em que o facilitismo é o patrocínio e a pobreza o mecenato. A Arte contemporânea é uma não-arte, ou no máximo, uma arte de fachada, um segredo colorido e conceptual que esconde uma caixa oca pronta a consumir. A Joana é alguém que, com sucesso e apoios muitos, tem conseguido espelhar bem esse conceito. A obra da Joana assenta, exactamente, na apropriação das realidades do quotidiano, como também, na descontextualização de obras de outros artistas (e não se trata sequer de cadáveres esquisitos à maneira surrealista). Assim, a Joana cria o que vê e recria o que alguém já havia criado séculos antes de si, vendendo (propositadamente ou não) uma criação que não é, de todo, sua. Mas a Joana também

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tem outro mérito: o mérito de ver as suas obras nascidas por artesãos que, perpetuamente na sombra, fazem dela uma artista ainda maior! A Joana é, também, uma artista que representa nas suas criações o papel da mulher, e como tal, faz candelabros com tampões, sapatos com tachos de cozinha ou até mesmo instalações com ferros de engomar e peças encapadas com bordados (que são aplaudidos dentro e fora de Portugal). A mulher Vasconceliana é, portanto, doméstica e passa o dia entre a higiene íntima, o croché, a cozinha e a lavandaria! No entanto, poderei estar a ser injusto, e o facto da utilização destes utensílios seja mesmo uma forma de criticar o estabelecido na sociedade machista (que já não o é tanto quanto parece) em que vivemos. Mesmo assim, parece-me uma ideia fácil e vazia, nada nova e ultrapassada de fazer uma crítica de género, mas cada um com as suas opções publicitárias. Desde há muitos anos que convivo, aprecio e procuro arte e artistas, que 64 // www.IDIOTMAG.com

descubro gente que tem ideias e as concretiza, lhes dá vida pelas próprias mãos. E estas pessoas quem são? Não sabemos! A sociedade não quer que sejam conhecidos. Os governos não querem subsidiar quem faz arte ao serviço do belo, mas quem faz arte ao serviço dos interesses políticos, quem produz ideias ao serviço do consumo imediato que distrai e engana. Entristeço todos os dias mais um pouco sempre que atendo ao panorama artístico contemporâneo; enraiveço mais um bocado quando percebo que a democratização da arte serviu para fomentar o vazio e não para levar a estética a todos os que não tinham acesso a ela! Estamos perante uma insustentável limitação intelectual que, infelizmente, ainda não tem os dias contados! Até lá, até ao dia em que possamos acordar… sempre é melhor ir dar um passeio pela colecção Berardo, lembrarmo-nos das mulheres tradicionais e tirar umas ideias para uns casaquinhos com a elevada ideia artística/recreativa dos bordados da Joana! //


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UM GUIA DE UM JOVEM FRACASSO PARA SE TORNAR NUM ADULTO EXCELENTE Crónica: Tiago Moura

I JUST CAN’T STAND TO SEE YOU LEAVING: Não saber o que dizer é uma sensação horrível. Eu não sou avesso a silêncios com significado, mas sou fiel crente que a palavra certa, no momento certo, pode ajudar. Mas, às vezes, não há mesmo nada a dizer. Num estranho momento cósmico, acordei uns sábados atrás com uma daquelas chamadas que trazem más notícias e durante o telefonema estava o raio da Beyoncé a cantar Heaven couldn’t wait for you vezes e vezes sem conta. O pai de uma das minhas pessoas preferidas no mundo inteiro tinha falecido e ela estava a pedir que fôssemos estar com ela. Quando chegámos, um pouco mais tarde, perto dela havia um fosso entre mim e ela. Eu sentia que devia fazer algo, dizer algo, enquanto a abraçava, mas não havia absolutamente nada que pudesse fazer ou enunciar que ajudasse a sua situação, por isso tentei estar presente o máximo possível. Quando ela nos explicou o que havia sucedido, à porta da capela mortuária, o único nó que se formou na sua garganta foi quando falou que não sabia se o pai a conseguira ouvir. Segunda feira seguinte, voltei da hora do almoço e

preparava-me para sentar em frente ao computador quando um som terrível veio do fundo do corredor: o avô de uma colega estava perto de falecer. Não tendo uma enorme ligação com ela, deixei que outros tomassem conta e tentar estar presente. Quando ela nos explicou o que se passara, ela só conseguia balbuciar que a última vez que tinha estado com ele, tinham discutido e que tinham virado costas zangados um com o outro. Costuma-se pregar que a morte faz-nos repensar a nossa própria vida e, neste caso, ambas as situações fizeram-me pensar no que ficaria por dizer. E eis que um medo nasceu em mim: o que é que eu não a X devia dizer? Recentemente, estivemos todos juntos. Ela falou sobre o pai e falou de como estava a lidar com a situação e eu, novamente, não soube dizer nada, por isso tentei estar presente, mas fiquei surpreendido com a reserva de forças emocionais que possuímos. Ela era ela, apesar de tudo, apesar não o ser mais, porque algo do género deixa marcas. Tudo deixa marcas e não vale a pena comparar cicatrizes. Ouvi-la descrever o leque de emoções e situações ridículas que havia passado, nos últimos dias, do mais doloroso ao mais mundano, fez-me admirá-la ainda mais e questionar, em parte, se ela não seria algum tipo de super-herói. Mais que tudo, fez-me extremamente orgulhoso e grato por a conhecer. Se eu tivesse de lhe dizer algo era isso. // CULTURA E TENDÊNCIAS URBANAS // 65


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