crítica em movimento: \Teatros peculiares na mão dupla com Cuba e Brasil
verdade, da força da realidade, e não há espaço para a utopia em nenhuma daquelas malas, ou quadros, ou cartas, nem sequer para uma nova utopia, porque chega um momento em que até os sonhos são levados à ruína. Em Departures e Arrivals, o corpo de Mariela Brito não tem mais espasmos visíveis. Eles foram condensados, diluídos com o tempo e convertidos, como se tivessem se transformado pelo cansaço, em ações um tanto líquidas, fluidas, concretizando e patenteando a mais pura realidade, sem chavões nem assembleias. Ainda assim, com tudo aparentemente à mostra, não é tudo que se diz, não se expressa tudo como em um panfleto. A arte não vive desse lugar depositário de informações como os jornais. Jornais, documentários, novelas e até a própria memória servem para fazer a arte se distanciar da realidade, porque a própria realidade não lhe é suficiente. Por muito perto que a obra de arte esteja dessa realidade, sempre haverá uma linha tênue que a afaste da realidade, pois é aí que se constrói a ponte da qual aquele cervo encantado vigia seus caçadores e cria um território inominável para a sua salvação. É nessa cisão, nessa clivagem, que se produz a reflexão, durante o ato imediato da ação e depois da morte do ato do teatro.
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