A SIRENE PARA NÃO ESQUECER | Edição 9 - Dezembro de 2016
“-Dis que ês da Samarco tá arrumano tudo: as casa, as rua, até a praça. - A praça ficô muito bunita, tem uma grade de sigurança que parece escada pra minin subi, a grama ficou verdinha cum a tinta quês passou, até os cachorro que rolô na grama fico verdin, é pena que ês num pintô o rio, também ia ficá bunitu.” Papo de cumadres Foto: Larissa Helena
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Dezembro de 2016 Mariana - MG
PARA NÃO ESQUECER
Editorial
O ano de 2016 está chegando ao fim. Um ano bem atípico para todos os atingidos pelo rompimento da Barragem. O último A Sirene deste ano traz temas presentes desde o início da nossa luta. Insistimos em não deixar esquecer a nossa história, resgatar nossas tradições, festas e costumes. Mas, muita coisa mudou. Agora precisamos entender o processo que estamos vivendo durante a reconstrução. Buscar mais informações sobre a assessoria técnica é uma forma de atuarmos nesse sentido da nossa história. O alento que buscamos com as idas a Bento Rodrigues continua sendo um caminho difícil, mas não desistimos. Juntos, nós, moradores, passamos uma noite no lugar em que nascemos, em outro momento fomos consertar a ponte que por anos foi a nossa passagem para chegar em casa. Uma forma de continuar com o cuidado e respeito que sempre tivemos com a nossa terra. No Papo de Cumadres regis-
tramos todas as incertezas, inseguranças, doenças que estão presentes em nosso cotidiano e destacamos que nada é tão fácil e belo como a propaganda oficial insiste em mostrar. A maquiagem foi colocada em todos os lugares e se tornou uma outra grande preocupação em nossa luta. Neste mês em que preparamos o Natal, histórias como o último casamento ocorrido em Paracatu e o Álbum de família, homenageiam as famílias que moravam próximas umas das outras e que durante esse ano, viveram separadas. O jornal A Sirene é feito com a participação de todos os atingidos e queremos que em 2017 essa integração se amplie; aqui é o espaço para deixarem sugestões de pautas, críticas, dúvidas, informações e elogios para seguirmos sempre firmes em busca de mais justiça. Desejamos que esse Natal seja repleto de verdadeiros sentimentos e que fortaleça a união entre todos os indivíduos.
Erramos Na edição número 8, o jornal A Sirene errou. Na matéria “Direito de entender: policard”, localizada na página 25, não esclarecemos que a fonte de informações foi o Ministério Público de Minas Gerais - 2ª Promotoria de Justiça de Mariana. Nós pedimos desculpas a instituição e reiteramos que vocês, leitores, nos ajudem a corrigir nossos erros escrevendo para a seção “Espaço dos leitores”, através do endereço de e-mail: jornalasirene@gmail.com
Charge
AVISO Não assine nada: • Se tiver dúvidas sobre o conteúdo; • Se precisar de ajuda de um advogado ou qualquer outro especialista; • Se alguém disser que “todo mundo já assinou, só falta você”; • Se você quiser consultar algum familiar antes; • Se alguém disser que “se não assinar, não terá mais direito”.
Atenção! Se alguém tentar fazer você assinar qualquer coisa, procure o Ministério Público ou a Comissão dos Atingidos. O tempo para analisar e questionar qualquer documento é seu!
Leve essa mensagem a todos todos os outros atingidos
Expediente Realização: Atingidos pela Barragem de Fundão, Arquidiocese de Mariana, Projeto de Extensão A Sirene e o Direito à Comunicação dos Atingidos pela Lama (Curso de Jornalismo/ICSA/UFOP) e Um Minuto de Sirene | Conselho Editorial: Milton Sena (Editor Chefe), Ana Elisa Novais, Antonio Santos, Cristiano José Sales, Fernanda Tropia, Genival Pascoal, Lucimar Muniz, Manoel Marcos Muniz, Mônica dos Santos, Pe. Geraldo Martins, Rodolfo Meirel, Sérgio Papagaio, Silvany Diniz, Simone Maria da Silva e Thiago Alves | Diagramação: Silmara Filgueiras (Editora) | Fotografia: Rodolfo Meirel (Editor) | Apoio: Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e MICA/Brazil Foundation (Carlos Paranhos, Caroline Hardt, Daniela Felix, Flávio Ribeiro, Genival Pascoal, Larissa Helena, Miriã Bonifácio e Wandeir Campos) | Revisão: Ana Elisa Novais, Elke Pena, Plínio Carvalho e Rivania Trotta | Agradecimentos: Daniel Iglesias (Coletivo Erro 99), Duke (autor da charge) e Guilherme de Sá Meneghin | Impressão: Sempre Editora | Tiragem: 2.000 exemplares | Fonte de recurso: Termo de ajustamento de conduta entre Arquidiocesse de Mariana e Ministerio Publico de Minas Gerais (2ª Promotoria de Justica de Mariana).
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Declaração de amor a Paracatu
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Fotos: Caroline Hardt
Por Angélica Peixoto Com o apoio de Fernanda Tropia
O amor a Paracatu de Baixo levou uma parte de seus moradores ao subdistrito no dia 5 de novembro de 2016, um ano do rompimento da barragem de Fundão. Todos demonstravam muita saudade, algumas pessoas emocionadas choravam e crianças de expressões tristonhas acompanhavam seus pais. Luciene Gonçalves afirmou: “não deixaria de vir. Paracatu pode ser esquecido por todo mundo, mas eu não esqueço dele nunca.” Os moradores levaram cartazes, velas e flores, e rezaram o terço ao lado da igreja de Santo Antônio, que estava isolada por metalão. Assim mantiveram a tradição de décadas: fazer orações unidos para pedir a Deus ajuda nos problemas de difícil solução. Segundo Claudiane, “a situação que estamos vivendo é muito complicada. Só com deus vamos conseguir superar.” E apontou para as ruínas à sua frente. Em alguns cartazes, podiam-se ler frases como: “Eu amo Paracatu” (E. 15 anos) “Paracatu é nosso amor”. É nosso lar. (E. 10 anos) “Paracatu, nós amamos você, como você ama a gente”. Vamos lutar para te ter de volta. (J. 10 anos). “Morar em Paracatu era bom demais.” E, claro, não faltaram os protestos e as manifestações de inconformismo e de tristeza por tudo o que aconteceu. Algumas moradoras aproveitaram o momento para chamar todos para lutar pelo reassentamento. De acordo com Daniel, morador de Paracatu, “o apoio de todos é muito importante, juntos somos mais. Ninguém vai fazer por nós o que nos cabe. Quando as pessoas se unem em defesa do bem comum, as chances de vitória são maiores.” Ao final, rezaram a oração do Pai Nosso de mãos dadas, simbolizando a união e participação de cada presente.
O dia 5 de novembro em Paracatu refletiu o espírito de união da comunidade "mexeu com um, mexeu com todos"
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Gesteira ainda espera
Fotos: Simone Silva
Por Eva Cristina da Silva Costa e Simone Silva Com o apoio de Carlos Paranhos
9 famílias de Gesteira, pequeno distrito de Barra Longa, irão ter uma nova chance de conquistar um lar digno e recomeçar. O local foi eleito pelos próprios atingidos e pelo Ministério Público Estadual durante uma votação democrática, onde 95% escolheram as terras de Macacos, que ficam localizadas na quadra central do distrito. O que parecia ser uma decisão certeira e concreta, é, na verdade, uma grande incerteza. No dia 16 de novembro, todos os interessados se reuniram em uma assembleia comunitária na esperança de sair com uma resposta definitiva sobre a
Comunidade ainda não conhece seu futuro depois da lama.
posse do terreno, mas isto não aconteceu. Ainda há incerteza sobre o futuro deste terreno e sobre qual o planejamento da empresa para reparar os atingidos dessa região. As consequências Minha mãe, Dona Maria Geralda Pinto, moradora de Gesteira, está atualmente com 78 anos e um pouco frágil devido a um ataque recente de pneumonia. Além de ter que resolver assunto ligados à saúde , ela está morando em uma residência, em Barra Longa, com o aluguel atrasado há mais de quatro meses. Na procura de justificativas, ouvi da
Ao fundo, casa de Dona Maria Geralda Pinto totalmente destruída.
mineradora Samarco que a responsável por essa prestação de contas seria a recém-criada Fundação Renova – que pertence justamente à Samarco. Nada ainda foi feito. O contrato da casa venceu no último mês de novembro, os proprietários do imóvel, obviamente, não querem renová-lo. O mais lamentável desta situação é ver uma empresa do porte da Samarco, cujo lucro do ano passado foi de mais de 6 bilhões de reais, deixar uma senhora de 78 anos passar por essa humilhação. Infelizmente minha mãe e os atingidos que tiveram que abandonar o distrito não são os únicos que passam por duros “perrengues”. Para quem conhece Gesteira, sabe que ele é divido em duas partes: uma alta e outra baixa. A parte baixa foi destruída pela lama, e nós já
sabemos de toda a fatalidade que ocorreu depois, mas a parte alta permaneceu intacta, tanto que os moradores dessa área ainda residem lá. Como o encanamento do lugar também está devastado, foi feito às pressas um plano cartesiano muito mal colocado para ligar os canos das casas até o rio, que, obviamente, encontra-se contaminado pelos rejeitos cheios de minerais pesados. Como consequência, todos estão tendo diarreia e mal-estar constante. Mais uma vez vemos a inadimplência dos responsáveis. No meio de toda essa incerteza, os atingidos de Gesteira não sabem onde serão construídas suas novas casas e estão adoecendo por conta da lama. Novas assembleias foram marcadas para decidir o futuro do vilarejo. Quantas mais serão necessárias?
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Meu acesso é controlado Por Mônica Santos Com o apoio de Larissa Helena, Miriã Bonifácio e Wandeir Lucas
Tudo aconteceu quando fomos realizar a missa de finados na igreja de Nossa Senhora das Mercês, em Bento Rodrigues. Estava marcado para chegarmos cedo e fazermos a arrumação da igreja. Sim, nos preocupamos em arrumar a nossa igreja. Levar os panos, os arranjos, enfeitar o altar. Cheguei por volta de oito e meia da manhã e me deparei com o portão trancado. Por que ainda estava trancado? Dois cadeados grandes em uma porta, outro na segunda entrada. Vários "seguranças" parados. Perguntei: - “Quem está com a chave?” - "Ninguém", responderam Fui até a praça e liguei para um funcionário da Samarco. - Por que trancaram? Precisamos organizar a igreja, não vai dar tempo. Voltamos e resolvemos arrombar os cadeados, soltar as trancas e realizar aquilo que planejamos fazer. - “Vamos arrombar o portão que só tem um cadeado, é mais fácil”, disseram. Ainda tinha os cadeados dos portões os tapumes. Com uma chave de roda em mãos, arrebentamos o cadeado e entramos. Tivemos que tirar os tapumes em frente a igreja para finalmente conseguir ter acesso. Pouco tempo depois a chave dos cadeados apareceu, eles trouxeram. - Mas já está quase na hora a missa! Por que demoraram? Por que ninguém apareceu? - Sempre tentam dificultar a nossa entrada, mas até agora não desistimos e não vamos desistir. - De quem é o Bento? Para que ele serve agora? - “Serve para isso, para resistir”, respondi
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Fotos: Cristiano Sales
A nossa Ponte
Estamos juntos, estamos vivos, estamos fortes e somos muitos, e somos loucos, loucos pelo Bento. Com o trânsito de caminhões pesados prestando serviços para a Samarco, foi bem danificada a ponte de madeira que dá acesso a nosso querido Bento. Em uma das reuniões, solicitamos a empresa que a consertasse, principalmente porque estava aproximando o dia de finados e o dia 5 de novembro, nos quais o local receberia muitas pessoas. Representantes da empresa pediram 60 dias para fazer o serviço. Pedi ajuda do prefeito, mas não fui atendida. Nosso amigo da guarda, Dr. Guilherme, no dia seguinte foi até o local para ver o que podia ser feito. Mas achamos que já estava muito em cima
da hora, apenas mais um final de semana. Resolvemos então juntar dois "loucos" e ir no domingo, nós mesmos, arrumar a ponte. Outros apareceram para ajudar! Levamos as ferramentas que tínhamos, porém precisávamos de um serrote. Foi quando parou uma van e desceu um casal. Eles não só tinham o serrote, mas também uma furadeira e resolveram nos ajudar. Deus sempre coloca pessoas boas e anjos em nossas vidas. Esse dia foi mais uma prova do que somos capazes. Ele foi resumido em palavras pelos loucos: perfeição; satisfação; companheirismo; união; perseverança; força; brincadeira.
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Dezembro de 2016 Mariana - MG Fotos: Daniel Iglesias (Erro 99)
O dia em que dormimos no Bento de novo Por Maria das Graças Quintão Santos Com o apoio de Mônica Santos
Dormimos no Bento dia 22 de outubro de 2016. Foi uma noite inesquecível.
A ideia de dormir em Bento surgiu de um desejo enorme da Mônica, que sempre falava que queria passar a noite no local onde era o seu quarto. Até que um dia, em uma de nossas inúmeras visitas, ela falou e todo o grupo de loucos topou. Então marcamos. Porém, no dia combinado perdemos o Senhor Henrique. Decidimos então, adiar para o final de semana seguinte. E lá se foi mais uma semana de ansiedade e espera. Apesar de ter chovido durante o dia, tivemos uma noite maravilhosa. Chegamos em Bento às 17 horas, montamos nossas barracas, acendeUma noite para pensar na importância de ocupar aquilo que é nosso.
mos a churrasqueira, fizemos uma roda de conversa e ficamos até de madrugada. Antes da meia noite caminhamos até as ruínas da Igreja de São Bento e pedimos proteção e força para prosseguirmos com a nossa luta. Cantamos, soltamos fogos de artifício, bebemos, comemos e conversamos até o dia amanhecer. Éramos 15 moradores e outros oito visitantes que nos acompanhavam. Apesar de alguns imprevistos e parecer que tudo conspirava contra a nossa ida, fomos e fizemos o que queríamos, com a certeza de que não será só essa vez, e que virão outras e mais outras. Porque a "Força do povo vem da Fé".
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De atingido virei réu Por Manoel Marcos Muniz Com o apoio de Miriã Bonifácio e Rodolfo Meirel
Sou atingido e também sou réu. Junto com o meu irmão enfrento um processo movido pela empresa que nos tornou réu. A ação é sobre a não autorização formal para fazer sondagens em nosso terreno. No dia 02 de agosto de 2016, a mineradora enviou duas notificações contendo 67 páginas cada, alegando que era para proteger direitos e preservar responsabilidades, a notificação diz ainda que, caso não haja oposição formal em 48 horas os estudos de sondagem na área iniciariam, mas sequer se prestou a explicar do que se tratava. Diante de tantas dúvidas e insegurança sobre os nossos direitos e propriedades dissemos não. Outros dois irmãos e herdeiros não disseram nada, não tiveram tempo hábil para tal. Já outros 4 irmãos, sob diferentes circunstâncias, disseram sim. Porém, sem a aprovação de todos ela não poderia entrar no terreno para fazer a sondagem. Para reverter isso, resolveu nos processar. Ajuizou uma ação na justiça comum, com pedido de tutela de urgência, com o objetivo de conseguir o que tanto queria. Nesse processo, já tive que perder tempo lendo, pagar autenticação com o dinheiro do meu bolso, o único que tinha no momento, e tantas outras consequências que isso me acarretou. Não há pena no final desse processo, mesmo assim já me
Fotos: Daniela Felix
sinto condenado. Por encarar tudo isso, e ainda por cima não ter os meus direitos plenamente reconhecidos. Com a autorização do governo do estado de Minas Gerais, a empresa pôde não só fazer tais sondagens, como começar a obra do dique S4 em nosso lar. Não só o meu ou da minha família, mas o lar de outras tantas famílias que moravam, amavam e protegiam Bento Rodrigues.
Quando me perguntam o porque eu não autorizei eu respondo: entre o dinheiro ou o alagamento, eu fico com as memórias. Não sou contra a volta da Samarco, trabalhei lá durante 29 anos e 10 meses. Muito do que conquistei e que depois, ironicamente, perdi foi com o suor do meu trabalho na empresa. Entendo que a juventude está aí e precisa de emprego e oportunidade. Mas também entendo que é preciso ter justiça e respeito pelas memórias de uma vida inteira. Pela casa que meu pai construiu e viveu, pelos meus objetivos da aposentadoria, de criar meus animais e vender o que produzia ali, por aquilo que dinheiro nenhum pode comprar e que medida nenhuma vai conseguir devolver. De atingido, virei réu!
Ainda aguardo determinações sobre os meus direitos de indenização
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Família Gonçalves Por Luzia Queiroz (atingida de Paracatu) Com o apoio de Wandeir Campos e Larissa Helena
Dona Efigênia nasceu em Gesteira e aos 19 anos casou-se com Sr. Mário, em setembro de 1956. Logo se mudaram para Paracatu de Baixo , onde tiveram oito filhos e ficaram casados por 50 anos. Após a tragédia, ela foi obrigada a se mudar para a sede em Mariana, uma vez que sua casa e comunidade foram totalmente destruídas pela lama da barragem. Para que a memória familiar também não se apague é preciso remontar alguns álbuns de família...
Retrato de D. E
figênia e Sr. M
ário
“Para que a memória familiar também não se apague é preciso remontar alguns álbuns de família...”
Família é onde nossa história começa. Dona Efigênia e duas de suas netas.
sa : L aris Fotos
a
Helen
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Sr. Mário & Dona Efigênia A. G
Ce.
Im.
M. J
Dc.
4 filhos
5 filhos
1 filho
N. C
2 filhos
1 filho
2 filhos 1 filho
1 filho
2 filhos 3 filho
1 filho
J. G
2 filhos 1 filho
1 filho
1 filho
+
1 filho
J.B
4 filhos
1 filho 2 filhos
2 filhos
2 filhos
A representação em formato de árvore genealógica simboliza a família Gonçalves, partindo da união do Sr. Mário com a D. Efigênia até os seus bisnetos.
4 filhos
1 filho
Fotos: Arquivo da família
Última vez que a família inteira se reuniu em Paracatu, na foto está Dona Efigênia com seus filhos, netos e bisnetos. D. Efigênia com seus filhos.
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Era uma vez Por Angélica Peixoto Com o apoio de Fernanda Tropia
Era uma vez uma comunidade com o nome de Paracatu. Lá não era o lugar mais bonito do mundo, mas tinha muitas árvores, flores e uma cachoeira onde todos que quisessem poderiam se refrescar em suas águas. Castelo também não havia. Suas casas simples, porém aconchegantes, eram chamadas de lar. Príncipes e princesas? Longe disso. As pessoas, os moradores eram bem comuns e reais, com defeitos e qualidades como os de qualquer ser humano. Era uma comunidade cheia de desafios como outras tantas por aí. Um belo dia, belo mesmo, o sol brilhava num céu azul, a barragem
de Fundão arrebentou, despejando milhares de metros cúbicos de rejeito de mineração e destruiu a comunidade.
Todos os moradores foram para a cidade sede, chamada Mariana e... Viveram felizes para sempre! Felizes para sempre? Algumas pessoas afirmam que os atingidos estão “numa boa”, “nadando em dinheiro”, tem muito mais que tinham, “do bom e do melhor”. Uma maravilha! Esse é o grande equívoco
da história. Todos os atingidos são julgados por critérios baseados na falta de informação, portanto, carregados de preconceito. Falta a quem pensa assim conhecimento, reflexão e fundamento sobre a real situação de muitos atingidos. Isso leva a atitudes de rejeição, intolerância, suspeita e má vontade gratuita contra pessoas que só querem suas vidas de volta. Assim, questões como cartão alimentação, pagamentos de aluguéis, antecipação de indenização tornam-se mais importantes que os problemas enfrentados e são polemizados de forma desumana , que rotula, classifica , desrespeita e Foto: Daniela Felix
Apresentação do Teatro de Bonecos no último dia 5 de Novembro em Mariana.
exclui. Nossas crianças são chamadas de pé de lama. Idosos sentem-se rejeitados. O mais triste é ouvir que a lama deveria ter chegado à noite e matado todo mundo. Até quando será ignorado o sofrimento das pessoas que não se conformam com uma situação imposta pelas circunstâncias? É preciso compreender que cada um reagiu à tragédia de acordo com sua concepção. Uma comunidade não é feita de pessoas iguais com a mesma filosofia de vida. As diferenças determinam as ações. O razoável para alguém nem sempre é para todos. Paracatu foi devastado pela lama. A maioria das casas virou escombros, tudo o que havia nelas foi destruído. Para alguns, não sobrou uma foto sequer. Perdemos nossa identidade, nossa história, nosso sentimento de pertencimento. Para entender o processo complexo pelo qual estamos passando, é necessário deixar o preconceito de lado e fazer o exercício de se colocar no lugar do outro. Com clareza de que as pessoas são diferentes e únicas, compreendendo-as sem fazer pré-julgamentos. Antes de sermos atingidos, somos indivíduos com emoções e sentimentos. Com os mesmos problemas inerentes à humanidade. Reflita: você trocaria de lugar conosco?
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Atingidos: figurantes em sua própria história Por Sérgio Papagaio
Cinco de novembro de dois mil e quinze: iniciou-se o rompimento de uma barragem que sangra até hoje. Mas a lama desse rompimento vem atingindo, gradativamente, dia após dia, os cidadãos das comunidades afetadas: com negativa de direitos, descaso, mentiras, falta de compromisso, inversão de valores e acordos feitos às escuras com políticos. Sem que o atingido tome sequer conhecimento do que será o destino da sua vida doravante. O dique está sendo construído em Bento sem o consentimento dos herdeiros das terras, mas com o aval do Estado. Essa barragem que ainda sangra, faz sangrar também o povo de Bento, senão pela invasão de suas terras, pela destruição de suas memórias; com o alagamento da área atingida
que hoje foi surrupiada pelo carrasco. Sobre o dique que querem construir em Barra Longa, no rio Gualaxo do Norte, a decisão de sua construção também foi feita sem a participação dos barra-longuenses, assim como aconteceu em Mariana. Em Barra Longa, parte do rejeito foi depositado no parque de exposições da cidade. Segundo o engenheiro Claudio Siqueira, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, essa foi uma medida emergencial para liberar a praça Manoel Lino Mol, entregue à população onze meses e vinte e três dias após o rompimento da barragem, no dia 30 de outubro último. A lama que está depositada no parque de exposições hoje está próxima a nove casas que, até então, não tinham sido atingidas. Nesse cenário, será usada para alte-
ar o campo de futebol do Rodoviário Esporte Clube. Alteamento anunciado também arbitrariamente, sem consulta prévia à população. Até quando nós, os atingidos, seremos figurantes em nossa própria história? O sangramento da barragem vem dando pernas às doenças e, consequentemente, VIDA À MORTE que precocemente vem carregando os atingidos para o fim de sua própria história: pela crescente negativa de direitos, pela incerteza de seu futuro, ou pelo medo da barragem de Germano se romper. O homem morre dentro de si mesmo. Essa, posso afirmar, é a mais dolorosa de todas as mortes. A que o homem carrega dentro de si enquanto vive! Por isto, volto a perguntar: até quando seremos figurantes no show da Samarco? Foto: Larissa Helena
A peça abordou a representação do que é viver como atingindo, enfrentando preconceitos.
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Como está funcionando a Assessoria Técnica? Por Equipe Cáritas Brasileira - Regional Minas Gerais
Fotos: Daniela Felix
Reunião com a comunidade de Paracata para levantamento de expectativas de reconstrução no novo local.
Desde o dia 24 de outubro, a equipe da Assessoria Técnica, de confiança dos atingidos e atingidas, começou os trabalhos. Nesse período inicial, a equipe multidisciplinar para assessoramento técnico aos atingidos tem se inserido e acompanhado juntamente com a Comissão dos Atingidos os espaços representativos e deliberativos legitimados perante a comunidade, como as Reuniões dos Grupos de Trabalhos de Bento Rodrigues, Pedras e Paracatu, assim como, as reuniões internas da Comissão dos atingidos e reuniões públicas gerais dos atingidos de Mariana com o Ministério Público Estadual e a Samarco. Os trabalhos de assessoramento técnico aos atingidos são coordenados pela Cáritas Brasileira, instituição com experiência internacional, indicada pelo Ministério Público para monitorar as ações de reparação aos atingidos feitas pela Samarco e propor formas de garantir os direitos
Onde encontrar?
dos atingidos. De acordo com a Ação Civil Pública, de 10 de dezembro de 2015, escrita pelos promotores de justiça, é reivindicado uma assessoria que forneça aos atingidos elementos técnicos capazes de lhes dar segurança nos processos decisórios. O principal objetivo da equipe é garantir a ampla informação e participação em tais processos, e auxiliar na busca pela ampla reparação de perdas e danos sofrido pelas famílias que tiveram seus direitos violados. Dessa forma, inicialmente a equipe Cáritas tem se empenhado no estudo crítico do cadastro das famílias atingidas, apresentado pela Synergia/Fundação Renova, instituições contratadas e fundadas respectivamente pela Samarco. A análise do cadastro pela equipe técnica da Cáritas está sendo feita com o objetivo de assegurar que este cadastro contemple as reais perdas e danos adequados as diferentes realidades dos atingidos do município de Mariana
O escritório é um ponto de referência da Assessoria Técnica e está localizado na Rua Santana nº 140, Centro, Telefone: 3557-2488. Horários de funcionamento: de segunda a sexta das 8h às 12h e 14h às 18h e aos sábados das 8h às 12h. As principais orientações e ações para garantia dos direitos acontecerão em reuniões da assessoria com os atingidos, na cidade e na zona rural.
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O último casamento em Paracatu
Foto: Larissa Helena
Karine se casou na igreja de Paracatu de Baixo em setembro de 2015, nove dias antes da tragédia, sendo a última noiva a se casar no distrito que foi arrasado pela lama. Conseguiu resgatar poucos presentes recebidos no dia da cerimônia. Hoje, ela vive em Mariana com o marido e não recebe nenhum auxílio da Samarco.
Por Karine Gonçalves Com o apoio de Larissa Helena,Luzia Queiroz e Wandeir Campos
Olá, meu nome é Karine de Fátima da Silva Gonçalves, tenho 23 anos, sou casada com Moisés das Graças Gonçalves, somos filhos de pais que foram nascidos e criados em Paracatu de Baixo. Nos casamos no dia 26 de setembro de 2015, um dia mais que especial, porque foi na igreja que queríamos e tinha tudo de nós. Foi um casamento programado, do jeito que imaginávamos. Com o padre perfeito, uma bênção de casamento esperado por todos que ali viviam. Um lugar pequeno, simples, mas cheio de esperança. Não tinha como expressar tamanha a nossa felicidade, dos padrinhos, amigos e familiares. Meu casamento foi realizado pelo padre Reginaldo, que celebrou com muita emoção e amor, Mas a felicidade não durou muito, porque acabou de repente.
Perdemos o brilho, a alegria daquele dia lindo e a emoção do casamento ainda respirava naquele lugar quando a barragem se rompeu e levou a dignidade de todos. Eu estava na escola quando a notícia da tragédia chegou. Foi um desespero total, mas não tinha muito o que se fazer, pois estava longe de casa e de todos. Pensei na minha mãe, nos parentes e amigos, no desespero dessas pessoas, depois sim, pensei nas minhas coisas que estavam na casa da minha sogra, os presentes do casamento que foram quase todos destruídos. Poucos foram resgatados pela minha sogra e uma tia, correndo o risco de morrer na lama, que já entrava na casa.
Hoje vivo de aluguel com meu marido, tentando recomeçar do zero, sem ajuda da Samarco, pois não recebemos o auxílio do cartão. Aluguel pago para nós não existe, vivemos com o pouco que meu marido recebe por mês. Meu casamento foi uma realização única, por ser o último que aconteceu ali e por ser a primeira ce-
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lebração de casamento do padre Reginaldo. Ele estava tão feliz quanto nós, feliz por estar na nossa comunidade, que mudou muito depois da e nviado sua chegada e só por Deus. Pena ganhou em tê-lo que não durou muito. como sacerdote
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Direito de entender: venda de animais
Por Guilherme de Sá Meneghin Com o apoio de Milton Sena
De acordo com a ação civil pública ajuizada pela 2ª Promotoria de Justiça de Mariana, o atingido tem o direito de vender seus animais para a Samarco. O atingido que tiver animais sob os cuidados da Samarco, deverá comparecer à sede da Comissão dos Atingidos, na Rua Bom Jesus, nº 190, Centro, Mariana-MG, e preencher o formulário com sua proposta para venda dos animais. O atingido não é obrigado a vender e, nesse caso, poderá preencher o formulário optando por vender ou não. Caso queira vender, indicará o animal e o valor da venda do animal.
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AGENDA DE DEZEMBRO 5
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Reunião Grupo de Trabalho Temático de Pedras Horário: 17h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
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Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Pública Geral da Comissão dos Atingidos de Mariana/Comunidades Atingidas de Bento/ Paracatu e demais localidades Horário: 18:00 h Centro de Convenções
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Reunião Grupo de Trabalho Temático de Pedras Horário: 17h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Paracatu Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
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Reunião pública geral dos atingidos de Mariana/ Samarco/ Ministério Público Horário: 18h Local: Centro de Convenções
Reunião Interna da Comissão dos Atingidos Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
Reunião Grupo de Trabalho Temático de Bento Rodrigues Horário: 18h Local: Escritório dos Atingidos
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Papo de cumadres Por Sergio Papagaio
Meu nome é Clemilda, o meu Concebida. -Nós morava no Gesteira véio, lá de Barra Longa, onde a lama da Samarco cabô com tudo, só sobrô a igreja. Nós é cumadre uma da otra, eu batizei o minin dela, ela batizou minha minina. Nós era vizinha lá na roça, agora tá cada uma pra uma banda. -Sem cumadre mi sinto tão sozinha, tem muito tempo que nós num vê uma a otra, depois que o barro da Samarco tomou nossa casa. Eu tô morando no Morro Vermelho. -Eu na Vorta da Capela, num é tão longe assim uma da otra mas tá muito ruim de andar por aí a gente que tem minin pequeno. -Se agente leva os minino com esse tanto de caminhão só se fô siguro pela mão. -Se a gen num leva, num tem quem toma conta dês não. Lá na roça ês curria pra tudu que é lugá, aqui na cidade, com esse trânsito inferná, nós num pode dexá. -Paricia um bando de rulinha, aqui tá tudo preso, igual pintin na gaulinha. E nós, parece galinha choca, presa no galinheiro o dia inteiro. -Tô com medo de enferrujá, a gente num acha jeito nem lugá pra caminhá. -Oia só procê vê, tô ruim até pra falá, essa poeira tá quereno me matá.
Tive uns dias na casa de Odete do Bananá, lá num tem pueira, drumi bem prá daná. Vorto pra Barra Longa, mar consigo respirá. -E comigo é cocera, coço pra disgraça e dá umas pereba que num qué sará. -E Sofia, fia de Simone? -Tá da mesma manera, dá febre, mancha na pele, umas boia na testa. -Que danera, -Tá até com caganera. -Dis que ês da Samarco tá arrumano tudo: as casa, as rua, até a praça. - A praça ficô muito bunita, tem uma grade de sigurança que parece escada pra minin subi, a grama ficou verdinha cum a tinta quês passou, até os cachorro que rolô na grama fico verdin, é pena que ês num pintô o rio, também ia ficá bunitu. -Diz que ês vão fazê um tar de dique no ri Gualaxo. - Tá correno esse buato, pra que qui serve isso? - Sei lá. -Deve sê mais um trem pra rebentá. -Dis cumpadre Malaquia quês vai arrumá a cidade toda. Es pode arrumá as istrada, fazê ôtras ponte, arrumá as casa, pintá as frente das casa, tampá rachadura com tinta. Mais, quem vai consertá esse trem esquisito que ês pôs dendenós? -Óia cumadre, que nós num perdeu parente na lama. -Na hora não, mais tia Chiquinha, morreu foi de
tristeza: por causa da casa dela que sumiu na lamacera. -Isso é verdade mesmo comadre, diz que tem um pessoal da TV firmano os trem tudo que ês já fez? -Pois é, quem é que vai firmá, o que ês num fez? -nós tá todo mundo duente pra daná. E a policlínica num dá conta de nus curá, nós ainda tem que pagá médico particulá -E ainda tem o medo da Germano rebentá. -Eu num guento essa zuêra, dá na gente um tipo de uma doidera. -Cumadre, quem sofre mais é as criança. -Tem gente que fala que é nós, as muié, eu acho que os mais véio sofre mais. Pu causa dessa puera, o médico de Ponte Nova fala que é pra eu de Barra Longa me mudá, e meus fios e papai mais mamãe também levá. -Hum...pra onde que nós vai mudá? Se fô pra Mariana, nós vai é morrê lá, o zoto mexe com a gente, parece que foi nós que fez a barrage rebentá -E Ponte Nova nós nun tem lugar de morá, nem de trabaiá pra ajudá nosso marido, de nossos fio podê tratá. -Cumade nós tá sem jeito e sem lugar. Tenho muita dó de todo pessoá, todo dia rezo 40 pai nosso e 60 avimaria pra nós tudu miorá. -Puis eu já rezo e pra ês lá, nós tá com Deus, e ês com estes coração de pedra, do diabo és é freguês.