Eu não quero repartir (Material do professor)

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Daniel Goltcher

Ilustrações de Sergio Magno

LIVRO DO PROFESSOR

MATERIAL DIGITAL DO PROFESSOR

Editora Universo da Literatura Ltda. Avenida Ordem e Progresso, 157 – 8º andar – Conj. 803 CEP 01141-030 – Barra Funda – São Paulo/SP Telefone/Fax: (11) 3392-3336

MATERIAL DIGITAL DO PROFESSOR – PNLD 2022 Educação InfantilTÍTULO EU NÃO QUERO REPARTIR

CATEGORIA DE INDICAÇÃO Creche II

ESPECIFICAÇÃO DE USO Para que o professor leia para crianças bem pequenas

GÊNERO LITERÁRIO

Narrativos: fábulas originais, da literatura universal e da tradição popular etc.

TEMAS ESPECIFICADOS

Quotidiano de crianças nas escolas, nas famílias e nas comunidades (urbanas e rurais); Relacionamento pessoal e desenvolvimento de sentimentos de crianças nas escolas, nas famílias e nas comunidades (urbanas e rurais);

AUTORIA E ILUSTRAÇÃO Daniel

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5 Sumário Apresentação 7 O trabalho com a obra e a base nacional comum curricular 10 1. Pré-leitura 11 Os autores 15 2. Leitura dialogada 17 3. Pós-leitura 23 Roda de conversa 23 Arte — simetria 23 Dia do brinquedo 25 Dramatização 26 4. Literacia familiar 27 Empréstimo de um brinquedo 27 Lanche coletivo 28 Referências bibliográficas 30

Um dos maiores desafios do convívio é a partilha. Entre as propagandas que nos prometem independência, individualidade — fazer tudo do “conforto” do lar, sem sair de casa — e felicidade, reside a nossa condição humana de ser gregário. É possível viver só? Como foram os momentos em que nos sentimos mais felizes em nossa vida? São perguntas que comumente remontam a experiências divididas com outras pessoas e que frequentemente estão associadas à nossa infância. Eu não quero repartir é um livro que nos coloca, adultos, diante de tais reflexões e nos desafia a promover momentos de partilha dessas perguntas com as crianças, convidando-as a confrontar as sensações depreendidas das experiências que viveram sozinhas com as compartilhadas com outras pessoas. O (re)encontro com essas sensações é uma grande oportunidade para mostrar-lhes que “a felicidade só é real quando compartilhada…”, como afirmou Henry David Thoreau.

A partilha é um tema que dialoga com a realidade da criança; vivência necessária para trabalhar a sua construção enquanto ser social.

E por que não dizer que devemos estar atentos ao tema durante toda a vida?

É preciso aprender a repartir para conviver. E repartir — partir, deixar ir parte de algo — pode ser doloroso em alguns momentos, principalmente para as crianças: repartir a atenção da mãe, repartir brinquedos e, mais à frente, repartir as letras do seu nome — aquilo

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Apresentação

que há de “mais seu” no momento em que se começa a escrever. Sabe-se quão legítimo é esse tema às crianças e quão necessário ao desenvolvimento da empatia é o compartilhar.

Daniel Goltcher e Sergio Magno nos trazem um livro que vai além do discurso — pela leitura das imagens, as crianças conseguem visualizar as “dualidades” implícitas no repartir e também observar as expressões das personagens, possibilitando o encontro construtivo do texto e das imagens com as vivências infantis. São ilustrações vívidas que transportam os pequenos e pequenas para situações comuns ao quotidiano, permitindo que vivam afetivamente as sensações provocadas pelo ato de repartir; deixar partir uma parte de algo que lhes pertence.

As experiências apresentadas no livro são diversas: repartir brinquedos, alimentos, roupas, espaços, a vez, objetos afetivos. Após essa imersão, seguem-se as consequências, o ônus do não repartir, o ensinamento de que, para se inserir socialmente, é preciso dividir com outra(s) pessoa(s). Só faz sentido “ter” se for para “ser”, e não existe “ser” só: somos a partir do outro.

Essas questões que perpassam a filosofia e a sociologia estão diretamente ligadas ao desenvolvimento das crianças, enquanto seres em construção, seres sociais e parte do todo.

Com este livro, o professor ou professora terá um rico material em que, por meio de um texto sensível e das ilustrações que dialogam com o imaginário infantil, a mensagem passa pelo diálogo e pela afetividade — uma união perfeita para dar significado às transformações necessárias para o bem comum, para o coletivo, para o desenvolvimento das inteligências intrapessoais e interpessoais.

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A inteligência interpessoal denota a capacidade de entender as intenções, as motivações e os desejos do próximo e, consequentemente, de trabalhar de modo eficiente com terceiros. A inteligência intrapessoal envolve a capacidade de a pessoa se conhecer, de ter um modelo individual de trabalho eficiente incluindo aí os próprios desejos, medos e capacidades e de usar estas informações com eficiência para regular a própria vida. (GARDNER, 2001, p. 57 e 58).

Começa aqui uma rica aventura, na qual o partilhar torna-se um meio de ser e estar, fundamental para o desenvolvimento, exercido pela troca, pela interação, pelo compartilhamento de experiências.

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O TRABALHO COM A OBRA E A BASE NACIONAL COMUM

CURRICULAR

CAMPO DE EXPERIÊNCIA HABILIDADES

Traços, sons, cores e formas

O eu, o outro e o nós

EI02TS02

EI02EO01

EI02EO03

EI02EO04

EI02EO06

EI02EO07

Corpo, gestos e movimentos

Escuta, fala, pensamento e imaginação

EI02CG01

EI02EF01

EI02EF03

EI02EF04

EI02EF07

EI02EF08

Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações

EI03ET01

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As estratégias sugeridas neste material contribuirão para o desenvolvimento das seguintes habilidades, previstas na BNCC da educação infantil:

Antes de iniciar a leitura do livro, é aconselhável que o professor ou professora realize algumas estratégias de antecipação, para que os pequenos e pequenas possam aproveitar melhor a experiência. Assim, sugere-se que se faça uma roda de conversa, para que as crianças possam se ver e interagir; essa estratégia favorece a construção de relacionamentos e a realização de inferências. Pode-se iniciar a atividade com a pergunta: “Qual o brinquedo de que você mais gosta?”. Em seguida, pode-se solicitar que descrevam o brinquedo ou a maneira como se brinca: sozinho/sozinha? Com outras pessoas? A sequência de perguntas pode prosseguir: “Você tem irmão ou irmã? Já teve que repartir o brinquedo de que mais gosta com o seu irmão/a sua irmã? Com algum outro familiar? Com algum amigo/amiga? Já teve que repartir alguma coisa gostosa que estava comendo com alguém? Já teve de repartir a atenção de sua mãe ou seu pai com seu irmão ou irmã?”.

Cada um desses questionamentos deve vir acompanhado da pergunta: “Você se sentiu feliz ou triste?”. Outros exemplos são: “Você já viu alguém comer alguma coisa gostosa e sentiu vontade de comer também? Você quis repartir? Como se sentiu: feliz ou triste? Você já viu alguém brincar com algum brinquedo e teve vontade de brincar também? Como você se sentiu: feliz ou triste?”. É importante que esse momento de interação seja conduzido com espontaneidade pelo professor ou professora, que

11 MATERIAL DIGITAL DO PROFESSOR 1. PRÉ-LEITURA

pode iniciar essa partilha de vivência usando uma fruta, por exemplo, para explicar e exemplificar o que significa a palavra “repartir” e trazer a experiência para o âmbito concreto.

Além de antecipar o tema principal do livro, essa estratégia promove o “diálogo interior”, pois, uma vez questionada, a criança mobiliza seu repertório de experiências e vocabulário que as descrevem; organiza suas ideias para expressá-las, planejando, a partir dos esquemas que já assimilou, a verbalização do que lhe foi solicitado, ainda que com poucos detalhes. As outras crianças podem auxiliá-la nesse processo, complementando com outras palavras de seu repertório, confirmando detalhes de um determinado brinquedo ou indicando um sentimento que também já tenham sentido, em um processo de construção da imagem de si e do outro. Segundo Oliveira et al. (2011, p. 45), “a interação que o indivíduo estabelece com o meio, em especial com outros indivíduos em situações sociais determinadas, é essencial para a formação do pensamento e da personalidade”.

O registro das observações e expressões das crianças é uma prática muito rica, sobretudo quando um dos objetivos do trabalho é a educação emocional; as diversas formas de comunicação, por meio de falas, gestos e intenções de fala marcadas pelas expressões corporais, fornecerão informações para avaliar o desenvolvimento cognitivo de cada uma: como se expressa — a construção e a expressão do pensamento por meio da oralidade —, as relações que consegue estabelecer e sua evolução. Esses registros poderão ser organizados em um portfólio, que servirá como ferramenta avaliatória da evolução de cada criança quanto ao seu processo de aprendizado e também para acompanhamento dos familiares.

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Consideramos o portfólio uma testemunha da ação pedagógica, o registro de como o trabalho ocorreu, a memória da evolução de uma mesma proposta desenvolvida em diferentes momentos. Essa forma de documentação envolve interpretações de dimensões pedagógica e psicológica. Pedagógica porque o portfólio caracteriza-se como um objeto fundamental de ensino, da valorização do raciocínio e das atitudes da criança. Psicológica porque mostra um pouco da personalidade de cada uma, de sua forma de ser e de pensar. Por meio dessa documentação, o professor ou professora pode compreender alguns anseios ou dificuldades e as conquistas de cada aluno (SMOLE, 1996, p. 186).

A estratégia seguinte a ser adotada pode ser o convite à leitura do livro por meio da apresentação de sua capa. Afinal, as imagens também mediam nossa relação com o outro. É por meio delas que reconhecemos as diferenças, alimentamos nossas crenças, construímos nossa concepção de como estar no mundo (PEREIRA, 2008, p. 19). Pode-se despertar a atenção do grupo para a ilustração de capa, que traz uma representação da figura humana de perfil, ou seja, mostrando seu rosto pela metade, ainda que com contornos bem definidos e cores vivas. A qualidade das ilustrações criadas por Sergio Magno possibilita apresentar os seguintes questionamentos: “Por que o rosto está pela metade? Cadê a outra parte?”, aguçando ainda mais a curiosidade das crianças e levando-as a perceber a parte que falta da pessoa representada na imagem. Sugerimos utilizar a palavra “pessoa” para se referir à imagem, a fim de evitar as referências binárias de gênero. Para essa abordagem, sugerimos a leitura de estudos recentes e conceituados sobre o percurso de construção da desigualdade de gênero, que provoca muitos problemas de ordem psicológica e social, e sobre como podemos contribuir para a criação de uma sociedade mais justa da perspectiva de gênero. Desde muito cedo, no

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âmbito familiar ou escolar, as crianças recebem ensinamentos por meio de gestos, tom de voz, da escolha dos brinquedos, das brincadeiras e das roupas que devem usar ou da indicação de como devem se comportar, o que é aprovável e o que é reprovável, inclusive em relação ao que lhe é esperado por ser menino ou menina. Nesse processo, as crianças também depreendem o “significado” dessas palavras, a interpretação que os outros atribuem para os termos homem/menino e mulher/menina.

Segundo renomados autores, como Fagundes (2001, p. 76) ou Passos (1999, p. 106): “[…] no Brasil, tradicionalmente, homens e mulheres recebem educação diferenciada, não em respeito às diferenças entre os sexos e sim para torná-los desiguais e com isso, marcá-los, rotulá-los e destiná-los a lugares e papéis”. Assim, é preciso ter um olhar cuidadoso e despido da visão tradicional e desigual de gênero, a fim de formar sujeitos mais livres e autônomos, que possam se desenvolver de maneira integral desde a educação infantil. Se a definição do gênero for considerada necessária, sugerimos que essa interpretação seja livre, partindo das próprias crianças.

Outra importante ação que poderá ser feita é conduzir a atividade para que as crianças leiam a expressão facial da pessoa representada na imagem:

“Como essa pessoa está se sentindo? Feliz? Triste? Assustada? Calma?”.

A partir das repostas e da conclusão à qual as crianças chegaram em relação à expressão da ilustração, é possível ampliar o diálogo: “Por que será que essa pessoa está se sentindo assim?”.

Neste ponto, a leitura do título complementará as hipóteses levantadas e possibilitará inferências dos pequenos e pequenas. É importante recuperar as questões iniciais: “O que é repartir? Quem reparte?”. E, antecipando a reflexão sobre a escolha de “não repartir”, pode-se apresentar o questionamento: “Será que ficamos felizes quando não repartimos?”.

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OS AUTORES

A leitura com os pequenos e pequenas também é uma partilha, e, para aproveitá-la melhor, sugerimos algumas estratégias. A curiosidade das crianças é genuína, e essa energia para saber “de onde vêm as coisas” deve ser aproveitada. Assim, é importante que o professor ou professora apresente o autor e o ilustrador do livro que vão ler. Além disso, embora as crianças tenham pouco repertório ou experiência para compreenderem a passagem do tempo, é interessante que sejam expostas a exemplos que demonstrem essa passagem. A trajetória do autor e do ilustrador de Eu não quero repartir reflete as vivências que os dois tiveram na infância e que os conduziram a uma vida adulta em contato com as coisas de que mais gostam desde esse período.

Outra prática interessante é, antes de falar do escritor e do ilustrador, incentivar as crianças a pensarem sobre as ocupações dos adultos que as cercam — a ocupação ou profissão de familiares e responsáveis, e também sobre o que fazem alguns profissionais da escola, como o professor ou professora, as pessoas que cuidam da limpeza e da alimentação, por exemplo, sempre com o cuidado de se referir a elas pelo nome e demonstrar a importância de sua atividade. Essa observação tem como objetivo aproximar as crianças da ideia de que escritores e escritoras, ilustradores e ilustradoras, produzem livros e literatura, arte tão necessária à nossa vida. Em seguida, sugerimos que se mostrem as fotos do escritor e do ilustrador, destacando-se a importância do trabalho de cada um na construção do livro e do que mais gostavam de fazer, quando crianças, como fio condutor das atividades que fazem hoje, na vida adulta. As fotos servem como recurso de aproximação e envolvimento na escuta sobre a vida dessas pessoas.

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A seguir, fornecemos algumas informações sobre a biografia dos autores para direcionamento das intervenções:

Daniel Goltcher nasceu em Curitiba–PR em 1970 e mudou-se para São Paulo ainda muito pequeno. Apaixonado desde a infância por música, cinema, livros, quadrinhos e artes em geral, acabou buscando na propaganda a junção de todas essas paixões. Nesse percurso, trabalhou em várias fases da produção de conteúdo para rádio e TV. Mais tarde, resolveu escrever livros infantis; Eu não quero repartir é o seu quarto livro. Nele, Daniel conta sobre sua própria experiência com sua irmã menor, mas também aborda questões que observa na relação entre seus filhos.

Sergio Magno é formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e pelo Istituto Europeo di Design. Sua habilidade para lidar com as imagens desde criança e sua grande criatividade o conduziram para a publicidade e para a produção de animações. Em seu processo de criação, realiza uma imersão em um ambiente lúdico, de onde surgem personagens e histórias. A forma como realiza seu trabalho na vida adulta é uma atualização de seus “rabiscos em blocos de papel e caixas de lápis de cores” tantas vezes apontados, como ele mesmo relata, resultando em um trabalho que para ele é uma grande diversão.

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2. LEITURA DIALOGADA

Eu não quero repartir é ilustrado com imagens vívidas, propícias para a realização de intervenções que favoreçam o desenvolvimento de diversas habilidades nas crianças. Um olhar mais atento conduzirá à identificação de diversos elementos que permeiam o universo infantil na faixa etária para qual o livro foi escrito. Sempre considerando o nível de alcance da turma, o professor ou professora pode fazer perguntas que levem as crianças à percepção da variedade de formas, cores e detalhes gráficos das imagens: “O que está faltando nessas imagens? Por que será que está faltando uma parte? Por que o rosto dessas pessoas está pela metade? O que será que tem na outra metade?”. Essa prática favorece o desenvolvimento da atenção e da concentração e servirá como base para o aprofundamento do tema desenvolvido pelo texto verbal.

Ao iniciar a leitura mais atenta, página por página, teremos, em cada cena, abertura à discussão sobre as sensações e consequências do ato de repartir: “O que vemos nessa imagem? Há algum brinquedo? Que brinquedo é esse? Há alguma pessoa? A pessoa está feliz ou triste?”. Depois dos comentários sobre as ilustrações deve-se proceder à leitura do texto verbal, seguida de perguntas sobre a reação das crianças: “E você, emprestaria? E se estragassem? E se não devolvessem? E se você tiver que brincar sozinho/sozinha?”.

O conteúdo verbal e visual do livro apresenta grande potencial para desenvolvimento da educação emocional das crianças, contribuindo

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para promover seu bem-estar psicossocial e para a formação de sujeitos mais autônomos e capazes de lidar com suas emoções, além de aptos a construir relacionamentos saudáveis. Franco (2009, p. 135) defende uma abordagem significativa das emoções no âmbito escolar por parte dos educadores (as suas e as das crianças), a fim de proporcionar “bem-estar emocional, pois quando elas estão ausentes ou são excessivas tornam-se patológicas, perturbando o curso normal das situações de vida”. No momento da leitura, é importante que as crianças coloquem as ações retratadas no campo das sensações, para que sejam desdobradas depois do fim da leitura. Goleman (2012, p. 28) afirma que a emoção é reflexo de um estado de espírito passageiro que surge como resposta biológica a determinada situação, sendo, portanto, indissociável da razão. Demore-se em cada imagem pelo tempo que for necessário para que os pequenos e pequenas leiam as figuras e as expressões (de alegria ou de tristeza) associadas ao ato de repartir. É importante que “vivam” as memórias que possuam dessas ações corriqueiras do universo infantil, dando embasamento às próximas discussões e atividades propostas. Segundo Moreira (2008, p. 167), a partir dos três anos de idade, a criança é capaz de expressar seu estado emocional, atribuindo significados emocionais às vivências do dia a dia e relacionando-as com experiências já vividas. Ao longo do livro, iremos nos deparar com questionamentos acerca do ato de não repartir. Sugerimos ampliar essa questão, oferecendo exemplos de situações que levem cada um a questionar se é melhor ter tudo só para si: “É melhor ter um saco inteiro de pirulitos só para você e deixar todas as outras crianças olhando, com vontade? O que você escolheria? Repartir com os colegas ou comer tudo sozinho/sozinha?”.

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Depois, é importante estimular a criança a justificar sua escolha destacando as consequências da ação: “Se repartir, você terá menos doces, mas todas as outras crianças terão doces também. Se não repartir, você terá todos os pirulitos, mas seus amigos e amigas ficarão com vontade… Talvez os outros também não queiram repartir nada com você. Como se sentiria se o seu amigo/amiga tivesse muitos pirulitos e não quisesse repartir com você?”.

Também é possível avançar essa discussão utilizando brinquedos como exemplo: “Ninguém é obrigado/obrigada a repartir um brinquedo, mas o que é melhor: brincar sozinho/sozinha ou com colegas?

Brincar com vários brinquedos ou só com o seu? Você já teve vontade de brincar com algum brinquedo que alguém não quis repartir com você? Como você se sentiu?”.

Na página 24, a personagem apresenta uma expressão reflexiva diante da constatação de que não quer “repartir nada com ninguém”. No entanto, essa conclusão não demonstra ser confortável, dada a expressão reflexiva e descontente de seu semblante. Por isso, chega à conclusão de que, “pensando bem”, não é que não queira… É aconselhável explorar de maneira cuidadosa esse ponto máximo de conflito em que se encontra a personagem, pois sua expressão reflexiva demonstra que está tentando descobrir o motivo de seu desconforto ao concluir que não quer repartir nada: “O que será que essa pessoa está pensando? Parece feliz ou triste? Se vai ficar com tudo só para si, por que ainda está triste?”. Repetindo a frase “não é que eu não quero repartir”, peça às crianças que apresentem hipóteses sobre qual seria o problema. Segundo Goleman (2012, p. 284), a tristeza é o sentimento imediato decorrente de uma frustração.

Na página seguinte, a personagem constata que o que não quer é “ficar com o coração partido…”. Nesse ponto, é interessante aproveitar

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as emoções afloradas pela leitura para propor alguns questionamentos: “O que seria ficar com o coração partido? Você já ficou triste? Por quê?”. Deixe que cada uma das crianças fale com naturalidade, orientando a escuta atenta do outro. Pode-se retomar a frase, explicando que, quando estamos tristes, podemos dizer que “estamos de coração partido” e que a personagem sente tristeza ao repartir porque tem de deixar partir um pedaço de si; dividir aquilo de que gosta com alguém. “Mas será que essa pessoa se sente feliz quando não reparte as coisas? Quando reparte, fica com uma parte daquilo de que gosta, mas as outras pessoas também têm uma parte; então, tendo, cada uma, uma parte daquilo que gostam, elas não poderiam, assim, dividir a felicidade e ficarem todas felizes?”.

Conforme Kostelnik et al. (2013, p. 166), o adulto deve ajudar a criança a desenvolver suas habilidades emocionais da seguinte maneira:

• Definir o problema ou objetivos;

• Obter informação sobre a disponibilidade de recursos;

• Criar alternativas possíveis;

• Escolher entre as alternativas possíveis;

• Escolher entre as alternativas e ater-se a elas;

• Reunir materiais e equipamentos conforme as necessidades e organizar o ambiente;

• Executar o plano; e

• Discutir e avaliar a atividade.

A literatura é um dos principais recursos para o desenvolvimento da educação emocional das crianças, e, mais especificamente, Eu não quero repartir oferece diversas possibilidades de intervenções nessa esfera.

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RODA DE CONVERSA

Convidamos você, professor ou professora, a aprofundar a mensagem do texto com questões como: “Para um colega que não lhe empresta nada, você mesmo assim emprestaria o seu brinquedo?”.

O livro traz questões que favorecem o desenvolvimento e a valorização da empatia; questões sobre “se colocar no lugar do outro” para estar “ao lado do outro”.

Após os diversos questionamentos apresentados durante a leitura, chega o momento em que podem ser abordadas as singularidades implícitas no ato de emprestar algo: a possibilidade de que se quebre ou se perca, o ato de esperar a vez, os ciúmes decorrentes, dentre outras situações que estão relacionadas ao repartir. Como lidar com elas?

E com as emoções de não repartir?

A vida em sociedade é um processo de aprendizagem do ganhar e do perder, o que podemos, de certa forma, resumir com a expressão “aprender a viver”.

ARTE — SIMETRIA

O que acontece quando emprestamos ao outro aquilo que temos de melhor?

Propõe-se aqui uma atividade que trabalha a simetria por meio da pintura. Sugerimos que a atividade primeiro seja desenvolvida de

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3. PÓS-LEITURA

maneira coletiva e depois sejam oferecidas oportunidades de experiência individual a todas as crianças.

Em uma grande roda, mostre uma folha em branco para as crianças, relatando que, como essa folha não gostava de repartir nada, ficou esperando alguém usá-la — a folha em branco representa o vazio gerado por não compartilhar nada. Nesse momento, pergunte às crianças o que podemos fazer com uma folha em branco. Em seguida, acolha as respostas e, se necessário, amplie o diálogo oferecendo sugestões:

“Escrever? Pintar? Fazer um brinquedo? Um avião? Um barco? Amassar? Rasgar? Transformar em uma bola?”.

Após essa etapa inicial, continue a narrativa explicando que a folha se dividiu ao meio: uma parte resolveu que queria ter muitas coisas e que não iria repartir nada com a outra metade. Neste momento, dobre a folha ao meio, fazendo um vinco. Proponha a pintura desta metade da folha com tinta plástica, reforçando que ela queria muitas coisas: cada desejo poderá ser apresentado por cores diferentes, sendo necessário usar muitas cores, assim como as ilustrações do livro. A pintura deverá ser feita com cores fortes, marcantes, utilizando-se movimentos fortes para representar a fartura, o exagero. Depois, abrindo novamente a folha por inteiro no centro da roda antes que a tinta seque, as crianças observarão juntas a parte colorida, “cheia de coisas e cores”, e a outra que continuou em branco, “sem nada”. Neste momento, reforce a ideia de que uma parte tem muito e que a outra queria tanto um pouquinho de cor, mas nada tem…

Em seguida, peça sugestões sobre o que deveria ser feito para as crianças. Acolha as sugestões antes de continuar a narrativa: “Então, essa parte cheia de cores ficou sozinha e percebeu que ser colorida pela metade não era tão bom quanto ser toda colorida. Pensou que

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seria muito melhor dividir suas cores com a outra parte. Foi aí que teve uma ideia…”.

Nesse momento, feche a folha ao meio novamente e depois volte a abri-la — a parte colorida com tinta irá de encontro à parte em branco. “E foi assim que uma parte da folha deu o que tinha de melhor para a outra parte. E ambas ficaram coloridas.”

Pode-se reforçar a ideia de que a parte que “repartiu” não deixou de ter o que tinha de melhor e que a parte que nada tinha passou a ter também as mesmas coisas.

Observar e registrar as reações e as falas das crianças são ações importantes para compor o portfólio deste trabalho, ferramenta que pode apoiar a realização de novas atividades.

DIA DO BRINQUEDO

Outra possibilidade para ampliar o discurso e proporcionar vivências que se relacionam ao ato de repartir é estender essa discussão para o “dia do brinquedo na escola”.

Sugerimos que um dia de trazer um brinquedo de casa seja pensado a partir da leitura da obra Eu não quero repartir, pedindo-se às famílias auxílio na escolha de um brinquedo que realmente seja especial para a criança. O objetivo é tornar o ato de repartir uma vivência afetiva que dialogue com a situação de dividir o que você tem de melhor — não apenas aquilo de que não se gosta ou que não se quer mais.

No dia do evento, organize uma roda de apresentação para que cada um fale sobre o brinquedo escolhido, incentivando o desenvolvimento da oralidade e da capacidade de relatar experiências, e também

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para que todas as crianças conheçam todos os brinquedos com os quais terão oportunidade de brincar.

A mediação durante o brincar deverá respeitar a vontade de “não emprestar” dos pequenos e pequenas, mas sugerimos pontuar com a observação de que também poderão receber essa mesma negativa ao pedirem algo emprestado para brincar.

Essa troca de experiências e vivências proporcionará construções sobre o ônus e o bônus de repartir, ensinando-se às crianças a lidar com conflitos, sentimentos, ações e reações.

Sugerimos também que, ao final desta atividade, a roda de conversa seja retomada para que todos possam dialogar sobre os acontecimentos e relatar os sentimentos e as sensações experimentadas.

DRAMATIZAÇÃO

O corpo, os gestos e as emoções marcadas pelos movimentos despertam percepções que atingem outras dimensões da comunicação, possibilitado experiências mais intensas de aprendizagem. Assim, pode-se encenar uma experiência do ato de repartir, conferindo-se movimento ao discurso apresentado pelo livro e proporcionando-se ensinamentos por meio da diversificação da linguagem corporal.

Sugerimos que o professor ou professora encene uma curta dramatização sobre o repartir. O exemplo poderá ser embasado em alguma situação ocorrida na vivência anterior do dia do brinquedo, por exemplo. O objetivo é apresentar às crianças os problemas para os quais a ação de repartir torne-se uma solução.

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4. LITERACIA FAMILIAR

É importante que o brincar faça parte da rotina das crianças em todos os lugares, seja em casa, seja em parques ou na escola, garantindo que possam crescer e aprender enquanto se divertem. Assim, é aconselhável que os registros desse processo percorrido pelo grupo seja compartilhado com as famílias. Realizar uma das brincadeiras no ambiente doméstico poderá trazer um sentido especial ao trabalho desenvolvido.

Outra possibilidade é pedir que os familiares relatem por escrito uma brincadeira que faziam na infância. Esta é uma ótima oportunidade de mostrar a importância da escrita e da memória. As crianças poderão escolher uma das vivências de que mais gostaram e levá-la para o ambiente doméstico, ensinando a família a brincar. Depois, poderão relatar como foi essa experiência, com a ajuda de fotos e vídeos. Como fechamento do projeto, é possível convidar as famílias para brincarem na escola e apreciarem os registros produzidos.

EMPRÉSTIMO DE UM BRINQUEDO

Uma primeira proposta para essa interação é que a família ajude a criança a escolher um brinquedo para partilhar com os amigos. Os brinquedos escolhidos deverão ser partilhados no ambiente escolar, no momento da “hora do brinquedo”, ou como na atividade do “dia do brinquedo”, proposta anteriormente. Sugerimos, entretanto, ir além:

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as crianças poderão deixar os colegas/as colegas levarem brinquedos emprestados para casa.

Esse movimento trabalhará uma instância ainda mais profunda do compartilhar, do repartir: o ato de emprestar e todas as suas consequências, inclusive a responsabilidade do cuidado com o objeto do outro. Outra maneira de realizar essa mesma proposta é que a própria escola, representada pela figura do professor ou professora, empreste um brinquedo a cada criança por um período determinado, para que o aproveite no ambiente familiar e, depois, partilhe o que achou dessa experiência. Neste caso, a escola seria a primeira a exercer o movimento do repartir, colocando-se como referência e trabalhando todas as situações adversas que podem decorrer dessa ação.

LANCHE COLETIVO

O lanche coletivo explora a ideia de compartilhar com os colegas o alimento que foi preparado no ambiente familiar. O primeiro movimento poderá ser um convite aos pequenos e pequenas para uma roda de conversa sobre o lanche coletivo, durante a qual se perguntará quem gostaria de dividir com os colegas/as colegas o lanche que se prepara em casa. Sugere-se que, no dia escolhido para o evento, cada criança conte o que trouxe para repartir. Também é importante dialogar com as famílias, convidando-as a participar das ações. Podese pedir a cada família que prepare um lanche de que a criança goste muito, para que perceba como pode ser divertido e prazeroso descobrir que outras pessoas apreciam o mesmo alimento e se divertem juntas, vivenciando de fato o repartir.

Após o lanche, sugerimos retomar a roda de conversa para que cada criança fale sobre os alimentos de que mais gostaram e as sensações de

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repartir. É importante apontar que nem tudo o que estava disponível foi consumido, pois cada um tem uma preferência, um gosto. A livre escolha também faz parte do repartir, portanto, é preciso aceitar que nem tudo o que se tem a oferecer é o que o outro deseja. Perguntar se a outra pessoa quer algo faz parte do repartir, para que a ação da partilha não caia no outro extremo: uma pessoa ter de aceitar o que o outro quer repartir. Esta será uma oportunidade para que as crianças compreendam que repartir é deixar ir e, ao mesmo tempo, ter parte daquilo que se oferece ao outro.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FAGUNDES, T. C. P. C. (org.). Ensaios sobre gênero e educação. Salvador: EDUFBA, 2001. (Série UFBA em Campo: Estudos).

Este livro é uma coletânea de estudos produzidos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e por outras instituições de ensino e de pesquisa envolvidas com o estudo de questões de gênero e educação. Os artigos refletem a preocupação com os rumos da sociedade e a crença no papel da educação como uma das ferramentas mais potentes para a desmistificação de preconceitos.

FRANCO, A. F. O mito da autoestima na aprendizagem escolar. In: Psicol. Esc. Educ., São

Paulo, vol. 13, n. 2, pp. 325-332, dez. 2009. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S1413-

85572009000200015>. ISSN 2175-3539. Acesso em: 09 ago. 2021.

Essa revista apresenta importantes estudos que desmistificam a abordagem da construção da autoestima relacionada às práticas pedagógicas.

GARDNER, H. Inteligência: um conceito reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

Gardner reconstrói o percurso de sua pesquisa quanto aos conceitos sobre os tipos de inteligência.

GOLEMAN, D. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o que é ser inteligente.

Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

Dentre os diferentes conceitos a partir dos quais se pode abordar a inteligência, Goleman mostra como a incapacidade de lidar com as próprias emoções pode comprometer a experiência escolar.

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KOSTELNIK, M. J. et al. Guia de aprendizagem e desenvolvimento social da criança. São Paulo: Cengage Learning, 2013.

A obra oferece um panorama multidisciplinar sobre o desenvolvimento das crianças pequenas. Cada capítulo apresenta um aspecto do desenvolvimento sob a perspectiva de um dos campos, como psicologia, fisiologia, educação, fonoaudiologia e medicina. Uma obra de referência para a compreensão da natureza do desenvolvimento por meio de exemplos reais.

MOREIRA, P. Ser professor: competências básicas 2. Diferenciação emocional, cognitiva e comportamental/Autoconceito e autoestima. Porto: Porto Editora, 2008.

O autor apresenta estudos consistentes sobre o percurso de construção da autoestima a partir do trabalho com as emoções, a fim de promover ajustamento psicossocial da criança por professores e educadores.

OLIVEIRA, Z. M. R. et al. Creches: crianças, faz de conta e cia. Petrópolis: Vozes, 2011. As autoras apresentam a visão do desenvolvimento humano elaborada a partir dos trabalhos de Vygotsky, Wallon, Piaget e outros; refletem também sobre como estruturar condições para a construção do conhecimento em crianças pequenas.

PASSOS, E. Palcos e plateias: as representações de gênero na Faculdade de Filosofia. Núcleo de Estudos interdisciplinares sobre a Mulher – NEIM – FFCH/UFBA. Salvador: EDUFBA, 1999.

A autora discute a participação maciçamente feminina nos cursos de graduação voltados às Ciências Humanas e suas implicações nas atividades profissionais, como na área da Educação, por exemplo.

PEREIRA, K. H. Como usar artes visuais na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2008. Este livro aborda a importância do trabalho com as artes visuais na escola, conceituando a arte, a arte no espaço escolar, a formação do gosto e o processo criativo e propondo diversas práticas por meio de linguagens como desenho, pintura, escultura, entre outras.

31 MATERIAL DIGITAL DO PROFESSOR

SMOLE, K. C. S. A matemática na educação infantil: a teoria das inteligências múltiplas na prática escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

Nesse livro, que traz uma abordagem interessante sobre a importância do ensino da Matemática para as crianças e as estratégias que podem ser adotadas, há uma rica descrição do uso do portfólio como recurso avaliativo do desenvolvimento da criança na educação infantil.

INDICAÇÃO DE LEITURAS COMPLEMENTARES

COLOMER, T. Introdução à literatura infantil e juvenil atual. São Paulo: Global, 2017.

MARTINS, C.; CUNHA, L.; SISTO, C. Literatura infantil e juvenil: aprendizagem e criação

Rio de Janeiro: Semente Editorial, 2021.

MEIRELLES, C. Problemas da literatura infantil. São Paulo: Global, 2016.

MORAIS, A. G. Consciência fonológica na educação infantil e no clico de alfabetização. Belo

Horizonte: Autêntica, 2019.

ZILBERMAN, R. Como e por que ler a literatura infantil brasileira. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.

32 MATERIAL DIGITAL DO PROFESSOR

É permitida a criação de obras derivadas deste material desde que não tenham fins comerciais, atribuam crédito ao autor e licenciem as criações sob os mesmos parâmetros.

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