Revista de Estudos Piracicabanos

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EXPEDIENTE:

Estudos Piracicabanos ~

A edição da Revista de Estudos Piracicabanos é de 500 exemplares. Circulação anual.

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"Revista de Estudos Piracicabanos" Editada de ac8rdo com a Lei Municipal n! 1796 de 16 de setembro de 1970 1972

N. 1

ANO I

Piracicaba Imprensa Oficial (Oficinas)

Preço do exemplar

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Cr$ 3,00 '

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Nota: -

A Redação houve por bem não alterar a ortografia das colaborações recebidas. Comissão de Redação da «Revista de Estudos Piracicabanos>:

Prefeito Municipal: Homero Paes de Athayde

Da Redação I

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Guilherme Vitti - Do Instituto Hist6rico e Geográfico de Piracicaba. Benedicto de Andrade - Da CAmara Muni­ cipal de Piracicaba. Presidência da Comissão de Redação: Coordenadoria de Educação, Saúde e Promoção Social - Flàvio Moraes de Toledo Piza e Profa. Cacilda de Azevedo Cavaggioni.

Todos os que colaboraram, com trabalhos e sugestões, os nossos agradecimentos. ' - À oficina da Imprensa Oficial somos gratos pela boa vontade num 6timo trabalho gràfico e pelas gentilezas.


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APRESENT AÇAO

Vem a lume neste ano de grnças de Nosso Senhor Jesus Cristo, de um mil novecentos e setenta e dois, a revista que ora vos apresentamos A REVISTA DE ESTUDOS PIRAClCABANOS de publicação autorizada pela Lei n. O 1796 de 16 d~ dezembro de 1970.

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Foi enviada ao prelo pelo Sr. Prefeito Muni­ cipal Conto Homero Paes de Athayde. Destina-se a empolgar a cultura piracicabano este anuário, que veiculará os seus preciosos estudos de nossa terra e de nossa gente. A Comissão de Redação espera que tal se cumpra.


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HomenageIO ao Sesquicelltellário da Indepelldência A Independência da Pátria mostrou a maturidade do povo capaz de desenvolver-se livre e bem forrado de qualidades morais e CÍvicas. A Independência do Brasil assim nos achou, em 1822. e propiciou-se a grandeza de nação que somos em 1972/ Independência é o inviolável direito de viver em coexistência com todos os povos.. na união sincera.. nO amor e nas mais elevadas virtudes morais! Independência é a razão de ser do homem ou da comunidade, fustigando idéias de opressão. repelíndo tirania ou despotismo, nilo comungando senão da paz, do amor e da fra~ temidade com todos os povos. Saudamos o Sesquicentenário da independência do Brasil f

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Da alma

de Piracicaba PROF. FLAVIO MORAES DE TOLEDO PIZA I Pirac'caba, minha terra adotiva: Quando o Presidente de teu Legislativo desceu as escadas de minha casa, depois de convidar~me pa­ ra assOmar a esta tribuna, eu, que pedira tempo pa ra um balanço por dentro de mim mesmo, pus~me a pensar no motivo de tal escolha, na esquis~tice de ser ltmbrado para uma missão já por tantos realizada com blilho~ numa cidade onde enxameiam OS capa­ zes de manter Ssse fulgor, eorrespondendo à tradição de elegância e de cultura que já se criou em. redol' das palavras aqui proferidas neste d·a. Não era a tradição da amizade que levava S. Excia. a uma escolha inesperada) arriscando o pa~ drão intdeetual da cerimônia, pois vivemos duas v:~ das tão diferentes que, pessoalmente) até a hora do Convite, éramos dois quase desconh::cidos, Todavia, recompondo as palavras de S. Excia" escandindo-as Urn.:l por uma, comec'!i a entrever nos argum~nt03 do capitão de indústria desdobrado em político, alo guma coisa suhjacente, que não chegou a ser expres­ sa. Talvez, minha Piracicaba, nem mesmo ê1e tenh:l dado conta de estar sendo guiado pela faceta mai, piracicabana de seu espír:to: depois dos oradores bri* lhantes, após os pesquisadores pacientes, em seguida aos mestres eruditos, procurava alguém} despido d':.! todos os títulos, vazio de tôda a sabedoria; sem ar'­ mas, portanto) para se dirigir ao .teu cérebro, mas: capaz de falar alguma co:sa ao teu coração. Esque­ cidó de titulas e indiferente a pergaminhos, transpa-"

r1!CLa no coração do homem de negócios, um lastro afetivo e uma tonalidade psicológica que contribuem para tornar o teu espírito, minha boa Piracicaba, completamente diferente do espírito de t8das as ci­ dades. Foi quando tomei o telefone. Aceitava: ia tentar dizer-te alguma coisa a respeíto de tua al­ ma., • E desde já te peço, cidade encantadora, que não vislumbres, no que te vou dizer) nesta hora de pa­ rabéns, .a vaidade pueril de um floreio literário, mas um grito sincero de preocupação, ou mesmo de pre. monicação angustiosa. 1

II Piracicaba, terra de minha espôsa: Não sou o pesqu:sador paciente dos arquivos~ nem o sociólogo embebido nas interações de múlti.. pIos fatôres. Não me vou lançar à tarefa impossível de analisar as origens e OS primeiros vagidcs de tua alma ímpar. Sei apenas que ela se forjou em dia, longínquos e se temperou em dois séculos de lutas c. de vitórias, de derrotas e de consolações, de alegriaSc e de angústias, sem um momento, porém, de vacila,. ção ou de fraqueza, sem um dia falho de nobreza, sem um minuto despido de dignidade. Tua alma se formou à beira dêste rio deslum" brante? prod'gioso de beleza, ~as encerrando no sal­ to imponente a fôrça capaz: de estacar a arrancada. do homem; impondo ao desbra,-:ador, que varava flq­ restas, uma noção realista de sua pequenez e de sua


DA ALMA DE PIRACICABA impotência. Tua alma se forjou à. beira 90 P1cadão de Cuiabá, ao tropel das botas rudes, ao tinir das foices que se embrenhavam no desconhecido, garan­ tindo o recuo para os Andes da línha constrangedora de Tordesilhas, riscada no confôrto das cfutes pode­ rosas. E eu não te VOu alinhar, nesta hora de congra­ tulações, os nomes dos que temperaram teu espírito

oom a farça de suas personalidades e a chama do suas índoles. Tu conheces muito bem essas criaturas. Quero apenas lembrar que, ombro a ombro cOm COr­ rêa Barbosa, rasgando em quatro meses cinquznta léguas de pieadão até o Avanhandava, andou pa­ ra minha honra, wn Toledo Piza - alguém) que de­ pois foi morrer no degrêdo da Africa, por haver s0­ nhado, junto com Tiradentes, um sonho de Iib"da­ de, que ainda hoje bruxuleia nos casarões de Vila­ Rica. Ao redor de teu berço não vibraram apenas machados desbravadores, enquanto as mãos caleja­ das daqueles homens rudes te afagavam, Sob o t,ci­ clo grosseiro de suas roupas e sob suas peles queima­

das de sol, esconãiam-se espíritos onde fagulhavam idealismos, tornando-se capazes de expor a fdicida~ de e a vida por um anseio de liberdade, de respeito pela personalidade humana. Vie.ram depois outras influências: entre elas a lusitana, que deixou marcas profundas em teu sen~ timentalismo, e a alemã, tão sensível J que tiveste to­ do um bairro com seu nome. A êsses e outros fatôres espirituais, havia de jun­ tar-se O elemento físico. As florestas" que há cem anos Zaluar comparava a templos sublimes e vene­ l'áveis, aproximando o homem da divindade, sal­ to imponente, pode-se dizer simpático, extrovertido. Tu já reparaste que, nele~ o centro se projeta, COmO uma ferradura lançada para a frent.e, ao passo que no COmum das cachoeiras Q centro se encolhe, in­ trovertido, como uma ferradura que andasse para trás? Já notaste que essa feição lhe permite, além da beleza que os outros podem possuir, um traço to­ do par~icular de simpatia, privilégio das coisas cO~ municativas? Houve, também) a topografia incompa­ rável, que permite, por ex.emplo, da porta da chá· cara da Lara, ali à beira d'água., uma visão de quem se encontr~sse a cavaleiro da cidade, criando a sen­ sação inefável de harmonia e de equilibrio que assai· tou o romintico Garret~ ao tentar em vão descre­ v<er o Vale de Santarém. E houve, ainda, desde o dia em que nasceste, os teus crepúsculos perturbado.. res. ~. Tudo isso se juntou, se fundiu, se amalgamou, plasmando a tua alma. Todavia, não se deve esque­ cer que cidades não se fundam por bomens sem per-

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sonaJidade, nem faltam a outras terras, ora um arre­ bol fe:ticeiro, Ora uma topografia empolgante. teu encanto, a tua diferença, provêm da perdulária con­ fluência de tantos fatôres .positivos. Isso, porém, não chega a ser ine.xplicável. O quo:! me espanta, O que para mim chega a milagre, é ha· veres conservado integral esse teu espírito, não ap~" nas através das épocas propicias e calmas da Colô­ n:. e do Império, como ao longo desta m.tade do Século XX, alucinante e deformadora, corrosiva c implacável, Como pudeste, no meio deliquesconte e na trilha crivada de espinhos, chegar a tê o meado dêste século sem um arranhão na pureza de teu espí­ rito, s-!m urna fenda na muralha de teu caráter?

IH Piracicaba, terra de meu filho: Perdoa-me a ousadia de uma hip6tese capa. de e."i:plicar essa estranha permanência. B desculpa~me o mau gôsto de falar um minuto de minha própria experiência. Já te disse uma vez, numa declaração de amor, que havia recebido, numa de tuas escolas, além da paIxão pelos livros e a insaCiável curiosida­ de espiritual, o dom de nunca me sentir sozinho, sem­ pre me bastando a companhia amável de meu pró­ prio cérebro. E' que havia naquela casa um tipo di­ ferente de educação, uma forma diversa de estudar. Não era uma diferença de currículo, nem uma d.fe­ rença de método: era uma diferença de concepção, era uma diferença de filosofia, fundamental e d"ci­ siva. Ninguém ali entrava «para» ser alguma coisa, pois seus diplomas não eram reconhec:dos pelos go­ vernos. Entrava-se ali para aprend~r, E só para aprender, Já naquele tempo, por aí afora, se estuda­ va «para» ser engenheiro, «para» ser médico, «para» urna finalidade restrita. O estudo, assim, um meio e não um fim, Hoje essa deformação de tal for­ ma se agravou, que os moços são educados para dis­ seminar o imperialismo eslavo, ou para combater as ditaduras. E isso é forma mais infalível de ela mes­ ma se aniquilar. A educação que me ofereceste era. uma coisa que dizia respeito a pessoas e não a teses sociais, a senhas demag6gicas ou a formas de ga­ nhar dinheiro. Ali não se ensinavam as vantagens da liberalidade, nem se pintavam' os horrores da escra­ vidão: ensinava..se, tão sÕmente, a pensar. Nesse tipo de educação é preciso reconhecer "­ maior das heranças que nos legaram os gregos. 0, gregos que (na síntese admirável da helenista Edith Hamilton) conservaram livre sua pátria enquanto mantiveram sua fôrça espirítual e que, em Maratona e Sal.mina, com farças diminutas d'frotaram exér­

era


DA ALMA DE PIRACICABA citos esmagadores. O segrêdo dês.., poderio imate­ rial era o haverem compreendido que a educação diz respMo a indivíduos e não a multidões. Os gregos x.l.ão educavam seus flihos para vencer os persas, co­ nlO ontem se educavam crianças para vencer o mili­ .tadsmo germânico~ Ou como hoje se educam para VEncer o capitalismo ou o comunismo. Os jovens não eram modelados por uma ideologia: eram edu" cados para pensar e, por isso, sentiam prazer em se­ rem educados, Como O futebol de hoje arrasta mul­ tidões> havia muita gente que procurava Sócrates) para com êle mergulhar no domínio do pensamento. Tão elevado era o nível dessa educação) que os mo­ ços chegavam a essa capac~dade de se deleitarem no campo do pensamento, divertindo-se com seu próprio espíriLO. Consequências de tal educação individuali~ xada foram a clareza de raciocínio e a limp .dez de expressão, Viçou entre êles a paixão pela pureza du pensamento. Eram antipodas de certos literatos con* temporâneos que se ebmprazem na obscuridade. Ex. primiam suas idéias com o mínimo possível de pala­ vras.. ao contrár:o de muitos líderes de hoje, de cujas bôcas não escorrem senão palavras vazias. Tudo isso foi conseguido colocando as crianças diante das coi­ sas belas, da arte, da música, isto é, respirando UlThl brisa pura soprando de um boa terra, como chegou a dizer Platão. Foi essa mentalidade cristalina que moldou a po­ lítica e as instituições. Os moços tornaram-se capa* zes de decidir' como cidadãos independentes, dentro de um estado absolutamente livre. Sua democracia e: a tão perfeita, que seus in:mi~s retrógrados a cen­ suravam por base~\l'~se na prosperidade das classes inferiores, e não das superiores. ~sses homens, que governavam protegendo os trabalhadores braçais e os remadores de navios, foram J todavia, Os mesmo... que construiram o Partenon e que frequentaram os teatros onde se representavam tragédias imorta:s. Nem políticos, nem miJionários l nem sindicatos, nem igrejas podiam influir nessas escolas. Nada as PO' d'a, portanto, bitolar. Por tudo isso, o grego apren­ deu que ninguém pode ser livre sem ser responsável. Como e quando optaram por êsses princípio, educacíonals, ninguém o sabe. Sabemos, contudo , os resultados: amaram a beleza e detestaram o fausto, gozaram as delicias do espírito e não fugiram do tra­ balho pesado, não consideraram crime ser rico e não se envergonharam de ser pobres. Eram supremamen­ te livres, porque, além de obedecerem de bom gra­ ,do à lei escrita, dobrav.am""Se ante a lei não escrita: um misto de ternura) de .simpatia, de desinteresse, que nenhmna lei pode cr:ar e que torna mais fácil a vida da comunidade. Essa educação não produz massas amorfas e

11 obedientes, nem tropa que siga em silêncio o cincer­ ro da madrinha.

IV Piracicaba, terra de minha mãe: Essas pinceladas rápidas formam um espelho em que se reflete, inteirinha) a tua alma. Como em Ate­ nas, teus filhos cresceram em contacto cOm a Beleza e aprendendo a pensar, na dura escola do trabalho e da Nature.a. Quero deixar b'm claro que, no dia em que aportou em teu seio a primeira escola forasteira, tua alma já estava "feita, temperada pelo fogo do aprender-fazendo. Já era uma alma grega, conscien­ te de que o homem só vale pelo seu espírtto. A minha hipótese é de que, nas décadas mais decisivas da transformação da filosofia do homem diante da vida, na época mais crucial da desperso.. nalização humana, tu tiveste a felicidade de receber em teu seio, vindo de longe) um tipo de educação que se casou integralmente com o tipo do teu espín. to, a ponto de não perceberes o quanto êle passou a contribuir para conServar-se intacto êsse mesmo es­ pírito. Os lineamentos dessa maneira de encarar o ensino impregnaram, insensivelmente, o ambiente~ através dO's lares, através das famüÍas que influiam no e.spírito da terra) Ínflltrando-se até mesmo nas ou'" tras escolas. E' fácil perceber e analisar fatÔres sociais que causaram mudanças, mas é qu~e impossível de­ monstrar e medir a extensão dos que evitaram que as mudanças se consumassem. Todavia, no teu caso, não há cO'mo negar que a presença de um tipo de en­ sino individualízado, de aprender apenas por apren­ der, embebeu o teu meiO' e te conservou diferente co-' mO' já er.as, cO'nsolidando os traços essenciais de tua alma, que eram O'S traçO's essenciais da alma de Ate­ nas. A prova se colhe em outras cidades, muitas e muitas, menO's felizes, mesmo dO'tadas de um espíri­ to característico, que nãO' contaram com escudo se-­ melhante a lhes preservar as almas e não conseguiram manter, como t .. , as personalidades traçada pelo ber­ ço. Muitas almas coletivas se 'apagaram e se amol­ daram aos tempos, vencida pelo ensino totalitário, centralizado, passivo, das mesmas lições debulhadas às mesmas horas, diante de alunos calados imó­ veis, nivelando a todos por baixo, padroni7..ndo pelo menos capaz, amortalhando as superioridades indi­ vidua's, que são a fonte da grandeza das nações. Não me arreccio de ir mais longe: não foi por mero acaso que essa escola te escolheu, no meio de um país imensO'. Houve, sem dúvida, a atração irre­ sistivel de tua mentalidade. Ou a fundadora dessa

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12 escola sentiu a consangu 'cidade espiritual e nela di­ visou um fator de sucesso, ou os 'homens que te guia­ vatn perceberam o valor dêsse tipo de .nsioo • atraí­ ram para estas plagas a semeadora, Seja com~ lôr houve a atração, houve a s..mpatia esp.ntual. E COm isso cimentou-se aj.nda ma's O espírito que te imp.. ' Eg­ nava, formando*5e o círculo vicioso. Estabeleceu-se a fôrça centrípeta que havia de aglutinar mais uma porção de fatÔres afinados pelo mesmo diapasão de teu caráter. Assim aconteceu quando, em 1921, Sud Men nucei sonhou transformar"'te no ma's perfúto mu~ nicípío brasileiro a respeito de instrução. q~.mfessn êle que, ao aportar em teu seio COmo delegado de ensino, encontrara cada um de teus f.lh:>s sonhandJ o mesmo sonho, A ser posto em p'rática, o projeto j:í não era dele: era de todos, Atraído p,lo teu espiri to, Sud comol dou êsse esphito pela d'sseminação d, cultura, pois o que desejava era ensinar: ap~nas p:::r ensinar, na limpidez ateniense de espírito, sem reser vas mentais nem propósitos políticos ocultos, Ia...e formando a bola de neve, Educada no há, bito de pensar pelo teu próprio cérebro, nunca I'ren:;:_ gaste aquela noção fundamental do bom senso, de que a indústria é a lida de tomar os p.odutos da ter­ ra para transformá-los em utilidades para o h3mem. Nunca te embalaste em teorias econômicas arquite~ tadas para um fim polltico ou demagógico, E nunca esmoreceste na tua velha afeição pela boa Mãe que tudo nos dá, sempre reservando à faina da indústri, " seu papel de indispensável ancHa. E assim, brotand, de tua faculdade de julgar, desabrochou O teu acen­ drado ruralismo, a paixão que te fêz a Meca dos apóstolos do Solo, Tu te fizeste ruralista, a ma:. nt­ ralista das cidades do Brasil, graças a um traço fun­ dam~tal de teu espírito, que se desdobrava na resis­ tência às solércias doutr:nárias. E êsse Iuralism? en­ tr~nhado é que levou o mesmo Sud Mennucci a es­ colher-te como o único ambiente capaz de prop'ciar a uma Escola Normal Rural as mais completas pers­ pectivas de sucesso. Experiência ousada, sem modê­ lo por que se guiar) só poder'a florescer num am~ biente contaminado pela escola de Luiz de Qld,oz, que Ii"ava ao solo o homem já adulto, e pelos Club" do Milho, de Tales de Andrade, qu, ligavam ao so, lo a infância que desabotoava, Ousei dizer que a tua cultura, adquirida atra~ vés da arte de' pensar, te fêz ruransta, ru"alis.m:) que ainda mais se cristalizou pela obra de V6rgu"'~r"l. Agor~ não hesito em dizer que loi essa ment·a1idad" que arrastou Luiz de Que'roz a e<;colher~te p'Ull <l oferta de seu ma~nífico presente. Talvez não trn~, havido, mesmo, dentro do cérebro daquele teu am'­ go, um raciocínio frio e calculado, mas houve em SUl

DA ALMA DE PIRACICABA sçnsibilidade aguda a iofluência dec:siva de um run­ bitnte material de policultura e de um ambiente es­ pir!iual de compreensão do papel da agÚultul'a. A escola de que tanto te orgulhas não foi, u'im~ um 1. causa, mas uma consequência da tua ffi2ntal.dade., do teu discernimento, da tua filosofia límp'da a res­ peito da aYf:ntu!a do homem sôbre o nosso planeta. Lá está., velhinha, no texto de um dos Salmos, a observação de que um abismo cham:l Outro abismo, Mas as montanham também atraem outras monta~ nhas, e os gestos generosos e puros, outros ge5tcs, também puros e g~ nerOSC5.

v Pirac'caba, que eu adoro tantO! Se isso fôsse· tudo, já 5eI'.a muito. Todavia! é ' qU:1,C nada! Os atenLn.:e!) educavam S:!Ui fJh-:s e~''i Ct"ncacto com as coi_as b~1as, moldavam seus osp~,·.t s n:! intimidade daS arte •. Tu, também, n.l p.>d.,;;> n..: g::tr t mesmo na nl.llS angélica m:;déstia, a tua t a .1' ção de ,arte, ar:e pura e desinteressada, simples pai­ xão da Beleza, Assim) já no tempo do. Inlp6rio, Cus jOTna' s dei~vam entrever um nÚnlêl'O' inc p.naco de band..ts de mús ca, E se me rcfuo somen~e a elas, é p.,)r sel'C:ll expressões art~ticas malS mt!marncnce ligadas ao grosso da· massa popular, Com o tempo, {m vez de se diluir, êss~ cult~ s-; expandiu, desdobrandc~se nas famcsas se;_natas que se tornal'am tradição e que rn:.titus vêzes eram, audições de pequenas orqw:stras, do mais' alto qu:' late, derramando melodias de esquina em esquina" d~ porta em porta, sob o luar fascinante, ressusc.tando, nos albôres dêste século, os anfgns cantores itinc-­ rantes que a Hist6ria não esqueceu nas brumas dos tempos. E já em p!eno século XX, uma senhora forastel 1'a, que lá longe se casou com piracicabano, ao c;:mhe. cer sua nova terra, ao palmilhar, encantada, cada palmo de teu chão~ teve para o espôso esta obselYa· ção sintomática: «A gente anda pela rua, ouve um piano 1 alerta os ouvidos para o p~.dacete moderno ou para o casarão do Império, e acaba descob indo qu"! .a música vem da casinha modesta, p'1bre, p;qu~ni· na, ai i de frente... Nunca vi tantos pian-:s em c \ sas tão modestas 1» E eu te pergunto, Piracicaba: T I já deste conta do número de artista~ que, d:!ssas c,­ sinholas minguadas; alçaram vôo para além de tuas fronteiras, honrando-te e engrand::cendc.. te? Para essa paixão artíst:ca, p=tra êsse amor des:rt­ teressado, nunca se enje·tavam cca,;:iõ"'s {". ássim. quando o cinema ainda era mudo, prof~fsôrest ag:ô­ nomos, advogados, reuniam-se no Politeama, em p:i­


DA ALMA DE PIRACICABA

rncrosas audições durante as sessões, num !-imph::s culto despretensioso, que se transformava num traba~ lho obscuro e eficiente de educação dos ouvidos e d&s scnsib Iidade,. E aí também se formou a bola de neve, em :;C~I -centripetismo irresistível. '" Teria Sido um mero acaso que arrastou um Lv :.!-ano, da longínqua Espanha para o teu sdo? Ou re­ .n a êle sofrido a atração do ambiente que, depois~ tanto contr.buiu para engrandecer? Tecia sido um mero acaso que reteve o hOln;:,m qtl2 tu hoje homenageias pelo seu apostolado muá~ cal, pela obra educativa sem esmorecimento, dissehll­ ha~::tio a arte e elevando-lhe incessantemente o nÍv-:i? Ou teria sido o teu ambiente receptivo, carinhoso pi'l.. la com a arte pura e sadia que ·contribuiu para q·le se t:entlsse bem, entre teus fIlhos, um Mahle, ê::s~ n ­ \ J fitho que podia ter escolhido qualquer ouO a c~ua" de do mundo? Não há dúv:da, Piracicaba, de que em tudo fluiu, decisivamente, aquêle espírito ateniense, aqui n Fctido e ·aqui cultivado ha vinte e cinco séculos d.'!' distânc·a. A educação, de indivíduos e não de mas sas, nunca deixou apagar~se o culto do Belo, e o am­ bien te em que um Miguel:únho Du tr.a se sentia bem é- o mesmo em que SEUS descendentes cultivam e di;)· seminam a Beleza, cercados de teu estímulo: conscien te.-:. de tua admiração, j

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1// Outra senhora, forasteira; também casada lá. lc;;:gc cem outro de teus f.lhos, ao chegar à nOva ter ......) .ao conhecer a população, ao transpor as soleira') llC pobres e de ficas, encantada Com a htspita.ida:l..:. sem p1econce.tos, notou quanto era frequente a es· tante de livros ser uma das peças mais preciosas dos lares mais humildes. E notava, sobretudo, não haver a1i apenas um móvel com um punhado de livros: ha­ v a no ambiente alguma coisa fazendo da estante um centrO de gravitação espiritua1, algo parecido com o papel do, oratórios. Há nesse culto. quzse incomciente do livro um for­ moso retrato de tua alma, temperada no contacto das c..úsas grandes e belas, mantida incorrupta par. uma educação da mesma tonalidade esp:ritual. E por i,so aí esu\. COm a tua primeira ata, o prirneiro livro de tua Hist6ria, intacto e venel'ável) provando que não adquiriste essa paixão ao 10ngo de sua vida, mas que já trouxeste do berço o apreço pelas coisas do espí­ dto e o resp:ito pelo passado e pelas tradições. E o que veio depois? Ve:o a tua imprensa, uma escola de ética e d!'! aticismo grego. E neta p~rdurou ês~e mesmo espíri~",

to, guardado para ê,te século pelo decano de teus jor­

nais, com trEze lustros contados no respeito integral pela opinião antagônica e na tolerância sagrada dian­ te do pensamento do colaborador. Vieram os serõe.s literários em que havia a mão benfazeja de Lid'a de Rezende. Veio a Universidade Popular, com sua biblioteca convidativa e COm suas «Horas Literárias») cujo ní.. vel é fácil avaliar por uma conferência que se ch:.goú a ;mprimir e de que guardo um exemplar precioso: "0 Elogio da Mentira», de João Silveira Mello. E vieram homens, que por aí andaram, como Osório de Souza e Antônio Pinto, distribuindo j6ias, cf sserninando cultura, tão embebidos no mero prazer da arte, que nem mesmo pensaram em escrever o que falavam. Eram poetas ou fil6sofos, como Os longín­ quos·gregos, que nada mais ambkionavam além do culto da Beleza, no meio de wn punhado de discí· pulos. E veio a Escola Igualitária, ali nos alto, do «Jornal», num programa nítido, num esfôrço desin­ teressado e consc:ente de alargar os horizontes da cul· tuta popular, pelo ensino noturno gratuito. O p.-óprio nome da escola já diz uma porção de coisas a respei to de tua alma. E veio, lá embaixo, onde hoje febrlcita Uma es­ cola industrial, uma soc'edade de incentivo à cultu­ ra, tão desinteressada, que até seu nome se vai apa· gando. Foi uma semente que brotou, e viçou: e ali mesmo se transformou na Escola Complementar, pa­ ra depois se fazer grande cômo tua Escola Normal, desdobrando-se mais tarde num Instituto de Educa­ ção, a que ligaste um dos nomes mais caros, mais estremecidos ao teu coração de cidade onde sempre houve quem estudasse pelo simples prazer de estudar, onde sempre houve quem ensinasse pelo simples pra­ zer de ensinar. Veio também a casa onde hoje floresce, pujan­ te, o Centro Acadêmico Luiz de Queiroz. Houve ali Outro Joco desinteressado de ensino, ao CJ.ue parece difundindo a instrução entre operários. Morta a entidade, talvez pelo pulular de outras escolas, o velho prédio ficou sEm dono. Ao estl1ltu~ rar a instituição} ninguém pensara no lado legal, nO al'pecto material das coisas. E o velho casarão cOn­ tinuou o seu fadário simpático de abrigar estudan" tes, através de longos anos, até que a usucap:ão veio legalizar uma situação indiscutida t para que s'! cons-. truisse aqui10 que ali está. Piracicaba: onde já viste Outra cidade, onde mn simples pedaço de chão) onde lima vetusta casa sem dono, varasse os anOs, por todos respeitada, para cumprir a sua missão intocável de l1ma espécie de Mecenas de alvenaria? Na velha A~e­ nas, os homens e os poderes públicos agasalhavam OS


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DA ALMA DE PIRACICABA

moços sedentos de cultura. Em lE"u seio, até os ve­ lhos casarões abandonados o fazianl ...

VI Piracicaba, cheia de cncan to: Afirmei, Já para trás, que o espírito aten cnse e seu ensino individualiz.ado faziam homens livres e. por isso meslno, responsáveis, L b::l'dade parccida~ responsabilidade semelhante são sempre focabzadas quando se fala de ti, ao se recordar a famosa campa nha do Partido Independente, lutando contra a oli· garquia do carcomido PRP, sub~evando-sc cOntra r: caciquismo da COID.ssão Diretora, revoltando-se con­ tra as candidaturas sacadas do bolso do colete dus marajás políticos) e;JU uma palavra) lançando~sc, de cabeça erguida, em luta desigual pela aliorria políti~ ca da cidade. E todos te louvam a altivC".r. e todus r.:· conheceIn a imensa projeção dessa campanha lá po," fora de teus lim:tcs, desdobrando-se na jO~'nada do Partido Dnnccrático, até desagllar nas ondas tumul­ tuOsas da. revolução de trinta. Todavia, Piracicaba, êsse não fOI um fato vir­ gem em tua vida, nem um milagl e de tua alérgica ao bridão espiritual. Foi apenas uma repetição} Ulua simples repetição das eleições de 1832·, em que derro· taste os quarenta poderosos coligados, os quarenta ri~ cos senhores de sesmarias, que se encarniçavam na posse de terras que Corrêa Barbosa destinara li po­ voação, e que dia a dia se valorizavam. Um século se interpõe entre as duas man'festações da vontade do povOJ mas a alma de que partir.am pennanee: in· tegralmente a mesma, incorruptível no seu destcmor' e na sua altivez. Os traços decisLvos de tua alma, cons::'rvados e fortalecidos pela edllcação do aprender por áprender, haviam, fatalmente gerar a tua filosofia de que ~ donheiro nunca deve ser 11m fm, mas apenas um meio, Nunca um a1vo, mas um recurso, uma ferra~ menta, um servidflr. E assim é que nunca te embebe.. daste com as grandes aventuras financeiras~ nem so- . nhaste jamais com tesouras fáceis. Há mesmo em teu espírito um traço que muitos cominam de ind feren­ ça ou de resignação: 56 consegues chegar aOs fiscos, tanto federal como estadual, através de Rio Claro; tua emprêsa de luz, pioneira no Brasil, filha de Luiz de Queiroz, é hoje governada de Campinas. Tu nun­ ca levaste tudo isso muito a sério: são eoisas dc ta­ xas, de matéria, de dinhei.ro. Além disso J mn impos­ to é dinheiro que sai, é dinheiro que te levam E t~1l aticismo grego não te permite que discutas a ma~ neira COln que dás, a fonna com que ofel'eccs. BS'ie desprendimento, gerado pela exata concep­ ção do valor de: ouro, cspelhaMsc em tooas as tuas at: j

de

w

tudcs, até mesmo no teu culto por aquêles que chcgas­ te a amar. Na galeria de teus ídolos: fervilhanl po­ bl"ctôcs como Padre Galvão, Dou tOr Cardoso, Sud IvIennucc', Monsenhor Rosa, Migucb:inho Dutra, Erotides, Lagreca, Newton. <. E, quando aparecem nos altáres de tua saudade figuras abonadas ou opu­ lentas, elas sempre se fizeram amadas des.pojando-se de seus bens materiais, para tl'ansfol'má~los;> como Lí­ dia de Rezende J em arte, em literatura, em bc1cza! ou como Luiz de Queiroz, em progresso, em cultuta,. em amor ao solo.

1/1 Naturabnentc1 a tua formação cultural atenien­ se te fêz sEràficamente tolerante, s~mpàticamcnte oti­ misla. Em consequência, são rat<as as tuas queixas. Entretanto) uma pontinha de tristeza tran5parec~ quando lamentas tua p~ição de cidadc~fim~d.:-.inha* Apesar de tudo, nunca é possível encOntrar nesses de~ .abafos O desconsôlo de quem perdeu op'>ttunidad. de riqueza, OH de quem foi despojado de um tesourO, O que existe é uma espécie de vaga nostalgia de pro­ gressos que aqui não aportaram, uma saudade amo­ rosa de coisas que podiam chegar a -existir. Pa:l',a mim, êsses anseios confusos, incapaz:!s de se fixarem na palavra «dinheiro», são outras tantas confinnações dos traços essenciais de tua alma _ Nã:> são sonhos de om'o: são saudades do Picadão de Cuia­ bá, lembranças longínquas do teu tempo de bôca do sertão, quando tua voz era a menos distante, a der­ radeira que ouviam, amortecida pela selva brava, aquêles que mantinham e vigiavam as fronte~ras da pátria, empurradas pelos Bandeirantes das alturas do Jaú para as bal'1'ancas do Paraguai e para as encos­ tas dOs Andes.

III Dizem por aí, às vêzes, Piracicaba, que teus fi.. lhos são encaramujados, vo1tados para dentro de suas casas, arredios de aglomerações) alérgicos às multi­ dões. Línguas venenosas, aqui e acolá, procuram re­ matar a crítica com pinceladas vagas de egoismo ou de orgulho. Nada mais erradol Nem orgulho, nem egoísmo, nem fuga da praça pública. A explicação, para mim, reside no espírito do pirac'cabano: espírito de Ate­ nas, que; como afirmei há pouco: s~ compraz no cam­ po do pens.amento, diverte-se com o p ·óprio cérebro. não se cansa de sua própria companhia e só acorre, pressuroso, quando lhe acenam COm algo mais nOvO c


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ou mais belo do que tUdo quanto é capaz ·de arran­ car da própria reserva intelectual.

//I Queres mais uma prova, minha boa Piracicaba? Tu não podes negar a centelha de satisfação, "­ fals.a de orgulho cOm que te abre, num sorriso fe­ tiz, ao ouvir um de teus coguomes: Atenas Paulista. E' que no apelido com que te honram não existe ape­ nas um louvor à quantidade e à profundez de tua cul tura, mas uma identificação mental muito mais profunda, atingindo o mais íntimo de tua estrutura espiritual. Com o nome e a lembrança da lum~nos. república dos gregos, o que se está pintando é o ar

cabouço essencial de tua alma, diferente da alma de todas as cidades. . VII

Piracicaba, cheia de flôres: Afirmei, lá para trás, que um dos traços da al­ ma forjada em contacto .om o Belo e aprimorada pc· la arte de pemar, é o amar entranbádo pela pátria, a dedicação incondicional ao torrão nativo. E' uma coisa muito diferen te de bairrismo, cOmo diferente de

bairrismo é o teu nconfundível piracicabanismo. No bairrismo tremeluz uma fagulha de inveja, uma fals­

~o plantar, por aí além, a semente do te"u espírito. Bairrismo é exclusivismo) um encaramujar"se egoísta. Piracicabarusmo é isso, de receber cOm o co· ràção limpo todos os que venbam de boa fé; de abrir os braços, «deixando» que o forasteiro se «deLxe» as.. similar. Usei o mesmo verbo de prop6sito; ambos «deixam», ninguém força nem se obrigai ninguém sugere nem obedece. A simpatia que dOmina o am­ biente, que por tudo se infiltro, é que precipita a fu­ são, a ponto de seres uma terra onde não há foras... teiros. Se um pecado houver nesse teu pir.acicabanismo, há de ser o de não medir, por vêzes J noS que chegam,

a rapidez de assiínllação, de contaminação peJa tua alma. Na tua boa fé sem bairrismo, jamais impuses­ te quarentenas .aos forasteiros e muitas vêzes lhes en­

tregaste posições decisivas de mando ou de influên­ cia no ambiente. E' que sempre tiveste a segurança. instintiva da fortaleza de teu espírito, e sabias qúe, mesmo de cima, mesmo com a fôrça nas mãos) os

que chegavam seriam seduzidos pelos teus encantos e amoldados ao teu ••plrito. Onde encontrar, nisso tudo, o mais longínquo

resquíc'o de bairrismo? Como negar que, dentro de ti, o ·que existe é um estado de esplrito, gerado pelo teu tipo de cultura, tão diferente de tudo, que não se pode batizar senão com uma palavra também di"

ferente?

ca de inconformismo, uma centelha de intolerância t

que os olhos mal distinguem atrás de uma bruma de antipatia. O piracicabanismo não inveja ninguém, porque não compara; não se revolta porque "não inve.. ja; não se deixa arrastar pela intolerância porque

nasce do fundo de um coração nobre fecundado por um cérebro límpido. O piracicabano gosta de ti sem te comparar com n"nguém; o piracicabano te adora

sEm pensar que a inveja possa existir. Piracicabanis~ mo é amor, e o amor não compara J não inveja, nã)

odeia. O bairrismo é egoísta: tudo deseja para si. O piracicabanismo é altruísta: tudo oferece a quem pede e até mesmo a quem não pede. Na tua educa­

I11 Já vai muito longa esta

declaração de amOr! ...

Ficou registrado, lá para trás, que os atenienses, graças à arte de pensar, eram felizes, porque, além de obedecerem de bom grado à lei escrita, dobravam­ se, também, ante a lei não escrita: um misto de te!'­ nura, de simpatia, de desinteresse, de amOr ao que é

belo e ao que é bom, privilégios espirituais que ne­ nhuma lei pode criar e que tornam mais fácil, mais agradável, mais amena a vida da comunidade.

E é nesse traço do espírito .ieniense, nesse qua­ se imponderável da alma helênica, adoçado pela pai­

ção, nessa maneira de aprender que consolidou a tua

xão da Beleza e da Alegria, que eu vejo o vínculo

alma, Prudente de Moraes e Caetano de Campos se

mais forte de tua alma com a alma da terra de S.s:. crate.. Tu sabes o valor da Beleza e da Aleg~ia ... E por isso eu te pergunto: em que cidade, sem o teu

vieram inspirar para uma reforma do ensino. Teus mensageiros andaram e andam por todo o chão da pátria; cuidando do ensino, pesquisando nos labora~ tórios, difundindo á arte, inoculando no ambiente

em que se localizam a religião da beleza e o anseio da cultura. Não cabe nestes ráp'dos minutos de sau­ dação o desfilar de nomes que tão bem conheces. Mas não te podes esquecer de que em cada uma de tuas filhas, que se casa com um estudante e que par­

te para longe de tu, lá se vai um pedaço de teu cora­

espírito diferente de todos

OS

espíritos} poderia viver t

transbordante, deflagrando gargalhadas, uma cria­ tura como o teu Bráulio de Azevedo? tsse Bráulio, que para muitos é um contador de ax;edotas,' para outros um imitador incomparável, mas que poucos

chegaram a medir em sua. grandeza. S'm! Não foi por de,cuido que falei em grandeza: Porque o Bráu· lio nunca foi um mero repetidor" de piadas~ E' um


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16 professor de Arte, de tão múltiplas facêtas, que raro. conseguem abarcá-Ias para uma visão ode conjunto ° Raríssimos, s6 mesmo os que longamente o procura~ ram estudar de perto~ conseguem fugir de uma visão fragmentária. Quantos sabem que o Bráulio fazia a mão os seus cartões de visita, imitando a letra das tipografias? Quantos notaram que, ao imitar uma flauta, êle estava divulgando Chopm; ao imitar um v:olino, nos estava revelando Beethoven; ao imitar um disco arranhado, nos estava mostrando as b.!lezas da música de Vereli? Quem deu conta de qu" imi­ tando Gigli, êle estava cantando .os Palhaços», e de que, imitando Schipa, estava cantando o «Rigoleto.? oQuantos notaram a preeisão de Fnguagem, o dom\­ nio do vocabulário, a Arte em suma, com A grande,. com que o Bráulio descreve a aproximação de um guaçu, Ou a luta com um dourado «dêstf: tamanho»? Quantos já se compenetraram de que o Bráulio, hã meio século, nos vem e~inando uma das artes mais difleeÍs e mais expressIvas: a mímica? Quantos j:.í se deram ao cuidado de estudar a mímica dos piraci~ cabanos, inconfundível como o se.u sotaque, e apren­ dida pelas esquinas com êsse estranho professor quo nunca chegou a perceber que o era? Quer deixando por cinco m' nutos a caixa da Leiteria para cantar ao rádio a Ave-Maria de Gou< nod; quer modificando uma mesma anedota diante de cada tipo de auditório, num mOlagre de s:nsibl­ lidade; quer declamando como Angela Vargas ou imitando a voz de meio mundo; quer descrevendo uma caçada ou representando uma história por mí~ mica, o Bráulio é sempre um artista do ma:s alto quilate, lutando apenas com a desvantagem de não perceber que penetrou no domínio da Arte. De esquina em esquina, de casa em casa, de fes ta em festa, tem sido" durante meio século, um se~ meador de Be:eza, um cavaleiro andante da Alegria. Corno Sócrates, há quase vinte e c' nco séculos, anda­ va pelas esquinas, cercado de moços que mal por­ cebiam estar filosofando, assim o Bráulio viveu pelas esquinas, cercado de moços que mal davam tento d, estarem bebendo da taça da Beleza, da Arte e da Alegria <. < Os aedos da velha Grécia cantavam de porta em porta, de casa em casa, de festa em festa, espalhando o que era belo <.. Nem deles tu precisas ter inveja! ...

vm p'racicaba, minha terra adotiva:

E' urgente encerrar esta louvação de tua al­ ma!. .. Iniciei dizendo que iria proferir um grito preo­ cupado de alerta, pois, se a minha °hipótese fôr exa-

ta, é evidente que ela se desdohra<emopedgos. E infe­ lizmente acredIto que estou certo, porque de ti mes­ ma aprendi que nenh_a fôrça existe que se compa­ re à educação. Tudo se cria COm ela, tudo flOreSN com ela, tudo 5Ossobra com ela, até mesmo a liberda­ de. Ainda hoje se arquitetam teorias ingênuas ou od<osas para explicar ou para explorar o subdesen­ volvimento de certos povos. O bem senso grego, Ou limpidez de 'raeiocínio de Atenas veria logo a reali..· dade cruel: o desenvolvimento na proporção exata­ mente inversa da percentagem de analfabeto,. Se a tua alma grega se conservOu até hoje intac­ ta por efeito de um tipo de ensino individualizado, que, embora morto" continua a agir - então é pre~ ciro compreender que tua alma não é eterna. .. Vi­ ve ainda, porque a obra dos mestres não cessa no t{l­ mulo e o professor contínua a influir sabre as g~ra­ ções que em seu tempo ainda não havia nascido. l:sse é o quase milagre do magistério. Todavia, as­ s~m como o bom ensino que 56 considera indiví~ duos e que ensina a pensar - perman~ce p:)r gera­ ções, assim também o mau ensino - o das multí~ dócs amorfas e do nivelamento por baixo - êsse. também corrói, envenena e dilacera as almas que ainda não nasceram. A meu ver, Piracicaba, estás no p':mto decisivo,.. em que se vai e.ljmaecendo a fôrça do passado, ante o choque implacável do pl'.esente. 8:! vencer o espiritn tacanho do ensino de massa$ do ensino de não p~n~ sar, tu jamais chegarás .a recuperar a tua alma que­ se vai perder. Não desejo falar de sintomas alar­ mantes nesta hora de parabéns e de alegria. Ous~ apenas lembrar que tu, com o espirto daquela Ate­ nas de onde nos chegaram as tragédias de ~,quilo.o já suportaste viver mais de doze anos sem um tea­ tro. Piracicaba, minha boa terra! Sabendo que ,6 vivo uma vez, dvu graças p~r haver aportado em teu seio < Devo-te o pouco que sei e o quase nada que cheguei a ,er. Mas agradeço-te, do fundo do coração, por me havue, abençoado COm os maiores dons com que um homem pode ser aq u:­ nhoado: a paixão de pensar, que me p:!rmite viver feliz junto de mim mesmo, SEm j amais conhecer o que se chama por aí de tédio, e a paixãop'la Bele­ za, que em tudo faz descobrir o lado bom, o prisma mais s'mpâtico, a CÔr mais sedativa. ASlim dotado,. há muito que envergar na vida sem se precisar de~ ter no sofrimento. Por isso, não quero que teu espírito se transfor.. me; por isso, não quero que tua alma se desvaneça, por isso não quero que tua sensibilidade se émboie. A todos que me ouve:mJ autor*dades e p::J:Vo, m!:!Stres e· artistas, sacerdotes e militares) intelectua!s e traba­ j

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Ihadorts, pobres e ricos, eu pediria que reselVassem um minuto de suas preocupações, uma célula de seus cérebros, um cantinho de seus corações, para estudar essa alma afetiva e boa" elegante e sóbria, alt:va e sincera, procurando uma inspiração, esmando um roteiro? ou mesmo orando por um milagre, que COn­ serve tua alma como ela é, que não pe'rmita apag,1­ rem-se Os traços essenciais que a fazem única e in­ comparável, que não pr:ve nossos filhos e nossos nc­ tos da ventura que nos coube de ser piracicabanos.

escolher, ped:ria para nascer em teu seio, Piracica­ ba, enVÔlto pela música dêsse mesmo salto e pelas Cô­ res dêsses mesmos crepúsculos) para formar meu eS­ pírito na mesma escola em que êle se formou na pri " meíra vez. E se, num gesto supremo de generosidade, o Oni­ potente me perguntasse o que eu desejaria que se mu­ dasse em tua alma, para que eu te sentisse ainda mais perfeita, teubo certeza de que responderia sem a me­ nor hesitação: Nada!

Ouso pedir, ouso sugerir, porque, se, depois de morto e enterrado no teu chão, lá do outro lado do grande mistério, me fôsse oferecido viver outra vez, sem dúvida que eu aceitaria ... E, se me fôsse dado

Porque é assim" como tu és, que eu te amo! ... Porque é, assim, cOm essa tua alma, que eu te adoro!. "


Capitão

Francisco

Franco da Rocha DR. ALE~RE GUIMARÃES' DOS SANTOS (Membro correspondente do L H. G. P.)

o capitão Francisco Franco da Rocha, tem de 1:al modo seu nome' ligado a acontecimento, que se desenrolaram nos primêiios tempos da vida plraciea. 'bana, ocorrências estas que dada a alta pos'ção ad­ ministrativa que ot:t;pava nessa comunidade paulis­ ta, não ficariam perfeitamente esclarecidas, sem um apaIlhado 1 mesmo sucinto como o que segue, da his~

tór a da progressista e encantadora cidade de Pira­ ·cicaba.

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E' porém, um trabalho que não ultrapassa Os li­ .mites que os entendidos no assunto, denominam «pe­ -quena história», porque se restringe mais, a fixação

de datas, nomes e f"tos, fugindo assim a história que -os sociólogos modernos mais apreciam e cultivam. porque para êles, só interessam os estudos de inter...

pretação, O que não deixa de ser perfeitamente ra­ ,cioIl/l1. Acontece porém, que reconstituição e interpre­ tação são dois proc.essos que dificilmente caminham

de mãos dadas, principalmente em caso particular como êste, que tem por objetivo evidenciar dentro da história de um detenninado lugar, ocorrências

que se processaram em tÔmo de uma determinada personalidade. No crescimento de nossas comunidades, obser­ vamwse duas épocas hist6ricas distintas: uma, a do "princípio de povoamento e form.ação, que na maioria

das v&es é escassamente documentada; outra de constituição de município; de vida administrativa.

autônoma, e de documentação pr6pria. Neste se­ gundo caso, já com um acervo apreciável constituido pelo arquivo local, pelas atas da Câmara, pelos re­ censeamentos, Jivros paroquiais, correspondência ofi­ cial, registros, posturas, sesmarias, testamentos, in.. ventários e papéis avulsos. que constituem material quase sempre suficiente, para quem possuindo capa­

cidade e disponha de tempo, empreenda uma análise mais profunda, mais minuciosa e portanto mais rica

em frutos de ordem sociológica. O mesmo não se dá com o perlodo anterior, ca­ rente, mais que tudo, de documentação sistemática, sem a qtial não será possível o estudo interpretativo. A fOllnação social e econômica de Piracicaba deve ser procurada nOs fenômenos dessa ordem, que detenninaram a vida da região em que se localiza o município; do ponto de vista geográfcio. Sua existên..

cia está intimamente ligada à vida da região capita­ noada nos primeiros tempos por Itú, depois o cresci­ mento da zona de povoamento, iniciada nos campos de Araraquara, do centro-oeste paulista, para o qual serviu Piracicaba, por muito tempo de b8ca.. de·ser.. tão.

Não há dúvida também, sob o ponto de vista his­ tórico a interdeperidência social, econômica e psico­


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DÁ ROCHA

16gica, que houve entre Piracicaba e alguns núcleos de povoamento situados em lugares bem distantes de sua sede, como a colônia militar de Iguatemí, na'! profundezas de Mato Grosso, e a zona de mineraçã:> de Cuiabá"das quais estava separado pOl' vasto terri­ tório despovoado e faltando um nada para ser des­ conhecido, e às quais muito dificilmente se Jigava por via fluvial ou por terra. Entretanto, Piracicaba dependeu tanto de Iguatemí que, em 1777, COm o arl'azamento desta pelo inimígoJ o pequeno núcleo de lavradores que constituia sua escassa população. p3.­ deceu muitíssimo, a ponto de quase desaparecer tat'. bém. A primeira notícia da fixação do homem civHiw zado na reg'ão ('m que se situa Piracicaba, tem~s.· através da sesmaria concedida no ano de 1693 a PI" dro dé Morais Cavalcanti, pelo capitão-lnór Mamtd Peixoto da A10ta, no dia 15 de novembro. «O pl'ri­ donário alegou que ia povoar com tôda a sua famí­ lia, de uma e outra banda do 1':0 Piracicaba. f!c:\nd:J o salto no m-:io (Cartório da tesoul'al'ia de fa"l.puda de São Paulo, LhTO 11 de sesmarias antigas). (1). Assim o salto .seria a parte central desta 3f,;snln~ ria, e em face da ausência de outros documentos coe­ vos, deve-se acreditar que tenha s~do a primt'ira ten­ tativa de exploração rural na região? p~rém, nada in­ dica que Pedro de Morais Cavalcanti tenha atingideJ seu objetivo 1 fixando um núcleo estavel de populaçi'\ nesse local. Ao contrário u":nta anos mais tarde, elO 1723:: é regist,·ada a favor de Felipe Cardoso, da «villa de Ut(l'» (2L outra se.l\maria, «porque estava vaga mUl­ ta parte de terra do porto de Piracicaba e elle sup­ plicante queria situar-se no porto do dito rio pa:-'â que lhe era necessario uma legua de terra de te..I\ta­ da, ficando o porto em meio, e para baixo mais ml~;a legua, e para cima outra meia legua de Sertão (3:~ e J como o pôrto de Pirac!caba lica muito próximo d) salto do mesmo nome, é de crer-se tratar-se das nlel;R mas terras que pertenceram a Pedro de Morais Ca" valcanti, devolutas então. o que era comum, à vi"'it>. do primeiro sesmeíro não ter executado os benefki"s exigidos por lei. f:,sse da «villa de 1tú», confirma o modo do pensar de Mario Neme, que, no «iníc:O é de In', principalmente que vêm os seus primeiros povoadc. 1

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r"", •

Existe notícia de outra sesmaria. Trata-se da concedida no ano de 1728 a Manuel Lopes Castoh Branco, com «legua e meia de terras em quadra no caminho do sertão de Piracicaba» (4). Do exposto conclue-se que, se até esta data n~i-1 havia gente civilizada radicada definitivamente nc.;, te.local, pelo menos a região já f.'ra conhecida e exC'r-

da no sertanejo da época, desiludido da cata ao ou to" certa fascinação, oriunda da ferocidade das terras que cercavam o salto, que no dizer de 1v1iUiet ';'e­ SaÍnt Adolphe, aptesentavam uma vegetação estu­ penda onde se ·encontravanl «arvores de extt aordin.i­ ria grandeza (5)>> e onde abundava a caça e a pesca_ Já em 1733 a impressão que predom,na é de ser essa região habitada, porque posseiros e sertanejos de Piracicaba vão engrossar, sob as ordens do velho Manuel Corrêa Anão, a pedido do conde de SUl"le­ das, a expedição que partiu de Itú para fazer guerra .aOs ferozes Paiaguas e Caiapós. Foram estas e outras razões, como a de ser o rio P.racicaba conhecido em todo o seu p.:rcurso, mesmo antes de 1721" que l~aram Mário Nem:, que com tanto carinho vem estudando a formação h!s­ tórica de Piracicaba, afirmar que é inteiramente de3­ tituida de fundamento~ a lenda que Azevedo Mar­ ques registrou por ouvir dizer de «pessoa aut01 i7.a­ da (6.) que: <o princípio da povoação f"i s?rvir d" d:gredo; os capitães-mores. de Itú e Porto Feliz, quando algum dos seus subditos lhes cahi.a em de­ sagrado, faziam~n'o embarcar em Porto Feliz, desce: o rio Tieté até a' foz do Pirac!cab!l, subir por este, " larga-los em Piracicaba~ então denominada - sl:r­ tão». No correr de 1766, o capitão genoral Luís An­ tonio de Sousa Botelho Mourão, Morgado Mateus, como braço executivo do pensamento da Metrópole, .xpresso na carta régia de 26-1-1765, que autorIZava' a criação de vHas e fregues:as nos lugares que jul­ gasse conveniente e tendo em vista asseguraI' a ma­ nutenção da c01ônia de IguatemíJ de tão triste me­ mória e que constituiu uma de suas maiores preocu­ pações, delibera criar seis povoações. Dessas «Huma na Barra que faz o Rio Piracicaba entrando no rio Tieté, dez leguas adiante de Araraytaguaba última povoação em que se embarca para Cuyaba, para os que fazem esta viagem tenham escalla mais abayxo ' em que possão refazer-se (7).» Para a realização dêste empreend:mento o capi­ tão general escolhe «para Diretor dclla a An tonio Corrêa Barbosa (8).» Antonio Corrêa Barbosa (Silva Leme, «Genea­ logia Paulistana», volume V. título Alvarenga•• pág. 240, 5-6), nessa época mais ou menos cOm trinta anos de idade, não se estabeleceu no locaI detelmina­ do~ provavelmente à v:sta das condições top()gráfica~ do loeal, sujeito a febres c, quem sabe 11 vista des ru­ mores que, então corriam, de uma provável incur são annada por parte dos castelhanos. Credenciado pelo governador da Capitania, p ••.­ corre êle o sertão, desce o grande rio, abre estradas por terra e manda e desmanda. R


CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA Suas funções crescem tanto em importância, que se torna atrabil:ária, prepotente e mesmo como adiante ver-se~áj insubordinado. A localização de Piracicaba é um caso curioso de desobediência e além de cutioso é de cap:tal im­ portância para () estudo do povoamento e da fOlma­ ção do atual municlpio, Ordenára o capitão-general que a povoação se fundasse na foz do rio Piracicaba no Tietê, porque a isso se prendiam interêsses ime­ diatos da Capitania - ou de seu govêrno, empe­ nhado como estava em ações bélicas contra Os espa­ nhois do Paraguai. Araraitaguaba, hoje Pôrto Feliz, era o pôrto mais avançado onde os comboios que d;!­ mandavam pela estrada das águas os postos milita­ res da fronteira, se reabasteciam. Corrêa BarboSfl entretruIto, desprezando ordem expressa do capitão general, foi estabelecer o nOVO núcleo populacional, nas cercanias do salto do Piracicaba, portanto em um Io<:al distante cêrca de setenta quilômetros do ponto determinado pela portar:a do Morgado de Mateus. No estudo dó povoamento de São Paulo, essa localização feita mais ou menos à revelia, ocorrem certas circunstâncias de inegável interesse, porque. na ocasião em que se deu - 1769 - já desaparecera de todo a exploração do our" - que foi a riqueza nlóvel condicionante da uma forma de pioneirismo --- a dos bandeirantes. Pioneirismo pouco, ou me­ lhor, nada povoador. Na Capitan:a então imperava, como derivativo); para uma coletividade pouco amiga de sedentarismo (' amante de aventuras, o regime militarilita ---; uma fa"e de transição ao escasseamento do Out"o das mi­ nas e desaparecer o interêsse na preação de ind1ge­ nas. Francamente tinha início nesse fim de século, como fonte de riqueza, a exploração agrlcola, que até os princípios do século XIX, não passou de ativi* dade secundária. Isso porque, como escreveu Gilber­ to Le'te de Barros em seu trabalho «A Cidade e o Planalto», «o brasileiro colonial. 50bretudo o mame­ luco, o mulato ou o cafuso, do Norte Ou do Sul, não tinham oportunidade de aprender coisa alguma sa­ bre agricultura. Ademais, revelava-se meio burroide para compreender as subtilezas da agronomia. Por e>'~lDplo insistia na prática da coivara., o que o leva.. va a mudar constantemente de ares; aceitava~ por~ que não havia outro remédio, a estrutura social esta· belecida, submetendo-se, cegamente ao poder dos grandes senhores de engenhoJ da pecuária e, mais tarde, do café». Foi assim, nesse pedodo de deca­ dência econômica que se fundou Piracicaba - o que devia ser feito, se tivesse se erguido nas margens do Tietê, no 'nteresse militar do govêrno de São Paulo. . A povoação porém não se ergueu nas margens

21 do Tietê, segundo O plano estratégico do capitão-ge­ neral e não se localizou nem mesmo à beira de qual­ quer estrada, não obstante ter sido aberto um cami­ ,nho, aliás muito ruim para Cuiabá, meio século an­ tes, que se encontrava invadido pelo mato em muito,;: pontos, por ter sido seu transito trancado por deter­ minação oficial logo após a sua construção, caminho êste que passava pelas proximidades dó povoado. O que acima foi escrito tem por finalidade ape­ nas demonstrar que Pirac'caba não foi núcleo de dundação deliberada», não só porque não se cum­ priu a missão oficial a que fôra destmada, mas priu­ cipalmente porque a povoação já existia desde o pri­ me:ro quartel do século, há quase cinquenta anos. O govêmo da Capitania, através de seu prepos­ to c do ato de certo modo arbitrário dele, nada maio fb. que legalizar - com a fundação oficial de 1767 - wn estado de cousas já existente de fato, que per­ duraria, e progrediria, mau grado a qualquer cir­ cunstância ,adversa e estas não fa1taram~ Não se trata também de prímitivo «P".!JSO" de tropeiros, &se profissional que se tornou comum no planalto paulista, na segunda metade do século XVIII, indívlduo que contribuiu também, para com­ plementação do sistema econômico da Capitan;a. Não teve também relação direta ou indireta COm o movimento das bandeiras. não se incluindo tam.. bém no quadro dos 'núcleos populacionais ge,"'dos em tomo de uma capela, porque só depois de oficial­ mente fundada é que o povoado teve sua casa de Deus, Por outro lado, o povoamento de Piracicaba não precedeu a abertura de estrada - pois só Se iniciou depois de construido o caminho de Itú para suas ter­ ras, caminho feito pelo primeiro sesmeiro. Ocorreu aí uma tipica fundação peto processo das sesmarias o.. melhor, pelo processo agrário, já que seus habitan­ tes não tinham atividade que o amanho da terra, pe.­ cuária rudimentar e na atividade agrícola, ptedoIDi.. nava a lavoura da cana de açúcar. E nesse gênero de atividade, o capitão Francisco Franco da Rocha, não foi exceção, como se vê nos recenseamentos de 1802 de Itú e 1805 da população de Piracicaba. No primeiro encontra-se o seguinte: - «Mappa Geral dos hab:tantes na Freguezia de Piracicaba e seo Destricto em opresente Anno, seos Nomes, Em­ pregos, Naturalidades, Idades, Estados, Cores e 0<:­ cupaçõens com especificação das Casualidades que acontecerão em cada Uma das suas Respectivas fa­ mitias desde a fatura da lista antecedente .


~2

CAPITÃO FRANCISCO·FRANCO DA ROCHA

2 Fl'ancisco Franco da Rocha

Capro de Ordnça desta

Povoação, . nat de Itu

D. Maria de Arruda GeJ Fos João Manoel

58 C B

José

16S 14 S 12 " 10 " 2: a 7 "

28 C fi 20.S B 18 S B

Francisco ,Antonio

Luiz Antonio

mez

Anna. Aggos Bento Roiz . F raneisea de Paula Fos

B B B B

Senhor de Engo. Ignora a produção de sua sarra por se não ter ap.urado até apresente. 50 sim tem feito Agua ardtc. 20 Can das q dispOZA na mesma terra. Planta mantimentos para seu gasto Acresce sua família

Anna q~ nasce0

B

B

40 C P 2.. C N

N N

9 7

José Lino Escros

12 Na seg~nda: o seguinte:

F regue'.lia de Piracieaba

1

o

Capm Franco. Franco da Rocha D. Maria de Arruda Gel. Filhos

Sua

60

30

mel'

/

solt. 20 solto 16 solto i I

Manuel Franc:sco Antonio Luiz

12 5

Antonio Anna

.~

Maria

2 12 e",ravos 4 escravOS Snr de Engo. produzio a Sua saffra deste anno Assucar

Alvo Redondo Mascavo

Antonio Corrêa Barbosa escolheu, 'para fixar-se, um lugar que ficava distante setenta quilcmetl'O!' da barra do Pií·.acicaba, no Tietê, rio acima, em

sua m:<.r­

gem direita e dnde~ dç\'ido à formo~ura da p~is~g~'m, enriquecida com as b<,e}ez.as do Saho,já se encontra­ vam estabelecidos com seus ranchos, roçados e p~­ quenas culturas) pescadores e sertanejos. Assimt «a povoação p"rim'itiva foí estabelt'cida na

271 arrs 70 ditas

11 ditas

/

margem direita do r:o, pouco abaixo do salto, no 10­ gar atualmente é pasto da fazenda do Dr Estevam de Rezende: seus principais sinão únicos etiifício~, constituíam em uma pequena capella, casa do pa­ dre, e um grande telheiro debaixo do qual 0' mora· dores se te!lnião para esperar a .missa (9).».

A 24 de julho de 1765, Antonio Correa Barbosa é nomeado diretor e povoador de Piracicaba, com


t.~PITÃO

23

FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

ordem expressa de tratar Os ,moradores ant:gos e Ou­ tros que ali fossem fixar residência «com toda SU'll­ v:dade e sem vexação (10)>> e a 1-8-176' é a povoa­ ção oficialmente fundada.

O desejo de ver a povoação crescer rapidamente para com sua produção auxiliar a guarnição de Igu.,­ temi, lhe proporcionando um celeiro que fosse um" garantia para a pennanência no local, da guarniçã:i ai destacada para defende-la, foi que levou o gener.l d. Luís Anton'o de Souza Botelho a determinar qu·, desclassificados sociais fossem entregues a AntOU~j Corrêa Barbosa, como se vê pelo seguinte trecho da carta que dirigiu ao povoador de Piracicaba em 28-1-1768:

«O Ajude, MeL José Alberto entregará, a vrnce. 'os prezos que Constão da relassão P(·... mim rubr:cada de que vmce. deve tomar con­ ta e fazer-lhe aCentos de Suas naturalidade" Com os mesmos hirá vmce. povoar na mar­ gem do rio Tiete os Sitios de Avanhandava, Barra do Pirassicaba, e Itapura co! mais qUi" forem convinie)ltes }la. bem dos povos. . (11).» Aí, talvez, tenha t'do origem a infonnação pres~ tada pela «pessoa autorisada. (I Z), a que se refere Azevedo Marques. Em 11-12-1771 fui Antonio Corrêa Barbosa p,'o_ movido a capitão eJ três anos mais tarde, a povoação que «por espaço de seis anos, dez meses e vinte dias (13)>> estivera sugeita. a voz Paroquial de 1lú, COm grave detrimento pela distâneia de quatorze léguas, que intennedião (14)>> obtem seja erigida «1gl'eja para Matriz (15) >, constituindo freguezia separada de Itú. Seu primeiro pároco, empossado a 21 de junho de 1774, foi o «Reverendo 'Padre João Manuel da Sylva Présbitero Secular de virtude e Letras (16)., :€ como padroeiro escolhido Santo Antonio, provavel­ mente em homenagem ao Santo de nome do captiã·) povoador. Em 1775, segundo recenseamento de 1tú, na par­ te referente à povoação de Piracicaba, existiam nO local 45 fogos e a população estava assim distribui­ da:

Masculinos até 7 anos ........ 37

Femin'nos até 7 ànos .... ~ . . . 26 Masculinos de 7 a 15 anos. ' . . 21 Femininos de 7 a 14 anos. . . . . 17, Masculinos de 15 a 60 anos.. '61' Femininos de 14 a 50 anos "., ,61 Velbos de 60 anos para cima 6 Velhas de 50 anos para cima .. 5 Total ........ , , . .. . .. .. .... 234 habitantes

Donde se conclue que a população, abaixo de 6.0 anos e maior de 15, provavelmente toda ela era fot­ mada de casais e que considerava as mulheres com.o sendo velhas, desde os 50 anos e os homens s6 qllan­ do atingiam a casa dos 60, isto é 1.0 anOs mais idoso. que as mulheres. O capitão povoador, que nesse tempo devia 'es­ tar com quarenta anOs de idade ·ou pouCo mais, vi.. via em companhia de sua espôsa Ana Lara da Silva, então com 28 anos de idade, seus quatro filhos, João Barbosa, Alexandre, Antonio e Bárbara, respectiva­ mente com 8, 3, 2 e 5 anos de idade, seus doze agre­ gados e seis escravos. Em 1777, Iguatenú, de tão triste memória e que tantas lágrimas fez COrrer aos paulistas deserdados da sorte, falta de recursos, à v:sta do abandono a que a relegou «o Governador Fidalgo eomo o chamavam por ironia (17)>> Martim Lopes de Saldanha, é for­ çada a capitular) cai nas mãos dos paraguaios e é arrasada.

Piracicaba que tinha'sua vida int:mamente liga. da a essa praça fort,", da qual foi estaleiro de canoas e celeiro humano e alimentar, forçosamente tinhh que ser at'ngida pela ruina daquele estabelecimento militar, porém, já possuia suficiente «vitalidade paR ra crescer sosinha (18)>> ao encerrar-se o'ciclo da sita atividade, que provinha do rio que lhe dera b nome e que fôra a causa da fixação do primeiro ná­ cleo de sua população, Tanto isso é verdade qué, 1781 aumentara de onze fogos, passando assim, a 56 e teve sua população acrescida de 55 almas, o que elevou a 289 o número de seus habita,ntes. Com o desaparecimento de Iguatemi, diz Silvei. ra. Martins: «ficaram sendo de pouca importância os motivos da exi"stência da povoação à margem di .. reita do Pirac'caba; não. havia mais necessidade de estaleiro para a fabricação de canôas, e nem do rio como barreira que difieultasse aos soldados e degre­ dados apanharem a noite a estrada de 1tú (19)>> e como o local em que se achava a matriz «nao era suficiente para hua extensa Povoação (20). resol· veram os povoadores, tendo a frente o capitão Anto7' nio Corrêa narb,osa e o vigário frei Tomé, dirigirem ao capitão general 'Francisco Cunha Menezes urná


24 petição solicitando que fossem autorizados a remover a povoação para a outra margem do rio, em ponto situado «iogo abaixo do Salto, sitio alegre, alto, pla­ no e não distante das agoas (21)., o que fizeram a 6 de junho de 1784.

Vicente da Costa Taques Góes e Aranha, usando da influência que emanava de sua autoridade como· capitão-mór de Itú prestou na mesma ocasião Os in­ formes necessários ao capitão-general e de tal modo que, nO mês seguinteJ a 7 de julho, recebia instruçõ.-::.s para satisfazer a pretensão dos piracicabanos, diri­ gindo-se então, àquela localidade a 22 do mesmo mSs, na companhia do capitão João Fernandes da Costa, do mestre entalhador Miguel Francsico Peas Soares e vários armadores. Permaneceu Vicente Taques G6es e Aranha em Pirac.caba até os primeiros dias do mês de agosto e ésse lapso de tempo foi empregado na escolha do lo­ cal onde deveria ser instalada de novo a povoação, bem como em atender às queixas da população e do vigário> contra o capitão povoador, que foram amar­ gas e em número considerável. Com o beneplácito geral escolheu·se para mu­ dança da povoação um «lugar abaixo do Salto e es­ tando este coberto de mattas alimpou-se e preparou­ se de mãm commum para o del:neamento da Po­ voação (22). e a 31 de julho depois de assistida a missa por intennédio da qual imploraram as graças divinas «da Soberana Imperatriz do Céo e da terra e sempre Virgem Maria Nossa Senhora (23)>> diri­ giram-se para 040cal de antemão escolhido e demar­ caram «um pateo Conl quarenta e seis .braças em quadra (24). para edificar a Igreja Matriz bem co­ . mo delineou-se «mais aos lados do referido pateo duas ruas direitas do Sul ao Norte e duas travessas de Oeste a Leste com cinco braças de latitude com cincoénta de longitude, plano suficiente para edifi­ carem suas moradas não s6 os actuaes habitantes, mas ainda "muitos v'ndouros (25)>. Antonio Correa Barbosa, a fim de poder realizar êste empreendimento, adquiriu por compra, dos her­ deiros de Felipe Cardoso a sesmaria a que foram fei­ tas referências no início destas considerações e sôbre a qual será dito algunla causa, posteriormente no correr dêste trabalho, di...idindo-a em lotes, que fo­ ram distribuídos aos que desejavam fixar residência na nova sede da freguesia. Tantas foram as que'xas recebidas dos piracica­ banos por Vicente da Costa Taques Goes e Aranha contra o capitão povoador, durante sua curta per­ manência por essa ocasião, na sede da povoação, que viu-se na contingência de chamar a atenção de Antonio Corrêa Barbosa, medida esta por~m contra-

CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA producente, como os fatos posteriores serviram para demonstrar . Assim â vida de Piracicaba em seus primeiros: tempos caracterizou-se por uma série de pequenas questões entre os povoadores ciosos de sua liberdade, o representante do clero tolhido em suas funções e Q capitão povoador, intransigente em sua prepotência. Como estbpulo em suas Jutas com o pároco da freguesia, tinha para an:má-lo os péssimos exemplQ'l vindos do govêmo da Capitania, onde Lopes Salda· nha primava-se, pelo desrespeito ao piedoso bispo frei Manuel da Ressurreição. O que foram essas questiuncuLas e que ponto chegou o descontentamento da população, tem-se uni típ:co exemplo nO que se refere à construção da no~ va Matriz, em que se vê uma agremiação profunda* mente católica, criar as maiores dificuldades a rea­ lização dllste piedoso empreendimento ao ponto dela ser edificada em proporções mu:to menores que a pri­ mitiva capela construida~ Este período agudo de hostilidades «marcou a; poucas relações entre os moradores e o povoador, que enva de corrigir .os seus atos de modo a que não fossem de encontro aos estorvos que lhe antepunham seus briosos gOvernados, prosseguindo na sua política de ostentação de fôrça~ passou a exceder-se em arbiw trariedades, não tanto agora levado pelos seus imp::­ tos naturaes mas sim pelo desejo de mostrar que da­ va de barato aquela oposição (25)>>, modo de pro­ meder assiz natural se levarmos em conta o síslem&. patriarcal da época. A vista dessas ocorrências, frei Tomé de Je,us abandona a povoação, na finne intenção de ná" mais voltar, porém, ao passar por Itú, caminho for­ çado para seu convento em São Paulo, encontra-se com Vicente Taques Goes e Aranha e abre-lhe o co· ração, porém, de tais ordens foram os argumentos apresentados pelo capitão-mór de It6 que, resolve voltar a sua paroquia, onde os habitantes aos 8 de ja­ neiro de 1785, redigem uma pesada queixa contra Antonio Corrêa Barbosa, que, é enviada ao eapítão­ general. Frei Tomé pouco mais demorou·se na fr~guesi.;);, desiludido l cansado de tanta luta, «vexado e escan~ dalizado cada vez mais (27)., abandona seu rebanh" deixando Piracicaba em julho de 1786. Aos 5 de mao de 1785 havia sido empossado no govl'rno da Capitania o capitão-general Frei Rai­ mundo Cichorro da Gama Lobo e os piracieabanos dirigem-lhe uma petição, na qual, depois de narra­ rem o que se passava, indiretamente pedem a substi­ tuição de Antonio Corrêa Barbosa do comando da povoação, alegando que: «enquanto governar aque!­


CAPITÃO. FRANCISCO. FRANCO. DA Ro.CHA le Capm. Diretor nunca será a dita povoação util, nem terá adiantamento (28)>>. Ao' capitão-mór dc Itú, Vicente da Costa Ta­ ques Goes e Aranha, cabe por determinação do ca­ pItão-general, informar essa petição e o faZ apaixona­ <lam,nte, sendo dela os seguintes trechos: «Há certo que esquecendo:se o referido Capi­ tão DiretOr daquelas determioações, e abuzan­ do de seu poder não regeu aquelles COmo po­ voadores e libertos, mas como escravosl casti­ gando-os com' açol.,ltes e a páu; com açoute3 como praticou com Antonio Pontes, Lourenço Rodrigues e Manoel da Costa, e a páu José Rodrigues e Manoel Fernandes, João José da SJva e Januaroi de Tal e como escravos os ocupa em seu particular serviço (29).» E neste estilo, narra as perseguições sofádas p. lo primeiro pastor de almas da povoação, que ten por êsse motivo de abandonar a localidade, persegui­ ções q uc continuaram na pessoa que anos 4epois veio

.substitui-lo nessas funções. ' o. francsicano Frei Tomé de Jesus :"0J;n mui di­ lll;nuto templo ficou gravemente escandalisadó (30)., a vista dos maus tratos a que foram sujeito. vários moradores, que por êsse" motivo se viram obr~­ ,gados a deixar o povoado, contando-se ante êstes. Cristóvão Corrêa da Costa, «homem branco e faml­ lhado (31.)>>. E afirma que «aquella povoação erecta para bem .do Estado nenhum augmento tem tido por causa Ge~1.e Captão, e' nem terá emquanto elle governar t,,:,:,) », e termina dIzendo: «está aquella Povoação <cnstituida um couto dos maiores insultos. A mmha \""S não se ouve, as minhas ordens e providenc'as nã)

se e"'cutam, o.s individuos de mdhor c'onduta não são .aceitos, .os criminosos aili acham aziló cOmo) .Francisco Pedroso, querellado na ViDa de Fax:na pe.­ lo rapto que fez de uma moça, com a qual foi morar á sombra do referido Capitão, e indo em segúimento ,da mesma com uma precatoria daquelle juizo e ap."­ sentandO-a ao Dr. Corregor. que pelo' dito Cap'tão ll,andasse cumprir 'aquella precator:a, e ordenando­ ,lhe cu com maior émpenbo esta execução deo fuga ·a hum e a outro; tão bem com criminoso José Soa­

res, com quem ainda teve o dito Capitão tracto e ·conversação familiar, sendo sabedor das apertadissi­ mas ordens para a sua pris~; e tão bem alêm de

muitos que não,expresso, c6mo João Benedicto preto forro, que 'depois de ferir mortalmente ao pardo João de Almeida sahio daquella Povoação a vista de' todos, sem que para sua captura fizesse o dito Capitão a menor diligencia. Estes e outros infnitos absurdos e desordens tem posto aquelle povo em tal desespera­ <;ão e ira, que chegam a blasfemar que o referido Ca­

25 pitão ha de ir para o Inferno montado em mim-elle pelos insultos que comete, e eu por não dar-a ulti­ ma providenc a suppondo que nas minhas mãos está oremedio (33)>>. Estas informações' de tal modo impressionaram o capitão-general Frei Raimundo Chichorro, da Ga­ ma Lobo que resolveu enviar para Piracicaba um própr:o de sua confiança, o conego João Ferreira de Oliveira Bueno; munido· de poderes discricionários para resolver o incidente dando a tudo «acomoda­ mentO e confraternisação (34)>> porém as medidas que tomOu não foram de moldes a satisfazer a popu­ lação pois, embora tenha substitu'do Corrêa Bar­ bosa no coman.do da povoação, sua escolha recaio em Joaquim Meira 'Siqueira, amigo e partidário do co­ malldante destituido. Frei Tomé de Jesus, a quem ainda uma vez ti­ nham conseguido convencer que não devia abando- ' nar sua par6quia, retornou a Piracicaba porem, sua permanência não foi além de um ano e assim aban­ donou defin'tivamente Piracicaba a 15 de junho de 1788, quando já governava a Capitania, Bernardo José de Lorena> ~ com sua ausência ficaram os Pira­

racicabanos por dez longos anos, privados dos socor­ ros espirituais que tinham de procurar -em Itú, quan­ do deles careciam. Em 1191, de acÔrdo com o que se encontra no recenseamento de Itú, lista da povoação de Piracica­ ba, possuia esta 327 habitantes, distribuidos em 46 fogos e achavam-se sob o govêrnei, de' Benedito José Alves, e entre os nomes de seus habitantes não se en­ contra o do antigo capitão povoador Antonio Cor­ rêa Barbosa, que, segundo Mário Neme, deve ter fa­ lecido no ano seguinte~ E' nos fins dêsse ano que a figura enérgica e sim­ pática,do capotão Francisco Franco da Rocha, cOme­ ça ter ligação com a história da' povoação de Piraci­ caba. Com a morte do capitão Antonio Correa Bar­ bosa, determina o capitão-general ~rnardo José de Lorena, aos 6 de outubro de 1791 que, sejam ind'ca' dos os nomes de «Ires pessoas capazes c' beneméritás (36)>>, para dentre elas «escolher huma (37)>> que, bem lhe parecesse "Para ocupar o Posto de Capitã? da. o.rdcnanças da Povoação de Piracicaba, que se achava vaga pelo falecimento de Antonio Corrêa Barbosa, que o exercia (38) ». Mário Neme estudando a fundação de Piracica­ ba, escreveu: - «Infel'smente não podemos encou- , trar até agora a portaria da nomeação 'do substituto de Corrêa Barbosa, cuja indicação fÔra solicitada por Bernardo de Lorena á Camara· de. nú ,a 6 de outubro de 1791. E' de presumir-se,~porém, que des­ se ano: até fevereiro de 1792 th,,"..e sido nomeado>


CAPITÁO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

26

D~monstra assim esta lista, que ó cap"tao-móe Vicente da Costa Taques Ooes e Aranha aparece CJ­ mo comandante de Itú no ano 1792, pela primeira vez, pois no ano anterior enCOntrava-se êste posto em mãos do capitão Bento Dias Pacheco e que Car­ los Bartolomeu encontrava-se naquela localidade co­ mo sargento-mór reformado. Feito êste ráp:do esboço de evolução histórica de Piracicaba, desde sua fundação até encontrar-se sob o comando do capitão Francisco Franco da Ro­ cha, passo agora a descrever" t!m traços rápidos a sua personalidade. O capitão Francisco Franco da Rocha (Silva Leme, «Genealogia Paul stana"., volume I, página 262, 5-3 e 537, 4-1; volume IV, páginas 56, 4-13, 78, 5-7, 220, 5-1, 248, 6-4; volume VI, páginas 24, 4-3­ (; 553, 2-7 e volume IX, página 42, 3-7), nasceu em Itú no ano 1774 e seu assentamento de batismo que encontra-se na página 94 do Livro número 3 de bati­ sadas de brancos, de Itú, referente aos anos de 1783 a 1753, pertencente a.o Arquivo da Cúria M·etropoli­ tana de São Paulo, assim d:z: «Franco.

Aos quatro dias do mez de Março de mil so­

tecentos e quarenta e quatro annos baptisel

com os Santos Oleos a FlancÍsco innocente fi­

lho de João Franco da Rocha e de sua mu­

lher Mada Friaz: Forão padrinhos Manoel de

Fria Tave;ra solteiro e Maria de Godoy tam­

bém solteira moradores desta Villa; de quo fi"

este assento.

Vigario Miguel Dias Fera.».

Carlos. Bartolomeu de Arruda para o cargo de Capi­ tão das Ordenanças de Piracicaba, pois andava ele por essa época nas boas graças do Capitão~gene­ ral (39)>>. Julgo trazer algum esclarecimento SÔbre êsse ponto obscuro da história piracicabana:, :reproduzin. do o registro da patente do capitão Francisco Fran­ co da Rocha, copiada no ArquNo do Estado de São Paulo, do Livro de Sesmarias, Patentes e Provisões 0.0 29, referente aos anos de 1788 a 1794, às fls. 106, e que diz o seguinte: «Aos 2 de Dezembro de 1791 Se Registou a Patente de Francisco Franco da Rocha, pas­ sada em 27 de 8bro. do Corrente, do Posto de Capitão das ordenanças da Fregue-.ia de San­ to Antonio de Piracicaba, dotermo .da Va. de Ytu, de que hé Capm. Mor Vicente da Cos­ ta Taqués Goes Aranha; Cujo Posto vagou por falecimento de Antonio Corrêa Barbosa, que o exercia -

Duas vias».

Além disso, a lista de população de Itú te ao ano de 1792, contem o seguinte: Lista geral da Va. de Itu 1792 Cappam. Mór Vicente dá Costa Taques Goes e Aranha Dna. Aldabrandina de Mello Filhos Manoel Florencio José Raimundo Maria Josefa Bernardo Luiz Anna Maria Hospedes José da Rocha Leme Anna Maria de Fria. mero deste Filbos Francisca

Manoel Salvador Gurgel do Amaral Margarida mer.· deste Filho Vicente Escravos

43 33 6

4 3 I

37

25 3 I mez 24 18 1

-::-c----­

Sargento Mi". Rcfonnado Carlos Bartholomeu de Arruda Dna. Maria de Meira Siqa. Filhos Alfes. Manoer Joaqm. pto. de Arruda Carlos José Boto. Eugenia Maria Maria Francisca

Escravos

referen­

47 47 46

20

5 18 15 32

I

Seu padrinho Manuel de Frias Taveira (Silva Leme, «Genealog·a Paulistana., VI, 26, 3-5 de 4-6) era filho de Antonio da Costa Aranha e de Sua "'­ pô... Ana de Godoi; neto patemo de João Aranha dOs Santos e de Joana Rita (Silva Leme, IH, pág. 48) e neto materno de João de Frias Taveira e do sua segunda mulher Catarina de Godoi, COm quem casou-se em Itú em 1707. Casou-se em 1754 em Itú, com Maria Garcia de Campos, filha de José Corrêa Le:te Penteado e de Maria Borba, com geração des­ crita na .Genealogia Paulistana., IH, pág. 40. Sua madrinha Maria de Godoi Cordeiro, irmã de Manuel de Frias Taveira, casou~se em Itú no ano de 1751 com João de Godoi Moreira, de Conceição de Guarulhos, filho de João de Godoi Moreira e de Antonia Furtado Pinheiro. Faleceu em Itú no ano­ de 1763, tendo deixado apenas uma única filha, que receheu O nome de Maria. Ambos os padrinhos eram tios do capitão Fran­ cisco da Rocha, por serem irmãos de sua mãe, Maria .de Frias Taveira. Seu pai, João Francisco la Rocha (Silva Lo­


27.

CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA me, I, 356, 3-8; n, 222, 4-3; VI, 24, 3-1 e 553, 2-7; IXIX, 42, 3-7), era natural de Atibaía e faleceu em 1759. Sua mãe, Maria Frias Tave:ras (Silva Leme, I, 536, 3-8; lI, 22, 4-3; IV, 127, 2-3; VI, 553, 2-7 c IX, 42, 3-73), nasceu em Itú, provavelmente no ano de 1715, levando em consideração as anotaçõ,. qu~ se encontram no recenseamento de 1765 da vila de Itú, onde aparece seu nome em companhia de SU3.$ flihas Francisca e Ana e no estado de viúvo. Maria Frias deve ter-se casado três vezes. Sua, primeiras núpcas foi com José Leme do Pl'ado e se n~a:izaram em ltú no ano de 1725.

Pela segunda vez, a vista do que se encontra em Silva Leme, volume IV, página 127 e na Revista do Instituto de Estudos Genealógicos, n.o 1, ano de 1937, pág. 264, § 3.0, 2-3, em um trabalho do dr. Francisco de Assis Carvalho Franco, intitulado .0 Titulo dos Arrudas Botelhos», casou-se cOm Miguel de Arruda, filho de Sebastião de Arruda e Sá e de lnácia de Lima, enlace êste que deve ter-se realizado em Itú no ano de 1740.

Pela terceira vez com João Franco da Rocha. Treze foram os irmãos do capitão Francisco F"anco da Rocha, dêsses, porém, somente Ana Fran­ -co Bueno (Silvã Leme, I, 542, 4-2), casada em Itú ,,,, ano de 1790 com o capitão Lu!s de Araujo FiI­ gueiras, natural de Cuiabá, o foi por parte de pai e mãe. Os outros í'rmãos, apenas pelo lado materno, f:>­ raro: João Leme Frias, solteiro em 1766, José Leme

Fr as, falecido solteiro, Catarina Leme de Gadoi, ca­ sada em 1750 em Itú com Antonio Leme da Silva, Maria Leme do Prado, casada em 1733 em Itú com Miguel de Gadoi de Almeida, todos êstes, filhos de José Leme do Prado. Foram ainda seus irmãos pelo lado materno, Mi­

guel de Arruda Botelho, Manuel Rodrigues de Frias, -casado em 1769 com sua parenta Maria Leite, Cata­ dna de Gadoi, casada em 1761 em Itú com João Francisco Ribeiro Guimarães, Inácia de Arruda, sar­ gento-mór de ordenanças Eufrasio de Arruda Bote­ lho que foi importante cidadão de Itú, onde OCupou cargos públicos e casado na mesma localidade em 1796 com Ana Joaquina de Campos, Gertrudes Ca­ bral, casada com Antonio Rodrigues Soto, Rosa Ca­ bral, casada em Itú em 1775 COm José Ribeiro da Silva e finalmente João Cabral; falecido em ltú em

1773, com 28 anos de idade e casado com Maria da.. Penha. João Francisco da Rocha deixou também duas filhas naturais de nome Catarina e Escolástica. Por largos anos residiu o capitão Francisco Fran .. co da Rocha em Itú Ou seu município sendo que ()~ prime:ro recenseamento que faz referendas a sua pessoa, já instalado e com casa própria, é o datado de 1776, quando residia nO Baírro Cayacatinga.

ltsses «Mappas de População" tiveram início em 1765 e foram executados em todas as localidades da Capitania, por determinação do capitão-general go vemador dom Luis Antonio de Souza 'Mourão, Mor­ gado de Mateus e foram mantidOs pelos governado­ res seguintes. No que acima foi feito referência, o de, 1776, consta o seguinte com relação ao capitão Francisco Franco da Rocha: Casa de Francisco Franco da Rocha sold Do de cavo. Meren.no

Teodoro Fraco. Fel:p-e Franco, da Rocha Franco .Reginaldo Salvor. Ma, Bernarda Barbara Rosa Soares Escolastica Rosa Rosa Catana.

escr~

6

esc esc esc

9 9 '8 39

esc

28

esc esc esc mer agr esc esc agr

18 7 2 12 17 70 50 60 72

1.0 sexo masc até 7 2.0 de 7 a 15 3.0 de 15 a 60 5.0 e sexo io te 7 a 6.0 de 7 a 15 7.0 de 15 a 70 8.0 de 70 pa ca No ano segujnte o capitão Francisco Franco da Rocha, passou a residir no bairro !tainguas,u e na


28

CAPITÃO FRANCiScO FRAlIlCO DA ROCHA

. «lista de População» da vila de Itú, dêss. ano, 1777, consta o segu:nte:

No recenseamento dêsse ano,' feito p:>r seu pró­ ' prio punho, encontra-se o s~guinte:,

'352 ­ Casa d. Franco. Fra'nco da Rocha 2.• de 2 a 15 anos

Lista da éompa. do, Capitan Francisco Franco da Roxa 47 Francisco Franco da Roxa. mer 2~ D. Roza Soares FJhos 14 Eufrasio 10 Joan 8 Manoel José 3 Franco. 1 Antonio 12 Maria

Eufrasio fo. Merendano esc Theodoro Frco. Felipe

8 9 12

13 10

Soa de 15 a 60 Franco. Franco da Rocha Raimundo esc Salvador

32

30 31

6.a de 7 a 19

Ma. esc Bernard~

esc

9 8

7.a de 19 a 40 Rosa Soares

19

8.a de 40 aSa.

Caterina agreg escr Rosa Rosa

7l

57 62

Já no recenseamento de 1778, encontra-se Fran­ cisco Franco da Rocha em Itú, como «Auxiliar de ACavalo» e no ano seguinte morando em Itú, no bair­ ro Poriumd,uba, incluido na lista do «Capitam Joa­ quim Meyra Siqueira «como «Soldo.», com um ca­ sal de filhos (Eufrasio e Maria), dez escravos e três «Forros», (Salvador, Mati.. e Romaria). Nos anos subsequentes passou a residir no ba:r~ Itaimirim, fazendo parte da companhia do capitã.:> André San Payo Botelho em 1784 e 1787 e na do «Gappam. Joaqm. do Amaral Dias Ferraz Gurgeb em 1791, e em sua companhia encontrava-se entã0 com 68 anos de idade, sua velha irmã olCaterina Franca». TO

Uma vez porem, que fôra escolh"do entre «as pessoas capazes e benemeritas (40)>> para ocupar o posto de comandante dã povoação, transfere sua re­ sidência para Piracicaba onde é encontrado no ano de 1792, em companhia de sua família, em substitui­ ção ao falecido capitão povoador Antonio Corrêa Barbosa. '

,

Apesar das desagradaveis ocorrências de que Pie. racicaba foi palco nos anos que prec~deram a sua chEgada a essa cidade, Franc!sco Franco da Rocha,. homem de «muita honra, inteireza e limp.:za de mãos. (41), contribuiu para 'fazer cessa:!' a atmosfera pesada de ódio e desconfiança então reinante na: lo­ caIidade que, começou a prosp~rar satisfatoriamente. O capitão-general Bernardo José de L<>"na, a vista de começarem a escassear em PÔrto Ferz, ter­ ras apropriadas para a cultura da cana de açúcar,_ Imo se can3ava de r:ccm~ndar ao capitão-mór de Itú,< (; emprego de «effieazes providêneas. (42). no seno tido de incentivar O' que «serja util ao servo. de S. Mage, a povoaçãp, e cultura das terras, q. c:.:>mpre~ hende a Frega. de Pirao' caha (43)>. Os agricultores das visínhanças, prÍnc'pa)mente' de Itú, sentem-se atraidos p3la exc-.!lênc:a das t::rral roxas onde a cultura da cana de açúcar que,. tanto incremento .tomou no último' decenio - do século­ XVIII, apresentava um aspecto deveras tentad:>r. Esboça~se então uma fase d'! progresso, Pir:ad~· caba que em 1791 era hab:tada por 172 homens li­ vres, 146 muJheres e 21 escravos, o qu~ perfazia um total de 339 almas, distribuidas em 60 fogos, tem sua população aumentada no ano seguinte por 42 novos povoadores. Foram êles: - ' Joaquim Roiz Lag», Luis Fer­ nandes, Geraldo Leme, Manuel de Morais, José An­ tunes, Inác·o B:cudo t Tom~ de Oliveira) FrancisC'~ Joam, Joaquim Reiz, An~onio de M'3.t::s, Frandsc,' de Almeida, José Bicudo, Antonio Mi. Maria Bu,­ na, Inácio Corrêa, Joaquim Ribeiro, Migu,! c-,rrea" José Teixeira, Gertrudes de Aguiar, Francitco Le.me, Joam Pomsse, Anselmo Ferraz} F.ranchc:> Dias, Ma­ nuel Corrêa, Joaquim Garcia, João da Mota, Pedro Cunha e João Francisco. Demarcam..se sesmarias «ao longo do rio, na:


CAPITÃO FRANCISOO FRANCO DA-ROCHA estrada de Itú, iniciando o plantio de canaviais; der· ribada a mata se levanta o engenho, e assim a p:~mei­ la indústria, o açúcar) nasce e progride (44) ». E' o segundo ciclo de sua atividade que desa­ uma vez que o primeiro será encerrado cOm a destruição de 19uatemí, que fel. cess~r toda ativi. dade que lhe vinha do rio, fase fluvial e causa de Sf u povoamento definitivo. brocha~

Assim, acentua-se a preferência dos lavradores «só em 1795, obtinham sesmarias em Piracicaba, Inácio de Almeida Lara, alferes Joaqumi Feneira d~ Toledo, sargento~mór Carlos Bartolomeu de Arru­ da) capitão Francisco Franco da Rocha, Pedro Le­ me de Oliveira, capitão Antonio José da Cru7., B:r­ nardo José Alves e Joaqu:m da Costa Garcia (..5) ».

<::

O dr. João Batista de Campo, Aguirra, referin­ do-se aos títulos de propriedade da zona em que se encontram Piracicaba e Itú, atribue ao cap:tão Fran­ cisco Franco da Rocha, a posse de três sesmarias, localizadas em J acaréquara e Piracicaba Rio, sendo as duas primeiras obtidas em 11 de novembro de 1799 e a terceira em 17 de outubro de 1807 (46)_ Nas pesquisas procedidas no Arquivo do Esta­ do de São Paulo, apenas foi possível encontrar o re~ gistro de urna sesmaria, s:tuada na par-agem denomi~ nada Jacaréquara e que vai transcrita na íntegra: «Carta de Sesmaria ao Capm. Francisco Franco da Rocha de huma p0rção de terras no Destr de Pirac:caba, COmo abaixo declara. Antonio Manoel de Mello Cestro Mendonça ..... Faço saber aos que esta minha Ca: ta de Sesmaria v:rem, que, attcndcndo arreprcsentar O Capm. Frai'\.­ csico Franco da Rocha m::Jrador em Santo Ant3ni:J de Piracicaba termo da Va. de Portofelis que eU" se acha estabelecido com escravatura, fabrica de: En~ genho, e plantações de canaveaes, e para adiantaI' mais a sua fabrica de assucar, quer tirar pOl' Sesma­ ria huma porção de terras, que se acha entre o r:o Piracicaba co rumo de Antonio Rodrigues na pa­ ragem chamada Jacaréquara cuja porção de terra poderá ter de largura do rio té O rumo sobre do. An­ tonio Rodrigues empartes meia Legoa,· cem outras hum quarto de legoa mais ou menos, o que na ver­ dade for, comhuma Légua de Sertão, seguindo este mesmo rumo de Antonio Roiz; obrigando-se osupe. a dar data a todos os moradores que estiverem em ter­ ras de suas proprias a excepção daquella que ven­ deras osseus cultivados, e que por favor eprecaria­

29 mente nellas se conservar: comO O Supe. se acha com· possibilidade, esuffic'ente numerO de Escravos pa. po­ der adiantar assuas plantaçõens, ecultura. porisso mepedia lhe concedesse por Stsmaria as mencionadas terras acima confrontadas com todas as routas, cen .. seadas, que nelle se comprehenderam, vista a utili­ dade, que deste mesmo estabelcmtr>. pode resultar afavor do Comercio, comooneficio do Supte. Sendo visto oseu def!:'rimento, justificação a que mandei proceder das provas que tinha para cultivar as ter­ ras ped'das, resposta da Cama. da Va. de Porto fe­ liz, aquem se não offerecem duvida, nem ao Doutor· Procur. da Coroa e Fazenda aquem se deo vista: Hey por bem dar de Sesmaria em Nome de S. Mago. E em virtude da sua Real Ordem de quinze de ju­ lho demil setecentos eonze, ao dito Capm. Francisco Franco da Rocha as terras que pede na paragem mencionada, com as confrontaçoes acima indicadas, esem prejuízo de terceiro, ou do direito que alguma pessoa tenha deUas: com declaração que as cultivará, ernandal'á confirmar esta minha Carta de Sesmaria por S. Mage. dentro de dous annos, e não ofa""ndo lhe denegará ma's tempo: e antes de tomar posse del­ las asfará medir e demarcar judicialmente sendo p'­ ra este effeito notificadas as pessoas comquem con­ frontarem: E será obrigado a fazer os camOs. de suas testadas) com pontes e estivas, onde precizar: e des­ cobrindo-se neUas Rio caudaloso, q. necessite de bar­ ca para se atravessar, ficará reservada de huma das margens delle mais meia legoa deterras ernquadra, para a comodidade publica: ene;!a data nlio poderá suceder em tempo algum pessoa ~clesiastica ou R-e~ ligião, sucedendo, será com o encargo depagar Dí­ zimos, ou outro qualquer que sua Mage. lhe quizer ~mpor denovo; enão ofazendo, responderá dar aquem denunciar; como também sendo a mesma Senhor:;, Selvida mandar fundir m destricto deUa alguma ViHa opoderá fazer ficando livre, eSCm ·encargo aI.. gum, Ou pensão para o Sesmeiro; e não comprehen­ dera esta Data Veeiros, ou Minas dequalquer gene­ rometal que neUa se descobrir, reservando tambem os graos Raes: e faltando aqualquer das ditas Clau­ sulas por serem conforme as Ordens de sua Mago. , as que d'sporem a Ley eforal das Sesmarias, fica rã privado desta: Pelo Mando ao Ministro, emais pes­ soas aque o conhecimto. desta pertencer, deu possa ao dito Capm. Franco. da Rocha da. referidas terras oaforma que pede. E por fmne-la detudo lhe mande; passar a presente por mim assignada e SeUada com o SeIlo deminhas Armas, que seeumpr:rá nos livros da Secretaria deste Governo, e mais partt!s aque te­ car, e sepasou por duas vias. Dada nesta Cidade de São Paulo. Manoel Cardoso de Abreu a fez a 16 de 9bro de 1799. Luiz Antonio Neves de Carvalho Se­


30

CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

cretano do Governo a fez escrever. Antonio de Cas­ tro Mendonça ...... (47). Em 1797 a situação demográfica da povoação de Pirac:caba era a seguinte: Brancos homens 175 mulheres 140 Pardos homens 43 mulheres 38 Pretos homens 37 mulheres 75 Total 508 (48) Do exame consciencioso dos recenseamentos d,~ Piracicaba até o ano de ! 797, pode-se concluir qUJ ao capitão Francisco Franco da Rocha, esteve afeto o comando daquela povoação até êste ano. Em 1797 porém, dois fatos ocorreram, de impor­ tância para Pirac.caba. O primeiro foi a remoção pa­ ra Minas Gerais, de Bernaldo José de LOI'ena, que ocorreu a 28 de junho) sendo substitwdo por Antonio Manuel de Melo Castro e Mendonça e o segundo, " elevação da freguezía de «Ararytaguaba» à catego­ ria de vila cOm a denominação de Pôrto Feliz, que "té hoje conserva. Na demarcação dos l~mites entre a vila recente­ mente criada e a de ltú, observou-se COm relação a freguezia de Piracicaba wn traçado assaz ínteressan~ te, de tal modo disposto que esta localidade ficou di­ vidida em duas partes, urna sob a jurisd:ção de Itú e outra sob a jurisdição de Pérto Feliz. Como era de se esperar) elU face de tão dispa~ ratada divisão, não demorou muito que ambas mu­ nicipal:dades ~ntrassem em conflito que segundo ] Silveira Melo, terminou quando foi <estabelecido um acordo em que ficou conferído ao Capitão de Pôrto Feliz a ordenança da freguezía (49) ». Mário Neme, acha que êsse fato ainda não foi perfeitamente esclarecido e cita carta datada de 1816, dirigida ao conde de Pabna e onde se lê: «Es­ tas distâncias e a mistura das duas jUl'Ísdiçães,.. (50)>>, que realmente deixar permanecer dúvidas a l'esp~ito. E ' pois a partÍl' do ano de 179i, a vista da escas­ sez de documentos, que se supõe tenha deixado o ca­ pitão Francisco Franco da Rocha o comando da fre­ guezia, premido pelas ocorrências acima menciona­ das. O que porém está fora de dúv:das é que, no ano de 1802 quem se encontrava com O comando da fre­ guesia de Piracicaba, era o sargento-mõr Carlos Bar­ tolomeu de Arruda Botelho, COmo se vê p~lo recen­ ' seamento seguinte:

1802 «Mappa Geral dos habitantes existentes na Fre­ guezia de Piracicaba, esSQ Destricto em oprezente

Anno, seos Nomes} Empregos, Naturalidades) Idades, EEstEados, Cores, e occupações com especificação 1 Carlos Bartolomeu de Arruda 56 Sargto. Mom Comte. das Ordenas. desta Povoação e natal desta Va. de Porto f'lis, D. Maria de Meyra e Siqua. 54 Filhos Manoel Joaquim Pto, Alferes reformado da Ordenança 31 Lauriano 14 Carlos 12 D. Eugenia Antonia 24 D. Maria Francisca 22 Anna Vicencía 5 Agregados 2 21 escravos

2 Francisso Franco da Rocha Capm. da Ordas. dESta Povoação natal. de Ytu D. Maria de An'uda Gel. mero Filhos João Manoel José Francisco Antonio Luiz Antonio Anna B escravos 3 agregados

58 28 20 18 16 14

12 10 2 m·2zt':Z 7

Como se vê' acima, o capitão Francisco Franco da Rocha, aparece sob o número 2 nesse recensea­ mento, como capitão de Ordenanças e a:nda constava ser senhor de engenho, ignorando a produção de sua safra «por não ter apurado até o pr'esente» e planta~ do mantimentos para seu gastol casado em segundas nupeias. O sargento-mór Carlos Bartolomeu de Arruda Botelho, deve ter gozado de prestígio junto ao capi­ tão general Antonio de Melo Castro e Mendonça, prestígio êste adquirido de maneira pouco elegante, quando denunciou seus pares em Itú na questão da reforma do Cam:nho para Santos, pois s6 com a substituição dêste em 1802, por Antonio José Franco e Horta, teve sua influência abalada, ao ver que fo­ ram levadas em consideração as manifestações de descontentamento que vinha sendo alvo dos piraci­ cabanas. . A origem dê..e descontentamento prendia-se a três fatores: primeiro uma série de arbitrariedad?s que .vinha praticàndo nO comando da freguesia'; se­


:n

ClAPITAO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA gundo a tentativa de se apossar das terras doadas pelo c.pitão povoador, para o rocio da freguesia e terceiro, como escreveu Luis Leandro, no «Diário de Pjracicab~,

ed:ção de 31-7-1960: «um rOmance

<:a­

pitoso» que viveu com a viúva «Maria Flor, que a<i

circunstâncias estão apontando COmo mulher boni­ ta». Relativamente as arbitrariedades nos reporta­ mos anda a Luls Leandro que assinl a êle se refere: .:Carlos Bartolomeu de Arruda, pela sua COnduta à testa do comando militar e administrativo da Fro­ guezia de Piracicaba, não era homem estimado pelo. população. A prova está na representação que Os mo­ radores de nossa terra, na época, endereçaram às au~ toridades competentes) retratando, com pinceladas inc:sivas, o comandante local». A representação mencionada, foi escrita nos se­

guintes termos:

.•Senres. do Nobre Senado.

Requeremos a Vmces nos abaixo assiguados em nome deste povo moradores desta F reguezia de Pi­ racicaba p.r. q. chamando o Illmo. Ex.mo Snr. Gene­ ral p. r. q. nos alevie do pezado jugo q. carregamos com o titulo de Com.de desta Povoaçam Carlos Bár­ tolomeu de Arruda Sarg.to Mor reformado da Orde­ nanças q. interinam.te comanda e por Portaria q. lhe foi servido pagar o IlLmo e EX.mo Sm. Antonio Manoel de Mello Castro e Mendonça apezar de ter­ mos hum Comandante amavel e criador em q. exi.. gero as circunstancias de hum comandante por cer

homem pacifico e prudente e de hua inzemplar vida este q.. hé o Cap.m Fran.co Franco da Rocha q. por ordem do Ill.mo e Ex.mo Snr. Bernardo José Lorena foi ole:to pela Camara na V.a de Ittu. foi deposto "sem ter hero algum de oficio por industrias do d.a Snr.to 'h-f"or Comandante ass:m de ce incostar n:> Car.

go q. existe sendo este homem q. tem todos aquolles defeitos q. som opostos as circunstancias necessárias em hum bom Comd.te as cua's se mostrão itens se.;.

guintes 7 ' Lo - Item q .. hé homem colerico i bingativo q. só procura vingar dos seus Negocios particulares e mas non do Servisso de S. Alteza Real. 2.0 - Item q. se Cerve destes moradores por proprios de seus desmandos e Negocios COm o prc­ testo do mesmo Ser.o. 3.0 - Item q. todas as suas obras som em pre­ juizo desta Povoaçam procurando o tempo em q. estes povoadores p. tanto ·recolhem os seus man·­ t'm.tos afim de não pagarem o. dizimos por q. hé inimigo do atual Contratador. , 4.0 Item q. sinbaraça com os particulares Ne­ gocios destes pobres moradores tomando terras de huns i dando a outros e inbaraçando aos q. fazem

canoas tirando lhes os camaradas afim dos ditos te­ rem prejuizos. 5.0 - Item q. hé homem J:bertino iscandalozo q. vive' cuncubinado publicam .• a seis annos· dando CJ mais pertifero izemplo a esta Povoaçam. 7.0 Item q. Se opos a factura da nova Igr.a em hum lugar o mais habil q. de acha neste pais apezar de cer já ileito i demarcado pelo Cap.m Mor de V.a de Ittu por ordem do Illmo. Snr. GaL Antonio Ma­ noel de Mello Castro e Mendonça e com o fribulo pertesto de serem suas terras cauzando a este povo ()

mais grande detrim.to q. se vê na apreciazon paçar o caudalozo Rio em pequenas canoas p.a acudir "' obraçcens da Religiam. 8.0 Item q. no tempo do noçd antepaçado paro­ co o R.do José Franco de Paula rua introduzindo huma lista contra este povo dizendo q. era milhor correr viados do q. oubir m.íça e assim o fez m. tas be­ zos e por este izemplo ia m.tos das poboaçom não queria oubir mOça sendo a cauza disto hua inimizade q. tinha com o d.o Vigr.o porque este o queria co­ reger; ora rezoins bastantes

SOn

estes p.a nos obrigar

a dar parte a V.ces comobidos da triste lamentavel vaixaçon q. suportam estes miaerabeis moradores q. por se bere.m atemorizados com castigos istrcbados por hum edital q. mandou o d.o Com.e publicar e fichar no lugar mais público desta frequezia r.ão se acinam peçalm.tc; mas sim nos em nome de todos pais. prontos estamos p.a jurar se for necessario e o mais

q~

por não impGrtunar a V.mces não d:zemús.

Ficamos certos de cermos alibiados deste disposta Com. te pela izata informaçoens q. esperamos de V.mee b:sto serem homens q. de bom olhar p.a o bem publico. Piracicaba, 29 de Dezembro de 1802. An­ tonio José Correa, Eufra5Ío José da Rocha, Fra.co de Paula Roza, Dpm. Gls. Ribr.o, Sebastião Leme da Costa. Iguacio Antonio de Feg.o, José do Rego Cae­ tano, Bento Leme de Alme.a, Joaq.m Pinto Correa:•• A ambição de mando foi um dos traços carac­ terísticos da personalidade de Carlos Bartolomeu, revelou-se desde os tempos de sua mocidade em Itú, quando desejando crescer no conceito dessa figura ant:pática e injusta de adntinistrador violento, que foi Martim Lopes Lôbo Saldanha, governador da Capitania, entre os anos de 1775 a 1782, não trepi­ dOll em implantar a desarmonia entre as figuras re­ presentativas da localidade, denunciando não só seu

companheiro de juizado, mas os pr6prios edis mu­ nicipais, acusando-os na questão do alargamento do caminho para Santos, em que estava interessado, de criarem embaraços ao sátrapa que os azares do des­ tino colocara para governar os paulistas. Mais tarde se manifesta na oposição que fez ao cap:tão Corrêa Barbosa, a quem criou inúmeros em­


32

CAPITÃO FRANC~SOO FRANÇO DA ROCHA .. '1

baraços na administração do povoado, visando apo­ nas tão somente «lhe disputar a primazia ,do man­ do (51)., bem como, mais tarde, na oposição feita ao capitão Francisco Franco da Rocha, visando <) mesmo i.m. Algumas semanas depois que foi Opl'es:!lltada a .queixa acima transcrita, o seeretárío do eapitão ge­ ne.·a! da Capitania de São, Paulo, mandava' p'>r 'Car­ ta, a V,cente da Costa Taques Goos e' Aranha, ca­ pitão-mór de Itú, a seguinte carta txpressa: . «O IIImo. e Exmo, Snr. GOl'. e Capm. GemI. me ordena remeta a Vmce. o requerto. incÍurode ai· guns morcs~ de Piracicaba, corrob~rando' cOm a Re­ prezentan. da Camara. do Porto-f"liz, c3ntra " Sargto. M. CGmde. Cados Be, meu. de Arruda, e p •. vir no Conhecimto. da verde. dos factos nelle dodu­ zidos: Hé s~lvido determinar, q. em VMCi!. rec~b;;:l1' do esta passe logo a da, Povoação a examínar a con­ <luta do refer:do Cornde. ouvindG,. e informandJ-s: de pessoas livres de toda a suspeita de q. dará hum:" fiel e circunstanciada conta a S. Exça., sobre os pon~ tos allegados no dito requelinto., e hé o mmo. 8m'. igualmente servido ordenar, q. achando VmCê. so­ r~m verdadeiros os factos m~ ncionados susp, nd.l o dito Sargto. l\16r doste Governo, Confer:ndo iutcri­ namente o Comando della.ao Capitão Francisco Franco da Rocha, até sobre este objtcto dar S. Ex•. as providencias q. lhe parecor justas, 'e adequadas. Cumpra-o V. Mee. assim com 'aquella exactidão e inteireza q. S. F..xa. confia da sua pessoa. Os. go. a VMce. 'São Paulo 14 de Jane:.p de 1803 - Lui" Anton'o Neves de Carvalho - Snr. Capm. Mor da Va. de Ytú - Vicente da Costa Taques Goes e Ara­ nha (52)>>. O capitão~mór de Itú cumpriu as ordens recebi .. das e não se fel demorar na diligência e a sua. respos­ ta também não .foi nada favorável ao sargento~mól' comandaste da Freguesia de Piracicaba, como se v~ pelo que segue: «UI.m" Ex.mo Snr. Em cumprimento da mu:to rcspeitavel Ordem de V. Ex.a expedida pela Secretaria do Gov.n, em 5 do corrente passei a Povoação, de S.to Antonio de Piracicaba, e procurando neHa conhecer as pessoas q. livres de ·suspeita pudessem informar..me COm bre­ vidade, e ouvi com a ma:or prudencia, e exc:cção~ q. me foi possivel, e as suas informações por cllas assi~ ~as, q. são· dez em numero, faço COm esta prcsentc't a V.Ex.a. DeUas ·se mostra ser inteira,te ve.dade:ro o requerimento q. contra ó Sarg.to Mor Ccanm.t.:: Carlos B.meu de AlTuda fizerão alguns morad.1r·s daquelIa Povoaçiio a Camara de' Porto feliz, e ·gual· mente representação da 'm~mrna q. o·, c::trrobora; e

todo o çontexto das dp.tas infolmações inclusas seria authenticam.te comprovadas p.r todos aquelles Po· voadores, se não fora hum proc·esso irifinitó de as­ signados'; pois nesses ou aq'Jli:s artigos' tod.Js clruna­ vão, todos gemiam de ba xo do pezado jugó daq.eUc Conim.te. Sobre ó 6.0 artigo do referido requetímen­ to sei de propria sciencia, q. já o 'Ex.mo Antecessor de V.Exc.a pl'ocurou separar este artigo, e mui es~ candalozo concubinato adulterino, externi:nando p.a ·está V.à a concubina Maria Flores em principio do anno 'de '1798, ti vindo a esta m.ma V.a. aq.Je Sr. ·Ex.mo em o mes de Outbr.o do reier.o anno reque­ reu-Ihe' a referida Concubina, suplicandJ-lh~ o seu "grosso p"a a aq.lla Povoação, e aUegando-lhe pre­ juizos com a aUz.a de sua Cv..a; e persuad do o m.mo 'Sr. Ex.mo. daq.las expressoens lhe permiti0 1:> seu re­ gresso, de cuja graça abu7.ando e!la inteiramente: vol­ tou p.a o mesmo sitio Comp:a do referido Sar.to mor aonde eu a aehei, e a deixei czm mayar fscan­ dalo de toda aq.lla Fovcação. Sobre o 7.0 a:.t:g3 tã·, bem sey de propr a sciencia, q.' em o anno de 178·~ requererão os ·moradores daq.elIa Povoação ao I1l.mo e Ex.mo S.r Gen.a! Francisco' da Cunha Menezes • mudança da m.ma da p.te dalem daq.Ué Rio, aondo se achava, C's.e acha, p.a. a p.te d~quem lcg') abaix"l do Salto do m.mo Rio, ou <m todD intervalh d "" até defronte a Barra do R.beyrão Corumbatahv, aonde ·melhor terreno houvesse p.a. á. situação, plin­ cipiando-se esta com os' assentos, e termos nec:s ar:05; e assim foi m.mo Ex.mo ·S.r 1iervido detenninat-m: p.a Carta de 7 de Ju!ho do refer:do ann~, cujo orgi­ nal faço a V. Ex.ma presente. Em virtude desta re, peitáve! Ordem passei immediatamente aq.Ua povoa: ção;' e junto com o Cap.m q. então era Antonio Cor­ rea Barbosa, e 40 melhor' do povo COrrem~s COm a mais prudente reflexão todo aq.Ue terreno, e afinal todos unifonnamem.te concordamos,' e elegemos a referida situação da p.te daquem Jogo abaixo do Sal­ to primeiram.te indicado, e determinado p.r. aq.lIe Ex.mo S.r e depois de eleito aq.l1e lugar p.a cOncOr­ data e consenso de todos, mandei logo alimpalo, e cOrrer com baliza de estacas e delineamento das ruas princ'paes} e travessas) pateo, e 1ugar p.a a nova Igr.a tudo com a lnayor perfeição. q. me foi possí­ vel; e lavrei de proprio punho tbdos 6s assentos, e termos necessarios com as melhores noções, q. m:! ocorrerão em hum pequeno livro q. fi;:; a m.a custa, I!. remeu ao Ex.mo S.r e se há de achar naSceret.a d" Gov.o; e m.a custa tirei a POv.m de S. Ex.ma A\!:ma p.a a factura da nova Igr.a. Passando pouco tem: pc depo:s de feito o referido delineamento; parecen­ do áqu.!!e Cap.m q. ,melhor estabelecim.to; e,' inte­ resses 'eneontraria em OS sitias da ·Taquary; q. fbi do lallecido Sap:m Mor· José Gomes dê Gbtiveia; 'no

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CAPITÃ.O FRANCISCO FRANCO DA ROCHA Destr,Q de Mogy, comprou-o e p.a elle se mudou1 deixando aq.lla Pov.am sem Com.te habH p.a exe­ cutar o delineado, e determinado; e decorrendo o es.. paço de O~to 3,S COm vários Comm.tes todos inertes e indoLtes; afinal lançando as vsitas a este Contarn') eleg_mos, com a Camara p.a Cap.m daquela Povoa ção a Francisco Franco da Rocha p. sua regular con­ ducta, conhecida prudencia, e exp,a de crer, e COll­ fessar; e tomando cUe posse do Carmo em 8 de ja.m de 1792, passou logo aqu.Ua Pov.am a cuidar do seu estabelecimento e nOs daq.lles Povoadores, q. se acha­ vão Em huma total desordem, Neste ex.erddo cOm· mandou eile p.r espaço de seis a. mais ou menos res­ p lando aHi a paz, união e socego; e em seu temp"J ae seo Comm.de não deo principio as Ob!'3S delinea. das p.r haver empregado o sco esforço no seu pro­ pno estabelecim.to; e em crear ~Jla quaze extmta YGvoaçao, alliviando Povoadores, destinando..lhes si­ tuações, e animando as suas plantações, e colheitas, e a tempo, em q.aq.Ha Povoação já se achava em grande melhoram, to, e a ponto de se principiarem as obras delineadas, passou a Comm.te della o Sar.to mor Refor.o Carlos B.meu de Arruda, q.p.r se achar estabelece.o vizinho ao termo determinado; demarca­ do, se tem opposto na verd.e a estructura das refe~ ridas obras naq.Ue lugar, achando-se a chamada Igt.a ParochiaI em tão indecente, e em tão deplora~ vel estado q. passa a sacrílega a sua conservação; e p.a conhecer-se toda irreligião, q. aUi respira, basta alli chegar qualq.er prud.te; e seu ouvir, nem ardcu lar expressão algua, e só revendo aq.lle horroroso templo plcnam.te conhecerá l q. alli nem se tçme, nem. se conhece a a D,s Supremo. Há tão evidente (} porigo de toda ruina daq.Ue Templo já pende ao lado direito, especado) rachado, cheio de goteiras, q. de­ pois de eu ver COm pasmo, e com horror perguntei aos q. me acompanhavão, se terião animo de passar alli hua só noute; e respondendo~me q, não se anim.an~ do eUes perrloytar alli hua só vez, como se animavão á. permittir.: q. dias e noutes se conservassem 'aq.l1as Sagradas Imagens no evidente perigo de serem em hum momento sepultadas de baixo de hua repentina ruína? Esse horrorozo objecto sobre sahe entre todo:; !ta m.ma ponderação, e hê o mais dígno da mais apréSsada provid.• de christanismo zelo de V. Ex.a; e COln esse conhecim.to passei a dar a devida e.,xecu­ ção de mis rcsp.\ Ordem de V. Ex.a; dir'gindo ao Cap.m Francisco Franco da Rocha a Carta cuja Co· pia paço a V. EX.a presote e não effcctuei a prizão de referido Sarg. Mor p.r estar auz-te, e nessa Capital. Esta hé a fiel e verdad.ra exposição de tudo q. vi, examinei, e reconheci naq.lla Povoam; e hé o q. pass) infonnar a V. Ex.a q. com a mais indefectivel justi­ ça mandará o q. for servido. Itu 25 de janr.o de

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1803. Vicente da Costa Taques Goes e Aranha". «E' que», escreveu Luís Leandro no Diário d,:, Piracicaba, edição de 31'7-1960, em seu artigo «A história de Maria Flor através dos documentos», «Carlos Bartolomeu de Arruda, embora não estand>.> presente em Piracieaha durante a diligência do cap'­ tão mor de Itu} lhe deixou uma carta, uma carta qll,~ procurava comprar a consciência da autoridade itua­ na .. . '1>. A vista das informações prestadas pelo cap:tão­ mor de Itu, uma semana depois) Carlos Bartolomeu era destituido oficialmente do cargo de comandante da Freguesia e em seu lugar empossado o capitão Francsico Franco da Rocha, como se verifica cOm a le:lura do documento que segue: .Pa. o Capm. Franco. Franco da Rocha Comande. da Povoação de Piracicaba. Havendo o Illmo. e Exmo. Snr, General manda­ do proceder a huma exacta averiguação das queixa3 q. chegarão á sua presença contra o S. Mor Carlos Bartholomeu de Arruda, e verificando-se pelo exame serem verdadeiras. Houve o mesmo Snr. por bem privalo do Commando dessa Povoação, conferindo-., a Vmce. como verá da Portaria inclusa que lhe re­ meto. Em consequencin deUa mandará Vmce. cha­ mar o d:to S. M., ê lhe extranhará muito da parte de S. Exa. o seu comportamento, advertindo~o se t,bstenha para o futuro de todo O genero da pel'tur... bação, e vioJencia com algUIll de seus moradores, alliás será severamente casti~do. Igualmente fará Vmce. despejar logo dessa Povoação huma Maria da. Flores q. o do. Sargo. Mor conserva em sua caza com escandalo publico, e por compaixão p.a a fra­ gilidade do seu sexto, não consentirá q. ningu'~m a dezatenda. Da fiel execução destas Ordens, dará, Vmce. Imediatamente parte a Sua Excia., o qual informado do mizeravel estado em q. se acha essa Igreja, há igualmente por bem recomendar-lhe, quei­ ra empenhar-se com todo o zelo na factura de huma nova, em q. se possão celebrar os Ç>fficios Divinos, persuadindo com o seu exemplo a todos esses mora.. dores para q. concorrão segundo as suas possib:Jida­ des para huma tão justa e meritória: bem atendido q. hade ser d'aquem do Rio, onde foi demarcada ulti­ mamente a Povoação. Deus guarde Vmce. S. Paulo (! primeiro de Fevereiro de 1803 Luiz Antonio Ne. ves de Carvalho - Snr Cap'ãto Francisco Franco da Rocha. Comande. da Povoação de Piracicaba (53)>>, A ambição de poder revelada por Bartolomeu de Arruda) âesde o verdor de seus anoS J intensific€\u­ se em Piracicaba, já nos tempos do capitão povoador


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CAPITÃO FRANCISCO FRANGO DA ROCHA

Correa Barbosa, a quem sempre aborreceu e criou embaraços sem número no correr de sua adm:ms­

.tração nO povoado, v:sando tão somente «lhe di'pl:­ tar primazia do mando (54) », e esta ambição que s~ acentuando com a idade, aumentou de intensidade,

na oposição que fez continua e sem tréguas, ao ca· pitão Francisco Franco da Rocha. Quanto aos métodos empregados na defesa do seus interesses pessoais ninguém o censurar~a) st. os ·processos empregados não violassem as boas norma.., c não fossem como o foram,> em prejuizo da coleti .. i­

dade. Merecem repulsa todas as ocorrências relacic­ nadas com as terras patrimoniais de P~racicaba, doadas para o rossio da Povoação pelo capitão po· voador e que tiveram inicio no mOmento enl que Carlos Bartolomeu vslumb,ou o valor que em futuro teriam essas áreas, motivo p210 qual se apressou em

je nos quais pela força de seu cargo, encOntrou-se

envolvido

O

capitão Franc:sco Franco da Rocha .

Assim, oito meses depois do ,capitão Francisco

Franco da Rocha ter sido novamente cmp~ssado M comando da Povoação, recebeu da Secretaria do Go­ vêrno da Capitania" nova e inc:siva carta .. que prova de modo concreto, que o romance pecaminoso entro! a viúva e o sargento-m6r continuava. Continuava mesmo contra o protesto da povoaçãoJ da denuncia

do capitão-mór, das ordens do capitão· general. «O rumo. e Exmo. Snr Qeneral hé servido Or­ denar em Vmce. recebendo esta faça em continent~ despejar dessa Povoação e Maria Flores, filha de lzabel Barboza de Almeida, visto que tendo-lhe fa· cultado lc"eoça para recolher-se a dispor ahi do; seus bens) O não tem feito, antes continua a viver com o mesmo escandalo que an tecedentene. Asshn cumpre Vmce. dando imediatamente. parte ao mes­

De posse dêsse titulo «nulo e burlo (56)>>, tanto

mo Snr. da execução da prezente ordeno S. Paulo 30 de 8bro. de 1803 - Luiz Antonio Neves de Carva· lho - Snr. Francisco Franco da Rocha. Comde. de Piracicaba (58)>>. Carlos Bartolomeu de Arruda não p~rdia opor­

@le. como mais tarde seus descendentes, quiseram va­ ler-se de um direito que não possuíam e umas vêzes

tunidade para se vingar de seus adversários, tal co­ rno atesta a carta seguinte, que enviou ao capitão

empregando a ameaça, outras usando de vioJência. tudo fizeram para impedir que novas fammas cons­

general, acusando' o padre José Francisco de Paulo,

tituíssem suas casas nos terrenos de sua supo:rta pro­

«Illmo. e Ex.mo S.r Antonio Jo"; de Franca é Horta. Já d<'P0:s de ter participado a V. Ex.a o q.

en trar em entendimentos com 'Os herdeiros de venda das mesmas terras que anter:ormente haviam sido compradas por Corrêa Barbosa (55) ».

priedade que, são precisamente aquêles onde hoje em dia ergue-se altaneira a 4:Noiva da Colina» e que se extendiam desde a barra do Itapova para além do bairro da Paulista, partindo do rio. uma légua de extensão, até o Piradcabamirim.

Sobre esta questão das terras do rossio, ainda voltaremos, estudando com maiores detalhes4 quando

adiante filr descrita a personalidade de um dos gen­ ros do capitão Francisco Franco da Rocha, Francis­ co José Machado.

seu primitivo denunciante:

consta na Carta junta tomei o acordo de por na

prez.a de V. Ex.a o detrimento gravissimo que pa­ decessem os Povos desta Freg.• na conservação do Vigr. José" Francisco de Paulo, p.r ve q. o Cap.m desta Freg. mostrando-se tão ativo a imbaraçar a execução da ordem que V. Ex.a q. atual. e esta este Povo sem Missa e sem Sacramentos, e inda está pro­ xima a Semana Santa, na passada esteve este Povo

sem ofício n·nhum da Igreja p.r ter estado e, Porto .Feliz a sua regalia; deixando mOrrer a varias seln

Quanto ao tributo ao filho de Marte e de Ve­

confissão p.r q. quase sempre não está capaz de acu­

nus, pedimos perm:ssão a Mário Neme, para trans­

dir seos xamados, alem do escandaIo com q, vive

crever o seguinte trecho de seu excelente trabalho _ História da Fundação de Piracicaga - «culiosos ep;_

publicam.o; p.r q. hé aro.do Cap.m p:xie jemer o Povo, na prinzipal.te p.a de mayor n?cessidade o m.mO acontesse a resp.o de Anton'o José Corr.a q. senno hum homem de pessima conducta p.r q. ., tempo do Antecessor de V. Ex.a fez varios insultos.. ~ ave,.,). tres d.as que deu em hua pobre liberta mui­ tas pancadas pelo rosto q. quase lhe furou os olhos e

sódios poderiamos contar, como p;)r exemplo aquêle ofm que figura COmo heroina a v:uva Flora, Ou Ma­

;ria das Flores, com quem se amasiara Carlos Barto­ lomeu, numa mancebia tão escandalosa a ponto de fomentar a indignação dos moradores. Essa indigna­ ção atingiu tal eferverencia que seus ruroc>rês foram

ferio na testa, e levada em sangue se foi queixar ao

ecoar nos corredores do palác:o do capitão-g:cmeral (57)>>. ~sle trabalho não comporta maiores cOmen­ .tários sôbre tão escabroso "assunto e 'nem a êsse res­ peito seriam abordadas refereneias, não fôra a n<lC<'s­ sidade de reproduzir documento. existente. ainda ho-

cap.m e devendo castigar nada fez, e ao P.o respon­ deu nesta ocasião que pouco e q, elle fazia cem maior rOgar, a sim como o tem feito p.r vezes ficando a po­ bre mizeravel sem justissa; e sobre a ordem que tive

de V. Ex.a a beneficio da Igreja se ve q. tonão fora


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA hua paixão particular q. tive não estaria nem Os es~ teias levantados que o fiz em Janr.o proximo passa... cio em tempo improprio p~a Levantar edificios e d3. mais vil madeil'a, e vendo ncurvaturas cOm tanta abundancia - devendo conhecer q. isto m,mo re­ dunda em detrimento aos pobres pela pouca dura, devendo fazela de taipa q. hé propria, e de menos detrimento; e como reconheço o zeJo ardente q. V. Ex.a tm mostrado" na compayxão dos pobres, e zelo do bem público, participo a V. eX.a estas desordens com que costumo. Deos g.e a V. Ex.a felizmente m.ann.p.r nOSSO amparo. Freg. de Piracicaba 17 de Abril de 1804. De V. Ex.a o mais humilde subdito Cados B.meo' de Arruda•. A luta entre o vigário e o sargento-roór se pro~ 100~gOU

por alguns anos mais e, em 1806, os fatos

<;::!

precipitaram, como atestam as linhas que seguem: «Aos do:s dias do mez de dezembro de 1806, nes­ ta Freguezia de Santo Antonio de Piracicaba em o Qualter de mim Francisco Franco da Rocha capi­ taJn mand.e da mesma por Maria Flor de Moraes Ine foi aprezentada hua sua petiçam e no rosto della o "ospeitavel Despacho do IIl.mo e Ex.mo Sr. Antonio José da França e Horta F:dalgo da Caza de S. A. lU e Governador e Capitam General desta Capitania na qual me ordenava fazela Ou lavrar hum termo com as condíçoin; porem que a Sup.e não consentirá <f'1 sua casa o Sal' .to Mor Carlos Bart.meu de Arru­ da e nem ella em casa delle desviando-a de ter en­ contrados e nem menos 'communicação e p.a assim pod-;m existir nesta Freguezia a cujos preceitos se ascgeitou e observar e que se proceder o contrado ser explllçada como dantes e sendo lhe lido este ter·· }TI::> prometeu entera satisfaçam a todas as condiçõe~ (; por não saber ler nem escrever pedio a Eufraslo de Arruda e Sá que por ella assignace. Pirac'caba em dia mez e anno supra. Assigno a rogo de Maria FlOr de Moraes - Eufrasio de Arruda e Sá. Como teste· munha que este foz - Sebastião Leme da Costa». A despeito dêste tê. mo «de bom vive,.", Maria Flor continuou a ser a «diva susp'rada do Sargento Mór Carlos Bartolomeu de Arruda» segundo as !,a­ lavras de Luís Leandro; baseadas na carta que a se~ ~lIir vai transcrita e do punho do capitão Francisco Franco da Rocha; «1l1mo. e Ex.mo S.or Meu Snr. EX.m·o nesta ocazião remeto a Lista e Mappa Gera" do meu Commando ao Coronel S.,­ cretário, e de alguma imperfeição della supl'co a V Ex.a haja disfalsar em attenção o não haver nest~ Certam quem" faça melhor. Ex.mo Snr. Maria Flor de Mora;s apresentou me o re.p.el Desp.o deVo Ex.a ilefferido em hum requerimento com que se· dirig:o

• prez.ça de V.Ex .• ao qual sem embg.o de ter da­ do já cumprimento a eIle Com tudo se me offerecc contra d,zer ao d.to Requerimento ex vida a falta de verd.e com certos pontos, prirnr.am.te que dizendo ella tinha cessado" cauz.; porq. tanto a "pal'açãu de sette Legoas p.a deixar de haver communicação inda mais estando ella na parage Capivary que não díffére da Estrada que vai p.a as V.as de 1tú e Por­ to Feli. p.a onde está o complico actualm.te passan­ do nem meyo quarto de legoa mayor m.te p.r me ~onstar) q. o d.o nas suas passagess faz a sua aposen­ tador a em hum rafiXO dist,e da Caza della duze~toJ passos mais ou menos. Também diz, que tivera tidn gr.avissímos prejuízos çauzado da exterminação Cltjl~s eu ign6ro expecialm.te em dizer, que deixOU sua C~.. za e mais moveis, pois a Caza onde estava habitando foi hua das cauzas da separação p.r estar plantuda: nas terras do cumprice dist.e daquelle vinte pasj"")!i­ em rigor. Justam.te implocou a sua recolhida p.a esta Freg.a com o pretexto de vir viver em Comp.a de sua May, e Irman, o que já faltou porq. antes C,tU<..Ll de hua parage remota onde pode fadlm.te proceb.,ir na seu antigo habi to lugar dist.e a Casa do d.o meya legoa. Sobre tudo meu Snr. Ex.mo não convem, que esta m.er rezi~ nesta Freg.a por ser de natureza p::.... sima cauza de discordias., e inimizades, atrevjd~. e arrogante no fallar pondo calunias infamatarias no meu Commando, e no que resp.ta ao Pastor Espi.rt .. tual, e neste tempo da sua auz.ça tem estado P.-':lta Freg.a com outro Sucego, e hannonia; e que d~'!.:llJ~ Cln diante nio succederá, se V~ Ex.a não der provid,a,. EUa aqui não tem que perder e só lhe resta a amOI<'­ za Comp.a de sua May, e como esta hé desprezada nada mais tem, que possa alegar. E p.a prova de m.a verd.e em todo tempo do meu Commando inda não me attevi a fazer hua reprezentação a V. EX.a se!15.o agora, pois esta vinda desta m.er p.a esta Freg.a hê Sumam.te nociva p.r ser ella cauza de todas a~ cnu~ zas. Nada mai~ me resta representar a V.Ex,a que r::;... ma .tão rccto deffrirá o que for de justiça. D.s g.de a V, Ex.a p.a amparo· deste povo p.r m.s e dilatad~. almas. Freguezia de Piracícaba, 20 de Janr.o de 1807. De V.Ex.. Humilde Sllbd.o - Francisco Franco da Rocha». A resposta de Antonio José da França e Ho,ta, capitão general da Capitania' de São Paulo, n1\() sei fez esperar e foi inc:siva: «Tendo considetado e quanto V.Mce. ffi'~ ,'''~ poem na sua carta de 20 de prez.e mez,· relativa· ao comportamento de Maria' Flor de ,Moraes; Orebnó á V.Mce. que em 'recebendo esta 'lhe mande int;mar dá m.a} que como ela continua no seu antigo es'candaloJ


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,CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

concubinato, não obstante o Despacho q. lhe ,aei p.a voltar p.a essa Freg.za., haja de sahir deUa no tenno de trez d:as; O q. vmce. assim fará execut".r. Ds. g.e a vmce. S. Paulo 26 de Janeiro de 1807 de Sr. FranciscO Antonio Joze da França e Horta Franco da Rocha Caprn. Commde de Piracica­ ba (59) •. Joaquim Silveira' de Melo, em seu «Almanaque de Piracicaba para 1.900»., cita a seguinte frase de uma ordem do cap;tão·mór de ltú, como pode ser vista na página 107 da referida obra: «Não consinta que Carlos visite Flora em c8.!:,.J, desta e nem que esta visite o comandante em cas3. deste, e além disso que não se encontrem em parte alguma, até mesmo na capoeira», e Mario Neme fa­ zendo l*Cferências a êsse documento escreveu que u mesmo não foi encontrado «infelizmente na COfr~J> pendência oficial dos governadores da Capítama~, por ocasião das pesquizas que fez nesse sentido. «Por êste saboroso - em parte alguma, até me.;­ mo na capoeira» bem se vê que o «capricho» de Car.. los Bartolomeu, repetindo ainda palavras de Mário Neme, que vinha aliás do tempo em que comandava a povoação, preocupou seriamente o capitão Fran­ cisc.o Franco da Rocha, obrígando-o a cuidar de mio nuciosas particularidades a fim de obter êxito em 'Sua função moralizadora. Para terminar êstes comentários, que já vão lon­ ge, segne a transcrição da última carta que faz refe­ rências ao assunto em questão e na qual encontra-se leve menção a respeito da legitima espôsa do sargen­ to-móI' CarlOs Bartolomeu de Arruda, e a sua famí­ lia, carta esta que foí dirigida ao capitão general da Capitania: «lILm" e Ex.mo Senhor. Meu Snr. Ex.mo na ocaZlam que remetti a Jista, e Mappas do meu co­ mando tão bem fiz hua representação em q. fazia ver a V. Ex.a os inconvenientes q. resultavão a habitação de Maria Flores neste contn.e do qual não tive sollu· ção, e vendo o exemplo com q. transgredia o tenno que assinou O qual incluso remetti, tomei o acordo de fazel-a expedir em conceq.cai do Resp. D'sp.o de V. Ex.a de 8 de 9bro proximo preterito, pois além da continuação no Laberinto da Culpa inda passa a constrangir a m.er do cumplice" e assim tão bem a fam.a e sem embg.o destes por sua gravides o não manifestarem ellas por sua maligna conducta o faz pt1blico. Esta expedição foi feita a 19 do mez passado por cauza de me achar gravem~te enfermo, já não dei a p.te com a devida promptidão, e por ver, que a demora tem sido gr.e, e a m.a molestia se prolon­ gará détermino dar já a d.a p.r fazendou q. assinou por mim o meu actual escrevente Eufrasio de Arruda e Sá, pois me vejo privado de o poder fazer pelo meu 70

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proprio punho; por cujo motivo suplico a V.Ex.a m" conceda Licença p~a transferir o Com mando enl pessoa do meu conceito athé que eu fique prompto p.a poder continuar, pois na m.a ordenança não te... nho f? off.al imediato ao meu posto Se não que Os Infer.cs e como obrig.a vaí augmento achava acer~ tado V. Ex.a creasse aqui a hum a jd.• e hum Alf.r> p.a que em casos taes, ou em m.a auzeflcia comman~ dem a Freg.a o que penso sera do agrado de V. Ex.a que tanto emponha a favor do bem publico. Piraci­ caba 3· de abril de 1807. De V. Ex.a - Humilde e obrg,o sud, to - Assigno pelo empedimf:nto do Cap.m Commd.e - Francisco Franco da Rocha Eufra­ sio d' Arruda e Sá». E aqui~ através dos documentos que se enCOn­ tram no Arquivo do Estado, termina o romance pe­ caminoso que a história de Piracicaba registra e no qual, por força das circunstâncias se vio envolvido o eapitão Francisco Franco da Rocha" muito prova­ velmente contra a sua vontade, dado a sua formação moral, bondade de coração e beleza de caráter. Voltando aO ano 1804, vê-se que Carlos Barto­ lomeu de Al'ruda nunca resignou-se de ter p'l'dido o comando da Freguezia e no ano seguinte! pl'OcU~ COu captar as graças do capitão general, oferec':'ndo~ se para organizar uma expedição contra nfgros Or­ de entrar em contacto com o governador, para acu­ ganizados em quilombo e não perdeu a oportun:dade sar seus adversários, como se deduz do documento seguinte: «Pa. o S. M. Carlos Bartolomeu de Arruda (co­ municando-lhe ter ordenado lhe seja prestado auxí­ lio na expedição contra os negros fug dos) (Do Se­ cretro.) . S. Exa. me ordena avise a Vmce. ter recebido a sua carta de 17 do corre. mez, e q. pa. obviar todas as duvidas q. podem suscitar~se, vai nesta bcasião ordem ao Comde. dessa Freguezía, pa. não emba­ raçar, antes proteger a deligencia de q. Vmce. se ach" encarregado. O mesmo Snl' houve COm d' ss.bor tudo o q. são queixas intempestivas, e feitas pro pessoas suspeitosas em razão das suas inimizades particulares,. pelo q. se deve Vmce. abster de cahír nessa censura. Ds. ge: a Vmce. S. Paulo 21 de Abril de IBM - Lu," Ant.O Neves de Car.o Sr S. M, Carlos Bartolomeu de Arruda (60)>>. As que:xas~ COmo se vê pelo documento acima, foram taxadas de intempestivas e o capítão general não perdeu tão bela oportunidade para mostrar sOu desagrado com respeito a fatos de tal natureza, e en­ viou ao capitão Francisco Franco da Rocha a se­ guinte determinação: «P.a o Capm. Franco. Franco da Roxa (orde­


CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA nando-Ihe prestar auxílio á expedição contra negros 'fug.dos) (Do Secretr.o). O 11lmo. e Exmo. Sr. Gal. houve pro bem en­ carregar ao S. M. Carlos Bal tolomeu de Arruda de atacar hum Qullombo de Negros fugitivos, e lhe dell ordem pa. conduzir consigo a gente q. lhe fosse ne­ cessaria, a q. partecipo a Vrnce. pa. q. não só o não embarace, mas antes lhe preste todo o auxilio q. pu­ der pa. tão interessante deligcnc:a. Ds. Ge. Vrnce. S. PIO. 21 de Abril de 1804. - Snr. Franco. Franco da Rocha Capm. CoCmde. da Freguczia de Piraci­ caba (61) ».

III Voltando ao documento que faz referência à no­ meação do capitão Franc.sco Franeo da Rocha para de novo oeupar o posto de comandante da povoa­ ção de Piracicaba, a 1 de fevereiro de 1803, vê-se que na parte final há wna referência ao «mizeravel estado» em que se encontrava a igreja 10calJ naquela ocasião. Foi determinado então, ao capitão Francisco Franco da Rocha, quc se empenhasse com todo o zelo na construção de uma nova igreja, onde .com digni­ dade pudessem ser celebrados os ofícios divinos. O cap~tão Francisco Franco da Rocha não po­ de realizar essa p:edosa missão, por vários motivo5 independentes de sua vontade. Como já foi dito anteriormente, as contendas entre os primeiros' piracicabanos, fruto das paixões políticasJ sopitaram seus sentimentos cristãos, fato e~tl'anho, a vista do espírito de religiosidade da épo.. ca, a ponto de não haver' p3ssibiHdade de fazer com que exteriorizassem seus sfnt;mentos católicos, con­ tribuindo para o levantamento de um templo, digno dêsse nome. . A ausencia de um pároco, provavelmente foi um fator capital que contrbiuiu para êsse estado de cou­ sas, durante a primeira gestão no comando da fre­ guez'a, do capitão Francisco Franco da Rocha, isto é, de deZEmbro de 1791 até 1797. Nesse espaço d~ tempo, nada foi feito no sentido de dotar Piracicaba de uma igreja, onde mesmo com simplicidade pudessem os ministros de Cristo, cele­ brar cond'gnamente, os ofícios divinos. Examinando porém, conscienciosam-::nte a escas­ sa documentação da época, chega-se a conclusão que não foram somente a ausência de pároco, nem a ca­ rência de numerário entre os componentes da comu­ nidade, Os únicos motivos que criaram obstáculos à realização de tão piedoso empreendimento. E' bem verdade, que a primitiva p"Jpulação PI­ racicabana não tinha grandes fontes de riqueza, VI­ via do amanho da terra, que era <ldadivosa e boa», da caça e da pesca que eram abundantes e fáceis.

37 Seu limitado comércio, fazia-se com os longínquos sertões de Mato Grosso e a sua indústria primitiva. não ia além da fabricação de canoas, monjôlos e pri­ mitivos engenhos para a moagem da cana de açúcar. Porém, o que caracterizava a pobreza paulista da éra colonial, nem sempre era a falta de Ouro ou pedras prEciosas e sim a acentuada escassez de mó· veis, roupas e utensílios domésticos, resultantes d·1 falta de intercâmbio cOm o mundo exterior a que eram coagidos pelo isolamento 'em que viviam, for­ çados pelas longas distâncias em que residiam, pela falta de estradas e meios fáceis de condução. Não era outra coisa pois, que «uma riqueza sem uso-fruto, sem comodidades (62)>>. Corrobora êste modo de pensar, o fato de que, de 1798 a 1802, o «Livro do Tombo» da Igreja Ma­ tr:z de Piracicaba, registra na relação dos vigários da paróquia, o exercício do padre José Francisco de Paulo cu de Paula, pa,ulistano de nascimento, filho de João Pais Damasceno, de São Paulo e de Josefa Roiz da Silva, de Santo Amaro (63), nada ter podi­ do fazer nesse sentido, continuando a Matriz, funcio­ nar em «um pequeno telheiro, sob a invocação de Santo Antonio (64». Também o seu súcessor, o padre Joaquim Ma­ nuel Fiuza, natural de Santos e que foi vigário de Piracicaba de 1802 a 1803 (65), nada pôde fazer cOm relação à construção da nova igreja. Acresce ainda que ambos abandonaram o po­ voado «compelidos pelos desmandos de Carlos Bar­ tolomeu, que estava no cartaz, pois era praxe que vigorava em Piracicaba desde sua instalação (66)>>, a campanha contra os ministros de Deus. E' a Carlos Bartolomeu pois, que cabe em gran­ de parte a responsabilidade de haver sido retardada a construção da igreja e o maior embaraço que o ca­ pitão Francisco Franco da Rocha encontrou na rea­ lização dêsse desiderato tem sua explicação na já mencionada questão das terras patrimoniais, pois Og assentamentos do «Livro do Tombo» da Matriz de Santo Antonio, esclarecem que depois de soluciona­ da essa questão, por acôrdo assinado entre a muni­ cipalidade e os 40 corgados, é que a mesma pôdo ser terminada no ano de 1838. <lTodos os anos - diz o Códice da Matriz -­ roçavam a chapada entre o ribeiro Itapeva e o rio Piracicaba, para nela fazerem igreja e casas. Demo­ rando de ano a ano a construção da igreja, devido à escassez de recursos dos habitantes, que a princípio e apenas puderam levantar um pequeno telheiro so:, a invocação de Santo Antonio. A nomeação de Ca.­ los Bartolomeu de Arruda Botelho, para capitãIJ­ comandante de Piracicaba, fêz retardar ainda mai") a construção da igreja (67) >.


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

o cap:tão Francisco Franco da Rocha assumiu pela segunda vez o comando de Piracicaba no mes, mO ano em que a paróquia era confiada ao padre Manuel Joaquim do Amaral Gurgel (Silva L'ID", Genealogia Paulistana, IV, página 143) (68), que apesar de encontra'r Carlos Bartolomeu destituido de qualquer autoridade, parece que ainda teve de ven­ cer da parte dêstel muita oposição) COmo se deduz do documento que segue: «Pa. o Sarmor. Carlos Bartolomeu de Arruda (dispensando-o de vir pessoalmente á sala do gover­ no) . O IlImo. e Exmo. Snr. Gal. me ordena dig" " Vmce. q. não hé precizo vir pessoalme. como pmn,<'. te na sua carta de 22 do m'ês passado, o q. hé muiLj baste. mandar os documentos reUativos ao V:ga!"l'l dessa FreguEz'a, o que deve executar com maior brr;­ vidade. Ds. Ge. a V. Mce. S. Paulo 22 de Abril de 1805 - Luiz Antonio Neve, de CaIValho - SI1C. Sargto. Mor Carlos Bartolomeu de Arruda (69)>>. Não deve ser confundido o padre Manuel JOa­ quim do Amaral Gurgel, que fol vigário de Pirac,cl­ ba 1 com o seu homônimo e pr'mo~ que foi profes:;í''J!' da Faculdade do Largo de São Francisc~J dep,,'la­ do, více presidente da provinda e conselheiro do lm­ pério, mas que só recebeu ordens de presbítero w:: ano de 1816 (70). Durante a gestão no comando de Pjracicaba~ dI.> capitão Francisco Franco da Rocha, o v'gário Ama ral Gurgel. nada fez com relação a construção da nova matriz e a seu respeito, alguma cousa será dito em outra oportunidade, qunado forem feitas ref!'" , rências a questão das terras patrimoniais. l/I Houve uma época <:In que a salsaparrilha (,ui. lax officinalis), dada a crença em suas propriedades anti..sifiliticas, ocupou um lugar de destaque n:> ar~ sena} terapêutico da época, e a sua existênc:a CIO qualquer região, despertava sempre interesse. Aos ouvidos do capitão general, chegou a not!~ cia da existência dessa smUacea na região de Plra~!~ caba, o qual apressou-se a dirigir ao capitão Fran­ cisco Franco da Rocha, a seguinte ordem: «P.a o Capro Comde. de P:racicaba. (sol'citar.. do a remessa de salsaparilha) (Do Secrtr.o). O Illmo. Exmo. Snr. General tendo noticia q'10 nesse Dectricto há Poaya - e Salsa Parrilh" Há SelVido Ordenar q. em Vmce. recebendo esta mande apanhar huma pequena porção de cada hum dos '.1'­ tos generos~ e com a possível brevidade os rem~ta a esta Secretaria pa. se examinar a sua qualidad:; de~ vendo Vmce. explicar na occazião que remet<:.'r a, ditas amostras, se a. sua colheita hé facil, ou d:ricu'. tosa, se fica destante da Povoação, e se ambas se

acha Em abundanda, ou hé piquena a sua. quant,da­ de. Assim o cmopra. S. Paulo 8 de Março de 1803 - Luiz Antonio Neves de CaIValho - Sr Capro. Franco. Franco da Rocha Capm. Comde. de Pira­ cicaba (71 ) •. Se Franc:sco Franco da Rocha enccntrou "u não salsaparrilha e poaia (cephaelis ipecacuanha i Ha região de Piracicbaa e enviou as amostras pedtJas, nada consta da documentação que o tempo, a Ulllí­ dade e os papirógrafos pouparam e que a mão do ho­ mem conservou a tê nOSSOs dias.

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arruamento da Frcguezia de Pirac:cab.:!. foi realizado no período em que o capitão FranCiSCO Franco da Rocha esteve peJa segunda vez. com o co­ mando da comunidade. Que nesse comando era tído em boa conta ptlo capitão general, conclui~se de um «post..scriptum» de Ultla carta endereçada P')l" êstc, em data de 22 do:: L:~ vefeiro de 1808 ao cap..tão·m6r de Pôrto 1-'eliz, ,:m y.u~ se ve que a sua atuação no comando de Plrac.~ caba agradava-o e era de moldes a satisfazer as ll.!~ cessitlades locais. Seus termos são os seguintes: «Como se toma indispensável} que na Frcguczi:a de Piracicaba haja sempre um con1.andantc que ptv­ videncíe os casos rcpeut.nos, do serviço, e m~:.mo dar execução ás minhas ordens) e teudo o capitão ... _ . conduzindo-se no comando da m::!sma COm llluíta honra e zêlo do real serviço: Ordeno a Vmce. o no­ meie para ficar comandando a dita Freguezia debai­ xo das suas ordens - Anton:o Jo. da Franca e Hor­ ta - sr. Franco. Corra. de Moraes Lte., Capo mor da Va. de Porto-feliz (72)>>. Alguns meses depois que esta carta foi escrita, o govêllO interino da Capitania determinou à Câmara de Pllrto Feliz que tomasse as providências para que fossé f.:to O alinhamento do terreno para a fregllczia de Piracicaba. Eram as antigas questões das terras patrimoniais que se reacendiam, devido a atitude de Carlos Bar­ tolomeu, que continuava insist~r nos velhos propósi­ tos de apoderar-se das terras do rossio da Freguesia, No «Livro do Tombo» escontra-se uma anota... ção que foi transcrita por Mário Neme em sua «Bis. t6ría da Fundação rie Pirac·caba. e que diz o se­ guinte: «Só depois de decorridos alguns anos, é que Os herdeiros de Corrêa Barbosa intentaram uma ação de reivindicação a favor dos povoadorest o que mo­ tivou o govêmo, em 1808 a mandar a Câmara de Pôrto Feliz fazer arruar a povoação no lugar ass:na­ lado pelo capitão-mór de Itú, e ser chamado 'a São Paulo Carlos Bartolomeu de Ar uda Botelho. a fim de renunciar todo o direito e pretensão que ~ ambi:­


CAPITAOFRANCISCO"FRANCO DA ROCHA cionava, com o título nulo e criminoso) sobre as ter­ ras doadas ao povo, pelo falecido capitão-povoa­ dor (73)>>. O a[shamento determinado, foi executado de acôrdo com as instruções recebidas do govê rr..o da Capitania e seu projeto dcve~se ao senador ~:colall Pereira de Campos Verguciro, que em 1807 adq.... iriu uma gleba de terra elll Piracicaba~ onde formúu uma propr.edade agrícola que esteve sob " chreçã" de se\! irmão João ~{anucl Velgueiro, que mais tarde veio a falecer nesta localidade, precisamente c..'1J 1815. O projeto delineado pelo senador Vcrgueiro, foi o que deu «origem á hoje bella e futurosa cidade de Pirac·caba (74)>> e consistiu em cruzar todas as ruasÍ' formando angulos retos, de 40 em 40 b: úça;, do mO­ do que elas tivessem 60 palmos ou 13,3 metros de largura e formassem quarteirões em quadr.,' de 1.600 braças quadradas cada um. Esse plano, observado até hoje, tornQu PíracÍ­ eaba uma das cidades melhor arruada, do tst.'ld" de São Paulo. E' uma cidade pitoresca e agraàavel sob muitos pontos de vista. (75)>>. O executor do projeto senador Ver~ueil'O foi o respe:tável piracicabano José Caetano Ros-" falecido aos 9 de dezembro de 1871. França e Horta que depois de Uma iicença de três meses reassumira seu pôsto govername!ltalJ foi informado em 29-10-1808, do resultado da, medi­ das tomadas pelo seguinte ofício dos carnari.stas de Pôrto Feliz: «lllmo. e Exmo. Sr. - ' Participamos a V. Exc,a. que em cumprimento a uma ordem expedida pelo.; Exmos. e lImos. governadores interinos, fomos á ftt.­ guc>:ia de Piracicaba e nela no dia 14 de OutubrJ Í1zemos o alinhamento do terreno delineado para a Povoação, para a qual houve uma repartição ecOnô­ mica, e prudente pelos moradores, conforme determi­ naram os lnesrnos senhores do govêrno. O plano c:ms­ ta de cinco ruas com seus nomes, e outras tantas tra­ vessas com os seus nomei) ficando a igreja Com um pátio de cinquenta braças de comprido, e quarenta de largo; e também uma praça destinada para a co­ de'a; o que tudo consta do auto de dem~rcação, e repartição que neste cartório fica. E porque temo~, satisfeito esta comissão, que nos foi encarregada, da­ mos parte a V. Excia. para que determine o que fór devido sõbre êste particular. Deus guarde V. Excía. mu'tos anos - Pôrto Feliz em Câmara, 29 de Outu­ bro de 1808. - De V. Excia. - Muito humildes e obedientes súditos - Antonio de Padua Botelho, Sa­ tumino Paes de Almeida, José Inácio de Faria, Lou. renço de Almeida Lima (76) ». Com o arruamento da povoação são cessaram l

39 porém as velhas questões cr:adas pelos Botelhos, seus parentes e amigos. Continuaram a criar todos os obstáculos possí­ veis, persistindo «-o Sargento-mor Carlos am;::drontar alguns pobres, que queriam edificar, e proibir-lhes tirar madeiras (77) ». Estes obstáculos criados pelo sargenta-mõr Ar­ ruda deram como resultado «ser chamado pelo capi­ tão-general Horta á Secretaria do Governo, onde re~ conhecendo o nem um direito que tinha nas terras da escritura do Barbosa renunciou toda a pretensão a elas (78)>>. As duas cartas que a seguir vão trasscritas, re­ ferentes ao lato que foi mencionado com o fim de tor.. nar patente as dificuldades que o capitão Fl'ancisco Franco da Rocha teve de fazer face, embora sejam posteriores a demissão dêste comandante) são bastan~ te elucidativas: «Pa. o Capmor. das Ordenanças de Porto feliz. Chegou a esta cidade o Sargento Mor das Orde­ nanças re[fOlmado Carlos Bartolomeu de Arruda, e eu tive o gosto de fazer~lhe ver que o telTeno que elle chamava seu não o era, e s:m Publico, e eIle em rC­ conhecimesto disso assignou na Secretaria deste go­ verno hum Tenno que eu remeto por Copia a Ca­ mara dessa ViIla, para o fazer registar nos seus Li­ vros, com a Carta inclusa, que Vmce. mandará en­ tregar depois de ler. Eu espero que Vmee. daqui por diante viverá em socego com o dito Sargento Mor, tractando-o com a Urbanide. e respeito, que clle polo seu Posto merece de sorte que não tome a chegar a Preza. deste Governo queixas de parte a parte. Ds. 15". a Vmce. S. Paulo 27. de 7bro. de 1811. Antonio Jozé da França" Horta (79) ». A segunda carta foi escrita nos seguintes termos: «Pa. a Camara da Villa de Porto Feliz. Tendo ch:gado' a esta cidade o Sarg. Mor das Ordenanças refformado Carlos Bartolomeu de Arruda, e ouvin­ do·o na prezença do Rdo. Ygario de Piracicaba e Bacharel Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, ti.. ve a satisfação de Convence-lo de que o terreno em que elle não queria deixar cortar madeiras não era de sua propricdade, mas sim do Povo) e disto elle assignou hu Termo na Secretaria deste Governo, que eu remetto a Vmcc. por copia para com esta Minha Carta, ser registrada nos livros dessa Camera, e a todo tempo constar que o terrenO questionado hé Pu~ blico, a quem - se neces!"O. hé eu por esta dou para Logradoiro dos Moradores da Povoação de Pi­ racicaba: e Vmces. assim o mandarão publicar na da. Frega. para ch<'gar no!"cia a todos. Ds. ge. a Vrnces. S. Paulo 27 de 7bro. de 1801, Antonio José Franca e Horta (80) •.


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

Outro fato que corrobora o que se procura es· clarecer, .isto é 1 os inúmeros diSsabores e a série de preocupações vividas pelo capitão Francisco Franco da Rocha, homem íntegroJ de C3t-áter e de tona ho~ ncstidade a toda prova, que tudo fez para defend~r os interêsses da população sob seu comando, manten. do a ordem, a justiça e a disciplina na coletividade afeita a seus cuidados, prova a seguinte carta: <Para o Capo mOr da Viii. de Porto Feliz. Ten­ do chegado a minha Prezenç. Manoel Joaquim pin­ to em ooservancia das Ordens, que para isso dirigi a V. Mce. em eonsequencia do seu Omeia de 14 de ja­ neiro deste anno o reprehendi cevcl'amente; pelos fac­ tos de desobedieneia, que V. Mee. e contra O Capnt. po Destricto de Pirac:caba: e que hia dr húa salÍsfa­ ção a V. Mce., e ao dito Capitão na conformidade do que lhe ordenei, e porto he elle mesmo o proprio con· ductor desta de que passou recibo na Secreta,;a do Governo, e V. Met. me avizará se eUe cumpre cem l promessa, que fez: Cazo a Camal'a o torne a n01near Inspetor do novo eamo. tendo-lhe ordenado, que pc­ ça ao Capm. a Gente perciza, e que não se mf':ttn ~, nomealla eUe mmo. e espero de V. Mee. tome a seu cuidado o animar a concluzão do do. cam.nho e que 'mto. se intereSSá o Publico, .e Eu - D;;. Ge. a V. Mee. São Paulo 8 de Fevereiro de 1810. Antonio Jo," da Franca e Horta - Snr. Francisco C:Jra. de M{j~ me.> Leite Capo mor da Villa de Porto feliz (81)>>.

111 O capitão Francisco Franco da Rocha, este\!! no comando da Freguesia de P;racicaba até os fins d.: primeiro trimestre do ano de 1811. Sentindo-se velho, cansada, querendo ser CO~~ rente COm o modo de proceder que sempre caracter:· zou sua vida pública, não quis continuar a exercer uma função que suas forças não permitiam pteenclHP: em toda sua pujança, em toda sua finalidade, moti,o pelo qual preferiu recolher...e à vida privada, salie'­ tando sua demissão. O capitão general Antonio José Franca e Horta a vista dêsse pedido, dirig:u-se ao capitão mór de Pôrto Feliz, nos seguintes tennos: «Para o Capm. mor da Va. de Porto felli,. Re­ cebi o seu Officio de 11 do corrente acompanhad~ da carta q' lhe escreveo O benemerito Capm. de Pi­ racicaba Franc:sco Franco da Rocha; bem a meo pe­ zar consinto em q'elle seja demitido do Real Servi­ ço attentas as suas' razõens de molJestia vdhice e aI... to de posses; porem pelos scos bons serviços O"dono q' elle seja conservado em todas as suas onrras Moellí­ tares uzando de seus competentes unífonnes. Vmce. faça a nova Proposta com a Caroara e mto. lhes re­ comendo nomeem trez sugeitos do Destricto em q' concorrão s:rcunstancias iguais a do Capm. Fran-

cisco Franco a ql. deve voltar cem a Proposta. D~ guarde a Vrnce. São Paulo 23 de Mco. de 1811 Antonio Jaze Franca e Horta. Snr. Capm. Mor da Villa de Porto Fe!liz (82)>>. Encerrou-se assim a vida ele homem público do capitão Francisco Franco da Rocha, p:Jrém dZ' um modo brilhante, pois como disse Franco e HOí'ta~ fo· unl benemérito.. que não mediu sacrifícios no inte­ rêsse daquele pequeno núcleo de população, que Em seu contínuo desenvolvimento, constitue hoje umá das nossas maiores e progressistas c'dades e que tem dado ao Brasil um sem nÍlmero de flIh:::s ilustres. Cidade, que como escreveu o professor Guilher­ me Vitti em seu «Manúal de História Ptl'ac'c,,'1ba­ na», onde até os passadOs «mostram algo de diferen· te, assim como o sotaque de sua gente, de coração sempre a sorrir?!» e onde «tudo:> caminha dentro da n::>rmalidade de acontec:rucntos luunanoS»l onde. «1u­ ta-se pelo pão de cada dia, luta-se p.-Ia cousccução de 'deais terrenos e celestiais, luta~se, enf:m~ por tudo aauilo que possa tornar a existencia mais amena e suportável, num uníssono esforço de vida em COn­ junto, acampados fraternalmente na terra bendita e bela que Deus nOs deu - PIRACICABA». (83). Sua atq.ação no ccmando da Fngu -zia, fQi de moldes a permitir quo o govêrno da Cap:tan'a des· cansasse, confiado na sua influência de homem sen­ sato, probo e de coração. Silveira de Melo, l'eferindo-se ao cap:tão Fran­ cisco Franco da Rocha J escreveu o seguinte: - «Es­ te Capitão comandante, de illustre ascendência, ca:­ sado com d. Maria de Arruda Mello e Amaral, se­ nhora de raras virtudes e assaz educada para aquel­ les tempos~ sobre haver-se em tudo como um paulista .as direitas. Homem de bem, muito esemado, de muito tino pratico; e e!;triio cumpridor dos seUR de­ veres, m~receu sempre ser .apoiado em todo5 os seus actos pelo capitão-mor de Porto Feliz que quando deHe fazia referenc!as ao Capitão-general, di7.ia: E' um Offal. que tem servido a S.A.R•. com toda hon· ra, inteireza e limpeza de mãos (8'1).,». Enfrentou o capitão Francisco Franco da Ro~ (;ha, «intilnorato os Botelhos e seus parentes, princi­ palmente o turbulento Alferes Manoel Joaquim de Arruda P:nto que, à força, queriam ser donos de to­ das as terras circunvizinhas, mesmo de partes perten­ centes ao rossio. Em abono de seu governo firme e honesto, a lo­ calidade conseguiu atrair para si mais gente boa e famílias de respeito. Foram anos de fal"tura e paz, nos qua:s se ini­ ciaram a cultura inten"la da cana de açúcar e a cul­ tura do chá. Grandes fazendas de criar em sua vast~ cxten5ão~


CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA Esses fatos se verificaram entre 1786 e 1800, (85),.. Em 1813, sentindo que a morte se aproximava, ditou o seu testamento, que foi escrito nos segui.ntes termos:

TESTAMENTO

Em nome da Santíssima Trindade Padre, filho e Espirito Santo tres pessoas distintas e hum s6 Deu; verdadeiro. Piracicaba, dez de julho de mil oitocen­ tos c treze. Saibam quantos este publico Instrumen· to virem que sendo no aono do Nascimento de Nos­ so Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e treze, aos dez dias do mo. de Junho; Eu o Capitam Fran·

cisco Franco da Rocha, estando gravemente enfer­ mo porem em meu Juizo perfeito, faço meu Testa­ menlo na forma seguinte: Declaro que profccci aRe· Jig ão Catholica Romana e sou natural da Villa de Itu~ filho Legitimo de João Francisco da Rocha, e de Maria Farias Taveira; declaro que fui cazado do primeiro Matrimon:o com Reza Soares da Silva dê quem tive sinco filhos Eufrasio, João; Manoel, Fran­ cisco e Luis; e de prezente sou cazado Com Donna Maria de Arruda do Amaral de quem tenho sete fi­ lhos Antonio~ Francisco, Anna, Maria, Maria, Car~ lota e Gertrudes; cujos acima nomeados sam meus Legitimas Erdeiros; deixo a metade de minha Ter. ça a meu Filho Francsico entrando nella pela ava­ liação o escravo Antonio Banguella '" outra metade deixo que se d' gam dez Miças pela Alma de meu fi­ lho Antonio sinco pela Alma de meu filho José sinco pela alma de minha filha Maria dez pelas Almas dos metls Escravos, huma capela pela minha Alma e de· p~·ii

de cumprir o meu Legado o resto se repartira

por todos as m'nhas filhas. Declato mais ,que de mi­ nha Terça digo deminha meia Terça deixo sinco ml! reis de Esmollha a Santo Antonio; declaro que devo a sertos homens de que pacei credito asignados por minha Letra declaro que devo a Bento José de Abreu a onze m!) seis centos setenta reis; Declaro que se Jeronimo da Silva ,Bueno tem plantado hum quartel de casas nas minhas Terras, cujo tera mando no mell Engenho seu partido com 0$ meu Eseravos, e Rogo a m'u Filho Francisco e ao Capitam Domingos Soa­ res de Barros e a Jeronimo da Silva Bueno queiram ser meus testamenteiros e por ser minha ultima von­ tade pedi a Jeronimo da Silva Bueno, que este por mim fizece e a meu rogo assinace por eu estar enfer­

41 neiro. Como testemunha que este fiz a rogo do tes­ tador Jeronimo da Silva Bueno. Numero duzentos e secenta e nove. Pagou quarenta reis do selo. Porto feliz quinze de julho de mil oitocentos e treze. Faz o escrivão Peixoto». A seguir vae transcrito o inventário:

.Do inventário que se fez .dos bens que ficaram por mo.;te do Capitam Francisco Franco da Roxa da treguezia de Santo Antonio de Piracicaba, termo da ViUa de Porto feliz» em que foram «dados os pre­ sentes bens Escritos por sua mulher Dona Maria de Arruda. consta: Titulo dos flhos da pro. mulher Eufraso José da Rocha casado João Franco casado Francisco de ide. de 24 as Manoel solteiro de 22 as Antonio soldado auzte de ide de 22 as Luiz de idade 20 as, Filhos da sega. mer, e invte. Anton'o de ide. de 13 as Anna de ide. de 12 as Maria de ide. de 11 as Maria do Nascimento de idade 7 as. Corlota de ide. de 6 as. Francisco gemio de idll. 3 as. Gertrudes gemio de ide de 3 as. Hu filho que acha no ventre

1

2 4

3 .:;

6

7 8

9 10 11 12 13 14

Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e treze aos vinte dias do mes de Agosto do dito annO nesta Freguezia de San­ to Antonio de Piracicaba termo da Vila de Porto Feliz, comarca da Cidade de São Paulo, em casas da inventariante Dona Maria de Arruda. Amaral. ..... disse: que seo marido falecera comhum testamento lluncomparativo que reduzio a publica forma ..... . canaviais - cavalares - Bens ouro - prata - co­ bres - estanho - vidros - ferro - escravos - bens de raiz - Total 4:445$600. Descrita assim, a largos traços a vida laboriosa e útil do capitão Francisco Franco da Rocha, termi­ na aqui a sua biografia, que com o tempo poderá ser ampliada, na hip6tese de serem encontrados ou­ tros documentos que façam referências a sua perso­ nalidade.

mo assigno arrogo do Capitam Francisco Franco da

BIBLIOGRAFIA

Rocha - Jeronimo da Silva Bueno. Como testemu­ nha João Manoel Vergue'ro da Costa. Como teste­ munha Bento José Ribeiro. Como testemunha An­ selmo Maxado de Souza. Como testemunha João Vi­ cente Soares, Como testemunha João Manoel Caro

1. Azevedo Marques, «Apontamentos Hist6ricos, Geográficos, Biograficos} Estatísticos e Noticio­ sos da Província de São Paulo»1 Livraria Mar­ tins Editora, Edição comemorativa do IV Cen­


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA tenário de São Paulo, dirigida por Afonso de E. Taunay, Tomo I, página 197.

2. Sesmarias, publicação oficial do Arquivo do Es­ tado de São Paulo, volume II, p;lg'na 482, Ano de 1921. 3. Idem, página 493. 4. Idem, página 459.

25. Idem.

26. Mário Neme, «P'racicaba no século XVIII>, in Revista do Arquivo Municipal, número 45, pá­ gina 155. 27. Idcm, página 156.

5. Mário Neme, Piracicaba, Documentário.

28, José J aéÍntho Ribeiro, «Cronolcgia Paulistana», volume lI, página 50.

6. Azevedo Mar<lues, obra acima citada, pág. 198.

29. Idem, página 50,

7. Documentos Interessantl:s, publicação of ci,al do Arquivo do Estado de São Paulo, volume XXIII pág;na 40.

30. Idem, página 51.

8, Idem,

10. José Jacinto Ribeiro, .Cronologia Paulista», vo­ lume lI, página 50. 11. I>o<!umentos intcl'essantes, publicação ofic!al do Arquivo do Estado de São Paulo, volume V, pá­ gina 75, 12. Mário Neme, "Piracicaba no século XVIII», in Revista do Arquivo Municpal, número 45, pá­ gina 135. 13, Idem página 146.

18. Alice Piffer Canabrava c Haria Tei"oira Men­ des~ «A Região de Piracicaba», in Revista do Arquivo Municipal, número 45, página 308.

19, Silveira Mclo, «Almanaque de Piracicaba para 1900», página 108.

20. Mário Neme, Piracicaba no século XVIII»: in Revista do Arquivo Municipal, número 45. pá­ gina 150. Arqnt~

22. Idem, página 176, reproduzindo documen:" existente no Arquivo Municipal da Prefeitura d'" Piracicaba.

23. Estevão Leão Bourroul, «Almanaque do do POVO», ano de 1894, citação.

34. S;lveira Martins, «Almanaque de Pirac'caba p-;;..­ 1900».

r"

35. ::VIário Ncm~, «Fundação de Piracicaba») in Rí;­ \" sta do Arqu:vo Municipal, número 46, pág:na 130.

36. Documentos interessantes, publicação ('{idal tiiJ Arquivo do Estado de São Paulo) VJIl!~ XLVI, página 139.

37. Idem. 37. Idem. 39. Mário Neme, «Fundação de Pirac'c::ba»; in Re­ vista do Arquivo Mun·cipal, núm.::ro 66, págL ~ na 131,

14. Idem. 15. Idem. 16. Idem. 17. Idem.

21. Idem, citando documeto ~rtencente ao vo da Prefeitura Municipal, página 76.

31. Idem. 32, Idem.

33. Idem.

9. Prudente de Moraes, «Almanaque Liternrio da Província de São Paulo», Ano de 1878.

>

24. Idem.

Jorn~l

40, Documentos Interessantes, publicação oficial do Arquivo do Estado de São Paulo, volume XLVI, página 139. 41, Silveira de Melo, obra já citada, página 119.

42. Documentos Interessantes, publicação Of dai ,.h Arquivo do Estado de São Paulo, volume XLVi página 100. 43, Idem,

44. Alice Piffer Canabrava e Maria Teixeira Men­ des, «A região de Piracicaba»; in Revista do Ar­ quivo l'vlunicipal, número 45, página 308. 45. Silveira de Melo, «Almanaque de Piracicaba pa­ ra 1900., pág'na 115. 46. Dr. João Batista de Czmp:>s Aguirra, «Sc:;.ml~i~ ros e Posseíl*osl>~ in Revista do Instituto Histó~ rico e Geográfico de São Paulo, volume 34, pá­ g'nas 286 e 287.


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CAPITÃO FRANCISCO FRANCO DA ROCHA

,

47. Cartas de Sesmarias" Livro número 30 1 pagma 133 e seguintes, publicação do Arquivo do Es­ tado de São Paulo.

48. Lista de população de Piracicaba no ano de 1797, pertencente ao Arquivo do Estado de São Paulo. 49. Joaquim Silveira de Melo, «Almanaque de Pi­ racicaba para 1900», página 19. 50. Mário Neme, «História da Fundação de Pira­ cicaba», página 98.

51. Idem, página 65. 52. Docmnentos Interessantes, publicação ofeial do Arquivo do Estado de São Paulo, volwne LV, páginas 19 e 20, 53. Idem, páginas 26 e 27. 54. Mário Neme, «História da Fundação de Pira­ cicaba», página 65. 55. Mário Neme, Idem, página 113. 56. Idem. 57. Idem, pág:na 110 58. Documentos Interessantes, publicação oficial do Arquivo do Estado de São Paulo, volume LV, página 187, 59. Idem, volume LVII, página 97. 60. Idem, volume LV, páginas 286 e 287. 61. Idem, página 287. 62. Mário Neme, «História da Fundação de Pira­ c'caba», página 104, 63, A. Pompeu, .Os Paulistas e a Igreja» volume

lI, página 86, número 725.

67. Idem .

68. A. Pompeu, «Os Paulistas e a Igreja», volume I, página 33, númerO 10. 69. Documentos Interessantes, publicação oficial do Arquivo do Estado de São Paulo, volume LVI, página 197. 70. A. Pompeu. "OS Paulistas e a Igreja», volume I, pág:nas 31 e 32, número 9. 71. Documentos Interessantes, publicação oficial do Arquivo do Estado de São Paulo, volume LV, página 37. 72'. Idem, volume LVII, página 250.

73. Mário Neme, «História da Fundação de Piraci­ caba», página 122. 74. Djalma Forjaz, .Senador Vergueiro., segunda conferência, ín Revista Nacional, ano I, número 5, página 17. 75. Idem.

76. Mário Neme, "História da Fundação de Piraci­ caba», páginas 122 e 123. 77. Oficios da Cap:tal, 1822 a 1847, pertencentes ao Arquivo do Estado de São Paulo. 78. Idem. 79. Documentos Interessantes, publicação oficial do Arquivo do Estado de São Paulo, volume LIX, páginas 278 e 179. 80. Idem, página 279. 81. Idem, volume LVIII, páginas 293 e 294. 82. Idem, volume LIX, páginas 197 e 198.

64. Mário Neme, «História da Fundação de Pira­ cicaba», página 116.

83. Professor Guilherme Vitti, «Manual de Histó­ ria Piradoabana., páginas 126 e 127.

65. A. Pompeu, .Os Paulistas e a Igreja», volume lI, página 89, número 739.

84. Joaquim Silveira de Melo, «Almanaque de Pi­ racicaba para o ano de 1900., página 119.

66. Mário Neme, «Hist6r'a da Fundação de Pira­ cicaba., página 117.

85. Professor Guilberme Vitti, «Manual de História Piracic.bana», página 20.


Elucubraçõ.es sôbre uma certidão de nascimento PROF. GUILHERME VlTIl (Membro do I. H. G. P.) Quando me ponho a ler documentos antigos, se~ jam êjcs avulsos ou enfeixados, manuscritos ou jm... p~sos, sinto-me transportado para a épcca em que @1es vieram à )u;/;, Voejam-me, então;, na mente, os personagens que a leitura 'vai desfIlando, tactei-os quase, ouço­ lhes o linguajar do tempo, percebo seus poculiares gestos~ advinho seus pensamentos idos, vivo, enfim, com êles, como se companheiros fôsscm d.;; longa jornada ou quotidiana lide. Babo-me pela companbia dos antepassados, dos clássicos, dos quadr41dos e dos sup::rados COmo o:; apodam hoje. E essa inclinação para com Os traque­ jados no embate da ',,,,,téncia ("",a dosdc a· infân­ ~a) seguiu-me na meninice, flanqueou-rnc na juvcn­ tude1 acompanha..me na maturidade e escoltar-me-á na rampa derradeira da existência.. - Velho - foi a alcunha que me impingiram os companheiros da puerícia. E foi bem posto, já que eu era avesso aos folguedos daquela quadra, prefe­ rindo -a roda dos marmanjos e barbudos, cheirando a suor e a fumo. Mas vamOS ao que interessa. Quando tive em mãos, pela primeira vez, o qua­ se bicentenár'o manuscrito que rem"'mora os pri­ mórdios da história píracicabana, senti um arrepio de júbilo, de encanto, de posse intensa, semelhante, quiçá, ao do faisc.dor suar~to, v'slumbrando na ba­ téia rústiea o diamante enorme, rutilante, têrmo fi­ nal de sua busca insana. . Aquêles papéis perfurados pelas traças e pelo

tempo, cheirando a môlo de estantes silenciosas, vol­ taram à vida, amaciaram-se felinamente ao contato trêmulo de meus dedos. E a sárabanda dos persona­ gens dt'ssa quadra histórica entrou a se agitar na mi­ nha inlaginação deslumbrada. Depois, no amoroso manuseio de pesquisador curioso e constante~ eis o que a minha fantas'a mental engendrou com a leitu­ ra vigásima dêsse memoríal de efemérides nossas.' De antemão deixo bem claro que tudo quanto aqui f8r expendido, é fruto de investigação e inter­ pretação minhas, de amador curioso, sem pretensões a historiador, à moralista, a psicólogo, a grafólogo, a filósofo, e a outras quejandas especialidades. Puro·e ingênuo diletantismo é o que é. O manuscrito em pauta contém o relato das ra­ zões que mofvaram a fundação oficial de Piracica­ ba, focalÍ7.ando, alémdlsso, o epis6dio da mudanç~ de localidade. Seu autor: VlCENTE· DA GOSTA TACQUES COES E ARANHA, Capitão-mór de Itu,·vila à qual a freguesia de Piracicaba estava su­ bordinada em seus prim6rdios.. O opúsculo, atual­ mente, apresenta..se. em encadernação resistente, ten­ do lombada e cantos de couro e capas de pano espe­ cial. O trabalho é de 21 de março de 1886, feito em São Paulo, qllilndo era secretário da Câmara, Jerô­ nimo JoSé Lopes de Siqueira. O mesmo encaderna­ dor executou o trabalho do segundo livro histórico da cidade, no qual se transmite tllda a d.ocuI)ltnta­ ção pertinente ao processo da elevação de ~i~acica­ ba à Vila, a munidpio independente portanto. Por sinal que o título da. capa poderá enganar as pessoas pouco afeitas à terminologia administrativa, uma vez


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ELUCUBRAÇÕES SOBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO

que lá está escrito; «História da Fundação de Pira­ cicaba», quando, na realidade, deveria ser: «Hist6áa da Elevação de Piracicaba à Vila, OU li Mun.cípio». Retomemos o curso da palestra. O papel usado pai a o manuscrito em questão é de puro linho, representada a marca da linha d'água, por um cavaleiro montado, cavalo e cavalei­ ro mal desenhados e desproporcionados, rudimentar­ mente ajaezados. Uma roseta de 6 pétalas aparece na paleta dianteira do animal. O cavaleiro cal'rega uma longa lança que apon ta para o chão. Sob o con· junto há um monograma; formado p~)as letra.. S.B.P. em caracteres maiúsculos. O livro teIn 27 fôlhas, em formato de pap"l de ofício, tendo s:do usadas apenas as primeiras cinco, de ambos os lados, resultando, portanto, 10 página3 escritas. E' de se estranhar o número desigual de fô­ lhas existentes em cada um dos três fascículos. O pri­ meiro teln seis fôlhas, o segundo 13, e o tercerio OitO. Teria havido e1.mináção de fôlhas no ato de enca­ dernar? O momento seria oportuno para uma biografia minuciosa do autor do registiO de nascimento de Pi~ racicaba, o Capitão-Mór V.cente da Costa Tacqucs Goes e Aranha. Fica o assunto a encargo de pessoa mais capacitada. Limito~me ap.enas a uma observa~ ção sôbre a gl'afia exata de seu nom::!, isto porque, em obras de alguns historiadores, vi..o com a prepo~ s:ção «de» entre Os têrmos «Goes» e «Aranha». Erro manifesto, pois) a assinatura de próprio punho do Capitão-Mór, que tinha uma caligrafia elogiável, nao deixa resquício de dúvida quanto a isto. Nas duas vezes em que ela aparece, a conjun­ ção «e» está nítida e destacada. ~sse ituano de truz é um dos raro. individuo; que se ligaram à vida d!ste Mun!dpio, sem visa,' vantagens pessoais, cuidando tão sômente da novel povoação, como se filha f&se de sua p,edileção, nu· ma porfia sem trégua contra maus e discordantes ele­ mentos da localidade, e ao longo de -duas décadas, pois há correspondência do mesmo, com as autorjda~ des superiores da Província, tratando de interêsses piracicabanos desde 1784 até 1803. Dezenove -anos, portanto, em correspondênc'a de meu conhecimento. Passemos, agora, à análise do documento em re­ ferência, sob vários aspectos, cujas denominações obedecerão mais a normas de minha im~ginação d~ que propriamente à terminologai técnica de uma anãrse literária, histórica, geográfica, física ou m2.~ tafísica, social ou religiosa. 1.0 ASPECTO APRESENTAÇÃO GRAFICA DA OBRA Digna de elogios é tllda ela, levando-se om co!'­ ta o material disporuvel naquele tempo. Que o au­

tOI' da escl'ita foi o próprio Capitão-Mór, nã'J se .fs­ cute, pois, a caligrafia do texto e a de sua assinalu:l.:.L. revela-se idêntica ao primeiro olhar, até mew!u para. possea de pouco traquejo no assunto. Não sou grafólogo d~plomado1 nem tenh,j vclci~ dades para entendcdor profundo da matér.a Co-­ nheço essa ciência apenas pela rama, comll simples curioso. O caráter) todavia, firme, decidido, coeren­ te, patriótico e relig:oso do escritor vibra no c0ntcú­ do caligráfico da narrativa, de tal fOlTIla. llut Um leigo nota-o de pronto, As letras, como que de.;crJh~l­ das uma a uma, são lançadas em linhas retas e para­ lelas perfeitas, eonstantes ctn seu tamanho e fo:"!uato:­ guar~ando igual distAncia entre si, e con<;ervando consoantes e vogais as proporções respectivas. f'..nm que perícia foram executados os volteios das m;;tiús­ cuIas! .. , E releva notar que as fôihas de a~lt:.iJ\hf} não dispunham de linhas! A primeira página do libreto é ocupada por urna moldura desenhada em arabesco de folhagem .,t;(i­ zada, colorida em aguada côr de tijolo e amardo vi­ vo, numa tentativa de f pelo contraste das co; E":;. pro­ vocar o relêvo do desenho. Quem seria seu autór? O próp!'io Capitão-Mór ou alguém perito na ae­ te p:ctórica? Visto assim de relance, o trabalho é de ente!ldi­ do no aSSunto. Como, porém, nota ..se falta de 'iiú'ieo-· tria perfeita entre as partes correspondentes, tudú leva a crer que o trabalho foi executado às p:·esH~,. como que para se atender a um pedido de urgêncil.. Como o artista não dispudesse do material apropria­ do, fê? o desenho à mão livre. Por miII1 não vejo dificuldades em atribui-lo ao­ Mestre Entalhador e Arruador, Miguel Francisc,," Paes Soares, pos~o que o mesmo acompanhara o Ca~ pitão-M6r de Itu e esteve pres~nte na transladação­ da povoação de Piracicaba ,cabendo-lhe, aliás, a in­ cumbênc'a de traçar o ..seu primeiro plano de arrua-­ mento. Um ilustre pintor contemporil.n'o atribui o trabalho a Frei Tomé de Jesus. B3a paternidade tam­ bém essa. A distribuição das palavras do título do livro,. dentro da moldura. estâ um tanto assimétrica, de· duz'ndo~se daí, ter ~Ia sido executada dep-::is do tra­ balho da escrita. Provàvelmente, com essa moldura colorida, pretendeu o Cap'tãc-Mór dar maior valor e imponência ao documento por êle lavrado. Essa hip6tese minha parece confirmada, poisr em data de 25 de janeiro de 1803, escrevia, dirigin­ _do-se ao Capitão-General de São Paul~; «lavrei de' próprio punho todos os assentos e termos necessários,. cOm as melhores noções que me ocorreram, em um pequeno livro que fiz a m1nha custa e remeti ao­


ELUCUBRAÇÕES SóBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO Exmo. Sr. e se há de achar na Secretaria do Govêr­ no ... l> Seja como fár, o desenho impressióna de chofre pela vivacidade das côrcs e pela delicadeza das li· nhas. Uma só tinta servia para a escrita, tanto a do texto como a das ass:naturas. Também, pudera1 na~ quela época l tinta e caneta er.am preciosidades de no~ brIOs. E' uma lástima que o óxido de ferro da tinta, ajudado pela ação do tempo, esteja corroendo o pa­ peI em muitos lugares. Ainda bem que a pa!'ticipa­ ção das traças tem cessado, depois de guardado em local mais apfapr' ado. Saibam Os ouvintes que um livro dessa importância jazeu por longos anOS no po­ Tão da Prefeitura como velharia desprezíveL 2.0 ASPECTO

ASSUNTO HISTóRICO DO LIVRO A narrativa apresenta duas partes distintas: a primeira é um apanhado hist6rico-geográfico da pri. mitÍva povoação, no qual se define a orig~m de seu liome, revelando os motivos de sua fundação oficial, contando seUs primeiros passos como freguesia; a se­ gunda parte consta do ofício autorizando a sua mu~ dança, segu' ndo-se o tênno em que se descreve, por­ menorizadamente, o traçado da primeira. planta da povoação em local previàmente escolhido. Aliás, o tí­ tulo do trabalho é melhor resumo dnque o meu. ru·~

­

«Mrm6ria do estabelecimento da nova Povoaçãe de Piracicaba junto à margem da parte dalém do Rio do mesmO nome e da sua mudança c !'ced ficação para a parte daquém do d'to Rio». Disse tudo num punhadinho d..:;: palavras. Con­ cisão latina. O autor entra no assunto t declarando que a po~ voação tira seu nome do rio que a banha, e a seguir, explica a origem gentílica: «peixe que chega ou lu­ gar aonde chega o peixe». E comprova a definição, informando que, anualmente, a abundância do p~ix<;! que sobe sua torrente é notável. Já se discutiu abundantemente e ainda se discu­ te e díseutirá o signif cado do vocábulo - PIRACI­ CABA. Dezenas de explicações foram dadas e ou· tras mais surgirão. Apenas ponho um reparo, sem <:ontudo ap"ofundá-Io: Não estaria a definição do Capitão-MóI' mais pr6xima da exatidão, já que, em seu tempo, índios cl:lrijós ai.nda andavam esbarrando em gente da povoação? Não teria sido colhido en­ tre êles o s'gnificado do vocábulo nativo? Cito aqui a última interpretação que topei, nu­ ma obra s6bn: os Sumérios} ancestrais da humanida­ de que viveram há mais de cinco mil anos em terI'a~ da As'a t e dos quais, recentes desc:"br-rtas .arqHeolÓ~

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gicas relatam maravilhas de progresso e inteligência.~ Para comprovar-se que o idioma deles oferece raízes às várias línguas de povos da terra, o livro apresenta uma relação de palavras de todo o orbe terráqueo. Lá está, entre outras, o têrmo - PIRACICABA ­ com éste signircado hatuta: «Rio trabalhado pelos ilustres cantores do templo». Que beleza! E o espanto da gente aumenta e se complica, quando se acaba de ler os dois volumes do autor alemão, Erick Von Daniken, intitulados: «Eram os Deuses Astronautas?» e _De Volta às EstrSI..<». Ou ainda o livro: «Antes dos Tempos Conhecidos» de Peter Kolos:mo, e o interessaste trabalho: «Antiga História do Brasil, do escritor germânico Ludwíg Schwenhagen. Quem ler êsses estudos ficará basba­ oue e abismado diante das chocantes teorias ali ex .. postas sôbre a origem dos povos e de sua civilização. Com a segurança de um conhecedor e partici~ pante atívo dos fatos, para o desenrolar dos quais compareceu como ator principal, dá o autor dados exatos de geografia, cientificando que O rio Pira­ cicaba é fOlmado pelos caudalosos ribeiros Jaguari e Atibaia, desembocando no Anhembi ou Tietê, igua.. lando-se a êste na largura, não porém no fluxo das águas. Atente-se que, desde então já se pUnha em confronto o tamanho de ambos os rios. Depois de comentar a beleza do Piracicaba, res­ salta que a região é excelente para qualquer cultu­ ra, havendo abundância de salsaparilha. Salsaparilha ~ engracei-me com êsse risonho vocábulo desde os bancos do primário. Que é uma planta~ quase todos sabem, conhecê-la de visu, porém, é de poucos. Haverá exemplares nativos por estas bandas? Confesso não conhecê-Ia, salvo se tiver ontra denominação. E diz o texto que havia abundância. Teria aeontecido à salsaparilha o mesmO que ao chá.. mate que, nesta região, conforme· dad('s em docu~ mentos das atas camarál'ias. chegou a figurar eomo terceiro produto de "exportação? E quantos conh('c:m a planta do mate neste chão piracicabano!? Apena.. . nos delici;,tmos com o chá bem ·casado com as res~ peçtivas torradas. Sei, agora, que a salsaparilha tinha princípios curativos COntra a sífilis. Ainda em 1803, o Capitão·Gene",,1 de .São Paulo solicitava ao Capi­ tão-Comandante ele Piracicaba que lhe remcte5sC amostra~ da dita planta, informado que estava de sua abundância por êste, page,. Continuando a nalTativa~ o escritor, em rlllfl5 Ih.has aponta-nos as autoridades do momento: «o Ilustríssimo e ExcelentÍssrmo D. Luís Antôn;o de Souza Botelho e Mourao, Governador e Capitão­ Gene",,1 da Capitania de São Paulo, no tempo em quo a mui respeitável Coroa. de Portugal cing-ia a Au~ I(llSta Cabeça do Grande Rei, o Senhor D. José () Primeiro, que Deus Haja...


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ELUCUBRAÇOES SOBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO

Uma tirada laudatória e respeitosa como con­ vinha a sÍlbdito fiel 'l dcvotado que sempre foi. Estas duas autoridad,ils determinaram direta­ mente a fundação oficial de Piracicaba, começando por designar, por provisão de Z4 de julho de 1766, o encarregado da direção e povoamento: Antôni" Coerca Barbosa, natural de rtu. Tomou êste as providências necessárias para tal fim e, quase um ano exato depois, «em o dia 1.0 de mês de Agôsto, do ano de 1767, fundou a Povoação, com administl'ados, vadios, dispersos e vagabundos, que mandou congregar aquêle Excelentíssimo Gover­ nador; e na margem do referido rio, da parte dalém, edificou a sua habitação e dos seus subordinados». &te parágrafo merece um desdobramento n~ explicação: 1.0) Entre a designação do Correa Barbosa pa­ ra diretor e povoador, e o dia da fundação oficial de­ correu ano, gasto.; certamente, na preparação dn viagem, que exigiu transporte por canoas, dos admi. nistrados e gentt! de Araritaguaba, interessada ent passar-se para a nova povoação. Tanto é verdade, que, uma Portaria do Governador, de 3 de julh<> dêsse ano dispõe sÔbre a entrega de uma canoa ve­ lha para ser consertada, com o fito de atender àque­ la necessidade. Evidentemente várias viagens foram exigidas para a mudança, não s6 para o transporte

um

das pessoas,

COmo

também dos utensílios indispensá"

veis a montagem das futuras moradias; 2,0) O material humano posto à disposição do fundador não se recomenda de, forma alguma. T,.ê" apodos desmoralizantes os classificam: vadios, clis­ persas e vagabundos. Dose de elefant<;, cOmO se cos­ tuma dizer. Em outro trabalho de minha lavra tentoi ame­ nizar os têrmos acachapantes com que brindaram os rosticos colaboradores de nossa fundação. Esfôrço inútil, porque, em pesquisas posteriores, encontrei -ê.. ses mesmos degradantes atributos, acrescidos de outros não menos pejorativos, como sejam: «Ínfima plebe, mulatos, índios, bastardos inúteis, de má con"' dut~ escravos» etc. Devemos concordar que, naquelas círcunstãn" das, só indivíduos dessa 1aia poderiam ter sido arre· banhados 11 fôrça para ficarem sujeitos às ordens de um administrador, com poderes quase ab')olutos! num fundão de sertão bravio. Um consôl0 ainda res· ta. t.sses adjetivos pejorativos só se referiam aos a:\~ salariados, pois os que para cá vieram de livre von­ tade já eram de nível social algo melhor, E' o qno ,~ . depreende do parágrafo seguinte, quando o Capilãn­ Mór escreve: «alguns indivíduos de melhor condi­ ção cOncorreram para êste, lugar». E vejam os senhores que, apesar de tudo, essa ínfima plebe teve a missão privilegiada e única de

lançar os alicerces da futura Noiva da Colina, uma Senhora Cidade, de cultura e tradições modelares, orgulho do Brasil e enlêvo nosso. Ninguém já desconhece a dupla localização que a cidade teve em seus primórdios: no lado direito do rio) no aconchego da Curva do mesmo, e na parte daquém, atual situação mais projetada. Entro agora num assunto, fonte de polêmica'). A acirradas entre pesquisadores de nossas origens CASA DO POVOADOR, a primeiro e longo parágrafo do manuscrito assim termína: «na margem do referido rio f da pai'te dalém, edificou a sua habitação e dos seus subordi. nados» . Nenhuma dúvida quanto à primeira morada do Povoador na margem direita. Localizar o ponto exa· to é que são elas. Sondagens n") solo, pouco njuda­ riam penso eu. a material usado naquela época era todo lHe de pouca duração e OS du~entos anos redu­ ziram tudo a pó. PodeJ'~se~ia tentar, contudo~ na es­ perança de se encontrarem algumas peças d~ trem de cozinha, tais como panelas de ferro; cacos de lou­ ças, objetos de cerâmica e de adôl'no. Quem sabe? Vários situam o local da primeira povoação no pasto da Baronesa. Para mim é muito vaga a indi­ cação, bastando ver que o pasto não é um quartei­ rão ou pequena quadra, e continuo convencido, en­ quanto não houver prova em contrário1 de que O lu-­ gar ficava bem pr6ximo à margem do rio. Como subsídio lembro aqui uma reclamação do 1.0 pároco da freguesia, pondo em dcstaqne a ameaça elas águas contra as paredes da matriz. Não seriam as águas das famosas enchentes? Deixo a dllvida no ar .. , Mas retornemos ao que interessa ~ A Casa do Povoador, O falado prédio em ruinas, levantado à mal'gem esquerda do rio, entre as ruas Prudente de Morais e São José, foi casa do Povoador ou não? E! a polê .. mica armada entre os disputantes do assunto. Até onde me foi dado chegar, pesquisando, con­ frontando e deduzindo, concluí! para meu exclusivo e momentâneo uso: o seguinte) podendo mudar de pensar, caso surjam documentos irl'efutáveis: Ei~lo: Quando da mudança do povoado, o terreno existente entre o Rio Piracicaba e o Itapeva, ]1mita~ do ao sul por uma linha imaginária, passando apro~ ximadamente pela atuai rua D. Pedro I, pertrnda ao Cop. Barbosa que o adquirira de herdeiros de Fe­ lipe Cardoso, com o fito primordial de torná-lo ter, reno destinado ao rossio da freguesia, O terreno foi dividido em datas (lotes) que o Capitão-Povoador ia vendendo a seu bel-prazer, inclu~ive revendendo terrenos já cedidos, cansando não po;:quenos trans­ tornos. j


ELUCUBRAÇOES SOBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO Isso contribuiu grandemente na demora da transladação para a nova localidade. Acresce tam­ bém que) nessas alturas, forte corrente de oposição ao Barbosa já vingava entre os moradores, tanto qut:: perdeu parle de sua autoridade por determinaçà" superior. Com tôda a certeza o fato desgostou-o grandemente, tudo levando a crer que por isso evi­ tou fazer sua nov'a morada, na margem esquerda do rio, nO agl0111erado central do povoado. Daí concluir eu, ter êle preferido ficar lá embaixo, à margem da torrente, em terreno que era seu, longê dos detrato­

res. Pode ler acontecido que não tenha chegado ~ habitá-la, por ter-se afastado do município, difícil, porém; negar-se peremptoriamente, que não lhe te~ nha pfrtencido. Não se apoialia nisso a tradição de ser a Casa do Povoador? Entendidos em arquitetura e estilos de outrora comprovam a contemporaneidade da construção. Na comemoração do bicentenário da fundaçãn da cidade, com a colaboração estup,nda do pres­ tante cidadão e projetista, Menotti Lucehesi1. montei uma maquete da cidade, relativa ao decênio de 1820 a 1830, detalhando até os prédios existentes da época. Alguém estl'anhou a ausência da Casa do Po· voador no seu devido lugar. Isso era prova cabal de que o prédio em referência fôra construido m!li'tO tempo depois, quando o Capitão-Povoador não mais era dêste mu ndo. Mas vamos por partt"s que o assunto merece es­ clarecimentos mais amp]os. Realmente na maquete a Casa do Povoador nãú aparece, quando. por 'êsse temp'1, se de fato tivesse pertencido ao Povoador, deveria existir. Cemo ex­ plicar a ausência dela? E' o que vou tentar. Para executar a maquete, servimo-nos, Cu e () ami.1:{O Lucchesi, de uma planta da vila da C{)nsti~ tuição, executada com toda a probabUiclade entre 1822 e 1830. O trabalho foi feito a mão liv<', sem se importar com o traçado ~jmétrico e proporcional das ruas e praças. Nele aparecem, <!esenhadas a olho, dnco ruas e cinco travessas que terminam vagamen­ te nos terrenos circundantes. Das ruas que decocem para o rio, só uma chega até êle: a atual Morais B'lr· ros. As demais morrem na encosta. Os prédios, tos· camente desenhados, estão distribuidos regulann~n­ te à margem das ruas traçadas. Quando são v:ven· das longe do aglomerado central, elas parecem ati­ radas a esmo. Para que resultasse uma maquete bastante apro­ ximada da rea1idade, executamo-la em curvas de ní­ vel reais, lançando nela as ruas e praças na rigide7 do traçado geométrico., Foi fácil" localização das c",as erguidas à beira das ruas e travessas, Nas' demais, espalhadas pela,

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redondezas, guiou-nos o conhecimento histórico do:., fatos comprovados. Quando chegou a vez de se localizar O casaria localizado à beira do rio, tivemos dificuldade na identificação de uma casa isolada: na margem es­ querda, porque as ruas que descem para o rio mOr~ rem no melo da encosta, dificultando isso o nosso trabalho. Não querendo forçar o caso, ficou decididc aguardarnlos informações seguras a respeito do as­ sunto, visto que o mesmo se acha sob o fogo cruza­ do de moa polêmica. Essa a razão da inexistência da Casa do Povoa~ dor na maquete em referência. Nem se conclua daí que ponho em dúvida a sua posse. Os comprovan­ tes tira-teima ainda não apareceram. Até lá dibertas cogitandi» . ~{as vamos em frente no exime do relato his­ t6rico. Em fins de 1771; O Diretor-Povoador ganhou" título de Capitão, passando assim a Capitão-POvoa­ dor. A honraria lhe veio por seu trabalho na aber­ tura do Picadão de Mato Grosso, conforme êle mes­ mo informara ao Capitão-General da Capitania. No entanto, o comunicado era mentiroso, como se lê na correspondência do Capitão-Mór de Itu, em 8 de abril de 1785, nos têrmos seguintes: «... escreveu­ lhe dizendo que estava próximo do Rio Grande, cuja notícia supondo do dito Sr. verdadeira, em poUCO.i dias conheceu o engano que lhe havia feito ... ». Lamenta a seguir o historiador a distância dt! 14 léguas que os habitantes de Piracicaba tinham "­ percorrer até ltu para o cumprimento dos deveres básicos da religião. Informado da situação, o Bispo Diocesano. Dr. Frei Manoel da Ressurreição autorizou a ereção d'! matriz na lQcalidade, passando ela, «ipso facto» à cat~go ..ia de Freguesia, primeiro degrau na escala da organização administrativa de então, corresponden. do ao nosso distrito. Santo Antônio aparece como o Padroeiro, sendo o primeiro pároco o Reverendo Padre João MaMei da Silva, que dirigiu a paróquia pelo espaço de dois anos. Como autoridade paroquial foi o .primeiro. não pore-m, como padre no povoado t p:lis ant-fs dele, já estivera por estas bandas, o Padre Angelo Pae.< de Almeida, aquêle que recebera a incumbência de construir a matriz do outro lado do rio, tendo como orogo, Nossa Senhora dos Prazeres. Mais outra controvérsia surge aqui com rela­ ção aos doi. Padroeiros que a incipiente povoação possuiu: Nossa Senhora dos Prazeres e Santo An­ tônio. A ordem dada ao Padre Angelo pelo Capitão­ General da -eapitania de São Paulo, D. Luís Anto· nio de Souza Botelho e Mourão, foi taxativa: «A in­


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ELUCUBRAÇÕES SOBRE UMA CERTIDÃO DE .NASCIMENTO

vocação há de ser de Nossa Senhora dos Prazeres, minha Madrinha e a Padroeira de minha casa, e a­ sua imagem há de ser colocada no altar·mór». Ordem clara, sem subterfúgios. Todavia, quan~ do da elevação de piracicaba à Freguesia, aponta como Padroeiro dela Santo Antônio de Pádua. Aqui, mais uma coisa a se estranharJ pois, sendo súbdito$ de Portugal, necessàriamente deveria ser Santo An­ tônio de Lisboa. Ou naquela época ainda não dispu­ tavam Jusos e itálicos a preferência do Santo mibM greiro?

Essa mudança de padroeiros originou a lenda do sumiço da imagem de Nossa Senhora, levada, rio abaixo, pelos anjos do céu. Vamos tentar uma ex,. plicação ao fato. E' bom saber que a igreja da nova povoação do lado de cá do rio se resumia a um barracão, e isso por longo tempo. A causa foi motivada pela dispu~ ta da posse das áreas centrais da cidade, ap:::sar do solene delineamento feito com a presença do Capi­ tão-Mór de Itu, quando da cerimônia oficial da mu­ dança. . Enquanto a matriz do lado direito do rio ser­ viu para os ofícios religiosos~ evidentemente ningllénl se atreveu a desbancar Nossa Senhora dos Prazeres do altar·mór. Enquanto isso, concomitantemente, no tosco galpão que servia de nova matriz imperava oficialmente a imagem de Santo Antonio. Naturalmente essa dupJicidade não ag·radària ao Capitão.Povoador, o que o levou a uma solução vio. lenta, dando sumiço à imagem da Virgem. Capaz para proeza êle era, pois outras medidas al'bitrária:i já tomara. Não havendo ninguém bastante COra­ joso para impedir o ato, engendrou a engenhosa len.. da do Tapto para diminuir o impacto atrevid"J, Acompanhando-se a narração, fica-se informa­ do de que a !'aída do primeiro pároco foi motivada pela impossibilidade dos pobres habitantes poderem sustentar o seu pastor. Seria somente essa a causa? Ponho as minhas dúvidas. A essa altura, os atos vio~ lentos do Povoador já tinham excedido o tolerável. Basta ver que o piedoso Frei Tomé de Jesus, O se· gundo pároco, apesar de sua paciência, viu~se for­ çado a desistir do pastoreio por duas vezes. Contudo~ no escôrço hhtór1co do Capitã'JIMór, que se destinava à posteridade, o autor escondeu ge­ nerosamente as maselas e d.:.s.avenças dos prim::ir~"; moradores e responsáveis. Além disso, quando o ~~~ creveu, julgava ter êle desarmado Os ânimos. Mais tarde, porém, infonnando seus superiores hierárqui .. cos, pôs a nu o carMcr do .Capitão-Povoador, lJ'.ando uma comparação literária notável. E assim escrcvrll em 1785: «... Enfim: mca Exroo Sr., para fazer eu uma clara e distinta difinição do caráter do dito Capitão,

figuro na respeitável presençE. de V. Exa. um índio de qualquer aldeia, porém, branco de origem, muito forte, duro, animoso, agrad1.vel, ágil para a caça e pescaria, totalmente desgovernado e inútil para si e para os seusJ sem regra, sem palavra, e inábil para qualquer instrução e reforma, êste é o Capitão An... tônio Correa Barbosa». Cá'_pitd Que dissecação à f C11'0 frio ... Por êsses malentendidos sofreu o povo que ficou mais sete anos sem assistência religiosa. Quando Frei Tomé de Jesus aceitou a incumbêneia, já se estava no ano de 1784", 7 de abl'iI~ anotando o historiador que a população era de 203 p~'ssoas de c~llnssão. Ateutc~se pa.ra o têlmo confissão - d, sig-­ nativo dos 1mbítantes adultos, Se triplicado o Il{une­ 1"0 para se incluirem as crianças, tcrcmcs 609 [>\!sw soas. Como o total do I'ccenseanL'nto de 1775 (ra de 23 t pessoas, verifica-se que a p,-~pulação quase triplicou em nove anos. J~ntllsiasmados com o aumento populnci--:nai 1 os pritH::pais da nldeia remeteram uma I':':plescnt.<ição ao «Ilustríssimo c Excelcatíssimo Francisco da Cunha lvlenezcs, Governado! e Capitão-General da. Capitania, em tempo do f':.'Hz Reinado da muito Excelsa, Augusta e Soberana Rainha e S':nhora, D. ~1aria a" Primeira, que De·"\~ Guanle», solicitando ·autorização para «transplantar-se a p ..lVoação para a parte daquém do dito Rio 1 lego aba 'x..) do salto, sítio alegre, alto, plano e não distante das águas». Razão principal invocada para a mudança: «terreno êm que estava sitUada a ~ua Matriz não era suficiente para a sua extensa Povoação». Confir­ mam O.s vocábulos finais ser numerOsa a p:'pulação. Segunda razão: confirma a localização muito próxima ao rio, cujas enchentes ameaçavam, volta e meia, as: paredes da matriz, conforme noticiava o Padre João Manoel da Silva. São outras as autoridades citadas a rsta altura do memorial hi~tórico. Já se tinham id:) o Governa­ dor Botelho Mourão e D. José L Mandava então uma l'ainha, que ITh'lis tarde, parece-me, endoidou. O texto continua, relatando que a autoridade competente, diante do pedido feito p:'ln~ morador(,$ da Freguesia de Piracicaba? «pesou em a balança de scu perspicaz entendimeuto» a prop~)sta dn mudan­ ça) e, 1ouvado nas informações obtidas: achou (l!al­ tamente conveniente: não s6 para os habitantes, ma., também por ser" o (,nica transgresso (caminho) de prf><;cnw aherto rara a vasta camp;:mha de Arara­ quara. aonde muitas fa7cndas se podem estab"l=ccr». Percebe-se claramente que o Poder Pública aC2~ deu ao pedido por dele drcorrer mais uma vanta­ gem: continuidade na abertura da es.trada de 11ato Grosso, conforme promessa não cumprida pelo Ca.­ pitão-Povoador.


ELucunRAçÕE3 SOBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMU.'TO

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Foi dada ampla liberdade para a escolha do lo­ caI, no lado esquerdo do rio} ,em todQ o terreno de­ limitado por uma linha partindo do salto até a bar­ ra do COl·umbataí. No texto está escrito Corimba­ taí e é classificado como ribeirão. Não se apoquente com isso Q nosso sossegadp afluente, pois, nas atas da Câmara ~lunícipal e em outros documentos an­ tigos, deparam-se as mais variadas designações para os .mananciais da reglão~ Ora o Piracicaba é sím.. plesmen\e o Rio (COlO erre lnaiúsculo) ora é o Rio Grande, para contraste com os demais. O Corum­ balaí passa de rio para ribeirão e vice-versa. Mais variações sofreu o Itapcva que passou por todos os escalões: rio, riacho, ribeirão, ribeiro, ribeirinho e cónego. Atingimos finalmente o últ\nl<> parágrafo da primeira parle da Memória. Nesta, infonna o Capi­ tão-Mór de Itu que viera a Piracicaba, para pr<?sidir à mudança do povoado, no dia 22 de julho do refe­ rido ano (1784), trazendo em sua companhia o Ca­ pitão-MóI' João Femandes da Costa e Miguel Fran­ cisco Paes Soares, o Mestre Entalhador e Arruador. Estes senhores, juntamente com o Correa Bar~ 1losa, Frei Tomé de Jesus e o Povo, foram escolher o local adequado para a mudança. Como estava cober­ to de matos «alimpou~se e preparou~se de mão co· mum» para o delinramento da futura sede da fre­ guesia. Estava-se no dia 30 de julho de 1784. Notaram os ouvintes a cÀ"'Pressão «:de mão co­ mum», Nada mais nada menos que o moderno mu .. tirão tão falado, com a vantagem de ser gratúito. O primeiro têrmo da Memória traz Os nome::; de 27 pessoas, mas ap=nas 18 a$Sinaram de próprio punho, Os demais, de Cnt7_ Procurei descobrir qu::m teria assinado pelos .naUabotos. Sem ter chegado a uma conclusão definitiva; propendo-me mais plra Frei Tomé de Jesus. Intert'ssante é cbservar que as duas autoridades m:-lximas presentes, a religiosa e a civil, lançaram suas assinaturas na me-ma ahura, resp:!itada a pre· cedê'ncia do representante de Deus. Uma bela op~r­ t"nidad~ para um grafólogo ~plicar a sua ciôncia no exame des.~as assinaturas. Pelo pouco que ent~ndo, reveJa a aSFinatura dI! Frei Tomé de Jesus, pessoa um tanto tímida, disposta a evitar c:mp:icaçô2s. A do Capitão-Mór de Itu já foi comentada no início dêste trabalho. Homem decidido, com intermitên­ cias de·fraqueza, revela a do Capitão-Povoador. Que delicado artista descobre-se na assinatura do Mestre Entalhador e Arruador! As Jemais, ressalvadas duas ou três, sugerem indivíduos de pouca sabença. A segunda ata do livro subd'vido-se em duas partes: na primeira transcreve-se a ordem oficia1 pa~ ra a mudança da povoação, tendo a data de sete de julho de 1784, endereçada ao Capitão-Mór ituano

5.1

pelo Governador da Província, que era, então, Fran­ cisco Cunha Menezes. Nela resume-se a razã0 dos moradores para ã sua mudança: o terreno é espedal para a cultura, resultando disso melhoramento nos seus interesses particulares, e aumento do bem público da Povoa­ ção. O oficio [mda COm a determinação de que se façam os tErmos é assentos para COnstar. Data: 7 de julho de 1784. Assim, já são três os motivos para a mudança: a cultura da terra, aumento do bem público e cres­ cimento da população. Vou citar integralmente a segunda parte da se­ gunda ata que tem por titulo, .Delineamento da No­ va Povoação de Piracicaba». «:No dia sábado,. trinta e um do referido mês e ano, congl'!lgru"am-se, em a Igreja Matriz, o dito Ca­ pltão-Mór e o Capitão-Povoador, Oficiais, o Mestre Entalhador e Arruador e Povo, e depois de assisti­ rem ao Santo Sacrifício da Missa, e implorarem a graça do Espírito Santo, por intercessão da Sobera­ na Imperatriz do Céu e da Terra, a sempre Virgem Maria, Nossa Senhora, e receberem a bênção do Santo Padroeiro desta Povoação, foram, cOm o Re­ verendo Pároco, ao lugar destinado para a sua mu­ dança e estabelecimento; e sendo aí, delineou o dito Mestre Entalhador e Arruador, a beneplácito de to­ dos, um páteo com quarenta e seis braças em qua­ dra, se~indo de N9rte a Sul e de Leste a Ooste, pa­ ra edificarem-se a Igreja Matriz em qualquer par­ te dele que o Exmo. Bispo Diocesano ou sru Dele­ gado fosse servido consignar; e delineou mais aos la­ dos do referido páteo duas ruas direitos, de Sul ao NOite, e duas Travessas, de Oeste a Leste, cOm cin­ co braças de latitude e cinquenta de longitllde, plano suficiente para edificarem suas moradas não só os atuais habitantes~ mas ainda muitos vindouros, ter­ minando da parte Sul terra dentro, e do Norte, o Ri· beirinho denominado Itapeva, e da parte do Oeste, o Rio Piracicaba, e do Leste o mesmo ribeirinho; de que para mem6ria à posteridade fez o dito Capitão­ Mór l'ste têrmo, que assinou com o Reverendo P:í­ roco, Capitão-Povoador, Oficiais, Mestre Entalha­ dor e Arruador e Povo, aOs dois dias do mês de agõsto do mesmo ano:o. Se~uem-se 24 a ..inatur.., três a menos do que a primeira ata. Pela leitura, percebe-se 2. importlncia do doeu­ .mento, dondz várias condusõt"s resultam, que seavem aO menos para meu uso exclusivo. Entremos em análise mais minuciosa. Cada vocábulo parece ter sido escolhido a ·par­ tir do pr6prio título. A primeira palavra - Delineamento - dá a idéia básica de todo o arrazoado. São seus sinôni­


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ELUCUBRAÇõES SÕBRE UMA CERTIDÁO DE NASCIMENTO

mos: esbaço, projeto, demarcação, planta, plano, planejamento e outros. Ai está. A geração atual pensa. que descobriu a pólvol'a COm essa mania de planejamento para tudo, até para o amor. Nossos ancestrais piracicabanos deram-nos uma lição: planejaram uma cidade, e com que acêrto! A segunda palav.ra, o adjeti'vo - nova não deixa dúvidas sôbre a existêhcia de Outra povoação mais antiga com o nlesma nome, à qual esta sucedia. " Povoação - terceiro vocábulo usado, dá a idéh:. de recuo na escalada administrativa, já que chegara à Freguesia. Em verdade, Piracicaba já voltara l. .ser Freguesia em 7 de abril dêsse ano, não se a jus .. tando a ela; portanto, a desiF,nação de - POvoação. O escritor chamou-a aqui de - Povoação - no sen­ tido genérico de aglomeraçãc populacionaL Não iria cair êle nessa falha, perito que era em terminologia admínistrativa. Piracicaba - o 4.0 têm.o, para deixar bem ex~ plícito tratar..se do mesmo n{lcleo de habitantes que viviam nas cercanias do salto do rjo homônimo. A ata se inicia nos moldes clássicos, informando ser dia 31 de julho do' mesmo ano, cOm um porme­ nor precioso de que se estava num sábado. A data comprova que, entre a vinda do Capitão-Mór de rtu a Piracicaba, no dia 22 de julho, até o dia 31, houve um espaço de tempo bastante longo, que fói apl'O­ veitado pelas .autorida.des e povo para a esc/llha e limpeza do local! destinado ao páteo da matriz e ruas contornantes. A limpeza exigiu essa demora, pois a mata ali deveria ser densa. e agigantada, onde as onças pinta­ das se alapavam nas tocáias intrincadas dos' cipós, enquanto os macacos faziam estrepolias no alto dos jequitibás umbelados. E isso não é floreio literário, não. Há um mapa antigo da região, no qu~i se vê uma onça desenhada no local em referência. Se t) cartógrafo a isso chegou, é porque aí o machão era rei. Sendo o ato de demarcação transcendente acón~ tedmento, a participação ao mesmo foÍ maciça: Ca~ pitães-Mores, Oliciais subalternos, Povo e Pároco. Poderes, reHgioso, civil e judiciário que, antes de mais nada. cuidaram de se por em linha com o Poder Divino, assistindo o mais elevado ato religiosô da re.. ligião oficial - a Missa. Como intermediários dan­ te de Deus, nvocaram O Espírito Santo, Nossa Senha.. Ta e o Padroeiro Santo Antônio. Um trio de rc!;pcitc que não falhou no seu ofício. Causa admiração o respeito com que o e!'critor tratou Maria, Mãe de Jesus, chamando-a de Sobe­ rana) Impetratriz, Virgem e Senhora. Tendo a religião direito de precedencia sobre o .. demais atos humanos, cuidaram de assinalar, primci­

rarnt'nte, o local da igreja matriz 1 depois a dos mO­ radores. E não foram tacanhos na reserva de terreno para a Casa de Deus, como que adivinhando o fu­ turo grandioso da cidade. Mosquinhos foram os pós. teros na diminuição da área reservada à Igreja. A que pretexto bem esclarecido não ficou até ag01'a. Patente ficou, sim, a qúehra de simetria perfeita do quadrilátero central como fô.ra dada, resultando Q absurdo dos imensos quarteirões localizados entre a rua Boa Morte e a Governador Pedro de Toledo com a supressão de uma rua, interrupção da Boa Morte, com o nascimento canhestro da rua Santo Antônio. A catedral está localizada num retângulo de ter­ reno que corresponde à metade do quarteirão traça­ do no projelo. A outra m~tade foi invadida pola., construções onde atua1mente se levantam o prédio do Hotel Central e os demais com êle alinhados. Essa mutilação foi oficiali7.ada pela Câmara de POI'!O Feliz, a quem Piracicaba estava pareia!mcn~ submetida, baseada em estudo fcito pelo Son.dor VerguC'Íl'o. O Alf~rcs José Caetano Rosa foi o o."e­ cutor dessas alterações. Não entendi até agora porque tantas loas a (;ste último como idealizador e executor do arruamento de Piracicaba, se, na realidade, o atual arruam:nto diverge do plano inicial, id~alízado p~lo Arruador Miguel Francisco Paes Soales, apenas na SUpt'l·Ss.,;O infeliz da rua que existia entre a Boa Morte c a Go­ vernador Pedro de Toledo e a imperdoável diminui· ção da Praça da Catedral. Tudo o mais sogue o traçado primitivo do ituano. E houve relutância na aceitação dessa altera­ ção, desde aquê!es tempos, pois, apesar de O estudo do Senador Vergueiro ser de 1808, a planta da cida­ de, levantada por volta de 1822:, quando Piracicaba. acaba de ser elevada a vila, com o nome de Vila No­ va da Constituição, apresenta-se de ac8rdo cem () projeto pioneiro. E agora José, como explicar essa discordância? Com uma pitada de sal irônico, é bom saber-se que o prédio onde se localiza o Hotel Central pertenceu .os Vergueiros, O prestígio deles não teda forçado a invasão? «Chi lo sá ... » Alguém poderia objet.r que a planta em refe­ rência seria anterior ao ano de 1822. Coisa impos­ sível essa} a não ser que se admita no autor do de.. senho~ virtudes de futurólogo, uma vez que, na mes·· ma, aparecem objetos símbolos representativas de vila, como sejam: o pelourinho e o emblema do al­ caide. autoridade máxima administrativa daquela época. Continuemos com o exame da narrativa. Foi dada lima direção ao traçado das ruas c, conscquentemente, do pátio: Norte-Sul, Leste-O?ste. Ela) porém, não condiz com a verdade, pois os j

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ELUCUlIRAÇÕES SOBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO pontos cardeais verdadeiros alinham~se nOs ângulos .dos quarteirões, na diagonal exata. Duas explicações podem ser dadas, no meu en­ tender: umal em que o autor do rela to citou Os pon~ tos cardeais a «grosso modo». não se atendo à exati~ dão minuciosa. A outra, que também tem grande probabilidade, originou-se na observação falha da ClI[1.'a do caminho do sol nessa quadra do ano. Por ser tempo do inverno} o sol tem seu zênite' bem bai­ xo sôbre o polo norte_ Se búxarmos uma perpendi­ .cuIa r dêsse ponto máximo até o horizonte, veremo~ que seu centro caí justamente na direção atual da.., ruas. «Se non é vero é ben.; trova to». O encerramento da ata leva a data do dia doi, de agôsto, sugerindo isso que o Capitão-Mór levou dois dtas para lavrar o memorial, porquanto não erd lá muito fácil escrever~se com pena de ganso. Tl'ê~ cidadãos assinant~s do -primeiro têrmo, não o fize· ram no segundo. Vai~se ver que moravam distante . . do PQvoado, ou preferiram apanhar dourados ali no rio à mão.

III ASPECTO ESTILO LITERÁRIO Passemos agora ao aspedo literário do trabalho histórico. Pessoas afeitas a compulsar manuscritos antigo'i OH impressos dc tempos idos, não estranham a aig-a· ra\"ia ol'tognHica, indecisa t: inconsistente com que êlcs fOl'am escritos. Cada escritor tem sua próprja ortogt'afia, sua accntuação1 sua maneira de pontuar. QUl>m escreve o s inícial, representado por um F, quem só usa z para todos os efeitos. 1!.ste s!'rve-se do I il paro tôda e qualquer nasalização das vogais, aquêlc recorre sempre ao n. Um COrta o t em cima, outro sempre embaixo. Vírgulas em abundância aqui, sumiço total dclas acolá Há os que sio claro." can"ntivamente na exposição do pensamento, outrOs existem que só um tradutor de grego é cap3.7. de de· ·cifl'á~los:

Só cu Scl O trabalho insano que tive na leitura pHolicação de dez volumcs de nossas atas camará­ rias~ que o Diário de Piracicaba gC'ntllment~ pubH­ 'C(lH. Que cipoal intrincado. A pobreza do vocabulário é frequente na maio· ria di'>s:;.es documentos, e a repetição das palavras e fr;.lsl.·~ c!\lcl'iotipadas tornam cansativa a sua leitura. Di~!'o tudo livrou-nos o bravo e competente Vi­ cente da Costa Tacques Goes e Aranha. D?sconheço pormenores de sua biografia, mas tenho absoluta cer­ teza que a in~trHção dêssc homem revela estudos d~ um diplomado em universidade) ou de um seminaris­ ta no..'i t,ltimos graus de sua ~1.rreira1 traquejado na kilura dos c!.:issicos gregos e latinos. C

E' dono de um estilo redacional elogiável J mes· dando frases longas e breves que evitam o cansaço da leitura. Palavras em seu sentido exato com raros: adjetivos inúteis. Torneio no fraseado, ora começan­ do com o sujeito da oração, ora cOm o predicado, ora com os complementos esseneiais. Perfeita con­ cordância do sujeito com o predicado, e modelar exemplo de regências verbais e proposicionais. ~o que tange à ortografia, é de entusiasmar a consiâneia no escrever os vocábulos da mesma for­ ma, coisa de que eram incapJ:zes quase todos seus conterrâneos. Já perlustrei não poucos livros manus­ critos de priscas eras, mas nenhum com uma ortogra­ fia tão avançada e convicta como a do nO~so herói. Exemplíficando com uma palavra de uso cOns­ tante, encontradíça em cada ata lançada pelos se­ Clctários das Câmaras Municipais: a palavra - ses­ são, sinônimo de reunião. Ela aparece escrita desde a maneira atuaL cOm um s apenas, no início e no fim; com dois cc no meio; com três ecc, no começ.D e no meio; cOm um c no princípio, com a sílaba anasalada pelo D, pclo til, ou por um simples til sôbre (') a final. Um alelúia or­ tográfico, E há mais. O nosso falado homem já apresenta lima ortografia grandemente simplificada e bastante de acôrdo com a origem et:mo16gica das palavras, nos estritos di tames da ortografía ora em uso. Quem dos presentes não recorda os adjetivos pútrios, finalizando em z? Púrtugucz, francez etc.; o número trez com z, e assim por diante. Pois o seu Vicente grafoH~os com s inclusivc ú' nome próprio Luis~ que muitos ainda agorâ relutam em terminá­ lo com z. Na acentuação gráfica} problema complexo mes­ lflO em nossos dias, apresenta uma novidade, jamais vista por mim outros manuscritos antigos. Em geral, nos tcxtos de: outrora, ao menos nOs livros ex!stentes:. em nossa Câmara Municipal, o U'iO da acentuação era muito restrito. Alguns secretários conheciam apc:~ !las o til. O Capitão·Mór ituano ao C'nvez1 nessa particu· laridadc é todo êle original, atraindo a atenção ime­ diata do leitor: Usa dois sinais apenas: a crasct igual ao acento agudo nosso e o acento circunflexo. Mas êstc (11tim01 o chapeu7.inho das palavras~ usa-o indi:i­ tintamentc, abundantemente. tanto para indicar sua finalidade própria, como para sinal agudo, gI'ave e o curvilíneo tiL ~1ais. Todos os vocábulos oxít(Jnos pertenccntcs à ca­ tegoria dos variáveis, substantivos 1 adjetivos, prono­ mes, verbos e numerais apresentam~se com o infalí­ vel chapeuzinho. Assim vemos no primeiro par:í.gra­ fo~ têm, lugar, Jaguary, Tietê. mcnôr, fllndât, Di­ rcclôr, Povoada!': Itl.l; Congregâr, dalêm~ j


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ELUCUBRAÇÕES SóBRE UMA CERTIDÃO DE NASCIMENTO

Torno a frisar: trata--sc dos vocábulos oxítonos, sejam êles monossílabos, disdlabos Ou p:Jlissílabos. Não topei exceção nenhuma, Quanto aos parO){íto. nos ou proparoxítonas, nenhum sinal gráfico apre­ sentam. E agora aqui está o que de mais interessante encontrei na ortografia singular do histol"Íógrafo: Ao longo dó todo o texto, há um nome próprio, paroxítono na pronúncia, que Se apresent!! indefecti­ velmente grafado com um acento circunflexo na quarta sílaba, começando-se de trás para diante, de tal forma que, se aquêle sinal indicasse acentuação tônica, teriamos uma pronúncia quase impossívd, que é' completamente estranha à índole da língua lu­ sitana.

Trata-se do topônimo querido para todos nós­ PIRACICABA - E' ;SS,O mesmo - PIRACICABA - que, a crer-se como acCnt(. tônico seria - PIRÁ­ CICABA. Nas oito vezes que o nome aparece na cel'tidã'J 'de nascimento,. nas oito vêzes a sílaba ra apresenta 'O comentado chapeuzinho, o acento circunfl:xo, de que o autor usa e abusa.

Qual o motivo? Por ser nome próprio? Não. porque há outros no relato que poderiam merecer o Jllesmo sinal, como por exemplo - Araraquara. Seria para destacar a sílaba ra como para lndi~ cal' composição do vocábulo, assim como Pirá-ci­ cabal E por que outros nomes existentes' na obra nã:> mereceram igual tratamento? Confesso não ter deslindado até agol'. a esqui­ sitisse dessa gráfia. Ai têm os presentes campo para a busca de uma interpretação capaz. Investigando a singularidade tônica, recorri a outros manuscritos or~ginai::. de Vicente da Costa. Não os tendo encontrado voltei-me à transcrição de documentos seus, feita por terceiros. Pois não é que lá aparece infalivelmente o danado do dl*cunfIexo sôbre o têrmo - PIRACICABA? E agora José?

Aplicando uma comparação canhestra ao caso, cito aqui OS versos de Camóes: «Vejam agora os sábios da escritura Que segredos são êsses da natura) ~


,

,

Brasil coração do mundo l

NtUO FERRAZ DE ARRUDA (Do I. H. G. P.\

INTRODUÇÃO No início tudo parecia 1enda. Diziam haver um território fantástico do outro lado do oceano, onde as árvores se revestiam de esmeraldas o anO inteiro e o ouro governava os rios, em cujas águas de cris­ tal as estrelas do céu refletiam seus ciúmes. A natu­ l'C'/.a tooa dêsse paraíso era de um encanto misterio­ so na imaginação dos homem'! afeitos às atrações do mal',

Ficção para uns, realidade para outros mais im­

pressIonáveis, gente havia, bem formada, que pOS"

S1..1.i~l conhecimentos sôbre as terras existentes 'além das grandes águas, onde, como na India, viviam po. vos rudes Ou selvagens, sem o exagêro das preciosa:, pedras Ou do metal imperante. Na época dos grandes feitos marítimos, os ha­ bitantes da Península ibérica já desfrutavam de co­ nhecimentos sôbre a Europa e as terras do ocidente da Asia e do norte da Afriea. Sôbre a China, Ir,do­ china e regiões vizinhas. tinham mais circunstancia· das notações que as oferecidas pelo célebre viajante

Marco Paio quando da sua visita à Mongólia,' à China, à Sumatra e à Pérsia, no século XIII.

NOVO MUNDO Colombo realizara em 1492 uma extraordin;íria façanha deSCObrindo a primeira terra do Nôvo Mun­ do, a ilha de Guanaaní, uma das Lucaias. Navegan­ do para o sul descobriu Cuba e Haiti, a cujo agrupa­ mento dera o nome de Hispaniola. Às terras do con­ tinente chamara América. FBra uma homenagem ao

,

seu parlicular amigo Américo Vespúcio, famoso pi.. loto florentino. Julgando-se lesado com as descobertas de Co­ lombo, Portugal se indispõe com a Espanha .. O Tra­ tado de Torclesilhas, porém, esfria o assunto. Eram, afinal duas potências marítimas. Portugal se ufana­ va. disso: «As armas e 0$ bal"Óes assinalados, Que da ocidental praia lusitana, Por mares nunca de antes navegados, Passaram ainda além da Taprobana ... ». , Sob a euforia proporcionada pelo grande feito de Vaseo da Gama descobrindo o caminho para a India) ligando a Europa ao Oriente através do ocea.. no, D. Manoel, rei de Portugal, pen~a enviar a Ca.. lecut uma nova esquadra a fim de garantir os direi­ tos lusitanos e ultimar algumas negociaçõcs enceta.. das~ Organiza a mais poderosa .armada até então vista, confiando sua direção ao fidalgo de sua Côrte Pedro Alvares Cabral, homem enérgico, sabedor .e muito honrado.

Levantam"se as âncoras das naus. No calendário, está: 9 de março de 1500. Desviando-se da rota adrede preparada, a 22 de abril do mesmO anO Pe­

dro Alvares Cabral avista o Monte Pascoal, ond,

não encontrara abrigo, rumando em seguida para o

norte. No dia 25 a esquadra consegue ancorar nu..

ma enseada a que Pero Vaz Caminha dissera: «pÔr­ to muito bom e muito seguro» (hoje Coroa V'<me­ lha) J onde se rezou a primeira missa. Na verdade não era nem monte, nem ilha COro:> se pensara a princípio. Havia muita terra. Daí, Ter.. ra de Santa Cruz.


BRASIL, CORAÇÃO DO MUNDO

56 Portugal não se impressiona muito com o des~ cobrimento e prefere voltar sua atenção às esp?cia­

ros de outras plagas que chegaram, inclusive, a fun" dar algumas feitoáas nas costas brasileiras.

rias da India. Arrenda a terra dO' pau.brasil a Fer­ nãO' de NO'l'únha e um grupO' de negociantes cO'm· posto também de judeus recém cO'nvertidos. Ora, pa­ pagaios, madeira e micos não representam riqueza alguma ..•

xasse dois acontecimentos marcantes: a ocupação do

O. JO'ãO' ITI sucede, nO' trono, a O. Manoel c Volta suas vistas à Amé~ica portuguesa. Manda para câ Marlim Afonso de SO'uza que parte de Lisboa nO' ,terc<iro dia de dezcl)lbro de 1530, conduz'ndo em sua armada os primeiros colonos para a nova terra. Desce até o Prata. Depois volta para fundar SãO' Vicente a 22 de janeiro de 1532. Entra em c~ntato com João Ramalho que vivia na serra do Mar em ccmpanhia dos índios ~

Segundo alguns linhagistas, os Cubas, O'S Lemes, os Prados, os Velhos, os Garcias e os Rodrigues an­

tigos do Brasil tiveram origem nessa vinda de Mar­ tim Afonso de Souza.

O perigo francês pade' ser afastado, embora dei­ Rio de Janeiro, em 1555, pela colônia protestante de Villegaignon, dando origem à França Antártica, aniquilada pela expedição Mem de Sã, em ·1560, e a tomada do Maranhão, em 1612, pOI' um sindicato fidalgo da Côrte de Luiz XIII, surgindo a França Equinoxial. Jerônimo de Albuquerque, COm sua va­ lo~sa expedição a destruiu. Em 1624 os holandeses tentaram ficar com a Bahia. Nem apreciaram o acarajé. Dom Fradiquc de Toledo não permitiu. Adiante, o p:íncipe Joãe Maurício de Nassau Sicgen desejDU fazer d, Per­ nambuco uma filial de sua pátria. Inteligente, cul­ to, trouxe da Europa muita coisa de valor sabre ar­ te, ciências e letras, além de normas modernas d:.!

administração. Com as batalhas dDs Montes Guara­ rapes findarám-se as atuações dos batavos.

O pais dos papagaios fÔra dividido em nOVe ca­

Dentro das fases de ataques e defesas, contra o

pitanias que, por sinaJ) não tiveram êxito} exceto as

inimigo cobiçoso da época, andaram as Bandeira.;:

de São Vicente e Pernambuco.

.

pelo interior do Brasil.

São Paulo fDi o p:'incipal

centrO de expansão dessa valorosa e destemida gente

Para firmar sua posiçãO' por estas bandas, Por­ tugal manda Tomé de Souza para um teste. Expe­ rimentaria um govêrno geral, único. Acompanhaln Tomé de Souza os Padres Manoel da Nóbrega, Luiz da Grã e Aspilcueta Navarro, além de uma centena de degredados, em 1549. CO'ID a colabDraçãD de Oio­ go Alvares Correa, o Caramuru, outro português que andava bem de vida nestas terras, fundam a ci­ dade de São Salvador da Bahia. Muitas estóri"s são contadas sôbre João Rama­ lho e Diogo Alvares Correa, dando um colorido gos­ toso a certos fatos ocorridos no Brasil quinhentista. Também não esc<J.pou dessas estórias fantásticas o virtUDSD Padre Josê de Anchieta que CDm Manoel da Nóbrega, Manoel de Paiva e os chefes índios Caiubi e Tibiriçá, a 25 de janeirO' de 1554, funda o Colégb São Paulo, .semente dessa monumental metrópole paulisla.

que rasgou o famoso Tratado de Tordesilhas. Pela sua poSlÇac geogrâfica mais próxima da metrópole d'álem mar, e polo seu desenvolvimento através da cana de açúcar, a banda nordestina foi

melhor aquinhoada. na formação dos seus núcleos, recebendo povoodores e capitais especiais, c= boa ajuda oficial. São PaulO' não foi assim servido. A fim de conseguir a mão de Dbra à sua lavoura os pri­ meiros bandeirantes tiveram que procurar os índios, impossibilitados que estavam em adquirir escraVOs, sobrando já no nordeste. E' bom que se frise: a es~ crav.idão foi uma lamentável mancha nas terras ain­

da puras da América. Infelizme-nte o Brasil foi, o maior comprador dêsses infelizes africanos. Os navios negreiros vindos para 0$ nossos p~rtos traziam, vivos, ap:::nas 40~.-& da~

queles 400 ou 500 homens e mulheres marcados a ferro em brasa, aprisionados em Angola, em Moçam"

Se a Espanha respeitou o Tratado de TDrdesi­ lhas o mesmo não se deu com a França. Bem, a

França nãO' tinha obrigação de fazê-lO', poi', não as­ sinara nenhum acÔrdo diplomático nesse sentidO'. Os corsários franceses interessaram sobreman~i­

ra pela terra descoberta pelos lusos. O pau-bra,il se transformou num grande chamariz aos aventurei-

bique, na Guiné ou Costa da Mina. As atrocidades praticadas contra essas criaturas eram hedionda.s.

o poeta Castro Alves teve razão em se revoltar contra o tráfico de escravos que chegou a alcançar. Quem não

conh~ce

o protesto que escreveu vendo a

bandeira brasileira tremulando nos mastros dos na­ vios negreiros? Recordou em versos as gl6rias de


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IlRASIL: CORAÇÃO DO MUl\'DO

Caxias c Osório e lamentou estivesse o mesmo estan­ darte servinlo a fim tão bárbaro!

,

--«Exisle um povo que a bandeira empresta

Pl'Ú cobrir tanta infãm.a e cobardial ...

E deixa-a transformar-se nessa Iesta

Em manto impuro de Bacante fria!

Meu DéUS! Meu DeuS! Mas que bandeira. é esta

Que impudente na gávca tripudia?! ...

Silêncio L .. Musa! chora, chora 'tanto,

Que n pavilhão se lave no teu pranto ...

Aurivel'dc pendão de minha terra,

Que a brisa do Brasil beija e balança,

r·..s;tandarte que a luz do sol encerra,

L as promessas divinas de esperança ...

'fu, que da Liberdaae após a guerra

FÔ5!C hasteado dos: heróis na lança,

Antes te houvessem r8to na batalha#

_Que servires a um povo de mortalha! ... Fatalidade atroz que a mente esmaga!

Extingue nesta hora o brigue imundo

() trilho que Colombo abriu na vaga

Como um íris no pélago profundo L ..

... Mas é infâmia demais ... Da etérea plaga

LevantaFvos, heróis do Nôvo Mundo ...

Andrada! arranca êsse pendão dos aresL ..

Corombo~ fecha a porta ~e teus mares!

Volt{'ffiOS às Bandeiras paulistas. Nem ~;pmpr{' conlaram elas com o beneplácito oficial. Muitas ve~ zes foram até importunadas pelos homens do govêr· no. D~seendo para o sul, os bandeirantes foram tfr priJlICiramente às coJônias dos padr<:s jesuí.:as, onde aprbionaram índios mansos. Nessa ocasião aCOnte~ cerml1 llltas entre paulistas, espanhóis e jesuítas. O Brasil se alargou para b sul. Mais tarde Ra­ poso Tavarc!'õ penetra no Paraguai, sobe os Andes, entro em Nova Granada (hoje Colombía) e alcança o Amazonas chegando a Gurupá em '1651. Não fô­ ra o aparecimento do ouro pelos sertões de Goiás e ~1ato GfOSSO: possivelmente o:; paulistas teriam, na­ quela ocas.ião Se apoderado de tôda a América es­ panhola. ~1nrtim de Sá e Nicolau Barretc-, os iniciu­ dOl"CS dessa grande jOlnada souberam transmitir aos ~éllS SUCCSSOl'es a intrepidez, a coragem excepcional e o ideal dos bravos paulist:1s. Quando se Cala em banddrant.t'r nnm nOme pa, l"ece te::' destaque na nossa lemhrança, graças à di· vulgaçao que foi dada ao seu último trabalho. l{cfe­ rimo-nos a Fernão Dias Pais Leme. No entanto~ 11m dos atos mais importanlfs dêssc sertanist::t foi~ s-:1'n dúvida, aqu·êle relacionado com os índios goianazes.

que l'cfluiram dos campos de Piratininga para o ser'" tão entremeado pelos rios Tibagi e I vai, onde fun­ daram três reinados independentes, chefiados por Tombu, Sondá e Gravitai. Bcnl informado das lutas sangrentas em que essas tribos constantemente se env.olviam, Fl"rnão Dias penetrou, em 1661 nas suas terras e conseguiu. sem del'ramal' uma gôta de sangue, ou dispara!' um til"oJ porém, com muita astúcia e habíl;dadc, ~e:,c­ nar os ânimos da população dos referidos reino,. I; oonseguiu mais~ Trouxe, como amigos para São Paulo, os silvícolas das três tribos. O c~o das es­ meraldas aconteceu quando o velh:l bandeirante avançava muito em idade e... sonhos .. Com Gabriel Gonçalves no final do século XVI e no início do século XVIII I o espírito de autOnO­ mia cria ralzes nos fortes movimentos nativi~ta."i. Na capital paulista tenta..se arranjar um rei na pessoa de Amador Bueno que foge protestando. Acontecia, na ocasião, a possc dos Braganças no trono portu­ guês. O movimen~o inconformist-a favorece as como­ ções internas no Brasil-Colônia. A Revolta de Bok· filan (J6M), Gliena dos Emboabas (1711), Guerra dos Mascates (1711), Revolta de Felipe dos Santos (1720), e, muito especialmente com José Joaquim da Silva Xavier - o Tiradentes - foram aconteci.. lllentos que dis~eram em bom sOm do desejo de inde­ pendencia manifestado no nosso povo. POl'tugal luta para segurar nas mãos o g:gante da América. Ferve o tempo na Europa. Um famoso militar cuja predileta não é a mão ao queixo, tem fo­ me de conquistas. D. João VI, p~r Nap~leão, vem para O Brasil desalojando muita gente no Rio de Ja­ neiro. Depois, na bonança, volta p:lra L!sboa. D. Pedro fica. Fica para o bem de todos .e felic:dade freral da nação. E proc1amada, logo mais, em São Paulo a separação do Brasil. Isto se dera a 7 de s"­ tembro de 1822, pouco ante, das 17 horas, às «mat~ gens plácidas do riacho Ipiranga». Piracicaba soube do grito da «Independência ou Morte» quase um m'ês depois, via Itu, certamente. D. Pedro seguim o conselho paterno. Tomou a coroa antes que algum aventureiro lançasse mão dela. Infelizmentc t no nordeste houve derramamento de sangue. O brigadeiro Inácio Luiz Madeira de Meno, comandando fôrças portuguêsas tentou o po­ der. D. Pedro I envia àquelas paragem o Tenonte Luiz Alves de Lima e Silva e tudo parou. Parou na Bahia a 2 de julho de 1823. O Duque do Caxias acabou com o sonho lusitano' e o Brasil pcroeu a'$ algemas. Politicamente estava separado. Algum tempo depois o ddensor p,rpótuo do Brasil entrega o trono do Império a scu filho, ainda >

rase


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BRASIL: CORAÇÃO DO MUNDO

"'menor e volta para sua terra de orig~m. Uma casa -portuguêsa, com eerte-a teve a 'êle mais beleza, Com D. Pedro 11 há Regência trina e outras. ,. O impe· radar era um homem boro. j

" Inteligente e muito culto, o ilustre D. Pedro Il muito amou sua terra e seu povo. Lamentou ter de abandonar a sua pátria quando da proclamação da "República. Seu govêrno foi de justiça e de honra­ dez. Sua filha, a princesa Isabel quando o substi­ tuiu deixou seu nome gravado na história Foi ela qUEm libertou .os escravos. E o tempo foi passando. Passaram os senhore, de engenho, os senhores da mineração, Os s!nhores: do café. Mas estava .escrito que a República viria. Veio com o Mareehal Deodoro da Fonseca. Com? tudo muda, pretenderam mudar o hino nacional. Outro fôra feito. O povo não o aprovou. O Ma­

rechal concordou

COril

o povo.

o

antigo era melhor.

E o melhor acabou ficando. Quando o govêrno é entregue a um civil, ;) primeiro a reeeber essa distinção é o Dr. l'rudente de Moraes~ cuja vida está muito ligada à história de Piracicaba. (Por solicitação nossa ao Presidente da Câmara Municipal, em 1968, foi dado aO ilustre ituano o título de cidadã'!) piracicaban:>~ pnst-mor­ tem. é óbvio). REPÚBLICA Voltemos ao Marechal Deodoro. Com a procla­ mação do nôvo ~egime o povo pasSa .a ser consulta­ do na direção do pais. Há tempo certo para o man­ do. Agora o lema é «Ordem e Progresso., e vai pa­ ra a Bandeira. Lema de uma raça forte fbica c men­ talmente. O natural do pa"Liala a lingua P'r.tuguasa ., tem sfU uso e costumes próprios. Não escond::! o ar­ dente nacionalismo que, talvez, lbe tenha legado al­ gunl antepassado. Amante da liberdade e progrees­ sísta por natureza, conhece e cultu. sua história. A... lágrimas e o sangue dos que edificaram êste país fer­ tilizaram o seu solo e a men te, e criaram n~ses bra­ ~íklros normãs de vivência que diferem dos de outros povos. AGORA Pnís de dimensões continentais, sempre esteve >(; conlinuará visado por outro;; p::Jvcs. A c;)bíça tem :::e manifestado eom var~açõe~ distintas e constantes. Disseram alhures que o nOSsO celeiro ainda alimenta­ rá O lnundo. Não d~scordamos e até fazemes VOtos para que isso' aconteça. Porém, que isso t'lmbém nos traga alguma re<:omp:m::a. Há algo qu:::: jamais

concordaremos: é a intromissão da mão alheia em nossa tulha. Neste momento decisivo à integração nacional, não é justo, nem plausível que ignoremos certos problemas pátrios earecentes de solução. Partic'pe­ mos dêsse movimento nacionalista sincero que im­ porta e emp::>lga a lodos. Somos um país em aseen­ são. Despeia-se o Brasil do complexo do subd"sen­ vo!vimento e entra de cab~ça alevantada à maturi­ dade política, econômÍca e sociaL A dinâmica reformista da politica interna e ex­ terna leva-nos a acreditar num mundo melhor de paz e pmspcridade, positivando o acêrto de solução verde-amarela às nossas questões. O país caminha decididamente em busca do lugar de direito que lho compete no espaço internacional, Já se conscientiza da sua dimensão e procura abraçar seus limites guardando e protc gcndo o que lhe pertence. O homem na!ccu para viver em sociedade. E em sociedade deví! viver. Aristóteles já diúa; «Quem vive só ou é um bruto ou é um d:::us», Ap6s a pxjmdra família outras foram fpl'IDf.:.das. E com elas o Estado. O famoso Hug:> Grotius, precursor da doutrina do direito natural conceituou o Estado como uma s:>­ dedade perfeita de homens livres que tem por fina­ lidade a regulamentação do direito e a consecuçã, inglês do século XVII, a doutrina arisloélica sôbre Thomazius, L<ibnitz, Wolf, Rousseau, Blackstone e outras inteligendas luminosas do século XVII, ne+ sfnvolvel'am a referida doutrina dando-lhe especial esplendor. Para Thomaz Hobbes., o mais reputado escritO( do bem-estar coletivo. Kant, Hobbes, Puffendorf, a soci..sdade não tem razão de ser. Hobbes acha que o homem no estado de natureza é lôbo para OutrO homem, e que a sociedade form~da foi u'Jr interês­ 'se e necessidade. Como se formaram êsses Estados primitivos ou os atuais pouco nos interessa no momento# O impnr­ tante é saber como conservar o 'nosso. Os milênios se passaram e um problema contí­ nua a desafiar a todos. E' o da cobiça. Os Estado; fortes continuam desejando o que não lhes pertence. Além das lutas territoriais ainda levam doutrinas pe­ rigosas promovendo no mund:l dos vencidos com~ pleta transformação. Nem me,mo a ONU desempe­ nhando o papel daquele peixe monstruoso da Blblia c que serviu para Hobbes escrever o seu Leviatã; con­ segue eliminar as guerras de conqu!sta. Nos dias que passam há a necessidade de se ga­ rantir o F.stado. Com êle a forma dem,:,crática de govêmo, uma das mais preciosas conquistas que ti­

vemos.


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RRASIL: CORAÇÃO DO MUNDO A Nação brasileira não se interessa p~la agrega­ ção de alhejas terras ao seu territ6rio, porém saberá defender· o que lhe pertence. Estamos vivendo dentro de um regime demo.. ...rático, o único capaz de nos assegurar a ordem in­ terna, de nos oferecer justiça e de manter a defesa externa e ainda, proporcionar assistência social att'a­ vés dos serviços públicos. O Estado democrático garante o trabalho do homem dando-lhe condições normais para satisf.­ ~er seus· anseios, uma Ve'",l que não firam êstes os di­ reitos dos seus semelhantes. A riqueza pessoal, a saÚ.. d:.-, a ciência, a arte e outros bens não são criados peJu Estado. mas este estabelece condições favoráveis para que a sociedade ou Os indivíduos criem aquele... bt,,< 1':10 seu trabalho, pela sua atividade. O Estado dernccrático não fomenta a guerra entre os povos, l;"ms defende o direito do cidadão. Infelizmente, nem tôda gente compreende a ação agasalhadora que a democracia lhe ofcrece e insu­ flada por elementos de idéias esdrúxulas) passa a so­ lapar o alicerce em que o pais se assenta, tentando lhe mudar as características. Desejando se acomodar à situação do «não me importo» há ainda os conformistas. São os inc>ccn­ tes úteis aos delapiladores do regime em que vive­ mos. 'I'ornam-se nos vendilhões da pátria e da so~ ciedade. Muitas nações estão sofrendo horrores sob as imo!: nles ordens de governos estranhos. E outras há que caminham para mesmo fim, Abrem ,os bra­ çno;; f' vão de olhos vendados receber o «abrigo» da «Ordem do Tamanduá•.

°

IDEOLOGIAS E INTERESSES ESCUSOS :NIuitas foram as ideologias que tentaram inje. tar no Estado bras:ileiro. Para feliddade do nosso povo, não tiveram a acolhida que esperavam. Embora muita gente ande obselvando a esquer­ da ou -a direita, recomendamos mais 'cautela cOm as falsas ovelhas, Há muito llibo escondido aguar­ dando uma oportunidade. Neste ponto devemos fe­ licitar o govêmo brasileiro que vem de rejeitar o ofel ecimento de soluções estrangeiras aos problemas nossos. Oito e meio milhões de quilômetros quadra­ dos tornam-se, realmente, numa grande tentação. Ah! os drscjos escusos! Máxima cautela vem tomando o país cOm res'" peito à segurança nacional. A consolidação da sua soberania é hoje, mais que ontem, assunto de impor~ tinda e atenção. A arrancada final para a nossa total independência já foi dàda. A nação se preocupa em preservar OS poder<'s constituidos dentro da ordem e da lei, visando os ob­

jetivos nacionais. Inclui todas as medida; necessá.. rias! dentro das fronteiras do país capazes de neu­ tra!izar as pressões de qualquer origem, forma ou natureza . Diz o artigo 86, secção V, da Constituição Fe­ deral: «Toda pessoa, natural ou jurídica é responsá­ vel pela segurança nacional, nos limites definidos por lei». Como se percebe, a ordem é geral. Todo brasi­ leiro tem por obrigação, dentro de suas possibilida­ des, é claro, colaborar com os poderes que trilba.. lham pela segurança do país. Homens de indít<;tria, órgãos de classe e governo já se encontram de mãos dadas visando a integridade nacional. n:stinguiria­ mos as atividades industriais do nOrte e nordeste apoiadas nos incentivos fiscais, os trabalhos da SU­ DAM, SUDENE, INCitA, IBRA etc, cujos refle,,"', se fazem sentir até mesmo no exterior. As medidas de segurança abl'angem círculo ver .. dadeÍramente grande. Entram pelo campo político, economico social, militar e, num entrosamento gc:'­ ral procuram Os seus principais objetivos. Estes são a cristalização dos interesses e aspirações nacionais cuja conquista e preservação todo o país procura realizar pelos meios a seu alcance. Resumem-se eut independência, soberania, integridade territoria1! progresso) presetvação dos valores morais e espiri.. tuais e são estáveis no tempo e no espaço. Completam êsses objetívos que dizemos na­ cicnais permanentes, os objetivos atuais. Há aínda os que se consubstanciam no fim a alcançar pela co.. munidade sob a direção do Estado. Visam direta­ mente o homem, a terra e as instituições. O homem é o maior valor, Sem êle não haveria objetivo algum. A terra é fator de importãncia à vida do homem. As instituições são normas, são idéias e crenças ·através das quais a Nação se orga­ niza e se norteia. Disciplinam a vida e se prendem na terra a fatores de ordem social, econômica e po­ lítica. ...I j

GUERRA REVOLUCIONARIA A segurança inter'na do nOsso país precisa ser colocada num plano de especial atenção. Um peque­ no descuido será o bastante para perdermos a nOSsa independência total. Acreditamos que todos já ou~ viram faJar na Guerra Ccntcmporânea, usada e abu~ sada pelos homens da esquerda C da direita. Espe.· cialm·tnte pelos primeiros, Sua atuação p~~sa consi­ deravelmente na segurança do país. Ela se desenvoJ~ ve den tra do campo ideológico e é fei ta em nOme da paz, da fraternidade etc. € te., ocultando, cCmo é óbvio, os reais objetivo5T E' a guerra psicológica. A perigosíssima guerra psícológ'ca. Ela se rcali7.a in­ ternamente. E ' de ação eminentemente política.


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BRASIL: CORAÇÃO DO MUNDO

Conquista adeptos através de uma prcpaganda b;,;m engendrada que toca à mente do pJVO. Em consc­ qllêuci"" aparec~ m seus lideres ocupando postos-dla­ ves, propiciando, u seguir, a queda do regime. Fe­ nômenos tais tiveram seus exemplos em vários paí­ ses da Amériça Latina e em,outras partes do globo. Nossa precaução é para que acontecimentos dessa natureza não frutifiquem entre nOs. O povo inculto recebe com mais calor a semen­ te daninha c, num' ahl;r e fechar de olhos, já se vê envolto de uma ditadura impiedosa, sanguinária, nmterjalista e pcru:ciosa. Esse método vem sendo usado 'pelos elementos do MIC, que pretendem, ccr­ tarncnt:~, abarcar o mundo. Felizmente o Govêrno brasileiro está atento. Ai está o MOBRAL na sua luta alfabctízadora: A êstc propósito, é com satis­ fação que Icnlbranios o trabalho do ilustre piracica­ bano Prof. Thales de Andrade, que iniciou nesta sua terra uma campanha a que denominou de «Guerra Alfabetizador.», por volta de 1937, tendo como quartel general a Escola Normal Oficial, hoje «Sud M-cnnucci», e da qual participamos cOmo soldado raso, conseguindo tirar das trevas duas criaturas: um simples «gari» de mais de cinqucnta anos t: seu ne­ to, de treze. O combate aos inimígos 00 reg:me deJ.nocrático deve se prender, além da ação policial n:ccssária, ·também a outra de caráter psicológico, .atingiudo especialmente a massa proletária. Deve abranger os valores materiais! culturais, étnicos, m<>rais c espiri­ tuais. Cabe à democracia promover a valoriz.ação do homem com·uma ação .clara e objetiva, of~recendo­ lhe condições de vida condigna. E' fato' nowrio quc o comunismo se vale da miséria, das injustiças ·50!. ·ciais"e calamidades outras para ofcrec2r·o seu utÓ· pico remédio. Pregam os esquerdistas a.- desavença e se prendem aos desníveis ocasionais para a sua .ofC:Asiva. Que nos diz a «Dzdaração dos d';reÍtos ·huma... nos» assinada pela ONU em 19<Hl? Vejamos, pelo Ínteress-?, ó seu artigo 1. «Todos os sêres humanos na~cem livres e iguais em dignidade e direitos. São dOlados de razão ~ e consciênc'ia e devem agir Cm re­ 1ação unq aos outros COm espír~to de fraternidad-::». São. inquestionave~mC'nte, princípio,> cristãos e democráticos. Por êJes devem~se nOrtear os povos que almejam ordem, resp::ito, progresso, compreen­ são e paz. Ou melhor,

DESENVOLVIMENTO No Brasil, somente após a segunda guerra é que a palavra desenvolvimento veio ter uma especial atenção. Hoje ela se entrelaça a pregresso, a poder

e a riquC'La, talvez devido à desigualdade que a co­ moção mundial produziu nos povos. Estamos ve:ndu ~<J'Qra, países muito rícos e países muitO' pobres, Os economistas do mundo inteiro se preOcupam na solução da grande desigualda.re que vai polo glo­ bo. Há exames, fól'rnu)as e soluções pouco recomen­ dáveis. As teorias misturadas, a paixQ'!s políticas e ideológicas continuam sendo motiVO dJ estudos em muitas nações. Uma v·erdade é patente: todos os pal­ ses subdesenvolvidos se preocupam com o equilíbrio da produção em rcJação ao seu núm:!ro de hahítan~ tcs. Querem se Jivrar da misél'Ía e do atraso que Os. envolvem. Evidentemente há uma necessidad, de un1 pla­ nejamento 1 dando soluções adequadas ao comp~exo problema de crescimento economico e sedal. No caso do Brasil, que é um país em franca as­ censão, não podemos aceitar nem as soluções capi­ talistas da área do d61ar, nem as marx:stas-sccialis­ tas. Nossas soluções deverão ser verde-amarelas. A estrutura s6cío-econômíca brasileira hoje se faz com teorias exclusivamente nossas, gZl aclas e cres­ cidas nesta terra qu< Cabral descobriu. Devido à linha do plano traçado, já perceb,mos o sucesso que alcança. ~senvolvimento é cre3ci­ mento, é adiantamento. Como cxpressa o art'go 89 da Constituição Fe­ denil, no· inciso IV, letras a, b, c, deve haver unla política de desenvolvimento a fim de garantir, li se­ gIlrança nacional, o fortalec:mento do poder, A polít:ca nacional e o poder n,cional promo­ vem uma ação conjunta a fim de atender ao desen· volvim:nto do país em todos Os setores, Além do, poderes constituídos, todos os habitantes dêste Brasil imenso precisam participar dos trabalhes que visam o foitálecimento do poder e da segurança. A ciSnci.. e a tecnologia são preciosos auxili:l.res. Para a canse.. cução do fim (m vista a escola moderna vem cola~ . barando -eficientemente oferecendo o demento téc­ nico ou a mão de dbra·-quaJific2.da. A indú'tria e agricultura brasileiras já se adap­ tam os modernos métodos de produção. Produzem mais -e melhOl·. O trabalho humano ag::>ra é raciOF nal. E' digno de not" o entre!açam'nto atual da agri. cultura e indústria. As máquinas agl'íc'.'las naciona':-.. estão sendo preferidas e já ajudam o rurícola a plan­ tar melhor e colhêr mais. Devemos salientar que até há p'1UCO tempo atr~ a agricultura andou à margem das preocupações dos responsáveis pela direção nacional. D'!ixando o «slogan:b de «País essencialmente a:gric~Ja»1 partiu para uma industrialização não preparada. O B:-asit ficou em desequliíbrio, andou tropeçando. H:mv~ o­ ~xGclo rural e a mão. de obra não .rspzcizlizada nada


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ERASn., CORAÇÃO DO MUl\'DO

podia fazer de bom para a indústria que, então, aparecia. Felizmente tudo mudou. Se antes o agricultor não tinha o estímulo para sua produção, que também. não obedecia, de um :modo geral a orientação técll~~ ca alguma, atualmente êle recebe do Govêrno a mc­ 1hol' das atenções, inclusive, como está sendo Ie:to êste ano e COIll alguma promoção, um cl'éd:to agrí­ cola mais fácil para levar avante sua empreitada E o dito «Plante que o govêl'no garant..:», já tem seu resultado positivo. Já se abrem novas frentes para exportação de produtos não-tradicionais. Veja-se o caso da soja. Bssc é um dos produtos de ma:or a~i­ tação no mercado exterior atualmente. De 100 a 200 mil toneladas, cinco anos a trás, passou a nossa pro­ dução para dois milhões de toneladas. Como o Bra­ sil produz a soja na entressafra mundial, entl"asdo no mercado internacional na épcca da escassez,· o produto é grandemente procurado. E para satisfação nossa, o mercado dce carne bovina internacional está pendendo muito para o Brasil, com a crise que está se verificando na Ar­ geJltina. Também o miiho alcança um bom mercad" exlerior, dando clara demonstração que mui breve­ mente se ombreará com o café e o .algodão no inte~ rêsse internacionaL Interessante contraste podemos observâr entre o nosso país e outros, evidenciando o nosso propósi .. lo. pacifista. Enquanto outras nações se preocupam com O emprêgo da energia atômica em podcros~}s en.. genhos bélicos, no Brasil, ou para s.:r mais preciso, aqui em Piracicaba, ela é aproveitada para alim::ntar o homem. Vai ela aos campos produzir mNas e m(;­ lhores colheitas. O Centro de Energia Nuclcur na Agricultura, órgão da Universidade de São Paulo, anexo à Escola Superior de. Agricuitul'a «Luiz de Queiroz», instalado em nossa cidade realiza um tra~ balho que muito projetará o país. Nesse centro, através da bomba de e::lbalto, sua ferramenta, cientistas e professôres cl'iam novas va­ rildadcs de plantas, preservam alimentos, matam in­ setos, desenvolvem uma tecnologia avançada e clt' acarclo com as condições e n:!ce.'iS~dades brasileiras, fazen'do da nossa pátria lima: verdadeira p:>têncÍa agl'Íco]a. Contrariando os demagogos, o Brasil entra C)ll1 a sua rt'forma agrária perfeitamente enquadrada nas suas condições sócÍc ..cconômtcas, E' interessante notar que as tão anunciadas re­ formas oferecidas pelos países da esqu.~rda nã0 tive~ ram resultados positivos ,até o momento. Em Cuba elas foram um fracasso, pcrdfndo os ci'.mp:nese:s di.. nheiro, tempo~ sUOr e lágrimas. Na RÚSS'3, Cftm tÔM da a sua propalada tecnologia, elas não ficaram por

menos. Em 1963, Kruchev, há p"uc~ falecido, teve de gastar três bilhões de dólares~oul'O para adquirir, nos 111ercados «capitalistas», os cereais que as famo~ sas searas comunistas deixaram de produzir. A refoJ'ma agrária brasileira deverá triunfar, pois, foi baseada em princípios cristãos e democrá.. ticos. E~ pos.<ilveI que se estranhe a interferência do Estado na economia nacional, atingindo, inclusive o setor privado, Tudo é perfeitamente normal. O Estado tem seu limite de participação. E esta só vi­ sa o bem g'ral. Tudo é Brasil em ritmo de progres­ so, buscando sua total integração. INDÚSTRIA Não vamos nOS reportar a Ilineu Evangelista de Souza para afirmar que a indústria brasileira co~ meçou no tempo do imperador. Não, nada. disso. A realidade nOs mostra que a verdadeira era industrial surgiu f;lZ pouco, embora reconheçamos os esforço:. extraordinários do Barão de Mauá; tentando, numa. época difkil, tornar o Brasil um pais de múltiplas atividades. Sua fund;ção de ferro e Os estaleiros da Ponta de Areia, no Rio de Janeiro, de onde sairam milquinas agrícolas e navios a vapor, se diluiram COm 05 seus sonhos 1 eml:>ora sirvam de motivo aos homens da nossa época, ajudados pela tecnologia e outras fa­ ciJidades, para levarem avante o processo de inte" gração nacional. E' que país sem indústria, é paí5 pobre. Com a instalação da indústria pesada sob a di­ reç.=io do Estado, iniciou-se a nova fase bl+asileira de desenvolvimento. O surto industrial porém, não se fêz notar logo de iníeio. Faltava algo mais, além da. máquina e do capital. Era a mão de obra. São Paulo, como Estado líder da Federação co­ labOl"a para a solução do problema surgido. E os dr,. Roberto Simonsen e Roberto Mange criam uma or­ ganização que daria em pouco temp(), o operário qualificado reclamado pela indústria brasileira. E nasceu o SENAI, que acelerou a industrialização preparando a n,ão de obra. A falta do operário qualificado ocasionou, por volta de 1955 um grande d:sni\'eJamento econômico no país. A partir de 1964, porém, o j<1 bem equipado parque industrial brasi­ leiro passa a partkipar do progresso nacional atra­ vés da siderurgia, da construção naval, ferroviária, de máquinas em geral, dos meios de transportes, dos utensílios, usinas, indústrias de eletricidade, d.e teci~ dos, de mnédios, alimentos etc, Atualmente o Brasil produz para si e para o mundo uma série grande de máquinas, equipamen­ tos, autoI11óveÍs, caminhões, tratores, tomos, instru­ mentos profissiona:sJ geladeiras, televisores, tecidos,


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BRASIL: CORAÇÃO DO MUNDO

lâmpadas, válvulas eletr8nicas, papéis fotográfi­ cos etc.

Tem como seus mercados os países: Argentina, Bolívia, Africa do sul, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Espaoha, Estados Unidos, França, Grécia, Guatemala; Holanda, Honduras, Japão, Lí!>ia, México, Paraguai, Pem, !"ortugal, Quênia, República Dominicana, Suécia, Tailândia, Uruguai, Venezuela etc. O café solúvel brasileiro está alcançando gnin­ dos mercados. O mercado de calçado no exterior melhora dia a dia. As fábricas paulistas vendem veículos para vários países da A.mérjca Latina e da Africa. A venda de peixes congelados, defumados e salgados vai crescendo. Algumas vendas para o ex­ terior chegam a ser até pitorescas_' Portugal, por exemplo nos compra grandê quantidade de alim~Il­ tos para galinha; dnco mineiros estão vendendo sempre-vivas para os EUA a 2,5 dóla;!"es o quilo; a Alemanha compra uruhus a 25 dólares o casal; o Pa­ raguai nos compra escôvas de dentes, o Líbano, ba­ ton; Vendemos ainda, para os americanos, sapos­ cnrurus, cobras, peixinhos de luxo, borboletas, ma­ cacos e capiva.ras. Mas poderão dizer que esses bi­ chinhos não fazem parte dos produtos industriais. E têm razão) se pensam assim. Acontece que exigem embalagem especial. E temos uma boa indústria de embalagens. O petróleo e "seus derivados estão colaborando decididamente na istegração nacional. E bem agiu o nosso govêrno estend~ndo para duzentas milhas a sua plataforma submarina. Porque nelas se encon" tram riquezas imensuráveis, além do ouro negro. NOVA ORDEM

A ordem agora é «integrar para não entregar». E com isso passamos a derrubar os prognósticos dos futurólogos estrangeiros que ousaram injetar pessi. mismo na nossa gente, tentando ludibriar um povo ordeiro e realmente bom. Dentro do plano nacional de desenvolvimento mllitos são os problemas que preocupam seríamcnte o GoVêrno da República Federativa do Brasil. Den­ tre êles~ o da Região Amaz8nica vem merecendo d~'s­ taque natural. O Inferno Verde deverá se tl~ansformal' mim paraíso. Para isso, está havendo uma união de fôr­ ças com planejamento adequado. Um repórter curioso da «Revista Realidade. di­ vulgou, certa feita, a angílstía que prende Os habi­ tantes humildes e simples do interior da grande re­ gião. E cita recados tristes de familiares, pelo rúdío de Manaus" ou Santarérn mais Ou menos assim: «Atenção José da Silva, a bordo do «Bom GlIia~.

Peço que venha urgente.

A família

Mucuim nOs Bô­ pão pelo Almirante. Tire' banana comprida e mande 1 cacho». Num mun90 superpovoado, à beira cle u~a ex­ plosão demográfica, .a Amazônia é um enorme es· paço vazio suscitan~o cobiça. Sua suporfícbe de qua­ tro e meio milhões de quU8pletros quadrados cones­ ponde à metade da área de três dos mais extensos: países do glolJo: Canaáá, China e Estados Unidos. A Amazônia é vel'dadeir~mente um m~ndo dentro de oul ro munq,o: quaclro décimo,; da úrea da América do Sul, vigésima parte da superfície terr~st~"{'e, un:~ quin lo da disponil:iílídade mundial de água doce e a têrça parte das reservas IDundiais de floresta:; (Vi.. são, 1970). !fá quase um século é essa região a preo­ cupação de estudiosos, cientistas e curiosos que pfO'" CUl'am desvendar os seus problemas tão eomp:exos. A<; lendas amazônicas já não· iniprcssionam mah} P1­ rem ~ua áCOl:dou até o' estrangeiro qlie não vive nO BJ:asii. E1' uma tentação para paíSes estran­ geiros, pois, cont;tantemente a nossa impren.;;a noti­ cia a introIDlssão de elementos alienlg::-nas nesse ter­ rilório brasileiro, criando, inclusíve, ~ituação cmba~ raçosa à seg~ura~ça nacional. íH'r~e~ça ~ Inês». ,Francisca ~visa seus pais, na ca do ~namlj, que está melhor. Segue 1 quilo de

riqueza

PLANO DIABOLICO O plano diabólico' do Instituto Hudson dos Es­ 'tados Unidos da Atnérica do Norle, visando criar o grande lago de quatrocentos mil quilôm~tros qua~ drados de ál'eea, iria, logicaII)entc, arr.. mcssar, lôdã. a região Amazônica, sob a influência dos países do norte da America Latina e, especialmente os Esta­ dos Unidos. O plano dos Sete Lagos teria uma fi· nalidade: criar um outro canal ligando o Atlânlico ao Pacífico, substituindo o do Panamá. E o Brasil perderia uma parte muito grande 40 seu território, a fim de satisfazer estranhos apetites. Do plano brasileiro de inlegração, destaca~se mi Amazônia a sua grande estrada. TRANSAMAZONICA A Tl'ansamaz8níca é uma das mais arrojadas iniciativas do nosso governo. Vai ela completar ó Brasil no seu processo evolutivo «ermo nação, pIe..: namente emancipada». De início: p:::>ssivelmente a grande estrada traga mais sentido social que econô-.. mico. Ela ligará o Nordeste à nova região a ser d::-s­ bravada, possibilitando n ida do nordestino a lima região com futuro certo. Com a abertUl'a que se processa dentro do pra~ 70 marcado para suas várias etapas, teremos deu..


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rRASU.: CORAÇÃO DO MUNDO

,

..

tro em breve acentuada melhora também no trans­ porte fluvial da Amazônia, O entrosamento qu::! se dará, será de uma importância notável. B::neficiará ainda o povoamento da região, solucionando ~noso problema. .

mcio de transportc». E a ferrovia voltará a ser o que já foi. O trem de feno não é hoje uma lem­ brança do passado, mas uma fôrça viva que mais se revigora, incorporando-se ao esfôrço de construir um Brasil maior .

Processa-se também, no momento, a lígaçã::> en­ tre os setores estatais e privados do norte e nordeste,' a umentanclo o entuslaslno dos negócios, Pela p..:s~ quisa realizada faz pouco} demonstrou~se que o solo da região norte possui caracterísdcas várias, ideaIS para d<Zlerrninadas culturas1 aiém de jazidas de roi .. nérios e pedras preciosas. Dizem que em M,arabá e Altamira estão lccalizad~s as maiores jazidas de fer­ ro do continente. E ambas as 10calídades estariam

ReDE FLUVIAL

submersas se seguíssemos o plano dos Sete Lagos

p:"O~

posto pelo Instituto Hudson. A açãQ do govêrno brasileiro, especialmente na gestão do atual Presidente Emílio Garrastazu Médi~ ci, vem sendo extraordinária sob os mais díversos aspectos) repercutindo no exterior a ascensão do nosso país. E um dos fatores de Sucesso dêsse em­ preendimento foi a entrega dos problemas nacionais 11 técuicos nacionais.

,

A Transamazonica representará a tranquilidade social para grande parte da população do Nord"te. Além de -abrir um nôvo mercado de trabalho., duran~ te sua construção permitirá a fixação do elemento humano às suas margens, o qual deverá auferir OS benefícios da fertilidade do solo da região, escapau~ do ao fantasma eventual das sêcas. O Norte terá cer­ tamente. os grandes instrumentos de sua integraçã'J econômica política e social com o resto do paíç, e, uma ocupação territoríal imediata face aos trabalh{'s de construção das rodovias. Nossas fronteiras vão estar nos seus devidos lugares. j

ReDE FERROVIARIA NACIONAL A política dos: transp:lrtes é imp:lrtantíssima ao desenvolvimento do país e, por êsse motivo, não p~­ <leríamos nos esquec~r das ferrovias. Di"sc o G~>ne­ ral Adolfo Manta, Presidente da R«d~ FelToviária Nacional a uma revista brasileira: «Dep'Jis de havC!r cumprido a uma tarefa pioneira e civilizadora até a década de 1930, entrando, a partir de então, nu· ma fase de abandono e consequente deterioração, o trem de ferro volta a ocupar hoje o lug:1r que lhe compete na economia do país. Para um Brasil ain'" da não auto-suficiente em petróleo c que tem dis­ tâncias a vencer, a ferrovia é uma das soluções no panorama nacional de trant'p~rtes. Nrs últimos quatro anos, já tivemos alguma recup~ração ness~

A interligação dos sistemas rodoviários, ferro­ viário, fluvial e marítimo será dentro de pouco tem~ po uma das mais notáveis conquistas brasileiras. E uma prova doquente da confiança que o brasileiro dá ao Govêrno está no trabalho das nossas indústrias produzindo vagõcs, locomotivas! caminhõcs, tratO'­ res, automóveis, aviões, navios etc.

o

pf(1gl'ama do Ministério dos Transportes está pedindo rap~dez em tudo. O atual Ministro, entu­ siasta da navegação, quer també-ln resolver o mai$ breve êssc problema. E conta com razão bastante. Rcp0l'tando-nos novamente à história do Bra­ sil vamos encontrar na maior bacia hidrográfica do mundo, a Amazônica, algumas visitas que lhe foram lnteressantes. Francisco OreHana, soldado da con­ quista do Peru, para descobrir o país da Canela (1529-1532), desceu de Quito até a foz do maiOl' rio brasileiro. Lape de Aguirre parte de Cuzco (1560) seguindo até .a desembocadura do Amazonas. Já em 1636 os portuguêses apresentam com uma ex­ pedição comandada por Pedro Teixeira, seguindo direção inversa à dos espanhóis! ísto é, da foz a Qui.. to. A b:mdcira de Anlônio Rap:1so Tavares am­ p:iou os domínios lusos na região norte~ As vias li." quidas participaram ativamente da nossa história. Os jesuítas, os franciscanos, os mercadários e car­ melitas fundaram núcleos à beira dos rios catequi~ zando os índios. Mllitos dêsses núcleos, atualmen'" te são cidades de importância. Os rios participaram do nosso dC!óienvolvimento econômico, político, social. agrícola, industrial etc. Até a proclamação da nOs­ sa independência teve como palco de ação um pe~ qurno rio - o Ipiranga. Francisco Orellana, na sua descida pelo mar~doce, confunde índias valen­ tes c:~m :l() mnazonas das lendas gregas e surgiu um ncme p:lra um rio, para uma região. Há um rio na nos!'a história. E rio lembra navegação. Ontem co.. mo hoje a hidrovia se fêz e se faz importante. Ela dar{t lima nova dimensão ao Bra"il depois de conve~ nrenlelllen1e preparada como quer o nOssO ministro dos Tran!"portcs.

se

o plano nacional de navegação é fantástico e nOs impr(s<;iona. Não poderá haver integração na... cional se não houver aproveitamento também do;)


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BRASIL: CORAÇÃO DO MuNDo

nossos rios. Oferecem 'êles o mais barato meio dI.! transporlC .

o Brasil vai ter as suas três grandes bacias in­ terligadas. No momento executam-se a Jigação Guu­ pOl'é ao sistema Paraná-Uruguai unindo duas inl­ lar o perigo às nossas costas oferecido pela rodovia lar o perigo às nOssas costas ogereciâo pela l'odovi!l. Bolivariana t marginal da selva amazônica, de tra­ çado eminentemente político e que serviril à Améri­ ca espanhola. 1

São Paulo estará dentro de poucos anos liga­ do .ao Amazonas pela aquavia, E tambént o será à bacia do Prata. Parte do rio Tiete já comporta a navegação. E a êste propósito, tivemos a satisfaçã~t de participar dos estudos e projetos iniciais da li· gação do rio Piracicaba ao sistema Tictê-Paranú, a cargo do CENAT (Comissão E,,"cutiva da Navega­ ção do Tietê-Paraná), da Secretaria dos Tran;por· tes do Estado de São Paulo. Essa ligação de Piraci caba ao Tietê dará à região do Vale do Piracic.aba e vizinhança um desenvolvimento todo especial, além

de oferecer condições melhores para alcançar o Co· mércio do Brasil~Central. O calcário de Piracicaba, Rio Clal'o~ Laranjal, Tietê etc. poderá ser levado ao norte c nordeste a fim de regular suas terras para a agrieultura. O petróleo dO' Paulínia, por via flllvia! chegará a bom preço a qualquer região brasileira. Também teremos o nosso turismo em bases concre­ tas. São Paulo poderá ter o níquel do Tocantins; o

minério de ferro, de manganês e de chumbo do rio Fresco, o diamante e ouro do Araguaia e do Xillgu; a madeira e o petróleo bruto da região do Ama7.0nas.

o

Brasil apresenta nas suas três bacias condi~ ções recomend::íveis para sua integração pelos rios que poderão ligá-Ias. " Com a hidrovia teremos o surgimento da ind{IS~ tria da eletricidade em muitos lugares" onde aind:t impera o Iam peão a querosene, Ou a gás. T(,femO~ a eletrificação rural e a necessária fixação do laVl'a­ dor na zona rural.

EDUCAÇÃO Integação não se faz apenas construindo estra­ das, incentivando a indústria ou a agricultura. Há um ponto importantíssimo que o Govêrno nao des­ cuidou: a educação.

o

atu.l Ministro da Educação muito bem fa­ . 2endo para acabar com um dos maiorps entraves ao desenvolvimento: analfabetismo. O !\{ovimcnto Brasileiro de Alfabcti7.ação está caminhando a pas-

°

largos, já ofereeendo, em pouco tempo, resulta dos satisfatórios.

50S

COln uma população já se aproximando à casa dos. cem milhões de habitantes f estudam no Brasil, 400 mil em universidades; 4 milhões no curso SPcus~ dá rio e 13 milhões, no primário. ~sse número de.. verá ser aumentado nestes próximos anos. Maior também vai ser o campo de ação dos qU2 conclui~ 1'<:ln o segundo e ° terceiro ciclos de estudos. Vem. aí Ulna nova reforma para as diretrizes e bases do ensino no país. Haverá entrosamento de escolas di.. fercntes aproveitando a capacidade ociosa de umas para suprir a deficiêncía de outras. Serão criados centros interescolares reunindo serviços e áreas de estudos comuns a várias escolas de uma mesmâ re­ gião. Ha\'erá eliminação da prova como único meio de avaliação de aprendizagem c sub'tituição do atual curso de madureza, por cursos e exames sup!o:::tivos, cobrindo desde a alfabetização até o tre:namcnto e aperfeiçoamento de profissões o Oito anos de ensino obrigatório e gratuíto de 1.0 grau a partir dos 7 ano.3 de idade, COm 720 horas de aula por ano em 180 dias úteis. j

PALAVRAS QUE FICAM «Homens do meu teltlpol tenho pressa» o Essa frase tão significativa e oportuna, pronunciada pelo Excelentíssirt1D Senhor General Emílio Garl'aslazu Médici, por ocasião de sua posse no alto cargo de Presidente da Rep6blica, teve a melhor repercussão em todo o país. Decididamente é êste o momento de ação. Já se prepara uma elite intelectual e técnica buscando soluções nossas aos reclamos da Nação. E .o brasHciro, produto do caldeamento de tantas l'a­ ças saberá como proceder, pelos seus conhecimentos. jnteJigenela. attivez e honra para a elevação moral e material da sua Pátria. O fortalecimento do Poder Nacional quc hojc se processa é uma garantia à segurança interna. ao de­ senvolvinlento econômico e à plópria Constituição dcmocrática que possuimos. Brasil vibrante! Brasil dc agora e de sempre} cordiforme pelas mãos dos homens quc fizeram sua grandeza, haverá dc SCl' pelas suas tradições, pelo seu progresso c pelo seu amor à paz, indubitavelmente. o CORAÇÃO DO MUNDO!

BIBLIOGRAFIA Encyc10pédia c Dicionário Internacional Jackson Inc.

W.M.


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IlRASIL: CORAÇÃO DO MUNDO Encyclopaedia Britanka São Paulo.

Barsa -

Rio de Jan. ­

Palestras da Associação dos Diplomados da Escol., Superior de Guerra Ciclos de Confer~.ncia, - Interior - 1971 Universo e Humanidade Enc. da Vida Ltda.

Douglas Michalany -

História da Civilização Bl"asileira Ed. Saraiva

J. Silva -

DulHo Ramos

Comp. Ed. Na­

cional

o Comunismo de

Prof. Dr. Euzébio

Consto da República Federativa do Brasil Tendências Atuais do Estado Brasileiro - Dr. Wal­ dirio Bulgarelli - Ed. Col. de Estudos Juridi­ COs «Kepe» Revistas; O Dirigente Industrial -

Direito Agrário e Reforma Agrária - DI". Fernand" Pedreira Sodero - Ed. Livraria Legislação Bra­ lÚleira - São Paulo História do Brasil -

Apontamentos de Economia Rocha.

Marx e o Muro de Berlim -

Ed.

Abril lnterêsse Nacional e Política Externa - J. Honóôo Rodrigues - Ed. Civilização Brasileira - Rio de Janeiro

são -

Realidade -

Conjuntura Econômica -

Vi­

Cruzeiro

Manchete. Problemas Brasileiros -

SESC

Histól"Ía de Piracicaba em Quadrinhos - Imp. Ofi. cial de Piracicaba - Edição do Inst. Hist6rico 1971 - Auto! e Geográfico de Piracicaba :erof. Leandro Guerrini. Jornais - Diário de São Paulo - Jornal de Piraci­ caba - Fôlha de São Paulo - O Estado d~ São Paulo. Espumas Flutuantes Os Lusiadas -

Castro Alves.

Luiz de Camóes -

Ed. LEP


o

Natureza agonizante

,

PAULO NOGUEIRA DE CAMARGO (Do I. H. G. P.)

Todos nós nos ufanamos das belezas naturais de Piracicaba, dentre as quais sobressai o magnífi­

co Salto, cantado e exaltado por prosadores e poe­ tas. Mas, a beleza do Salto não se resume na ma~ jest.de do espetáculo de suas águas escacho.ntes, .que se despencam no abismo e se espedaçam nas ro­ chas e se desmancham em espumas e neblinas, O que dá encanto à paisagem e nos toca mais de perto a .alma, fazendo-nos s::!ntir emoções jamais sentidas, ao contemplar a soberba queda dágua, é o ambiente que a vegetação do Salto propicia. Aquêle trecho de lIoresta natural, pedaço exu· berante de mata ribeirinha, onde ponteiam elegantes cedros, jequítibás esguios e belas perobeiras, e onda as figueiras se destacam: por seus troncos respeitá­ veis; aquelas árvores enormes, de galhos contorcidos, enleados de cipós e atapetadas de tenros mu'gos e adornadas de orquídeas, bromélias e cactos penden­ tes, umedecidas pela garoa fina que sobe da ca­ choeira; todo êsse esplendido cenário é que prepara o nosso espírito e nos encanta os sentidos para a fas­ dnação do Salto, Sim, porque beleza sem vida não tem poesia. Pode extasiar, pela majestade. Pode maravilhar, pc­ 'Ia imponência, ~{aSt SÓ enleva e toca a alma e exal­ ta os mais ternos sentimentos, a natureza estuante de vida, que cresce, que luta, que floresce, que abriw ga mil sêres que correm, que piam e gorgeiarn e es~ voaçam e vibram, em sinfonia sem par. Vêde, por exemplo, a Cachoeira do Marimbon­ do, no Rio Gl'~ande. E t linda. Uma cortina de água, cintilante ao sol, que cai, lá das alturas, franjeandv as fímbrias num algodão de espumas. E' extasiante. Mas, a par de um sentimento de admiração, nos dei­ xa um outro sentimento vago) de opressão e tristeza. E' uma cachoeira sem vegetação. Por tôda parte ve~ mos pedras. Pedras nuas, inertes, pedras sêcas, e, um

pouco retÍrado, uma vegetação mirrada, de arbus­ tos ressequidos. Ah! Se ali houvesse uma floresta que [ôsse comparável à roata do mÍ<ante! E, no entanto, essa jóia das belezas naturai!\, o verde ramalhete que engalana O véu de tule da Noi­ va da Colina, será coisa do passado, em futuro não distante. Vem sendo destlUida, desde há muito, e sua destruição tem avançado a passos gigantescos, nos anos mais recentes. Mesmo as crianças de hoje, talvez não tenham a sorte de poder gravar seus no.. mes, ou desenhar corações nos troncos de suas ár­ vores nativas. . Durante anos e anos, a erosão corroeu as bar­ rancas, no trecho da ponte do Salto, 'desenterrando as raÍ7.es das árvores que cresciam junto ao rio. E nas épocas de enchente, de chuvas e tempestades, muitas delas despencaram dos barrancos e se fo­ ram, na turbulenta caudal. A erosão foi contida. Construiu~se um paredão, para conter o barra·nco. Mas o rio já havia levado boa parte da floresta do mirante. Outro fator natural, que há muito vem extin... guindo as árvores daquele trecho de mata, é uma figueira - bonita como tôdas as figueiras - co­ nhecida pelo povo pelo nome de mata-pau. O mata­ pau dá uns pequeninos figos que os passarinhos gos­ tam muito de comer~ E comem, até se fartar. E, de~ pois da digestão, êles dejetam num galho de á..vore qualquer. As ..montinhas do figo, quando passam no intestino, são bastante estimuladas RClos sucos diges­ tivos e, então logo germinam. Daí, nasce uma plan... tinha que produz uma raíz muito fina e delicada. Parece um fio de barb.nte_ Essa raiz vai crescendo. vai descendo pelo tronco, até que chega no solo e se .introduz, logo, na terra. Outras raízes se fOlmam to! de~cem, como a primeira, e vão se ramificando e se: tornando mais grossas. Quando uma encosta na ou­ tra,. ambas se emendam, se fundem como se fosso f


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NATUREZA AGONIZANTE

uma SÓ, formando, assim, uma rêde que recobre o tronco todo. Essa rede de raízes engrossa cada vez mais e se toma mais lenhosa" e arrocha, e comprime a árvore, com descomunal pressão, e continua cres~ cendo e ainpa se fusionando, até formar um só todo - o tronco de uma figueira. O tronco do mata-pau envolve, completamente, o da árvore hospedeira.. e o aperta, mais e mais) acabando por matá-la. D..;poi~ que a árvore morre, ela apodrece e se desfaz, enl res­ tos esfarelados, deixando,' no seu lugar) aqude es­ paço vazio, que é o ôco da figueira. E, lá no alto, os galhos do mata-pau já fonuaram uma exuberau­ te copa.

FINIS • • . Paulo Nogueira de Camargo O Salto, Eu o conheci bravío) impressionante: Mole imensa, espumejante, De catadupas tremendas, Lançando o rio inexoravelmente ao abismo Em turbilhões medonhos fragorosos estrondeantes! E do abismo, surgindo, novamente, o rio,

Em borbotões de espuma,

E se a ti rando, em loucas corredeiras,

Escachoando sôbre as rochas crespas,

E, em tempo de enchente,

Engolindo gente ...

Aqui perto da cidade, tôdas as matas já fo.·am completamente arrasadas. Só restou a do mirante. Os arvoredos são poucos - o parque da Escola Agrí­ cola e alguns jardins mais antigos, que vão sendo destruidos, para modernas reformas. Por isso os pas~ sal'Ínhos afluiram para o SaltoJ em número muito maior do que seria norma1. E ali, ano após ano, êles vão disseminando a figueira mata-pau, que vai comendo a floresta.

O Salto,

Eu' o conheci sorrindo em côres de arco-íris,

Lev.ando ao céu o manto diáfano e sutil

De alva neblina - manto virginal

Da Noiva da Colina ­ Tremeluzindo ao sol, em lantejoulas mil,

Aos revérberos de peixes, saltando, em piracema!

Mas, O pior inimigo do encantador trecho de mata é a urbanização. A Prefeitura, no prop6sito louvável, de atrair à nossa terra turistas e vjsitant('s~ arrasou um bom pedaço da floresta e construiu um jardim. Ao edificar o prédio do restaurante, derru­ bou outro peJaço. E, agora, já pôs abab.:o Outra parte. Vai fazer mais construções.

O Salto,

Não o verei, jamais, bravio,

Nem o verei sorrindo, em côres de arco-íris,

Levando ao céu o manto virginal,

O sutil véu da Noiva da Colina ..•

O Salto é morto... é morto o rio ...

(01.09.1955)

Quanto à parte inda restante, o seu fim se mOs­ tra à vista, pois o equilíbrio biol6gico, que deve sem­ pre existir, na floresta natural, há muito já foi rom­ pido. Ali se tem cultivado tÔda espécie de plantas que se encontram em jardins e praças públicas, plantas que não são da mata e, inda mais, quase que na maioria, plantas que nem são nossas. Isso faz di­ minuir o encanto da beleza natural, vulgarizando a paisagem e J o que é pior, transforma, muda o am­ biente que a natureza criou. Ali não vai mais nascer espécie alguma da mata. E, mesmo que o mata-pau não mate tôdas as árvores, aquelas que vão morren­ do não serão substituídas. Para o futuro, sem dúvida, teremos, a bordejar o Salto, um bem tratado jardim, com aléas de mo· saico português, canteiros de florezinhas, buxinhos e alcatifas, e, também, gostosas sombras de fIamboians, primaveras, ou alecrim de CampInas ... 28 de abril de 1968

--···0-­

PIRACICABA Paulo Nogueirlli de Camargo Mirando o salto e ouvindo o seu fragor,

Ao descansar, às tardes, cada dia,

Jamais imaginava, o Povoador,

Que a Noiva da Colina já nascia ...

Ana de Lara e êle, com amor,

cuidavam bem da prole, que crescia,

E a Vila se formava, no labor

Da gente que chegava à Freguesia...

Dois séculos depois ... Oh! Que beleza!

Repousa, 'na colina escultural)

A Noiva, com seus dons da Natureza!

Cidade rica, bela e cultural,

:És tu~ Piracicaba, com certeza,

A jóia do Brasil! Não há igual!

Piracicaba, 1. 8.6:


A lenda do tesouro PAULO NOGUEIRA DE CAMARGO (Do I. H. G. P.) Conheci Florindo Batista de Lara há, segura­ mente, mais de vinte anos, Mulato alto, descenden~ te de escravos dos Condes de LaraJ simpático e eon·

versadol', entendia de polínca e tinha uma inV{!jável memória. Recordava-se de fatos antigos e contava-os .cOm abundância de pormenores, cOmo se fossem acontecimentos recentís$imos~ Dele ouvi muitas his­ tórias verídicas, com os mínimos detalhes e comen­ tários lógicos e convincentes. Florindo era um eOn'" versadol" de primeira ordem. Apesar de não ter cul~ tura, era um infatigável leclar de jornais. Conhecia, detaJhadamentc) os grandes crimes que abalaram a .opinião pública, tais como o crime da mala, o famo­ so crime de Cravínhos, com tôdas as suas peripécias. publicadas pelo «O Parafuso», e outros tantos, cujos detalhes se vão apagando em nossa mente, com o perpassar do tempo. Comentava as atitudes e os atos <los chefes de Estado, desde Hermes da Fonseca " Artur Bernardes a Getúlio, tirando conclusões inte.. ressantes. Conhecia os ministérios de todos os Gover­ nos e fazia prognósticos políticos. Florindo era notívago. Gostava de ficar até al­ tas horas da noite, a palestrar, num dos bancos do nos~o saudoso jardim público, o jardim das árvore<; frondosas e do repuxo de mánnore, onde oS estudan.. tes, nas suas libações alcoólicas, muitas vêzes, iam tomar seu banho. Foi numa dessas noites que co­ nheci Florindo. Palestrávamos, então, até alta ma­ i'lrugada, noites e noites, a fio. Florindo morreu. Morreu silenciosamente, na .Santa Casa, há alguns dias atrás, levando para Q túmulo a sua grande, enorme esperança de se tornar um dia, um milionário. Deixou, entretanto} para ,1 história de Piracicaba, uma lenda que passará de boca em boca, de pais a filhos - a lenda do teSOurO -do mato da Baroneza de Rezende. Numa daquelas cálidas e saudosas noites pira.. ócabanas de 1934, estávamos ouvindo Florindo con· tar suas hist6rias, sentados em um banco, ao lado do

corêto do nosso velho jardim. Além de Florindo, fa­ ziam parte do grupo o tipógraf", Alan Damantn Cunha, o estudante Enio de Andrade, o guarda Ge ... mano Bandóna,. que era cunhado do Vitória Zaga~ to) e eu . Corria, por aquela época, na cidade~ a nodeid. da d""",berta de um tes6uro, na chácara da Baro­ noza de Rezende. A polícia havia tomado conheci­ mento do fato, mas nada se sabia, ao certo, sôbre .) achado. •• " e Florindo começou a contar:

Era oficial de alfaiate em um salão da rua Boa Morte. Ali trabalhava um seu colega chamado Diti. nho de tal, que; tôdas as tardes, costumava ir cortar capim nas imediações do mato que havia na entra­ da da chácara da Baroneza de Rezende. Uma tarde, Ditinho viu sair do mato uma se­ nhora elegantíssima, tada vestida de seda preta, c~ o rosto recoberto por um véu. Intimidado pela pre· sença de tão distinta dama naquele local, Ditinho fi­ cou sem saber se devia ir-se embora Ou desculpar~se) por estar ali, eOltando capim sem a necessária licen­ ça da administração da chácara. Ainda nesse dilema, qual não foi a sua surpresa, quando viu a dama desaparecer, repentinamente, diante dos seus olhos! Tomado de indescritlvel pa­ vor, O negrinho precipitou-se em desabalada carrei­ ra, chegando, transfigurado, ao salão da alfaiataria, onde a custo, relatou o estranho fato. . Profundamente emocionado, Ditinho não mais se restabeleceu do choque. Caiu doente e, dias de­ pois, morreu. Passados alguns meses, Florindo sonhou com a misteriosa dama. Estava êle, em seu quarto) come.. çando a pegar no sono, quando, repentinamente, to­ do o aposento se iluminou por um grande clarão~ Não era relâmpago nem faísca da instalação elétri­ ca. Era uma luz diferente, esquisita, inexplicável.


70 Ap6s o fenômeno, quando tudo caiu na penumbra, Florindo v.iu, clara e nitidamente, em pé no meio do quarto, uma senhora alta, elegantemente vestida de negro, com"o rosto coberto por um véu de tute. Através' do véu êle podia advinhar uns olhos negro., aveludados e penetrantes. A dama misteriosa acer~ cau"se do seu leito e começou a falar:

Sou Laura de Moraes, viúva de Clodomiro Santiago. Por motivos de família, enterrei, ..ao pé de um jcquitibá, no mato do Barão de Rezende, o meu tesouro ... Florindo viu-se, então, accmpanhando a miste­ riosa dama, na estrada que vai para o antigo Sana·

tório da chácara Barão de Rezende. Naquole tem­ po havia, orlando a estrada, um belo trecho de ma­ ta virgem, com imponentes e."(empJares das nossas es"

s<lncias florestais, onue Os joquitibás pontificavam. A certa altura, a dama penetmu no mato, ca­ minhando por um sinuoso cal'reador. Florindo Se­ guiu..a. Chegaram, enfim, ao pé de um enorme je· quitibá. Era um belíssimo exemplar, com vários me­ tros de perímetro. Suas raizes enormes pareciam ser­ pentes fantásticas penetrando a terra. Dona Laura sentou-se em uma daquelas raíses. Parecia triste, guardando em seu peito uma angús­ tia secreta. Permaneceu, um pouco, em silêncio. De, pois, tomando uma resolução, fez um gesto com a mão, como que ordenando algo. Florindo viu, então, a teiTa abrir-se J entre as duas maiores raízes do je­ quitibá e, no fundo do buraco, divisou uma arca de feno. A um sinal de Dona Laura, como que por en­ canto, a arca veio ter à superfície da solo. Dona Laura abriu-a e Florindo pôde ver a maravilhqso tesouro: aderêços de ouro e brilhantes, correntes fi.. níssimas de ouro e de platina, anéis e brincos a gra­ nel com pedras resplandescentes e multicores, moc­ das de ouro e prata, do tempo do Império e lihras esterlinas, além de um soberbo crucifixo de ouro maciço, todo cravejado de brilhantes e dois rolos de documentos amarrados por uma fita. Dona Laura desatou a fita de um dos documen­ tos e começou a lê-lo em silêncio. Florindo julgou ler o nome de Clodomiro Santiago espiando, indis­ cretamente, por cima do. ombro da dama misteriosa, mas esta, com um gesto enérgico, tornou a enrolar o papel~ colocou"'O novamente na arca, fechou-a eJ dirigindo-se a Florindo, disse: - «Aqui está o meu tesOuro. Estou sofrendo e sofrerei até que alguém o tire dêste lugar•. Olhou, ainda, meIanco1icamente, para a arca I:!: depois, com um suspiro, fez, novamente os gestos com a mão. A arca desceu ao fundo da terra e esta se fe .. chou, coI1).o por encanto. Dona Laura levantou-se, e voltando-se '{)ara

A LENDA DO TESOURO Florindo, com os braços pendidos, em uma atitude de profunda tristeza, fitou·o demol'adamente, atra~ vés do véu que lhe cobria o rosto. Florindo julg'vu ver brilharem nos seus olhos, duas lágrimas... e acordou. Tudo fôra um sonho! Mas que sonhol D~lí Cm diante, Florindo teria a sua vida, para sempre, liga.. da àquela hnponderável dama misteriosa, ,Florindo não dormiu mais. Ouviu o cantar dos galos. Ouviu as carrocinhas de dão rodarem pela rua. Ouviu o bater das cinco horas. Lcvantou-~e e saiu a vagar pela cidade. Dirigiu-se para os lades de Vila Rezende. Já de manhãzinha, chegou ao mato da Baroneza. Que coisa impressionante! Nunca ti­ nha ido àquele lugar, mas como tudo lhe era famI· liar! Chegou ao local em que, acomp~nhand()j {In sonho, a dama misteriosa, havia penetrado no matO. Tudo idêntico ao sonho! Achou o carrendor, entrOu no mato e foi andando. Florindo nao p~l'c{!b;a o or~ valho das plantas que lhe ensopava a l'Ollpa~ nem percebia os acúleos dos cipós que o arranhavam e lhe esfiapavam as calças. Só via o carreador que j4 conhecia e que ia ter ao lugar do tesOurO. Foi an­ dando, foi andando, até que, numa volta, ju~ta· mente como havia sonhado, eis que lhe surg? pela frente o imponente jequitibá! Ali estava aquêle gi­ gante da fJoresta, com as suas raÍ7.es enorm('Sj pen!'~ trando na solo, como :re fossem serpentes gigantes· cas, a guardar o seu tesouro! Oh! Então era verdadel Florindo tremia. O suOe descia em bagas pela sua fronte. Não podia t'acio~ cinar. Tudo aquilo era tão estranha! •••••••••••••••• * •••••••••••••••••••

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Florindo começou a conjecturar sôbre como po­ deria retirar o tesouro. Irja~ sõzinho, escavar o pé do jequitibá? Se fosse surpreendido ali, não poderia se, tomado por um ladI'ão? Poderia, talvez, ir à noite: sem testemunha,· porém, se fosse apanhado, as con... sequências ainda seriam mais grave~. POI' mais que rcfletisse~ não encontrava uma solução. Surgia, sem­ pre, em sua mente, a figura de alguém penetrando clandestinamente em propriedade alheia, cOm fin:. aparentemente escusos. Esta idéia o atormcntava~ Não fazia questão de repartir o tesouro. Mesmo que êle fosse dividido em muita5 partes, sempre lhe sobraria o suficiente para se considerar um homem rico. O tesouro era muito grande. Só aquêles ade rêços com centenas de brilhantes do tamanho de um grão de milho, quantos contos não renderiam? E .) crucifixo de oum maciço, cravejado de brilhantes' Só de ouro fino deveria tecI pelo menos, uns trê", quilos. E os cravos que pregavam o Cristo ao cru" cifixo? Cada um dele. era um brilhante, talvez maior que um botão de camisa. Isto, sem falar nos


7I

A LENDA DO TESOURO menores, que, dispostos em ricos arabescos, orna­ mentavam, artisticamente, aquela fabulosa joia. Não, não fazia questão de repartir, mas devia, d.... qualquer maneira, desencovar 1tquêle tesouro. Pre­ cisava salvar a alma de Dona Laura. Precisava ali­ viar o sofrimento daquela dama misteriosa que es­ colhêJ'a a êle, um pobre e humilde alfaiate, para de­ sEmpenhar tão nobre missão. Florindo resolveu agir honestamente. Escreveu uma carta à Baroneza, relatando o seu sonho e pe­ dindo-lhe autorização para proceder às escavaçõc, ao pé do jequitibá. Não obteve resposta. Escreveu outra carta e mais outra sempre com o mesmo re­ sultado. Não desanimou. Redigiu, cuidadosamente, uma quarta missiva, insistindo com a Baroneza pa ra que autorizasse, com a assistência de quem elL! indicasse, a escavar o lugar do. tesouro. Dias depois recebeu uma intimação para comparecer à Delegacia de Polícia.. Lá estavam .as s~as cartas. . ,A Baroneza, naturalmente, o havia tomado po, um louco ou um visionário~ Louco êle não era, nem visionário, mas descobrira que era vidente. Via Dona Laura, quase que diàriamenteJ não mais em sonho apenas, mas em plena vigUia. Tôdas as vêies que ia aO mato da BaronezaJ lá estava ela, esperando-o, em uma curva do carreador. Outras vêzes, ela lhe aparecia em seu quarto, à noite e sentava-se à beira do seu leito, sempre com aquêle ar de sofrimento in­ definível, misto de compaixão e de culpa. Sim, Flo­ rindo começava a sentir-se culfJado, responsável in­ voluntário pelo sofrimento de Dona Laura. Cada vez que a via, sentia-se desapontado, julgava adivinhar uma sentida nota de censura no seu olhar. Apesar do sua curiosidade em conhecer as feições de Dona Lau· ra, dava-se então, por feliz pelo fato de ela usar aquêle véu. Nessas ocasiões, Dona Laura nada dizia. Ela s6 lhe falava quando lhe aparecia em sonhos. Na Delegacia, Florindo confirmou o que disse­ ra nas cartas. Ficou, então, combinada uma diligên.. <:ia' ao jequitibá do tesouro, COm a presença do ad­ ministrador da chácara e assistência da policia. FIo· rindo exultava. Até que, enfim, estavam dando crédi­ to a êle! Exumariam o tesouro e tudo seria resol­ vido legalmente. E a lei é sempre justa. Não está es­ crito, na Constituição, que todos são iguais perante a lei? No dia marcado, ao pé do jequitihá, encontra­ vam-se, além de Florindo, o administrador Nhô Custódio, um rapazinho chamado Mário, dois sOlda­ dos da polícia e alguns camaradas, para desencovar o tesouro. Retirada a serapilheira que atapetava a super­ fície do solo, o camarada iniciou a escavação. Logo, a pouco mais de um plmo de profundidade, o enxa­ j

dão bateu em coisa dura. lSpa! O nervosismo come­ çou a dominar os presentes. Ninguém falava. A es­ pectativa era geral O operário, com as mãos têmu­

las de emoção, foi retirando a terra, cautelosamente. Viu~se,

então, aparecerem numerosas pedras de dia­

base, dispostas em fileiras paralelas, de modo a for­ marem uma área retangular, cuidadosamente pavi

w

mentada. A surpresa era geral. Alguém comentou; dsto s6 pode ter sido feito por mão de gen­ te!»

De fato, como explicar a presença daquelas pe­ dras ali, no meio da mata virgem e, ainda, tão bem arrumadinhas, COmO que a significar um marco in..

tencionalO operário estava tão emocionado que não ti­ nha forças para segurar o enxadão. Foi substituido por um outro, que continuou o trabalho. As pedras foram removidas e a escavação prosseguiu. NOva surprêsa dominou. os presentes. Mal se havia apro­ fundado alguns centimetr05, eis que surge um re­ tângulo negro, de uns dose palmos de largura por. uns três de comprimento. Seria a arca? Um calafrio percorreu a espinha de todos. Seria a famigerada caixa do tesouro? Não, não era. Tratava-se, apenas,

de uma espessa camada de carvão vegetal pilado e endurecido pelo tempo. Quando o operário começou a retirar o carvão,

o administrador, visivelmente surprêso e amedron­ tado, gaguejou: -

«Pare" não cavoque mais! Vamos comunicar

à Baron"". o que foi achado aqni!:o Florindo não concordou com a paralisação do trabalho, insistindo em que se continuasse a escava. ção, pois ali estavam os indicios de que algo de anor­ mal havia naqu@1e lugar. Agora tinha certeza de que, dentro de poucos minutos, desenterrariam o te­ souro. Nh6 Custódio, entretanto, manteve-se h'redu­

tive!. Com wz trêmula, disse: - «Não! Isto aqui está muito estranho. Eu nãa posso arcar com a responsabilidade do que aparecer neste buraco. Vamos suspender o trabalho, para continuarmos depois de eu ter falado com a Barone­ za). Florindo insistiu, argumentando, discutiu, ten­ tou convencer O administrador de que a êle não ca­ bia responsabilidade alguma, pois ali estava a !>OI!· da, mas foi tudo em vão. O velho não cedeu. Man· dou suspender a escavação, para comunicar à Ba· roneza o sucedido. Retiraram-se todos, convictos de que, logo abai­ xo daquela camada de carvão, se encontrava a arca

prenhe de j6ias faiscar,tes e moedas de ouro e prata. Florindo estava desesperado. Perdera a sua grande oportunidade. Que fazer agora? Esperar :l


72

A LENDA DO TESOURO

resposta da Baroneza para continuar a escavação? Não. Isso não era possível. O seu segredo caíra nt1 domínio público, , De fato, a notícia correu, célere, de boca em boca. No mercado, no jardim, nas esquina, em tôda parte, só se falava no teSOuro. Histórias fantásti~ e mirabolantes se espalhavam aos quatro ventos excitando a curiosidade de uns, despertando um sorriso incrédulo em outros. Dizia~se que um pobre alfaiate, gUiado por sonhos, havia ch:scoberto, na raiz do Jequitibá, um fabuloso tesouro e se tornár.. riquíssimo. Afirmava-se que o tesouro fôra apre~ndi­ do pela polícia, a fim de ser dividido entre o seu des­ cobridor, a Baroneza e o Governo. Asseverava-se; ainda, que, embora eneontrada, a arca não pudera ser exumada, pois uma força estranha a retinha no fundo da terra... e o tesouro lá permanecia, qual lâmpada maravilhosa, à espera de Aladin ... O mato da Baroneza tornou-se frequentado. Para lá afluiram curiosos de tôdas as condiçõ'" so­ ciais. Automóveis de luxo estaciollavam à beira dd estrada e deles saiam cavalheiros respeitáveis e se· nhoras elegantes que, enfrentando os espinhos e os t

cipós, dirigiam.-.se ao jequitibá, para «ver

ó

tesouro».

Florindo asSistIa a tudo isto com o coraçãú amargurado. Não dormia, não comia. Vivia rondan~ do o mato. Presenciando tudo o- que ali se passava Escondido atrás das moitas, protegido pelas sombras do arvoredo, vigiava, dia e noite, o seu tesouru. Viu vultos silenciosos penetrarem no mato, na calada da noite, dirigindo-se ao· jcquitibá. Acompa­ nhou~os. Eram outros tantos garimpeiros improvisa­ dos que, cheios de 'esperança,. tentavam a fortuna, Florindo aliou-se a êles. Não h,avia outra alter­ nativa. Pelo '"lnenos, achariam juntos o tesouro. Ca~ varam, cavaram até alta madrugada, noites a fio, . Uns desistiam, apareciam outros, que também de­ sistiam. Só Florindo perseverava... Cavava, cava­ va, cavava ..•

........... , ............................... .

Estava raiando o dia, quando Florindo termi­ nou a sua história. Os últimos apitos dos vigilante;; noturnos, as carrocinhas de pão e o frio da madru­ gada anunciavam a hora de nos recolhermos. O guar. da Germano ponderou que era perigoso mexer com coisas relacionadas com as almas do outro mundo e se despediu. O grupo dispersou-se. Fui, uma noite, com Florindo, 'ao jequitibá. Meo. amigo Enio nos acompanhou. Era noite de lua e uma leve aragem balouçava as fÔlhas do arvoredo. As sombras do mato figuravam silhuetas de mil duendes, a dançar, silenciosamente, em trejeitos macabros. Ca~ mínhávamos cautelosamente, Florindo na frente, de

pois eu e atrás o Enio, pelo carreador famoso. Che­ gamos ao -jequitibá. Florindo cotucou-me com" co­ tovelo. - «:Voce viu?» disse êleJ baixinho, - .0 quê?» pergntei. - «Dona Laura. Ela estava ali, sentada naque­ le tronco caído, na curva do carreador. Parece que está muito triste», Não. Eu não vira o fantasma. Enio também não. o vira. Entretanto, um calafrio nos percorreu a es pinha e os nossos cabelos se eriçaram. Ficamos. por um momento, mudos, sem saber o que dizer, COme que esperando, perplexos, ver surgir, de repente, de uma sombra mais escura, o fantasma da dama· mis­ teriosa. Cavamos até a madrugada. O buraco já era um poq>. Florindo, lá em baixo, com a água até os jo,­ lhos, enchia a caçamba que nós retirávamos, puxan­ do, a corda. , Ao derredor, tudo estava esburacado. Cova, aqui, covas ali, em· tôda a volta do jequiJibá. Nã,.> havia um pahno de terra que não tivesse sido revira­ do e esquadrinhado pelos cavoucador.,. noturnos. Nós, também, não achámos o tesouro .. ~ e de.. sistimos~ Mas Florindo não desistiu. Continuou ca· vando, cavando, cavando ... Anos depois, foi derrubado o mato. A terra foi lavrada e a fisionomia do lugar perdeu aquêle encan­ to misterioso que lhe dava a mata virgem COm a sua lenda. O últ!mo sinal de que ali existia o famos~ mato da Baroneza, el"ll o tronco decepado do jequi­ tibá, que ainda resistia ao tempo, elevando-se, tris· temente, sôbre a terra nua, como que a guardar, ainda, o tesouro de Florindo ... Quantas vêze" de tàrdezinha, ao par do sol. F1oríndo sentava..se pensativo, num taco, a olhar aquêIe velbo tronco do jequitibá! Ao descerem sô· bre a terra as sómbras da noite, Florindo, im6vel, continuava a olhar a silhueta do velho tronco .. ~ z divisava, então, sentada em uma de suas raízes, a melanc6Hca dama misteriosa ... Hoje nada mais exístc; ne~ Os restos do jequi­ tibá. Dizem, no entanto, os moradores do h.igar, que' O's videntes, quando andam, a deshoras,_pot aquela estrada, vêem um vulto preto, caminhandO, vagaro­ samente, no meio das terras de cultura, para lá e pa­ ra cá, sem cessar. Florindo morreu. Não·conseguiu áchar o tesou­ ro. Quem sabe, um dia, daqui a muitos anos; qua·n­ do Piracicaba for uma grande metrópole e se estive­ rem batendo as estacas de um arranha*ceu, naquele lugar, ainda alguém encontrará a arca fabulosa? Piracicaba, 10 de abril de 1965-_


«Constituição, (Piracicaba): Barbosa x Arruda» Contribuição à mais antiga contenda a respeito dos terrenos patrimoniais de Piracicaba (APONTAMENTOS DE HISTÓRIA PlRAClCABANA) MARLY THEREZINHA GERMANO PERECIN

(Do Instituto IrlStÓriCO e Geográfico de Piracicaba)

(Profa. de História do I. E. «Sud Mennucei» de Piracicaba)

-1­ UM LIBELO ESCLARECEDOR Em 1821 a Freguesia de Santo Antonio de Pi­ racicaba foi elevada a Vila, rcbatizada cOm o nOme de Vila Nova da Constituição. Somente muitos me­ ses lnais tarde, chegaram as autoridades adminis­ trativas de Itú, as quais procederam à demarcação do rodo e ao levantamento do pelourinho na praç&. defronte da Matriz (10.8.1822). O símbolo da sobl'ancerla municipal ocupava o centro' geográfico do rodo, e dele partiam uni qual'to de légua em direção aos quatro pontos cal'­ deais. Esta demarcação efetuada em 1822 ""arretOu seríssimos transtornos, particularmente de ol'dem ju­ rídica, pois acabou envolvendo em litígio os HomeIl~ do Conselho da Câmara e os proprietários estabe­ lecidos, desde o século XVII, nas glebas em afora­ mento dos sertões de Piracicaba. Havia em Porto Feliz um rico pl'oprietário «de: terras, escravaria, engenhos e fábricas de açucarJ>, o Tte. Cel. Theobaldo de Fonseca e Sousa. Até 1821, Piracicaba (como Povoação e depois Freguesia), por motivos de ordem geográfica) esteve sujeita às juris­ dições de ltú (comarca) e Porto Feliz (Vila), da; quais distava 14 e 12 léguas, respectivamente. D:s­ tas, a mais importante era Itú, o grande centro eco­ nômico-político da Capitania de São Paulo, sede do Comarca nos séculos XVIII e XIX, assim cOmO ma triz de povoamento de todas as comunidades da

bacia fluvial do Tietê, a partir do século XVII. OS mais antigos povoadores piracicabanos, dali proce-­ demo Testamentos, inventários) -escrituras de trocas, compras e vendas eram lavradas em Itú, até 1797, quando a Freguesia de Araraitaguaba (Porto Fe­ liz) foi elevada a Vila, e ali Se passou a registrar a maior parte da nossa documentação. Pois bem, .} Tte. Cc!. Theobaldo da Fonseca e Sousa, cidadão res­ peitado em tôda a Capitania, l'Csidente em Porto Feliz, amplamente l'Clacionado em Itú e São Paulo, possui a em Constituição (Piracicaba), uma excelen­ te propriedade, adquirida «a título de compra». A localização geográfica desta gleba era exce­ lente; fazia testada com o Rio Piracicaba nos seu~ dois trechos principais (o Rio Abaixo e o Rio Aci ma)t tendo por vizinhos antigos moradores locais: Isabel Barbosa (a irmã de Antonio Correa Barbo sa, proprietária na margem esquel'da) ~ B~nto José Ribeiro, o Sargento Mor Carlos Bartholomeu de Ar­ ruda, e o falecido Alferes Luís Teixeira. Na bela propriedade à margem do Rio Piracicaba, êl~ pos" suía «Engenho e casas de morada; pastos, gado, ca­ naviais, Javoiras, escrava ria e matas». E para sua imensa satísfação, as melhores terras do Distrito des· ta Vila! Durante sete anos, o Tte. CeL Theobaldo da Fonseca e Sousa usufruiu da propriedade, pacifica.­ mente, até que na tarde do dia 8 de agosto de 1822, sendo já quase noite, com grande alarido, e gente annada, a maneira dos Povos Bárbaros, se derrubou todo o feixo que 5eIVia de ataque ao Prédio e pastos


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CONSTIT

do Autor, metendo-se machado nos portões, expon­ do-se todos os seus canaviais e mais lavouras a vora· cid~de dos animai, da Vila, ... carregando a gen­ talha toda a madeira daquele feixo, obrando-se tu­ do sem a n1enor atenção nem respeito as Leis, paI' que neste caso pode mais o despotismo do que as mesmas Leis, despresando-se até as naturais que prei.:: bem não fa4e!' aos outros aquilo que cada um não '1uiser que lhe façam» (Autos do Libelo, Cartá.io do 1.0 Oficio, Piracicaba) .

Dois dias antes da instalação da Vila pelo Ou­ vidor de Itú, José de Medeiros Gomes, era invadida e depredada li propriedade do Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sousa) pelo povo, «com grande alari­ do, a moda dos Povos Bárbaros», em ato deflagra­ do pelo Sargento Mór Domingos Soares de Barros, o Comandante de Armas e os seus sequases agentes: Jerônimo da Silva Bueno, Francisco Telles Barreto, José Maria de Athaide, Antonio de Campos Bicu­ do e João Manoel Carneiro Brandão. As!'im; invo­ cando os Direitos do Homem e preceitos evangéli­ cos, protestando jusla causa e legítima defesa, o pro­ prietário nomeava os cavalheiros acima como auto­ res e agressores no crime, denunciando os seus desatinos, responsabilizando-os pela «total destrui­ ção da ~ua propriedade e lavoiras, pastos e grande mortandade de seus animais» ... «e cujos estragos eram avaliados na época em 14 mil cruzeiros> (Au­ tos do Libero - Cartório do 1.0 Ofício, Piracica­ ba). O crime havia sido praticado em 8.8.1822. O Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sousa s"ment" requereu à Justiça em 1825, através do Seu bastante procurador Manoel Frederico de Sousa, por se achar enfenno na Vila de Porto Feliz. E em nome do «Sagrado Direito de Propriedade», moveu uma ação de Libelo contra os acusados, desencadeando uma contenda, que se arrastou por muitos anos, e que acabou «por isto mesmo», uma vez que gente do po­ vo já se havia estabelecido na propriedade, na con­ dição de "Posseiros:!>.

o mais curioso deste processo não é o fato em si, o edme de violação de propriedade, mas a dispu­ ta travada entre os elementos Jítigantes; e a luz qUi! esta projeta sôbre acontecimentos ocorridos eIll, fins do século XVIII e início do século XIX, ajudando o entendimento da figura-chave da Hist6ria píraci­ cabana, o ituano Antonio Correa Barbosa, o seu Di­ retor-Povoador e Capitão Fundador.

UI~O:

(PIRACICABA): BARBOSA X ARRUDA» -11­

CLIMA DE INSEGURANÇA NA VILA

DE CONSTITUIÇÃO (PIRACICABA)

o exame dos autos cíveis do Libelo movido pe-. lo Tte. Cel. Thcobaldo da Fonscc.l e Sousa contra o Sargento Mór DOlningos Soares de Bano:s e outros, dá conla do clima de instabilidade e insegurança p". lítica reinante na Vila de Constituição (Piradca.. ba) da Fidelíssima Comarca de Itó, em 1822. Vicente de Campos Gurgel, responsável pelo Juízo Ordinário da Vila (cem alç.da no Cível e no Crime), devia julgar o «bárbaro, d"pótico e injurí­ dico procedimento» contra o qual o suplicante (Tte Cel. Theobaldo) solicitava a aplicação do Capítulo Único, Artigo 16, Parágl-afo 6 da Constituição do Império Brasileiro de 1824. O julgamento teve iní­ cio. Até a presença do Alcaide da Vila, Inácio de Almeida Lara, foi exigida, na sessão convocada por ordem do Juiz, na qual todos os implicados foram intimados a comparecer, sob pena de revelia. A pri­ meira reunião realizou~se na própria residência do juiz, perante todos os réus, testemunhas, alcaide, juiz e escrivão. A defesa dos réus solicitava que ficassem definitivamente esclarecidos: 1) o Sargento Mor D<>­ mingos Soares de Barros era realmente o Ccmandan­ te de Armas da Freguesia na época, mas nãó havia sido êle, nem tão pouco quaisquer dos acus~dos, o:, participantes do ato de violação da propriedade; 2) " instrumento da ação a que se referia o Libelo, era o Povo, em massa acompanhado do Oficial de Justiça. por determinação do Governo, a fim de dar cumpri­ mento a um despacho do De. Desembargador, cria­ dor da Vila. Finalmente, para reforço da argumen­ tação eram citados os livros da Câmara, onde se achavam inseridos aqueles provimentos, Fato curioso: após a assinatura de Domingo:; Soares de Barros, seguem as assinaturas dos acusa­ dos, mas a tôdas elas antepõem as expressões «como povo« ou «eu O povo». Exemplos: (eu o povo) João da Fé do Am,ral (como povo) José Maria de Athaíde. Os implicados recusavamwse aceitar a resp~nsa­ bilídade individual. A idéia de povo também apare­ cia estreitamente vinculada a de responsabHiôade CO~ letiva frente à Lei do Império. Enquanto durou esta contenda, ambas as fac­ ções defenderlam-se, apelando para os sens legíti­ mos direitos constitucionais. E cada uma das partes possuía o seu «pouco de razão». O Tte. Ce!. Theobaldo da Fonseca e Sou,,, es­ tava a reclamar oS atentados que sofria a sua pro­ priedade particular. Os representantes do povo ale­


«CONSTITUIÇÃO (PIRACICABA): BARBOSA X ARRUDA» gávrun como justa a derrubada das cercas, pois es~ tas se achavam situadas dentro do rodo, tolhendo o prosseguimento da urbanização.

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era o único proprietário nestas condiçõcs. Em 1822

Jundiaí, Itú propriamente dito), e até mC<mo na Imperial Cidade cabeça desta Província (onde exis­ te o Grande Cercado do Bexiga) e também na Corte do Rio de Janeiro» '" eles existem. E a seguir: «ná" consta que em parte alguma, por motivo de Rocio

havia em Constituição (Piracicaba), rQuitas proprie­

se expulsasse alguém das suas propriedades, princi..

O Ttc. Cc!. Theobaldo da Fonseca e Sousa não dades e engenhos compreendidos na meia légua elll

pahnenle quando ali se erguiam Fábricas de Açú­

quadra.do Rocio, tais como: o Engenho de Da. Ma·

car, que eram mandadas conservar por Privilégio

ria da Meira e os seus filhos (era a vÍúva de Carlos

Real» ... e tanto, que «nem pOl' dívidas se pode

Barlholomcu de Arruda), a chácara de Luciano Ri­ beiro Passo;; os Engenhos da Sociedade do Vigário, u Pc. Manoel Joaquim do Amaral Gurgd; o Engenho de Da. Maria de Arruda (viúva de Francisco Fran­ co da R~cha) na margem direita, logo ao pé do Sal to; a chácara do Pe. Miguel do Amara! Gurgel; o cercado inculto do Dignatário Vergueira (N;colau Pereira de Campos Vergueiro, o notável politico da Independência, do 1.0 Reinado e da Regência), "

desunir suas terras e utensílios. A Constituição Po~ litica deste Império, Capítulo 8, Artigo J79..';22, grt­

rantia o Direito de Propriedade do Cidadão da a sua plenitude.

Cm

tô­

-ID­

CONS'i'lTUIÇÃO (PIRACICABA), SEUS CABEDAIS E SUA «REVOLUÇÃO"

qual ficava na ladeira que descia para o rio, na mar­

gem esquerda; e ainda o cercado do Almotacé da Correção da Vila. S,mente três propricdados foram submetidas a violações, por parte. dos homens da

Vila, justamente as do Tte. Cel. Theobaldo da Fon­ Seca c Sousa, de Da. Macia da Meira e a de Luciano Ribeiro Passos, as quais diz o Libelo, doram aber­ taS e destroçadas com grande motim e gente ani~ mada apesar de estarem mais longe do CCn tI'O d:1. ·Vila». As demais" e que também eram contígua~, fo ram respeitadas.

O Libelo não poupa a pessoa do Sargento Domingos Soares de Barros: «pers:-guidor,

M·',.

inifi1i~

declarado do Tt". Cel. Thcobaldo, invejoso de tudo () que êste pos.'iuia, principalmente da propriedade

tida como o melhor sítio da Vila~. (Rcsponsabi!i por: J) valer-se do s6rdido estratagema de esti­

::ta-O

mular a população ao motim, mercê da sua p':Jsiçã" de Comandante c de sua aliança com os réus; 2) va­

ler-se da sua influência sabre o Ouvidor da Comarca de Itú 1 conseguindo dêste o consentimento para

';t

execução do atentado à propriedade alheia; 3) viola­ ção dos direitos alheios para a satísfação das suas paixões particulares, «destruindo com mão oclllt~ e com o. maior disfarce que lhe foi possível, a fim de ver se não recaia nêle a indenização dos gravís­ símos prejuízos». E ainda deixava bem claro: «05

pobres plebeus de Constituição» ... «sem Conselho, impulso e promessa deste indivíduo, de certo não se atreveriam a obrar tal atentado~. Concluindo o longo arrazoado: «se houvesse I.ei. ou costume antigo de invasão e posse de prédios com· preendidos na meia légua do Rodo na Ereção dali Vilas, não se veria mais nesta Província e mais par­ tes deste Grande Império, sítios, engenhos e cháca­ ras. porque em t8das as Vilas circunvizinhas dec;t'l

comarca de Itú (Porto Feliz, São Carlos, Campinas,

Parecia ter carradas de razão o Ttc. Col. Theo. baldo da Fonseca e Sousa, ao repudiar a violência e a ilegitimidade do ato praticado pelo Sargento Mó, Domingos Soares de Barros e suas gentes. O promo­ tor do Libelo via no atentado a vingança pessoal de alguém, empenhado em conseguir a sua perdição. Apresentava em cores sombrias o estado em que se con!lumia a sua propriedade arruinada: pastagens reduzidas, matas devastadas, animais morrendo. S6 de bois, havia perdido mais de 30, assim como mui~

tas vacas e novilhas - tudo por falta de pastos. O Engenho estava quase paralisado, produzindo apzna, «umas porções de açúcar, que nem chegavam para as despesas», apesar da «escravatura organizada e as melhores terras de todo o Distrito da Vila». As queixas comovedoras lembram o mais atroz infortúnio. Até mesmo o administrador e mais seis escravos foram submetidos à prisão e espancamento: inicialmente por haverem cortado, a mando do pro­

prietário (Tt•. Theobaldo) os três esteios, que o in­ trigante Manoel Dias Ribeiro havia finc.ado no solo dos ~eus pastos, jlegalmente. E pensar que o queixoso ainda tc\'e de arcar com a despesa da soltura dos 7

homens, mais o prejuízo de haver ficado a sua Fá­ brica 50 dias, sem Um só negro, isto porque no a,-.,w salto do dia 8, os escravos também foram violenta.. mente espancados, ficando três deles feridos, grave­ menteJ .

(',ondoídos pelo pesar do latifundiário, pereehe­ mos a real intenção do Conselho da Vila: permitir o engrandecimento do perímetro urbano nas terras do Rocio, consentindo que a crescente população se

apossasse dos terrenos cercados. Quais seriam os fa­ tores condicionantes na dinâmica do processo desen..

volvímentista piraelcabano- Colhemos algumas in­ formaç<les a respeito. Vejamos:'


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CONSTIT'UIÇAO: (PIRACICABA): BARBOSA X ARRUDA"

Uma «representação. feita em 1816 (6 anos an­ tes do atentado à propriedade do Tte. CeL Theobal­ do d. Fonseca e Sousa), ao Capitão General Conde de Palma, por parte das duas mais expressivas aul<'­ ridades da Freguesia de Piracicaba, o Vigário Go­ lado, Pe.Manoel Joaquim do Amaral Gurgel, e o Capitão Comandante Domingos Soares de Barros, sumariava notícias circunstanciadas a respeito da comunidade. Referia-se a 18 Engenhos levantados e 12 outros por fazer; daqueles em funcionarnento J 14 eram de açúcar e 4 de aguarden te. Havia muita'S telTas cultivadas, 22 Fazendas de criar e uma popu­ lação tocalizando 2,200 habitantes! (História d. Fundação de Piracicaba - Mário Neme) , Pouco mais deveria ser Piracicaba, no momento em que se erigiu em Vila, ano de 1821. Estas informações lisonjeiras de 1816 contras­ tam violentamente com aquelas obtidas em 1786. Na Carta enviada de Itú ao Capitão Genoral de São Paulo, dois anos após a transladação da comunidade da margem direita para a esquerda, mendona~sc que a população de Piracicaba era constituída em sua maior parte de «indivíduos de ínfima plcb?, COm~ são mulatos, índios, bastardos e aquelt!s que por sua má conduta se faziam inúteis nos lugares da sua an­ tiga residência». Não tardaram a se juntar outros elementos: os que chegavam ao sertão, fugindo do bárbaro sistema de recrutamento, neccs~itrio para o fornecimento das «tropas de linha», que durante o Governo Pombal, combatiam duramente no Sul e Ccntro-oeste, evitando a invasão castelhana captlz de golpear São Paulo pelas costas, vinda da Bacia Platina até o Tietê. Felizmente, os Tratados de Li, mites posteriores ao de Madri (EI Pardo e Sto, IIde­ fonso) e a mudança de orientação na política dos reinos ibéricos~ alteraram esta situação. Sob o rcÍ­ nado de Da. Maria I desanuviou-se a tensão nas fronteiras, reforçando-se o esquema colonialista. A política eminentemente agrária e ruralista da Rainha beneficiava indiretamente Pil"acicaba: VaiOrl7.ou-se o sertão? gnlnde n(lm-ero de p:JvoadOI'CS .anuia de Itú e Porto Feliz) multiplicando-se as ses­ marias. Não tardaram a surgir novos balizamentos d(! povoa~ões em dil'eção de Lim~il'a) Araras! Rio Claro e dos Campos de Araraquara, Segundo obn'­ vamos no Livro n.o 1 de Notas (Cartório do Lo OH cio, Piracicaba), ao findar o século XVIII, tôda a área do sertão de Piracicaba já estava retalhada em numerosas propriedade? praticando-!c policultul'u (cereais: milho e feijão, mandioca e cana) e pecuá­ ria. Ao iniciar o século XIX, já havia se e!itabe1eci­ do a nomenclatura dos bairros (Saltinho, Taquaral. Pinhal, As Araras, Rio das Pedras. Corumbataí), das paragens (Morro Azul, Tijuco Peto, Palmeiri..

nha, Alambari e Congonhas) e nos sítios (Algodoal, Itapocu-Guaçu, Ribeirão das Panelas). Havia lUui­ tos Engenhos nos quatro principais bairros: o de Rio Acima, o de Rio Abaixo (os dois mais antigos)) o de COl'lllnbataí e o de ltapeva. A urbanização defeituosa e incipiente respeitava ainda o pátio de 46 braças em quadm no sentido dus quatro pontos cardeais, delineado pelo Mestre Enta­ Ihador Almador em 31.7.1784, quando a povoação foi trasladada de uma margem para a outra. As ruas somente foram assentadas no início do século XIX,. pelo Alferes José Caetano Rosa, configurando-se melhor passagem urbanística. Quando Pirac:caba se; fêz Vila, os nomes das ruas eram Os mais pitorescos. exemplo: do Vigádo, de trás da Matriz, da GJória~ de Santo Antonio, do Itapeva J do Sz,bão, da Cadeia Velha, das Flores, da Praia, da Boa Vista, da Es­ trada para Mato Grosso. No plano sócio-econômico Piracicaba se hal'mo nizava no quadro geral brasileiro do comêço do­ século XIX. Ocupando o Lo nível da estratificação social~ eslava a «nobreza» terratenente, originária de Itú Porto Feliz e São Paulo, de onde saíram os pcr­ sonagens mais atuantes nOS epis6dios piracicaba nos . Seguia-se o grupo urbano, distribuído Qas rúas Cln delineamento no rocio, também ligado à t.er:ra, pro­ prietário de chácaras e sítios, extraordínàriamente atuante na vida do Concelho da Câmara. Outro grupo urbano, porém inferiôr em importância social", vivia de pequenos afazeres e de algumas roças. O Li· belo do Tte. CeL Thcobaldo da Fon,cca e Souza chama de «os plebeus», constituído de brancos r:. mestiços, também interessados nrs movimentos d': Vila, e que serviram de instrumento na dcn'ubada das cercas das propriedades. Os vadios e Os indi~ t!<'nles se lhes juntavam nos movlm:-ntos de massa. Finalmente, a força de trabalho, a mão de obra es­ crava, incorporando nPgros, pardos e mesti,..os, de procedência diversa. Na estratificação social cxtremamente ~ imp1cs,. do comêço do século XIX, não eram numerosos 0<; representantes do grupo latifundiário que sustentou o sistema escravista no Brasil e no Império. Predo­ minava o grupo urbano constituído pelos homens públicos e pelos plebeus; a este se incorporava a «gentalha, que refere o Libelo. Era meSmo tão in­ flnente, que «todos lh('s obedeciam», e com esp:;da· )idade a «g'cntalha» de que S~ servia prl.ra «tão sin:s­ tros fins~ por ser genle pr6pria e quem em todos os tempos tem servido de instrumento das Revoluçôes e motins, não 56 por terem pouco quc p?l'der como' pelo muito que esperam buscar a custa alheia, como tem acontecido com estes revolucionários, que nã:) tendo meios de possuírem um palmo de terra, hoje f

j


"OONSTITUIÇÃO (PlRACICAM): BARBOSA X

,

não só possuen1 muitas braças COmo propriedade, que tem fcito a custa do terreno e matas dos pro~ prieláríos por êles destroçados». (Autos do Lib,lo. Cartório do Lo Ofício, Piracicaba). Estávamos na época das bernardas, dos motius de tropas e das guerras da Independência. A turba que o Tte. CeL Theobaldo da Fon"e. e SOusa de­ nuncia nO Libelo (<<a gentalha.) não pndia deixar de agir, senão, mediante o espírito da época e a li­ derança urbana. O grupo de aventureiros estabeleci~ do nos sertões do Piracicaba, após as GuCrtas do Sul, não parecia imune à Ideologia Revolucionária e ao Contrato Social. O .bem público. cOm fina­ ]jdade coletiva, sobrepunha-se~lhes, aos an-azoado!i do interêsse material, justificando à saciedade, a posse dos terrenos patrimoniais do roeio, na Vila dl~ Constituição, incompreensivelmente cercados por particulares. Com enorme satisfação e na condição de «povo» puzeram abaixo as cercas, em nOme do Direito da. Gentes e do progresso da Vila!

-IV­ CONSTITUIÇÃO, A «POLíTICA FEUDAL» DOS 40 COLIGADOS, TERRAS E ESCRAVOS O crescimento populacional e a necessidade d" expansão urbana obrigaram o Concelho da Câmara a tomar a séria decisão de derrubar os: cercados das propriedades particulares que se intrometiam nas terras patrimoniais do rodo. Foi impossível COnCI­ liar as duas partes litigantes, o Concelho da Câmara de Constituição e o proprietário rural Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sousa, pois o atentado do dia 8.8.1822 tinha motivações anteriores, muito graves. Embora fizesse parte do «partido feudal. do,; 40 Coligados, a socíedadc intcgrada polos grandes propl'ÍetálÍos de terra (o, latifundiários do Velho <Ocste paulista), inimigos declarados dos Concelho, das Vilas, o Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sou­ sa, era Homem de bem. As suas terras, em Piraci· caba, êle as houve por titulo de compra de proprie­ tários anteriores. Uma parte foi adquirida de José Coelho Barbosat juzante ao Rio, em local onde êstl! havia tentado fundar um Engenho, empresa desas" trada, por causa das enchentes e pela falta de que­ das d'água. Outra parte, foi adquirida ao Vigário Manoel Joaquim do Amaral Gurgel com o objetivo de ali fundar a sua «fábrica de açúcar:.~ erguer ca­ sas de morada, construir monjolos e desenvolver p'lS­ tos. Esta última propriedade era contígua a primeira e acompanhava a beira"Tio, até mais ou menOS a úl­ tima olaria da Avenida Miguel Dutra, na parte do Río·~acima, vizinhava com os terrenos de Isabel Bar·

ARRUDA»

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bosa e Da. lv1aria Meira Siqueira, antigas proprie­ ~ tárias locais~ O Sargento M6I' Domingos Soares dc Barros também era pessoa honrada, gozando de grande pre~" tigio na Vila, tendo sido nomeado Capitão Coman­ dante da Povoação, pelo Concelho. A sua fi­ gura, juntamente com outros réus, foi identi­ ficada nos acontecimentos de 8.8.1822 e o Libelo sc lhe refere com particular virulência, apontando-o co" mo o «cabeça» do motim. O acusado defendeu-se «}Jm' todos os meios», negando a liderança da d: t'l'U~ bada das cercas, afirmando sempre que a sua parti­ cipação era de mero espectador, e ainda na quali­ dade de Povo. Pretendeu, até, defender-se em sepa­ rado dos outros réus, chegando a fazer um requeú.. mento ao jUiZl o que foi considerado injuridico c matéria desprezada. Claro, pois quem julgou - Vi· cente de Campos Gurgel, também fazia parte do Pal'lido dos 40 Coligados, o grupo feudal, do qual existe uma relação completa no Arquivo do Estado. Folheando os autOs do Inventário de Domingo::. Soares de Barros (1849 - Cartório do Lo Ofício, Piracicaba), vimos que o principal acusado era ho­ mem rico, o que invalida a acusação de haver êle se aproveitado do motim para servir a seus próprios in~ terêsses. Lemos o seu testamento e verificamos q lte era natural de Itú (como a maioria dos terra tenentes locais), integrado a uma das mais respeitáveis. Or" dens religiosas daquela cidade, a Ordem Terceira de São Francisco. Independentemente dos dados biográficos~ êste documento fornece notáveis subsí~ dios à História piracicaba na. O falecido deixava for­ tuna imensa para a época: bens m6veis, bens de raí­ zes~ e abundante (!Scravaria, o mais valioso capital da época. Temos procurado observar a valorização das terras pof;tas a venda em Piracicaba, a partir do sécu­ lo XVIII. Ainda no início do século XIX, o. Li­ vro, de Notas de Itú, Porto Feliz e Piracicaba (Car­ tórios de 1.0 Ofícios) registram, frequentementt"', os eontratos de compra e venda (Escrituras), onde um bom trato de terra, custava invariàvelmente, me­ nos da metade do prêço de um escravo enxadeiro. No Cartório do 1.0 Ofício, de Piracicaba. vimos muito sitio e muitas ratas, vendidos por 60$000 (ses­ senta mil réis) e Cr$ 10$000 (dez mil réis), enquan­ to um bom escravo (o macho adulto), era normal­ mente avaliado em 355$000 (trezento, e cinquenta mil réi.). ou 400$000 (quatrocentos mil réis). As «peças femeas» (as escravas), obtinham preço infe­ rior, j!Oralmente na altura dos 300$000 (trezentos mil réis). Analisando muitos outros inventários, princip~lmcnte o de Carlos Bartolomeu de Arruda, constAtamoc;. a mesma vaIoriz.a.ção. Posteriormente, o desenvolvimento da agricul..


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CONSTIT UIÇÃO: (PIRACICABA): BARBOSA X ARRUDA"

tura da Província de São Paulo, estimulando maiol demanda de mão de obra e a legislação repressiva (Lei Euzébio de Queirós - extinção do tráfico), fizeram subir, verticalmente o prêço dos escravos Em 1885, no Inventário do Dl'. Francisco Ferraz de Carvalho Barros, peças regulares (machos adultos) eram avaliados entre 450$000 a 500$000. No Inven­ tário de Francisco de Sousa Barros, aberto neste m:s· DIO ano, mas encerrado muito tempo depois, os prê­ ços de escravos refletem a onda altista, consequente a Lci Saraiva-Cotegipe (1885), favorável aos sexa­ genários. Os valores estipulados- «850$000 para mais» (o macho adulto) e «i50$000 para mais. (a mulher de enxada) . Voltando ao texto do Libelo, verificamos que o Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sousa não era o único reclamante contra a invasão de terras, nem o primeiro a ter sérios problemas COlTI o Concelho da Vila, a respeito dos limites patrimoniais do Rocio. No levantamento desta curiosidade, buscamos o Li­ vro de Notas n.o 1 (Cartório do. 1.0 Ofício, Piraci­ caba), onde encontramos a petição (Folha n.o 5 do livro citado) de Da. Maria de Almeida do Amaral, viúva do Capitão Francisco da Rocha e proprietá­ ria de um «Engenho com fábrica de açúcar» e terras de culturas, obtidas a 'título de compra. A proprie­ dade era «sita ao pé do Salto», c aconteceu que a de­ marcação do rocio para a nova Vila da Constituição, recentemente ereta, atravessava 6 Rio, entrando por grande parte das suas terras; de tal forma, que fi­ cavam o seu Engenho e mais çle 200 braças de ter­ ras de culturas compreendidas nas glebas patrin10- . niais da Vila. A suplicante receava que lhe. aconte· cesse o mesmo que ao Tte. Cel. Theobaldo e que os moradores da Vila ali se apoderassem, fazendo «ar­ ranchamento:1>. Desta forma, pedia ao Desembarga­ dor Ouvidor Geral, que não consentisse o estabele­ cimento de pessoa alguma em suas terras, apesar do marco posto em sua propriedade. Outrossim, decla­ rava haver sempre consentido na passagem de mO­ radores e passageiros para a Freguesia de Araraqua­ ra, e nunca se havia oposto à retirada de lenha, c:p5<: e combustíveis para as obras públicas e particulares. Algo muito sério ocorria na Vila de Constitui­ ção, motivando simultâneamente a violência do po­ vo contra as propriedades cercadas e os protesto,:; part iculares em defesa do Sagrado Direito de Pro­ priedade. A quem regponsabiJizar? Quem foi o par· tidor das glebas em Piracicaba?

-vMISTERIOSAS PERSONAGENS: ENIGMATICAS

PARTILHA~

O Tte. Cel. Theobaldo da Fonseca e Sousa era natural de São Paulo, mas achava-se estabdecido em Porto Feliz, onde se converteu num riquíssimo pro· prietário de terras, bens móveis e abundante escra· varia. A Oligem das suas terras em Piracicaba re­ monta à entrega, por dívida, de 1:340$000 (hum conto e trezentos e quarenta mil réis(, que José Coe­ lho Barbosa e sua mulher lhe fizeram «de uma sorte de terras lavradas, em 1.0 de novembro de 1812» Estas terras mediam meia légua de testada e uma lé­ gua de sertão, vizillhando com Bento José Ribeiro. e da outra parte com as terras que foram da falcci­ da Isabel Barbosa, a partir destas, a propriedad~· confinava com as terr.as do Sargento Mór Carlo~ Bartolomeu de Arruda. A testada era para a beira do Rio Piracicaba (Escritura de Convenção e Trato de Ajustes de Conta passada em Porto Feliz e trans­ ladada para o Libelo, onde consta à página 15). Outra parte da propriedade do Tte. Cel. Theo­ baldo da Fonseca e Sousa resultou da compra de uma chácara que havia pertencido ao Revdo. Vi­ gário Manuel Joaquim do Amaral Gurgel (a qual tâmbém se intrometia no roeio), pelo valor de ... ~ 500$000 (quinhentos mil réis). Procurando as ori­ gens deste terreno, constatamos que o mesmo per-o tenceu a Maria Flor, a filha de Isabel Barbosa e sua respectiva herdeira; igualmente personagem central do mais rumoroso romance do século XVIII, e ain­ da, sobrinha de Antonio Correa Barbosa. A chácara de Maria Flor acabou passando das mãos do Vigá­ rio Gurgel para as do Tte. Cel. Theobáldo da Fon seca e Sousa. Os pastos destas duas propriedades contÍ~uas foram unidos. As cercas div:sórias desaparec:ram, c na nova chácara organizou-se a fábrica de açúcar,. levantando-se casas de moradas e monjolos. Desta maneira, a enorme propriedade do Tte. Cc!. Theo­ baldo da Fons:::ca e Sousa ficava «a vista e face de· toda esta Vila», e além do mais, contida nos limite,:;. territoriais do Rocio. Uma vez esclarecida a prcc:dência das terras do latifundiário de Porto Feliz, qual teria sido a ori-· gem das terras dos proprietários nomeados em docu­ mentos mais antigos? PJr exemplo: Jos~ Coelha Barbosa. Quem teria sid:l o repartidor das terras na área do rodo de Piracicaba? Vejamos o primeiro caso, reC:lrrendo ao teste­ munho do Tabelião Franci'"co Peixoto de Sousa Ma-· chado, de Porto Feliz.


«ÜONSTlTUIÇ~O

,

(PIRACICAB~):

BARBOSA X ARRUDA»

José Coelho Barbosa e sua mulher Da. Maria Angélica do Anlaral eram proprietários em Piraci­ caba. Parte de suas terras havia sido adquirida ao sesmeiro Inácio de Almeida Lara. Outra parte, cons~ tava de uma rata que já lhes pertencia. O resto, era fruto de uma pelmuta de terras com o Sargento Mó,' Carlos Bartolomeu de Arruda. Cópia da Escritura de Troca enll'e Carlos Bartolomeu de Arruda e Jo­ sé Coelho Barbosa datada de 2.12.1799, cOnsta no Livro de Notas n.o 1 do Cartório do 1.0 Oficio de Porto Feliz. Ficamos inf01111ados que na Freguesia de Santo Antonio de Piracicaba, Termo da. Vila de­ Nossa Senhora Mãe dos Homens de Porto FeF:z, co­ marca de São P,aulo, os vendedores outorgante'i, o Sargento Mór Carlos Bartolomeu de Arruda e sua mulher Da. Maria da Meira Siqueira, diante de tes­ temunhas e na fanua legal, trocaram as terras que possuiam por título de compra, com as de José lho Barbosa, no lado do Piracica-Mirim. José Coelho Barbosa recebia por troca, as terra;, situadas na beíra~rio cOm 200 braças de testada, a partir do padrão da Vila, correndo o sertão no ru­ mO Sul. Posteriormente outras duas glebas foram incorporadas ao patrimônio de José Coelho Barbosa, a título de compra de Carlos Bartolomeu _de Anu­ da e sua mulher. Estas duas glebas estavam ori~ina· riamente compreendidas na sesmaria que o casal possuía em Piracicaba. Dali f01'am repartidas e ane. xadas às terras de José Coelho Barbosa. A primeira delas, começava exatamente onde acabavam as 200 braças da troca anterior; seguir, corria o Rio Piracicaba acima para a ponte novtl até entestar no pOl'to na estrada que passava pela Fre guesia (Estrada para Mato Grosso), servindo de di­ visa o Rodo. A segunda parte começava ná Estl'ada que acoropanhav.a o c6rrego Itapeva acima) até inteirar 300 braças. O valor total da compra alcan­ çava 51 $200 (cinquenta e hum mil e duzentos réis), que os vendedores declaravam pagos e satisfeitos em Escritura trasladada do original, em 11.1.1823, por Manoel Pereira de Almeida, Tabelião de Porto Fe­ liz, especialmente para constar no Libelo. Continuando nossas pesquisa~, deparamos outro caso notável, envolvendo Felipe CardosoJ 5e"imeiro mais importante da região, e Carlos Bartolom~u de Arruda, Sargento M6r de Piracicaba. Consta na Folha 23 dos auto, clveis do Libelo de 1825 (movido pelo Tte. Cc!. Theobaldo da Fon­ seca e Sousa), o traslado de.um documento de ex· traordinária significação. Trata-se da pública forma de um crédito passado em 16.10.1760, em Ararita­ gllaba, envolvendo Felipe Cardoso, devedor) e Fran~ cisco Cardoso de Campos, credor. Esclarecendo: Fe­ lipe Cardoso, sesmeiro desde 1726, das terras que

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abrangiam as duas margens do Rio Piracicaba, tendo o Salto de pelnlcio) abandonava por dívida, ao seu sobrinho Francisco Cardoso de Campos «uma sOrte de terras» que possuía, as quais constavam de meia légua em quadra, a partir do porto do Salto de Pi­ racicaba) para cima e para baixo, pela quantia de" 200$000 (duzentes mil réis). Descobrimos, final­ mente o destino das terras obtidas da Coroa portu­ guesa por Felipo Cardoso, povoador desde 1726. Francisco Cardoso de Campos foi O segundo grande proprietário em Piracicaba. Do 1.0 s~smeiro, Pe­ dro de A10rais Cavalcanti não restaram vestígios (História da Fundaçoo de Piracicaba, Mário Neme; História de Piracicaba em Quadrinhos, ,Leandro Guerrini; Documentos Interessantes - Depto. do Ar", quivo do Estado de São Paulo). Logo depois, parte das terras de Franci,co Car· doso de Campos passaram às mãos de Car!os Bar­ tolomeu de Arruda e sua mulher, os quais se decla­ ravam proprietârios «a titulo de compra», por aqui.. sição que fizeram ao herdeiro do falecido Francisco Cardoso de Campos, um personagem quase desco­ nhecido. Considerando êste assunto, o causídico Prudente de Morais (Presidente do Brasil: 1894-1898) e o historiador Mário Nem. (Histólia da Fundação de Piracicaba), ambos põem dúvida s6bre a legitimidade da posse destas terras por par­ te de Carlos Bartolomeu de Arruda e sua mulher. O Presidente julga «nulo e burlo» o thulo de posse, re­ duzindo os personagens a condição de usurpadol'es (Mário Neme, obra citada). A hipótese que se levanta: Carlos Bartolomeu de Arruda convenceu o herdeiro de Francisco Car­ doso de Campos, o qual vivia em Porto Feliz, em extrema miséria, a realizar uma nova venda, da me.;;.. ma terra que já havia sido vendida a Antonio Car­ doso de Barros, em 1784, sob a alegação de que o negócio ficou sem pagamento. Com efeito, Carlos Bartolomeu de Arruda já havia recebido uma sesmaria em terras contiguas àquelas de Antonio Corre. Barbosa (adquiridas ao herdeiro de Francisco Cardoso de Campos). Bastou­ lhe unir as duas propriedades: a ,esmaria e a gleba vendida pela segunda vez pelo herdeiro de Francisco Cardoso de Campos. Postcrionnente, êle e sua espô­ sa foram os grandes repartidores de terras em Pira­ cicaba. Quando faleeeu Carlos Bartolomeu de Ar­ ruda, ainda estava intacta a grande propriedade (sitio e terras de cultura), avaliada em 4:800$000 (quatro contos e oitocentos mil réis), estendendÚ"'se paralelamente ao Salto de Piracicaba, e intrometen.. do-se no rodo da Vila. O seu Inventário (Cartório do 1.0 Oficio de Piracicaba) revela enormes cabe­ dais: casas de morada na rua do Porto e na rua da


/lO

CONSTIT UlÇÃO: (PIRACICABA): RARlIOSA X ARRUDA»

Praia, uma fazenda de criar em Araraquara, obtida a título de sesmaria, a grande propriedade na Vila, escravaria numerosa, fábrica de açúcar, gado, e ou· tros bens móveis.

Conclusão: 1) O Libelo esclarece que o herdeiro de Fran­ cisco Cardoso de Campos vendeu duas vê,es a pro­ priedade de Felipe Cardoso; 2) O Sargento Mó, Carlos ·Ba,·tolomeu de Arruda e sua esposa foram os principais repartidores das terras patrimoniais de Piracicaba. Para darmos razão a Prudente de Morais tive­ mos de provar que a venda feita a Antonio Correa Barbosa era legítima. Assim mergulhamos em outro mistério: o universo de papéis velhos do Cartól'io do 1.0 Ofício de I tú!

-VI­

ANTES, UM POUCO DE HISTÓRIA DE PIRACICABA (SÉC. XVIllj Chegamos ao

pel'sonagem~c~ave!

Anronio COl'­

rea Barbosa) o qual dirigiu a Povoação e a Fn~gu;!­ sia de Piracicaba, durante vinte anos. As fontes documentais pouco e~lareccmJ a res­ peito da sua pessoa. Entt'etanto, o que já se pesqui­ sou isoladamente, nas Caixas de Documentos do;> Ar­ quivos, nos Maços e Livros dos Cart6rios, converge sempre para a figura do Diretor Povoador e Capitão Fundador de Piracicaba. Em 1766 Piracicaba era apenas uma paragem na rota abandonada de Cuiabá, quando o Capitão General de São Paulo, D, Luis Antonio Botelho de Sousa h10utão, Morgado de Mateus, e executor da política pombalina no Sul e Centro-Oeste do Brasil. resolveu nomear' Antonio Correa Barbosa, cidadão de Itú, para o cargo de Diretor e Povoador de Pi_ racicaba. (Documentos Interessantes - Departa­ mento do Arquivo do Estado de S, Paulo. História de Piracicaba em Quadrnhos - Leandro Guerrini). E"a notória a intenção do Capitão Gene.'al de apro· ximar Piracicaba do docal da barra que o mesmo rio faz no Tietê»J (Hist6ria de Piracicaba em Qua­ drinhos - Leandro Guerrini, pág. 14). e assim es­ tabelecer um colar de povoações, que partindo de São Paulo, via Santana de Parnaíba, atingia a Vila de Nossa Senhora da Candelária de Itú, e após, as ·Freguesias de Nossa Senhora Mãe dos Homens de Porto Feliz e Nossa Senhora dos Prazeres de Piraci­ caba. (<<Piracicaba no Século XVIII - Aspectos Históricos». Trabalho apresentado pela autora no 1.0 Simpósio de Estudos Piracicabanos, realizado no bicentenário da cidade, 1967).

A Freguesia de Santo Antonio de Piracicaba vi­ cejou rApidamente, ereta na margem direita, sobre a belíssima plataforma, que O rio contOrna numa Curva gr,aciosa. Mesmo 10nge da barra, a Freguesia satisfazia perfeitamente os propósitos da Adminis­ tração da Capitania, funcionando como centro f01'­ necedor de víveres e abastecimentos para as tr'opas que se deslocavam continuadamente, para o Sul, on­ de a g:uelTa entre castelhanos e portugueses prOsse­ guia com incrível ferocidade. A Bacia Platina, convulsionada! Espanha e Por­ tugal em guerra, envolvendo OS povos da América~ nas duas margens do Rio Paraná! Pairava Fôbre a Capitania de São Paulo um perigo ameaçador: a in­ va!'ao caslelhana através dos ,rios aflu~!ntes do Para­ ná, especialmente pelo Tietê, com o r,bjctivo de ata­ car São Pedro pelas costas e Rio de Janeiro p-:ll" mar ~ A partir de 1860, o sertão de Piracicaba foi subi­ tamente valorizado, mercê da sua posiç..ío estratégica. A Povoação de Piracicaba (1767) estava in!' mamen­ te ligada ao Forte de Iguatcmi (1767), atalaia pa­ ra os lados da Argentina e do Paraguai. As Vilas de São Paulo e It(l, as Freguesias de Araritaguaba e Pi­ racicaba e o Forte de Iguatemi formavam uma cnm­ posição perfeita. Piracicaba era o 1lltimo núcleo de povoação estável, e logo ap6s Iguatemi, seria o pri­ meiro a cair em mãos dos castelhanos, caso a inva­ são sc consumas;\e (Publicações do Arquivo da5 In­ dias dc Sevilha relativas ao Brasil - Ministério da> Re1ações Exteriores, Divisão de Documentação,; 1966). Pois bem, conhecemos Antonio COfl'ea Barbos,", como Diretor Povoador e Capitão Fundador da Po­ voação da Freguesia de Piracicaba. E ainda, como o notável se,·tanista das bacias do Pardo e do I vai em plena área .ameaçada pelos castelhanos (A Cida­ de que Deus fez e perdeu a receita - trabalho da autora) publicado no, «Diário de Piracicaba. em 4.8.1964-). Igualmente acompanhamos as suas atri­ bulações nesta Povoação, as arbitrariedades que cometeu1 as conten·das COm Os dois p,\rOC05 (Pe. J::-áo Manoel da Silva e Frei Tomé de Jesus). Era homem de gênio forte, inimigo do Sal'gento 1\161' Carlos Bar~ tolomeu de Arruda, particularmente, por ocasião do ~('scandalo50 romance» dêste com a sua sobrinha Maria Flor, Entretanto, nunca deixou de ser homem de confiança dos Capitães Generais, me~mo qu:tnd") perdeu as boas graças do Capitão Mór de ltú, Vicon­ te Tacques Goes e Aranha. Era inteligente: perce. bendo que Piracicaba «desapareceria» na margi'm direita, após a queda de Iguatemi, lutou com todas as suas forças para manter viva a povoação. :t;:.t;te~ foram os anos mais difíceis da História piracicaba­ Aspectos Hist6­ na (Piracicaba no Século XVIII


,«CONSTITUIÇÃO (PIRACICABA): BARBOSA X ARRUDA» ricos e A Cidade que Deus fez e perdeu a receita, da autora). Portugal experimentava désastres políticos e mI­ litares irreparávl.!is, na Europa e na Bacia P1atina. Assim que faleceu D. José, operou-se a «Viradeira», encerrando lugubremente a política do Marquês de Pombal. Os Tratados de EI Pardo e Santo Ildefonso sôore .as fronteiras na América, entre as colonias de E5panha e Portugal, denudam a fraqueza do Gover~ no da Rainha Da. Maria I. A assinatura dêstes Tratados implicava tremen~ ,das concessões à Espanha por parte de Portugal, mas afastaram o perigo da Invasão Castelhana na -Gapitania de São Paulo. Com isto, Piracicaba perdeu .sua funcionalidade estratégica. A «Viradoira» e a queda de Iguatemi foram desastrosas para a Fregue­ 'sía de Piracicaba, esta quase desapareceu! , A política de Da. Maria I reforçou o esquema .coJonialista. Os decretos proibindo a m,ovimentação dos teares, a profissão de ourives, o funcionamento ·de toda e qualquer manuratura, tinham objetivo es­ pecífico: consolidar a posição do Brasil, como colo­ nia fOlnecedora de matérias-primas agrícolas tropi· cais, e ao ll1esmo tempo, compradora dos produtos 'manufaturados e gêneros europeus. As autoridades das vilas paulistas anteviram .-excelentes possibilidades no cultivo da cana, na pro­ -dução do açúcar e da aguardente. O porto de San­ tos~ que por muito tempo permaneceu qua~e des€H'­ 'to, começou a dar sinais de intensa atividade, graças aos embarques das caixas de açúcar da Capitania para o· Reino, O, Capitães Mores de Itú e Porto 'Fdh: estimulavam' a agriGultura canavieira. Antonio ·Correa' Barbosa também se apercebeu da importân­ -cia da nova economia, mudando, incontinenti, a Fre.. guesia de Piracicaba para outro· local, na margem esquerda, onde. via melhores possibilidades para a expansão da lavoura canavirira. Preparou"Sc para -a «revolução econômica»!

-VlI­ PIRACICABA A VENDA: 80$0001 Homem forte, responsável e inteligente, Antonio 'Correa Barbosa, também era honesto... a sua mo­ -da! Fundar Piracicaba, transladá-Ia para a margem 'direita em 1784, foram trabalhos seus. Obedecia as ·diretrizes gerais da política sócio-econômiea aplicada pelo Governo da Capitarua de São Paulo, ma. fre­ qllentemente, agia de motu.pr6priot mesmo à reve. ·lia das ordens superiores, lutando por tlldas as for­ mas para impedir que a Freguesia desaparecesse, -após o desastre de Iguatemi.

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~--------"",~

Preparando a mudança da Freguesia, Antonio Cor"", Barbosa foi ter a Porto Feliz, a fim de ad­ quirir o' terreno da margem" esquerda do rio Piraci­ caba, para ali efetuar o translado. O importante ne­ gócio de compra ali se consumou. Vim<?s págínas atrás (V Capítulo - «Misteriosos personagens: par­ tilhas enigmáticas.), que Felipe Cardoso de Barras cntl'egou as suas terrãs das duas margens do rio 'Pi­ ,racicaba ao seu sobrinho Francisco Cardoso de Cam­ pos, pela quantia de 200$000'. Vimos igualment.o que um herdeiro de Fl'aneiseo Cardoso' de Campos vendeu esta mesma área ao Sargento Mór Carlos Bartolomeu de Arruda. No Documento levantad" no CartÓrlO do 1.0 Ofício, de Piracicaba, o Libelo do Tto. Ccl. Theobaldo da Fonseca e Sousa, éste eOIl­ swel'ado o proprietário legítimo, a título de compra». A derrubada das cercas das propriedades parti­ culares intrometidas no rodo da Vila (Constitui­ ção) motivou o Libelo, documento de revelações preciosas. O Tto. Gel. Tboobaldo da Fonseca e Sou­ sa assegurava que' as suas terras em Piracicaba eram parte daquela meia légua em quadra pertencente nO passado a Felipe Cardoso e deixada por dívida ao sobrinho-herdeiro Francisco Cardoso de Campos. Estas terras passaram a tltlJlo de compra a Carl"", Bartolomeu de Arruda, uma vez que a compra terior efetuada por Antonio COCl'ea Barbosa foi in· validada: por não haver pago em vida, os herdei,'os desta de\.'Olveram~nas ao legítimo dono, o herdeiro de Francisco Cardoso de Campos, o qual por sua v"," as revendeu, O Libelo data de 1825, quase trinta anos após o falecimento de Antonio Correa Barbosa, em condi­ ções ignoradas, muito longe de Piracicaba. O Lihelo não esconde que o primeiro comprador da meia lé­ gua em quadra na margem esquerda do do foi An· tonío Corre:a Barbosa.; nem que o segundo compr~­ dor foi o Sargento Mór Carlos Bartolomeu de As­ ruda, uma vez que por fillta de pagamento' a prç­ priedade foi devolvida ao herdeiro de Franci.'co Car­ los de Campos. A darmos razão ao Libelo, a questão do Povo do Coneelho da Vila, de Constituição, esta­ va jrreme:diavelmente perdida, pois o roc:io estava delineado em propriedade alheia! Antonio Correa Barbosa havia assentado a Freguesia ilegalmente' Acusação seríssima. No entanto, sabemos que Antonio Correa :Bar­ bosa adquiriu em Porto Felíz as terras que dQOll, pa­ ra nelas ser transladada a comunidade decadente da margem direita. A ocorrência Se deu em 1874 e o episódio foi marcado pela presença do Capitão Mór de Itá, Vicente Taques Goes Aranha, acompanha­ do de ilustre comitiva. Prudente de Morais e Má­ rio Neme, "êste baseado no Livro do Tombo da Ma­ triz de Santo Antonio de Piracicaba, refutaram a

an­


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CONSTIT UIÇÃO: (PIRACICABA): BARBOSA X AR,RUDA»

acusação. Diante disto, não tivemos dúvida: parti­ mos a Itú, em busça da documentação esclareCEdo­ ra. No Cartório do 1.0 Olício de Itú, o tabelião é o sr. Jal'bas Arruda. Ali encontramos as p"eciosi­ dades ituanas de documentação: o. Livros de Nota:; e os papéis do século XVIII. Um espetacular repo~ silÓrio de documentos hislÓricos, abrangendo grande área da Capitania de São Paulo, infelizmente, qua­ se destruido! Depois de busca insana, foi encontrad" o Livro de Notas n.O 2, parcialmente devorado por cupim. Folheamos o Livro, em grande espectativa, com imenso cuidado, separando as páginas mutila­ das pelo rendilhado de mil furos. Sabíamos o que procuravamos, pois já constava do índice: «Escritu­ ra de venda que faz Francisco de Campos, digo Fran­ cisco Cardoso de Campos e sua mulher Ignacia Pe­ drosa de uma sorte de terras ao Capitão Antonio Correa Barbosa por preço e quantia de 80$000 (oi· tenta mil réis)~. No verso da página 45, pudemos ler, na inte­ gra, e clal'amente, o que transcrevemos resumlda~ mente, a seguir. Em 20 de Novembro de 1785, na Vila de Nossa Senhora da Candelária da Fidelissi­ ma Comarca de Itú, compareceram os Outorgantes vendedores, marido e mulher, moradores da Fregue­ sia de Araritaguaba, e o comprador Capitão Anto. tonio Correa Barbosa, morador da Freguesia de Pi­ racicaba. Os vendedores eram possuidores de «uma sorte de terras na Freguesia e Povoação de Piraci" caba, que consta de meia légua em quadra, que hou­ veram por titulo de compra de Felipe Cardoso de Campos. Esta. terras principiavam e tinham por padrão a pedra do salto dela para cima um quartO e para baixo outro quarto, correndo o Sertão par ~ a parte do vento Sueste. Estas mesmas terras êles declaram vendidas de hoje para todo o sempre ao Capitão Antonio Correa··Barbosa···pelo·preço e quan­ tia de 80 mil réis, que IlIes vendedores declaram já

haver recebido em dinheiro, razão por que davam. plena e geral quitação, transferindo para a posse do comprador para que as logre e possua por si, sua· mulher e filhos 1 ascendentes e descendentes COrno propriedade sua comprada e paga com seu dinheiro Esta Escritura de venda foi lavrada no dia 20. 11. 1785 pelo Tabelião José Batista de Morais. Ali constam as assinaturas das testemunhas, de Francisco· Cardoso de Campos e .a de Antonio Cor­ rea Barbosa, cujos traços são enérgicos e inconfun­ díveis.

Falecendo em 1791, longe de Piracicaba, onde· não possuía mais ~migos nem parentes) Antonio Correa Barbosa nunca teve quem o defendesse das. acusações, nem tão pouco, provasse a operação de compra das terras à margem esquerda do fio Pira cicaba, para ali se assentar a nova Freguesia. Das. quatro pessoas que intercederam por êle, no case das terras: Capitão M6r João José da Silva (em. 17.5. 1824 - Documento do Departamento do Ar­ quivo do Estado de São Paulo), Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, o grande vulto da Indepen­ d/!'ncia do 1.0 Reinado e da Regência (15.9.1824­ Documento do Departamento do Arquivo do E'ta­ do de São Paulo), Prudente de Morais, o 1.0 Pre­ sidente Civil da República e Mário Nem", autor da. ·1.a História da Fundação.. de. Piracicaba, - todos provàvelmente basearam-se em documentos locais, pois referem-se a detalhes que não constam na E,-· critur.a de Itú, ou que não corrcspondem ao texto: original. Mas todos são a.nânimes em afirmar que as terras onde se desenvolveu a Freguesia, e depois. Vila de Constituição (Piracicaba) foram adquirida, por Antonio Correa Barbosa, pagas por êle, doada.· ao bem público e aos amigos moradores locais. A Escritura de Venda sOmente apareceu em. 1969, provando o negócio legítimo de Antonio Cor· roa Barbosa. -E -foi a única Escritura que apareceu, em mais de duzentos anos de celeuma I


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Almirante Chico Rodrigues

?

De NOEDY KRAHENBUHL COSTA (N. da R. - Sem a devida licença do autor, transcrevemOs o artigo - de «O Diário., 23.5.45, pelo pitoresco, pelo ver­ dedeiro, pelo saudoSó e pelo alerta para o futuro sObre a na­ vegabilidade de nosso Piracicaba) •

Antes da exagerada e improvidente deva.tação -das matas, o Pit..acicaba não era a exígua correntl}

·de água que hoje é. Caudaloso, prestava-se perfei­ tamente à navegação. Naqueles tempos, as estradas -eram muito menos numerosas do que agora. D~ ma~ neira que era necessário aproveitar os rios navegá­ 'veis, para transportar a copiosa produção das ter1'3s

-descansadas e ubérrimas.

mandara a expensas próprias, rasgar através da flo­ resta virgemJ uma estrada que vinha, desde a fazen­

do até à margem do rio, no pôrto de Araquá. Aconteceu, porém, que o imperador aqui che..

gou numa época de prolongada sêca. As· águas ha­ viam baixado consideravelmente, de forma que, em certos trechos, a navegação se tornara difícil e pel'Í­

gosa para embarcações de certo calado. Foi para tt·.nsportar o café produzido nas fa­ a Cia. de Navegação Fluvial. Logo se lhe associou

Contudo era preciso levar Sua Majestade Im· perial. Diante diSsO, o doutor Elias Chaves convoca

doutor Elias Chaves, engenheiro. que foi o diretol.' tecnico da empresa.

uma reunião dos quatro çomandantes dos vapores no escritório da empresa, no prédio em que hoje está

zendas marginais) que o Barão de Rezende fundou '0

o Clube Comercial. Reunidos em conselho, os três Os vapores partindo de Piracicaba, desciam até .., pôrto de Araquá. Na descdia, deixavam as lan­ -chas nOs entrepostos, onde iam recebendo a carga. Quando um deles subia, Iigavam-se-lhe as lanchas .carregadas e a composição vinha rebocada até a rua

do pôrto. O banacão vetusto do «Regatas» foi esta­

primeiros consultados negaram-se descer o rio, pois

em alguns lugares, especialmente nas .:Ondas Gran· des», não oferecia passagem segura. O quarto e úl­ timo consultado foi Francisco José Rodrigues. Era o mais moço. Chico Rodrigues ofereceu-se para co­

mandar o «Santo Estevam».

ção fluvial. O café era, pois~ trazido para ser em­

barcado em Piracicaba, porque a Estrada de Ferro Itu.na só chegava até aqui. Pelas ferrovias, ia para "São Paulo e, de lá, descia para o pôrto de Santos.

A incumbência lhe foi dada pelo doutor Elias Chaves, que, entretanto, lhe fêz ver a grande l'espon­ ~;'Ibilidade que assumia, quando lhe confiava a vida

de Sua Majestade.

Por êsse tempo, Pedro ll, imperador do Brasil>

veio a Piracicaba. Chegou pela Itu.na e daqui de­ veria ir até a fazenda do Conde do Pinhal, no mu­ nicípio de S. Carlos. Viagem longa. Para abreviá-la, convinha descer pelo rio. O conde, pelo prazer e pe­

Ja honra insigne de receber em sua casa o imper.ador,

o

jovem assumiu o comando da embarcação.

D. Pedro e comitiva

embarcaram. E lá se foi o

«Santo Estevam», sulcando as águas, rumo de Ara­

quão O rio efetivamente estava muito rasO. Quando


54

ALMIRANTE CHICO RODRIGUES

vaporzinho chegou a algumas centenas de m:~tl'OS do lugar denominado «Ondas Grandes», viu-se a su­ perfície das águas encrespada. pelas pedras que eS- . tavam quase" à ~tona. A tripulaçio. e os p~ssagcit'os tomaram-se apteensivós. Entre. as senhoras' chegou mesmo a reinar pânico. Cpico Rodrigues, impertur­ bável, emida vozes de comando. Ordenou aos ho­ mens 'das máquinas que tirassem tada a força que impeli á o vapor para a frente CJ ato continuo, des­ sem marcha à ré. Exeeutou-se a manobra. O resul­ tado foi êste: - o vapor, aproveitando a própria onda que produzira na sua marcha para a frente, Se elevou com ela e passou inc6lume acima das pedras que, devido. à sêca, estavam quase à superfície, en" crt'spando as água•. Pedro II, entusiasmado cOm a calma e a perícia do jovem comandante) não se con* teve:

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Vem cá, meu rapaz, quero dar-te um abra­

ço! Desse modo, apesar da s~ca de 1886, puderam Sua Majestade comitiva chegar incólumes ao pôr-­ to de Araquá, onde os esperava o conde do Pinhal.

e

Dê". epi.s6dio datou aquela veneração que' Francisco José Rodrigues sempre trihutou a Sua Ma-· jestade e à famUia imperial, enchendo espalhafato­ samente de retratos de suas: altezas a «Casa Concei-· ção», charutaria de sua propriedade, que Os moços, de hoje ainda alcançaram e que esteve~ por muitos anos, na mesma casa de esquina em que hoje está a «Tabacaria Tupan», de Justo MOrétti.


.'

Sonetos a Piracicaba JOAQillM DO MARCO (Do L H. G. de Piracicaba)

Cantar e Louvar a Minha Terra Cantar minha terra, ah! se eu pudesse!

Em peregrinos versos e perfeitos,

Dando-lhes forma de amorosa prece

Para mostrá-Ia pura e sem defeitos!

Louvar minha terra, ah! se eu soubesse!

Com termos altos, vivos e escorreitos,

Em que o poder de mágico eu tivesse

De ressaltar-lhe todos os conceitos!

Que rimas eu tivera de emoções,

Aos piracicabanos corações,

Com que pintar-lhe as graças naturais!

E que frases vibrantes de eloquência

Para exaltar a lúcida potência

Que consagrou seus homens imortais!


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SONETOS A PIRACICABA >

,

Cidade da Instrução

Piracicaba, minha terra boa,

Onde a ventura tive de nascer:

Se aos meus ouvidos o teu nome soa,

Sinto mais ânsia de por ti viver.

Não sei se existe nada que mais doa E mais fira todo o benquerer Do que o desprezo de qualquer pessoa Por incapaz de amar-te e compreender. Os dons que tens e da natura vieram Enchem de encanto o nosso coração, Pois "Noiva da Colina" te fizeram. Maior, porém, eu sinto a adoração Se lembro os grandes homens que souberam Fazer de ti Cidade da Instrução.


"­ 89

SONETOS A PIRACICABA

~

COmo se deve amar Piracicaba

AmO!" pelo rincão em que se nasce

Confessá-lo somente pouco a testa.

E' preciso enfrentar bem face a face

Provas mais duras que ninguém conteste

Para que dúvida nenhuma embace

O amor que com palavras se protesta,

Só o trabalho nos pode dar o passe

Coufinllativo de afeição honesta.

Só na luta pessoal ou pelo povo

Demonstra o cidadão o real empenho

De honrar e engrandecer a terra sua.

Piracicaba, se teus filhos louvo,

E' por neles sentir o amor ferrenho

Que tôda tua grandeza perpetua.

"


\

'.

lNDICE

Da alma de Piracicaba -

Prol. Flávio M. de Toledo Piza

Capitão Franoisco Franco da Rocha -

9

Dr, Alexandre G. dos Santos

Elucubrações sObre uma certidão de nascimento -

19

45

Prol. Guilherme Vitti

Brasil, coração do mundo - Nélio Ferraz de Arruda

55

Natureza agonizante -

Paulo Nogueira de Camargo

67

A lenda do tesouro -

Paulo Nogueira de Camargo

«Constituição (Piracicaba): Barbosa:x: Arruda,) Almirante Chico Rodrigues -

,

69

Marlg Therezinha G. Perecin

73

Noedg Krahenbuhl Costa

Sonetos a Piracicaba -Joaquim do Marco

~

A montagem desta edição é de 1972. Sai do prelo em 1973

. 83

85


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