No Entanto - 79ª Edição

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Edição 79 - Novembro de 2017

Jornal-Laboratório Universidade Federal do Espírito Santo

Pacientes avaliam Unidades de Saúde de seus bairros

Fizemos um check-up de algumas US da cidade de Vitória. Saiba como elas estão.

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Mitos induzem mulheres a optar por cesárea PÁG8

Usuários de drogas nas ruas, uma kombi e um desejo de reintegração. PÁG8

Eu já fiz um aborto

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Novo Estatuto provoca desacordo entre setores da Universidade

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Copa ES termina com problemas no calendário PÁG14

Departamento da UFES realiza campanhas contra o HIV PÁG3


Editorial No Entanto Jornal Laboratorial produzido pelos alunos do 3º período de Comunicação Social - Jornalismo da Ufes para a matéria Laboratório de Jornalismo Impresso Equipe Antonio Eduardo Nogueira, Álvaro Guaresqui, Carla Bianca Nigro, Felipe Khoury, Giovanni Werneck, Giulia dos Reis, Heitor Mielke, Isabella de Paula, José Renato Siqueira, Kelly Mesquita, Klayton de Melo, Lavynia Lorenção, Ludiana Zucolotto, Lydia Lourenço, Marcela Lovatti, Marcos Paulo Federici, Marcus Vinícius de Souza, Maria Clara Stecca, Maria Fernanda Conti, Marina Coutinho, Matheus Souza e Vitor Pinheiro

Editores Carla Bianca Nigro, Giulia dos Reis, Isabella de Paula e Lydia Lourenço

Diagramação Álvaro Guaresqui, Giovanni Werneck, Kelly Mesquita, Lavynia Lorenção e Matheus Souza Logo Gabriel Moraes Professor orientador Rafael Bellan

A equipe No Entanto mais uma vez traz as contradições e conflitos por trás dos fatos que a mídia convencional muitas vezes não se ocupa em noticiar e explora, por meio de novas abordagens, assuntos que estão em relevância em meio às crises econômica, social e moral que o país enfrenta. Em sua 79ª edição, nosso jornal se propõe a gerar debate e promover reflexões acerca dos assuntos relacionados às políticas internas da Ufes, desigualdade nos serviços públicos de saúde e também noticiar sobre o cenário do esporte capixaba . Nas seções em destaque, discutiremos as problemáticas relacionados ao uso de crack e as políticas públicas existentes para os usuários, bem como os contrastes presentes no atendimento e a disponibilidade de recursos no serviço público entre áreas nobres e bairros periféricos da Grande Vitória. Você também ficará por dentro dos mitos que cercam o parto e as questões referentes ao seu processo de desnaturalização, hospitalização e mercantilização. Dialogando com o tema, trazemos relatos e uma nova perspectiva acerca do aborto, bem como discussões que cercam a sua descriminalização. Busca-se promover a reflexão quanto aos direitos reprodutivos e de escolha da mulher. Ainda nesta edição retratamos o processo de construção de um estatuto para nossa universidade, além de abordarmos a relação entre o calendário dos campeonatos do futebol capixaba e a desvalorização dos profissionais do esporte no estado. Apesar das dificuldades enfrentadas nos bastidores, como a abstenção de algumas fontes devido às polêmicas que cercam os temas dos quais nos propusemos a tratar, conseguimos concluir esta edição e nos dedicamos ao nosso compromisso de não apenas produzir informação, mas contestar diferentes ângulos da notícia. A turma. Sigam-nos no Facebook! Para sugestões de pauta, críticas e dúvidas, entrem em contato: fb.com/JornalNoEntanto


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Departamento de ações afirmativas da UFES promove campanhas contra o HIV UFES e Secretaria Estadual de Saúde realizam aconselhamento e testes de HIV nos campi de Goiabeiras e Maruípe.

Foto: Lavynia Lorenção

Giovanni Werneck, Isabella de Paula, Lavynia Lorenção e Matheus de Souza

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Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo (Sesa) concluiu recentemente o Boletim Epidemiológico DST/AIDS anual, que contabilizou ao todo 13 mil soropositivos no estado. Apesar de já existir tratamentos e medicações para o cuidado com os portadores do vírus, há ainda uma despreocupação da população, principalmente dos jovens, na prevenção contra a doença. Voltado ao público universitário, tendo em vista que os jovens entre 20 e 30 anos representam a maior parte dos casos de HIV e sífilis, nos dias 19 e 20 de setembro, o departamento de cidadania e direitos humanos da Universidade Federal do Espírito Santo, realizou em parceria com a secretaria de saúde do estado uma ação de teste e aconselhamento sobre essas doenças. A ação visa incentivar os jovens a fazer o exame e também prestar o suporte para o enfrentamento da doença, no caso dos resultados positivos. A secretária executiva do Departamento de Ações Afirmativas e Diversidade da UFES, Viviana Corrêa, explica o funcionamento desse procedimento: “Os exames são feitos semestralmente dentro de uma van localizada aqui em frente ao departamento, onde existem profissionais que realizam os testes e em menos de 30 minutos você já consegue o resultado.” Apesar dessa medida pública em execução, a quantidade de voluntários ainda é baixa, totalizando nessa última atuação cerca de 230 pessoas testadas, das quais 8 apresentaram resultado positivo. Em comparação com o número de estudantes da universidade ao todo, menos de 1% participa do exame. No Espírito Santo, segundo a coordenação estadual de doença sexualmente transmissível e Aids, da secretaria de Estado da saúde, houve um aumento nos casos tanto em homossexuais quanto heterossexuais, porém entre o público LGBT o número de novas ocorrências foi maior.

Distribuição de preservativos em frente ao Departamento de cidadania e direitos humanos, Campus de Goiabeiras.

Medicações e tratamentos O SAE, serviço de atendimento especializado, oferece tratamento por meio do uso de antirretrovirais, medicamento que auxilia no fortalecimento do sistema imunológico; há também o acompanhamento psicológico e social. O SUS também atua na disponibilidade de coquetéis de inibição viral. Preconceito e Prevenção Temida, a AIDS não é sentença de morte no século XXI. Todavia, ainda hoje existe um preconceito solidificado na sociedade quando o assunto é a doença. Segundo a coordenadora da secretaria de saúde do estado, Sandra Fagundes, a maioria das mortes é relacionada ao diagnóstico tardio. Para Viviana, é possível se prevenir por meio de preservativos, que são abastecidos tanto na UFES quanto em qualquer posto de saúde e outras localidades públicas. Participação do público Na universidade, as testagens ocorrem na metade e no final dos semestres e nos postos de saúde podem ser feitos durante todo o ano. A partir dos resultados gerados, os pacientes soropositivos são encaminhados para tratamento e ajuda especializada.


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Dependentes químicos necessitam da atenção do Estado

Usuários de drogas nas ruas, uma kombi e um desejo de reintegração. Ludiana Zocollotto, Maria Fernanda Conti e Marina Coutinho.

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o entrar no organismo, age direto no sistema nervoso central do indivíduo. Acelera o batimento cardíaco e garante prazer, euforia e disposição. O efeito do crack é instantâneo. Como consequência, o consumo se torna incontrolável e os sujeitos rapidamente se encontram em situação de dependência. De acordo com a Constituição brasileira, é dever do Estado promover a saúde mediante políticas sociais e econômicas, que venham a propor a redução do risco de doença e de outros agravos. No município de Vitória, podemos perceber os danos provocados pela droga nas “cracolândias”, espalhadas por alguns bairros da cidade, como o da Praia do Suá (atrás da antiga Giacomim) e o da Vila Rubim (perto da Ponte Seca). Violência Fios de energia e telefonia, bem como torneiras, chuveiros, eletro-

domésticos e as próprias roupas: é necessária a promoção gratuita tudo era vendido por Cláudio*, 45 de saúde e base educacional, além anos, na busca do dinheiro para o de lazer, cultura e tratamento psiconsumo de drogas. Ele mesmo re- cológico. O problema é que tais lata o vício pelo álcool e por outras recursos são quase inexistentes substâncias, como cocaína e lança- quando se fala da atenção pública. -perfume. O total de suas interna- “O município conta apenas com ções devido ao crack beiram, em uma equipe do ‘Consultório na média, 6 vezes. Rua’. É um projeSem interação e to absolutamente Ele ainda possui integração enas memórias das necessário, desde tre os sujeitos agressões policiais da nossa socie- que seja integraque sofria, bem dade, não exis- da a outras ações te saúde e tão pouco saúde e setores da socomo as cometidas a mando de mental. A partir disso que a ciedade”, explica droga se torna uma opção.” traficantes. Siqueira. Cláudio é um O programa Marluce Siqueira dos exemplos de coordenadora “Consultório na como as políticas do CEPAD-ES Rua” é uma iniciapúblicas são imtiva do Ministério portantes não só no vínculo usuá- da Saúde que está em vigor desde rios-família e entre seus grupos de 2012 na cidade de Vitória. As aticonvívio, mas também para fora vidades são realizadas de forma deles, no contato com a comuni- ambulante, por meio de um veícudade. A coordenadora do Centro lo da marca kombi. As equipes são de Estudos e Pesquisas sobre o compostas por Assistente Social, Álcool e outras Drogas (CEPAD- Enfermeiro, Psicólogo, Auxiliar -ES), Marluce Siqueira, esclarece de Enfermagem e Técnico em Hique para a reintegração dos de- giene Bucal. Segundo a assistente pendentes químicos na sociedade social Maria Anita de Oliveira, a

*Os nomes foram alterados para garantir o anonimato das fontes.


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atenção do programa é totalmente dedicada a pessoas em situação de rua. “Mesmo com o desempenho, o foco do atendimento não são os usuários de crack e sim os de qualquer outra droga que esteja sendo usada de maneira abusiva”, afirma. O serviço é o único do município com abordagem de rua. “O atendimento é realizado de forma singular. As demandas do sujeito em acompanhamento são trabalhadas a partir de um plano terapêutico, que é elaborado com a equipe e com o próprio usuário”, descreve. Em alguns casos, os usuários são encaminhados para atendimento em unidades de saúde e outros serviços de referência da prefeitura de Vitória, como o Centro Municipal de Especialidades (CME) e o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas (CAPSAD). Em oposição à declaração de Maria Anita, Marluce defende que não observamos no cotidiano da cidade uma parceria entre os setores públicos para que aumentem a oferta dessas políticas. Ela julga que não existe um diálogo para fortalecer a recuperação dos dependentes químicos. “O que mais vivenciamos são as interrupções desses serviços de saúde, segurança e educação. Como exemplo disso temos o desmoronamento do SUS (Sistema Único de Saúde), que pode desencadear em um aumento da falta de assistência municipal, sobretudo para aquele portador de distúrbios em decorrência do uso de cocaína e crack”, desabafa.

“Perdi minha primeira família, que são meus pais e minha irmã. Consequentemente perdi minha segunda família, que foi minha 1ª esposa, juntamente com alguns ótimos empregos em empresas renomadas. Mas nos últimos anos perdi meu domínio próprio, perdi minha 2ª esposa e a presença da minha filha”, relata. Ao buscar parar com o consumo da substância, Fernando contou ter procurado o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), porém ele não achou efetivo o auxílio oferecido pelo serviço. “Pra mim não funcionou, pois me deram vários tipos de remédios que ao meu ver só pioraram a situação”, disse. Usuários versus Sociedade

O tratamento do povo brasileiro em relação aos portadores de transtornos mentais e usuários de substâncias psicoativas, ainda é criminalizado. Marluce Siqueira afirmou como é necessário que ampliemos nossa visão. “Os núcleos da sociedade carecem de informação sobre o quê, como e quando abordar esses indivíduos”, diz. E explica as causas do vício: “Sem interação e integração entre os sujeitos da nossa sociedade, não existe saúde e tão pouco saúde mental. A partir disso que a droga se torna uma opção. Antes de direcionar o assunto para os setores ‘saúde e segurança pública’, é preciso falarmos sobre integração pessoal, profissional e institucional.” Marluce também propõe debates sobre como não abandonar socialmente esses indivíduos. “Não Autodestruição se torna humanizada a situação desses usuários com uma atitude higieFernando*, 39 anos, entre idas e nista (de recolher e colocar numa vindas usou o crack por 12 anos instituição fechada)”, detalha. de sua vida. O uso de drogas que começou como uma forma de Retomando o controle aceitação na roda de amigos tomou um rumo destrutivo quan- Hoje, Fernando trata a dependêndo o consumo do crack iniciou. cia do crack em um centro de re-

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abilitação particular, no município da Serra. Já Cláudio, devido o acompanhamento do Estado no seu caso e o apoio emocional da família e da assistência social, caminha em direção à novas oportunidades. Ele segue limpo há 8 meses, agora buscando autonomia no seu espaço doméstico, o qual já tem energia elétrica e um fogão para o preparo da própria comida; tudo isso conquistado com as economias de uma nova chance de trabalho. Rede de Atenção Psicossocial

- Unidades Básicas de Saúde Realizam atendimento e acompanhamento do indivíduo com transtorno mental e/ ou que realiza uso de álcool ou outras drogas, de leve ou moderada complexidade.

- Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Atende pessoas com transtorno mental grave com idade a partir dos 18 anos. O órgão atende também crianças e adolescentes dos 0 aos 18 anos, no Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CapsI).

- Centro de Atenção Psicossocial em Ácool e Outras Drogas (CapsAD) Atende adultos, a partir dos 18 anos de idade, com problemas relacionados ao uso de álcool e outras drogas. O CapsADI, Centro de Atenção Psicossocial Infantil em Álcool e Outras Drogas, por sua vez, atende crianças e adolescentes até os 18 anos de idade. Ao precisar de atenção em saúde mental, busque a unidade de saúde mais próxima a sua casa ou entre em contato com um dos Centros de Atenção Psicossocial descritos acima. Fonte: Prefeitura de Vitória


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Exame de rotina: o dia-a-dia das Unidades de Saúde de Vitória Foto: Kelly Lacerda

Visitamos algumas US da cidade de Vitória buscando um panorama do atendimento básico do município. Álvaro Guaresqui, Felipe Khoury e Kelly Lacerda.

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s Unidades de Saúde (US) são o primeiro contato da população com a rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Elas são responsáveis pelos atendimentos básicos iniciais e fazem uma ponte entre os usuários e os atendimentos de especialidades. O bom funcionamento dessas unidades é primordial, uma vez que, segundo informações do Ministério da Saúde, cerca de 80% dos problemas de saúde apresentados pela população podem ser solucionados ainda nesse primeiro ponto de acolhimento. Sabendo dessa importância a equipe do “No entanto” percorreu as US do município de Vitória, para acompanhar de perto a realidade das Unidades do município, que conta com 29 desses locais para atender os seus quase 328 mil moradores, distribuídos em 80 bairros. Na US do Bairro da Penha, bairro que segundo último censo do

IBGE apresenta renda familiar per capita de R$ 613,12, conhecemos a auxiliar de serviços gerais, Cristiane Ferreira, que lamenta a situação encontrada na Unidade do bairro. Segundo ela, o atendimento ginecológico não é constante. “Quando a médica vem acompanhar as grávidas, ela atende as outras pacientes, mas ela não está sempre aqui”, afirma Cristiane. Ela ainda diz que o número de médicos é pequeno em relação à demanda do bairro. Uma dona de casa, que não quis se identificar, reclama da falta de pediatra na unidade. Ela, que é mãe de um bebê de 5 meses e uma menina de 11 anos, relata que quando uma criança precisa de atendimento é o clínico geral quem faz. Além disso, quando é necessário marcar uma consulta é realizado um encaminhamento para ser atendida em outro bairro. “Fui encaminhada para a Unidade de Saúde de Consolação para consultar o meu menino. É inviável para mim, é longe daqui para ir com um bebê, sozinha de ônibus”, desabafa a moradora.

Outra realidade exposta pelos moradores do bairro é a necessidade de chegar muito cedo à Unidade para conseguir marcar uma consulta. Segundo os usuários da US, é necessário chegar antes das 6h e ficar na fila para garantir o atendimento. Na Unidade de Saúde de Santa Marta os usuários também enfrentam problemas com o sistema de marcação de consultas, que não é diário. Ele é realizado através da “abertura da agenda”, que não possui um dia certo para iniciar e pode até ser encerrado no mesmo dia. “Tá difícil! Mês passado tinha fechado a agenda, agora eu tenho que esperar abrir esse mês para marcar para o outro”, relata a autônoma e moradora do bairro, que também pediu para não ser identificada. Para ela, saber o dia da abertura da agenda é como ganhar na loteria. US “nota mil” Em outros bairros a situação é bem diferente da apresentada. Em Jardim Camburi, a US trabalha com


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sua equipe completa, sendo formada por 9 clínicos gerais, 3 pediatras e 2 ginecologistas. A estudante Érica de Souza Diniz, mãe de dois filhos e usuária dos serviços da Unidade do bairro, se diz satisfeita. “Os médicos são muito atenciosos e é bem rápido o tempo de espera”. Elogia a estudante. Apesar da realidade no bairro ter sofrido alterações com a crise econômica, o que acarretou o aumento na demanda pelo atendimento na Unidade, o atendimento conseguiu ser mantido com qualidade, segundo a coordenadora administrativa da Unidade de Saúde de Jardim Camburi, Maiara Soares Baratela. Além de trabalhar com a equipe médica completa, a unidade não apresenta problemas com relação à marcação de consultas, uma vez que ela já está integrada ao sistema Vitória Online, em que o morador faz o seu agendamento pela internet. “Trabalhamos com o esquema de agendamento online, que acolhe a população de maneira mais digna, mais humana, de não precisar enfrentar fila para marcar consulta”, explica a coordenadora da unidade. A US do bairro Santa Luíza, que atende os bairros Barro Vermelho, Ilha do Frade, Praia do Canto, Santa Lúcia e Santa Luíza, locais majoritariamente de classe alta da capital, também não enfrenta grandes problemas. A equipe de saúde está completa e o sistema de marcação de consultas também está inserido no sistema Vitória Online. Uma aposentada moradora do Barro Vermelho, que não quis se identificar, utiliza os serviços da US de Santa Luíza desde que se mudou para o bairro há 2 anos e meio. “Se pudesse dava nota mil para o atendimento”, elogia a aposentada. Ela, que cancelou o seu plano de saúde após não ser atendida quando precisou, conta que hoje faz todos os seus acompanhamentos através do

serviço público. “Tive câncer de mama. A médica aqui da unidade que descobriu. Em mais ou menos 3 meses, fiz meus exames e a cirurgia”, relata a moradora. O outro lado Procurada para esclarecer as demandas dos usuários, a Secretaria de Saúde informou que a Unidade de Saúde do Bairro da Penha não conta com atendimento ginecológico e pediátrico uma vez que trabalha com a estratégia de saúde da família. Nesse formato de atendimento, cada equipe de trabalho é formada por clínico geral, enfermeiro, agente de saúde e em alguns casos, dentista. O clínico geral é o responsável por todos os atendimentos e apenas em casos específicos é feito o encaminhamento para as especialidades. A US do Bairro da Penha conta com três equipes de saúde da família. Com relação à quantidade de médicos na Unidade, a Gerente de Atenção à Saúde, da Secretaria Municipal de Saúde de Vitória, Renata Maria Sales informa que a quantidade de médicos por US é definida segundo a demanda de atendimento e que o quadro de médicos do município está completo. No entanto, a gerente assume que alguns médicos estão de férias, outros pediram demissão e além disso, ainda existe o problema dos médicos que passam nos concursos mas não assumem os cargos. “Isso é regra”, confessa Renata. O sistema de marcação de consultas, segundo a Secretaria, é definido de acordo com a dinâmica de cada bairro e é estabelecido juntamente com o Conselho Local de Saúde, mas todos estão sendo substituídos pelo o sistema de agendamento online, que está sendo implantado gradativamente nas Unidades.

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As 29 Unidades de Saúde de Vitória, funcionam de forma diferente, sendo: - 23 no formato de saúde da família- clínico geral, enfermeiro, agente de saúde e em alguns casos, dentista. - 2 no sistema de agente comunitário de saúde - agentes e enfermeiros - 4 no formato tradicional pediatra, ginecologista, clínico geral

O que dizem os médicos Para o Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES) os motivos que levam os médicos a pedirem demissão, ou mesmo não assumirem as suas vagas no Sistema Municipal de Saúde, são a “falta de condições para o profissional prestar o devido atendimento médico, somada à baixíssima remuneração e à insegurança nos locais de trabalho”.

Leia a nota do Conselho na íntegra: “O Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES) esclarece que a falta de médicos para assumir vagas em concursos públicos oferecidos pelas unidades municipais e estaduais de saúde ocorre pela falta de condições para o profissional prestar o devido atendimento médico, somada à baixíssima remuneração e à insegurança nos locais de trabalho. De fato, o que vem ocorrendo é um desrespeito, por parte das autoridades públicas da área da saúde, com o profissional médico. Muitas vezes o médico participa do concurso público na esperança de ocorrer melhorias. Mas diante da falta de condições de trabalho, da falta de segurança nas unidades e da remuneração vil, fica inviável trabalhar.” Assessoria de imprensa do CRM-ES.


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Partos por cesárea são maioria no ES A taxa de intervenções no parto excede o número previsto pela OMS.

Foto: Giulia Reis Giulia Reis, Lydia Lourenço e Maria Clara Stecca

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Ministério da Saúde aponta o parto normal como o mais realizado na rede pública representando 59,8% no total de nascimentos e, estabeleceu novas diretrizes que visam através da instrução de profissionais da saúde e das gestantes a diminuição de cesáreas desnecessárias no Brasil. Em 2016 foram registrados 55% dos partos de forma não natural. O país é um dos que mais realizam cesarianas no mundo, sobretudo quando analisamos dados apenas da rede privada de saúde. Em 2015, segundo números da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) 481.571 partos dos hospitais credenciados ocorreram por cirurgias cesarianas, o que corresponde a 84,6% do total de nascimentos pela rede

de saúde suplementar. O índice de nascimentos por cirurgia cesariana é percentualmente maior no Espírito Santo do que a taxa registrada no Brasil. De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde) o percentual de cesáreas no estado é de 62%, o que ultrapassa o limite de 15% de cesáreas considerado o ideal. No estado, a Maternidade Municipal de Cariacica disponibiliza uma sala de parto humanizado. Nela são possibilitadas medidas alternativas de alívio da dor, como hidroterapia e massagem lombar, assim como a presença de doulas voluntárias. A intervenção cirúrgica no parto nem sempre ocorre por necessidade. Para a doula e especialista em parto humanizado, Aline Almeida, a banalização das cesarianas é fruto de uma série de mitos que cercam o parto normal devido

o processo de hospitalização do parto, que antes ocorria no ambiente familiar e doméstico. “Quando o cenário do parto migrou para o hospital, foram criados protocolos e modelos que não existiam antes, com esse novo contexto a violência obstétrica virou rotina, criou-se a partir dessa violência o mito de que o parto normal é perigoso”, afirma Almeida. Aline acredita que esses fatores criam o fetiche da cesárea como processo limpo, rápido e salvador, gerando uma espécie de linha de produção. Através disso muitas gestantes são induzidas desde o pré-natal a crer que a intervenção cirúrgica no nascimento é necessária. Embora o número de partos naturais sejam menores que as cesarianas, algumas mulheres ainda optam pelo parto normal. A jovem de 26 anos e mães de dois filhos,


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Foto: Reprodução/Assessoria ALES

Natália Macieira, entende que muitas mulheres não optam pelo processo natural por falta de informação, apoio e encorajamento sobre a capacidade de seu próprio corpo. No nascimento de seu primeiro filho, Natália sofreu um procedimento abusivo: uma episiotomia. “Não deram crédito ao meu corpo, alegaram que não havia ‘passagem’ para meu bebê, pois queriam adiantar o trabalho de parto que já durava cerca de 13 horas”, relata a jovem. Essa impaciência dos profissionais dessa área é movida pela lógica mercadológica que envolve o nascimento “Muitos médicos se negam a realizar o parto normal por ele demandar maior tempo, o que para eles significa menos pacientes, logo menos dinheiro”, afirma Macieira. Mitos do parto normal: A OMS e o Ministério da saúde recomendam o parto normal em gestações saudáveis, e só não é recomendado quando apresenta riscos a gestante ou ao bebê. Embora seja um processo na maioria das vezes seguro, há muitos tabus acerca do parto natural. Os mais comuns são: Circular de cordão - Na maioria dos casos, o cordão umbilical enrolado no pescoço do bebê não representa risco e nem a contraindicação para o parto normal. Na realidade, é bem comum que o cor-

Episiotomia

Incisão efetuada na região do períneo (área muscular entre a vagina e o ânus) para ampliar o canal de parto. Seu uso se justifica em alguns casos quando o parto precisa ser instrumentalizado como em situação de sofrimento fetal. É geralmente realizada com anestesia local.

Aline Almeida, doula. Comissão de saúde discutiu a discriminação de mulheres usuárias do SUS.

dão fique enrolado no bebê dentro da barriga, não só no pescoço como em outras partes do corpo à medida que ele se movimenta no líquido amniótico. Cesárea anterior - Segundo especialistas essa máxima vem de muito tempo atrás, de uma época em que pacientes morriam por infecção no parto, tinham dificuldades com cicatrização e não existiam métodos de avaliação do trabalho de parto. Tudo isso já foi solucionado e, atualmente, não há motivos para maiores preocupação. Falta de dilatação - A dilatação do colo do útero só acontece com as contrações uterinas, portanto, só não ocorrerá se o médico não esperar o tempo suficiente que é em média de 38 a 40 semanas, podendo chegar a 41. Devido à importância da discus-

são sobre recursos disponibilizados pelo SUS aos direitos da mulher durante o processo do parto, no dia 24 de outubro a Assembleia Legislativa do Espírito Santo (ALES) organizou uma mesa de debate sobre “Os direitos das mulheres usuárias do SUS à analgesia no parto normal” com a participação de Eduardo Soares, diretor da Maternidade Municipal de Cariacica e Aline Almeida do coletivo capixaba de doulas. Parto Humanizado O parto humanizado envolve três pilares básicos: o respeito ao protagonismo feminino e ao tempo do binômio mãe-bebê, e o uso das melhores evidências científicas. Podendo ou não culminar no parto normal.


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Foto: Antônio Nogueira

Aborto ilegal mata 69 mil mulheres por ano

“Muita gente faz aborto, ou você já fez ou conhece alguém que fez.” afirma J.R. Segundo Pesquisa Nacional, uma em cada cinco mulheres já abortaram. Carla Bianca Nigro, Antônio Nogueira, e Marcos Frederici

Eu já fiz um aborto” conta M.A. anonimamente. “Comprei um Cytotec. A parte mais desesperadora não foi tomar o remédio. Passei semanas sem saber onde conseguir. A perspectiva de não poder decidir quando ser mãe, de ter que abandonar meus planos, isso foi aterrorizante para mim”, relata. Ela não está sozinha... Assim como M.A, meio milhão de mulheres tomaram a decisão de abortar em 2015, a maioria delas ilegalmente. Isso significa que, em média, a cada cinco mulheres em uma sala, uma já terá realizado um aborto. No melhor dos casos ninguém nunca saberá, no pior, ela se torna parte das estatísticas. A Organização Mundial da Saúde

(OMS) estima que 69 mil mulheres, no mundo, morrem por causa de complicações do aborto Na luta para permitir que as mulheres decidam sobre o próprio corpo nasce um dia para reflexão. O dia 28 de setembro é um marco histórico da luta das mulheres por esse direito,conhecido como Dia de Luta Latino-Americano e Caribenho pela Descriminalização do Aborto e assim como o dia da mulher, marca a mobilização do movimento feminista pela inserção de suas demandas no guarda-chuva do Estado. A data foi determinada no 5º Congresso Feminista Latino-Americano e Caribenho, em 1990. Nesse dia, coletivos feministas realizam mobilizações, passeatas, debates e eventos. Esse também é um momento simbólico, pois, em 2014, Jandira Magdalena dos Santos Cruz foi sepultada. A carioca

teve sua história divulgada na mídia por ter realizado um aborto. No seu caso, o aborto em uma clínica clandestina falhou e Jandira foi encontrada, dias depois, morta em um carro. Tornou-se um símbolo do abortamento como questão de saúde pública. O dia 28 demonstra a insatisfação do movimento feminista com a interferência do Estado sobre o corpo da mulher, no que deveria ser uma decisão particular dela. Nesse dia, também são exigidas providências legais para impedir a morte de mulheres que, como Jandira, sejam vítimas de um aborto inseguro. “Um dia de reflexão porque é importante refletirmos sobre a responsabilidade que a atual forma de organização social detém na perpetuação dessas questões e como as agravam”, explica Ana Sophia Brioschi Santos, integrante do coletivo GENI.


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Entretanto, Gilsa, professora do Departamento de Serviço Social da Ufes, acredita que não há perspectivas futuras para a descriminalização. “Neste momento da conjuntura política brasileira só vejo no horizonte grandes retrocessos. Há nitidamente um avanço de posturas conservadoras, que estão influenciando diretamente o desmonte de políticas públicas importantes. No que se refere aos direitos reprodutivos, o Brasil ainda se revela muito conservador” declara. M.A. não teve nenhuma complicação no seu aborto, mas nem todas as mulheres têm a mesma sorte. Além do fator de risco, a condenação é uma grande preocupação da mulher que aborta. Como J. R, professora, que relata o caso de sua amiga que fez uso de medicamento abortivo aos 18 anos e acabou eliminando o feto dentro do banheiro de um ônibus “Foi um grande escândalo na cidade de interior em que morávamos, os alunos da faculdade fizeram uma verdadeira caças bruxas para descobrir quem havia sido. Sendo muito nova, ela se entregou e no final, sentiu a necessidade de sair da cidade”, conta J.R. Naquela época, a internet não estava tão disseminada e era complicado conseguir informação sobre o assunto. A partir daí, J.R e algumas amigas formaram um coletivo para orientar e auxiliar mulheres que tivessem que tomar a mesma decisão. “Muita gente faz aborto, ou você já fez ou conhece alguém que fez”. afirma J.R. Atualmente, o desenvolvimento da tecnologia permitiu que haja grande ampliação dos debates sobre aborto, porém o tema ainda é visto como um grande tabu. O silêncio em volta da questão prejudica a sociedade: quando o tema é debatido na mídia, aparece sob

ângulo conservador, aprofundando o preconceito e “desqualificando a luta feminista pelo direito ao aborto”, aponta Gilsa. Além disso, a questão ainda é influenciada pelo fundamentalismo e influência política das igrejas. Questões como a posição social e hierárquica na sociedade se materializam ao analisar os dados sobre a criminalização do aborto e suas consequências. Impedir legalmente faz dele uma questão social, pois mulheres das classes média e alta recorrem ao mercado de clínicas clandestinas. Enquanto isso, mulheres pobres “que decidem pelo aborto, se utilizam de métodos precários ou recorrem a clínicas de fundo de quintal, onde não há equipamentos adequados e profissionais capacitados. O resultado disso é um alto índice de morte de mulheres pobres e negras”, esclarece Gilsa. Gilsa acredita que a posição da mulher na sociedade também explica a forma como o aborto é tratado hoje. “Os antecedentes históricos que determinaram o processo de subordinação sexual são importantes para entendermos porque tanto a sociedade quanto o Estado buscam exercer o controle sobre o corpo da mulher, sendo uma das expressões do Patriarcado, o qual subjuga a mulher como sujeito histórico e a coloca num patamar de humanidade inferior ao do homem”, explica. Não se trata de incentivar as mulheres a abortar, não é essa a intenção dos movimentos feministas, mas sim permitir que as mulheres tenham o direito de escolher e que quando façam, seja seguro, explica Ana Brioschi. “Os estudos têm indicado que quando a mulher é informada e assistida de forma adequada, ela, inclusive, pode recuar na realização do aborto, por-

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que passa a conhecer os riscos do mesmo à sua saúde”, complementa Gilsa. No coletivo clandestino três mulheres desistiram de abortar. Hoje M.A. tem dois filhos e é muito feliz. “Eu os tive no momento certo” ela conta. A amiga de J.R não tem filhos e também é feliz, “ela nunca quis” diz. “Essas mulheres são veladas em silêncio. Eu declaro que sou uma delas. Eu tive um aborto. Assim como nós exigimos o acesso livre ao controle de natalidade, exigimos a liberdade de ter um aborto”. Essas palavras foram escritas em 1971, por Simone de Beauvoir, feminista e intelectual francesa. O Manifesto das 343, ou Manifesto das 343 vagabundas, foi publicado na época em que abortar ainda era crime na França e abriu as portas para uma série de discussões políticas sobre o assunto. Trinta anos antes, em 1940, o Brasil havia declarado o aborto parcialmente como crime e era punido com 1 a 3 anos de prisão. Para quem ajudasse, a pena poderia chegar a 4 anos. Em contrapartida, haviam dois casos onde se podia abortar: se a gravidez fosse causada por estupro ou se colocasse a vida da mulher em risco. Já fez um aborto ilegal? Você não está sozinha O Anis - Instituto de Bioética e o Think Olga (site feminista) iniciaram a campanha “Eu vou contar”. Mulheres que já realizaram aborto a 8 anos ou mais (prazo para não mais ser crime) são convidadas a contar suas histórias. A ideia é que seja postado um relato por semana. O objetivo, além de romper o silêncio, é que essa questão alcance a política. (www.eu-vou-contar.tumblr.com)


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Proposta de novo Estatuto da Ufes gera conflito entre comunidade acadêmica Após 15 anos sem atualização geral, Reitoria propõe mudanças no Estatuto

Foto: Marcela Delatorre José Renato Campos, Klayton Melo, e Marcela Delatorre

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atualização do Estatuto da Ufes vem gerando divergências entre a Reitoria e os demais setores acadêmicos da Universidade. Os embates giram em torno de uma aparente imposição de um processo centralizador de poder que tem maior enfoque pela Comissão Especial designada pelo Reitor. No ano de 2014 foi designada uma Comissão Especial que visava promover a atualização do Estatuto e do Regimento Geral da Ufes. Essa atualização foi considerada necessária, pois a última alteração de Estatuto aconteceu em 2002 e, desde então, diversas mudanças já ocorreram na Universidade, tornando o atual obsoleto. A nova proposta de Estatuto contou com apresentações realizadas em todos os Centros da Ufes, assim como na Administração Central, Sintufes (Sindicato dos Trabalhadores da Ufes) e Adufes (Associação dos Docentes da Uni-

versidade Federal do Espírito Santo). E tem como eixos principais da proposta, de acordo com o slide de apresentação, os pontos expostos no box 1, ao final da matéria. Dentre todas as mudanças organizacionais próprias da Universidade, esteve inserido a possível extinção total dos Departamentos. Após algumas discussões foi determinado que os Centros poderiam optar entre ter uma estrutura simultânea envolvendo Departamentos e Colegiados de curso, ou exclusivamente de Colegiados de curso. De acordo com o Diretor do Centro de Artes (CAr), Paulo Sérgio de Paula Vargas, essa é uma das questões que mais chama a atenção na proposta do novo Estatuto. Ele afirma que o ideal seria um maior debate sobre questões que cercam a Universidade. “Essa proposta de Estatuto estaria sendo melhor desenvolvida se houvesse um debate sobre a Universidade de uma maneira mais abrangente sobre aquilo que funciona ou deixa de funcionar”. A integrante da Comissão de

revisão do Estatuto pela Adufes Gilead Marchezi Tavares diz que a associação é contra a extinção dos Departamentos por duas questões. “Os Departamentos são, querendo ou não, um local de discussão política, onde os professores discutem efetivamente o rumo da Universidade. A outra questão é no fato de ser nos Departamentos que os professores pensam sua vida enquanto trabalhador”, aponta. Segundo a coordenadora de assuntos jurídicos do Sintufes, Joanicy Leandra Pereira, os técnicos administrativos perdem muito com essa nova proposta de Estatuto. “Na minha opinião, e de acordo com as nossas discussões, nós perdemos principalmente no quesito da representação nas instâncias e queríamos discutir esse ponto. A gente acha que essa Comissão não está fazendo um trabalho incisivo e efetivo do jeito que deveria ser feito”, afirma. Impasses Para a Adufes, a forma como o processo está sendo realizado é impositivo. Gilead considera que a metodologia adotada não teve a forma que se espera de um processo de reformulação de um Estatuto. “Eles dizem que é democrático porque tem uma página em que você pode fazer sugestões. Democracia é debater, discutir ideias e depois levar uma proposta”. Com o intuito de tornar a questão mais democrática, a Comissão de revisão do Estatuto pela Adufes


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acredita que a formação de uma estatuinte seria de extrema importância. Existiria um processo em que se tem grupos de trabalho e discussões, na qual cada ponto debatido seria levado a uma plenária e nela seriam discutidos. “A gente não pode negar que a Comissão tenha ouvido, no sentido de ter levado em todos os centros um pouco do que eles estavam pensando. Mas um fórum de discussão ampliado eu não vejo acontecendo”. Para Joanicy, a Universidade não está dando a devida atenção para o tema. “Do jeito que está sendo feito nós não vemos como um processo democrático. Esse processo atual não tem a participação da grande maioria dos técnicos como deveria ter, por exemplo”, diz. Renato Rodrigues Neto foi designado pelo reitor como membro da Comissão que formulou a proposta de Estatuto. Ele acredita que essa questão de estar sendo um processo democrático ou não depende do ponto de vista, e que algumas pessoas estão solicitando que seja realizada uma estatuinte. “O Estatuto será votado em todos os Departamentos da Universidade e em todos os Centros, logo todos os professores, técnicos e alunos relacionados aos mesmos irão votar. Portanto, ao meu ver, o atual sistema é até mais abrangente que a estatuinte”, finaliza Rodrigues Neto. Durante todo o processo, as convocações para discussões e debates foram divulgadas por e-mail. Essa plataforma, porém, não estimulou o interesse da comunidade acadêmica como deveria. As reuniões feitas em cada Centro não deram grande público, e a discussão da nova proposta de Estatuto é desconhecida pela maioria da comunidade acadêmica, principalmente entre os estudantes.

Segundo o presidente do DCE (Diretório Central dos Estudantes), Raphael Simões, o e-mail é uma plataforma muito forte, entretanto, deveria ter tido uma maior divulgação por outros meios, mas isso não foi possível devido ao fato de as reuniões terem sido marcadas muito em cima da hora. “A mobilização entre os estudantes acabou sendo muito pequena. Antes de entrar no debate sobre o Estatuto, deveriam ter tido eventos para explicar o que é esse documento para os universitários”.

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atrapalhar a vida dos estudantes. É importante que a consulta seja feita com antecedência e que utilize todos os meios de comunicação da Universidade para mobilizar a comunidade acadêmica”. Para Joanicy Pereira, como membro do Sintufes, o Regimento deve ser apresentado para a comunidade, minimamente como foi feito com o Estatuto. “A Comissão deveria reformular toda a sua estratégia de elaboração, tanto de Estatuto quanto de Regimento, porque falta mais envolvimento Regimento Geral da comunidade acadêmica como um todo”, aponta. Uma vez que o Estatuto for voPara mais informações sobre a tado e aprovado, será a vez do proposta de novo Estatuto, acesse: Regimento Geral da Universida- estatutoeregimento.ufes.br. de ser alterado para que ambos estejam compatíveis. Tais docuPrincipais pontos do mentos são complementares entre novo Estatuto si (veja as diferenças no Box 2 no final da matéria). - Universidade mais flexível e Rodrigues Neto crê que a Comenos burocrática; missão quer um Estatuto que re- Universidade mais interdisciplinar; flita o que a Universidade anseia. - Universidade com cursos “É importante que ao ver uma mais fortes; proposta de Estatuto você tenha - Secretarias com procediconhecimento do que se trata, mentos padronizados e equipe capacitada; para que a proposta reflita o que - Maior integração entre graa comunidade busca”. duação e pós-graduação; Segundo Gilead, falando en- Fortalecimento das relações quanto Adufes, eles esperam que das atividades de ensino, pesquisa e extensão. haja uma sensibilização não só da Box 1 Comissão, mas como da Reitoria, do Conselho Universitário, no sentido de ouvir o que todos estão faDiferença entre o estatuto lando. “É preciso ter coragem para e o Regimento Geral abrir o processo estatuinte. Ao meu entender, se a reitoria encampar - O Estatuto é o esqueleto. isso, ela dá um passo interessante Constitui uma carta geral de princípios gerais que regem a na sua trajetória política”. organização da Universidade; Já Raphael Simões espera que durante o processo de aprovação - O Regimento é o texto mais detalhado do Estatuto. Trata do do Regimento ocorra uma maior funcionamento da instituição consulta com o grupo discente. “No como um todo, definindo mais Regimento há a explicação das reclaramente os processos e funcionamentos de cada setor. gras, lá podem passar questões abBox 2 surdas nas entrelinhas que podem


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esporte

Copa ES termina com problemas de calendário no futebol capixaba Foto: Heitor Mattedi

Clubes têm problemas de receita que interferem diretamente no contrato dos jogadores. Heitor Mattedi, Marcus Vinícius de Souza

“Já cheguei a jogar três vezes numa mesma semana por clubes diferentes no futebol amador. Não tem e Vitor Pinheiro. todo o suporte que o profissional dá, em caso de lesão calendário da elite do futebol brasileiro entra na por exemplo, mas na questão salarial, consigo uma sua reta final, a principal competição nacional e renda muitas vezes até maior”, afirma. as competições continentais como as copas LiSobre o futebol capixaba no cenário nacional, o fubertadores e Sulamericana que tem a participação de tebolista não vê muita evolução no momento e frisa equipes brasileiras também estão em fase decisiva. que o problema não está na qualidade técnica e sim Mas, para alguns times o ano já acabou, como é o na falta de apoio de grandes empresas e planejamento caso das equipes capixabas. no esporte, o que causa uma certa desvalorização da O fim das competições, que duraram um pouco profissão no estado. mais de 5 meses agora deixa boa parte dos jogadoPara Sérgio Burmann, diretor comercial da desportiva res sem contrato e sem salário.O zagueiro David ferroviária as principais causas dos problemas financeiros Gregório que este ano já atuou pelo Vitória e mais enfrentados pelos clubes são os próprios torcedores capirecentemente pela Desportiva ferroviária, diz que xabas que não apoiam tanto quanto deveriam e o setor de devido ao calendário é normal que as equipes façam empresariado do Espírito Santo, geralmente dá preferência contratos curtos com os atletas, delimitados ao fim ao investimento no futebol de outros estados e em outros de determinadas competições, o que ocasiona uma esportes, o que obriga os clubes a fazerem contratos mais frequente troca de clube e curtos com seus jogadores. prejudica o futebol do esta“Após o fim do campeSegundo dados do globoesporte.com, a média do na opinião do jogador, já onato depois de quitar as de público do campeonato capixaba 2017 foi de 356 pagantes a cada jogo, número 30,7% infeque as equipes não mantém dívidas do clube com funrior ao ano de 2016. uma mesma base para os cionários e jogadores nós já anos seguintes. fazemos um plano de ação, Newmar Loyola, torcedor do Rio Branco, reclaDavid ainda diz que uma buscando nos planejar para ma da participação da mídia no futebol capixaba. “Ocorre um grande problema de valorização alternativa a que recorrem o ano seguinte, buscar noe divulgação por parte da mídia nacional, a ênfaos profissionais é o futebol vos parceiros e manter os se é apenas em equipes do Rio de Janeiro, São amador, que tem seus camantigos, o que normalmenPaulo e Minas Gerais. peonatos ainda acontecente se concretiza entre deAs competições estaduais acabaram no início do após o fim do calendário zembro e janeiro, assim nos de outubro com o fim da copa ES, tendo o Atléprofissional e normalmendando margem para nos tico Itapemirim como campeão e dono da vaga no brasileirão série D 2018 junto ao Doze. te contratam para uma ou planejar melhor em relação duas partidas. ao time”, relata Burmann.

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