Edição 216 - Caderno 1

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PRIMEIRAS PALAVRAS

EDITORIAL

EXPEDIENTE

REITOR Rafael Ciccarini

Por Lucas Wilker

DIRETOR DO CAMPUS BURITIS Prof. Eduardo França

Entrecortadas, aqui as histórias se unem para

COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO Prof. Rafael Cristelli

reverberar necessidades do mundo e ir ao encontro do novo. Novas perspectivas, novos personagens,

LABORATÓRIO DE JORNALISMO

novas narrativas: nesta edição do Jornal Impressão,

EDITORA Dandara Andrade

acenamos para pluralidade como forma de construir

EDITOR ASSISTENTE Lucas Wilker

e reconstruir realidades que se apresentam, às vezes cheias de impasses, outrora cercadas de possíveis caminhos. Em nosso Caderno l, navegamos pelas tensões da violência de gênero e dos mecanismos para seu rompimento, apresentamos a realidade cruel da xenofobia crescente contra asiáticos e o arrevesado cenário da exploração animal em laboratórios. Também acompanhamos os novos rumos da saúde em plataformas online e a complexificada tendência do mercado de trabalho: ser traineezeiro. No Caderno Do!s, questionamos a ideia de “Música Popular Brasileira” na atualidade, entendemos o universo Slam em suas camadas políticas e sociais, e investigamos um assunto repleto de nuances: a cultura dos fã-clubes e as paixões e os perigos da idolatria. E tem muito mais! Que tal abrir essas portas conosco?

HUMOR

DIAGRAMAÇÃO Lorena Gomes PROJETO GRÁFICO LEGRA – Laboratório de Experimentações Gráficas ESTAGIÁRIOS Alexandre Santos Amanda Ferreira Ana Maria Rocha Íris Aguiar Luís Otávio Peçanha Mylene Melo Rafael Alef Thiago Toledo INFOGRÁFICOS Eller Zant Ícaro Guimarães ALUNOS QUE ESCREVERAM PARA ESSA EDIÇÃO Ana Carolina Sousa André de Paula André Zorzin Bruno Sousa Davi Bicalho Douglas Alexandre Glycia Vieira Guilherme Dias Hiago Soares Karen Moreira Lucas Marques Luisa Guimarães Luiza Maria Campos Marcela Reis Michael Charlles Napáuria Almeida Paulo Alfaro Paulo Henrique Pereira Rafael Teodoro Sarah Rocha Starley Sousa Tássio Santos Thayná Silva Thayane Domingos O Jornal IMPRESSÃO é um espaço de prática, experimentação e aprendizagem em Jornalismo, coordenado pela CACAU – Comunidade de Aprendizagem em Comunicação e Audiovisual do UniBH. Mesmo como projeto do curso de Jornalismo, o jornal está aberto a colaborações de alunos e professores de outros cursos do Centro Universitário. Participe do JORNAL IMPRESSÃO e faça contato com nossa equipe: Av. Mário Werneck, 1685 - BH/MG CEP: 31110-320 jornal.impressao@unibh.br

Créditos: Thiago Toledo


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DE OLHO

SERIAM OS FAMIGERADOS BITCOINS COISA DO PASSADO? AGORA A MODA É O NOVO MODELO DE CRIPTOMOEDAS: NFT Já presente no mundo dos games, da música e das artes digitais, NFT já ganhou a confiança e o investimento de diversos empresários ao redor do mundo Por Bruno Sousa e Rafael Teodoro PorCriado Matheusem Rocha 2009, o Bitcoin - moeda eletrônica para transações ponto-aponto, por algum tempo, teve dificuldades de se tornar algo relevante para o mercado de investidores. A então recente criptomoeda não era vista pelos empresários como legítima. Passados alguns anos, em 2021, um Bitcoin tem o valor de US$55 mil, podendo atingir os US$100 mil ainda esse ano. Em 2010, se fosse investido o equivalente a um dólar, esse número já estaria em US$3.024.989 atualmente. Porém, com toda a revolução mercadológica que o Bitcoin trouxe abriuse a porta para uma diversidade muito grande de outras moedas digitais. Algumas delas, que têm chamado a atenção em tempos recentes, são as criptomoedas que utilizam tecnologia NFT.

O QUE É A TECNOLOGIA NFT? Non-fungible token (NFT), ou token não fungível, é uma espécie de token criptográfico que representa algo único, específico, individual, que não pode ser substituído, e esse aspecto é o diferencial dessa tecnologia, que chama muita atenção de empresários e investidores. Contrário à outros tokens utilitários, como o Bitcoin, os NFT’s não são intercambiáveis.

Ilustração que demonstra a diferença entre os tipos de tokens utilitários. Imagem: erc721.org.


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Isso significa que, quando você compra essa tecnologia, seja ela em qualquer formato, dentro de um jogo, uma obra de arte digital ou uma música criptografada com o NFT, é literalmente sua, ou seja, ninguém pode alterar. E o que garante a posse e o valor desses tokens é o Blockchain.

BLOCKCHAIN Em um ambiente digital, dados podem ser copiados e alterados. Para que uma moeda virtual fosse criada, era necessária uma tecnologia que impedisse essas duas características. Surgiu, então, em 2008, o Blockchain, também conhecido como “protocolo de segurança”. Em outros termos, é como se essa tecnologia fosse o “livro contábil” dos tokens. “É uma

Por Matheus Rocha rede que funciona com blocos encadeados, muito seguros, que sempre carregam um conteúdo junto a uma impressão digital”, afirmou Jean Prado, pelo Tecnoblog, em 2018.


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NFT E A ARTE DIGITAL A arte digital é uma realidade e, hoje em dia, tanto quadros digitais, quanto memes, são vendidos a preços exorbitantes para colecionadores. Um exemplo é a obra de arte, criada ao longo de cinco mil dias, do artista americano Mike Winkelmann.

Obra de Mike Winkelmann, vendida por 69 milhões de dólares. Imagem: Reprodução Christie’s

A obra, quando finalizada na vida real, foi transformada em um NFT pelo artista e, assim como no mundo real, no virtual só existe uma única versão. Ela foi leiloada na famosa casa de leilões Christie’s, sendo avaliada em US$69 milhões. Está entre as maiores vendas de obras de arte da história.

NFT NO FUTEBOL No futebol, a “febre” do NFT já atingiu clubes gigantes. PSG, da França, Juventus, da Itália, Liverpool, da Inglaterra, e Real Madrid, da Espanha, são exemplos de times que estão em plataformas como a Sorare, que é em blockhain e usa os NFTs em uma junção com cards colecionáveis.


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No Brasil, o pioneirismo ficou por conta do Atlético Mineiro. O clube, que anunciou sua entrada para o mundo dos NFTs no início de maio de 2021, tem interesse em expandir a sua marca em âmbito internacional, buscando públicos que ainda não foram explorados, com intuito de aumentar a sua torcida em locais ainda distantes, seja fisicamente ou por contextos como a falta de calendário para jogos, ou até mesmo pela língua. No caso do Atlético, localidades como Ásia, Europa e América do Norte, onde existe a presença muito forte da Sorare, são terrenos a serem conquistados. Essa parceria é benéfica para os clubes também no âmbito econômico, por criar novas receitas no mundo digital que vão muito além de sua própria torcida.

NFT E OS JOGOS ELETRÔNICOS Um dos setores mais beneficiados pela onda do NFT, sem sombra de dúvidas, é o dos games, seja em jogos online de plataformas como os videogames e computadores, ou em jogos de celular. Um exemplo é o famoso e revolucionário Pokémon Go, em que, agora, o usuário pode negociar coisas como criaturas, itens e pedaços de terra digitais, tudo isso utilizando uma criptomoeda criada especialmente para o jogo. Esse token é o responsável por fazer a movimentação econômica de todo o ecossistema do jogo. Várias exchanges (corretoras de criptomoedas) ao redor do mundo já estão negociando essa criptomoeda devido ao gigantesco sucesso dentro do jogo. Seu valor já chegou a níveis muito altos e espera-se que valorizem ainda mais, pois o jogo tem uma média de 25 mil usuários por dia.

NFT’S E AS CONSEQUÊNCIAS AO MEIO AMBIENTE Você pode estar se perguntando: como arquivos digitais poderiam afetar de forma negativa o meio ambiente? A tecnologia que torna os NFTs possíveis afeta sim nosso ambiente devido às “pegadas” de carbono. As emissões de carbono estão conectadas ao uso da Blockchain, que precisa de grandes quantidades de energia e equipamentos para funcionar, todo o tempo, 24 horas por dia. A Ethereum, uma rede onde a maioria das transações de NFT ocorrem, consome algo em torno de 40TWh (terawattshora) por ano. Segundo o site Digiconomist, o consumo é comparável ao de toda Nova Zelândia, ainda assim o consumo é menor que do Bitcoin, que usa uma quantidade de energia 2,5 vezes maior. Investir é correr riscos. Não é possível ter total certeza de qual será a próxima criptomoeda que tornará pessoas que investiram nela milionárias. O que é possível fazer é estudar sobre o mercado e analisar suas estruturas para tentar uma previsão.


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STOP HATE

O CRESCIMENTO DE ATAQUES XENOFÓBICOS À IMIGRANTES ASIÁTICOS Desde a disseminação da Covid-19, crescem os índices de ataques xenofóbicos à imigrantes asiáticos. Especialistas dão suas opiniões a respeito das causas e perigos desse tipo de preconceito Por Davi Bicalho, Paulo Alfaro e Starley Sousa Quando a Covid-19 surgiu, em uma cidade chinesa, nem todos pensavam que essa doença se espalharia no mundo inteiro. Estavam enganados, vivemos uma pandemia sem precedentes e sem sinais de ter um fim. Ao se disseminar pelo mundo, o vírus carregou e carrega consigo uma espécie de assinatura negativa, ser um “vírus chinês”. Isso foi o suficiente para que víssemos a comunidade asiática espalhada pelo mundo, mais especificamente a chinesa, passar a sofrer ainda mais preconceito e xenofobia, como se fossem os responsáveis pela crise sanitária. Todavia, seja nos Estados Unidos, no Brasil, ou em outro país com um considerável número de imigrantes da Ásia, um contraponto surgiu, as campanhas contra essa agressão. “No soy un virus” e “Stop asian hate” rapidamente tomaram proporções gigantescas.

ESTADOS UNIDOS João Cumarú, membro da Rede Brasileira de Estudos da China, pesquisador do Instituto de Estudos da Ásia (IEASIA/UFPE), e articulador entre o Governo de Pernambuco e o consulado, media relações entre a comunidade asiática e o Estado. Segundo Camurú, dados da Stop AAPI Hate revelaram que, entre março e dezembro de 2020, foram registradas 2.808 denúncias nos Estados Unidos de atos racistas contra asiáticos, das quais 8,7% envolveram agressão física e 71% assédio verbal. Em Los Angeles, os ataques racistas aumentaram em 115%. Os números indicam uma correlação entre a pandemia e os atos. Mas já existem estudos que apontam também para uma relação de causalidade entre uma coisa e outra. “Os Estados Unidos carregam em sua história episódios de xenofobia.


STOP HATE

O que acontece hoje na pandemia de coronavírus já havia ocorrido, em menor grau, na epidemia do H1N1, na epidemia da gripe aviária, e isso na história recente – há menos de duas décadas –, quando tivemos casos semelhantes de racismo, que também haviam sido registrados”, relembra Camurú. Outra pesquisa recente, conduzida pelo jornal USA Today, mostra que 17% dos asiáticos que vivem nos Estados Unidos, ou americanos descendentes de asiáticos, afirmaram ter sofrido algum tipo de importunação física, verbal ou sexual. No ano passado, essa margem era de 11%. Um outro estudo, do Centro de Estudos do Extremismo da Universidade da Califórnia, apontou que os crimes de ódio contra asiáticos nas 16 maiores cidades americanas aumentaram 150% de 2019 para 2020. Legisladores da Califórnia alocaram US$ 1,4 milhão em fundos estaduais para expandir a coleta de dados, iniciativas e recursos para as vítimas de racismo, por lá, 15% da população é de origem asiática. Já Joe Biden, atual presidente estadunidense, assinou, em maio de 2021, uma lei contra crimes de ódio com o objetivo de proteger os americanos de origem asiática. Donald Trump, ao contrário, quando ainda era presidente dos EUA, culpava os chineses pela disseminação do vírus. O discurso do ex-presidente Donald Trump e alguns de seus apoiadores deram “permissão” para ações violentas. Existiram casos muitos graves, em ataques que resultaram em mortes – não só de chineses, mas também de coreanos -, mesmo depois da saída do Trump. Há, de maneira muito clara, um incentivo nas palavras do ex-presidente americano, de maneira a gerar um acirramento nessa onda de xenofobia. Apesar do primeiro caso de Covid-19 nos Estados Unidos ter sido rastreado vindo diretamente da Europa, essa propagação de fake news, e a insistência do Trump em classificar o vírus como “vírus chinês”, ou “vírus de Wuhan”, ajudaram a disseminar esse sentimento em práticas xenofóbicas. Imagem: Foto:Dia Dipasupil/Getty Imagens/AFP.

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Asiáticos ficaram ainda mais estigmatizados com as falácias sobre o “vírus chinês”.


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STOP HATE

RAÍZES DO PROBLEMA Em 1882, o então presidente dos EUA, Chester A. Arthur, assinou a Lei de Exclusão Chinesa, que proibia toda a imigração de trabalhadores chineses nos Estados Unidos, por enxergar neles uma ameaça no mercado de trabalho para os estadunidenses. Os chineses começaram a imigrar para os Estados Unidos em meados do século XIX, durante a corrida pelo ouro na Califórnia, para trabalhar essencialmente na mineração. No primeiro momento, teve a corrida pelo ouro, depois, o período de atração da mão-de-obra chinesa para construção em infraestrutura e, no final do século XX, há uma estimativa por volta de 100 mil imigrantes chineses nos Estados Unidos. A pandemia de Covid-19 pode ter sido um estopim que reavivou alguns sentimentos que, em alguma medida, foram construídos ao longo da história: essa imagem do chinês como “povo atrasado, sujo e imoral”. A partir do desenvolvimento socioeconômico e tecnológico da China é que a desmistificação se inicia. “Vejo cada vez mais empresários, gestores e estudantes interessados em aprender a língua, em conhecer sobre o país, em ter uma experiência de vivência por lá. Isso pode ser um movimento de desconstrução dos estereótipos que nós temos sobre a China e os chineses”, avalia o pesquisador João Camurú. Se, por um lado, o crescimento chinês pode inspirar admiradores por todo o mundo, por outro, os principais meios de circulação e as elites econômica e política podem ser instrumentos de estímulo para a intolerância, mas não de maneira sólida. Para Camurú, estratégias comunicacionais e institucionais não serão suficientes para afastar a boa recepção das pessoas em todo o mundo aos chineses a longo prazo. Camurú ainda afirma que há uma estratégia de mobilização (de parte) da mídia, mas considera que não será um problema permanente. “Em momentos de disputa mais aguda, em alguns casos específicos, pode ser que a opinião pública seja mobilizada para reverberar atitudes dos governos”. Wagner Silva Carvalho, professor de sociologia no Estado de Minas Gerais, avalia se esse preconceito, sofrido pelos asiáticos desde o século XIX, se encaixa em xenofobia ou racismo. “Se insere tanto em racismo quanto em xenofobia. A intolerância a eles se dá por um processo cultural, que se torna ainda mais evidente no mundo contemporâneo”.


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Sobre os discursos de ódio, proferidos contra chineses desde o início da pandemia, especialmente por políticos estadunidenses, Carvalho é categórico. “A única explicação que define as pessoas que cometem esse tipo de atitude é a ignorância. Quando essa barreira da ignorância é vencida, o racismo acaba caindo. A educação é o caminho mais sensato para minimizar o racismo”.

BRASIL No Brasil, o debate sobre a cultura oriental é menos vivo, uma vez que a prioridade de combate ao racismo é direcionada a povos com relação na formação étnica do brasileiro. Isso se refletiu na Lei 10.639, de 2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileiras e africana em todas as escolas, sendo importante fator na luta antirracista. Mas isso não significa que o Brasil se entende bem com as demais culturas do mundo. Assim como nos EUA, também foi um elemento político que deu início a uma negação de brasileiros, não somente com os chineses, mas com os orientais, e qualquer outra nacionalidade que não fosse a “verde e amarela”. Durante a ditadura militar (1964-1985), foi implementada a Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980, também chamada de “Estatuto do Estrangeiro”, que previa extradição caso o estrangeiro se atentasse contra “a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais”. À época, o estrangeiro era estigmatizado e visto como “ameaça” para o Brasil. A ação governamental afetou asiáticos no país e, só a partir de um importante acontecimento político do século XX, outros olhares começaram a surgir. “Passamos a nos preocupar mais com isso a partir da crise imigratória na Síria, quando recebemos pessoas, de diversas nacionalidades, que foram afetadas na Guerra da Síria [2011]. Este é um caso em que as origens geográfica e religiosa acabam sendo fatores que influenciam a xenofobia, muito por associar a religião islâmica com o terrorismo”, avaliou o professor João Lobo. Dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), de 2019, revelaram que das 43 mil pessoas com status de refugiado no Brasil, 11.231 eram sírias. À época, havia políticas escassas no recebimento de imigrantes, causando traumas em muitos sírios. Demoraria alguns anos para modernizarmos leis que atendessem às demandas daquele cenário e dessem suporte a um público oriental.


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Em 2017, criou-se a Lei de Imigração (Lei nº 13.445/2017), que facilitou o recebimento dos refugiados e melhorou as condições dos documentos concedidos aos sírios. Na região sudeste, ocorreu a Política Municipal para a População Imigrante de São Paulo (PMPI), instituída pela Lei Municipal n° 16.478/2016, que consistia em diretrizes para a população imigrante da cidade. “A crise migratória na Síria fortaleceu o desenvolvimento de algumas legislações no Brasil na recepção de imigrantes. Tivemos esse ponto positivo nos últimos anos, porém a aceitação do ponto de vista da sociedade brasileira ocorre de maneira mais gradativa, e não necessariamente com a necessidade de uma legislação”, explicou Lobo. Wagner Silva, professor de sociologia, diz que o brasileiro já traz consigo um preconceito enraizado na sua cultura, a grande diferença é que o estigma social sofrido pelos asiáticos no Brasil e nos Estados Unidos não diz respeito à violência racial e opressão policial que mata pessoas negras diariamente e nem ao genocídio em curso contra os povos indígenas. “Em ambos os países, o processo de enfrentamento à intolerância é a bandeira a ser levantada”.

“Em ambos os países, o processo de enfrentamento à intolerância é a bandeira a ser levantada”, afirma o sociólogo Wagner Silva, sobre preconceito no Brasil e nos EUA. Imagem: ShoptPot no Pexels


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MEDICINA

TECNOLOGIA APRESENTA NOVOS RUMOS PARA ATENDIMENTOS NA ÁREA DA SAÚDE Devido à pandemia da Covid-19, SUS realizou mais de 5,7 milhões de consultas online em 2020

Por Hiago Soares, Karen Moreira, Napáuria Almeida e Thayane Domingos Por Hiago Soares, Karen Moreira, Napáuria Almeida e Thayane Domingos

Teleconsulta ganha novos adeptos em meio à crise sanitária causada pela Covid-19 no Brasil. Imagem: Pixabay

Tecnologia e saúde andam de mãos dadas. Cada vez mais a ciência conta com recursos tecnológicos para inovar, realizar tratamentos e fazer descobertas que salvam milhares de vidas. Seja com instrumentos de última geração ou com simples aparelhos telefônicos, computadores e wifi, os dois mundos se conectam e trazem novas perspectivas ao mercado. Uma plataforma de extração de petróleo é, por natureza, um local de difícil acesso quando se trata de oferecer algum serviço de saúde, como um diagnóstico ou atendimento médico imediato. Normalmente, quando uma situação de risco acaba envolvendo os trabalhadores em algum acidente, equipes médicas são enviadas através de transporte aéreo ou são incorporadas ao grupo de trabalho da plataforma para que possam prestar o socorro necessário. Com o uso da tecnologia, porém, os mesmos serviços iniciais podem ser oferecidos com maior rapidez e sem a necessidade de médicos e equipamentos especializados a bordo.


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MEDICINA

Foi o que constatou uma pesquisa conduzida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que procurou analisar, a partir de uma experiência aplicada pelo Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, com as petrolíferas, a eficiência e a eficácia das inovações em telemedicina nas práticas hospitalares. De acordo com o estudo, o uso de tecnologias como videoconferências, sistemas de informação que unificam dados pessoais e de intervenções médicas dos pacientes, robôs que realizam procedimentos cirúrgicos, além das tecnologias de obtenção, a distância, de imagens e testes de tecido, sangue, urina, dentre outros, começam a provocar mudanças nos modelos de prestação de serviços na área da saúde. Mais do que oferecer uma alternativa ao atendimento presencial e possibilitar a interação entre médicos e pacientes em regiões distantes ou em locais de difícil acesso, a tecnologia facilita o acompanhamento dos resultados de exames. Os pedidos e realização de testes, que antes eram fragmentados em uma cadeia de empresas e fornecedores, podem agora ser realizados pelo próprio hospital, com as ferramentas inteligentes e adequadas. Por fim, o acesso aos resultados e o acompanhamento do diagnóstico do paciente podem ser feitos virtualmente, o que impacta na redução dos custos envolvidos tanto para a instituição quanto para quem demanda o atendimento. É o que também pode ser observado em estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sobre o rastreio de cegueira causada pela diabetes, em que se observou que o uso da telemedicina como estratégia adotada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tornou os procedimentos 94% mais baratos para os cofres públicos. Nesses casos, o uso da tecnologia para diagnósticos precoces a distância evita que pacientes cheguem à consulta presencial com quadro clínico grave, com pouca capacidade de melhora e controle. Como consequência, até mesmo o uso do transporte, como os veículos públicos de um pronto-atendimento, para deslocamento de pacientes em tratamento entre uma cidade e outra, ou entre clínicas dentro do próprio município, acaba diminuindo, impactando no orçamento da cidade. Segundo a mesma pesquisa da UFMG, as consultas online têm aumentado nos últimos meses devido à necessidade gerada pelo distanciamento social causado pela pandemia do novo coronavírus. Em 2020, com a grande demanda pelo atendimento remoto, a nutricionista Janaina Rungue se viu desafiada a reorganizar a sua agenda. Pesquisou e adotou em sua nova rotina alguns aplicativos e plataformas que possibilitam realizar o acompanhamento global dos seus pacientes de maneira remota. “Foi desafiador, mas percebi que precisava avançar neste sentido para conseguir atender aos pacientes que procuravam pelas consultas online.


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Com pouco tempo, percebi que essa modalidade era eficiente, prática e totalmente possível”, afirma. Atualmente, ela realiza cerca de 20 atendimentos online por semana. O valor da consulta é de R$70. Quando o atendimento era presencial, o preço era um pouco maior. “Nós tínhamos que considerar, no preço final da consulta, os custos para manter um consultório, como o aluguel, a água, a luz, o telefone e a internet. Hoje, não tenho mais esses gastos, pois atendo na minha casa ou na casa do paciente”, explica. Ainda segundo ela, outro ponto positivo é que a sua cartela de clientes aumentou cerca de 30%. Pacientes que, mesmo tendo um plano de saúde, optaram por pagar a consulta particular para ter facilidades como horário flexível, nenhum custo com deslocamento e a praticidade de ser atendido em qualquer lugar. Este é o caso de Aline Melo. A terapeuta ocupacional tem 25 anos e decidiu investir em uma alimentação mais equilibrada para ter uma melhor qualidade de vida. Após uma indicação, optou pelas consultas online e, segundo ela, não há do que se queixar. “Estou tendo uma boa experiência. Acredito que, por estar dentro da minha casa, me deixa mais à vontade e me vêm à memória mais fácil as minhas refeições. Além disso, me sinto super segura com a abordagem dela [da nutricionista] - é atenciosa, escuta as nossas queixas, passa confiança e sua conduta é assertiva, além da flexibilidade e do preço”, garante. A experiência tem sido tão positiva que, além da nutricionista, ela também é atendida pela psicóloga de forma remota.

ATENDIMENTO HUMANIZADO A tecnologia é uma parceira importante para o avanço da medicina, mas ela não substitui o trato humano, como o cuidado e a sensibilidade. A humanização começa desde o primeiro contato, quando o paciente precisa de uma informação. É a partir daí que ele começa a ser bem ouvido, ou não. A tela impõe uma barreira física entre o profissional e o paciente. A princípio, este seria o maior desafio na humanização, mas, para alcançar este objetivo, o profissional pode lançar mão de técnicas que fazem com que a consulta foque na escuta do paciente. Este foi o recurso utilizado pela psicóloga Cristiane Moreira, que também aderiu ao atendimento online nos últimos meses. Ela explica que, visando a qualidade dos atendimentos, precisou se capacitar com a realização de cursos e contou também com o apoio de outros profissionais que já realizavam consultas online. “No presencial, a gente consegue sentir, por exemplo, até a questão da ansiedade na fala da pessoa de uma forma mais concreta, por ela estar ali na nossa frente.


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Os movimentos, os gestos de pernas, de braços, enfim, muita coisa que a gente avalia com o olhar mesmo”, comenta. A psicóloga reforça que o teleatendimento tem feito com que ela melhore também como profissional. “Esta forma de trabalho me fez crescer muito enquanto psicóloga, pois tenho conseguido passar para as pessoas uma resiliência que a gente tem que encontrar nesse momento para lidar com tudo isso que está acontecendo”, destaca. O atendimento humanizado faz com que a queixa do indivíduo seja tratada com respeito e empatia, fazendo toda a diferença na condução do tratamento.

REGULAMENTAÇÃO DO ATENDIMENTO ONLINE Em março de 2020, o Conselho Federal de Medicina (CFM) remeteu ao Ministério da Saúde um comunicado sobre a decisão de reconhecer a necessidade e autorizar a prática do atendimento remoto, respeitando as diretrizes da entidade. No dia 15 de abril de 2020, o Governo Federal publicou a Lei 13.989, que dispõe sobre o uso da telemedicina durante a crise causada pelo coronavírus. As operadoras de saúde precisaram se adequar à nova realidade. Até então, a prática de consultas online, apesar de já ser liberada pelos órgãos responsáveis sob diretrizes específicas, ainda não estava consolidada no


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mercado, à exceção de alguns hospitais, como o Sírio Libanês e Albert Einstein, em São Paulo. Em Minas Gerais, a Unimed BH, uma das principais operadoras do estado, ofereceu a modalidade de consulta online para seus clientes e cedeu o seu sistema para a Prefeitura de Belo Horizonte que, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, também passou a oferecer o serviço para os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) da capital mineira. O superintendente de Provimento em Saúde da Central Nacional Unimed, Daniel Albuquerque, reforça a importância do recurso. “Estamos usando a telemedicina como grande aliada, nas suas diferentes modalidades: teleorientação, teletriagem, telemonitoramento e teleconsulta. Juntas, elas colaboram para a coordenação do cuidado e a garantia do acesso, fundamentais para um sistema equalizado”, disse. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ressalta que, independentemente do método e tipo de tecnologia utilizados, as operadoras de saúde devem observar a segurança e a privacidade dos dados de saúde dos beneficiários. Segundo a agência, essas são informações protegidas por legislação especial.

TECNOLOGIA NO SUS O atendimento online também está auxiliando a população que não tem condição para pagar planos de saúde. O Ministério da Saúde criou uma plataforma, o TeleSUS, que ajuda no combate à Covid-19 com consultas virtuais. No ano passado, mais de 5,7 milhões de pessoas já buscaram os serviços do TeleSUS, diz o Ministério da Saúde. O caminho de acesso passa, em todas as etapas, por tecnologias já consolidadas na sociedade. O cidadão pode acionar o Disque Saúde - 136. Também é possível acessálo pelo site do Ministério da Saúde, por meio do chat disponível na página, ou pelo aplicativo Coronavírus SUS.


Por Ícaro Guimarães

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CIRURGIA ROBÓTICA, DA FICÇÃO À REALIDADE Presente no Brasil há mais de 10 anos, essa ferramenta, que inspira o audiovisual, já foi usada mais de 30 mil vezes Por Douglas Alexandre, Paulo Henrique e Michael Charles

Cirurgia robótica usa braços mecânicos que têm movimentos precisos, comandados por um profissional com o auxílio de um console, como nos games. Imagem: DIVULGAÇÃO/INTUITIVE SURGICAL

Se você é amante de séries que retratam a realidade vivida em hospitais e atendimentos médicos, certamente já deve ter assistido algum episódio da premiada série americana “Grey’s Anatomy”. Com 17 temporadas e indicações a vários prêmios, a série estreou em 2005, nos Estados Unidos, e ganhou o mundo com o grau de realidade apresentado em seu roteiro. Na 3ª temporada, o médico Preston Burke, principal responsável pelas cirurgias cardiotorácicas, foi baleado no ombro, na porta do hospital, e


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teve parte dos movimentos do braço direito comprometidos, o que o impediu de operar corretamente com movimentos firmes. Nesse momento, sua namorada, que também era médica, a Dra Cristina, o auxiliava e assumia as cirurgias sem falar a verdade ao diretor clínico da unidade. Tempos depois, a farsa foi descoberta e eles acabaram se separando em seguida, após o afastamento de Burke. Em 2018, no filme “Guerra nas Estrelas”, o androide C-3P0 é um robô que realiza cirurgias, utilizando gorro, avental cirúrgico e máscara, como manda o protocolo. Na trama, é apresentada uma realidade virtual que ainda buscamos um dia. Mas porque apresentamos essas duas histórias da ficção? Bem, no primeiro caso, se o Dr Preston Burke já tivesse o auxílio da cirurgia robótica, não seria necessário a ajuda de sua namorada e, consequentemente, não perderia o emprego, podendo ficar juntos e nos brindando com um final diferente. Já no segundo caso, a realidade retratada no filme de Guerra nas Estrelas vai além do que existe hoje de mais moderno. Atualmente, os robôs utilizados em cirurgias são compostos por braços mecânicos e necessitam de um médico qualificado para operá-los, mas o que foi transmitido nos filmes pode ser uma evolução futura.

CIRURGIA ROBÓTICA A palavra robô vem de “robota’’, tem origem tcheca e significa trabalho. Os primeiros procedimentos médicos utilizando robôs datam de 1985, para realização de uma biópsia neurocirúrgica com o PUMA 560, nos Estados Unidos e, mais tarde, foi sendo adaptado para diversas cirurgias em todo o mundo. Depois do PUMA 560, foram lançados vários outros modelos experimentais de robôs que pudessem auxiliar os médicos em procedimentos cirúrgicos e, assim, acabar com algumas limitações que o corpo humano possui. O mais conhecido robô utilizado em cirurgias é o Da Vinci, cuja plataforma foi lançada em 1998, o tornando o primeiro totalmente adaptado para cirurgias no ano de 2000. De lá para cá, surgiram várias evoluções do antigo modelo. Basicamente, é formado por quatro braços mecânicos. Um possui câmera com visão até 5 vezes aumentada, e os outros têm movimentos em 360º, permitindo ao cirurgião movimentos precisos durante o procedimento cirúrgico, guiados por um console como os de videogame.


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Por Ícaro Guimarães

A cirurgia robótica possui muitas vantagens em comparação à cirurgia tradicional, ela tem uma garantia maior de precisão, além de ser bem menos invasiva do que o procedimento comum. Entre outras qualidades, estão a facilidade de acesso a diversas estruturas do corpo, maior amplitude de movimento, maior visão da área a ser tratada e a redução da perda de sangue, do tempo de cirurgia, do desconforto no pós-operatório e do risco de infecção. Outra vantagem é que o tempo de recuperação do paciente é muito mais rápido do que em um tratamento convencional, valendo a pena ser utilizado, sempre que o médico aconselhar.


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NO BRASIL Diferentemente do que a maioria das pessoas pensam, a cirurgia robótica está presente no Brasil desde 2008, quando um homem foi operado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Na ocasião, ele foi submetido a uma prostatectomia (retirada da próstata). De lá para cá, foram realizados diversos procedimentos com a ajuda dos braços mecânicos. São mais de 30 mil cirurgias e 1200 cirurgiões certificados em mais de 14 especialidades médicas. A maioria dos robôs estão na região Sudeste, seguida pelo Centro Oeste, Norte/Nordeste e menos equipamentos na região Sul. A rede privada ainda é pioneira, mas alguns hospitais públicos do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Belém, Recife e outras capitais já contam com os equipamentos para atender à população que utiliza o Sistema Único de Saúde, segundo o PebMed. Em Belo Horizonte, a Rede Mater Dei e o Hospital São Lucas realizam cirurgias robóticas em várias especialidades, dentre elas: urologia, gastroenterologia, trato urinário e, recentemente, ortopedia. Outra cidade que realiza procedimentos com robôs desde 2019, em Minas Gerais, é Uberlândia, com dois médicos especialistas no manuseio do modelo Da Vinci pelo UMC (Uberlândia Medical Center) em parceria com a prefeitura da cidade. Afonso Paulo, formado em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), membro da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, e especialista em cirurgia de joelho, de ombro e cotovelo, e videoartroscopia, é o responsável pelas cirurgias robóticas ortopédicas do Hospital São Lucas. O médico explica que os critérios para certificação em cirurgias robóticas são muito rigorosos, e que o equipamento veio para auxiliar o cirurgião, que já deve ter experiência em cirurgias convencionais. “Devido ao momento atual, imposto pela pandemia da Covid-19, são realizadas várias aulas e reuniões online em que são apresentadas características, dúvidas, técnicas, vantagens e dificuldades do procedimento. Após essa fase, inicia-se o acompanhamento de cirurgias gravadas ou ao vivo, com vários cirurgiões de diversos locais, com possibilidades para perguntas e esclarecimento de qualquer dúvida. Realizamos vários procedimentos em modelos que simulam características diversas. A partir dessa etapa, inicia-se a realização de cirurgias com a presença de técnicos.


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Só após várias destas cirurgias, sem intercorrências, se adquire a certificação definitiva. Vale ressaltar que o robô é um auxílio para cirurgias mais precisas, podendo melhorar a segurança e os resultados, não um substituto do cirurgião”, detalha. Utilizado desde março de 2021, o robô “Rosa Knee” possibilita um melhor ajuste de próteses ortopédicas e visão óptica de anomalias. Afonso Paulo fala sobre a satisfação de ser o precursor de cirurgias robóticas nessa especialidade em Belo Horizonte e o retorno positivo para os pacientes. “Me sinto privilegiado em poder proporcionar aos meus pacientes mais uma opção de tratamento seguro, eficaz, preciso e de alto padrão tecnológico para melhor resolução de suas doenças. Assim, com a maior precisão e personalização da cirurgia, aumentam a exatidão dos cortes ósseos e equilíbrio das partes moles. Melhoram a função do joelho, satisfação pósoperatória e, em tese, a longevidade do implante”.

O FUTURO Para além do uso de robôs nas intervenções cirúrgicas, há também o desenvolvimento de tecnologias capazes de aliar o celular com o robô. Segundo a revista Annal of Internal Medicine, médicos de Nova York conseguiram realizar uma cirurgia em um paciente utilizando um celular e a tecnologia de conexão à internet. Esse foi o primeiro caso de telecirurgia e aconteceu em 2001. Nessa época, ainda existiam muitas restrições com relação à internet, poucos robôs e poucos profissionais que dominavam o conhecimento da robótica na área. Já em 2020, muitos avanços aconteceram e foi realizada uma nova cirurgia, dessa vez, em um cadáver, onde médicos italianos utilizaram a conexão 5G para realizar o procedimento nas cordas vocais do ‘paciente’. Mas o que se torna mais relevante nesse procedimento é que, apesar de ter sido feita em um cadáver, essa cirurgia se mostrou muito satisfatória, uma vez que o médico que a realizou estava a 15 km de distância e, mesmo diante dessa distância, a velocidade de conexão foi satisfatória e o delay era de 280 milissegundos. Isso é o mesmo que dizer que cada comando dado na tela do celular levou menos de 1 terço de um segundo para o robô executá-lo. Avanços promissores são esperados nos próximos anos, como a replicação das sensações táteis ao cirurgião durante um procedimento cirúrgico, pelo comando do console de um robô, e até o preparo da sala sem a intervenção humana direta. Isso possibilitaria intervenções mais adequadas e evitaria o risco de infecções intraoperatórias, respectivamente.


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EXPLORAÇÃO ANIMAL EM LABORATÓRIO Vídeo viraliza na internet e chama atenção para marcas de cosméticos que ainda praticam testes em animais Por Guilherme Dias, Lucas Marques e Luiza Maria

Curta-metragem Salve o Ralph expõe a rotina de um coelho cobaia em testes de comésticos. Imagem: reprodução.

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SALVE O RALPH

O curta-metragem “Salve o Ralph” comoveu a internet, em abril deste ano, ao mostrar um personagem, representado por um coelho nomeado como Ralph, apresentando um pouco da sua “rotina de trabalho” para as câmeras. A ação faz parte da campanha global promovida pela Humane Society International (HSI) para conscientizar e proibir os testes de cosméticos em animais. Ralph é o porta-voz da #SaveRalph, que usa a animação para mostrar a crueldade dos testes e a situação dos animais nos laboratórios em todo o mundo. No vídeo, dublado pelo ator Rodrigo Santoro na versão em português, Ralph é entrevistado por uma equipe de filmagem para um documentário e apresenta sua rotina diária como “cobaia”. Logo no início, ele já mostra algumas sequelas dos testes a que é submetido: “Eu estou cego no olho direito e essa orelha [direita]... não consigo ouvir nada a não ser zumbido. Meu pelo já foi raspado, tenho queimadura química nas costas”, diz o personagem. Ralph é submetido a todos os procedimentos demonstrados no vídeo como uma forma de protesto à exploração aos animais indefesos, mas faz um alerta discreto no final: “Só gostaria de dizer a todos que ainda estão comprando cosméticos testados em animais como rímel, shampoo, protetor solar, praticamente tudo que está no seu banheiro, sem vocês e sem países que permitem testes em animais, eu estaria nas ruas, bem, não nas ruas, mas nos campos… como um coelho normal”. Segundo a HSI, o coelho é o animal que mais sofre com a indústria de cosméticos. Eles são amarrados pelo pescoço, tendo produtos cosméticos e seus ingredientes pingados nos olhos e na pele raspada das costas. Os porquinhos da Índia e ratos também são usados como cobaias, com produtos químicos espalhados nas peles raspadas e nas orelhas. Os animais não recebem alívio da dor e são mortos ao final dos testes.

EMPRESAS EXPOSTAS Embora já seja proibida em 40 países, incluindo o Brasil, a prática ainda é regulamentada em lugares como a China, onde os testes em animais são obrigatórios por lei para obter o registro e certificação oficiais da segurança de determinadas categorias de produtos. Desde que o vídeo saiu, listas com marcas populares e que ainda testam em animais circularam pelas redes sociais. Com isso, foi iniciado um movimento para que esses produtos não sejam mais comprados até que essas marcas tomem uma providência quanto ao assunto.


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SALVE O RALPH

Publicação da Vegetarianos Online, página com mais de 230 mil seguidores no Instagram. Imagem: reprodução.

No Brasil, estados como o Amazonas, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo já têm leis que proíbem o uso de animais em determinadas indústrias. Para identificar se um produto não faz teste em animais, o indicado é sempre se atentar ao seu rótulo, que deve conter um selo cruelty free. O vereador de Belo Horizonte, Wanderley Porto (Patriota), é um dos apoiadores desta causa. Relator da Comissão Especial de Defesa Animal, da Câmara Municipal, e responsável pela criação de diversos projetos que visam promover a saúde dos animais, ele afirma que lutar a favor dos animais é respeitar a vida. “Pesquisas comprovam que os animais são seres sencientes. Ou seja, eles são dotados de sentimentos e sensibilidade. Diante disso, é preciso conscientizar que a exploração, o abandono e os maus-tratos são atitudes incompatíveis com o que vivemos atualmente na sociedade”, diz.

A CIÊNCIA COMPROVA Cientificamente falando, Wanderley tem razão. Pelo menos é o que diz a Dra Marize Campos Valadares, professora e coordenadora do Laboratório de Toxicologia e Farmacologia Celular LFTC/FarmaTec, da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Goiás. Segundo ela, além da crueldade que atrai a atenção da sociedade civil, este tipo de experimento pode ser altamente ineficaz. “A eficácia preditiva deste tipo de teste nem sempre é convincente. Afinal, o que é tóxico ou danoso para um animal, nem sempre é para o ser humano. Creio que substituir testes em animais por métodos mais éticos, modernos e menos danosos a estes seres é o caminho natural que a ciência deva trilhar.”


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SALVE O RALPH

Dentre estes novos métodos citados pela Dra. Marize, está o teste que utiliza uma espécie de membrana vascularizada de ovos galados para analisar se novos cosméticos, como cremes, loções, pomada e rímeis, são tóxicos para, por exemplo, o nosso sistema ocular. “Este tipo de teste funciona basicamente da seguinte maneira: os cosméticos que estão em teste são colocados em contato com a membrana dos ovos galados. Então iremos observar se tal produto causou algum dano neste organismo, como manchas ou sangramentos. Aí sim, tiramos a conclusão se este produto é ou não tóxico para humanos.” E além da ciência, esferas do poder público também estão se engajando na causa. Com o objetivo de acabar com os testes em animais, o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA) tem monitorado laboratórios e outras instituições que mantêm ou utilizam animais para fins de ensino ou pesquisa científica. O objetivo é realizar a verificação dos requisitos pré-estipulados para a manipulação das espécies, bem como inspecionar os experimentos feitos nessas instalações. Mas, embora a pauta esteja ganhando ainda mais força após o curtametragem “Salve o Ralph” ganhar cada vez mais relevância nas redes sociais, o caminho até a resolução desse problema é longo. Para o vereador Wanderley, algumas ações como a proibição da venda desses produtos no Brasil, além da ampliação do debate em âmbito social, são fundamentais para o avanço da causa. “Essa é uma questão em que precisamos avançar urgentemente, e isso necessita chegar em mais pessoas. Assim, será possível mobilizar a população, o que cria um barulho que torna possível incomodar as instâncias superiores”, conta. O vereador ainda relata sobre o amplo diálogo que está sendo feito entre o governo municipal e Organizações Não Governamentais sobre o tema. Segundo ele, um abaixo assinado, com o tema “Brasil: sem mais atrasos - proíba cosméticos em animais já” foi criado pela ONG Te Protejo para combater de forma veemente esses experimentos no Brasil. A petição já conta com mais de um milhão de assinaturas.

CONSCIENTIZAÇÃO DO CONSUMIDOR A pauta também é discutida por consumidores que, em pequenas atitudes, buscam mudar o cenário do planeta. Esse é o caso de Gessica Fernanda. A estudante, de 23 anos, aderiu ao veganismo no início de 2020, e um dos motivos foi a imposição humana sobre a natureza. “Decidi me tornar vegana após meus olhos se abrirem para a forma que tratamos os animais, como se fôssemos proprietários, e também pela questão ambiental, que tem sido prejudicada pelas ações egoístas dos seres humanos”.


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SALVE O RALPH

Segundo a estudante, a decisão tem saldo positivo, com uma melhoria na saúde mental e física. Contrária ao uso de animais para a testes, Gessica conta que evita consumir produtos que comprovadamente fazem uso dessa técnica ou de marcas que ingressaram no mercado vegano visando apenas o lucro. “Eu não compro e nem uso nada que seja de origem ou testado em animais e isso inclui as marcas que chegaram agora pensando só em dinheiro. Quando vou para a casa de algum familiar ou amigo próximo, sempre levo os meus produtos veganos e os incentivo a usarem também, sempre explicando os benefícios que eles trazem”, conta. A estudante ainda relata que, embora não pareça, é “fácil” encontrar produtos que não são testados em animais. “É extremamente fácil. Os produtos são baratos e muitas vezes a gente mesmo pode fazer em casa, sem nenhum gasto. Algumas marcas que podem ser exemplo são Skala e Salon Line”, revela.

Linha vegana da Salon Line. Imagem: Divulgação


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A NOVA TENDÊNCIA DO MERCADO DE TRABALHO: SER TRAINEEZEIRO No momento em que batemos cerca de 14 milhões de desempregados no país, os programas de trainee se tornam cada vez mais atrativos para os recém-graduados, com salários iniciais na faixa de R$ 6 mil mensais Por André Zorzin e Luísa Guimarães Sair da universidade com uma vaga garantida no mercado de trabalho, a possibilidade de início de uma carreira sólida, no mínimo dois anos de experiência e aprendizado prático, e tudo isso recebendo um salário inicial na faixa de R$ 6 mil mensais. Não parece uma proposta ruim, não é mesmo? Estamos falando de trainee, conhece? A palavra tem origem inglesa e significa aprendiz ou pessoa em treinamento, e tem se tornado um dos caminhos preferidos pelos recém-formados para iniciar a vida profissional. A oportunidade de começar a carreira em uma grande empresa se soma com os salários muito acima do que o mercado oferece para alguém em sua posição e deixa a alternativa trainee cada vez mais irresistível. Mas como me tornar um trainee? Você deve estar imaginando que algo aparentemente tão bom assim deve ter muita concorrência, e tem. Os processos de seleção dos programas de trainee arrastam multidões de jovens do Brasil todo. As vagas? Disputadíssimas e, é claro, em um número muito singular.

Lanche de recepção dos trainees com a diretoria executiva da Ambev. Foto: Ambev Brasil.


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TRAINEE

MUITA CONCORRÊNCIA, POUCAS VAGAS Dez mil candidatos do país inteiro disputam sete vagas para a cidade de São Paulo. Quatro meses de processo seletivo em inúmeras etapas, dessa vez, online. Os participantes formam um grupo no aplicativo de mensagens instantâneas Telegram, a grande maioria tem entre 24 e 28 anos. Falam do Maranhão, do Mato Grosso, da Bahia, do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais, de Pernambuco e de todos os cantos do Brasil com um único objetivo, ser um dos sete a conseguir as vagas. Entre eles, no grupo, o clima não é de disputa. Pelo contrário, existe ajuda e cooperação mútua. Eles mostram seus materiais de apresentação, pedem sugestões, trocam experiências e informações sobre o processo. Mas esse sentimento de equipe é rapidamente esquecido na hora das etapas, é quando lembram que são muitos e as vagas, poucas. Quando existe a formação desse grupo, normalmente, o processo já está em uma etapa mais avançada e já deixou para trás boa parte dos dez mil inscritos no programa. Eram exatamente cem candidatos quando essa reportagem foi escrita, e as vagas se tornavam cada vez mais um sonho possível. Mais uma etapa e o número cairia para setenta. E como chegar nesse grupo? Como ficar entre os 100 ou os 70 colocados de 10 mil inscritos? Existe fórmula mágica, “decoreba”? A resposta que você vai encontrar na internet é sim. Existe. Dezenas de vídeos ensinando como se portar em cada uma das etapas dos processos de trainee, ensinando o que falar sobre você. Isso mesmo. Ninguém quer ouvir quem você é de verdade, eles querem ouvir coisas específicas, e existe muita gente ensinando isso no YouTube: os coaches.

COACH DE TRAINEE Assista a um vídeo, pegue uma apresentação pessoal de outra pessoa, reproduzida para quase um milhão de pessoas, adapte com suas informações e decore. Pronto. Eu – Maria Luiza – fiz. E estive entre os 100, e entre os 70 também. Passar em um processo de trainee é como estudar para concurso ou para a prova do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, por repetição. É claro que não seria tão simples assim. Existem, sim, muitos professores de “como passar em determinado processo seletivo de trainee”


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por aí na internet, mas as coisas não se resumem a decorar apresentações pessoais, porque na grande maioria dos processos de seleção, ou pelo menos nos que dão para levar a sério, existem profissionais capacitados e aptos para observar habilidades que a empresa deseja em um candidato. São profissionais de recursos humanos, psicólogos, recrutadores, gestores e, até mesmo, em etapas finais, os CEOs da empresa. A crítica que fica diz respeito à massificação desses processos, às análises das competências que são exigidas e à quase hegemonia de algumas habilidades comparadas a outras, o que é um fator que empobrece o mercado de trabalho e não é favorável para a pluralidade, nem de ideias. Camila Pinto, 26, conta que desistiu da carreira de trainee justamente quando percebeu que teria que reproduzir discursos para ter êxito nas etapas ou nos programas. Após a segunda tentativa, a jovem mineira, recém-saída da faculdade de Direito, optou por seguir a carreira de bancária. “Na primeira vez que fiz eu pesquisei tudo na internet, como falar, o que falar, peguei textos prontos e troquei pelo meu nome, cheguei até as etapas finais. Na segunda vez, na mesma empresa, tentei fazer sem ser no formato pré-estabelecido e não passei nem das etapas iniciais, aí percebi que não era para mim ”, conta. Se, por um lado, há pessoas como Camila, que não se encaixam no ideal dos programas de seleção do tipo trainee, existem muitas outras que afirmam ter nascido para aquilo e têm, como objetivo de vida, o ingresso no programa. Chamamos quem vive estudando para passar em um concurso de “concurseiro”, aqueles que dedicam seu último ano da faculdade e até dois anos após a conclusão (tempo máximo para entrar nos programas), são os chamados de “traineezeiros”. Entrevistamos um jovem que completou seu segundo ano de tentativas para ser um trainee. Ele começou ainda antes de se formar, no seu último ano da faculdade e, hoje, após um ano de formado, já são nove processos realizados, ainda sem sucesso. Mas ele não descarta o sonho e lembra que, no final do ano, e durante 2022, ainda tem mais chances. Como ele não quis se identificar, vamos chamá-lo por um nome fictício: Pedro. Pedro, 24, concluiu a faculdade de Engenharia Civil no final do ano passado e, desde os anos de 2019/2020, vem fazendo processos de seleção para trainee em diversas empresas. Inicialmente, ainda antes da pandemia de COVID-19, Pedro participou de quatro processos de forma presencial. No início de 2021, ele participou de mais cinco processos, dessa vez, todos de forma remota.


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“Eu sou muito tímido e acredito que isso é meu maior desafio, sempre fico nas etapas das dinâmicas em grupo, mas agora, virtualmente, consegui avançar mais”, afirma o jovem que já se prepara para os processos que ainda vão abrir inscrições no fim do ano.

ALTERNATIVA A SE CONSIDERAR O fato é que o Brasil conta, atualmente, com mais de 14 milhões de desempregados, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. E há ainda o número de desalentados, que são aqueles que já desistiram de procurar um emprego, que bateu recorde recentemente, com 5,9 milhões de pessoas. Sair da faculdade e ter um emprego garantido já virou quase que um projeto falido, ainda mais sair da faculdade e ter um emprego garantido com um salário bem acima do valor de mercado, como no caso do trainee. E o que precisa ser dito é que o projeto de ser um trainee tem se tornado uma das poucas chances de muitos jovens, que precisam sustentar famílias inteiras nas quais seus pais e mães perderam o emprego ou até a vida nessa pandemia.

Evolução do desemprego no Brasil em 2020. Elaboração: Ícaro Guimarães

Além de ter uma situação financeira muito boa, no programa de aprendiz, o profissional tem a oportunidade de aprender sobre os mais diversos campos e funções, até entrar no campo que mais lhe convém. Essa parece uma ótima oportunidade para entender melhor seus interesses, as áreas que você quer atuar no mercado, desenvolver habilidades adaptativas e entender o que é melhor para o seu futuro.


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Um dos principais atrativos dos programas de trainee é o grande número de cursos ministrados, tendo em vista que muitos desses cursos contribuem para a formação profissional e enriquecem os currículos. Muitas empresas oferecem cursos técnicos e de idiomas, por exemplo, para que os profissionais possam desempenhar bem suas tarefas. Com isso, mesmo que não escolha a área de habilitação ao final do curso, ele terá uma boa oportunidade que será aproveitada ao longo de sua carreira e também ajudará a encontrar outros empregos. Conversamos com a profissional Priscila Gomes, 37, formada em Psicologia na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, e hoje é mestranda em Psicologia do Trabalho, Organizações e Pessoas, na Europa. Ela está no mercado de trabalho há 13 anos, foi coordenadora de projetos de RH na Philips e gerente de desenvolvimento e treinamento na Coty. Priscila contou um pouco sobre como os programas de trainee podem ajudar o profissional em sua trajetória no mercado de trabalho. “O programa trainee é uma oportunidade interessante para a empresa e para o próprio trainee. Para o trainee, é uma chance de atuar em uma grande empresa, trabalhando com um projeto desafiador, construindo experiências relevantes para o desenvolvimento de sua carreira. Para a empresa, é uma chance de atrair pessoas diferenciadas, trazendo inovação e diversidade para os times”. A mestranda também aproveitou para dar sua opinião a respeito dessa competitividade nos programas de trainee espalhados ao redor do Brasil, onde cada vez mais aumenta o número de candidatos para disputar as vagas desejadas. “O início da carreira é desafiador. É esperado que o recém-formado esteja buscando possibilidades em vários lugares, para conseguir se colocar no mercado e começar sua vida profissional. Como profissional de recursos humanos, não vejo problema em saber que o candidato está em vários processos seletivos. Para mim, é mais relevante entender o seu perfil, o motivo da minha empresa estar entre suas escolhas e como podemos agregar valor um para o outro. Do ponto de vista do candidato, sei que é um tempo de ansiedade e de cansaço. Não é fácil estar em vários processos seletivos, na espera por uma resposta positiva. Então, para os ‘traineezeiros’, recomendo que seja um tempo de também construir network, conhecer pessoas diferentes, seja nas empresas, ou mesmo os outros candidatos. Ter um espírito de construção poderá agregar mais do que um espírito de competição, no qual o objetivo seja derrubar o outro”, finaliza Priscila. Mesmo perante desafios, a tendência é que os programas de trainee só aumentem ao longo dos anos, e muito provavelmente o número de candidatos também. Vamos ver em quanto tempo o programa trainee irá mesmo se tornar uma espécie de concurso no Brasil.


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A MODA É PARA TODOS? Apesar de ser um mercado em ascensão, ainda é difícil encontrar peças plus size. Como podemos defender que a moda é para todos se nem todos conseguem vestir o que está na moda? Por Glycia Vieira Mari Lobo começou a carreira de modelo e influenciadora digital enquanto estava no processo de aceitação do seu corpo. Para ela, receber elogios vindos de usuários das redes sociais e perceber que algumas meninas se identificavam com ela foi importante para seu processo. “Eu acredito que o que mais me incentivou foi conseguir ter esse retorno de várias pessoas falando que eu era bonita, afirmando algo que eu já era. Essa troca com minhas seguidoras, de eu incentivá-las e elas me incentivarem, foi muito importante, e vem sendo, para o meu processo de aceitação, até porque é um processo contínuo que, sinceramente, vou levar para a vida toda”. Apesar de trabalhar com marcas conhecidas nacionalmente, a modelo e influenciadora acredita que o mundo da moda ainda é bem restrito. Ela conta que, ao tentar entrar em uma das maiores agências de modelos do país, foi recusada por causa da sua altura. Mari tem 1,65 cm. Além da altura, outros pontos levantados pela agenciadora, segundo a modelo, seriam as suas curvas. “Eu tenho 135 cm de quadril e a agência disse que eu teria que reduzir medidas para entrar. Obviamente, eu não entrei na agência por conta da altura, mas se eu entrasse eu teria que reduzir medidas”. Segundo dados da Associação Brasileira Plus Size (ABPS), o mercado cresceu 10% em 2020 em relação ao ano anterior. Apesar de ser um mercado que está em crescimento no país, Mari Lobo conta que, em alguns trabalhos, é a única modelo gorda. Ela afirma que é complexo ter uma única pessoa para representar várias mulheres, enquanto vão ter várias outras representando as mulheres magras. Mari Lobo já fez trabalhos de modelo para marcas conhecidas internacionalmente, como a Nike. Imagem: Instagram/Mari Lobo.


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“Ainda tem muita coisa aí para ser desconstruída, a gente colocar de igual para igual e fazer uma publicidade legal”. Isso, quando a marca realmente contrata uma modelo plus size.

INCLUSÃO DE PESSOAS GORDAS Gordofobia é a aversão às pessoas gordas. Quem promove a gordofobia, geralmente, faz comentários sobre o corpo dos outros com a desculpa de que está preocupado com a saúde. Mesmo não estando na frente das câmeras, Juliana Jazra já vivenciou situações constrangedoras por ser uma mulher gorda. “Não é comum ver gordos trabalhando com moda, não digo nem na passarela. Na passarela é um outro assunto, que é um buraco mais embaixo. Mas é uma área que impossibilita muito o acesso da pessoa gorda, justamente porque existe um tabu a respeito do corpo gordo que é reforçado muito mais dentro da moda, então já tive muitas dificuldades, muitos olhares diferentes, principalmente no começo. Hoje, não é uma coisa que me abala mais, até porque sou muito bem resolvida comigo”. Além disso, a produtora afirma que foram poucas as vezes em que viu pessoas gordas em lugar de destaque no seu ambiente de trabalho. “Eu consigo contar na minha mão quantos desfiles eu vi, quantos desfiles eu participei, em que eu vi um corpo parecido com o meu, sendo vangloriado, exaltado, aplaudido, da mesma forma que um corpo magro”, enfatiza.

“Eu sei da capacidade do meu trabalho independentemente do tamanho do meu corpo”. - Juliana Jazra, produtora de moda. Nicole Benedicto é criadora da marca Tributai Store. A empresária conta que, inicialmente, vendia roupas nos tamanhos tradicionais, mas por insights de amigas, ela se atentou a produzir uma grade maior. “Nossa mente não está preparada para a inclusão. A gente pensa no P, M, G, GG, no máximo”. Foi quando percebeu que o mercado era escasso e que poderia dar certo. “É um público que carece de peças A produtora Juliana Jazra em foto postada em suas redes sociais. Imagem: Instagram/Juliana Jazra.

atuais”, afirma Nicole. Hoje, 89% dos clientes da Tributai são plus size.


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Nicole afirma que o principal diferencial da marca é manter o preço das peças. Para ela, não existe a necessidade de cobrar um valor maior por ser uma peça plus size, como é possível ver em outras marcas. “Isso é ridículo”, enfatiza a empresária. Segundo ela, a diferença de preço para fabricação de peças maiores não é grande. “Não é nada que vá quebrar uma empresa”. O que realmente acontece, de acordo com Nicole, é que o trabalho aumenta por ter que produzir mais produtos. Apesar disso, ela não acredita que este é o principal motivo para marcas não trabalharem com uma grade extensa. Sobre o fato de marcas contratarem modelos que não são plus size, Nicole afirma que a culpa não é das modelos, mas das marcas Nicole Benedicto durante sessão de fotos da sua marca. Imagem: Arquivo pessoal/Fotógrafo: @olimabr.

que optam por isso. “Não sei se entendo o motivo, não sei se, para eles, ligar a marca deles a pessoas gordas é uma coisa ruim, porque a gente sabe que o mundo é assim, né? Infelizmente”. Apesar de não ter certeza, ela acredita que isso não é feito pensando no público, mas no retorno financeiro. “Porque se realmente se importassem, não fariam apenas uma coleção plus, fariam todas as peças da loja”. Inicialmente, Felipe Duart começou a criar conteúdos sobre moda, no Instagram, por ser algo que gosta muito. Com o tempo, pessoas que se identificam com seu estilo começaram a segui-lo e ele percebeu o quanto este público era carente de referências de estilo. “Eu comecei a mostrar mais para compor as minhas roupas, as minhas ideias, e aí a galera começou a chegar e falar ‘poxa, eu sou gordinho igual a você, uso roupa grande’”.

Uma das prioridades da marca Tributai é fotografar as modelos em diversos ângulos para evidenciar o caimento das peças nos variados corpos. Imagem: Arquivo pessoal/Fotógrafo: @olimabr.

O criador de conteúdo afirma que não tinha como pauta falar sobre aceitação, mas que


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as

pessoas,

aos

poucos,

foram

introduzindo o assunto nas conversas e, consequentemente, nos conteúdos. “Escuto muito sobre marcas que mascaram o plus size, com modelos menores ou que só vestem até o GG, e isso expandiu meu campo de visão”, conclui.

DIVERSIDADE DE PEÇAS E DE CORPOS Um dos grandes desconfortos do público plus size na hora de fazer compras é quanto ao modelo e formato das roupas que, muitas vezes, não acompanham as tendências da moda. A modelo e influenciadora, Mari Felipe Duart cria conteúdos sobre moda nas suas redes sociais e mostra os looks que usa no seu dia a dia. Imagem: Instagram/Felipe Duart.

Lobo, conta que essa é uma dificuldade que encontra quando vai às lojas. “Quando

você vai ver a parte plus size, são umas roupas menos joviais, mais adultas, e a gente pensa: ‘as mulheres gordas são só as mulheres mais velhas? Nos seus 50 anos?’ Não, temos mulheres gordas jovens”. Se, hoje, algumas marcas, como a Tributai, se importam e se preocupam com o público plus, é algo a se comemorar. A empresária Nicole Benedicto lembra dos diversos comentários que recebe diariamente dos clientes e da felicidade dessas pessoas ao adquirir os produtos da marca. Alguns, inclusive, citam que foi na Tributai que encontraram peças atuais e que vestem todos os corpos, independente do formato. “Isso é muito gratificante pra mim”. Nicole acredita que uma forma de reforçar essa luta pela pluralidade é na produção das fotos. Para ela, falta trazer “realidade” nas fotos, evidenciando o corpo natural. “Acho que falta trazer um pouco mais de realidade e tornar o ambiente, o Instagram, a marca, o site, um ambiente mais confortável para as pessoas”, finaliza. Já para Juliana Jazra, o fim da gordofobia é uma grande forma de reforçar essa luta. Com o fim dessa discriminação, a produtora de moda acredita que vai ser possível chegar em um alto nível de representatividade e aceitação. “É preciso entender que o corpo gordo é tão normal quanto o corpo magro, ele merece ser tão amado quanto o corpo magro. Quando a gente chegar em um patamar onde nós vamos ser olhados da mesma forma que olham para um corpo magro, que nós vamos ser cuidados da mesma forma que


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as pessoas cuidam de um corpo magro, nós vamos chegar nesse nível de representatividade”. Juliana também reforça a importância de cada vez mais pessoas gordas ocuparem espaços que antes não lhes eram dados. “A gente está abrindo um caminho para outras pessoas gordas, para que outras pessoas se sintam encorajadas e sintam que ali é o lugar delas”.

FEMINICÍDIO E OS DESAFIOS DE SER MULHER NO BRASIL Mulheres de diversas gerações relatam a dor e a luta enfrentados diariamente em prol do respeito, da igualdade de gênero e pelo rompimento de violências Por Ana Carolina Sousa, Tássio Santos e Thainá Silva Não importam a idade, a classe social e a origem: ser mulher no Brasil é historicamente desafiador. A luta vem de séculos e séculos atrás, ainda quando a mulher era vista apenas para servir seu parceiro, cuidar das crianças e dos afazeres domésticos. Trabalhar fora de casa não era tarefa para o gênero feminino, elas sequer tinham oportunidades para inserção no mercado e, se essa rara oportunidade surgisse, só podiam trabalhar com a autorização do marido. O tempo foi passando e muitas transformações ocorreram de lá para cá, como a oportunidade de frequentar a escola, de votar, ter direito à licença maternidade e tantos avanços alcançados pelas mulheres. Mas elas ainda lutam, principalmente pelo direito de ir e vir com segurança e de não serem violentadas dentro de casa, nas ruas ou no local de trabalho. “Mulher silenciada”. Foto: Ana Carolina Sousa.


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A presença das mulheres nas universidades é considerada uma das principais conquistas femininas. De acordo com o relatório Education at Glance 2019, as brasileiras têm 34% mais probabilidade de se formarem no ensino superior do que os homens. Na contramão disso, as mulheres ainda são a minoria quando se trata de inserção no mercado de trabalho, sem contar com as disparidades salariais. Elas têm rendimentos 33% menores, se comparados aos mesmos cargos exercidos pelos homens, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) de 2020. Tal cenário reforça as desigualdades que as mulheres vivenciam todos os dias, seja em trabalhos de carteira assinada, contratos ou em cargos de liderança. Mas esse é apenas um dos desafios que as mulheres enfrentam no país. O feminicídio é um crime que tem se tornado cada vez mais estarrecedor e assola a sociedade de forma extensiva e cruel. De acordo com levantamento feito, em 2020, pela Rede de Observatórios da Segurança, nos estados de São Paulo, Pernambuco, Rio de Janeiro, Bahia e Ceará, cinco mulheres são mortas por dia vítimas de feminicídio, um número alarmante, assustador e preocupante. Tudo isso evoca um olhar para segurança e justiça em prol da vida das mulheres, que se sentem violentadas todos os dias. Essas violências reverberam por todos os cantos, seja dentro de casa, com os próprios parceiros, seja ao ir para o trabalho ou para uma atividade de lazer.

EFEITOS COLATERAIS Apesar do conceito “feminicídio” estar mais em evidência nos últimos anos, essa prática é bastante antiga, quando não havia uma lei de proteção às mulheres. O feminicídio é definido pelo assassinato de mulheres, cometido em razão de gênero, mas ultrapassa essa definição. Esse tipo de violência envolve menosprezo, discriminação, opressão e gera sérios efeitos colaterais nas vítimas, como explica a psicóloga e técnica de Referência Especializada de Assistência Social, Anna Letícia Silva, que atua no Centro de Atenção Psicossocial (CREAS). “Nossas mulheres saem afetadas de uma violência por eventos cruéis que alteram suas vidas e destroem seu bem-estar, e esses efeitos podem ser momentâneos, pontuais ou contínuos, que perduram para a vida toda. Esses efeitos podem ser limitações físicas, ansiedade, fobias, irritabilidade anormal, síndrome do pânico, comportamento antissocial, somatizações, depressão, mudanças nas relações com os outros, mudanças nas regulações do afeto, estresse pós-traumático e desordem de personalidade. Somado a isso, ainda há outros efeitos como comportamentos autodestrutivos devido ao uso de álcool e outras drogas, ou até mesmo tentativa de suicídio”, explica Anna.


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Os casos de feminicídio estampam páginas de jornais e revistas todos os dias: Larissa Nascimento (22), Eliane Ferreira (34), Lorenza Maria Silva (41) e Maria Adriana Costa da Silva (38) são mulheres que foram mortas violentamente por seus companheiros e que, infelizmente, não tiveram tempo de pedir socorro. O machismo mata e ao mesmo tempo coage e afeta a vítima de forma desastrosa, como é o caso de Gabriela Martins* (20), que dos sete aos oito anos de idade foi violentada sexual e psicologicamente pelo padrasto. Apesar de já ter passado mais de doze anos que a adolescente denunciou o agressor, ela carrega até hoje os traumas, os medos, a ansiedade e muita insegurança. “A violência que sofri na infância foi e ainda é muito dura para mim. Além do medo de me relacionar, porque me vinha à memória o que eu tinha passado na infância, eu não ando tranquilamente na rua sozinha. Trabalho em um salão de beleza e volto para a casa à noite, e tenho medo de, a qualquer momento, ser violentada, seja de qual for a forma, porque nem sempre meu namorado consegue me buscar no trabalho. Nós, mulheres, temos nossas inseguranças ao andar com certos tipos de roupas, porque não sabemos como os homens vão reagir, e isso não é um problema nosso. Eles precisam saber o lugar deles, nos respeitar e entender que a roupa que nós vestimos não é um convite. E que somos livres”, disse. É difícil traçar o perfil do agressor, mas existem sinais que podem ser percebidos caso a vítima esteja atenta. As violências não são apenas físicas, acontecem de diversas maneiras e vão afligindo a vida das mulheres, como explica a psicanalista, pós-graduada em psicologia e saúde mental, Mayara Moraes. “Precisamos entender que agressão não acontece apenas no físico. Aquela pessoa que está sempre cortando suas falas, que diz que você só fala bobagem, que diz que você está sempre enganada, que contorna a situação e justifica o que fez colocando a culpa em algo que você falou ou fez, aquela pessoa que te controla, invade seu espaço, mexe no teu celular, escolhe teus amigos, determina teus passos, faz você “Um basta à violência”. Foto: Ana Carolina Sousa.

se sentir culpada, inferior, burra, insegura.


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Essa pessoa está te violentando, te agredindo, sem precisar te dar um tapa”, aponta. Julia Fonseca* (33) passou 19 anos junto com o seu agressor. Desde o início do relacionamento, quando tinha apenas 13 anos e ele 20, o seu namorado já dava sinais de violência psicológica e emocional, mas ela não percebia. Mesmo tendo sua vida controlada, Júlia casou aos 18 anos e logo engravidou por desejo do marido. Ela era uma das várias vítimas que não podia sair para trabalhar e tinha que ficar cuidando da casa, filhos e cônjuge. Quando percebeu que estava vivendo um relacionamento abusivo, começou a traçar o caminho do pedido de divórcio, que durou mais de três anos. Além das violências psicológicas e emocionais, Julia também sofreu violências morais, materiais, sexuais e físicas. “Desde sempre escutei: ‘não use essa roupa’; ‘ não ande com essas pessoas’; ‘tudo que falo é para o seu bem, sou mais velho e mais experiente’. Ele me levava e buscava na escola todos os dias, forçava relações sexuais, ameaçava tirar a guarda da minha filha, caso me separasse, quebrou todo o meu local de trabalho e me agrediu. Precisei fazer boletim de ocorrência, ir para a delegacia, fazer corpo de delito e pedir uma medida protetiva, tudo após me divorciar. Ele até chegou a ser preso, mas não durou muito. Já se passaram dois anos e hoje tenho paz com minhas filhas”, relata. O feminicídio é considerado crime tipificado pela Lei Federal 13.104/15. O código penal estipula pena de reclusão de 12 a 30 anos para os casos de homicídio contra a mulher por razões de gênero, seja violência doméstica ou familiar. Apesar do feminicídio ser criminalizado, isso não coíbe a sua prática, pois muitas mulheres vítimas de violências não realizam as denúncias, seja por medo, dependência financeira, ameaças ou falta de informação, o que enfatiza principalmente a importância de divulgar informações sobre a realização da denúncia e, para além disso, de que esse ato é um crime e que não deve ser naturalizado. Além da Lei do Feminicídio – 13.104/15 e a lei Maria da Penha – 11.340/06, há ainda outras leis que intentam proteger as mulheres e que autorizam a concessão de medidas protetivas de urgências, seja em casos de violência ou assédio. Mas, infelizmente, o acesso a esse tipo de informação ainda é limitado. A psicóloga Anna Letícia Silva enxerga que a Lei Maria da Penha trouxe inúmeros benefícios para a proteção das mulheres e, principalmente, evidenciou a violência contra a mulher. Mas ela acredita que é preciso pensar sobre como as mulheres irão acessar esses serviços e programas. “A lei Maria da Penha é uma lei efetiva, porém ainda necessitamos repensar sobre alguns aspectos e conceitos para que ocorra a efetivação mais concreta dos direitos das mulheres em todas as condições. Não basta que


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existam leis para nos proteger se não houver uma grande mudança de comportamento na nossa sociedade, dos operadores de serviços e instituições de proteção, e dos próprios agentes policiais envolvidos nesse processo, e como as vítimas podem acessar esses serviços que o país oferece - como as delegacias especializadas (DEAM), serviços de proteção básica e especial de assistência social com as suas normativas, o disquedenúncia e os centros de acolhimento”, explica. Olhar para o feminicídio como um problema sério é compreender que, apesar das leis de proteção existirem, os agressores não se sentem intimidados, e que necessariamente é preciso ampliar o acesso à informação e aos serviços de proteção às vítimas de violência contra a mulher e, para além disso, garantir a segurança contínua das vítimas. Justiça para frear essa epidemia que gera uma série de sequelas na sociedade, como a morte de mais de mil mulheres que ocorre anualmente no país também é uma das muitas reivindicações. Dados Jus Brasil. Infográfico: Eller Zant

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O FEMINICÍDIO NÃO SE ISOLA Neste cenário de pandemia, provocada pela Covid-19, o número de casos de violência doméstica contra as mulheres cresceu. De acordo com pesquisa organizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), em parceria com o Datafolha, que reuniu dados dos últimos 12 meses, oito mulheres foram agredidas fisicamente por minuto durante a pandemia no Brasil, e quase metade das violências vivenciadas por mulheres aconteceu dentro de casa.

“Vergonha”. Foto: Ana Carolina Sousa.

Isso porque a medida mais eficaz contra a disseminação do coronavírus é o isolamento social. Entretanto, na maioria das vezes, a vítima precisa conviver com o agressor em casa, como explica a psicanalista Mayara. “O agressor está dentro de casa. Em isolamento, muitas mulheres ficaram longe de suas redes de apoio, sem ter literalmente para onde ir, convivendo vinte e quatro horas com esse agressor, em um país que justifica assassinato, onde se diz que o homem ‘perdeu a cabeça’, seria evidente que os casos de violência e feminicídio iriam aumentar. Essas mulheres ficaram sem escapatória e sem ter a quem pedir auxílio. É dentro de casa que o oprimido vira opressor, e essas mulheres servem para descarrego dos rompantes de raiva e ódio acumulados nesses homens”, afirma. Além da violência doméstica se destacar no aumento de casos, devido ao cumprimento do isolamento com o agressor, os números das outras formas de violência contra a mulher também são alarmantes. Ainda segundo a pesquisa do FBSP, que entrevistou mais de mil mulheres de 130 municípios brasileiros, aproximadamente 17 milhões sofreram violência física, psicológica ou sexual no último ano. Por outro lado, dados divulgados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos apontam que houve um aumento de denúncias referentes à violência contra a mulher recebidas pelos canais Ligue 180 e


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o Disque 100. Ao todo, em 2020, foram registradas 105.821 denúncias. Já em 2021, até o momento, constam mais de 30 mil denúncias de violência contra a mulher. Porém, apesar destes dados, as vítimas de violências estão tendo dificuldade para realizar a denúncia. Segundo a advogada Daiana Guimarães, que atua nas áreas de Direito de Família e Direito da Mulher, a maior convivência das mulheres com os agressores acaba as impedindo de procurar ajuda ou ir até uma delegacia. “Com esse contato mais próximo do agressor, e sob uma vigilância maior do mesmo, até mesmo o uso de telefones e aplicativos torna-se dificultoso para a mulher que é vítima e, por isso, acabam tendo mais dificuldades em formalizar denúncias de agressões contra os agressores, o que, por muitas vezes, lamentavelmente, resulta na morte da vítima”, pontua Daiana. Contudo, mesmo que em passos lentos, há algumas campanhas, projetos e canais de denúncias como o “Denuncie a violência doméstica. Para algumas famílias, o isolamento está sendo ainda mais difícil”, desenvolvido pelo Governo Federal, que visa não apenas chamar a atenção contra as agressões sofridas pelas mulheres, mas enfrentar e conscientizar a população sobre um problema grave e que está cada vez mais inflamado na sociedade. Além disso, as mulheres não podem e nem devem ter medo de buscar ajuda ou aceitar tais atos: elas precisam denunciar o agressor. Ao Estado, cabe acolher essas mulheres e acompanhá-las durante todo o processo, o que é uma forma de dar mais segurança às vítimas e garantir que elas sejam assistidas de forma efetiva. O silêncio mata, mas a falta de acolhimento corrobora ainda mais para que mais mulheres se sintam sozinhas e desprotegidas, o que pode piorar ainda mais essa triste realidade do feminicídio no país.

NÃO SILENCIE. DENUNCIE! A violência contra a mulher está tão naturalizada no Brasil que, às vezes, é imperceptível. As mulheres estão a todo momento sendo violentadas, e o que impressiona é que elas são agredidas ou mortas pelo simples fato de serem mulheres. Ao mesmo tempo que isso choca, traz reflexões importantes sobre como o preconceito e a discriminação de gênero vêm tomando proporções cada vez mais cruéis e voláteis na sociedade. É importante destacar que, no país, há canais de denúncias que podem ser acessados gratuitamente e de forma sigilosa. Tanto as mulheres vítimas de violência - física, psicológica, sexual, patrimonial e moral -, quanto outras pessoas que presenciam esses tipos de violências podem realizar essas denúncias e buscar ajuda. Daniela Maciel, advogada criminalista e membro


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da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas (ABRACRIM), explica os canais onde essas vítimas podem realizar as denúncias contra os agressores. “As denúncias podem ser realizadas através do 180, ou diretamente na delegacia da mulher. Lá, ela será ouvida e será lavrado um boletim de ocorrência, em que será tomado a termo a representação dela contra o agressor. E é nesse momento que serão colhidas todas as provas policiais e periciais. Essa representação deve ser encaminhada ao juiz em até 48 horas para que, assim, seja concedida uma medida protetiva, caso a vítima deseje”, explica. Algumas mulheres, após realizarem a denúncia, podem se sentir ameaçadas pelo agressor ou até mesmo pelo familiar. Se a vítima se sentir coagida, a advogada criminalista esclarece que, em caso de renúncia sobre a representação, os procedimentos desse processo precisam obrigatoriamente seguir todos os protocolos judiciais. Daniela Maciel ainda deixa o seu recado para todas as mulheres que são vítimas de violência. “Tratando-se de uma ação pública judicial condicionada à representação, a vítima não pode renunciar essa representação sem que haja uma audiência especialmente designada para tal, onde ela será ouvida pelo juiz competente. Como mulher e advogada, eu aprendi a ter fé e esperança nos bons profissionais que ainda existem. Nós ainda estamos muito longe do ideal, estamos ainda mais distantes do impossível, porque muitas mulheres já lutaram por nós para que continuemos essa luta e que lutemos por nós mesmas, umas pelas outras. Que você e que nós sejamos fortes e corajosas. Denunciem e busquem outras mulheres para lutarem lado a lado com vocês”, reforça. A voz da mulher é capaz de romper o silenciamento e preconceitos que estão enraizados em suas histórias, em seus corpos e em suas relações. A voz de uma mulher pode produzir sororidade e quebrar o ciclo de poder estabelecido sobre todos. Conscientizar-se de que as mulheres devem lutar pela reivindicação de seus direitos, lutando em prol da igualdade entre gêneros em diversos contextos sociais, visando o rompimento evidente de tantas reações contrárias à presença feminina, são aspectos cruciais da vida em sociedade.


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Em Belo Horizonte, há uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher na Avenida Augusto de Lima, 1.942, Barro Preto. Os telefones para contato são: (31) 3291-3573 e (31) 3330-1928. Para falar com a 3ª Delegacia Especializada do Plantão de Atendimento à Mulher, o telefone é (31) 3295-6913. O 180, de âmbito nacional, é gratuito e funciona 24 horas por dia. Não silencie, denuncie! *Para preservar a identidade das mulheres, vítimas de violência, que cederam entrevista, os nomes são fictícios.

A VULNERABILIDADE LGBTQIA+ FRENTE A PANDEMIA DE COVID-19 Os quadros depressivos afetam 10% dos adultos brasileiros em geral, enquanto atingem 25% dos LGBTQIA+ Por André de Paula e Marcela Reis Bem antes da pandemia, já era de conhecimento geral que pessoas LGBTQIA+ sofrem dos mais diversos tipos de exclusões. Porém, o atual cenário de isolamento social veio a agravar as condições psicológicas, socioeconômicas e até mesmo afetivas da vida de algumas dessas pessoas de forma única, enfatizando uma série de problemas e negligências já enfrentados por esse público. De acordo com a pesquisa realizada pelo coletivo #VoteLGBT, cerca de 42% das pessoas entrevistadas alegaram piora na saúde mental, outras 39% mencionaram dificuldade de lidar com as regras do convívio social, a convivência familiar e a solidão, associadas ao afastamento das redes de apoio que muitas pessoas tinham antes da pandemia, 17% disseram enfrentar dificuldades econômicas e se sentem fortemente afetadas pela falta de emprego e dinheiro, e 54% afirmaram precisar de apoio psicológico.


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População LGBTQIA+ fica ainda mais vulnerável durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Imagem: Unsplash.

Segundo o mesmo estudo, a população LGBTQIA+ está mais propensa que a média nacional a sofrer com problemas de saúde mental. Ao analisar esse grupo, é possível associar a manifestação recorrente de problemas mentais e emocionais, como depressão e ansiedade, ao convívio rotineiro com as diversas formas de preconceito. Tendo em vista esse cenário, podemos entender que a quarentena e o isolamento social limitaram muitas dessas pessoas a ambientes familiares muitas vezes pouco saudáveis, bem como impossibilita que pessoas LGBTQIA+ se congreguem presencialmente a fim de fortalecer seus vínculos e o senso de comunidade. Foi o que alegou a entrevistada Laura Carmine, mulher trans e estudante de 21 anos. Segundo ela, durante o período de isolamento social, se viu forçada a conviver por muito mais tempo com os familiares, que ainda apresentam resistência em compreender sua identidade de gênero. “Me revelei trans faz mais ou menos 4 anos, de lá pra cá minha mãe me trata com muita rispidez. O tempo que eu passava fora de casa era precioso para colocar a minha cabeça no lugar, agora eu não tenho mais esses momentos, acabo me sentindo muito mais cansada psicologicamente”, declarou a estudante de Biologia. Ela também disse que estar afastada de outras amigas trans tem reforçado a sua sensação de solidão, o que a faz se sentir ainda pior diante do comportamento transfóbico por parte da família. Já Victor Mendes relatou que sua maior dificuldade vem sendo prover seu sustento estando confinado em casa. “Eu sou ator e mesmo fazendo


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trabalhos virtuais, minha família faz constantes críticas homofóbicas relacionadas ao meu trabalho com figurinos. Eu nunca precisei lidar com esse tipo de desconforto nos espaços em que trabalhei, é muito desgastante ter que passar por isso em casa”, desabafou o jovem gay, de 26 anos. Victor também mencionou que os eventos LGBTQIA+ eram uma grande fonte de renda para ele e, nas atuais circunstâncias, continuam inviáveis. “Minha renda caiu muito e acredito que a de grande parte das pessoas com quem eu trabalhava também. Os eventos eram minha principal forma de conseguir dinheiro”, completou. Entrevistamos também o psicólogo clínico e pós-graduando em psicologia social, Renato Neves, e ele fala sobre o agravamento do sofrimento mental em pessoas LGBTQIA+ durante o contexto da pandemia. Segundo Renato, é muito válido ressaltar que pessoas da comunidade LGBTQIA+ já sofriam com o isolamento antes da Covid-19. Ele explica que, em sociedades de base patriarcais como a nossa, as pessoas do grupo LGBTQIA+, e que estão mais próximas do feminino como, por exemplo, as mulheres trans, os casais de mulheres lésbicas e os homens gays que são mais afeminados, já viviam uma rotina de esconder quem eles são em determinados espaços. Renato cita que é importante lembrarmos que esse medo não se trata de um medo irracional, se trata de ter medo do real e do que exatamente pode ocorrer. Ainda de acordo com o psicólogo, as pessoas LGBTQIA+ estão sofrendo um isolamento duplo, pois além de se esconderem das idealizações da família tradicional brasileira, agora também enfrentam o isolamento por causa da pandemia. “Tenho observado na clínica que as pessoas LGBTQIA+ chegam com mais sintomas de angústia e de ansiedade justamente porque agora elas não têm muito para onde fugir”. Renato Neves também menciona que, antes da pandemia as pessoas tinham os espaços públicos, os eventos e visitavam as casas de pessoas queridas que as acolhessem e, agora, pessoas que são do grupo LGBTQIA+ e convivem com familiares que nãos os aceitam, estão sendo obrigados a passar muito mais tempo com essas pessoas, estando mais sujeitas a agressões, sejam verbais ou físicas. Ao longo da vivência LGBTQIA+, grupos extrafamiliares muitas vezes acabam por substituir o papel familiar, oferecendo esperança para que essa pessoas tenham uma referência e que se vejam em outros espaços. O pós-graduando também enfatizou o papel de eventos, como a Parada LGBTQIA+, como uma referência no espaço público muito importante para que a pessoa LGBTQIA+ se veja sendo representada, bem como um dispositivo de conscientização cotidiana sobre a luta da polução LGBTQIA+, esta, que nas atuais condições sanitárias do país, ainda se encontra inviável.


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Para Renato, as redes de apoio são importantes para que essas pessoas não acabem no fatalismo, se alienando aos discursos homofóbicos que são repetidos através de piadas, anúncios, publicidades e através das falas de pessoas de certa relevância e que trazem mensagens homofóbicas (em algumas vezes disfarçadas). Por isso, a necessidade de existir um suporte, para que as pessoas não vivam presas em sentimentos negativos sobre elas mesmas. “Todas as redes de apoio são muito importantes, mesmo que seja uma rede de apoio entre amigos. A ausência dessas redes pode agravar muito a saúde mental de determinadas pessoas do grupo LGBTQIA+, muitas vezes elas procuram nessas redes de apoio o que elas nunca tiveram da família”, completou.

SAÚDE MENTAL

De acordo com pesquisa do coletivo #VoteLGBT, 54% das pessoas LGBTQIA+ afirmam precisar de apoio psicológico. Imagem: Unsplash.

Conforme dados divulgados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no ano de 2020, a cada uma hora, uma pessoa sofre violência devido à sua identidade de gênero ou orientação sexual, seja ela física, moral ou psicológica. A desassistência do sistema de saúde à comunidade os deixam ainda mais vulneráveis. Segundo uma pesquisa realizada pelo Inquérito Nacional de Saúde LGBTQIA+, juntamente com Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), durante a pandemia de Covid-19, 36% das pessoas que pertencem à comunidade mencionaram casos de intolerância semanais, sendo 11% dentro do sistema de saúde. De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde, feita pelo Instituto Brasileiro de Gerografia e Estatística (IBGE), no ano de 2019, enquanto os quadros depressivos afetam 10% dos adultos brasileiros em geral, 25% da comunidade LGTQIA+ é afetada. Ainda conforme a pesquisa, esses dados revelam a grande carga de depressão e ansiedade nas pessoas da comunidade, e reforça a necessidade de fazer um rastreio de saúde mental identificando as pessoas que estão sob maior risco, dando suporte psicológico e prevenindo episódios suicidas. Apesar da importância dos grupos de suporte, é necessária a construção de políticas permanentes que vão além do assistencialismo, para que a pessoa que está em uma situação vulnerável se sinta acolhida e confortável a buscar e a receber um tratamento adequado.


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