15 minute read
RESOLVI CASAR: O QUE AS PESSOAS VÃO FALAR AGORA?
POR VICTORIA THOMAZ
Não há idade certa para casar. Sim, muitas vezes as opiniões podem ser cruéis e machucar as pessoas. Críticas e preconceitos disfarçados de conselho são o principal relato de jovens, por volta dos 20 anos que resolvem casar. Insegurança, receio e ansiedade por conta das suas escolhas são as principais consequências que o preconceito gera, segundo nossos entrevistados. Essa reportagem conta essa história de quatro casais com um ponto em comum, eles decidiram casar antes dos trinta anos e sofreram preconceito por esse motivo.
Créditos: Arquivo pessoal / Carolina Sellmer Scortegagna; Frederico Mombach; Saul Produções & Antenor; Asaph Ximenes
Deize e Eduardo Abrantes
Nadyne Andrade e Pablo Lopes
Helen e Douglas Carrassai Vitória e Luan Timm
Decidir casar com 20 anos há 50 anos, na época dos avós de alguns dos entrevistados, tudo bem. Decidir casar hoje com 20 anos é quase um ato de coragem. Há décadas o preconceito era com as pessoas que esperavam mais para se casar. Atualmente, os jovens adultos sofrem ao escolher se casar antes do 25 anos. Namoros longos e relações maduras muitas vezes geram uma decisão: casamento! Construir uma família juntos, ter a própria vida, a própria casa, se conhecer mais e viver como casal.
Como Deize Abrantes que casou há dois anos e sete meses. Contou que ela e o esposo decidiram casar aos 20 e 23 anos para “começar a construir uma família, começar a nossa própria história e porque já tinha acontecido o tempo de ‘conhecimento’ (após cinco anos de namoro) e estávamos preparados para o próximo passo”. Nadyne e Pablo, que casaram em 2019, depois de cinco anos de namoro, afirmam: “Esses anos que namoramos, nunca foram suficientes
para nos conhecermos como agora, no casamento”.
“Quem sabe não casa? espera ter certeza”, “tu tem que aproveitar, tu é muito nova pra isso”, “tem muito que viver ainda”, “é muito cedo para casar, vai se arrepender” e “você está grávida?”, essas são algumas das frases que nossos entrevistados ouviram ao resolver partilhar a escolha do casamento.
Casar em meio aos estudos também gera ainda mais estranhamento. Deize decidiu pelo compromisso enquanto fazia faculdade de publicidade e propaganda e relatou que ouviu de muitos professores e colegas que eram muito novos. Alguns acharam loucura, mas ela sempre estabeleceu um diálogo para reforçar sua escolha e o porquê dela.
Nadyne e Pablo casaram-se há um ano, ela com 23 anos e ele com 32 anos. No caso deles, havia um “segundo preconceito”: ele escutou muitas vezes frases do tipo “Olha só, 32 anos, já tava na hora”. Helen e Douglas Carrassai,
MAS O QUE, AFINAL , É CASAR?
Tantas definições para chegar a uma única resposta: cada história carrega um significado mas todas são uma decisão, que é pessoal.
SE PRECISASSE DECIDIR NOVAMENTE, NÃO MUDARIA NADA. AS OPINIÃO SÓ MACHUCARAM.”
que se casaram com 17 e 21 anos, relataram que sofrem preconceito até hoje quando falam a idade com que casaram. Na maioria das vezes, escutam questionamentos como: “Mas você não viveu nada?”, “Sem graça”, “Não aproveitou” ou até comparações como “Viu, não casa, vai ser mais difícil fazer as coisas”.
Vitória casou com 22 anos e relatou: “Com o Luan, que é homem, aconteceu muito mais. Muitos outros homens falando pra não fazer essa besteira, dizendo que ele ia perder a liberdade dele. Reforçando um estigma de que casamento é algo ruim. Mas amar é ser livre, se há amor em um casamento há liberdade.”
A frase acima se repetiu nas entrevistas. Viver o casamento é também ter uma experiência e uma escolha com consequências particulares conforme as pessoas envolvidas nele. Para Helen, “casamento não é um sofrimento, é parceria, cumplicidade, admiração, respeito, amor. Por isso, já anos e parece que foi ontem que casamos”.
O conhecimento, o amadurecimento e a decisão são os passos que os casais têm até decidir oficializar a união, ou não. Deize também acredita que o casamento é resultado de uma construção conjunta. Ela afirma: “Não acredito que tenha ideia para casar, existe tempo de amadurecimento e, se as pessoas se sentem preparadas, daí já é a hora”. O relacionamento, independente de qual seja seu formato, idade, local, gênero, compete somente às pessoas que estão nele, que conseguem compreender em sua totalidade.
estamos casados há mais de 12
“É a união de duas pessoas diferentes que se amam e que estão dispostas a conviver, fazer sacrifícios e se esforçar constantemente para crescer juntos, buscando a felicidade mútua.” Vitória e Luan
“Casar é uma escolha! É prezar por felicidade conjunta.” Nadyne e Pablo.
“É quando qualquer tempo longe se torna uma eternidade e você quer acordar todos os dias do lado daquela pessoa.” Helen e Douglas
“Querer, estar e permanecer em cada minuto do dia. Aquilo que o amor é, o casamento também é.” Deize e Eduardo
MAS, O QUE, AFINAL, É APROVEITAR A VIDA?
O aproveitar a vida tem um significado diferente conforme crença, vivências e experiências particulares da cada pessoa. Não há regras, não há pessoas ou formas certas, há escolhas.
“Eu também escolhi aproveitar a vida, mas com o pablo. Eu poderia aproveitar minha vida de qualquer outra forma mas fiz uma decisão de aproveitar com ele. Ele me completa, e essa decisão faz sentido pra mim.” Nadyne
“Tive a sorte grande de encontrar cedo o que é melhor pra mim sem precisar me machucar muito, porque muitas vezes é isso que as inúmeras experiências geram, infelizmente! Aproveitar a vida é algo muito particular pra cada pessoa e eu aproveito muito com meu marido.” Vitória
“Para nós aproveitar a vida é estar com quem te ama, com quem você gosta de estar independentemente do que está acontecendo, seja em uma festa, seja em um momento difícil, em um passeio... Aproveitar a vida é estar com quem realmente vale a pena em todos os momentos.” Helen
“Aproveitar a vida é estar com quem se ama, seja família, amigos ou o marido. Eu não deixei de sair com meus amigos, eu não deixei de ir a festas, fazer encontros à noite, jantares e tudo mais porque casei, eu só tenho uma pessoa que me acompanha e divide todos os momentos comigo, sendo apoio diversão e felicidade. O casamento nos trouxe esse lar que não excluiu os amigos, mas sim aproximou de muitos outros modos.” Deize.
O MACHISMO NO ROCK E O BORDÃO “ELA É UMA MOCINHA”
A REDUÇÃO DA MULHER AO FETICHE, GROUPIE OU A UMA SEX SYMBOL PERSISTE NO ROCK N’ ROLL, ESPAÇO NO QUAL SE ESPERARIA TER MAIS LIBERDADE
POR BRUNA CALCANHOTTO GALVÃO
O Rock N’ Roll costuma ser entendido como um ato de liberdade, uma maneira de expor sem medo de julgamentos os sentimentos relacionados a qualquer coisa que exista. Mas e quando se é mulher? O que os homens fazem no palco e fora dele também é visto com os mesmos olhos em relação às mulheres? Ou ainda há machismo? Três mulheres da cena Rock atual contam suas experiências.
Letras de músicas famosas como a da banda Guns N’ Roses, Used to love her, já sinalizam: “Eu costumava amá-la, mas tive que matá-la”. Ou a música Run for your life, dos queridinhos do rock, os Beatles, que coloca: “ É melhor você correr pela sua vida se puder, esconda sua cabeça na areia, garotinha, te pegar com outro homem, é o fim, garotinha”. Letras que refletem o estereótipo feminino ofensivo e a objetificação da mulher na música.
Ao longo do tempo, as mulheres acabaram sendo mais conhecidas como groupies e reduzidas a sex symbols mesmo no ambiente do rock. Ao perguntar para alguém quantas artistas femininas esta pessoa conhece, quase sempre elas são minoria, dificilmente você vai ouvir mais nomes femininos do que masculinos nas playlists. Mas por que isso acontece? No meio musical, há vários exemplos de mulheres que fizeram história, como Debbie Harry, vocalista da banda Blondie, criada nos anos 70 e que continua até os dias de hoje produzindo material novo. E Joan Jett, guitarrista da antiga banda dos anos 70 só de mulheres The Runaways e vocalista solo com os The Blackhearts, que também continua até hoje nos palcos.
Isis Queen, vocalista da banda grega Barb Wire Dolls, de punk/ grunge, respondeu por e-mail à entrevista para esta reportagem e contou como se vê sendo vocalista mulher e sobre a relação com o machismo. Ela afirmou: “Ainda vejo machismo no rock n’roll, sem pensar duas vezes, dizendo em porcentagem, seria 100% que ainda existe. Nada mudou desde o início, e é mais difícil ser mulher e fazer o mesmo que os homens sem ser julgada”.
Em Porto Alegre, a vocalista Aline Dillenburg, de 34 anos, da banda Destroyers, cover da banda americana formada somente por mulheres The Runaways dos anos 70, comentou sobre o machismo na cena rock. A Destroyers é originária da primeira banda de Aline, que se chamava Washing Machine. Tinham uma parceria de produção com o Clube Silêncio, na festa chamada Rock Clube, e a ideia era, a cada show, realizar um tributo diferente. Em agosto de 2013, fizeram um tributo especial a Stooges, foi o primeiro show de Aline Dillenburg, e depois a banda escolhida como tributo foi Rolling Stones. Logo após essa parceria, a banda estava feita, porém o produtor da festa e baterista da banda não permitiu que continuassem usando o mesmo nome, assim nasceu a Destroyers.
Crédito: Bruno Rapone/Divulgação
Aline Dillenburg
Ela conta que, inicialmente, achar integrantes para a banda que sejam somente mulheres, como a original, já foi bastante desafiador. “Tem muita musicista de qualidade em Porto Alegre, mas acaba sendo que a maioria das vezes essas profissionais acabam priorizando outros estilos de som”, afirma a vocalista.
Ao tocar no assunto do machismo, e a relação em ser uma vocalista mulher que interpreta outra e que exige ter muita atitude, Aline disse que infelizmente o machismo ainda é bem forte no cenário de Porto Alegre. Contou que já aconteceu de, ao chegar à portaria do evento e dizer que era da banda, o “cara” da portaria achar que é somente uma mulher que deve estar acompanhando algum homem de outra banda. “É uma viagem isso, mas eu levo na maior naturalidade e leveza, e acho até engraçado”, disse Aline. Entretanto, ela conta que nunca passou por alguma situação desconfortável em show por ser mulher, pelo contrário, se sentia mais à vontade porque assim poderia quebrar paradigmas machistas. “De modo geral,
no cenário atual, sendo autoral ou cover, falta valorização da cultura, vejo que as pessoas só veem o lado do entretenimento, mas esquecem de todo o trabalho que é feito nos bastidores, toda a produção, a dedicação dos profissionais”, afirmou. “As pessoas acabam só querendo se divertir e aproveitar, mas não querem pagar por isso, não veem isso como um trabalho que merece reconhecimento e retorno financeiro também. E dentro disso, também tem o movimento dos músicos, que dentro deste cenário acabam não se valorizando, e tocam de graça ou por um pack de cerveja. O que prejudica outros músicos que querem mudar esta realidade.”
A cantora autoral Lylith Pop, de 21 anos, musicista e produtora gaúcha, com influência de New Wave, Synth Pop, Pop e Punk, conta que antes de assumir o seu nome artístico de Lylith Pop, que é a interpretação da junção de luz e sombras, iniciou seus estudos vocais aos nove anos de idade. Representou o Brasil no Concurso Internacional da Canção de Punta Del Este em 2014 e já dividiu o palco com a banda “Tequila Baby”, Supla e Lady Gaga na vinda da cantora à cidade em novembro de 2012, aos 13 anos de idade.
A respeito do machismo no meio artístico, ela diz: “Com certeza há machismo! Por mais que digam que não, ações mostram o contrário. Como ver apenas bandas formadas por homens participarem de festivais, e os únicos caras com certa influência que se aproximavam só queriam algo a mais comigo, e quando deixei claro que não, que estava ali buscando uma oportunidade de trabalho, nunca mais falaram comigo. Nos veem muito como objeto, e em Porto Alegre é extremamente forte essa cultura machista. É difícil, mas tem que dar a cara a tapa e não desistir, não ter medo.”
MUDE A SUA PLAYLIST: CONHEÇA ARTISTAS MULHERES NO SPOTIFY
Não adianta cobrar reconhecimento do trabalho feminino se não há procura pelo trabalho dessas mulheres. Não é para ser algo difícil, comece por uma revisão na sua playlist.
Acesse uma playlist com músicas de artistas femininas, nacionais e internacionais, a partir do aplicativo do Spotify:
FACES DA PROSTITUIÇÃO
MULHERES ATUAM EM ORGANIZAÇÃO PARA AUXILIAR UMAS AS OUTRAS
POR EWILLYN LOPES
ONúcleo de Estudos da Prostituição, NEP, é uma organização sem fins lucrativos, que atua junto com mulheres prostitutas no exercício da cidadania e existe desde 1989. Ele representa a região sul na Rede Brasileira de Profissionais do Sexo. O local fica localizado dentro de uma galeria no Centro de Porto Alegre e atende mais de 100 mulheres por mês.
Desde jovens com 18 anos até mulheres com mais de 60 anos, todas são atendidas da melhor forma por outras mulheres que se dedicam a orientar na prevenção de DSTs, além de encaminhá- -las para apoio jurídico, quando necessário, médico e psicológico. Todo atendimento é feito via SUS e defensoria pública. “A função do núcleo é orientar e encaminhar cada uma delas para o local necessário quando for preciso”, relata Lucia, uma das responsáveis por fundar o grupo.
A história de Lucia na prostituição é longa, quase 40 anos. Ela conta que fundou o grupo quando viu a necessidade das mulheres que trabalham na rua receberem apoio. “Muitas mulheres eram agredidas e sofriam problemas psicológicos, sabiam que existiam DSTs, mas algumas não se cuidavam. Comecei a analisar isso até mesmo pelos problemas que passei no inicio da profissão e resolvi fundar o NEP”. Antes do nome NEP, Lucia e outras mulheres tentaram fundar a Associação Gaúcha de Prostitutas, mas o nome não foi aceito, pois a profissão não era reconhecida como uma atividade regulamentada.
A prostituição só foi reconhecida em 2002 pelo Ministério do Trabalho como uma ocupação profissional, porém ainda não é legalizada. Esse é um dos pontos que o núcleo também aborda e luta pelo direito. O NEP auxiliou na regulamentação da profissão atuando em parcerias nos cenários nacionais, regionais e internacionais com outras redes relacionadas a prostituição e aliados.
LÚCIA
“A regulamentação da prostituição permitiu para as mulheres que trabalham com isso pudessem participar das contribuições da previdência e só assim tivemos direitos como todos os outros trabalhadores, conseguimos auxilio médico, e até mesmo direito de nos aposentarmos.”, relata a prostituta.
O NEP também realiza reuniões com as profissionais do sexo, monitorias em pontos de prostituição pública, como ruas, praças, salas, bares, boates, com realização de intervenções e distribuição semanal de kits contendo camisinhas e gel lubrificante para as prostitutas. “É uma forma de cada uma conhecer o núcleo e de se prevenir.”
São mais de três mil mulheres atendidas nos últimos 20 anos pelo NEP, mas muitas sequer conhecem o local e trabalham “por fora”. Ou seja, existe um registo muito maior de prostitutas que não é contabilizado.
“É um trabalho realizado individualmente, cada mulher vai falando do núcleo, boca a boca, uma para a outra. No inicio, éramos dez e hoje somos mais de 100 por mês. Eu sei que existem mais mulheres trabalhando por ai, mas é uma escolha delas nos procurarem. É um trabalho feito diariamente, e uma passa para a outra.”
As histórias de quem trabalha no Núcleo se cruzam. Soila também é uma das gestoras e está na prostituição desde os 16 anos. Chegou do interior do Rio Grande do Sul para a capital. Soila atua efetivamente junto com essas mulheres.
Juntas, Soila e Lucia começaram a orientar as prostituas a denunciarem as violências que sofriam nas ruas e dentro de casa. Com esse trabalho o núcleo recebeu o prêmio Direitos Humanos no Rio Grande do Sul, homologado pela UNESCO em 1999.
“O trabalho que fazemos é social, tentamos acabar com esse tabu e legalizar a nossa profissão, o NEP vai auxiliar nessa luta diariamente e buscar pelos direitos de quem escolhe essa profissão”, relata Soila.
Confira ao lado o quadro sobre a diferença de legalização e regulamentação.
A prostituição é regulamentada desde 2002, porém ela ainda não é legalizada. Na legalização, todas as possíveis sanções são elimi- nadas, enquanto na descrimina- lização o ato deixa de ser ilícito apenas do ponto de vista penal. Segundo o advogado especia- lista em Direito Trabalhista Anto- nio Castro, “A prostituição não é crime, mas tirar proveito da pros- tituição alheia pode ser conside- rada rufianismo.”
Prostituição é constituída por uma troca consciente de favo- res entre a pessoa que usa o corpo por dinheiro e o cliente, e por mais que seja uma profissão muitas vezes tida como última “solução” para aquelas e aqueles marginalizados, ela não constitui um tipo penal.
Já o rufianismo está previsto pelo art. 230 do Código Penal como um crime ao tirar proveito da prostituição alheia. Por exem- plo, cafetões tirarem proveito de mulheres. Art. 230 - Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1o Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, com- panheiro, tutor ou curador, pre- ceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cui- dado, proteção ou vigilância:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 2o Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência.