Jornal A Sirene - Ed. 15 (junho)

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A SIRENE PARA NÃO ESQUECER | Ano 2 - Edição 15 - Junho de 2017


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Junho de 2017 Mariana - MG

PARA NÃO ESQUECER

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Informa

O QUE A RENOVA ESTÁ FAZENDO? Está marcada para o dia 20 de junho, às 18h, no Centro de Convenções de Mariana, uma Audiência Pública na qual será avaliada a atuação da Fundação Renova na cidade. O evento será realizado pelo Ministério Público, em parceria com a Cáritas Brasileira Regional de Minas e a Fundação Ford. A audiência tem como objetivo levantar informações sobre a relação da Renova com as comunidades atingidas; a efetividade das ações criadas pela empresa para os produtores rurais; a relação com empresários lesados por terceirizadas que prestam serviços à Fundação e o prazo para a contratação de mão de obra local. ASSESSORIA PARA BARRA LONGA Na última quarta-feira, 31 de maio, os atingidos de Barra Longa deram um importante passo na luta contra a violação de seus direitos. Foi assinado, junto ao Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Ministério Público Estadual (MPE) e o Ministério Público Federal (MPF), um acordo com a Samarco para a contratação da Assessoria Técnica para os atingidos da cidade. Quem assume os trabalhos é a AEDAS (Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social) - instituição que irá assessorar os atingidos com profissionais de diversas áreas, como engenheiros, arquitetos, agrônomos, advogados, entre outros. A conquista da Assessoria na cidade abre um importante precedente para que outras localidades da bacia do Rio Doce possam contar com o mesmo recurso. INDENIZAÇÕES TERRAS ALAGADAS - DIQUE S4 A Samarco segue realizando reuniões a portas fechadas com os proprietários das terras alagadas pelo Dique S4, em Bento Rodrigues. Agora, estão sendo apresentados os valores das indenizações com base em laudos produzidos pela Vaz de Mello Consultoria em Avaliações e Perícias - prestadora de serviço que já atuava junto a empresa antes do rompimento. Os atingidos não têm acesso a esses laudos e os critérios utilizados para avaliação dos terrenos não são claros. Além disso, o processo, iniciado pela Samarco, será finalizado como um programa de indenização da Fundação Renova. O Ministério Público segue orientando para que nenhum acordo seja firmado sem o devido acompanhamento. FEIRA NOTURNA A inauguração da Feira Noturna, prevista para o mês de maio, acontecerá no dia 6 de julho. O projeto é uma realização dos atingidos pela Barragem de Fundão, Arquidiocese de Mariana e Ministério Público Estadual. O evento, que acontecerá às quintas-feiras, das 17h às 22h, na Praça dos Ferroviários, tem como objetivo a geração de renda e a promoção de lazer na cidade de Mariana

Expediente

NOTA DE FALECIMENTO Na manhã do dia 23 de maio, morreu o Senhor Pedro Celestino, atingido de Paracatu de Baixo. Pedro Cascalho, como era conhecido, viveu mais de 60 anos em Paracatu. Amava cuidar dos animais e sentar todo final de tarde para ver o gado passar. Nós, do jornal A SIRENE, gostaríamos de lembrar a força de Seu Pedro. Prestamos nossos sinceros sentimentos à família e aos amigos. Destacamos sua especial participação neste jornal na matéria “Maria, Maria é um dom”, na edição 11 (fevereiro de 2017).

Ilustração: Wellidas Monteiro

AVISO Não assine nada:

• Se tiver dúvidas sobre o conteúdo; • Se precisar de ajuda de um advogado ou de qualquer outro especialista; • Se alguém disser que “todo mundo já assinou, só falta você”; • Se você quiser consultar algum familiar antes; • Se alguém disser que “se não assinar, não terá mais direito”.

Atenção!

Se te pedirem para assinar qualquer documento, procure o Ministério Público ou a Comissão dos Atingidos. O tempo para analisar e questionar qualquer coisa é seu!

Realização: Atingidos pela Barragem de Fundão, Arquidiocese de Mariana e Um Minuto de Sirene | Conselho Editorial: Milton Sena, Adelaide Dias, Angélica Peixoto, Ana Elisa Novais, Cristiano José Sales, Fernanda Tropia, Genival Pascoal, Lucimar Muniz, Manoel Marcos Muniz, Mônica dos Santos, Pe. Geraldo Martins, Sérgio Fábio do Carmo (Papagaio), Silvany Diniz, Simone Maria da Silva e Thiago Alves | Editor-chefe: Milton Sena | Jornalista responsável: Rafael Drumond | Gestora de redes: Aline Monteiro | Editora de Arte: Silmara Filgueiras | Editora de Texto: Miriã Bonifácio | Reportagem e Fotografia: Carlos Paranhos, Daniela Felix, Flávio Ribeiro, Genival Pascoal, Larissa Helena, Lucimar Muniz, Madalena Santos, Sergio Papagaio, Simone Maria da Silva e Wandeir Campos | Apoio: Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) | Revisão: Elodia Lebourg | Agradecimentos: Guilherme de Sá Meneghin (Promotor de Justiça - Titular da 2ª Promotoria de Justiça de Mariana)| Impressão: Sempre Editora | Foto de capa: Daniela Felix | Tiragem: 2.000 exemplares | Fonte de recurso: Termo de ajustamento de conduta entre Arquidiocesse de Mariana e Ministerio Publico de Minas Gerais (2ª Promotoria de Justiça de Mariana).


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A Fundação Renova tem legitimidade para atuar em Mariana? Nesta edição, Dr. Guilherme Meneghin explica que faltam transparência e participação dos atingidos nas ações da Fundação Renova

Guilherme de Sá Meneghin

Promotor de Justiça da Comarca de Mariana

A Fundação Renova foi constituída pelas empresas Samarco, Vale e BHP, em razão de um acordo formulado entre a União e os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Seu objetivo é executar programas de recuperação ambiental e socioeconômica na região, ações de obrigação primordial da Samarco, mineradora responsável pelo maior desastre da história do Brasil, com o colapso da barragem de Fundão no dia 5 novembro de 2015. No entanto, como a homologação do acordo que previu a sua criação foi anulada pelo Superior Tribunal de Justiça, há um natural questionamento sobre a legitimidade da atuação da Fundação Renova no território de Mariana. É importante esclarecer que a criação da Fundação Renova não depende do acordo firmado pela União, estados e empresas. Sendo assim, mesmo que não houvesse o “acordão”, as empresas poderiam compor a Fundação para cumprir as atividades de recuperação dos danos causados pela tragédia. Mas isso não quer dizer que a criação da Fundação extingue ou mesmo reduz a responsabilidade das empresas. Tanto é que a Samarco, a Vale, a BHP e a própria Fundação Renova figuram como rés em todas as ações ajuizadas pelo Ministério Público para tutela dos direitos dos atingidos de Mariana. Falta de legitimidade No entanto, a Fundação é rejeitada pela comunidade atingida e não conta com o respaldo do Ministério Público Federal nem do Ministério Público de Minas Gerais - que contestam veementemente o acordo celebrado sem o consentimento dos atingidos. Para compreender essa conjuntura lastimável, precisamos entender a noção de legitimidade ou legitimação, que significa uma aceitação ampla, por uma comunidade, a respeito de uma entidade, órgão ou ato. Esta aceitação somente é concretizada com a base na transparência das atividades e na participação dos membros da comunidade – dois requisitos essenciais que não estão presentes nesta relação e que são a fonte de toda ilegitimidade da Fundação Renova. Transparência é o acesso a informações corretas, compreensíveis e claras. Os atingidos que acompanham a reformulação do cadastro e a aquisição dos terrenos para os reassentamentos, por exemplo, perceberam que muitas informações prestadas pela Renova eram equivocadas, provocavam atrasos nos processos ou mesmo errôneas. Por outro lado, a publicidade da Fundação procura transmitir uma sensação de que “está tudo certo”. Isso, definitivamente, não é transparência. Já a carência de participação é, categoricamente, o maior problema da Fundação Renova. Analisando seu estatuto, nota-se a ausência de participação efetiva das vítimas do desastre na elaboração, fiscalização e execução de suas ações. Todo poder está concentrado em seus órgãos internos e no Comitê Interfederativo - composto em sua maioria por pessoas indicadas pelas empresas e pelos governos que pouco ou nada fizeram pelos atingidos. Esse problema é tão relevante que foi o principal fundamento para a anulação da homologação do “acordão”. Por isso, o Ministério Público, através da 2ª Promotoria de Justiça de Mariana, contesta judicialmente a Fundação Renova e demanda formalmente medidas concretas para reparação integral dos direitos dos atingidos, sempre exigindo a sua participação em todas as providências que devem ser adotadas. Ou seja, a Fundação Renova possui legalidade, pois sua criação está de acordo com a lei, mas não possui legitimidade, porque sua forma de administração, fiscalização e atuação não contempla de maneira adequada a participação dos atingidos, nem a transparência em suas ações.


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Um cadastro dos atingidos O cadastro é um instrumento de levantamento das perdas materiais e imateriais provocadas pelo rompimento da Barragem de Fundão. Trata-se de um recurso fundamental para a reparação dos danos causados pela Samarco aos atingidos. Nesta seção, esclarecemos algumas dúvidas sobre esse processo na cidade de Mariana. Por Genival Pascoal e Rafael Drumond Foto: Miriã Bonifácio

Modelo de questionário impresso proposto pela empresa Synergia e Fundação Renova/Samarco: 558 páginas

Por que o cadastro não está sendo aplicado na cidade de Mariana? O cadastro foi elaborado pela empresa Synergia - terceirizada que presta serviços à Fundação Renova/ Samarco. Era previsto que a Synergia fizesse a aplicação do instrumento. No entanto, conforme já publicado neste jornal, algumas irregularidades foram detectadas na proposta inicial. Pareceres técnicos do Ministério Público Federal e do Gesta UFMG (Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais) indicaram a ausência de participação dos atingidos no processo e a falta de diálogo com a realidade das comunidades. Segundo as avaliações, essa primeira proposta de cadastro é confusa no que se refere ao levantamento de danos morais, culturais, imateriais, socioambientais e coletivos. Outro problema identificado é a linguagem técnica utilizada no questionário, de difícil compreensão. Na cidade de Mariana, o instrumento vem sendo discutido junto à Renova/Samarco, tendo em vista sua adequação às demandas dos atingidos. Esse trabalho é realizado com acompanhamento da Assessoria Técnica da Cáritas e do Ministério Público Estadual. Como funciona a aplicação do Cadastro? Em versão impressa, o questionário apresentado pela Synergia possui 558 páginas. O processo é exaustivo e parcial, já que o trabalho seria realizado apenas por aplicadores da empresa. Além disso, o questionário demanda retorno imediato dos atingidos, cabendo ao aplicador anotar e, muitas vezes, deduzir o que lhe foi respondido. Na nova proposta, espera-se que processo seja menos cansativo e que o questionário seja organizado de maneira mais clara, permitindo uma fácil compreensão por parte dos atingidos. Propõe-se, ainda, que cada aplicação seja realizada por dois entrevistadores, um representante da empresa e outro da confiança dos atingidos. Esse cadastro irregular está sendo aplicado em outras localidades? Infelizmente, o cadastro original vem sendo aplicado em outras localidades da Bacia do Rio Doce. De acordo com informações disponíveis no site da Renova, a fundação vem utilizando dados fornecidos por profissionais e secretarias do Sistema Único de Saúde para localizar atingidos e finalizar o cadastramento de maneira rápida. A situação é ainda mais alarmante quando se considera a ausência de assessorias técnicas ao longo da Bacia. Como está a reelaboração do Cadastro em Mariana? Hoje, a reelaboração do cadastro é um dos principais eixos do trabalho dos atingidos de Mariana e de sua Assessoria Técnica. Trata-se de um processo de discussão e adequação do instrumento proposto pela Synergia. Mais do que isso, o espaço de construção coletiva do cadastro tem se mostrado um lugar de reflexão para os atingidos, que passaram a participar mais ativamente do processo de reparação.


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Papo de cumadres Por Sergio Papagaio

Consebida e Clemilda, estão as duas confundidas com as tais terceirizadas: - Cumadre, essas firma tercerizada num é Samarcu mesmu? - Óia, cumade, cumpadre Zé Dias me disse que a Samarcu contrata essas firma pra trabaiá, e o seuviço que ela ia fazê, as firma tem que executá. - Mas que baita confusão, comprica mais du que traz solução. - Cumade, veja só essa situação, as firma que tava fazenu a manutenção das área onde houve a destruição, elas vão embora e disseru que outras no lugar delas mais tarde virão.

- Cumade, me esclarece uma durda, pouque que a samarcu outras firma tem que contratá se ela mesmo o sirviçu podia executá? E nem os funcionários dela embora precisava mandá. - Diz cumpadre Zé Geraldo que os direitu que ela ia pagá prus impregadu, se por ela o serviçu fosse executadu, ela transfere prus outros que foi contratadu. Então continua a exploração. - Não entendi nada não. - Cumadre, nu que eu vô falá ocê põe sintidu, nesse modelo de trabaio até os contratadus são atingidu. - E a respeito da HP e Synergia, o que ocê mi diria? - Acho que ês com a Samarcu é a mesma culundria. - Cumadre, uma coisa eu quero peuguntá, a Renova é Samarcu ô é essa tar de terceirizada? - Pra mim, é uma coisa só, num tem nada mudadu. A noiva é a mesma com outru pintiadu.

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“Onde vou colocar minhas cabras?” Por Sergio Papagaio Com apoio de Silmara Filgueiras

Desde que a lama foi levada para o quintal de suas casas, as nove famílias que moram na região do Parque de Exposição de Barra Longa ficaram sujeitas a conviver com as máquinas da Samarco e com a poeira dos rejeitos. Os moradores da área foram comunicados de que uma avaliação médica constatou a necessidade deles serem retirados do local, como forma de evitar mais danos à saúde. Entretanto, o plano de remoção temporária apresentado pela empresa não satisfaz as necessidades reais desses atingidos. A proposta contempla apenas o pagamento do aluguel, água e luz e não leva em consideração o modo de vida daquelas famílias, que se mantém da criação de animais e do cultivo da terra. Os moradores revelam preocupação por não saber para onde vão os bichos e tudo mais que eles guardavam em suas propriedades.

Fotos: Daniela Felix

Canteiro de obras: animais disputam espaço com as máquinas

Geralda de Paula Gonçalves, 66 “E as cabras do meu neto? São seis. Pra onde vão? Pra onde eu posso levar meus cachorros? Os meus são três, no total da comunidade são 12. Nossa família terá de matar as 180 galinhas contra vontade? E as 42 codornas? E os dois perus? E o cavalo? Que destino eles terão? Também tem as nossas árvores frutíferas, no espaço em que brincamos, crescemos e colhemos os frutos da terra. São mais de 20 variedades que temos aqui. É pé de pêssego, manga, graviola, amora, abacate, coisa que não acaba mais. E quando voltarmos? Eles nos darão isso de volta? Precisam dar conta de entender como isso é importante pra nós. Só de pensar que vamos ter que deixar tudo pra trás dói. Imagine quando tivermos que sair.”

Tereza Cristina Gonçalves, 46 “Não queremos sair daqui. Não pedi pra Samarco trazer lama pra porta da minha cozinha. Todos nós estamos unidos nessa luta. Mas se tivermos que ir, não vai ser do jeito que eles querem, vai ser do jeito que nós vamos exigir’’.


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Nem Mariana, nem Barra Longa:

Barretos

Lá vai para dois anos de lama e, em Barretos, o que vemos é uma falta de critérios da empresa Samarco para lidar com a situação da gente. O valor para uns não é o mesmo para outros. A verdade é que estamos atingidos entre duas cidades. Na geografia, estamos mais perto de Mariana, mas, no registro, pertencemos a Barra Longa. Por isso, tudo aqui fica muito difícil de resolver. Por nós, atingidos de Barretos Com o apoio de Sergio Papagaio e Miriã Bonifácio

Eram dez horas da noite do dia 5 quando a enchente de lama chegou arrasando tudo. Parecia que o mundo ia acabar. O barulho dela, da enchente, ah... o barulho! ... Ficou na cabeça e a cabeça dói só de pensar.

Se for ver o caso de Maria Helena então... Lá eles reformaram a varanda, mandaram móveis novos, tentaram pagar o barro que entrou pra dentro da casa dela. Mas a cama já quebrou, o copo era só botar café que saía o fundo, o tanquinho não torce, não tira a poeira das roupas. A história é que tem lugar que foi destruído na hora, como Bento e Paracatu, e tem lugar que agora que tá acabando. A gente tá vendo ficar vazio, as pessoas irem embora. Uma tristeza que só! Quando dá uma chuva forte, você já logo pensa na outra barragem, aquela que ainda tá lá e que é muito maior. Se a sirene tocar, se ela tocar... é nisso que a gente pensa. Fotos: Daniela Felix

No caso de Maria Bernabé, Barra Longa não resolve. Ela mora sozinha, com três filhos. _ A pura verdade é que a gente nem sabe quem é o prefeito lá. Eles só vêm aqui em época de eleição. _ E o que a gente pensa é o seguinte: atrapalhou, então arruma. _ Acabou curral, acabou paiol e o que eles dizem é que não tá no mapa, mas, desde que meu pai nasceu, ele existe. _ Nem a porteira da gente fica fechada mais. Aqui a lama atrapalhou foi tudo! Atrapalhou a vida de Dorinha e Bilú, que vivem num lugar chamado Guerra, esquina com o rio Gualaxo, e que a gente garante: são gente da paz! _ O negócio aqui não foi fácil não. Não sobrou pau de lenha nem pra fritar ovo. _ Se quiser uma batata, uma abobrinha, uma verdura qualquer, vai lá na venda, porque aqui não acha mais. _Quiabo é 6 real a dúzia lá na Barra Longa. E não tem muito lugar de plantar porque a lama da Samarco é um negócio agarrado, ela não quer sair não. _ Antigamente, nós punha a gordura no fogo e ia pra beira do rio pescar um lambari. Agora cê come o peixe encardido se quiser. _ Meus pintinhos na chuva morre tudo, por isso eu quero meu galinheiro de volta. _ E ainda deram 7 mil pra gente dividir pra 4. _A indenização deles é um negócio que não dá para conformar.

Para o Dirley, também ficou complicado. Ele cria boi, vaca de leite, tudo na baixada do rio. Agora mandaram ele subir pro morro, mas o morro não serve. Mandaram ele dividir o auxílio com o pai, mas sua renda sempre foi separada. Ele quer reformar o curral, quer ver o gado comer o capim braquiária de novo. E tenta resolver em Mariana: já que a lama veio de cima, é melhor ir pra cima.


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Diagramação: Carlos Paranhos

PRINCÍPIO, MEIO E FIM De Fundão ao mar, todos os dias, a tragédia se escreve em rejeitos difíceis de serem eliminados. O rastro de destruição da lama é longo e diário. Ele está na cor escura das águas, parado à beira dos rios, marcado no tronco das árvores, presente na memória e no coração das comunidades. Ele está em nosso entorno, na maior de nossas casas - não por acaso, chamada Terra. Neste dia 5 - Dia Mundial do Meio Ambiente -, A SIRENE ecoa para lembrar que, do ponto de vista ecológico, somos todos um mundo de atingidos. Por Carlos Paranhos e Sérgio Papagaio Com apoio de Rafael Drumond

Em Santana do Paraíso, a pescadora Maria Vera conversa com Sérgio Papagaio sobre as saudades criadas pela lama de Fundão: “A pescaria, além de me distrair, ajudava nas despesas, pois eu levava alimento de qualidade pra casa. Agora, peixe no prato só Deus sabe quando. Os do rio estão contaminados e os do mercado não tenho como comprar”. Enquanto fala, quase sem perceber, Dona Maria pega um galho seco e começa a rabiscar o chão de areia. De suas memórias, a senhora fisga os peixes que hoje o rio já não dá. Após o rompimento, Seu Elísio, outro morador de Santana, conta a história da morte recente de uma égua prenha, que acabou atolada na lama ao tentar beber água no rio: “Ela valia mais de 10 mil reais, mas eu não venderia nem por 20”. Em Mariana, na comunidade de Ponte do Gama, Maria José Silva também sente a perda de sua criação. Para ela, com a lama, foi-se também um tanto de tranquilidade: “No dia que a lama chegou, perdi quatro cabeças de gado. Depois, mais uma, que não resistiu ao impacto. Tive que colocar meus bichos na parte mais alta do lote. Antes, eles matavam a sede com a água do rio. Agora perdi meu sossego porque tenho que vigiar eles constantemente.” O rio que a lama levou embora faz falta para muita gente. Alan Cassiano, morador de Barra Longa, conta que o rio do passado virou saudade e, o de hoje, impõe distância: “Sinto muita tristeza ao ver o rio dessa forma. Me recordo de quando pessoas de todas

Foto: Sérgio Papagaio

as idades iam pescar, algumas até nadavam. Hoje tenho medo de entrar na água, pois há um alto risco de contaminação. Sinto saudade da minha infância, de quando o rio era limpo, de quando podíamos usufruir das suas águas”. Em Paracatu, a professora Angélica Peixoto sente no ar as consequências da tragédia: “Nos primeiros dias após o rompimento, toda vez que respirava aquele ar tóxico sentia que a lama ia chegar em Paracatu novamente. Alguma coisa invadia meu nariz para me dar noção de toda a destruição que ela causaria em nossas vidas. Não sei se era físico, mas tenho certeza que era na alma, uma sensação de desolação. O que iria me acontecer?”

Foto: Lucas Godoy

Descompromisso com o Meio Ambiente O IBAMA vem realizando um trabalho de acompanhamento das ações de recuperação da Bacia do Rio Doce e, segundo relatório de vistoria publicado no dia 28 de março, o trabalho da Renova não está atendendo aos pareceres do órgão. Além da insuficiência do trabalho (várias intervenções ainda não

foram realizadas), há um questionamento sobre a aplicação de técnicas consideradas inadequadas. O documento destaca ainda o descompromisso da Renova em relação à apresentação de projetos solicitados pelo Ibama, como o cronograma de execução das ações recomendadas.

Atendimento das Recomendações em relação ao relatório anterior:


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Foto: Daniela Felix

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RESISTÊNCIA

Não sabemos o que vai nos acontecer, se nossas matas serão recuperadas, se o Rio voltará a ser Doce. Infelizmente, do ponto de vista técnico, não estamos caminhando bem (veja o quadro ao final da página). Mas a natureza, mais uma vez, oferece lições de resistência. Mesmo devastada, a vida se reinventa, como nas teias das aranhas que fazem brilhar os galhos secos de uma árvore às margens do Gualaxo. Nos rastros da destruição, outras árvores se

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mantêm erguidas, e, mesmo mortas, servem como poleiro para as aves cujas fezes espalham sementes e adubam os solos. Nos córregos, ribeirões e pequenos afluentes não contaminados mora a esperança de repovoamento do Rio Doce: nesses pequenos cursos d’água ainda respiram as mesmas espécies de peixes que foram dizimadas pela lama. A esperança existe. Da força espiritual da gameleira à orquídea que não virou rejeito. Foto: Daniela Felix

Foto: Larissa Helena

Foto: Lucas de Godoy

Resgatei a minha orquídea uma semana após o rompimento ter chegado a Ponte do Gama. A lama por pouco não a afetou, mas, graças a Deus, o tronco na qual ela estava plantada ficou intacto. Minha maior preocupação era se a orquídea iria se acostumar com a mudança para Mariana, porque

ela precisa de uma iluminação adequada, e como aqui é mais quente que Ponte, fiquei receoso dela nunca mais florir. Tive que realizar algumas adaptações, mas há pouco mais de 20 dias, ela floresceu e está linda. Mauro Lucio Santos Pais Pinto, morador de Ponte do Gama

A Gameleira Deus e os Orixás Foto: Daniela Felix

Por Sérgio Papagaio

No Brasil, a árvore gameleira é associada ao Orixá Irôko.

Sobre a lama viva, a morte impera. Bicho, mato, água parecem perder a guerra. Mas lá, no meio da várzea onde a Samarco semeou desertificação, em sinal de força, fé e superação, a majestosa gameleira vive. Vive para provar que Deus, outrora, havia embalado a natureza com as próprias mãos e, junto com os orixás, plantou também a Criação. Neste momento de pura aceitação, transportaram o amor para outra dimensão. A copa da gameleira, onde se ergue o ecumenismo desta dupla relação, é grande a coragem que se mostra continuidade. Na gameleira brava, Deus e o Orixá Irôko se dão as mãos, na esperança de que os homens se reconheçam nessa aliança e possam agora caminhar juntos. Que com isto cresçam e tenham algo de divino inspirados nos Orixás e no Deus Menino.

Áreas vistoriadas que apresentavam obras em execução durante o período da vistoria realizada em novembro:


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Por Luzia Queiroz, Marlene dos Reis, Mirella Sant-ana e Mônica Santos Com apoio de Daniela Felix

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A realidade cotidiana comprova que existe uma forte violação de direitos das mulheres atingidas. Estudos feitos pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) destacam a invisibilidade, a desqualificação e perda do trabalho, o silenciamento em espaços deliberativos, o não reconhecimento como atingidas pela empresa, a perda dos laços comunitários e familiares, o aumento de conflitos e violências. Por essas e tantas outras razões, elas lutam. Uma luta que diariamente se faz necessária.

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Cresci em Pedras. Lá trabalhei na roça e estudei até a quarta série. Aos 16 anos me mudei para Mariana para ajudar minha irmã durante a gravidez. Comecei a trabalhar como babá e cuidadora de idosos. Aos 18, conheci meu primeiro marido, com quem tive um filho, Odilon. Após 16 anos de casados, nos divorciamos. Decidi concluir o ensino médio e fui trabalhar como manicure e cabelereira. Me casei de novo. Quando a barragem rompeu, minha vida mudou outra vez. Minha mãe perdeu tudo. Agora, sou eu quem luto pelos direitos dela e de meus irmãos que moravam em Pedras. Os funcionários da Samarco me questionam: “Você perdeu o quê?”. Hoje sou a Marlene que vive sob estresse, que emagreceu, que vai à psicóloga, que não tem tempo para o marido e o filho. Mas não vou desistir do meu objetivo, que é correr atrás dos nossos direitos. Não só da minha família, mas da comunidade de Pedras. Como membro da Comissão dos Atin gidos de Pedras

as As super-heroínas são personagens fictícias dotadas de poderes especiais. Possuem o dever de salvar o mune Promotora Popular de Defedo, numa constante luta entre o bem e o mal. Mas, ao contrário sa Comunitária, eu vou do comum em alguns quadrinhos, as mulheres atingidas não se vestem com correr atrás. roupas elaboradas ou utilizam acessórios. Além de Marlene, Luzia, Mônica e Mirella, existem muitas outras que demonstram bravura, força e coragem. À elas, todo nosso apoio e admiração!


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Lá em casa me chamam de Dona Barragem. Reclamam que agora só sei falar disso, que, desde o rompimento, não paro mais em casa. Sou da Comissão dos Atingidos de Paracatu. Junto com mais de quarenta mulheres, participei do curso de formação de Promotoras Populares de Defesa Comunitária, realizado pelo Ministério Público de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Foi ótimo poder voltar a estudar, trocar experiências e conhecer a história de vida de outras mulheres. Minhas colegas de turma dizem que, quando precisarmos de ajuda aqui em Mariana, é só chamar que elas vêm. Brinco dizendo que estamos igual a Pokémon, evoluindo sempre. Com esse diploma, identifico problemas na minha comunidade e os levo até a entidade responsável. Além do mais, o conhecimento obtido no curso tem me ajudado na busca pelos direitos dos atingidos. Como diz o lema das Promotoras Populares: Arte “mulher bonita é mulher : Silm ara F ilgue que luta!”. iras

Mônica Santos, 32 anos, atingida de Bento Rodrigues

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Luzia Queiroz, 54 anos, atingida de Paracatu

O preconceito com as mulheres ainda é grande. Acham que não entendemos as coisas. Pensam que somos mais delicadas, que não temos força para lutar. No meu caso, é bem ao contrário. Brigo o tempo todo. Concilio meu tempo com serviço, aula e reunião dos atingidos. Sou da Comissão dos Atingidos de Bento Rodrigues. Promovo o diálogo entre a comunidade e a Samarco. Além disso, trabalho como auxiliar odontológico e faço faculdade de Direito. A partir do rompimento, com 32 anos, quis voltar a estudar. Chego do serviço e vou para a aula. Estou, há alguns dias, sem ter tempo para lavar meu cabelo, mas não desisto da Universidade. Acredito que o curso me ajudará a compreender quais são nossos direitos e deveres. Se a mulher soubesse a força que tem, as coisas seriam diferentes. Precisamos ser mais unidas. Foi a Cláudia Alves, uma amiga de Bento, quem me incentivou a entrar para a Comissão. Já a Aninha do cartório vivia me dizendo que eu deveria me matricular em Direito.

Fotos: Daniela Felix Sou a primeira da família a cursar o Ensino Superior. Quem disse que mulher é sexo frágil? Aqui na cidade a gente não pode fazer barulho, mas quando fui aprovada no vestibular, eu e minha mãe gritamos mesmo assim. Desde o rompimento da barragem, tomei a responsabilidade de participar das reuniões com os atingidos, para garantir os direitos da minha família. Ao entrar para o Movimento dos Atingidos por Barragens, descobri o poder que essas empresas têm. Vi que esses crimes não acontecem só aqui. Se a gente não se organizar e lutar, não vamos conseguir nossos direitos. Uma vez, durante um ato de mobilização em Acaiaca, me mandaram pegar uma enxada e capinar. Respondi que era exatamente o que gostaria de estar fazendo, mas que a Samarco tirou isso de mim. Quando resolver nossa situação aqui, quero ajudar os atingidos de outros lugares. Mirella Sant-ana, 19 anos, atingida de Ponte do Gama


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Nossa memória, nosso patrimônio

Diagramação: Carlos Paranhos

Por Kleverson Lima e Lucimar Muniz Artesanato produzido por Seu José Jair, morador de Ponte do Gama

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Devoções à Nossa Senhora das Graças e São Vicente de Paulo

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Festa de Santa Cruz - celebrada no mês de maio nas diversas comunidades atingidas

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Seu Valdir - Produtor rural

O Rio Gualaxo do Norte é o personagem natural central que corta o território atingido pelo rejeito da Samarco em Mariana. Em suas margens, nos córregos que o alimentam, e nos morros próximos, estabeleceram-se, nos últimos três séculos, modos de vida assentados em diferentes atividades econômicas, como a agropecuária e a exploração do ouro e do minério de ferro. Foi em meio a esse processo que se formaram e permaneceram ativos os povoados de Camargos, Bento Rodrigues, Bicas, Gama, Paracatu de Cima, Paracatu de Baixo, Borba, Pedras e Campinas. Pouco se sabe sobre a história dessa região e sobre os bens culturais que possuem importância para os seus moradores, como as festas religiosas, os lugares de lazer, a prática artesanal e as ruínas que ainda registram um pouco da vida do passado. O diagnóstico que está sendo produzido para a Comissão dos Atingidos começará a lançar luzes sobre esse assunto. As informações que serão analisadas pela equipe contratada contribuirão para estabelecer as futuras diretrizes de reparação dos danos causados pela Samarco e nos ajudarão a compreender melhor o processo de reassentamento das famílias e de reconstrução dos seus modos de vida nesses novos lugares.


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Um passeio em Camargos Fotos: Larissa Helena

Por Nós, Atingidos de Camargos, Larissa Helena e Wandeir Campos

Dona Efigênia e seus irmãos

Dona Madalena e Seu Ênio

Camargos fica a cerca de 19 quilômetros da sede de Mariana, dez deles percorridos em estrada de terra. Até o rompimento, o caminho - parte da Estrada Real - seguia para Bento Rodrigues, Santa Rita, Santa Bárbara e Catas Altas. Hoje, a rota está interditada, já que, a poucos quilômetros à frente do povoado, uma ponte foi levada pela lama. Já se passaram um ano e sete meses desde o rompimento e, até hoje, as obras de reconstrução não foram iniciadas. Questionada pelo Jornal A SIRENE, a Fundação Renova/Samarco informou que a previsão é que o trabalho seja realizado até outubro deste ano. O reerguimento da ponte é importante

para o fluxo de turistas na região, em geral, pessoas interessadas nas festas religiosas, na tranquilidade da vida rural e no ecoturismo. Camargos é um típico vilarejo mineiro. Quem passa por lá, pode comer um queijo fresquinho fabricado na Fazenda do Tesoureiro, provar o doce de leite no tacho servido na Fazenda da Palha, almoçar a comida preparada no fogão à lenha de Silvana. Quem passar por Camargos e quiser parar um pouquinho, pode descansar na acolhedora pousada de Dona Cota e Seu Darío. E, assim que a noite começa, logo ali do lado, o Bar do Ênio abre sua janela para a comunidade. Quem passa por Camargos pode ver, lá no alto do morro gramado, uma linda igreja, hoje, em reforma. Nessa época do ano, as portas das casas se colorem com cruzes floridas - uma das muitas artes de Dona Zezé - que decoram o distrito para a Festa de Santa Cruz. Camargos é Minas em forma de vilarejo. Um par de ruas onde a riqueza de uma vida simples encontra a beleza de uma gente receptiva. E que volte a ponte: para que mais gente possa, por Camargos, passar.

Tatiane

Dona Zezé e Seu João

Silvana

Dona Cota e Seu Darío


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A SIRENE

Junho de 2017 Mariana - MG

PARA NÃO ESQUECER

Em memória dos que se foram

Foto: Daniela Felix

Em Paracatu, era costume realizar o velório de parentes e amigos dentro das casas dos próprios moradores. Em seguida, os corpos eram sepultados no cemitério da comunidade, localizado em terras cedidas por um morador local. A limpeza, a manutenção e todos os cuidados com o espaço eram feitos coletivamente. Agora, mesmo que o cemitério não tenha sido atingido pela lama, a comunidade tem dificuldades para visitar o local com a mesma frequência de antes. E ainda enfrenta a tarefa de encontrar, provisoriamente, um lugar para as despedidas. Por Marino Dangelo Junior e Romeu Geraldo de Oliveira Com apoio de Carlos Paranhos e Lucimar Muniz

Lá é um cemitério comunitário, nós mesmos limpávamos e reparávamos tudo. Ultimamente, o acesso está mais complicado porque o morro que dá acesso é muito íngreme e pouquíssimas pessoas estão indo cuidar dele. A Samarco ficou de fazer a limpeza, mas pelo que eu escuto, isso não está acontecendo. O cemitério está ficando sujo e sem os cuidados necessários. A comunidade começa uma nova discussão também sobre o local de velamento. Antes, ele era realizado na casa dos falecidos, mas agora não é possível. Já foi discutido que ele ocorresse na Igreja Santo Antônio ou na Capela São Vicente, mas ainda não temos respostas. É muito triste porque eu tenho uma filha enterrada lá, neste cemitério que necessita de atenção. Quando a gente tem um parente enterrado numa terra, aquele lugar passa a ter um significado muito grande. Marino Dangelo Junior, 48

Há algum tempo, nós, atingidos de Paracatu, estamos reivindicando à Fundação Renova/Samarco um espaço para velar os corpos de nossos familiares, amigos e conhecidos. Hoje em dia, por exemplo, se um atingido morre, o corpo é velado em Águas Claras, só depois retorna a Paracatu para ser enterrado. O justo seria velar na Igreja de Santo Antônio, atingida pela lama, mas ela não se encontra em condições adequadas. Queríamos apenas que os órgãos responsáveis deixassem a igreja em estado apropriado para o uso, não precisaria nem estar toda restaurada. Já tentamos conversar com o pessoal do cemitério Santana, mas eles ficam com o pé atrás, acho que é porque somos da roça, sei lá. O povo de Paracatu continuará lutando. Os mortos também merecem respeito. Romeu Geraldo de Oliveira, 42

Bento Rodrigues Na comunidade de Bento Rodrigues, as questões em relação ao uso do cemitério de Nossa Senhora das Mercês surgiram com o impedimento de visitação aos túmulos, colocado pela Defesa Civil como medida de segurança logo após o rompimento da barragem. Também era de grande desejo da comunidade enterrar os entes no local de origem. Depois do primeiro óbito, ocorrido em fevereiro de 2016, esse desejo ficou ainda mais forte. Na época, ainda não existia um planejamento para que os sepultamentos voltassem a acontecer na comunidade. O primeiro enterro em Bento, depois da lama, aconteceu em junho de 2016. Depois disso, mais dois atingidos foram sepultados no local. Mesmo assim, permanecem as cobranças para que se faça a manutenção adequada do espaço.


A SIRENE

Junho de 2017 Mariana - MG

PARA NÃO ESQUECER

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AGENDA DE JUNHO 5 Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

12 Reunião Reunião interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

20

6 Reunião de preparação de discussões do Cadastro Horário: 9h Local: Escritório de Assessoria ao Ministério Público

13 Reunião de preparação de discussões do Cadastro Horário: 9h Local: Escritório de Assessoria ao Ministério Público

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Audiência Pública de avaliação das ações da Fundação Renova Horário: 18h Local: Centro de Convenções

Reunião interna da Comissão dos AtingidosHorário: Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

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28

Reunião de preparação de discussões do Cadastro Horário: 9h Local: Escritório de Assessoria ao Ministério Público

7

Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos Reunião de discussão do Cadastro Horário: 9h Local: Centro de Pastoral

13 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu

Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos Festa de Santo Antônio Local: Paracatu

Convite especial:

Reunião de discussão do Cadastro Horário: 9h Local: Centro de Pastoral

29 Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos

Observações: *Agenda sujeita a alterações

7 Reunião da Comunidade de Pedras com a Fundação Renova (GT de Pedras) Horário: 18h Local: Escola de Pedras

20 Reunião de preparação de discussões do Cadastro Horário: 9h Local: Escritório de Assessoria ao Ministério Público


Editorial Dia 5 de junho é o Dia Mundial do Meio Ambiente. Queríamos comemorar essa data que é tão importante pra nós, que vivíamos na roça, mas dá tristeza só de pensar que não temos quem nos ajude a cuidar deste bem precioso. Assim como nós, a natureza, também atingida, sofre com o descaso das empresas responsáveis pelo maior crime socioambiental da história do país. Segundo especialistas, a recuperação do meio ambiente não está sendo feita da forma certa. Tem muita coisa errada e ninguém toma providência. E isso tudo acontece porque a Samarco se preocupa mais com sua propaganda do que com a reparação dos direitos violados. Qualquer um que acompanha o dia a dia da tragédia, percebe que a chamada Fundação Renova só atua para reparar os danos que o rompimento causou à imagem das mineradoras. Nesta edição, expomos, mais uma vez, os descasos e a falta de respeito com os atingidos. Até este mês, já contamos mais de 50 casos de ação emergencial envolvendo atingidos não reconhecidos pela empresa. Em Barretos - distrito de Barra Longa, próximo à Mariana -, a comunidade sofre com a falta de assistência por parte da Renova/Samarco e com o empurra-empurra entre municípios. Também em Barra Longa, famílias que moravam no Parque de Exposição - lugar onde cultivavam a terra e criavam seus bichos - são obrigadas a sair de suas casas para dar lugar ao rejeito de lama. Tem comunidades, como Paracatu, que velavam seus entes queridos nas casas dos moradores, mas que, com a destruição, inclusive da igreja, não têm mais onde realizar essas cerimônias. Essas são algumas das muitas situações com as quais lidamos todos os dias, sem sermos acompanhados por nossos governantes. Em Mariana, estamos passando por uma situação difícil, na qual vereadores mostram-se completamente desinformados em relação aos trabalhos desenvolvidos pelos atingidos da cidade. O poder público municipal deveria estar atento às dificuldades que enfrentamos para conquistar nosso reassentamento e uma indenização justa, mas não é o que acontece. Ainda bem que, por causa dessas injustiças, estamos vendo nascer guerreiros. A SIRENE traz também nosso trabalho duro em torno da reelaboração do Cadastro e a braveza de mulheres envolvidas na luta pela garantia dos direitos que nos foram tomados. Assim como a árvore Gameleira que a lama não conseguiu levar, nossas raízes são profundas e firmes. Aprender a ser atingido envolve nos reconhecermos como cidadãos, como sujeitos de direitos, como pessoas dotadas de uma dignidade que empresa nenhuma há de transformar em lama.


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