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SEGUNDA-FEIRA
PÁGINAS AZUIS
FORTALEZA - CEARÁ - 9 DE JULHO DE 2018
RICARDO CORREDOR
“A QUESTÃO É ARRISCAR UM POUCO MAIS” I JORNALISMO I O diretor executivo da Fundação Gabriel García Márquez fala sobre os desafios da comunicação em um cenário de crise de confiança
JÁDER SANTANA
MATEUS DANTES
REPÓRTER
FOTOGRAFO
jader.santana@opovo.com.br
fotogtafia@opovo.com.br
Referência no campo das investigações em comunicação na América Latina, a Fundación Gabriel García Márquez para el Nuevo Periodismo Iberoamericano (FNPI), com sede na Colômbia, se dedica a refletir sobre o modo como os profissionais de jornalismo se relacionam com a apuração de fatos, a elaboração de narrativas e a transformação da realidade. Fundada em 1995 pelo próprio García Márquez, concede anualmente um prêmio a iniciativas e repórteres que se destacaram em suas coberturas. Diretor executivo da FNPI, o jornalista Ricardo Corredor Cure esteve em Fortaleza para participar do Festival Vida&Arte, entre os dias 21 e 24 de junho, em mesa sobre as estratégias de validação do jornalismo em tempos de pós-verdade. Com longa experiência no estudo da comunicação na América Latina, Corredor assumiu em 2016 a presidência da junta diretiva do Global Forum for Media Development, rede formada por 200 organizações que trabalham pela promoção de veículos independentes de mídia nos cinco continentes. Em entrevista concedida na redação do jornal O POVO, Corredor reflete sobre a crise de confiança enfrentada pelas instituições ocidentais, questiona os esforços de reinvenção da mídia tradicional e sugere que transparência e rigor na apuração são elementos fundamentais para o resgate do ofício. Por fim, comenta o impacto da imprensa na definição das recentes eleições presidenciais na Colômbia e traça paralelos com o cenário que se desenhará no Brasil até outubro.
O POVO - Você vem ao Festival Vida&Arte para participar de uma mesa sobre jornalismo em tempos de pós-verdade. García Márquez dizia que todo jornalismo é, fundamentalmente, de investigação. O jornalismo tem que mudar e se adequar a esse novo tempo ou ele precisa simplesmente voltar ao seu papel de origem, que é de checagem rigorosa e apuração? Ricardo Corredor - Claro que o jornalismo tem que se adequar a esse novo tempo. Está mudando, são grandes transformações, portanto não é possível fingir que nada está acontecendo no mundo. Porém, há alguns princípios básicos do jornalismo que ainda continuam valendo, são importantíssimos, fundamentais. Entre eles está a investigação jornalística. Não podemos perder esse aspecto chave. De fato, uma das transformações mais importantes é que o foco central do jornalismo não é mais informar. Claro que isso continua sendo importante, mas informar é algo que qualquer um pode fazer, e as empresas e governos estão cada vez mais sofisticados em suas estratégias de comunicação. Todo mundo pode informar. Uma das coisas que o jornalismo pode fazer, e que nem todo mundo pode, é justamente investigar, apurar as informações, mandar repórteres para a rua, verificar, conferir, analisar, dar perspectiva, contextualizar. Nesse sentido, a investigação jornalística hoje cobra muita importância, muita relevância. Investigação não é algo que todo mundo pode fazer. Como cidadão, posso presenciar um acidente numa esquina e fazer um vídeo, uma fotografia, a informação básica: onde, número de feridos, de mortos, de carros envolvidos. Aprofundar o acontecido é trabalho do jornalismo: acontecem muitos acidentes nessa esquina? Todos no mesmo horário? Estão relacionados à falta de sinalização? Qual a razão dessa falta de sinalização? Em resumo, o jornalismo tem que mudar, se adaptar a esse novo momento, mas não pode perder algumas de suas características básicas, entre as quais a investigação profunda e grossa e independente.