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Televisões públicas europeias espelham crises nacionais Entre grupos de trabalho, formais e informais, mais ou menos consensuais, o futuro e o modelo de serviço público em Portugal têm sido alvo de ávida análise nos últimos anos, especialmente desde que a crise se instalou e a troika tomou as rédeas das finanças nacionais. Falou-se em concessões, privatizações, encerramentos e despedimentos e, por ora, algumas reestruturações já são dadas como certas e estão para breve. A televisão pública nacional, a RTP, está na ribalta e chega mesmo a ser descrita por meios internacionais como uma “vítima da crise”. Noutros países europeus onde a troika está, de alguma forma, presente, o serviço público é estudado, discutido e reestruturado. A Grécia surge como o caso mais gritante, com o encerramento efetivo da estação pública.
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PORTUGAL
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Passava pouco mais de um mês da tomada de posse do XIX Governo Constitucional, o atual, quando teve lugar a primeira reunião do grupo de trabalho constituído para definir o conceito de serviço público de comunicação social em Portugal, a 24 de agosto de 2011. O economista João Duque presidia ao grupo do qual faziam parte António Ribeiro Cristóvão, Eduardo Cintra Torres, Felisbela Lopes, Francisco Sarsfield Cabral, João do Amaral, José Manuel Fernandes, Manuel José Damásio, Manuel Villaverde Cabral e Manuela Franco. Ainda no início das suas funções, o Governo assumiu o compromisso de repensar o posicionamento do Estado como operador e detentor dos órgãos de comunicação social – o grupo RTP e a agência noticiosa Lusa. Surgiram, nesta altura, os primeiros indícios dos planos de privatização dos canais e estações de rádio da RTP e da alienação da participação na Lusa. O grupo tinha dois meses para apresentar as suas conclusões e Miguel Relvas, então ministro dos Assuntos Parlamentares, com a tutela da comunicação social, remetia a apresentação de um novo modelo de serviço público para outubro desse ano.
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O relatório foi entregue ao Governo a 14 de novembro e defendia, entre outros aspetos, o fim da publicidade comercial nos canais de serviço público de televisão. O documento, de 32 páginas, recomendava o encerramento dos canais RTP Informação, RTP Memória e a fusão da RTP África e RTP Internacional. A “missão histórica” dos canais RTP Açores e RTP Madeira foi descrita como “ultrapassada” e a existência de três rádios estatais apontada como “desproporcionada”. Nenhuma das sugestões apresentadas pelo grupo de trabalho foi concretizada e, em agosto de 2012, os responsáveis pela RTP revelaram-se preocupados com a “indefinição” e a falta de tomada de decisão. Entretanto, António Borges, conselheiro de Estado para as privatizações, que acompanhava, com Miguel Relvas, o caso da RTP, admitiu a hipótese de a RTP1 ser concessionada a investidores privados e a RTP2 encerrada.
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O futuro da RTP tornou-se uma “arma de arremesso” política, com a oposição e vários membros da coligação a tecerem fortes críticas ao Governo. A instabilidade apoderou-se das negociações e a administração entrou em conflito com o Executivo. A 31 de agosto, o Conselho de Administração da estação pública apresentou o pedido de demissão ao Governo, numa reunião com o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares. O pedido foi aceite e, a 5 de setembro, Alberto da Ponte, o antigo presidente da Sociedade Central de Cervejas, foi anunciado como o novo presidente do Conselho de Administração da RTP. “O assunto da RTP está resolvido. A RTP tem hoje um dos melhores gestores à sua frente, tem uma excelente equipa de profissionais e vai deixar de ser notícia, porque passa a ter a partir de hoje todas as condições para resolver todos os seus problemas”, declarou, à data, Miguel Relvas. Ainda assim, a escolha de Alberto da Ponte gerou algumas críticas que assentavam sobretudo na falta de experiência do gestor na área da comunicação social. As notícias que davam conta da instabilidade e incerteza na estação pública atravessaram o Atlântico – o diário norte-americano New York Times descreveu a RTP como uma “vítima da crise”.
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Já em janeiro deste ano, o Expresso avançou que o Conselho de Ministros terá decidido adiar, por tempo indefinido, a privatização total ou parcial da estação pública de rádio e televisão e a venda de um dos dois canais generalistas. Contudo, António Borges insistiu, em declarações à Rádio Renascença, que a privatização da RTP ia avançar e que existiam “vários interessados, por quem qualquer pessoa teria o maior respeito”. Em abril, Miguel Relvas apresenta a demissão e, dias depois, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, repartiu a pasta por dois novos ministros: Marques Guedes e Miguel Poiares Maduro, que ficou com a tutela da comunicação social. Em junho, Poiares Maduro revelou que estavam a ser estudadas novas formas de financiamento da RTP, nomeadamente parcerias que ajudassem no crescimento da empresa. No final de julho, Poiares Maduro criou uma equipa informal com elementos do seu gabinete e especialistas externos para estudar o futuro da RTP e o modelo financeiro mais adequado. Por um lado, Alberto da Ponte pedia urgência ao Executivo na tomada de decisões para conseguir implementar a tempo o Plano de Desenvolvimento e Redimensionamento. Por outro, Poiares Maduro anunciava que o Estado ia deixar de injetar dinheiro.
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Assim, a partir de 2014, a RTP conta apenas com as receitas da contribuição audiovisual e da publicidade. Nuno Artur Silva, produtor de conteúdos audiovisuais para a SIC e para a RTP, Jorge Ponce de Leão, presidente do Conselho de Administração da ANA – Aeroportos e ex-vice-presidente da RTP, José Pedro Ribeiro, presidente do Instituto do Cinema e do Audiovisual e Manuel Falcão, antigo diretor da RTP2, foram alguns dos nomes consultados pelo ministro, segundo o jornal i apurou. A RTP revelou-se incomodada com a criação do grupo informal, por ser composto por “profissionais que representam grupos de interesse e que trabalham ou já trabalharam para a RTP”.
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Em agosto, a RTP avançou com um pedido à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) para o alargamento da oferta-base da Televisão Digital Terrestre (TDT) para incluir todos os canais de serviço público – RTP Informação e RTP Memória. O pedido foi considerado viá vel, já que o ministro da tutela revelou estar a estudar a possibilidade de aumentar a oferta de canais na TDT. A decisão, contudo, não compete à ERC, mas à Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), a quem cabe, depois de autorizado pelo Governo, o aumento da capacidade do espetro, para que possa comportar todos os canais. A aprovação do pedido traduz um aumento de custos para a RTP, que passaria a pagar à PT um valor anual pela emissão do sinal dos seus canais. A televisão pública deixaria de receber a totalidade do valor pago pelos operadores de televisão por cabo e teria de faturar muito mais em publicidade, não só para compensar esta perda, mas também para pagar à PT e fazer com que a troca de plataforma compensasse financeiramente.
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No mesmo mês, foi noticiado o início da reestruturação da RTP Internacional e da RTP África, como o grupo liderado por João Duque tinha proposto. Neste âmbito, foi formada uma equipa conjunta para ambos os canais, com 90 elementos, que trabalha fora da tutela das direções de informação e programação e cuja função é produzir conteúdos para promover Portugal no estrangeiro. O objetivo é que os canais internacionais consigam financiar-se à margem do orçamento da RTP, através de patrocinadores e parceiros. Espera-se que o projeto arranque em pleno no mês de outubro.
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No início de setembro, a RTP assinou 177 rescisões amigáveis, na sequência de 240 candidaturas. De acordo com Alberto da Ponte, o processo de negociação ainda não terminou, devido à indefinição financeira da empresa. Atualmente, está em curso um Plano de Desenvolvimento e Redimensionamento (PDR) aprovado pelo Governo, que já permitiu uma poupança de “cinco ou seis milhões de euros”, como avançou o administrador. Contudo, o presidente da RTP revelou alguma preocupação com o futuro: “A RTP tem de ter, forçosamente, para viver, receitas na ordem dos 200 milhões de euros.” A estação pública vê-se, assim, obrigada a acrescentar cerca de 20 milhões de euros aos cerca de 180 milhões das receitas provenientes da contribuição audiovisual e da publicidade. Tendo em conta que, em 2014, a RTP vai deixar de receber a indemnização compensatória, o serviço público a que a empresa está obrigada pode “estar em perigo”, alertou Alberto da Ponte.
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A 8 de setembro, o ministro Miguel Poiares Maduro revelou que o Governo poderá entregar o controlo da RTP a uma entidade independente. Os detalhes do novo modelo de gestão da televisão pública ainda não são conhecidos, mas, de acordo com o ministro, a “monitorização, supervisão e controlo da empresa” devem ficar a cargo de um órgão “entendido como independente e de grande competência técnica sobre a área em causa”. Assim, será possível acabar com a suspeita permanente de que a RTP é instrumentalizada pelo Governo, perceção que afeta, de acordo com Poiares Maduro, a imagem e a própria gestão da estação.
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GRÉCIA
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Foi a 11 de junho que a notícia se espalhou pelo mundo – o Governo grego encerrou, sem qualquer aviso, a televisão e a rádio públicas, num total de cinco canais de TV e sete rádios nacionais. “A ERT é um caso de extraordinária falta de transparência e de incrível esbanjamento. Isso acaba agora”, declarou, à data, Simos Kedikoglou, porta-voz do Executivo grego. De acordo com o diário espanhol El Mundo, a ERT tinha prejuízos anuais de 300 milhões de euros e registava um share de audiência inferior a 4%. À data, Kedikoglou garantiu que a ERT ia ser substituída por “um organismo público, moderno, com muito menos pessoal”. O plano passava por despedir e indemnizar os mais de dois mil funcionários, que poderiam, contudo, candidatar-se a um trabalho na nova estação. O sindicato da ERT reagiu com um comunicado em que descrevia o encerramento da emissora como um “golpe de estado” e acusava o Executivo de estar “disposto a sacrificar a rádio e a televisão públicas” apenas para cumprir as exigências da troika. A Comissão Europeia defendeu-se e garantiu que não solicitou o encerramento, que se tratou de uma decisão “tomada em total autonomia” pelas autoridades gregas, que “não questiona”.
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Dias depois, a Justiça grega anulou a decisão do Governo e ordenou o restabelecimento imediato das emissões da televisão pública. O Conselho de Estado grego, órgão equivalente ao Tribunal Supremo Administrativo, sentenciou que a ERT permanecesse aberta até que fosse criada uma nova televisão pública. Os parceiros da coligação tripartida do Governo grego reuniram para encontrar uma solução para a crise desencadeada pelo encerramento da ERT e o primeiro-ministro, Antonis Samaras, que havia tomado a decisão unilateralmente, propôs a reabertura “transitória” e “parcial” da estação pública.
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Os trabalhadores mantiveram-se, entretanto, barricados nas instalações da televisão pública. O objetivo do protesto era evitar que a situação se repetisse em outros países europeus, incluindo Portugal, Espanha ou Itália. Apesar da medida cautelar, a ERT continuou sem sinal, mas os jornalistas barricados mantiveram a emissão através da internet, enquanto aguardavam as “decisões do Governo e do tribunal sobre o futuro”: “Temos de saber a quem e como passamos a emissão”, explicou o jornalista Janis Skalkos. Solidários, os estudantes de Atenas realizaram uma marcha até ao edifício da ERT. Entretanto, como resultado do impasse nas negociações para resolver a crise provocada pelo encerramento, o Partido da Esquerda Democrática grega, Dimar, anunciou o abandono da coligação governamental.
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A 5 de julho, foi apresentado no Parlamento grego um projeto de lei que contemplava a criação de um novo grupo – o NERIT. Antonis Samaras esperava satisfazer, assim, os objetivos da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Pantelis Kapsis, o vice-ministro responsável pela televisão pública, anunciou que as emissões iam ser retomadas, um mês após o encerramento, baseando-se essencialmente em “documentários e notícias de rodapé provenientes de agências noticiosas”. A programação temporária vai manter-se até ao outono e, até lá, uma empresa privada e académicos universitários encarregam-se da contratação de jornalistas para a nova estação, dando prioridade aos antigos trabalhadores da ERT. A esta estação provisória, com 577 funcionários temporários, o Governo grego deu o nome de DT. Os trabalhadores da ERT queixaram-se do processo de seleção dos novos profissionais, que consideraram pouco transparente.
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A coligação governamental não conseguiu, porém, negociar soluções com os trabalhadores barricados nas instalações da antiga televisão pública, que rejeitam o encerramento das emissões. As televisões privadas gregas, à exceção do canal conservador Skai, fizeram uma greve a 18 de julho, em solidariedade para com os trabalhadores da TV pública. A televisão pública provisória emitiu pela primeira vez um formato informativo em direto, após a temporada de reposições de programas, documentários e filmes. Entre as 8 e as 10h da manhã do dia 20, o canal realizou a primeira emissão em direto do dia. A 21 de agosto, a União Europeia de Radiodifusão deixou de reproduzir o sinal analógico e por satélite da ERT.
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IRLANDA
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A Irlanda introduziu, em junho, uma taxa de radiodifusão de pagamento obrigatório para todos os lares, sem exceção. A taxa deverá entrar em vigor no final de 2014 para substituir o atual imposto televisivo, que é pago por apenas um em cada cinco lares irlandeses. Esta “evasão” custa ao Governo perto de 30 milhões de euros por ano. Pat Rabbitte, ministro das Comunicações, assegurou que “ninguém” poderá contestar o pagamento da taxa sob o argumento de que não possui uma televisão, um computador ou qualquer outro dispositivo capaz de receber o serviço público de radiodifusão: “O serviço público é importante na nossa sociedade e, como tal, é justo que todos nós façamos uma contribuição, não apenas 80%. Não deve haver aproveitadores.” De acordo com o responsável, a taxa não deve exceder os 160€ anuais já pagos pelo atual imposto televisivo.
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A Broadcasting Authority of Ireland (BAI) defende que a RTÉ, a estação pública irlandesa, deve receber mais fundos públicos para se manter relevante no atual panorama mediático, mas que esta alocação dos fundos só deverá ocorrer após serem analisadas as alterações que permitam uma maior eficiência.
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Rabbitte referiu que os salários dos apresentadores poderão ser objeto de análise, embora reconheça que a RTÉ já conseguiu poupanças substanciais, ao ter dispensado 500 trabalhadores nos últimos anos e ter reduzido o orçamento em 21%. Foi também um dos primeiros organismos públicos a introduzir cortes nos salários. Entre 2008 e 2012, a receita publicitária da RTÉ perdeu 84 milhões de euros, uma redução de 35%. De acordo com o BAI, a estratégia futura da RTÉ deverá basear-se num enquadramento financeiro mais realista, já que 93% dos fundos da estação são públicos. A autoridade revelou ainda que o tempo de publicidade terá de ser reduzido para que a contribuição de dinheiros públicos se mantenha.
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ESPANHA
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A RTVE, o grupo de rádio e televisão públicas de Espanha, tem vindo a debater-se com sérios constrangimentos financeiros e várias remodelações nos últimos anos. Mais recentemente, em setembro de 2012, o presidente Leopoldo González-Echenique anunciou um corte de custos adicional de 50 milhões de euros para 2013, a somar aos 204 milhões reduzidos em 2012. O responsável adiantou ainda a alteração ao acordo coletivo da RTVE, para que se adaptasse à nova Lei do Trabalho e assegurasse “a estabilidade fiscal e a promoção da competitividade”. Os despedimentos não estavam previstos, mas sim uma flexibilização de horários, para potenciar o rendimento dos trabalhadores, e cortes nos salários de diretores e apresentadores. Em fevereiro deste ano, os media noticiaram uma perda de espectadores decorrente da remodelação da televisão pública espa nhola. A reestruturação da estrutura diretiva e dos apresentadores dos principais programas da La 1 custaram a liderança à estação, que no espaço de um ano caiu para terceiro lugar. No parlamento espanhol, criticava-se a alegada falta de credibilidade e independência dos serviços de notícias da RTVE – os socialistas do PSOE acusaram mesmo o grupo de ser um “altifalante” do Governo.
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No mesmo mês, a administração do grupo público propôs, no âmbito das negociações de um novo acordo coletivo, a redução de 35 milhões de euros em gastos com pessoal. A proposta sugeria uma simplificação do sistema de classificação de cargos, para potenciar a mobilidade e versatilidade dos trabalhadores. De acordo com a administração da RTVE, o objetivo prioritário era “manter os empregos no grupo, tendo em conta as circunstâncias atuais”. Outros dos objetivos da administração passa por investir o valor poupado na produção própria, para aumentar a audiência.
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A ameaça de implementação de um ERE (Expediente de Regulación de Empleo) – um procedimento legal que permite às empresas com dificuldades económicas obter uma autorização para suspender ou despedir trabalhadores – pairava sobre a RTVE desde que o Governo começou a impor cortes na estação pública. 30 de junho foi a data apontada por Leopoldo González-Echenique para a finalização do novo acordo. Em março, a Comisión del Mercado de las Telecomunicaciones (CMT) pediu ao grupo Mediaset España e ao canal laSexta perto de 562 mil euros para financiar a RTVE. A CMT justificava ter encontrado discrepâncias entre o valor que deveria ser atribuído à RTVE em 2011 e o que foi realmente alocado. O fim da publicidade na TVE e consequente imposição de uma taxa paga pelas estações privadas ao canal público gerou, desde a sua aplicação, um sem-número de reclamações. Em 2011, a legalidade da taxa foi contestada junto da justiça europeia.
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Também em março foram conhecidos os resultados operacionais da RTVE, que fechou 2012 com um défice de 113 milhões de euros. Leopoldo González-Echenique descreveu o atual modelo, implementado em 2009 pelo Governo de Zapatero, como instável, tendo culminado numa situação “absolutamente insustentável”.
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Em maio, as estações privadas alertaram para os riscos de uma potencial recuperação da publicidade na TVE, que provocaria com “colapso do setor”. De acordo com um estudo realizado pela consultora Arthur D. Little, para a Unión de Televisiones Comerciales Asociadas (Uteca), o setor privado teria perdas entre os 150 e os 175 milhões de euros, caso a TVE tivesse emitido anúncios em 2012. Adicionalmente, ao recuperar a publicidade, a estação pública perderia os subsídios do Estado e a taxa paga pelos privados. As perdas arrastar-se-iam a produtoras, distribuidoras e outras empresas do setor. De acordo com o estudo, os problemas económicos da RTVE não são consequência do fim da publicidade, mas de falhas estruturais. Uma TVE eficaz e que cumprisse a função de assegurar o serviço público só seria possível, com a estrutura atual, com um orçamento anual entre os 620 e os 680 milhões de euros. Ainda de acordo com o mesmo estudo, a TVE, o cinema e as entidades de gestão de propriedade intelectual custam aproximadamente 350 milhões de euros às estações privadas.
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Soraya Sáenz de Santamaría, vice-presidente do Governo espanhol, avançou em junho que o Executivo estaria dependente da decisão do Tribunal de Justiça Europeu, sobre a legalidade dos modelos de financiamento das televisões públicas, para decidir o potencial regresso da publicidade à TVE. Contudo, não esclareceu se a posição do Governo é, ou não, favorável. No mesmo mês, a RTVE propôs aos trabalhadores, no âmbito da negociação do acordo coletivo, um corte de 5% nos salários. Quando chegou a notícia do fecho da estação pública grega, a situação da RTVE foi inevitavelmente comparada. De acordo com o site espanhol PRNoticias, “é obrigatório pensar a situação espanhola” – uma televisão pública com custos sobredimensionados, o dobro dos trabalhadores da estação grega e o debate sobre o suposto regresso da publicidade. Os paralelismos entre ambas as crises financeiras eram também descritos como “inevitáveis”. Os especialistas asseguraram que a recessão espanhola não é comparável à da Grécia, mas há “preocupantes” elementos em comum – o elevado desemprego, a quebra constante do PIB, o crescimento exponencial da dívida pública, os cortes nos serviços públicos e a questionável viabilidade da televisão pública.
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A 1 de julho, comprovou-se aquilo que há dois anos os conselheiros da RTVE haviam previsto – a audiência da televisão pública registou uma perda de dois dígitos. A TVE fechou o mês de junho com um share de 9,6%, o mínimo histórico registado pela estação. Na origem da quebra estará a política de austeridade a que o grupo está a ser submetido e o fracasso da maioria dos novos formatos estreados no canal. Em agosto, sai a decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia. O modelo de financiamento da televisão pública espanhola, que obriga as estações privadas e os operadores de telecomunicações a doar parte da sua receita à RTVE, é legal e foi aprovado pelo tribunal. O recurso arquivado tinha sido apresentado pela Comissão Europeia há dois anos.