Jornal A Sirene - Ed. 11 (fevereiro)

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A SIRENE

EDIÇÃO ESPECIAL PARA NÃO ESQUECER Edição 11 - Fevereiro de 2017


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Fevereiro de 2017 Mariana - MG

PARA NÃO ESQUECER

Editorial

Há um ano e dois meses o maior crime ambiental da história do Brasil ocorreu, e desde então não nos calamos. Há um ano começava o jornal A Sirene, feito pelos atingidos, com um ponto de vista e com histórias que outros meios de comunicação não mostram. Nosso compromisso é com a voz dos atingidos, sem a censura que o dinheiro das empresas compram. Agradecemos nossos parceiros: o coletivo Um Minuto de Sirene, que desde o início nos acompanha; da Arquidiocese de Mariana, representada pelo Padre Geraldo Martins, que ajudou a idealizar e estruturar o projeto; o curso de jornalismo da UFOP, através de bolsistas de projeto de extensão coordenado pela professora Juçara Brittes e da estrutura de laboratórios; o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), que nos permite conhecer outras lutas; e o Ministério Público de Minas Gerais, em que se destaca o Dr. Guilherme Meneghim, que nos acompanha de maneira tão próxima e cuidadosa. Trazemos nesta edição questões atuais importantes. Em “Direito de Entender”, a promotoria explica a finalidade do cadastro dos atingidos e faz um alerta importante: aguardar o cadastro realizado em parceria com Ministério Público, Assesso-

Expediente

ria Técnica e Comissão dos Atingidos. Cada família, cada atingido possuía patrimônio material e moral distinto. Todos precisam ser contemplados. Reforçamos a necessidade de continuidade do processo de tombamento de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo. É preciso preservar o que restou dos núcleos urbanos, evidências arquitetônicas e memórias dos atingidos, e criando meios para que o desastre causado por atividades minerárias não caia no esquecimento. A primeira missa nas ruínas da Igreja de São Bento foi um alento, uma alegria para mostrar que, se nos mantivermos unidos, conquistaremos nossos objetivos. O “Papo de cumadres” e outros textos continuam a contar a história dos personagens atingidos por esse desastre. Em nossa retrospectiva, depoimentos de voluntários do jornal e de pessoas que atuaram em Mariana nos primeiros dias do desastre nos mostram o quanto aprendemos nesse tempo. Esse aprendizado precisa ser levado em conta para que possamos seguir sem mais vítimas e destruição. Neste um ano de trabalho e aprendizado intensos, esperamos cada dia mais continuar lutando e garantir nossos direitos. A cada dia nos aperfeiçoando para dar voz a mais atingidos.

Charge

AVISO Não assine nada: • Se tiver dúvidas sobre o conteúdo; • Se precisar de ajuda de um advogado ou qualquer outro especialista; • Se alguém disser que “todo mundo já assinou, só falta você ”; • Se você quiser consultar algum familiar antes; • Se alguém disser que “se não assinar, não terá mais direito ”.

Atenção! Se alguém tentar fazer você assinar qualquer coisa, procure o Ministério Público ou a Comissão dos Atingidos. O tempo para analisar e questionar qualquer documento é seu!

Leve essa mensagem a todos os outros atingidos

Está proibida a reprodução de conteúdo deste jornal sem autorização A Sirene online, Leia e compartilhe: ISSUU: www. issuu.com/jornalasirene FACEBOOK: www.facebook.com/JornalSirene BLOG: www. jornalasirene.wordpress.com

Realização: Atingidos pela Barragem de Fundão, Arquidiocese de Mariana, Projeto de Extensão A Sirene e o Direito à Comunicação dos Atingidos pela Lama (Curso de Jornalismo/ICSA/UFOP) e Um Minuto de Sirene | Conselho Editorial: Milton Sena (Editor Chefe), Angélica Peixoto, Ana Elisa Novais, Antonio Santos, Cristiano José Sales, Fernanda Tropia, Genival Pascoal, Lucimar Muniz, Manoel Marcos Muniz, Mônica dos Santos, Pe. Geraldo Martins, Rodolfo Meirel, Sérgio Fábio do Carmo (Papagaio), Silvany Diniz, Simone Maria da Silva e Thiago Alves | Diagramação: Silmara Filgueiras | Foto de capa: Daniela Felix| Apoio: Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e MICA/Brazil Foundation (Carlos Paranhos, Daniela Felix, Flávio Ribeiro, Genival Pascoal, Larissa Helena, Miriã Bonifácio e Wandeir Campos) | Revisão: Ana Elisa Novais e Miriã Bonifácio | Agradecimentos: Iago Inácio (autor da charge) e Guilherme de Sá Meneghin (Promotor de Justiça - Titular da 2ª Promotoria de Justiça de Mariana)| Impressão: Sempre Editora | Tiragem: 2.000 exemplares | Fonte de Recursos: Termo de Ajustamento de Conduta entre o Ministério Público de Mnas Gerais (2ª Promotoria de Justiça de Mariana) e Arquidiocese de Mariana.


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Carta de esclarecimento

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Mariana, 28 de Janeiro de 2017

A comissão dos atingidos de Mariana foi criada em Novembro de 2015, logo após o rompimento da Barragem de Fundão. Legitimada pelo Ministério Público Estadual e pelas comunidades afetadas, vem lutando desde sua formação pelos direitos de seus representados. Dentre suas atividades, destacam-se o acompanhamento dos processos de reconstrução e indenização, participação em assembleias e audiências públicas, mobilização, visitas às famílias mais vulneráveis e negociações junto à Samarco. A proposta urbanística hoje submetida à validação da comunidade de Bento Rodrigues começou sua elaboração em Novembro de 2016, procurando restaurar as características do distrito - principal reivindicação dos moradores em relação ao projeto de reassentamento. A Fazenda da Lavoura foi a primeira opção para a reconstrução da comunidade. A escolha do terreno, ocorrida em maio de 2016, com aprovação de 92% dos moradores, foi o marco inicial do processo de reassentamento. O segundo passo em direção à reconstrução será a aprovação de uma área dentro da Lavoura para a implantação da zona urbana: este perímetro, conhecido como poligonal, prevê elementos como a distribuição das quadras, arruamento e disposição dos equipamentos urbanos. A proposta foi pensada a partir de aspectos importantes para os atingidos, apontados no Levantamento de Expectativas realizado em 2016, tais como a manutenção das relações de vizinhança e dos meios e modos de vida da comunidade (criação de animais, cultivos, formas de lazer…) Tais características não foram levadas em consideração na primeira proposta de reassentamento apresentada pela Samarco, em outubro de 2016. naquele desenho, a empresa empregava soluções incompatíveis aos originais modos de vida dos atingidos: ruas demasiadamente largas, redistribuição arbitrária dos principais equipamentos urbanos, desconsideração das relações de vizinhança. A Igreja de São Bento, por exemplo, ganhou escadaria e foi alocada no centro da cidade, em frente a um campo de futebol - características originalmente inexistentes. O apelo visual da proposta inicial desconsiderava as referências cotidianas da comunidade, o que levou a comissão não só a refutá-la, mas também a demandar a participação dos atingidos na construção de um projeto mais adequado. O atual projeto de reassentamento foi construído a partir de discussões da comissão junto à assessoria técnica dos atingidos, em Grupos de Trabalho organizados pela Samarco. Após uma série de reuniões, entre novembro de 2016 e janeiro de 2017, foi construída a proposta em processo de validação. Desse trabalho preliminar, a comissão, junto de sua assessoria, levou o projeto para avaliação dos Grupos de Base - núcleos de atingidos organizados em torno da luta pela garantia de direitos. Tal diálogo, ainda em curso, tem como objetivo levantar informações capazes de fundamentar a proposta e garantir sua adequação às demandas da comunidade. Embora em processo de elaboração, o desenho urbanístico apresentado é fruto da escuta dos atingidos e busca manter viva as referências de Bento Rodrigues. Por essas razões, a atual proposta foi aprovada pela comissão e encaminhada à validação em Assembleia Geral dos Atingidos, tendo em vista que as decisões finais devem ser sempre tomadas pelo conjunto da comunidade. Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão

Foto: Thiago Fernandes Área urbanística do Novo Bento foi aprovada com unanimidade.


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Um ano de voz e luta Neste um ano do Jornal A Sirene queremos homenagear as muitas pessoas que contribuem para que a nossa luta, nossa história e nossas memórias se mantenham vivas. São muitos voluntários que estão com a gente nessa causa e nos apoiam, nos bastidores, com fotos, revisões, diagramações, entrevistas e até mesmo buscando recursos e parceiros para que sejamos cada vez mais fortes e autônomos. Nós perguntamos a alguns desses colaboradores qual foi o momento mais marcante de sua participação no jornal. Por Nós os atingidos

Foto: Ana Elisa

Silmara Filgueiras

Nossa, mas já? Se for destacar uma edição, eu escolho a de número zero. Ela marca o início de uma importante jornada para nós e também para os atingidos. Ainda me lembro da sexta-feira, véspera do primeiro final de semana de fechamento. A partir daí participei de todas as edições, isso é uma grande conquista para mim.

Elke Pena

Cada um tem uma história e isso é algo que me toca de maneira bem especial. A coluna "a gente explica" da edição 0 é marcante por trazer, de forma direta, a ideia dos atingidos a respeito dos termos que lhes diziam respeito. Ali foi um momento forte de construção da identidade dos atingidos. Foto: Daniela Felix

Lucas de Godoy

Nesse um ano de colaboração com o jornal cada clique foi carregado de emoções e muitos aprendizados. Como foto-emblema, que reúne um pouco de cada matéria que participei, escolhi a imagem que resultaria na capa da primeira edição. Era a primeira vez que os ex-moradores de Bento Rodrigues visitavam a área que futuramente seria eleita para a construção do novo Bento. Olhando para imagem agora, um ano depois, percebo que aquele grupo representava não só os ex-moradores de Bento Rodrigues mas todos que foram atingidos pelo rompimento e que naquele momento, ainda atordoados, iniciavam mais uma luta na busca da reconstrução de casas, ruas, histórias, territórios e identidade. Foto: Lucas de Godoy


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Foto: Daniela Felix

Silvany Diniz

Cada matéria que colaboramos no jornal é uma emoção e um sentimento diferente. Mas eu acho importante relembrar a história de Manoel Marcos Muniz que foi trabalhador da Samarco por quase 30 anos e vive a infelicidade de ver a suas propriedades e de toda a sua família soterrada pela Lama. Em meio a tantos desapontamentos ele fez uma pergunta até hoje sem resposta: Com tanta segurança interna, por que não havia Sirene em Bento?

Foto: Lucas de Godoy

Foto: Lucas de Godoy

Luiza Geoffroy

A matéria que mais me marcou na Sirene até hoje foi a pauta “Sabores da Memória”. Aquela era a primeira a primeira vez que visitava as áreas atingidas e instantaneamente fui tomada por uma mistura de sentimentos. A passagem por Paracatu de Baixo, Pedras e Ponte do Gama foi triste e me senti impotente. Passado algum tempo, o sentimento de dor já era outro: depois de comer um queijinho e prosear com Sr João e experimentar uma brevidade repleta de amor da Dona Terezinha tive uma das maiores provas da beleza da humanidade mesmo frente a tristeza do mar de rejeitos. Essas experiências mágicas, onde o amor é transformado em comida, me fizeram entender que a lama levou muita coisa, mas o carinho, o amor, o afeto e as lembranças ela jamais levará.

Ana Elisa

Aninha Maia

A matéria que eu mais gostei de fazer pro Jornal foi aquela que eu, Gladsmar, Elias, Lucas e Psica fizemos sobre as riquezas do Bento. Foi muito legal poder vivenciar a volta dos meninos aos lugares onde costumavam se divertir nos fins de semana e ainda por cima conhecer um lugar lindo, de rara beleza natural e com patrimônio histórico a ser preservado.

O jornal A Sirene só aconteceu com a soma de muitas forças, mas principalmente porque os atingidos sentiram a importância do projeto e o abraçaram. Estamos construindo juntos e a participação de todos se faz cada vez mais importante. Saber que essa articulação cidadã é possível, quando existem objetivos comuns e organização, e que faço parte dela, me dá um orgulho danado. Colaborar com a matéria sobre o voluntariado, desta edição, me fez mais uma vez acreditar que a sociedade pode e tem condições de se mobilizar e atuar de forma colaborativa e cooperativa. Se é possível nas emergências, precisamos aprender para usar essa força em nosso dia-a-dia também. Sou muito grata por todo esse aprendizado.


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Foto: Larissa Helena

Larissa Helena

Minha trajetória com A Sirene é transformadora. Lembro com grande apreço de uma matéria que participei, a qual tratávamos da Identidade do Atingido. Foi quando tive uma ligação maior com todas as famílias. Sabe quando você conhece pessoas tão especiais que quer levar para toda vida? Então, são eles, e claro, a equipe do Jornal.

Kleverson Lima

Carlos Paranhos

Logo quando tomei conhecimento do jornal quis participar. A ideia de poder colaborar em uma produção onde os atingidos têm voz e total liberdade para opinar despertou algo tão forte em mim que pedi para ser voluntário. Entrei fazendo a diagramação de algumas páginas, e hoje estou como repórter. Durante todo esse processo, ouvi e relatei histórias tristes, compartilhei e vivi junto momentos felizes A matéria que eu mais me orgulho de ter participado foi "O laudo de Sofya". Quando falei com a Simone, mãe da Sofya, não acreditava na barbaridade que aquela família estava sofrendo por conta da lama tóxica que afetava sua saúde. O resultado foi uma matéria emocionante que deu voz a uma mãe desesperada pela saúde da sua filha.

Isabella Walter

Participar da produção da matéria sobre o subdistrito de Borba e sobre a Dona Maria, foi uma experiência inesquecível. Dona Maria, foi a única atingida da região, sua casa foi totalmente soterrada, e naquele momento ela encontrava-se sozinha na luta pelo reconhecimento de seus direitos. Porém através do visita, criamos uma relação de respeito e compreensão, e percebi a importância do Jornal, que não era apenas um meio de comunicação entre os atingidos, mas também um espaço de integração social. Foto: Arquivo pessoal/Simone

Entrei na casa do Seu Filomeno com a tarefa de ajudar a equipe do jornal a recolher dados sobre a Festa de São Bento. Ainda não o conhecia, apenas a fama. Ficamos lá durante um bom tempo ouvindo os seus relatos sobre a igreja, a festa e o cotidiano da sua comunidade. Suas lembranças iam longe, se estendendo até a época de criança, quando começou a ajudar um amigo do seu pai a cuidar da pequena capela de São Bento. Templo que foi destruído pela passagem do rejeito. Dias depois encontrei com um de seus parentes na rua que relatou que aquela entrevista teve um efeito terapêutico: Seu Filomeno havia recobrado um sorriso que tinha se perdido naquele triste novembro e que tinha começado a sair mais de casa. Esta foi a melhor notícia daquela matéria.

Marilía Mesquita

Produzir a matéria “Seu Filomeno me contou”, junto com o Elias Souza, foi magnífico. Naquele dia, em que estávamos dando início a primeira edição do Jornal, eu conheci o amor e o respeito daqueles atingidos por canto, cada pedra, cada história do subdistrito deles Bento Rodrigues, que hoje, é só história.

Wandeir Campos

Fazer parte do jornal A Sirene tem sido mais do que uma experiência profissional, tem me feito aprender na vida, no meu dia a dia, com as histórias de luta de cada atingido, com a força que cada um tem ao ensinar para nós como é ser atingido. Ou como mudar completamente sua vida para cuidar, por exemplo, do seu pai que foi atingido pela lama, que é o exemplo como é o caso da Dona Maria, filha do Sr. Pedro Celestino.


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Foto: Lucas de Godoy

Fernanda Tropia

Minha colaboração no jornal começou para que eu pudesse ajudar na preservação da memória e da cultura dos atingidos. Por causa do jornal conheci o que há de simples e bonito nessas pessoas e entendi que o maior aprendizado de superação quem ganhou fui eu, através das pautas que pude acompanhar. Uma das mais marcantes pra mim foi a matéria sobre a dona Tita e seus filhos, que moravam em Ponte do Gama. Essa senhora, com sua idade avançada, ainda tem esperanças de voltar para o seu lugar e continuar sua vida simples e cheia de boas lembranças.

Miriã Bonifácio

Uma matéria que me impressionou foi "A última noite". Quando Antônio foi reconstituindo tudo o que eles passaram naquela última noite em Bento Rodrigues foi como se eu estivesse lá. Eu consegui entender um pouco mais o sentimento de ter perdido tudo, de ter que começar a correr para fugir da lama. Foi triste ouvir isso, mas foi importante também porque pude entender que eu não sou atingida, e que é preciso escutar e perceber a dor e a reação de cada um após o desastre. Mais do que nunca essas histórias precisam ser contadas, elas mudam a gente! Foto: Stênio Lima

Stênio Lima

O nó na garganta ao ouvir as histórias dos atingidos virou rotina por meses. Fotografar nunca foi tão difícil, os olhos estavam sempre cheios d'água. Editar textos nunca foi tão delicado, tudo era importante. Entre tantas memórias, acompanhar seu Zezinho em Paracatu me marcou muito. Ressabiado, ele queria ver de perto a Igreja, mostrar a bandeira, localizar a casa onde ele e a família viviam e onde recebiam a tradicional Folia de Reis. A fé não pôde ser descrita, mas foi sentida. Os aprendizados e as trocas que o Jornal A Sirene me proporcionou foram imensuráveis.

Foto: Lucas de Godoy

Adelaide

A mais marcante foi a primeira matéria que fiz, em que fomos a Ponte do Gama cobrir a reunião organizada pela comunidade com o MAB onde iriam definir quais as prioridades da para a reconstrução da parte coletiva destruída pela lama. Chegamos lá e vimos uma união e uma organização tão grande, me emocionei demais. Todos tiveram oportunidade de serem ouvidos, pois a comunidade havia preparado uma dinâmica onde cada um colocou no papel (em forma de desenhos e relatos) quais eram as prioridades. Depois, definiram juntos qual a prioridade coletiva!


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Fevereiro de 2017 Mariana - MG Foto: Larissa Helena

Intimidade provisória "(...) Sofá sem mancha? Tapete sem fio puxado? Mesa sem marca de copo? Tá na cara que é casa sem festa. E se o piso não tem arranhão, é porque ali ninguém dança. Casa com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde. Tem gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante, passaporte e vela de aniversário tudo junto." Casa arrumada - Carlos Drummond de Andrade

Por Antonio Geraldo Santos e Genival Pascoal Com o apoio de Ana Elisa Novais e Miriã Bonifácio

Faz um ano e dois meses que vivemos em condição provisória. Nesse tempo, alguns de nós se mudaram mais de uma vez porque não se adaptaram ou porque tiveram problemas com a "nova casa". Hoje as memórias da casa que era nossa estão nos detalhes, nos vasos de flores, nos forros de mesa. Apesar da padronização imposta, ainda carregamos nossa identidade.

Mesmo mudando de casa não nos adaptamos e continuamos procurando nossa identidade, nos ajustando aos padrões. (Antônio)


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Os móveis padronizados foram entregues pela Samarco às famílias atingidas que tiveram suas casas destruídas pelo rompimento da Barragem de Fundão.

Não há nada que substitua a nossa vida em nossa origem. Tudo o que queremos é trazer um pouco de nossa história para que podermos viver o pouco dela que ainda resta em nossa mente. (Genival)

Nessas mudanças estamos comprando coisas novas. Que faltaram ou para compor o novo lar. (Antonio)


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É possível: a força da coletividade Por Ana Elisa Novais e Flávio Ribeiro

Fotos: Mauro Henrique Soares Aniceto

Enquanto parte da população de Mariana tentava digerir o que estava acontecendo na semana do dia 5 de novembro de 2015, o restante do Brasil se comovia com as imagens na TV e pensava em como poderia ajudar os atingidos. No turbilhão das emoções pessoais e sinceras, voluntários de diversas regiões uniram-se em um momento de desprendimento e humanidade. Naquele momento, a participação do povo se tornaria a força pós-desastre. Sem eles, muita coisa não teria sido possível. A incapacidade da Samarco e do poder público para lidar com o desastre e suas consequências emergenciais, sem esclarecimentos à população sobre a responsabilidade sobre o que aconteceu, fez emergir uma força popular e uma energia de coletividade na cidade. Para Douglas Sant’Anna, coordenador de logística humanitária que atuou voluntariamente em Mariana na organização do estoque e na distribuição das doações, a proximidade com as vítimas do desastre em Bento mostrou que há possibilidades de se fazer diferente no mundo. “Dá para se envolver com qualidade, com um atendimento humanizado. [A ajuda no desastre] se tornou um molde de como fazer a coisa certa”. O voluntariado também está nos pequenos detalhes, e nas singelas lembranças da vida. Passado mais de um ano após o rompimento da barragem, o morador de Ouro Preto Emerson Assis ainda possui as anotações sobre o resgate de animais. A cada três linhas de caderno, o voluntário registrava uma espécie de animal com sua aparência e os dados para contato com o dono. O Bobby, por exemplo, é um labrador preto com um caroço no abdômem. Nenhum detalhe passou despercebido. Convidamos outros voluntários para narrar sua experiência em Mariana nos meses que se sucederam ao desastre. Publicamos aqui trechos desses depoimentos, que estarão disponíveis na íntegra no site do jornal.


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Fevereiro de 2017 Mariana - MG Mauro Henrique Soares Aniceto Estudante de Filosofia da UFOP Falar sobre a experiência como voluntário de Mariana é algo muito difícil. De todas as experiências que tive na vida, essa foi uma das que mais me marcou. É muito difícil entender o que realmente é a sociedade, mas trabalhando como voluntário no desastre ambiental causado pelo rompimento da barragem do Fundão, pela primeira vez vi pessoas trabalhando quase que 24h por dia sem se queixar de cansaço, trabalhando felizes e motivadas. Pela minha primeira vez tive a oportunidade de ver o poder público, privado e a sociedade trabalhando juntos por uma única causa. Pena que para essa união solidária acontecesse foi necessário que pessoas perdessem até a própria vida e outras seus lares e pessoas amadas. O que mais me marcou em minha opinião foi o solidariedade e o amor ao próximo.

Marina Braga Estudante de Serviço Social da UFOP

Meu envolvimento no trabalho voluntário começou no dia seguinte ao rompimento da barragem. Eu estava em Ouro Preto quando comecei a ouvir várias informações, até aquele momento desencontradas. No dia seguinte vim pra Mariana sem saber ao certo o que haveria para ser feito. Eu imaginava ajudar durante aquele final de semana e voltar para Viçosa, onde eu morava e estudava na época. Eu não havia entendido, até aquele momento, que aquele dia mudaria completamente a minha vida. Aquele trabalho me mostrou a grandeza de muitas pessoas, me ensinou a ser mais humana e me fez admirar profundamente a força de muitos daqueles que estavam diante da pior situação que poderiam enfrentar. Meus planos de voltar pra Viçosa nunca se concretizaram. Decidi me mudar para Mariana pelo tempo que fosse necessário para concluir aquela tarefa. Fiz isso por 7 meses e agradeço por cada um desses dias. Márcia Freitas - enfermeira - São José dos Campos Faz algum tempo que estou em reflexão para tentar entender o motivo de ter me comovido tanto com esse crime. Achei que atendendo a um pedido do meu coração, chegando nas áreas afetadas, eu descobriria o motivo tão forte que me fez despencar de São José dos Campos até lá, nos distritos de Mariana e Barra Longa. Confesso que a resposta eu ainda não obtive. No caminho passavam mil coisas em meu pensamento. Não tinha a mínima idéia do que encontraria lá e se eu teria forças para ficar. Para quem está longe, pode achar que tudo está minimizado. Para quem pensa assim, uma notícia: a situação é muito pior do que diz a mídia. A proporção é muito maior do que se vê nas fotos e nos vídeos. Além de tudo, tenho um sentimento enorme de gratidão por cada

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pessoa e cada animal que encontrei desde o início. Cada um me ajudou a evoluir. Trago todos no coração! Barbara Guimaraes Naquele dia 5, correu o boato na rua sobre o rompimento da barragem. Fui pra casa, liguei a TV e vi que infelizmente era verdade. Peguei um saco grande, saí juntando roupas e produtos de higiene pessoal que tinha em casa, peguei o ônibus e fui para o CDC. Eu continuei pelos próximos 45 dias lá. Quem estava ali todo dia acabou incumbido de determinadas funções. Nosso trabalho era registrar a entrada e saída das doações, cadastrar e direcionar nossos companheiros voluntários, armazenar de forma correta os mantimentos, fazer triagem e separação de roupas. E a parte mais importante, atender e servir os atingidos da maneira mais humana possível. Depois de um trauma tão grande, o que nós voluntários queríamos e nos doarmos da forma que podíamos.

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Sara Martins de Araújo Professora do curso de Serviço Social da UFOP. Cheguei na Arena já haviam muitos voluntários, profissionais da prefeitura de diversas áreas e unidades. Para o meu espanto, a prefeitura não tinha um plano emergencial. O médico do SAMU foi quem deu algumas orientações mais coerentes e seguras. Os primeiros atingidos a chegar foram um grupo de trabalhadores. Estavam em choque. A atuação da prefeitura, do ponto de vista da gestão e execução do plano/programa de estado de calamidade, era caótica. Uma equipe da Samarco apareceu e usufruiu do levantamento e informações feitas, em grande parte, por voluntários. Depois, pela falta de controle e ineficiência na gestão da calamidade, foram dispensando os voluntários. Faço esse relato para que nunca mais se esqueça, para que nunca mais aconteça! Não foi acidente!


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Mães da esperança Conceição, Gisele e Hiata foram atingidas pelo rompimento da barragem, engravidaram e agora terão que criar seus filhos em um cenário muito diferente do que imaginaram ou viveram. A criação das crianças na "cidade" as faz lembrar que é preciso ter esperança. Por Mônica Santos Com apoio de Wandeir Lucas e Larissa Helena

Fotos: Larissa Helena


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Gisele dos Santos Oliveira, grávida de sete meses: “Independente do lugar que estaremos, eu tenho a esperança de que meu filho cresça bem, com amor, porque Kennedy veio planejado.”

Hiata Meiriane Salgado, grávida de seis meses: “Quero passar para os meus filhos as boas experiências que tivemos no antigo Bento, porque quando o novo Bento sair eles vão estar bem grandinhos, para que as histórias que nós vivemos no Bento não morram.”

Conceição Aparecida Gonçalves Saramento, grávida de cinco meses: “Apesar dessas fases conturbadas que estamos passando, espero criar meus filhos com muita clareza e amor, não permitindo que isso afete na maneira de educar, seja vivendo na cidade ou não. O importante é fazer com que cresçam valorizando as pequenas coisas.”


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Sonetos Irmãos

Foto: Carlos Paranhos

Dentro de mim mora um homem Que sofre e chora, teme e treme Por Sérgio Dentro de mimPapagaio surge um homem amargando incertezas dor tristeza

Dentro de mim mora um homem Que sofre e chora, teme e treme Dentro de mim mora este homem Dentro dealém mimdasurge umehomem Que enxerga distância amargando incertezas dor tristeza Quase sem esperança, no momento De relutância sonha com a bonança

Dentro de mim mora este homem

Dentro de mim mora Que enxerga alémum dahomem distância e Que conhece a essência da maldade Quase sem esperança, no momento E sabe dela o tamanho e a gravidade.

De relutância sonha com a bonança

De dentro de mim emerge um homem Dentropor debarragens: mim mora homem Atingido e a um dúvida é de Deus ou do Diabo, tamanha maldade? Que conhece a essência da maldade

E sabe dela o tamanho e a gravidade. De dentro de mim emerge um homem Atingido por barragens: e a dúvida é de Deus ou do Diabo, tamanha maldade?

Dentro de mim morre um homem Que sofreu, chorou, temeu tremeu Dentro de mim viveu este homem Amargando incertezas, dor, tristeza. Dentro de mim morreu o homem Que enxergava além da distância, Havia perdido a esperança, mais ainda assim sonhou com a bonança. Dentro de mim morrera aquele homem Que conhecia a maldade e sua essência Sabia tudo dela o tamanho e a diferença Dentro de mim renasce um novo homem Atingido por barragem e a certeza: é Deus, este poder que faz de nós uma irmandade.


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Album de Família

Foto: Miriã Bonifácio

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Família Santos, de Ponte do Gama Por Madalena das Dores dos Santos Com o apoio de Miriã Bonifácio e Wandeir Campos Fotos: Miriã Bonifácio

Família reunida na Capela que Senhor Zé de Jair ajudou a construir em Ponte do Gama.

Se eu contar a história dessa família começando pelo senhor José Silvério dos Santos, nascido em 07 de março de 1945, segundo filho do primeiro casamento de Jahyr dos Santos com Maria Izabel dos Santos, que morava em Paracatu de Baixo, onde aprendeu a ler e escrever, tenho certeza que vocês não iriam brigar comigo. Ou iriam? Então, vou dar início a essa história para vocês verem como essa família foi formada. No segundo casamento do meu avô, com a senhora Mariquinha, eles vieram morar em Ponte do Gama com seus sete filhos. Um desses filhos foi criado por sua tia, então chegaram aqui no Gama seis filhos. Nesses seis estava José Silvério dos Santos, mais conhecido como Zé de Jair, com apenas 12 anos de idade.

Recordação de Zé de Jair com os primeiros cinco filhos e com os três últimos.


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Ainda nessa idade ele já trabalhava em fazendas, carvoaria e tudo que é tipo de serviço que havia na época. O tempo foi passando e o garoto se tornou homem. Assim que completou 15 anos, já tinha seu próprio barraco e morava sozinho, tendo que trabalhar no mato e cuidar de sua moradia. Em 1971, quando o pessoal da comunidade estava em dúvida se fariam ou não a Capela, meu pai, com 26 anos, tomou a frente e se pôs pronto para construí-la. Logo no primeiro dia de trabalho ele e seu irmão Manuel Germano foram quebrar pedras, pois não tinham materiais de construção. Todos que moravam no Gama, vendo que o senhor arregaçou as mangas, se sentiram na obrigação de ajudar. Os tijolos foram feitos por eles, amassando barro com os pés. Depois carregaram os materiais no carro de boi. Após tanto trabalho, a capela de Nossa Senhora Aparecida foi inaugurada no dia 14 de outubro de 1973. Enquanto muitos desistiram de seguir a igreja Católica, Zé de Jair sempre se manteve firme na sua religiosidade, se tornando ainda um vicentino da Sociedade São Vicente de Paulo e ajudando a quem precisa. Aos 29 anos casou-se com a senhora Maria da Conceição Carneiro, que o concebeu cinco filhos homens, começando pelo Arlindo Antonio dos Santos, depois Vicente André dos Santos, Antonio Vicente dos Santos, David Paulo dos Santos e Tobias Adriano dos Santos. Antes do mais novo completar cinco meses, sua mãe veio a falecer, deixando cinco crianças. A madrasta de Zé de Jair, vendo essa situação, pegou o mais novo para cuidar, deixando os outros quatro com o pai. Muitas pessoas depois vieram pedir para que ele as deixassem cuidar dessas crianças, mas ele não abriu mão e se tornou pai e mãe para eles. Pouco tempo depois ele se casou pela segunda vez com Terezinha da Silva, e esse casamento durou quatro anos e alguns meses, mas não tiveram filhos por ela ter alguns problemas de saúde e com isso veio a falecer. Mais uma vez o homem da casa, se torna pai e mãe por quase cinco anos sem abandonar seus filhos. Aos 50 anos se casou pela terceira vez com sua cunhada e comadre, pois Maria de Lourdes Carneiro é irmã da sua primeira esposa. Desse terceiro matrimônio nasceram três filhos, sendo dois homens, por nome de Noel Geraldo dos Santos e Tomé Anatalino dos Santos e uma moça, cujo nome é Madalena das Dores dos Santos, como diz meu pai "a rapinha do tacho".

Apesar das dificuldades vividas ele não deixou de criar, cuidar e ensinar seus oito filhos a viverem no caminho de cristo. Ele, que sempre dedicou sua vida à igreja, aos 60 anos se tornou ministro da Eucaristia, cumprindo essa missão por 12 anos. Hoje ele tem dois filhos que também se tornaram ministros, o Tobias e o Tomé. Além disso, desde novo o Arlindo e o Antônio toca e canta na igreja. Enfim, todos nós no caminho que ele nos ensinou. Quem acompanhou a história do meu pai desde o início não diria que ele iria conseguir construir essa família, mas ele conseguiu. Apesar dos pesares ele nunca entrou em desespero, sempre manteve a fé e a paciência. Além dos filhos todos criados, hoje ele tem sete netos (as) que são motivo de muito orgulho. Vou terminando de escrever esse tex-

to muito feliz, pois sou grata ao meu senhor Jesus por ter o pai que tenho e mãe maravilhosa que ele me deu. Também agradeço pelos irmãos que tenho e que admiro tanto.Muitas pessoas se assustam quando digo que sou a caçula e única moça no meio de sete homens, mas se eu tivesse que escolher uma família para viver escolheria essa, pois minha vida não faria sentido se eu não tivesse eles,. Amo cada um,sendo eles perfeitos ou não. mo pelo simples fato de existirem, pois são os melhores! E antes de eu assinar e por um ponto, não um ponto final pois é apenas o começo, quero deixar deixar um dos ensinamentos do meu pai para vocês meus caros leitores "tenha fé e paciência que tudo se ajeita".

Da esquerda para direita: Madalena a "rapinha do tacho", Tomé "o amoroso", Noel "o parceiro", Tobias "o companheiro", David "o conselheiro", Vicente " o bondoso", Antônio "o carinhoso" e Arlindo “ o carinhoso”

Maria da Conceição

Sr. José Jair

A História do meu pai

PARA NÃO ESQUECER

A. A

A. V

2 Filhos

1 Filho

V. A

D. P

T. A

1 Filha

3 Filhos

Teresinha Maria de Lourdes N. G

Tm

M. D

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PARA NÃO ESQUECER

Gama sem futebol e sem arena A comunidade de Ponte do Gama tem se reunido com frequência para tomar decisões conjuntas a respeito do processo de reparação e compensação pós desastre. Mesmo com algumas coisas já encaminhadas, eles ainda juntam forças para brigar pelo direito do campo de futebol e da arena levados pela lama. Por Milton Sena Com o apoio de Daniela Felix e Miriã Bonifácio Fotos: Miriã Bonifácio e Wandeir Lucas

Comunidade unida para lutar pela recuperação do Gama.

Na reunião que aconteceu no dia 21 de janeiro de 2017, toda a comunidade de Ponte do Gama se reuniu para tentar definir assuntos pendentes com a Samarco no que diz respeito ao bem comum. Também chegou a hora de receber de volta o Centro Comunitário e a Capela, mas claramente se via no semblante de cada morador que aquilo que seria motivo para comemoração depois de tudo o que passou desde o rompimento da barragem, nem se aproxima do que era antes. Tínhamos um belo rio, uma bela cachoeira, um belo vale, um campo de futebol, uma arena para cavalgada e agora ficamos reduzidos a um espaço de pouco mais de mil metros, onde nos pesa a dúvida de um futuro incerto em que não se entende bem o que é reparação, ou ainda a compensação do que foi perdido. Lutamos e tentamos entender, pois uma certeza que toda essa tragédia nos trouxe é a de que unidos as decisões são mais ágeis, e isso faz com que cada um da comunidade supra as deficiências do outro. Essa simplicidade nos une, e a união faz com que sejamos ouvidos e respeitados em nossas decisões.

Parque comunitário foi "entregue" como compensação para o lazer perdido após o desastre.


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As ruas que sobraram

Por Antônio Geraldo dos Santos Com o apoio de Miriã Bonifácio

Desde o rompimento da barragem ainda não conseguimos entender o quanto somos obrigados a aceitar por imposição tantas violações de direitos. Agradecemos a Deus todos os dias por estarmos vivos depois de um crime tão brutal, fruto da ganância excessiva pelo lucro e do descaso com a vida humana que se encontrava na rota da lama. É lamentável sermos condicionados a essas violações, mesmo sabendo que foi a negligência da empresa que causou toda essa tragédia. O tempo passa e nos sentimos impotentes para mudar esse panorama … A construção do dique S4, em Bento Rodrigues, é retrato da imposição a que fomos submetidos. Sua construção se deu através de um decreto estadual e sem o consentimento da comunidade. O morro (a parte alta do Bento) não será alagado, mas para os moradores dessas

ruas que sobraram o sentimento de dor é o mesmo de quem viu suas histórias de vida, construídas durante gerações, serem cobertas pela lama. Temos a mesma sensação de impotência, a mesma dor no coração. É muito triste olhar a rua onde sua infância realmente foi vivida, onde as pessoas caminhavam calmamente e as crianças faziam bagunça e se divertiam, se transformar em vias para máquinas e caminhões pesados, com o ronco dos motores ofuscando o canto sereno dos pássaros. Essas ruas que sobraram serviram de rota para quem teve de correr e não ser levado pela lama. Essas casas que sobraram serviram de abrigo para passarmos a última noite. Elas são essenciais para manutenção da nossa memória como comunidade, pois também contam o fato ocorrido no dia do rompimento. Pela cronologia dos fatos e as ações direcionadas para apagar nossa história, tais

como criar condições para inviabilizar o acesso ao Bento ou então as alianças firmadas entre empresa e poder público que não levam em conta a nossa vontade, não me surpreenderia se o próximo passo de imposição fosse a demolição das casas que resistiram a lama, aos saques e aos abalos de máquinas e caminhões. Existe o receio de que se crie condições que favoreçam essa destruição, ou que se comprove uma necessidade através de novos laudos. Até quando isso vai continuar acontecendo? A Samarco ter uma fundação para cuidar do crime cometido, e o crime continuar? O mais cruel é querer a qualquer custo arrancar nossa raiz e acabar com a nossa dignidade. Estamos vulneráveis, mas lutaremos até o último suspiro para manter nossa história viva. Foto: Stênio Lima


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Sobre como tornar a morte invisível Caminhão tomba e terceirizado da Samarco morre em Barra Longa. Você sabia? Por Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

Passados 15 meses do crime da Samarco (Vale\ BHP Billiton) não há dúvida em afirmar que a tragédia não acabou. Ela é o “bicho vivo” que vai crescendo, esticando seus tentáculos, deixando um rastro de destruição. É ilusão achar que a destruição foi apenas no dia 5 de novembro de 2015 quando a avalanche de lama atingiu a bacia do Rio Doce. Ela continua a cada dia quando os direitos são negados, quando a vida não recupera sua dignidade ou não encontra uma boa perspectiva para o futuro. Sem casa, sem terra, sem peixes, sem saúde... Mas, o pior, é a vida que se perde e deixa o vazio definitivo para família e amigos. Em 5 de novembro foram 19 mortos e um aborto forçado pela lama, mas não parou por ali. Na noite do dia 6 de janeiro de 2016, próximo das 22h, morreu mais um trabalhador cujo nome não foi divulgado: 31 anos de idade, pai de dois filhos, morador de Sete Lagoas. Trabalhava na Tamasa, empreiteira que atua nas obras de reconstrução dos estragos provocados pelo rompimento da barragem

de Fundão.A empresa é uma das responsáveis pelo transporte de pedras que estão sendo depositadas nos rios Gualaxo, Carmo e Doce com o objetivo alegado de preservar as margens atingidas pela lama. Segundo informações de atingidos, o trabalhador guiava o caminhão carregado com pedras e próximo à entrada de Barra Longa perdeu o controle, tombou e acabou esmagado no veículo. Ele trabalhava há poucos dias nas obras de reconstrução. Será que estamos diante de mais um “acidente”? Os atingidos organizados no Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) consideram que os terceirizados da mineração que atuam nestas áreas de reconstrução também devem ter os seus direitos respeitados garantindo condições de segurança para eles e para os atingidos. Veículos sem lonas nas caçambas e trafegando acima do peso em horários que evitam “a balança de fiscalização” são algumas das denúncias frequentes já discutidas em reunião, além da precariedade no vínculo de

trabalho entre motoristas e empreiteiras. Apesar de mais uma morte no contexto do rompimento da barragem de Fundão, não se viu atenção alguma da impressa sobre tema. O site Tragédia Anunciada, coordenado pelo MAB, publicou um texto sobre o tombamento do caminhão. O único após 72 horas. Ao copiar o título na busca do Google o que se via como resultado de busca era um só: o NADA. Nos primeiros dias, nenhuma informação, nem único texto, uma única reportagem. Todos os grandes meios de comunicação receberam a informação, mas não houve nenhum destaque. Transformar a tragédia e a morte no invisível é o resultado mais dramático e injusto desde crime. Na contramão da indignação seletiva, o MAB continua seu trabalho de organização dando permanente espaço e voz para cada atingido onde ele estiver. É seu direito não desaparecer na nuvem das informações, não virar um número ou, sobretudo, não ser esquecido. Foto: Arquivo pessoal/MAB


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Maria, Maria é um dom!

Maria Tecla Celestino, filha de Pedro Celestino, viveu grande parte de sua vida em Paracatu de Baixo. Trabalhava com alimentos orgânicos (morangos e tomates-uva), antes do rompimento da barragem. Após a tragédia, Maria teve que abandonar o trabalho para cuidar de seu pai idoso e de seus outros três irmãos, que necessitam de acompanhamento psicológico. Por Maria Celestina Com apoio de Daniela Felix e Wandeir Lucas Fotos: Daniela Felix

“Uma certa magia Uma força que nos alerta Uma mulher que merece Viver e amar Como outra qualquer Do planeta É o som, é a cor, é o suor É a dose mais forte e lenta De uma gente que ri Quando deve chorar” Fernando Brant

Maria Celestino

Vi o que aconteceu pela televisão, no plantão do jornal. Minha menina passou a noite toda na frente da TV. Às cinco horas da manhã, ela me disse: “Mãe, ainda não acharam eles.” Meu pai, Pedro Celestino, não quis sair de Paracatu de Baixo. Meus irmãos, José, Nicanor e Pedro, que também moravam lá, tentaram retirá-lo, mas ele resistiu, ficando os três a noite toda em meio ao lamaçal. Os três foram resgatados pelo meu irmão Odair no dia seguinte, já que nem helicópteros conseguiam ter acesso à área. Meu pai passou 13 dias internado no hospital, porque engoliu lama. Quando recebeu alta, foi para um hotel, onde ficou por duas semanas com meus irmãos. Depois, vieram para essa casa em Mariana, alugada pela Samarco. Em meados de 1940, meus avós se mudaram de Piranga, Minas Gerais, para Paracatu. Construíram a própria casa, entre o sítio do seu João Bigode e a casa do seu Valdir. Anos depois, meus pais também ergueram nosso lar com as próprias mãos, pertinho da casa dos meus avós.

Crescer lá foi “bão dimais”. Tínhamos um rio limpinho, onde a gente nadava e pescava. Tinha pé de mamão, manga, laranja e café. Eu brincava muito com a Kátia e a Maria Helena. As fotos dessa época se perderam na lama. Quando me casei, me mudei para Amarantina. José e Pedro construíram suas casas pertinho da dos meus pais. Nicanor continuou morando com papai. Odair comprou uma casa em Itabirito. No mês da tragédia, completariam cinco meses do falecimento de minha mãe. Antes, era ela quem cuidava deles em Paracatu. Tive que largar meu emprego em Amarantina para ficar com papai, José, Pedro e Nicanor aqui em Mariana, já que eles não têm condições de viverem sozinhos em cidade grande. Eu preparo as comidas, lavo as roupas, compro os remédios, levo ao médico. Fico de olho quando saem na rua. O Nicanor já recebe atendimento médico e psicológico da Samarco. Agora, a única coisa que eu quero é que as três casas fiquem prontas logo, para que eles pos-

sam voltar para a roça. Não podem ficar aqui na cidade, porque passam o dia todo na rua sem fazer nada. Lá, pelo menos eles podem arrumar galinha para cuidar, partir lenha, arranjar alguma ocupação. Como nenhum deles sabe ler, fica difícil arranjar um emprego aqui. O José tem acordado todo dia às cinco da manhã para bater pasto no alto do Ribeirão do Carmo. Volta só de tardezinha. Até apelidei ele de zumbi.

Maria Celestino e seu pai Pedro Celestino

Vou para minha casa apenas aos finais de semana para ficar com meus netinhos, que sempre me perguntam quando voltarei a morar lá. Espero que as novas casas sejam entregues bem feitas, que todo mundo de Paracatu aprove, fique contente e comece sua vida nova. Não adianta voltar pra um lugar que você não se sinta em casa. Quando isso acontecer, correrei atrás de outro emprego.


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O zelo pela saúde mental Após o rompimento da Barragem de Fundão surgiu a necessidade de se ofertar suporte em saúde mental aos moradores das comunidades atingidas. Com esse intuito, foi necessário aumentar o número de trabalhadores de saúde da Prefeitura Municipal de Mariana, levando à contratação de novos profissionais. Conversamos com Érica Candian e Maíra Almeida, que integram a equipe de saúde mental, para saber, depois de todo esse tempo, como a equipe vem cuidando dos atingidos. Por Érica Candian, Maíra Almeida, Piruá e Zézim Café Com apoio de Carlos Paranhos

Não somos daqui. Quando chegamos em Mariana para trabalhar no serviço público de saúde do Município, não nos conhecíamos e nem conhecíamos a cidade. Diante de uma situação tão nova e complexa, não sabíamos muito bem como iríamos trabalhar, mas, como profissionais da saúde, deveríamos construir junto a nossa equipe ações em saúde mental para aliviar um pouco os sofrimentos e tristezas dos atingidos pela barragem que estavam realojados em Mariana. Um dia resolvemos pegar um ônibus para dar uma volta e tentar conhecer os bairros da cidade. Não foi suficiente. Assim como vocês, só passamos a conhecer a cidade depois de viver todos os dias aqui. O estranho e o desconhecido do contato com um novo lugar nos permeava, mas de uma forma muito diferente. Nós escolhemos mudar pra Mariana; vocês foram obrigados, passaram noites em hotéis e escolheram, às pressas, casas em bairros muitas vezes desconhecidos. Nós estávamos construindo uma nova experiência de trabalho; vocês estavam em sofrimento por terem perdido tudo. Nós estávamos tendo um difícil desafio de trabalhar em equipe; vocês estavam separados, espalhados pela cidade, longe de vizinhos e familiares. Nós estávamos aprendendo a cuidar dos atingidos por barragens; vocês estavam aprendendo a ser atingidos. Durante todo o ano passado, os sentimentos e afetos provocados por nossos encontros foram fortes. Foram várias conversas, contatos, visitas, cafés, reuniões e mais reuniões para que pudéssemos nos conhecer e pensar nas possibilidades de cuidado que poderíamos ofertar e como seria a nossa contribuição neste trabalho.

Um dia acompanhando uma manifestação dos atingidos, lemos a seguinte frase em um cartaz: “Quem não pisou na lama, não venha falar por nós”. Ela nos ensinou que para esse trabalho dar certo, nós deveríamos estar próximos e juntos. A escuta sobre os seus desejos, modos de vida e como gostariam de viver deveria estar em primeiro lugar. De um dia para o outro, tivemos que despir de muitos dos conhecimentos aprendidos em nossas faculdades e profissões para sentar, tomar um café, comer uma rosca e aprender muito, mas muito mesmo com vocês. Acima de tudo aprendemos a escutar! E foi a partir dessas escutas que começamos a resgatar memórias, histórias e atividades importantes para as comunidades. Ofertar espaços de encontros, de conversas. Acolher e estar junto quando as angústias, desesperos e sofrimentos apareciam. Ajudar as famílias a se reunirem e pensar na circulação e adaptação num novo território desconhecido. Pensar em soluções para situações de preconceitos. Estar juntos nas escolas, praças e locais públicos. Estar atentos às frustrações vindas da relação com a empresa e preparados para orientá-los. Estar junto nas reuniões das comissões. Dar um suporte quando os medos e incertezas com relação ao futuro apareciam. Agora já temos mais de um ano juntos! Fazemos parte de uma grande equipe que, assim como vocês, está espalhada por vários locais da cidade, tentando levar saúde e procurando formas de estar mais perto. Gostaríamos de agradecer a todos os atingidos que compartilharam esses momentos conosco e de convidar os demais para conhecer o nosso trabalho.

Fotos: Daniela Felix

Maíra e Érica em uma intervenção com as crianças que agora residem na Vila Maquiné, Mariana

Onde nos encontrar ? A equipe trabalha em vários espaços da cidade podendo ser acionada através do Posto de Saúde de Bento/Paracatu, Rua Wenceslau Braz, 461, Centro. A partir de Fevereiro será ofertado acolhimento para escuta individual na quinta-feira (16), às 17 horas, no momento da reunião ampliada dos atingidos, no Centro de Convenções.


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Arte: Carlos Paranhos

Zézim Café e Piruá prosando

José Marques da Silva, mais conhecido como Piruá, e José das Graças Caetano, o Zézim Café, são atendidos pelos serviços de saúde mental. Eles contam como o trabalho impactou suas vidas. Piruá: Quando vim para Mariana, me senti “fora do ninho”, foi como se antes eu tivesse tudo e agora nada. Daí as meninas me procuraram e começamos a nos entrosar, jogar conversa fora. Depois veio alguns colegas que eram conhecidos meus de Bento, o bom é que a gente se entende muito bem, falamos besteira, mas falamos de coisa séria também. A cumplicidade é muito forte, damos suporte um ao outro. Um dia eu fui até a Renata para a consulta psicológica e encontrei com uma menina que também é atingida, estava tão para baixo, virei para ela e falei: “continua vindo que depois tudo vai ficar bem com você”; dito e feito. Algumas semanas depois ela já estava bem melhor. Outra coisa que eu gosto muito é dos espaços onde a gente se encontra, são sempre abertos e amplos. Aprendi a andar nos arredores de Mariana graças a Érica e a Maíra. Elas são nota 10. Zézim Café: Se não fosse pelas meninas eu ainda estava dentro de casa. Depois que a barragem de Fundão rompeu e levou todas as nossas coisas, eu estava numa fossa do cão, desanimado com tudo. Teve um dia que eu estava tão mal, mas tão mal, que eu

não queria ir a um de nossos encontros, daí a Érica foi lá em casa, tocou o interfone e me chamou com aquela voz mansa. Não pude resistir e acabei indo, esse foi um dos meus melhores dias aqui em Mariana. Todo este trabalho está sendo fundamental na minha vida. Caminhei nos bairros da cidade, fui ao nutricionista, estou fazendo

Piruá, Maíra, Érica e Zézim Café em sequencia

acompanhamento psicológico, fiz até novos amigos, além de encontrar alguns companheiros das antigas. Tem dia que eu estou com a perna doendo, mas eu me empenho para sair, porque quando a gente gosta de algo, a gente faz o esforço que for necessário. A Maíra e a Érica já ganharam um lugar no meu coração.


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Tombamento parado na Prefeitura há 9 meses Como relatado na matéria “Muros Antigos de Bento”, presente na última edição do Jornal A Sirene, um processo de tombamento dos núcleos urbanos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo foi aberto em maio do ano passado, com o intuito de proteger e preservar os bens culturais que resistiram à passagem do rejeito da empresa Samarco. Mas o processo ainda continua parado. Desta vez fomos atrás de respostas para entender algumas questões legais sobre o tombamento. Por Carlos Paranhos e Genival Pascoal

A preservação do que restou das características arquitetônicas e urbanas de Bento e de Paracatu cria uma porta de entrada para a reconstrução da história destas localidades. Cada pedaço, cada canto que de alguma forma resistiu ao desastre, encontra-se permeado pelas lembranças das diferentes gerações que viveram nestes lugares. Além disso, o tombamento reforça a necessidade de não se esquecer esta tragédia: conservar estes espaços nos faz refletir sobre os fatos que levaram a este acontecimento e sobre os possíveis impactos que podem ocorrer em comunidades que vivem nos territórios marcados por barragens de mineração. A atual presidente do Conselho Municipal de Patrimônio de Mariana (COMPAT), Ana Cristina de Souza Maia, destaca a importância deste ato de tombamento: “Não conheço no Brasil nenhuma proposta simular como a do tombamento de Bento (e de Paracatu), principalmente pela sua complexidade. Eram duas comunidades inteiras que antes existiam de uma maneira, mas agora estão se readaptando a uma outra maneira de viver, em uma nova cidade”, disse. Um dos artigos da deliberação do tombamento, que se encontra disponível na página oficial do COMPAT, prevê ainda a criação do Museu Territorial de Bento Rodrigues e Comunidades Atingidas, um espaço onde parte do acervo histórico dessas localidades estaria disponível para a apreciação e reflexão dos visitantes. “A criação deste museu está dentro de uma proposta a ser desenvolvida junto com os atingidos. O local e quais bens estarão ali inseridos, ainda serão definidos”, concluiu Ana. Depois de aprovada pelo COMPAT, a documentação relacionada ao tombamento seguiu para a Secretaria de Cultura, Turismo e Desporto, entidade responsável pelo patrimônio de Mariana. No entanto, desde que chegou - há cerca de 9 meses - o processo encontra-se estacionado. Devido a esta demora, visitamos a Secretaria e questionamos sobre esta situação, mas a resposta para esta indagação, conforme apuramos, só poderá

ser apresentada após o término da reformulação da equipe da Secretaria e da nomeação do novo secretário, mudanças que deverão ocorrer até o início de fevereiro. Na próxima edição do Jornal A Sirene retornaremos a este assunto com a posição oficial da Secretaria. Entre maio e dezembro de 2016, o COMPAT efetuou dois novos tombamentos nestas áreas atingidas: a Igreja Nossa Senhora das Mercês, situada em Bento Rodrigues, e a Igreja de Santo Antônio, que fica em Paracatu. Apesar de sua importância, estes atos preveem a preservação somente destes templos e de seus entornos, não abrangendo os perímetros dos núcleos urbanos destas localidades, como define o tombamento realizado no ano passado. Afinal, o que é necessário para que um local seja tombado? O tombamento é um processo administrativo no qual se reconhece a relevância de um bem móvel ou imóvel para uma determinada comunidade. Este ato se baseia em diferentes tipos de informações, seja de natureza histórica, arquitetônica, urbanística ou plástica. Portanto, é um ato administrativo complexo, que pode levar bastante tempo, tendo como início a deliberação do Conselho Municipal do município e término o decreto assinado pelo Prefeito. No final deste processo o bem tombado é inscrito, conforme o seu perfil, em um Livro de Tombo específico.

Como a influência da Samarco/SA pode atrasar este processo? Na ata formalizada pelo COMPAT, é clara a ênfase dada à diversidade de bens culturais que possuem importância em Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, como as Igrejas de São Bento e Santo Antônio, os sítios arqueológicos, as cavidades naturais subterrâneas, os antigos muros de pedras e o trecho da Estrada Real. Mesmo depois do desastre, alguns desses bens continuam sofrendo novas interferências. Parte dos muros antigos e das ruínas que restaram de Bento Rodrigues está sendo alagada pelo Dique S4, obra de contenção de rejeitos construída pela Samarco no final do ano passado. Legalmente, o projeto do Dique S4 deveria ter sido analisado pelo COMPAT, já que o processo de tombamento que encontra-se parado na Secretaria é um instrumento legal suficiente para impor tal condição. No entanto, a Samarco desconsiderou este procedimento e aprovou o seu projeto recorrendo a duas outras instâncias: a Delegacia Regional do IPHAN, sediada em Belo Horizonte, e o governo do estado de Minas Gerais. Com a anuência da Delegacia e do governo, a obra foi realizada, mesmo com o processo de tombamento municipal em tramitação. Este exemplo demonstra que tombar é um passo importante, mas não terá efeito sem a necessária fiscalização e a participação das comunidades atingidas.

Foto: Stênio Lima Capela de Santo Antonio, localizada em Paracatu, com enorme valor cultural e religioso


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Arte: Carlos Paranhos Foto: João Pinheiro

Genival Pascoal, atingido de Bento Rodrigues, relata em um texto autoral a importância do tombamento, revisitando alguns momentos que viveu desde criança até adulto.

O tombamento vai fazer com que tudo aquilo que a gente viveu um dia não seja apagado de nossa memória. Sabemos das dificuldades que vamos enfrentar para conseguir o tombamento, mas depois que conseguir, vai ser melhor porque não vamos precisar ficar com aquela preocupação da empresa destruir tudo aquilo que sobrou. Sempre tivemos uma ligação muito forte com o nosso Bento, saímos para trabalhar fora, mas sempre voltávamos para o nosso cantinho, nossa origem. Depois do rompimento da barragem nós passamos a valorizar ainda mais o que era nosso. Para começar, temos as cachoeiras nas quais nadei desde criança, o morro da pedrona onde pegávamos areia para a construção da nossa casa, servia também para brincar de casinha de areia; A água Santa era uma das nossas principais diversões nos sábados e domingos de sol quente, onde também levávamos o carro cheio de roupas para torcer; A Igreja onde em um dia especial nos vestimos com roupas sociais para a primeira comunhão; O Coral da igreja que um dia cantamos; A quadra da escola onde jogávamos bola; O poço do campo de futebol que brincávamos de pular de pirueta na água e pegar filhote de pássaros; O campo que corríamos dos touros bravos; A água da mina que era encanada até o campo de futebol; Os pés de frutas que subíamos e ficávamos quase o dia inteiro lá em cima; Os pássaros que tínhamos como animais domésticos e que vinham até na porta de casa para comer; A paisagem bonita que conseguia admirar da pedrona ou do alto do papagaio para admirar; Os muros de pedra que fizeram parte da história de nossos bisavós, em geral, da nossa família... Tudo isso que sempre esteve ali para desfrutarmos na hora que queríamos. Sabemos que o tombamento não vai trazer aquilo que tínhamos de volta, mas manterá viva nossas lembranças.


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História de um tio, história de um povo Por Letícia Soares Peixoto Aleixo

“Enquanto remava demorado no regresso, me vinham à lembrança as velhas palavras de meu velho avô: a água e o tempo são irmãos gêmeos, nascidos do mesmo ventre. E eu acabava de descobrir em mim um rio que não haveria nunca de morrer. A esse rio volto agora a conduzir meu filho, lhe ensinando vislumbrar os brancos panos da outra margem.” COUTO, MIA. Nas águas do tempo. In: Estórias abenshonhas. 1996, p. 13.

Foto: Letícia Aleixo


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Foto: Leopoldo

O Tio Euclides, apesar desse nome, num é meu tio, não. Mas é como se fosse. Ancião do povo Krenak viveu 105 anos de muita luta e resistência. Viveu no tempo da construção da ferrovia Vitória-Minas, que passa pelo território de seus antepassados; viveu e sentiu no próprio corpo os males da Ditadura Militar; foi tirado de seu território sagrado e submetido a trabalho forçado em terras distantes; viveu para ver a construção de uma hidrelétrica inundar o cemitério dos antigos Krén-nak e, finalmente, viveu para ver o Rio Doce morrer. Na língua Krenak, Rio Doce é Watú, e Watú é “grande pai”. A perda do rio, para esse povo, ultrapassa qualquer possibilidade de mensuração de danos pelo homem, já que esses são de ordem espiritual. Para além da perda do modo de vida tradicional, a perda do Rio Doce configura um verdadeiro atentado ao sagrado Krenak. Muitos são os que anseiam, ao longo de toda a Bacia do Rio Doce, pela reparação integral dos danos ocasionados pelo rompimento da barragem de Fundão, já há ano e três meses. O processo é longo e, para que seja efetivo, exige a plena participação das comunidades atingidas. Para alguns, no entanto, a espera é mais sofrida. É que para aqueles em idade avançada, como o Tio Euclides, muitas vezes não se espera muito do que está por vir. Darcy Ribeiro já nos falava desse tempero da terceira idade em seu livro “O Mulo”: “Velhice é isso. É não ter outros eus adiante para neles se desdobrar. [...] Meu eu de hoje é já meu eu de sempre. Com ele vou acabar. Amém.”. A velhice, porém, pode ser vivida de várias formas. Há quem, como o Tio Euclides, tenha passado por várias dificuldades ao longo da vida e, mesmo assim, tenha começado a construir sua casa com as próprias mãos depois dos 100 anos. Há também quem, sem mesmo ter idade avançada, já viva avelhentado, como se nada mais pudesse aprender, mudar ou superar. Mas sempre há de chegar a nossa hora. E, Tio Euclides, sabendo não poder hoje salvar o Watú, tomou o seu caminho e virou pingo de luz.

Nak inhauit borum erehé...


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REDE COLABORATIVA DE APOIO AOS ATINGIDOS: Um Minuto de Sirene Por: Um Minuto de Sirene

O coletivo Um Minuto de Sirene é composto por moradores de Mariana e de Ouro Preto, e surgiu pouco tempo depois do rompimento da Barragem de Fundão. O nível de destruição apresentado nos noticiários, a bruta mudança ocorrida nas vidas das pessoas afetadas pelo rejeito e o histórico desnível de poder entre a força das corporações e dos grupos sociais nos levaram a participar desta causa e a contribuir para que os Atingidos de Mariana criassem, a curto e médio prazo, uma estrutura mínima que os permitissem lutar pelos seus direitos. Neste contexto nos aproximamos dos Atingidos e de outros atores que também começaram a se envolver nesta causa, como o Ministério Público, a UFOP e a Arquidiocese de Mariana, e criamos um ato mensal, ainda realizado na sede de Mariana, que visa atualizar as informações sobre o andamento desse processo. Entre o final de 2015 e ao longo de 2016, esta estrutura foi se montando, como demonstra o surgimento da Comissão dos Atingidos, do Jornal A Sirene e das Assessorias Técnicas, que dão suporte às comunidades afetadas em diferentes campos, como a representação, arquitetura, a psicologia, ad-

vocacia e comunicação. Atualmente, os Atingidos de Mariana encontram-se em outro patamar de organização, mas sabemos que o processo ainda será longo, desgastante e desafiador. Citamos alguns desafios: de que forma a passagem do tempo influenciará na luta dos Atingidos? Ela se fortalecerá ou vai se desagregar a partir da substituição do interesse coletivo por soluções individuais? As Assessorias Técnicas cumprirão a contento as tarefas de ampliar a mobilização dos Atingidos e de produzir uma reflexão técnica que esteja a altura deste desastre? A Fundação Renova, estruturada a partir do Acordão, aceitará os Atingidos dentro do seu Conselho Deliberativo, tornando-os agentes protagonistas e não apenas coadjuvantes nesse processo? Os grupos de atingidos da Bacia do Rio Doce, apesar da especificidade de cada região, conseguirão tecer uma rede comum a fim de promoverem ações conjuntas? Existem, portanto, desafios locais e amplos neste cenário, e o Um Minuto de Sirene continuará sendo um parceiro nesta luta. A garantia dessa estrutura mínima para a luta dos Atingidos tem nos liberado para

refletir sobre outra e importante questão relacionada a este desastre: o que aprendemos com este evento, de que forma a cidade de Mariana tem lidado com este acontecimento? A partir desse questionamento passamos a acompanhar mais de perto as relações tecidas entre a Samarco, a prefeitura, a Câmara e a sociedade local. Citamos algumas questões que, atualmente, nos orientam: quais fóruns têm sido promovidos pelo poder público local para se discutir os aprendizados deste desastre? Como a cidade está se preparando para construir um futuro menos vulnerável e dependente de determinadas atividades econômicas? De que forma a sociedade local tem sido envolvida nesse debate? Como os grupos sociais existentes em Mariana se posicionam quanto a atual situação de Mariana e as suas perspectivas futuras? Acreditamos que estas questões nos servem como uma espécie de termômetro para medimos, neste momento, o grau de amadurecimento ou de retração da nossa ideia de cidadania. Que cidade temos? Que cidade queremos? Sim, em graus diferentes, somos todos Atingidos. Foto: Lauro Soares

Ato do coletivo Um Minuto de Sirene na praça da Sé, em Mariana. 5 de abril de 2016.


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A SIRENE PARA NÃO ESQUECER

Direito de Entender Nos termos do artigo 927 do Código Civil brasileiro “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Em outras palavras, toda vez que alguém – pessoa física ou jurídica – causar dano ou lesão a um direito de outrem, é obrigado a reparar esse direito, especialmente por meio do pagamento de indenizações em dinheiro. As vítimas do rompimento da barragem de Fundão, conhecidas como “atingidos”, tiveram vários direitos violados pela empresa responsável: muitos perderam a fonte de renda, veículos, moradia, casa, emprego, lotes, roupas, coleções, plantações, animais, lembranças, dinheiro em espécie, materiais de trabalho, recordações, vivência comunitária e social, entre outros direitos. Logo, a causadora do dano é obrigada, por lei, a reparar todos esses direitos. Em razão do grande contingente de vítimas, faz-se necessário identificar todos os afetados e averiguar seus direitos violados. Isso porque, embora os danos tenham uma origem comum – o desastre do dia 05/11/2015 – cada família, cada atingido, possuía patrimônio material e moral distinto. Daí a necessidade do cadastro de atingidos, cuja finalidade é identificar os atingidos e proporcionar elementos para a estimativa das indenizações a serem pagas pela empresa causadora do dano. Portanto, o cadastro é um documento que será aplicado e preenchido por profissionais especializados, em relação a cada um dos atingidos, visando identificar dados pessoais e direitos violados, coletando o maior conjunto de informações possíveis sobre cada atingido, para permitir que a indenização seja calculada de forma justa. Nesse sentido, o Ministério Público, a Comissão de Atingidos e a Assistência Técnica gerida pela Cáritas trabalharam para que o cadastro represente os interesses da comunidade, e não só da empresa. Por isso, as partes pactuaram, na Ação Civil Pública n. 0400.15.004335-6, que tramita na 2ª Vara da Comarca de Mariana, a suspensão da aplicação do cadastro, já que o documento existente foi elaborado unilateralmente pela empresa. Embora o atingido possa optar por aceitar o cadastro atual, correrá o risco de receber indenização injusta e ter mais direitos violados, sem a possibilidade de recorrer às autoridades. Desse modo, o Ministério Público recomenda que os atingidos rejeitem o cadastro elaborado exclusivamente pela Samarco, aguardando a formulação do cadastro conjunto e participativo, que possibilitará a realização da Justiça. Quando esse cadastro estiver concluído toda a comunidade atingida será avisada e, assim, estará apta ao preenchimento, com a constante fiscalização da Promotoria de Justiça. Em caso de dúvidas sobre o cadastro, o atingido poderá buscar informações no Ministério Público, na Comissão de Atingidos ou na Assistência Técnica e, se for abordado por representantes da empresa para acolher o cadastro atual, poderá comunicar ao Ministério Público para as medidas legais cabíveis. Mariana, 23 de janeiro de 2017. Guilherme de Sá Meneghin Promotor de Justiça

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PARA NÃO ESQUECER

Primeira Missa A primeira missa de 2017 celebrada em Bento Rodrigues marcou um recomeço para a comunidade. Os moradores contam suas impressões sobre esse momento e o modo como eles enxergam o futuro através da fé. Por Mônica Santos e Padre Geraldo Barbosa Com o apoio de Milton Sena

“O retorno depois de um ano para celebrar nas ruínas de São Bento foi de muita emoção e mostrou que se nos mantivermos unidos e perseverantes na fé conquistaremos nossos objetivos.’’

Marinalda

“Uma mistura de sentimentos. Paz e revolta, mas fé acima de tudo”.

Simaria

“Ficou evidente que para aqueles que o Bento não fez parte da vida deles, o Bento acabou, mas para os que fazem parte da vida do Bento ele existirá para sempre. Podem até tentar nos tirar de lá, mas ele jamais irão tirar o Bento de nós”.

Mauro

“Celebrar nas ruínas da igreja de São Bento me trouxe um misto de emoção. A alegria de me sentir em casa novamente, mas ao mes-

mo tempo a tristeza de ver tanta destruição e ainda ser vigiada o tempo todo no local em que você nasceu, cresceu e ajudou a cuidar durante a vida”.

Maria

“A missa foi uma limpeza da alma. “

Cristiano

“Entendi que existe vida após a "morte”.

Branco

“Para mim significou muito porque mesmo com todos os obstáculos conseguimos celebrar como fazíamos antes. Aquela igreja tem um significado muito importante na minha vida foi ali que aprendi com minha avó os primeiros passos para seguir a Deus. Também nesta missa foi a primeira vez que pude acompanhar minha afilhada Olívia a comungar pela primeira vez onde ela foi batizada. “

Mônica

“Nem o tempo consegue apagar da memória o que vivi aqui. Até o cheiro da igreja continua o mesmo, consigo sentir.”

Rosilene

“Senti como se nada tivesse acontecido com o nosso querido Bento Rodrigues. Foi uma coisa tão simples e gostosa, estar ali naquele momento de fé, amor e esperança. “

Paula

“Celebramos a missa e meditamos a mensagem do papa Francisco; pela não violência, por uma atitude política de compromisso com a paz, pela resistência, pela fé comprometida com as obras e também para que o ideal de vida de São Bento nos estimule a coragem para enfrentar e lutar contra o sistema devastador de vidas e do meio ambiente.” Padre Geraldo Barbosa Foto: Rui Souza


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PARA NÃO ESQUECER

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AGENDA DE DEZEMBRO 1 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

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6 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Pedras Horário: 17h Local: Escritório dos Atingidos

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6 Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

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7 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

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Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

Reunião Pública comunidades atingidas de Bento e Paracatu/ Arquidiocese e Mariana/ Samarco Horário: 18:00 h Local: Centro de Convenções (Salão Paroquial)

Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

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Reunião Grupo de Trabalho Temático de Pedras Horário: 17h Local: Escritório dos Atingidos

Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

21 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

Agenda sujeita a alterações

Reunião pública geral dos atingidos de Mariana/ Comissão dos atingidos Horário: 18h Local: Centro de Convenções

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Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

Reunião pública geral dos atingidos de Mariana/ Samarco/ MInistério Público Horário: 18h Local: Centro de Convenções

Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos


Papo de cumadres Por Sérgio Papagaio

Duas comadres conversando: clemilda e consebida, elas comentando sobre um ano do jornal A SIRENE. Clemilda disse: olha cumadre, já faz um ano que ês invento u jorná a sirene. - É cumade, esse jorná pôs voz na boca da gente; já pensou se nos fosse falá pro zoto tudu quês falô, óia só pro sê vê, no primeiro jorná, ês fez a pergunta, e se fosse com você? Isso fez muita jênte ingasgá. - aquela prosa de seu Sebastião quele fala que a sirene dele foi Deus, que ele correu, ainda levou a irmã de 70 ano no colo, até hoje mi faz chorá. - dona Figena de Paracatu me faz lembrá de nós no sigundo exemprá, condela diz: “sempre morei na roça, nunca agradei de cidade, tive meus 12 fio, tudu em casa". - é cumade, nós também teve nossos fio tudo na roça, agora nós é obrigada a viver na cidade, ô mardade, que tristeza que dá. - já no tercero jorná, até nós escreveu lá. - é no tercero cumade? Nun é no n° 2? - é o 3° sim, o primero foi o zero, - a é mês!

- nós falô do tanto de duença que apareceu depois da lama. - já no n°3, eu apreciei as palavras que mauro marcos iscreveu o texto “Eu, a Samarco e o fim da alegria”. - o n°4 troxe dona cassiana, benzedeira de Barra Longa com 96 anos. - são muintos jorná, vê só se ajente fô falá tudo quês iscreveu, nós vai gastar uns dez dias, sabe o que eu queria? Era escrevê de novo iguar a edição n°9 que nós fala da praça que pintaru de verde a grama com o ri chei de lama. - é os bandido izibindo com uma grandeza danada a pena que prá ês foi apricada. - tem coisa que nun é bacana, óia os povo, os vizinhu se istranha. Os amigo se arranha e a todo momento, a Samarco vem com falseijamento. - e isso até onde eu tenho conhecimento, é du mar até ni Bento. - fala de atinjido direto e indireto, óia até quem ta lonje do acontecimento se tomá tento, pra também sê atinjido só pricisa de um poco de sentimentu.

- e quem foi mais atinjido? A que perdeu a casa ô u maridu? - ô foi u quem perdeu u comercio, ô u amigu? - quem teve u quintá e as coisa cheia de lama, ô quem ainda sofre o drama? - pra mim a lama é o menor pobrema carzado pela samarcu. Ês misturo nossus sonhu, e virô pesadelo, hoje nós tem medo e até vergonha de sonhá de novu. - sintu muita pena dus mais atinjido. - uai quem é us mais atinjido cumadre? esa cunversa ta isquisita pra daná! - uê, os que tem os bem matériá como valor maió, esses sim, perderu tudu, pois era só u que ês tinha, amô pelo zotus nunca ixistiu. -é cumadi, cê tem razão, nós tem que tê mais pena é dês que nun tem compaxão. -E da samarcu também que nun tem coração, pois o negoço dela nun é pessoa, e sim, mineração, ao lado do estado perito em currupição, sob um sistema sócio economicu adestrado pelo cão.


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