Um delírio chamado pós-terror

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UM DELÍRIO CHAMADO

PÓS-TERROR Com personagens perdidos entre sonho e realidade, autores renovam o gênero de horror com narrativas cheias de fios soltos. Quatro lançamentos recentes, de autores nacionais e estrangeiros, revigoram o estilo mites entre realidade e delírio parecem borrados. Para esse tipo de horror, respostas nem sempre são necessárias. jadersantana@opovo.com.br No Brasil, o já citado escritor paulistano Santiago Nazarian tem uma produção que também se apropria dessa estética da uando se fala de literatuloucura. O autor já havia se aventurado pelo gênero em Ferira de terror, dois cenários ado de mim mesmo e aprofundado a experiência em Biofose desenham. O primeiro bia, seu último livro, de 2014. Lançou em julho Neve negra, deles vem banhado em sanromance de terror encomendado pela RT Features, produtogue, com membros fatiados, ra de cinema responsável pelo fenômeno A bruxa, filme que gritos de desespero e jump empolgou crítica e público no ano passado e que demonstra scares - os sustos abruptos que salbem o que se chama de pós-terror na sétima arte. tam da trama. Correndo paralelo está Neve negra acompanha um artista plástico de meia um tipo mais sofisticado de horror, com idade que volta de viagem do exterior para casa na noite menos surpresas e mais densidade, narmais fria do ano, em um dos raros registros de neve no rativas estruturadas não tanto pela ação, Brasil. Chegando lá, encontra o cachorro morto, percemas pelo que sucede na cabeça das perbe que a esposa desapareceu e que o filho apresenta um sonagens. Convencionou-se chamar a esse comportamento estranho. Todo o romance se passa, basegundo tipo de pós-terror. sicamente, no interior da casa da personagem, cenário Emprestado do cinema, o termo vem gaonde pouco a pouco são revelados detalhes sobre a nhando terreno em nosso cenário literáintimidade daquela família. Nazarian quer mostrar o rio. Nos últimos meses, alguns lançamentos que há de perverso nessas relações. e traduções chegaram ao mercado nacional, “O que eu sinto, por experiência própria, é que dando fôlego ao estilo e ajudando a movimenos desejos internos são tão mais obscuros do que tar um gênero que parece só ganhar algum aquilo que é manifestado. Quando escrevo que ‘a destaque quando envolve mutilações e assassinatureza é má, é madrasta’, que ‘ser pai é uma natos em série. São livros adultos, de autores utopia, uma incerteza para o resto da vida’, não visivelmente empenhados em escapar da banaestou dando minha convicção pessoal, estou ofelidade que vem sendo associada ao gênero. recendo uma proposta, uma visão em negativo. É o caso de Eu estou pensando em acabar com Sinto que essa provocação é parte do meu papel tudo, do escritor canadense Iain Reid, publicado como escritor, principalmente neste neoconserno Brasil pelo selo Fábrica 231, da Rocco. Criado vadorismo coió que estamos vivendo”, explica para reunir publicações de destaque do universo o autor, que aproveitou o romance para explopop, o selo chega a um novo patamar de qualidade rar um tema que o inquietava, a paternidade. com este romance carregado de ambiguidade e mis“Agora sinto que não tenho mais nada a falar tério, traduzido para o português pelo também essobre isso”. critor Santiago Nazarian - outro que vem exercitando com êxito o tal do pós-terror. CONTINUA NA PÁGINA 3 “Eu sou muito mais perturbado pelas ameaças metafísicas e existenciais do que pelo horror gore (de violência extrema) ou físico. Eu sabia que algumas pessoas poderiam ler esse livro sem achá-lo assustador, enquanto outras me disseram que se sentiram aterrorizadas”, comenta o autor em entrevista por e-mail. Antes de Eu estou pensando em acabar com tudo, seu primeiro trabalho no campo da ficção, Reid havia publicado dois livros com relatos amenos inspirados em experiências familiares. Para o novo título, trocou o bom humor e a sensação de conforto por delírios e manias de perseguição. A fórmula deu certo, e o romance recebeu críticas e menções positivas em veículos e premiações especializadas. “Eu estou pensando em acabar com tudo” é a frase repetida por uma das personagens da história, uma universitária que pensa em colocar um fim no relacionamento enquanto viaja com o namorado para a fazenda dos pais dele, em um passeio que se revela cada vez mais perturbado. A descoberta dessa família disfuncional e seus segredos lança o leitor em uma trama onde os liJáder Santana

“O que eu sinto, por experiência própria, é que os desejos internos são tão mais obscuros do que aquilo que é manifestado”

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EDITOR-ADJUNTO Marcos Sampaio (marcossampaio@opovo.com.br)


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