Jornal Samambaia - Dezembro de 2016

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DO CURSO DE JORNALISMO

Secundaristas se mobilizam contra retrocessos na educação no país

GOIÂNIA, dezembro de 2016

CÉSIO-137

DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

nº 075/ ANO XVI

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luta

Luana Carvalho

JORNAL LABORATÓRIO

Como estão as vítimas 30 anos após o maior desastre radiotivo do Brasil

PEC 241/55

convivência

Relação entre estudantes da UFG e macacos do campus Samambaia ainda gera problemas p. 11

Entenda como essa medida influenciará o futuro dos brasileiros

samambaia PRECONCEITO VELADO Intolerância ainda é sofrida por religiões de matrizes africanas e espíritas

Editores de Capa NATÁLIA MOURA | Criação e Design de Capa NATÁLIA MOURA| Fotografia GILSON MENDES

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- OPINIÃO -

RUMO R

UM OLHAR DE ESPERANÇA

V EDITORIAL

GOIÂNIA, DEZEMBRO DE 2016

POR Evaldo Gonçalves | DIAGRAMAÇÃO Julie Tsukada

iver o jornalismo é recortar a realidade a partir de cada um dos olhares que nos envolvem e neste momento nos colocamos quase que sufocados. Sobrevivemos a golpes que objetivam matar a singularidade de cada olhar individual, os aspectos de fluidez que a consciência de cidadania que a Constituição Federal de 1988 nos trouxe. O Congresso mais conservador desde 1964 repete a farsa do Regime Militar e viola um mandato legitimamente eleito, mas não basta alijar a presidenta Dilma Rousseff do Planalto. Saúde e Educação públicas e universais também devem ceder seu espaço para a iniciativa privada - e entendam privada como quiserem! A edição 75 do Samambaia começou a ser gestada antes que os movimentos de ocupação retornassem a Goiás e, especialmente, à UFG. Entre-

tanto, seria impossível que finalizássemos o jornal sem que nuances das mobilizações preenchessem estas páginas. O impeachment, a PEC 241/55 e seus impactos orientaram nossos olhos. E o grito de indignação e esperança de cada um e cada uma dos estudantes que tomaram posse da Universidade, que é nossa, também ocupam dezembro neste Jornal Samambaia. Muitos disseram que as ocupações foram derrotadas, pela aprovação da PEC da Morte. Lemos isso diferente. Abrir os braços, abraçar-nos e dizer: somos da luta não pode, nunca, ser classificado como derrota. Uma batalha foi travada e a mobilização urge por continuar. Diante de nós temos a Reforma do Ensino Médio, a Reforma da Previdência e a Lei da Mordaça. E contra a Lei da Mordaça, que poda a liberdade de cátedra, nossa capa de dezembro coloca em questão religiões que são cotidianamente atacadas. Sejam bem vindos, muito obrigado, Axé!

- CRÔNICA -

O PESSIMISMO POR Ana Luiza Alves | DIAGRAMAÇÃO Gabriela Campos

V

bros um pente, um iogurte vencido, uma pedra sobre a cama. No Acre, famílias inteiras de venezuelanos choram e invadem casas desabitadas, brigam para sobreviver, imploram de joelhos dobrados. Na Somália, os heróis das crianças desnutridas são os piratas do mar arábico, roubando cargueiros de europeus gordos, voltando pra casa num barquinho pe- queno, hasteando a bandeira preta da paz que sustenta a miséria de uma barriga oca. Nos Estados Unidos, um

cheiro forte de carne podre ainda rescende das árvores sulistas. O algodão que nasce dessa terra está encharcado de sangue, as pessoas não se misturam, os únicos pardos dessa terra são latinos, limpando latrinas, sempre servindo. No Iraque, na Síria, os meninos vestem camisetas de jogadores de futebol milionários, driblam pela cidade destruída, uma bola de meia remendada. Durante o intervalo, aprendem a atirar e decapitar um corpo, são obrigados a

rezar para um Deus desconhecido. Eu. No momento sofro por falta de inspiração. Minha dor é tão ridícula que quase não sinto o direito de sofrer, então me reestabeleço. Talvez minha falta de inspiração seja o resultado também desse pessimismo desesperador que se apossou de minha alma. E ah! Como acredito no espírito. Sobretudo, acredito na vida após a morte e no ciclo doloroso das recuperações individuais. Foi essa a drágea que encontrei para superar a violência do cotidiano. Não é tão doce quanto se pensa, mas é pelo menos mastigável. Não sei o que será de mim quando despertar desse hiato naufragado em pesadelos terríveis. O perigo está mesmo na vida. Eis o mistério da fé.

Ilustração: Reprodução

enho ultrapassando semanas terríveis como quem pula pedras pequenas, sem medo de cair ou do perigo da dor. Confesso que vez ou outra choro, meu estômago vibra qual um terremoto. Sofro de crises de identidade literária, o que Clarice bem chama de “hiatos”, espaços inertes da vida, como se estivéssemos mortos, prontos para renascer. É bem provável: que tenha sobrevivido e ignorado minha doença, não porque seja sábia o suficiente para dosar o equilíbrio, não enlouquecer de vez... A verdade é que a minha angustia faminta tem se aliviado e saciado na dor de desconhecidos. Haitianos sobrevivem de migalhas nas ruas de Goiânia. No Haiti, seus familiares recolhem dos escom-

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FIC Ano XVI - Nº 75, Dezembro de 2016 Jornal Laboratório do curso de Jornalismo Faculdade de Informação e Comunicação Universidade Federal de Goiás

Orlando Afonso Valle do Amaral REITOR

Luciene Dias

Estudantes da disciplina Jornal Impresso II

Julie Tsukada

Estudantes da disciplina Jornal Impresso I

Angelita Pereira de Lima

COORDENADORA GERAL DO SAMAMBAIA E COORDENADORA DE PRODUÇÃO

Ângela Teixeira de Moraes

MONITORIA E SUPERVISÃO EDITORIAL

DIRETORA DA FACULDADE DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO COORDENADORA DO CURSO DE JORNALISMO

EDIÇÃO EXECUTIVA E DIAGRAMAÇÃO

PRODUÇÃO

Contato - Campus Samambaia | Goiânia-GO - CEP 74001-970 | Telefone: (63) 3521-1854 - email: samambaiamonitoria@gmail.com | Versão online no issu.com/jornalsamambaia | Impressão pelo Cegraf/UFG - Tiragem de 1000 exemplares


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- EDUCAÇÃO -

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CEPAE SE MOBILIZA EM PROL DA EDUCAÇÃO os retrocessos na educação BRASILEIRA

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REPORTAGEM Alline Flores EDIÇÃO Larissa Farias DIAGRAMAÇÃO Julie Tsukada

o dia 22 de Setembro, o Presidente Interino Michel Temer e o atual Ministro da Educação Mendonça Filho anunciaram a Medida Provisória 746/2016, que altera o Ensino Médio. A medida entrou em vigor no dia de sua publicação, sem que houvesse consulta à sociedade. Para a Professora Dr. Amone Inácia, Coordenadora do Curso de Pedagogia da UFG, “O que houve foi uma arbitrariedade e desconsiderou anos de história e mobilização de diversos pesquisadores, professores e mesmo discentes no diálogo quanto à escola que queremos.” As mudanças devem ser implantadas no país a partir de 2018, e preveem a contratação de profissionais de “notório saber” sem que estes possuam graduação em cursos de licenciatura. Com a resolução o estudante não será obrigado a estudar as 13 disciplinas por três anos. Após um ano e meio algumas passam a ser optativas. Apenas as disciplinas de português e matemática serão obrigatórias. As matérias Artes, Filosofia, Sociologia e Educação Física passam a ser facultativas no Ensino Médio e podem desaparecer do currículo. A não obrigatoriedade desses saberes pode trazer grandes prejuízos, principalmente para a escola pública, pois “o aluno não consegue fazer uma boa redação sem esses conhecimentos e sem a reflexão sobre os valores fundamentais da convivência humana, o conhecimento sobre as relações sociais e da cultura, dificilmente esse aluno conseguirá ter uma boa formação” afirma Amone. MOBILIZAÇÃO O CEPAE não será diretamente afetado pela implantação das Organizações Sociais, contudo seus alunos apoiam a luta de outras escolas, que serão afetadas, pois “muitas pessoas não têm condições de pagar para estudar”. Ainda de acordo com os discentes “se essas medidas forem aprovadas as escolas federais, ou mesmo mestrado e graduação podem passar a cobrar taxas anuais. Aqui no CEPAE as vagas são por sorteio, e achamos isso bom, porque dá chance para as pessoas, porque se tivesse que fazer prova para

MUDANÇAS De acordo com Amone, a reforma no Ensino Médio consiste na reordenação do currículo, que passará a ser composto por itinerários formativos - Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências Humanas. Há ainda a possibilidade de optar por uma formação técnica. Segundo a Educadora “a Carga Horária deixará de ser de 2400 horas, atualmente, para 1200 horas, em torno de 1,5 anos do chamado núcleo básico. Após ter feito esse núcleo, o aluno poderá optar pelo itinerário que quiser cursar.” Contudo, as ênfases também serão oferecidas de maneira facultativa pelas instituições de ensino. Dessa forma, como ressalta a Professora “as mudanças trarão grandes prejuízos, sobretudo, para a classe trabalhadora que será tolhida do conhecimento necessário à sua formação.”

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Portão que dá acesso ao CEPAE indicando que o Centro está ocupado

As mudanças trarão grandes prejuízos, sobretudo, para a classe trabalhadora que será tolhida do conhecimento necessário à sua formação. AMONE INÁCIA

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organizam contra

entrar seria excludente, pois nem todos têm as mesmas oportunidades.” Os alunos secundaristas do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação da Universidade Federal de Goiás (CEPAE) têm a consciência de que “essas matérias optativas podem ser retiradas, e sem dinheiro as pessoas não vão ter como pagar escola, nem pagar as matérias e sem elas, em vinte anos a população não vai saber pensar”. Segundo eles “parece que essas medidas são um conjunto arquitetado para deixar a população alienada.” Desse modo, desde o dia 25 de outubro os estudantes do CEPAE ocuparam a escola em protesto contra a Reforma no Ensino Médio. O Projeto de Emenda à constituição 241/55, o Projeto Escola Sem Partido e o Governo vigente, que segundo eles não os representa. Eles criaram comissões, delegaram tarefas, cuidaram da limpeza e estabelecem horários fixos para as refeições. No que se refere à limpeza, na ocupação ela é uma função de todos: “a limpeza é coletiva, nos dias de limpar a maioria ajuda”. E para sanar as dúvidas dos pais, no dia 2 de Novembro realizaram uma Assembleia, onde falaram sobre os motivos de seu protesto e responderam a questionamentos. Os alunos da instituição afirmam que a escola propicia a eles a formação de uma ampla visão crítica desde muito cedo, e não poupam esforços para cuidar de seu colégio. Para zelar pelos colegas e pelo patrimônio eles criaram uma comissão de segurança, que fica na guarita recebendo os visitantes, “os membros do colégio entram livremente, mas as pessoas de fora têm que se identificar, assinam o nome em uma lista e apresentam um documento com foto. Também precisam colocar o horário de entrada e saída”.

Ocupa CEPAE

SECUNDARISTAS Se

Coordenadora do curso de Pedagogia da UFG Na contramão do empobrecimento de currículo proposto pela reforma, os estudantes do CEPAE entendem a ocupação como um protesto, no qual não há aulas padrões. Eles criaram uma comissão de cultura, responsável por organizar o cronograma com aulões, aulas de dança, oficinas e outras atividades lúdicas. Juntamente com essa comissão, existe a divisão de comunicação, responsável por pegar o contato das pessoas que querem dar oficinas, e cuidar do relacionamento com a imprensa. Segundo eles “a ideia é propor uma reforma do modelo escolar, sem aquele padrão rígido de aula em sala fechada, com as cadeiras em filas voltadas para o professor. Aqui na ocupação, organizamos muitas oficinas e vários professores querem vir aqui ajudar, não estamos nem conseguindo agendar todas!” A Medida Provisória (MP) modificou o artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica (1996), a qual estabelece os componentes curriculares obrigatórios também da Educação Infantil e Ensino Funda-

mental. Com ela o Inglês será a única língua estrangeira compulsória. DIFICULDADE Para os Secundaristas “na UFG muitas das pessoas que entram são as que tem melhores condições financeiras, vieram de escolas particulares ou pelo menos fizeram cursinho. Tiveram mais oportunidades de estudar. Apesar de o acesso ter ficado um pouco mais democrático, ainda é excludente.” Com a reforma no ensino e a PEC 241/55 (a qual congelará por vinte anos os gastos do Governo Federal com a educação, saúde, previdência e assistência social) o acesso ao ensino superior ficará ainda mais restrito, pois os estudantes de escolas públicas poderão não ter o conhecimento necessário para tirar uma boa pontuação no Exame Nacional do Ensino Médio, e como os secundaristas enfatizam “as pessoas que estudam em escolas públicas geralmente não tem condições de pagar cursinhos”.


- MOBILIDADE -

PERIGO NO TRANSPORTE PÚBLICO superlotação marcam a rotina de estudantes REPÓRTAGEM Emilly Viana EDIIÇÃO Alline Flores DIAGRAMAÇÃO Alline Flores

Larissa Farias

Emilly Vianna

ônibus encosta. A multidão se prepara para entrar. A linha é a de número 105, que alimenta o terminal de integração Praça A, Setor Campinas, e o Campus II da Universidade Federal de Goiás (UFG), o Samambaia. Às 7h15, manhã cedo, pelo menos 48 pessoas embarcam na jornada que vai durar pouco mais de 40 minutos até os domínios da cidade universitária. A maioria carrega mochila nos ombros e o desejo de chegar a salvo à sala de aula – e, com alguma sorte, no horário. Uma das usuárias que realiza esse trajeto é a estudante Anna Clelma, do curso de Jornalismo da UFG. Anna, moradora do setor Santos Dumont, região noroeste de Goiânia, precisa ajustar o despertador às 5h e pegar três ônibus para continuar sonhando com o diploma. São duas horas de itinerário entre a sua residência e a Faculdade de Informação e Comunicação (FIC): 14 Km que poderiam ser percorridos em 22 minutos de carro. “A gente chega no Praça A e tem tanto passageiro que a aglomeração deixa o embarque muito perigoso”, conta a graduanda de 18 anos, referindo-se à limitada pla-

À espera do ônibus no Campus.

taforma de embarque e desembarque que a linha 105 divide com a 160. “Já vi várias situações que quase se tornaram acidentes”, pontua. A falta de segurança no transporte público é um dos aspectos que mais preocupam os alunos da UFG. Amanda Alves, estudante de Relações Públicas, chega uma hora mais cedo no campus todos os dias, a fim de acompanhar a mãe que trabalha nesse horário. “Assim, nenhuma de nós fica sozinha no ponto”, destaca. Também não é difícil encontrar relatos nas redes sociais a respeito de roubos e furtos no campus. No último mês de maio, o acadêmico da licenciatura em Química, Gustavo Augusto, foi assaltado enquanto aguardava o 721 em uma parada próxima ao Restau-

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Emilly Vianna

insegurança e

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Falta de mobilidade, um dos desafios para os usuários do Transporte Público

A gente chega no Praça A e tem tanto passageiro que a aglomeração deixa o embarque muito perigoso. Já vi várias situações que quase se tornaram acidentes. ANNA CLELMA

Estudante de Jornalismo rante e Bar Gurupi, localizado à frente de uma das entradas principais do campus Samambaia. Os criminosos estavam junto ao grupo que esperava pelo transporte no local, quando sacaram as armas de fogo. “Como eu não estava com o meu celular, eles levaram minha mochila com todos os meus materiais escolares, incluindo pen drives, jaleco, documentos e trabalhos a entregar”, menciona. Gustavo só conseguiu voltar para casa porque a carteirinha de estudante estava no bolso da calça jeans na ocasião.“Hoje ainda sinto falta dos bens que eles levaram, dos trabalhos que tive que fazer de novo, dos documentos e suas segundas vias… Mas a vida, essa não tem segunda via não”, conclui o estudante. Discutir sobre transporte de qualidade para discentes do ensino superior público é relacionar-se com os mais variados direitos, assegurados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Constituição Federal de 1988. Por esta razão, de acordo com o conselheiro estadual suplente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), Fernando Chapadeiro, há a progressiva necessidade de um pensamento mais elaborado sobre a organização da cidade e, consequentemente, do sistema de transporte público coletivo. A lei de mobilidade, aprovada em 2012, prevê que municípios

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como Goiânia já tivessem realizado o chamado Plano de Mobilidade Urbana. O projeto é basicamente um estudo criterioso para levantar dados e conhecer os desejos e barreiras do vai-e-vem cotidiano. Chapadeiro explica que só com a implementação de um plano bem estruturado os estudantes poderão usufruir de um transporte eficiente, já que “identificando essas vontades e anseios de deslocamento é possível implementar o planejamento ideal que vai melhorar a prestação dos serviços”. Para ele, a qualidade das linhas destinadas à UFG certifica não só o direito de ir e vir, como também o acesso democrático à educação. Enquanto isso, os alunos elaboram alternativas para evitar os ônibus da capital. Com a intenção de lidar com a superlotação, alunos da universidade criaram no Facebook o grupo batizado de Carona UFG. Com mais de 4.500 participantes, a comunidade visa “auxiliar os alunos da UFG que utilizam transporte coletivo para ir à faculdade, através de carona oferecida por quem esteja indo de carro”, informa a descrição na página. É possível oferecer vagas no próprio veículo e procurar pessoas dispostas a colaborar com a dinâmica. “Em Goiânia, o índice de ocupantes por carro é muito baixo, em torno de 1.2 para cada veículo. As caronas otimizam esse sistema”, ratifica o conselheiro do CAU.

Apesar dos percalços, o transporte coletivo é um importante espaço de integração dos acadêmicos. “Conheci uma das minhas melhores amigas esperando o 105 chegar depois da aula”, revela Cybelle Castro, formada em Administração pela UFG. Conforme a graduada, a rotina exaustiva e a falta de segurança aproximam os alunos da universidade. “Não há um único estudante aqui que não tenha uma história inusitada para contar, boa ou ruim”, assegura. PASSE ESTUDANTIL A obrigatoriedade de identificação da carteirinha do estudante passou a ser obrigatória em outubro de 2015, e desagradou os discentes. Segundo Anna Clelma, muitos motoristas são grosseiros por conta da difícil visibilidade das fotos no passe escolar. Ricardo Jorge Alves, que abandonou o curso de Administração na UFG, afirma que já passou por situações de constrangimento: “o motorista duvidou que o passe fosse meu e, além da humilhação, o ônibus chegou bastante atrasado”. Os estudantes também problematizaram o fato de que os condutores tenham de dividir a atenção entre o trânsito e os detalhes dos documentos do passageiro. “Outra história trágica é não ter no campus máquinas para recarregar o passe livre”, denuncia o estudante de filosofia, BergKamp Magalhães. Os usuários das 11 linhas da universidade só contam com um lugar para comprar créditos de passe estudantil. Próximo à Biblioteca Central e à Reitoria, a lanchonete da Escola de Música e Artes Cênicas (Emac) é a única unidade que oferece o serviço. Se você estuda no Instituto de Informática (INF), por exemplo, vai ter que caminhar no mínimo 1,1 Km até o local.


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- MEMÓRIA HISTÓRICA -

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Césio-137 deixa marcas em gerações Wilton Morais

Após 30 anos, vítimas do acidente ainda recebem tratamento REPORTAGEM Rafael Tomazeti

Wilton Morais

EDIÇÃO Larissa Farias

o dia 13 de setembro, o acidente radiológico de Goiânia completou 29 anos. Para quem não se lembra, nessa mesma data, no ano de 1987, duas pessoas que coletavam lixo encontraram, um aparelho radioterápico nos despojos do abandonado Instituto Goiano de Radioterapia. Ao abrirem o equipamento, os trabalhadores se impressionaram com o brilho azul emitido por uma substância mortal: o césio-137. Encantados com o pó fluorescente, alguns moradores da região o levaram para casa, fazendo com que a área de risco e contaminação aumentasse em poucos dias e atingisse o raio populacional de 120 mil pessoas. Os sintomas da exposição direta ou indireta apareciam nas primeiras horas. As vítimas apresentavam diarreia, náusea e tontura. Na época, os enfermos foram diagnosticados como portadores de doença contagiosa. Dias se passaram para que os médicos realizassem o diagnóstico correto e conseguissem descobrir um tratamento para a Síndrome Aguda de Radiação. O estrago, contudo, já estava feito. A primeira vítima fatal da tragédia foi também a mais emblemática. Depois de brincar com o pó brilhoso, Leide das Neves, de apenas 6 anos, ingeriu, acidentalmente, partículas do césio misturadas com um alimento. A morte da criança foi simbólica e obrigou o Governo de Goiás a agir. Em 1987, foi criada a Fundação Leide das Neves (Funleide) com a atribuição de atender 129 pacientes. Após a edição da Lei nº. 14.226, de 2002, surgiu a Superintendência Leide das Neves (Suleide). O atendimento estendeu-se aos vizinhos da área contaminada, filhos e netos dos pacientes atingidos diretamente pela radiação e também contaminados pelo Césio-137. Trabalhadores envolvidos na descontaminação geral – policiais militares, bombeiros, servidores da Secretaria de Saúde do Estado – também passaram a ser auxiliados pela SULEIDE.

André Luiz de Souza, diretor do instituto CARA, apresenta acervo histórico fotográfico do Césio-137 ALENTO No ano de 2011, o trabalho de acompanhamento e a assistência às vítimas do trágico episódio passaram a ser atribuição do Centro de Assistência aos Radioacidentados (CARA). Segundo o diretor dessa instituição, André Luiz de Souza, o órgão é uma unidade de saúde multidisciplinar que atende, exclusivamente, pacientes radioacidentados. De acordo com Souza, “o CARA presta auxílio na área médica, psicossocial, odontológica, enfermagem e outros. Disponibiliza, ainda, abertura de processos administrativos e atendimento de demandas de processos judiciais de concessão de pensões estaduais ou federais, quando solicitadas na forma legal”, explica Souza. A unidade é o recurso que muitos encontraram para tentar amenizar a dor causada pela tragédia. Segundo dados do Centro de Assistência aos Radioacidentados, 540 pessoas estão aposentadas pelo estado de Goiás em decorrência dos efeitos do acidente. Outras 250 conseguiram o benefício por meio do Governo Federal. Um número de 127 vítimas tem direito a essas duas aposentadorias. “O número tende a oscilar devido à morte e à interferência judiciária”, afirma diretor do CARA. Para iniciar o processo para adquirir auxílio financeiro do Estado, o cidadão deve apresentar ao CARA um registro de envolvimento com o acidente radiológico. Segundo Souza, muitas pessoas reclamam de descaso, mas não contam com esta documentação e procuram outras vias para serem contemplados pela previdência: “Quando o cidadão vem aqui, ele apresenta o motivo do requerimento de aposentadoria ou benefício. Não existindo registro de envolvimento com o Césio, a maioria recorre à Justiça”, diz o diretor.

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Jhessyka Monteiro DIAGRAMAÇÃO Larissa Farias

Quando falo que fui vítima do Césio-137, as pessoas se assustam. Parecem nem acreditar! SILVIA NUNES BORGES Vítima do acidente

Mais do que uma unidade de assistência médica e social, a instituição se firmou como um combatente aos preconceitos que atingem vítimas da radiação. Uma delas é Silvia Nunes Borges, paciente do Centro de Assistência. Em 1987, quando tinha apenas 8 anos, Silvia viu a casa em que cresceu ser demolida por conta da contaminação radiológica. Ela relata que, mesmo morando fora de Goiás, foi alvo de olhares preconceituosos. “Morei cinco anos no Pará. Quando falo que fui vítima do Césio-137, as pessoas se assustam. Parecem nem acreditar! E isso não é só no Pará. Aqui em Goiânia, há pessoas que miram a gente com esse olhar”, revela Silvia. MEMÓRIAS Na época da tragédia, os olhos do Brasil estavam voltados para Goiânia. O episódio foi motivo de comoção nacional. Em todo o território nacional, pessoas se solidarizaram com a dor que sofria a capital goiana. Algumas delas, inclusive, foram voluntárias e vieram a Goiás para contribuir. Ênio Freire é engenheiro e trabalhou na demolição de prédios e nas estruturas irradiadas pelo Césio-137. “Houve presença voluntária de intelectuais e artistas em visitas motivacionais às equipes de trabalho e aos locais de confinamento radioativo de pacientes. Chegavam de várias partes

do Brasil, trazendo afeto e esperança”, relembra o engenheiro. Emocionado, Freire lembra que sua amada Goiânia sofreu também com preconceito ao redor do país, mas destaca que os voluntários e artistas ajudaram na desconstrução da imagem negativa da cidade: “Ajudaram na fase de rejeição do Estado de Goiás, de seu povo e de seus produtos, em função do acidente. O compositor Moacir Franco fez uma música para levantar o moral do povo goiano: Eu amo Goiânia... Goiânia me ama. Tocava o dia todo, no Brasil inteiro. Ajudou bastante”, explica. Freire ainda afirma que prefere manter as boas lembranças para apagar o fantasma vivido na época. Mesmo com o medo nas ruas, o engenheiro explica que nunca olhou diferente para pessoas irradiadas. No exemplo de Freire, o diretor do Cara alega que a unidade tem atuado para quebrar preconceitos: “Ninguém vai pegar radiação por estar ao lado de uma das vítimas. Existe uma preocupação na secretaria em desmistificar a questão”, garante. Hoje, o maior acidente radiológico do mundo tem quase três décadas. Entretanto, as cicatrizes ficarão para sempre na história de Goiânia. Resta ao Estado cuidar da assistência das vítimas. Cabe à população fiscalizar tais ações, além de acolher as pessoas que mais sofreram com a irresponsabilidade dos mantenedores do Instituto Goiano de Radioterapia.


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- GÊNERO -

mulheres lutam por representatividade eleitorado, elas ainda ocupam menos da metade dos cargos públicos REPORTAGEM Aline Rodrigues

Ludmilla Lobo

EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

Natália Moura

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egundo a Estatística do Eleitorado, divulgada em junho deste ano pelo Tribunal Superior Eleitoral (TRE), 76.534.83 mulheres votaram na última eleição, o que representa 53% do total de eleitores no Brasil. Entretanto, o número de mulheres que participam diretamente da política do país ainda é mínimo. Na Câmara dos Vereadores de Goiânia, apenas quatro dos 35 assentos são ocupados por mulheres. Partindo para um cenário nacional, na Câmara dos Deputados apenas 52 do total de 513 parlamentares são mulheres. A representação no Senado não foge ao modelo já conhecido: são apenas 11 mulheres entre 71 homens. Aprovada em 1997, a lei de número 9.504 prevê a obrigatoriedade da reserva de 30% das vagas de candidatura de um partido para o gênero feminino. No entanto, se mais mulheres se candidatam por conta dessas cotas, o mesmo não se pode dizer do total de eleitas. Essa desproporcionalidade pode ser observada quando é feita uma verificação no Partido da Mulher Brasileira (PMB). Apesar de ter sido criado com a intenção de “aumentar a par-

ticipação das mulheres em todos os setores da sociedade”, como diz o programa partidário, dos 75 parlamentares associados ao partido, apenas 29 são mulheres, o que corresponde a aproximadamente 38% do total de eleitos pelo PMB. CONFLITOS Existem diversos fatores que levam a essa disparidade, principalmente aqueles que envolvem a construção cultural da sociedade brasileira. A doutora em Ciência Política e professora da Universidade Federal de Goiás, Denise Paiva, afirma que a participação da mulher no mercado de trabalho é relativamente recente, o que influencia muito a atuação feminina na política. Para a especialista, as mulheres ainda enfrentam dificuldades em conciliar o trabalho e a rotina dentro de casa, principalmente aquelas que não contam com o apoio de seus companheiros na hora de dividir as tarefas. A candidata à vereadora nas eleições 2016, Eronilde Nascimento, defende que é hora de as mulheres votarem em outras mulheres para representá-las. Em sua campanha, Eronilde levou às ruas de Goiânia alguns números da participação feminina nas Câmaras para convencer suas eleitoras de que é preciso mudar esse cenário. Ela conta que sempre se interessou por política, desde as reuniões de bairro, e que decidiu se candidatar porque não se sentia representada pelos políticos em atuação. Eronilde Nascimento não teve nenhum apoio financeiro de seu partido, toda a sua campanha foi financiada por ela mesma. Essa falta de auxílio partidário não é exclusiva do período de eleições. De acordo com a vereadora de

HISTÓRIA DE LUTA Reeleita na última eleição, com 9.114 votos, Dr. Cristina é uma das cinco mulheres escolhidas pelo goianiense para representa-los na Câmara dos Vereadores. Natural do Paraná, a vereadora se mudou para Goiânia na década de noventa em busca de um tratamento médico. Cristina teve 85% do corpo queimado pelo ex-namorado que estava insatisfeito com o término da relação. Após passar por

Reprodução

maioria do

24 cirurgias, Cristina decidiu se formar em Fisioterapia, especializando-se na mesma área em que foi vítima. Entrou na política para defender direitos das mulheres e a participação feminina em cargos públicos. Atualmente, Cristina é presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania, além de ser vice-presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos vereadores de Goiânia.

Vereadora Dr. Cristina discursa durante sessão na Câmara dos Deputados. Goiânia, reeleita na última eleição, Dr. Cristina, para além da candidatura, os partidos deveriam ceder cargos de visibilidade para que, quando essas mulheres fossem concorrer, o eleitor já tivesse familiaridade com as candidatas, facilitando assim uma posterior eleição. “Esse exercício é que ainda falta, inclusive dentro dos partidos: os cargos de comando, os cargos de indicação. Nós precisamos exercer maior pressão para que as mulheres ocupem esses cargos”, pontuou. INICIATIVAS Apesar da atuação da mulher na política até a década de 2000 não ser expressiva, as eleições de 2010 mudariam em muito esse cenário. Foi nesse ano em que, pela primeira vez, uma mulher assumiu o cargo máximo do país. Desde então, a ex-presidenta, Dilma Rousseff, começou uma nova era na política nacional, servindo de inspiração para todas as brasileiras. A mudança desse cenário não para por aí. A vereadora Cristina pontua que,

quando se trata de candidatura, em alguns lugares onde o trabalho da mulher tem se fortalecido, é possível verificar a predominância feminina. Por exemplo, na cidade de Valparaíso de Goiás, o número de mulheres candidatas é maior do que de homens. “Nessa cidade, vem-se cumprindo a cota de uma maneira inversa em relação à maioria das cidades brasileiras”, destacou. Nesse ano, diversas iniciativas foram criadas com o intuito de mudar esse cenário desigual. A senadora Fátima Bezerra é autora do projeto aprovado pelo Senado (PLS 515/2015) que institui 2016 como o “Ano do Empoderamento da Mulher na Política e no Esporte”. Além disso, a bancada feminina no Congresso também vem trabalhando para sensibilizar brasileiras em todo o país por meio da campanha Mais Mulheres na Política. Recentemente essa campanha ganhou o apoio do TRE, que agora passa a promover campanha institucional em rádio e televisão para incentivar a participação feminina na política de forma mais abrangente.


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- ECONOMIA -

U M A P E C I N C O M O D A M U I TA G E N T E alternativas viáveis para tirar o Brasil da lama financeira REPORTAGEM Ana Luíza Alves EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

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Amanda Soares

ão se fala em outra coisa: PEC 241. Michel Temer mal se sentou na cadeira e já colocou Henrique Meirelles como Ministro da Fazenda; juntos decidiram a tábua de salvação: PEC 241. Da direita ouviram-se gritos de “Viva! Coloquem ordem nessa casa!”. Da esquerda, estudantes escutaram a palavra “educação, corte e sacrifícios” na mesma linha. Fartos de tantas notícias, desde Reforma na Educação até Escolas sem Partido, decidiram que era hora de dizer não: “Não deixaremos passar essa PEC!”. Mas o que é, afinal, uma PEC? Literalmente o seu nome por extenso significa “Proposta de Emenda à Constituição”. Essa proposta pode ser apresentada pelo Presidente da República, por um terço dos Deputados Federais ou Senadores ou por mais da metade das Assembleias Legislativas. Mas para vigorar na “Constituição Brasileira de 1988”, ela é discutida e votada em na Câmara dos Deputados e no Senado. Uma PEC em especial, identificada pelo número 241, já foi aprovada por 366 deputados e agora segue em discussão dentro do Senado com o nome de PEC 55. Enfim... Por que a PEC foi proposta, o que ela diz e quais serão os reflexos dela em nossas vidas? Não é segredo para ninguém. A vida no Brasil está mesmo difícil. O Governo diz que a culpa da atual crise econômica está nos gastos primários desenfreados com a população. Foi assim que nasceu a PEC 241. Essa medida propõe que seja estabelecido um limite de gastos públicos com a população e que mesmo que o Brasil se recupere e comece a ganhar mais dinheiro, continue gastando o mesmo valor. REALIDADE De qualquer maneira, precisamos conviver com a realidade. Hoje o Brasil tem 70% da sua riqueza (PIB) comprometida apenas com dívidas. Apenas 40% da dívida foram gastos com políticas sociais. Parece muito? A França compromete 50%

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Manifestantes fazem protesto no centro do Rio de Janeiro contra a PEC 241

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consequências e as

do seu PIB para esses gastos. Os Estados Unidos operam 40% do seu PIB com gastos públicos. E países em desenvolvimento como Coréia do Sul, gastam 30%. Deste modo, o Brasil em nada extrapolou seu orçamento com gastos primários e está na mesma linha dos países emergentes em grau de investimento. Dizem que a PEC 241 “apenas irá congelar os gastos atuais”, mas não é bem assim. Pedro Linhares Rossi, Doutor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) explica que, se a máquina continuar rodando - e continuará -, o Brasil vai ganhar mais e proporcionalmente o investimento será menor. Com o plano da PEC, o Brasil vai passar de um investimento atual de 20%, para 15,7% em 2026.

Fernando Frazão

O que é, quais são as

É necessário fazer sacrifícios, mas eles não dizem quem vai sangrar nessa história. PEDRO ROSSI

Doutor do Instituto de Economia da Unicamp Em 20 anos, os gastos públicos serão apenas de 12,3%, isso com uma previsão otimista de Rossi. Esse resultado é assustador. O Brasil irá se igualar a países pobres como Sudão, Congo, Bangladesh, Madagascar, Turcomenistão, Irã, entre outros. Um país que está entre as dez maiores economias do planeta investirá em saúde e educação tal qual um país subdesenvolvido. PREOCUPAÇÕES A PEC 241/55 enfatiza os gastos com saúde e educação. Mas, dentro da mesma porcentagem dos gastos sociais estipulados, estão os recursos direcionados a todos os servidores públicos. Portanto, nesta folha de pagamento estão as forças armadas, a polícia, os professores, o judiciário, etc. Ou seja: o funcionalismo publico não verá um aumento de salário por pelo menos dez anos. Rossi calcula que no fim desse período, sobrará apenas 1% para pagar todos os demais setores. Incrédulo, ele acredita que a própria PEC não se sustentará e será revogada, pois não é factível com os gastos reais. O Brasil precisa mesmo de um regime, mas onde podemos e devemos cortar calorias? O economista Felipe Rezende, professor de economia na Hobart & William Smith Colleges em Nova Iorque, diz que a PEC não irá tratar a doença. Ele

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explica que é como o pai ou a mãe que diminui a mesada de um filho na esperança de que irá gastar melhor esse dinheiro. Portanto, a PEC 241/55 não é um Novo Regime Fiscal. Se fosse, efetivamente, todos os pontos seriam trazidos à tona. Pedro Rossi, outra vez, enfatiza a necessidade de se pensar na qualidade dos nossos gastos. Sabe-se que o Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo, maior até do que em países mais pobres e com uma inflação maior do que a nossa. Ele oferece então uma alternativa: “É necessário fazer sacrifícios, mas eles não dizem quem vai sangrar nessa história”. Estamos sempre quebrando recordes: além da maior taxa de juros, somos também o país que mais impõe tributos sobre bens e serviços, colocando-nos, assim, entre as nações mais desiguais do mundo. O Governo sustenta a narrativa da PEC. Afirma que essas medidas retomarão a confiança dos investidores estrangeiros, e esses investimentos suscitarão mais empregos. Consequentemente, o Brasil voltará a crescer. Mas essa é uma maneira muito discreta de se dizer que o Governo está lavando as mãos: toda a responsabilidade e pressão recairão sobre o setor privado. Como se o Brasil fosse um país desenvolvido e tivesse Saúde, Educação, Segurança e Infraestrutura suficientes para ficar ao sabor dos ventos internacionais, nos braços do neoliberalismo.

SOLUÇÕES Por que, então, colocar toda a culpa da crise nos itens de necessidade básica do brasileiro? Precisamos diferenciar os gastos: há aqueles que podemos diminuir e cortar, para a saúde da nossa economia, e há aqueles que são investimentos para o futuro. Afinal, como desenvolveremos um mercado de trabalho eficiente sem uma boa educação? Sem uma boa saúde acessível a todos, como teremos força para o mercado de trabalho? E sem infraestrutura, como vamos competir com o mercado estrangeiro? Nessa PEC, não há sequer uma cláusula de escape que preserve a população de catástrofes, epidemias, ou outra crise econômica, como aconteceu em 2008/2009. De que lugar o dinheiro sairá para situações de emergência? O Governo tem pressa. Mal a PEC chegou à Câmara dos Deputados, e prontamente foi endossada por um número acima do necessário. Agora ela descansa em banho -maria nas mãos dos senadores e, ao que tudo indica, será aprovada como tanto deseja Henrique Meirelles, à direita do pai, Michel Temer. Mas por que tanta rapidez numa questão tão séria e que afetará a todos de forma tão profunda? Não há dúvidas. O Congresso ainda está surfando na maré “boa” da crise política brasileira. Vinte anos estão à nossa frente e determinarão o futuro de nosso país, ou pelo menos dez, como os conservadores preferem enfatizar. Que essa não seja, então, outra década perdida. Que um projeto concebido às pressas não signifique uma prisão. Se uma PEC incomoda muita gente, uma PEC de 20 anos incomoda muito mais.


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- RELIGIÃ

VOZ DAS RELIG ESPIRITISMO, UMBANDA E CANDOMBLÉ BUSCAM

Graziano Magalhães

VISIBILIDADE REPORTAGEM Ana Carolina Petry EDIÇÃO Amanda Soares DIAGRAMAÇÃO Julie Tsukada

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universidade, em sua extensa pluralidade cultural e racial, cria um ambiente saudável de diálogo em relação às manifestações religiosas da comunidade universitária. No âmbito das discussões teóricas, isso também acontece. No entanto, este fato não é regra na prática religiosa, afinal, o espaço universitário é um local de livre expressão. É por isso que, nele, grupos religiosos católicos e evangélicos se encontram em seus pátios e áreas externas. Porém, essa mesma realidade não dá espaço às religiões de matriz africana e espíritas. Sabe-se que há umbandistas, candomblecistas e espíritas na Universidade Federal de Goiás (UFG), mas não há um conjunto de pessoas que se reúna a fim de cultuar essas religiões. Então, será que realmente a Universidade está fazendo seu papel de criar um ambiente saudável? A não-existência de grupos de encontro dessas religiões é problemática e sintomática. “Mostra que nossa sociedade exclui o que não conhece”, diz Bárbara Luiza, 19 anos, universitária e espírita. Há uma omissão da instituição e dos estudantes quanto aos vácuos sociais nesse quesito. “Isso me demonstra a falta de maturidade e de empoderamento”, afirma Yordanna Lara, 31 anos, mulher negra, universitária e umbandista. Tal fato reflete o quanto as religiões espíritas e afro-brasileiras ainda são estigmatizadas pela sociedade. PRECONCEITO A cronologia da história humana é embasada em antes e depois de Cristo, mostrando a enorme influência do cristianismo na sociedade. Esse predomínio perdura até hoje, visto que, segundo o censo de 2010, 64,6% da população brasileira é cristã católica. Enquanto que apenas 2% é espírita e 0,3% umbandista e candomblecista – esta porcentagem permanece a mesma desde 2000. Em

Abraço de um Orixá em festa do Ca


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IGIÃO -

IGIÕES MARGINALIZADAS

9 Gilson Mendes

decorrência desse caráter cristão marcado pelo catolicismo, religiões nãocristãs não possuem a visibilidade que deveriam ter. Principalmente devido ao preconceito, realidade que muito se reflete na universidade. “Recebi vários olhares e ouvi alguns insultos tanto no trajeto quanto na própria faculdade”, diz Ana Cláudia Azevedo, 21 anos, universitária e candomblecista. No período de iniciação do Candomblé, é necessário o uso de certas indumentárias, como pano na cabeça e roupas brancas. Quando Ana Cláudia foi à faculdade com esses artigos, ela recebeu ofensas. Além da intolerância direta, vinda de insultos e olhares, há o preconceito que se manifesta por meio da tentativa de persuadir alguém a trocar de religião. Essa insistência para a mudança de hábitos religiosos, que desvela intolerância, aconteceu à Bárbara, que professa a fé espírita. CONVIVÊNCIA Segundo Lethycia Dias, universitária e espírita-umbandista, a vivência na UFG a fez enxergar as religiões de forma mais crítica. “Me dei conta de como muitas vezes a religião acaba sendo instrumento de opressão e de discriminação quando as pessoas a interpretam de forma errada”, conta. Na busca por empoderamento e res-

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Salão onde se pratica ritual do Candomblé, religião de origem africana

Conhecer outra religião não significa se converter a ela, mas, sim, entender a visão de mundo daquelas pessoas, deixando de lado os preconceitos.

peito, Yordanna vê em sua formação e vivência como historiadora e umbandista, uma oportunidade. “Devo reconstruir, em alguma instância, o passado dos meus ancestrais e trazer dignidade às suas vozes e às suas manifestações, uma vez que fomos duramente silenciados”, explica ela. A convivência na UFG entre pessoas de crenças religiosas distintas pode ser desagradável. Ana Cláudia, candomblecista, diz que convive mais com pessoas pertencentes ao Candomblé e à Umbanda, “já que as pessoas que são cristãs têm uma certa aversão a pessoas que são de religiões de matriz africana”. Em contrapartida, a convivência também pode ser agradável e até gerar um conhecimento mútuo, por meio do qual se aprende a ouvir e a respeitar diversas crenças. É importante que se desconstrua a intolerância, a fim de conceber uma do Candomblé

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LETHYCIA DIAS Estudante da UFG

base sólida para um ambiente mais diversificado na universidade. IDENTIDADE A existência da religião, assim como sua ausência, forma identidades. Faz o indivíduo se reconhecer como pessoa, identificando seu espaço no mundo. Também pode fazer com que o fiel compreenda as raízes que o originaram. É também uma forma de empoderamento pessoal e de elucidar comportamentos. Para Bárbara, ser espírita faz parte de sua formação como pessoa e também está presente na leitura que desprende-a do mundo. Ambos – Espiritismo e Umbanda – fazem parte da história de Lethycia. Após um acontecimento que impactou a ela e sua família, Lethycia encontrou conforto e acolhimento na prática espírita.

O empoderamento dentro da religião acontece quando é iniciado o processo de desmistificação da cultura do seu povo, assim como o crescimento de ligação com suas raízes. “A partir do Candomblé pude reconhecer o meu lugar nesse mundo e principalmente a contribuição dos meus ancestrais”, disse a candomblecista Ana Cláudia. O fato é que, a partir de manifestações religiosas, acontecem um autoconhecimento e uma autoafirmação. Há um autoconhecimento daquela crença e, consequentemente, as existências se tornam

mais empoderadas. No caso das falas aqui expostas há ainda outra nuance: o empoderamento e a consciência de si são dados às mulheres, o que contribui para a luta contra o machismo. Permitir as manifestações negras na UFG é uma forma de desconstruir o preconceito contra essas religiões. É preciso buscar conhecimento de pluraridades. “Conhecer outra religião não significa se converter a ela, mas, sim, entender a visão de mundo daquelas pessoas, deixando de lado os preconceitos”, disse Lethycia.

Número de brasileiros em cada religião Católica Apostólica Romana ......................................... 123.280.172 Evangélicas ..................................................................... 42.275.440 Espírita ........................................................................... 3.848.876 Umbanda, candomblé e religiões afrobrasileiras ......... 588.797 Outras religiões .............................................................. 5.185.065 Sem religião .................................................................... 15.335.510 Fonte: Censo 2010 / Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE)


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- CULTURA -

Universitários no exterior Thaís Alves

Por meio dO programa de intercâmbio, alunos conheceM outros países REPÓRTAGEM Fausto André EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

Cainã Marques

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Lorena de Souza

A jornalista Thaís Alves apreciando a paisagem de Porto em seu intercâmbio universitário Segundo o relatório da CAI de 2015, 49 estudantes estrangeiros participaram de programas de mobilidade e 477 estudantes em programas de mobilidade no exterior. Para tentar atrair mais alunos estrangeiros na UFG, foram abertas três disciplinas na pós-graduação e uma na graduação em Inglês, além do Curso de Português para Estrangeiros, existente desde 2014. O estudante que quiser se candidatar a alguma viagem de intercâmbio deve ter a matrícula com a UFG devidamente regularizada, o mínimo de 20% do curso concluído, bom rendimento acadêmico, compreensão da língua do país escolhido e um plano de trabalho aprovado pela coordenação do seu curso. ADAPTAÇÃO

THAÍS ALVES Jornalista

apenas um mês e, como o pessoal do grupo de brasileiros que foi comigo já havia se conhecido antes da viagem, a adaptação foi bastante rápida”, conta a jornalista. Já Lorena de Sousa, graduanda de Jornalismo, estudou no Instituto Politécnico do Porto, fez sua viagem em agosto de 2015 e voltou em fevereiro deste ano. Ela conta que também teve dificuldades no início, em especial pelas relações interpessoais entre os portugueses serem diferentes dos laços estabelecidos pelos brasileiros. Todavia, ela afirma que, a viagem em grupo foi de grande ajuda para a superação dessas dificuldades. Lorena ainda cita a dificuldade em morar em uma casa com dez garotas de diferentes lugares em um país estrangeiro. “Não foi uma das coisas mais fáceis, mas me acostumei rápido. Por conviver com muitos brasileiros, me adaptei com mais facilidade”, afirma a estudante. Thaís conta a similaridade das palavras que os brasileiros têm o costume de falar cotidianamente, mas que os portugueses entendem em um sentido ofensivo: “Fui comprar um chip de celular lá e chamei a atendente de moça, e depois descobri que lá

isso é entendido como um xingamento”, conta, mencionando também o sotaque pesado dos portugueses. FUTURO Thaís considerou a experiência maravilhosa e recomenda à outros estudantes “É como se eu não fizesse mais parte só do Brasil, e sim de qualquer lugar. Voltei, dessa experiência, uma outra pessoa! Acho que todos deveriam passar por isso”. Enquanto Lorena conta que, por ser uma cidade com bastante tradição de receber intercambistas, sentiu-se acolhida por essas pessoas que estavam na mesma situação que ela, ou seja, que também eram estrangeiros: “De qualquer forma, absorvi uma experiência humana e cultural impagável, conheci lugares e pessoas que jamais imaginaria, aprendi coisas que nunca aprenderia aqui em Goiânia”. Reprodução

Lorena durante o intercâmbio

Embora haja uma grande diversidade de universidades estrangeiras que podem, dependendo do curso, ofertar as disciplinas necessárias ao aluno de graduação, o destino favorito dos estudantes ainda é Portugal, que recebeu nos últimos dois anos 78 estudantes da UFG e atualmente tem sua maior comunidade estrangeira formada por brasileiros. Thaís Alves, formada em Jornalismo pela UFG, fez seu intercâmbio na Universidade do Porto, em Portugal. A profissional conta que a presença de um grande número de estudantes brasileiros foi importante, especialmente para que ela se acostumar aos novos hábitos. “As dificuldades que eu tive duraram

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É como se eu não fizesse mais parte só do Brasil, e sim de qualquer lugar

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Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio da Coordenadoria de Assuntos Internacionais (CAI), oferece todos os anos aos seus estudantes a possibilidade de realizarem viagens de intercâmbio, para estudar em universidades de países estrangeiros. Também são disponibilizadas vagas para alunos estrangeiros realizarem suas viagens de estudos para o Brasil. Nos últimos dois anos, mais de mil estudantes já participaram do programa, que possui associação com alguns países de língua portuguesa, espanhola, incluindo parcerias com o Mercosul e Canadá. Há também ligações de estudo para países conveniados e não-conveniados, como a Universidad de La Habana, em Cuba, a University of Agder, na Noruega e a Universidade de Veliko Târnovo, na Bulgária.


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- CAMPUS -

Cada macaco no seu galho Alimentar os ANIMAIS do campus pode trazer AMEAÇAs a SEU BEM-ESTAR REPORTAGEM Cláudia Castro EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

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Jhessyka Monteiro

convivência entre os macacos do campus 2 da Universidade Federal de Goiás (UFG) e os humanos resultou em um relacionamento vinculado a um aspecto específico: a comida. Mesmo que a própria natureza já forneça o suficiente para que eles se alimentem, o convívio com pessoas introduziu vários ingredientes prejudiciais à saúde dos animais. De acordo com a professora da escola de veterinária da UFG, Luciana Batalha, o campus Samambaia foi construído em uma área bastante afastada do centro de Goiânia e conta com cerca de

CONSEQUÊNCIAS Quando uma pessoa oferece ao macaco comidas que não são próprias do ambiente em que ele vive, ela está afetando diretamente a saúde do bicho. O animal absorve uma quantia excessiva de glicose, gordura e outras substâncias nocivas. “Nós temos animais com obesidade e com índices de glicemia elevada, que pode levar a um diabetes, cáries e por aí vai”, diz a professora. Em uma pesquisa realizada em 2008 pelo projeto De Volta Pra Natureza, criado pela professora doutora Marilda Shuvartz, do Instituto de Ciências Biológicas da UFG, foi detectado que a maioria desses animais possui alguma patologia. O estudo foi feito com cerca de 20 macacos. Para manter o controle populacional foi realizado o processo de vasectomia em todos os machos capturados para a pesquisa.

Segundo a professora Batalha, que é especialista em animais silvestres, a população de macacos-prego que povoam o bosque Auguste de Saint-Hilaire, no campus 2, é extremamente grande, pois os animais de vida livre da mesma espécie costumam formar bandos de, no máximo, 10 indivíduos. Apesar da quantidade incomum de animais no bando, os macacos-prego do bosque Auguste convivem em harmonia e isso ocorre por eles não precisarem disputar comida. Com a interferência dos frequentadores do campus, eles têm um fácil acesso ao alimento. De acordo com Batalha, isso coloca em risco toda a comunidade. FUTURO Quando a disputa por alimento não é mais necessária, ocorre uma alteração na seleção natural da espécie. “Quando não se tem mais essa seleção, começa-se a provocar uma queda na qualidade genética daquela população. Então, daqui alguns anos, pode-se ter um extermínio em massa, por exemplo”, explica a professora.

HISTÓRIAS

esde que nós, humanos, nos inserimos nesse cenário silvestre, os macacos se adaptaram a esse relacionamento inesperado. Eles seguem convivendo com os universitários. Quando necessário, eles intimidam os transeuntes do bosque, que são ameaças que encontram pelo caminho. O grande atrativo que une os estudantes e os animais do bosque é a alimentação. Mesmo que na natureza haja o sustento necessário a eles, os pães de queijo, bolachas e a coca-cola acabam sendo mais sedutores. Como essas guloseimas não são exatamente fáceis de conseguir, os alunos acabam, por vezes até involuntariamente, sendo os fornecedores. Os calouros, distraídos e desprevenidos, são as principais vítimas. Normand Almeida, estudante de Letras, ainda no primeiro período, encantado com as belezas do campus, comprou dois pães de queijo e se sentou para comer um, enquanto deixou os outros em cima do banco. Apenas alguns segundos foram suficientes para que o pequeno macaquinho se apossasse da quitanda.

O mesmo aconteceu com as amigas Amanda Gomes e Jéssica Pereira, alunas de Geografia. Decididas a não gastarem dinheiro com lanche na faculdade, trouxeram biscoitos de casa. Sentaram-se em volta de uma das mesinhas dispostas pelo pátio e conversavam enquanto saboreavam as bolachas. Entre uma palavra e outra, uma mãe macaca, com seu filhotinho agarrado às costas, se enfiou no meio e pegou todo o potinho. Às meninas, restou apenas a memória do sabor de meio cookie. Já Janaína de Oliveira, estudante de jornalismo, vivenciou um episódio um pouco mais traumático. Após comprar o seu lanche, um pão de queijo e um café, ela se sentou em uma das cadeiras dispostas ao lado de fora da lanchonete. Janaína nem havia começado a comer ainda, quando um macaco pulou agressivamente em cima da mesa. Houve gritos de ambos os lados. O café: espalhado pela mesa e também na calça branca dela. O pão de queijo: espatifado no chão. O macaco, com o pão de queijo na mão, sumiu entre as folhas das árvores. Janaína: passou o dia todo suja de café e com fome. Bem, a hostilidade que assustou Janaína, com certeza, não assusta Edinete Alves, a “tia” que vende comidas e bebidas no pátio das faculdades de ciências humanas. Segundo ela, foi preciso travar uma batalha contra os animais,

A seleção genética de má qualidade acarreta em uma população suscetível a doenças, pois, conforme Batalha, sem a competição intraespecífica – ou seja, entre animais da mesma espécie –, os mais fracos terão as mesmas condições de se alimentar do que os mais fortes e, assim, se reproduzir. Dessa forma, essa genética mais “fraca” é transferida aos descendentes, formando uma população menos resistente. REEDUCAÇÃO Muitas vezes, a pessoa não tem a intenção de alimentá-los, mas os bichinhos acabam roubando a comida. Para evitar situações como essa, a professora afirma que é necessário reeducar a população, de forma que os estudantes, professores e servidores da UFG evitem comer em ambientes externos. Quando forem levar algum lanche de um lugar para outro, eles não devem carregá-los em sacos plásticos, mas, sim, dentro da mochila ou da bolsa. “Ora, é muito mais fácil reeducar uma população de humanos do que os bandos de macacos”, esclarece Batalha.

Carlos Siqueira Alves

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70 macacos que habitam os 200 mil metros quadrados de mata, concentrada no interior da universidade. Os animais que vivem no bosque são da espécie sapajus libidinosus, popularmente conhecidos como macaco-prego.

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Macaco-prego na Reitoria da UFG para que ela conquistasse o território e pudesse vender sua mercadoria em paz. As quitandas de Edinete eram um grande fascínio para os macacos. No início, apareciam alguns a fim de conquistar o carisma de alguém e receber algo em troca. Mas, quando essas conquistas foram se tornando mais difíceis, eles começaram a aparecer em bandos a fim de apoderar-se dos lanches. E, assim, além de todas as bolsas com comidas e bebidas, Edinete começou a carregar uma peça inusitada para uma vendedora ambulante: uma corrente. Ela batia o objeto na mesa e, pelo barulho, conseguia espantar os animais.

Certo dia, aproximadamente 30 macacos, juntamente com o que parecia ser o líder, um macaco maior, cercaram a barraquinha de Edinete. A intenção era intimidá-la, mas Edinete protegeu seus produtos como uma mãe protege seus filhos. Se eles chacoalhavam as árvores, ela batia os pés e rodava a corrente. Se eles gritavam alto, ela gritava mais alto ainda. Até que, em certo ponto, o tal líder desistiu. Desde então, Edinete Alves “conquistou o respeito” dos macacos e se auto nomeou “chefe da macacada”.


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- EDUCAÇÃO-

Um leque de oportunidades e a prática: os desafios em se conseguir um estágio

REPORTAGEM Amanda Sales EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO Larissa Ariel

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preocupação com o mercado de trabalho ronda os estudantes universitários ao longo de suas graduações. O estágio surge, nesse contexto, como uma oportunidade de colocar em prática os conteúdos teóricos aprendidos com o curso e como uma preparação para o mercado que aguarda o aluno após sua formação acadêmica. Estagiar pode parecer um processo simples, mas levando em conta as dimensões de uma instituição como a Universidade Federal de Goiás, há muitos impasses que separam o aluno interessado da vaga disponível. Para solucionar esses problemas, a Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) criou uma coordenação própria para auxiliar o estudande na hora de encontrar estágios em suas áreas. ESTÁGIOS A Prograd conta com uma coordenação de estágios que atua juntamente com as coordenações de cada curso, fornecendo apoio e regulamentação da prática na universidade. Além disso, a UFG inaugurou, nesse ano, uma Central de Estágios para facilitar a comunicação entre os estudantes e as empresas. Essa central, que cuida dos estágios não obrigatórios, reúne dados e vagas disponíveis de empresas conveniadas à universidade e os disponibiliza em um portal na internet. As vagas podem ser encontradas por curso e o site dispõe também de informações como a remuneração de cada oferta, como o período mínimo para estagiar em cada curso e como os documentos necessários para o aluno interessado. O coordenador de estágios da UFG, professor Lawrence Gonzaga, ressalta a importância da Central: “com a criação desse departamento, houve um ganho enorme para os estudantes. Como o próprio nome diz, ela centraliza as informações. A gente busca oportunidades de vagas, socializa essas oportunidades com os estudantes na rede e faz uma divulgação em massa para eles no Facebook e Twitter”. A Central de Estágios é atualizada semanalmente pela coordenação e por isso o estudante conta sempre com informações recentes. O órgão também é importante em um nível institucional, para

que a UFG tenha registro e controle de seus alunos que já estão estagiando. Para que a instituição saiba quais áreas têm mais, ou menos, demanda de estagiários.

Wagner Tamanaha

Entre a teoria

IMPORTÂNCIA O estágio é, muitas vezes, a primeira experiência profissional do aluno. E por isso oferece noções como agilidade, prazo, ritmo e trabalho em equipe. Essas noções podem passar em branco ao longo da aprendizagem acadêmica, focada para o ensino de teorias. Mas isso não quer dizer que a base teórica é deixada de lado no estágio, pelo contrário: grande parte dos estudantes enxerga o trabalho como estagiário como uma maneira de conciliar teoria e prática. “O estágio é importante para aprender a lidar com a rotina e com casos reais. Nas aulas tudo é ensinado de outra forma, como se tudo fosse padrão e exato, mas no estágio nós lidamos com o dia-a-dia e vemos que muita coisa é diferente”, ponderou a estudante de Biomedicina Talissa Sanches.Talissa estagia no Laboratório de Patologia Clínica da UFG, um dos muitos órgãos da universidade que oferecem vagas de estágio. Mas é possível que o estudante consiga estagiar também em empresas ou em órgãos públicos que fazem parceria com a faculdade. É o caso de Letícia Povoa, estudante de Jornalismo que encontrou na assessoria de imprensa na Adufg. Ela afirma que “a formação da UFG é pouco ou nada mercadológica” e que, por isso, o estágio é uma oportunidade ímpar de se ter contato com o mercado de trabalho. Esse contato pode, muitas vezes, não ser do modo como o aluno espera. Apesar de vários cursos possuírem disciplinas de orientação de estágio, elas não oferecem noção do que vai ser enfrentado no trabalho diário.Além da experiência no mercado de trabalho e da associação entre teoria e prática, o estágio pode “aprimorar a capacidade de relacionamento interpessoal” como lembra Lucas Vasconcelos, estudante de Direito e estagiário no Tribunal de Contas dos Municípios. DIFICULDADES Os estudantes listam, em primeiro lugar, a deficiência na quantidade de vagas como dificuldade para quem precisa estagiar. A estudante de Jornalismo recém- formada, Thais Alves, estagiou como assessora na Secretaria Municipal de Saúde e reconhece que não há vagas para todos. Ela conta sobre a experiência durante a graduação: “quem pegava a disciplina de supervisão de estágio era uma turma de 50 alunos e não era essa turma toda que ia ter experiência de estágio”. A coordenadora de estágio do curso, professora Ângela Teixeira, reconhece a questão das vagas como um problema. A professora lembra que a UFG foi

Jovem em busca por oportunidades de estágio

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O estágio é importante para aprender a lidar com rotina e casos reais. TALISSA SANCHES

Estudante de Biomedicina da UFG contra a prática de estágio obrigatório por muito tempo, temendo a exploração do trabalho do estagiário. Mesmo assim, muitos cursos adotam a obrigatoriedade do estágio. Uma decisão que cabe à diretriz curricular de cada graduação, como à supervisão de seus estagiários. Essa supervisão, quando acontece em ambientes fora da universidade, pode ficar defasada. É quase impossível que cada faculdade mantenha um controle efetivo sobre todos os seus alunos em situação de estágio acadêmico e, desse modo, o aluno fica um pouco à mercê da sorte.Outra questão é que muitos estudantes acabam estagiando em esferas com as quais não têm afinidade por não conseguir outra oportunidade. A acadêmica de Biomedicina, Wanessa Galvão, estagia no campo de análises clínicas. “Pelo menos na área de biológicas, são poucas as vagas ofer-

tadas. A maioria está mais relacionada a pesquisas que são desenvolvidas dentro da universidade. Seria interessante já termos mais contato com estágios voltados para a área de atuação”. Os horários também incomodam os estudantes. As cargas horárias podem ser muito extensas e acabar atrapalhando o desempenho do aluno em outras disciplinas acadêmicas. Além disso, as condições de trabalho e a falta de liberdade de atuação são lembradas como empecilhos durante a prática do estágio. A professora Ângela se recorda ainda de outra problemática: “pode ser que haja uma descompensação, porque não há necessariamente um vínculo imediato entre a área em que se está estagiando e a área que se vai desenvolver depois de se formar”. De acordo com ela, isso pode desmotivar o aluno em relação ao mercado de trabalho de seu curso.

Três princípios para um bom estágio, por Ângela Teixeira: 1. Estar no período adequado:

é importante respeitar o período mínimo de estágio que cada curso determina. Assim, chega-se até o estágio com todo aparato teórico necessário para orientar a prática; 2. Ter bom aproveitamento das matérias do curso: o aluno não deve apenas ser aprovado na matéria, mas ter apreendido o máximo de cada disciplina.

3. Ter personalidade ética. A

professora explica: “a questão da personalidade quer dizer a postura ética dentro do ambiente de trabalho. Significa se dedicar, se mostrar interessado em aprender. Mostrar que você não está ali só para cumprir uma obrigação. Então, essa questão pessoal, de saber lidar com pessoas, ter responsabilidade, ter essa postura ética, é o fundamental.


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GOIÂNIA, DEZEMBRO DE 2016

- EDUCAÇÃO -

ADAPTAÇÃO INFANTIL NA UFG

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ENSINO BÁSICO PARA CRIANÇAS NA UNIVERSIDADE PASSA POR MUDANÇAS REPORTAGEM Ludmila Lobo EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada á Educação - CEPAE teve início em 1968 vinculado à Faculdade de Educação da UFG, e tem como propósito ser um campo de aplicação de ensino básico para crianças a partir dos seis anos de idade, atendendo as necessidades da Universidade, em especial, das licenciaturas. É um espaço para o exercício, e trocas entre acadêmicos e comunidade, por meio de pesquisas, projetos de extensão, desenvolvimento de currículo pautado em uma educação inovadora em que ambos se beneficiam. E pensando também na necessidade de atender crianças abaixo dos seis anos, surge em 1989 a antiga creche da Universidade Federal de Goiás, que visava atender, principalmente, filhos de professores, técnicos administrativos e alunos da UFG. Em fevereiro de 2013, a Creche se vinculou ao CEPAE e se tornou o Departamento de Educação Infantil – DEI, estendendo o atendimento a comunidade em geral. A t u almente, segundo Claudiane Corrêa, secretária administrativa, só o CEPAE atende 680 alunos e no DEI são 80, no total são 760. E esse número de vagas torna a entrada, em especial de crianças no ensino infantil, muito limitada, mas de acordo com o diretor do CEPAE, Prof. Dr. Alcir Horácio da Silva, a UFG ao não ter obrigação de fornecer o Ensino Básico não pode se comprometer com o número de vagas. AUXÍLIO Todavia, dentro da própria instituição existem pendências importantes que comprometem o progresso educativo das crianças e o auxílio aos pais que necessitam desse serviço. A idade mínima para ingressar no DEI era a partir dos 4 meses e o atendimento acontecia até os 4 anos e 11 meses de idade, e para o CEPAE a partir dos 6 anos. Porém, nesse intervalo de um ano entre a educação infantil e a educação fundamental, os alunos ficavam sem atendimento, e eram afastados, retornando aos 6 anos completos para a educação fundamental no CEPAE. Isso desorganizava não somente as ati-

Creche localizada na Universidade Federal de Goiás, Campus Samambaia

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Roberta Rodrigues

As crianças eram obrigadas a dormir depois do almoço... Na Creche da UFG esse tipo de situação não acontecia. LARA FRANÇA

Pedagoga do IFG vidades profissionais dos pais, quanto ocasionava problemas de adaptação da criança em outra instituição. “No início do ano meu filho, atualmente com 5 anos e 7 meses, foi para uma creche conveniada, mas não se adaptou com a rotina, pois as crianças eram obrigadas a dormir depois do almoço e ele não tinha esse hábito, e não conseguiu desenvolve -lo. Na creche da UFG (DEI) esse tipo de situação não acontecia” nos conta Lara França, pedagoga do instituto federal de educação de Goiás (IFG). Além disso, Lara ainda se deparou com outro problema do qual a creche conveniada não conseguia lidar. “Fomos chamados para uma reunião com a direção, coordenação e professora na qual disseram que meu filho era muito inquieto e que provavelmente tinha Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDH). Isso nos trouxe muitas angústias. Fomos à um neurologista, fizemos exames, iniciamos um tratamento com psicólogo e nada foi constatado, por fim meu filho só era uma criança ativa e muito inteligente”. Após essa experiência Lara ainda tentou uma creche do município, mas também se decepcionou, pois apesar das proposta da instituição ser bastante interessante, não era o que acontecia na prática. E ainda, nesse choque de mudança educacional, o filho de Lara pedia todos os dias para sair

do local. “As atividades eram monótonas, enfadonhas e desinteressantes e as professoras não sabiam o que fazer”. Então, tiveram que se organizar para colocar seu filho em uma escola particular, que trabalha em uma perspectiva “alfabetizante”, “não era o que queríamos, mas foi onde ele melhor se adaptou, pois apesar de iniciar a alfabetização precoce ele também tem aulas de educação física, que adora”. Para resolver tal situação, muitos pais que precisam do serviço do DEI da UFG recorreram ao Ministério Público Federal para que seus filhos não fossem desvinculados ao completarem 5 anos, e que o CEPAE junto ao DEI tomassem as devidas providências. Em relação a isso, conforme o diretor do CEPAE, em 2016 uma nova turma foi aberta, mesmo em meio as dificuldades de infraestrutura, aos alunos com 5 anos completos. Porém, a ação não se efetivou para ser continuada e será discutida para aprovação de edital em outubro de 2016 pelo conselho diretor. Tal edital prevê outras consequências para que se aprove a continuidade do ensino infantil para o fundamental, como a exclusão do berçário, crianças de 04 meses a 11 meses, o que poderá causar outros transtornos para os pais. Isso sem contar que para a implementação desse projeto, outras medidas estão sendo tomadas

como a retirada do tempo integral de alguns alunos, a redução da carga horária e pontualidade de entrada e saída dos alunos. O que obriga os pais, mesmos contando com a vaga de seus filhos no DEI em apenas um período, terem que procurar outras saídas como levar para o próprio trabalho ou deixar com parentes. Apesar desses problemas o DEI se destaca por um processo de educação pautado no desenvolvimento de habilidades das crianças e não apenas em seu assistencialismo, como acontece pelas instituições municipais, Centros Municipais de Educação Infantil-CMEIs da prefeitura de Goiânia. Estes apesar de ter um projeto que garante um atendimento integral durante, no mínimo, 10 horas de atividades diárias às crianças entre 0 e 6 anos, ainda falta atenção ao desenvolvimento motor, intelectual e humano. Isso é notório quando uma criança é obrigada a sair do DEI e ir para CMEIs, pois há uma mudança drástica não só de ambiente, mas também nas atividades a realizar, como aconteceu com o filho de Lara França. No entanto, conforme Simone Cristina, assessora de comunicação do sistema de bibliotecas e que tem três filhos no DEI, apesar das mudanças e promessas ainda falta diálogo entre pais e filhos no DEI em conjunto com a direção do CEPAE. Pois apenas algumas pessoas que pertencem a Associação de Pais e Mestres que podem opinar e falar o que acham importante nas reuniões. A reivindicação de Simone aponta que com a vinculação ao CEPAE questões específicas em relação às crianças não são levadas para o conselho e estas são tratadas da mesma forma como se fossem alunos maiores, o que impede a melhoria do atendimento a esse público.


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samambaia

GOIÂNIA, DEZEMBRO DE 2016

- EDUCAÇÃO -

“A gente conversa, a gente se entende” Matheus Carvalho

Estudantes contam SOBRE dificuldades e motivações no aprendizado de outro idioma

conhecimento de uma segunda língua nos dias de hoje é essencial para qualquer pessoa. Existe um provérbio tcheco que diz: “você vive uma nova vida por cada nova língua que você fale. Se você sabe apenas uma língua, você vive apenas uma vez”. Com a globalização, as diferentes culturas estão a todo o momento se integrando. Falar apenas o idioma materno acaba limitando o indivíduo. Um exemplo dessa limitação foi o caso de Rafaella Mendes, 19 anos, estudante de Farmácia da Universidade Federal de Goiás (UFG), que, durante um curso técnico integrado ao ensino médio no Instituto Federal de Goiás (IFG), perdeu a oportunidade de entrar para um projeto de iniciação científica por não saber falar inglês. “Fiquei duas semanas indo ao laboratório até o dia em que a professora responsável me passou um artigo em inglês. Quando contei que não tinha conhecimento acerca daquelas palavras, ela me olhou com insatisfação e me dispensou”, relatou a estudante. O choque de realidade foi tão grande para Rafaella que após o ocorrido ela se matriculou no Centro de Línguas da UFG. A estudante conta ainda que sempre soube da importância de uma segunda língua, entretanto só depois de perder essa oportunidade é que realmente percebeu que aprender outro idioma seria fundamental. “Hoje eu vejo como uma segunda língua é importante, tanto para o desenvolvimento acadêmico quanto profissional”, concluiu. DIFICULDADES O caso de Rafaella não é isolado. Muitas pessoas, em especial os estudantes, perdem muitas oportunidades de emprego, de projetos ou de viagens por não ter conhecimento de um segundo idioma. As maiores dificuldades apresentadas pelos estudantes são os preços exorbitantes e a pouca disponibilidade de horários para cursos presenciais. Para solucionar essas questões, foram elaborados diversos cursos de língua onlines e gratuitos. É o caso do My English Online, criado pelo Ministério da Educação (MEC) em março de 2013, com o objetivo de atender estudantes

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Matheus Carvalho, estudante de Engenharia Civil da UFG, em Lyon, na França

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REPORTAGEM Juliana França EDIÇÃO Dayane Borges DIAGRAMAÇÃO Alline Flores

Eu creio que o principal ganho que você pode ter é justamente conhecer pessoas do mundo inteiro e poder se comunicar com elas. MATHEUS CARVALHO Estudante de Engenharia Civil

de graduação e de pós-graduação de instituições de ensino superior que desejam aprender inglês. O curso na web conta com vídeos curtos e explicativos, áudios para auxiliar a pronúncia das palavras, além de atividades avaliativas. De acordo com Jessyca Oliveira, 19 anos, estudante de Psicologia da UFG, as principais vantagens encontradas no My English são a flexibilidade de horários e o não pagamento de taxas. “Optei pelo curso online pela falta de dinheiro e de tempo. Os cursos de línguas não são baratos e isso, somado à minha falta de disponibilidade de horários por causa do curso de graduação integral, me fez procurar outra opção para aprender um segundo idioma”, conta a estudante. Jessyca fez cursos online de inglês e de alemão. Ela explica que é possível fazer suas aulas a qualquer dia e a qualquer hora. “Porém, em relação às desvantagens, o aprendizado virtual é um pouco mais difícil pela falta de espaço pra tirar dúvidas com alguém que entenda do assunto, por exemplo”, conclui. MOTIVAÇÃO Para se aprender qualquer idioma, seja de forma online ou presencial, é preciso muita dedicação. O estudante

de Engenharia Civil da UFG, Matheus Carvalho, 21 anos, aprendeu francês em um ano, com aulas presenciais e curso online, e a alcançou seu objetivo: um intercâmbio no país de Sartre e de Simone de Beauvoir. “Saber outro idioma foi o ponto chave para vir para a França, já que as aulas aqui são todas em francês”, ponderou. Matheus afirma que possuir boas notas no curso de graduação foi importante para conseguir uma bolsa de estudos na Aliança Francesa para aprender o idioma. Ele conseguiu ser aprovado no exame de nível e foi selecionado. “Eu encontrei no francês uma oportunidade, já que era uma língua que poucos buscavam conhecer”, completa. Matheus conta ainda que fez quatro anos de inglês antes de entrar na faculdade, mas que possui muita dificuldade nessa língua. “Comecei o curso de inglês ainda no ensino médio. Minha preocupação era com o mercado de trabalho, então decidi estudar inglês para ter um currículo melhor”, explica. “Já o francês foi diferente, veio muito mais natural que o inglês, e isso me motivou muito. Eu fiquei apaixonado e mergulhei de cabeça para aprender”, conclui.

IMPORTÂNCIA A identificação com o idioma escolhido pode ajudar muito no aprendizado, como aconteceu com Matheus. Entretanto, a professora de inglês do Centro de Línguas da UFG, Mariana Bênia, afirma que ainda hoje existem alunos que estudam de maneira obrigatória e acabam desistindo do curso. Porém, ela explica que percebeu uma mudança com o passar dos anos. “Há algum tempo, muitos alunos vinham estudar inglês um pouco ‘obrigados’, mas hoje já vejo que os alunos vêm estudar essa língua por outros motivos, como realização de viagens, inserção no mercado de trabalho e aquisição de conhecimento, já que se dedicar a um novo idioma é também estudar um pouco sobre outra cultura”, conta a professora, que há oito anos ministra aulas no Centro de Línguas da UFG. Essa nova geração de estudantes acredita que é fundamental incrementar um currículo com a informação de que se é fluente não somente em português. “Além disso, ter um conhecimento, ainda que básico, de uma língua pode ser importante em viagens ou até mesmo em congressos e encontros, muito comuns na vida acadêmica”, conclui Jessyca Oliveira. Contudo, aprender um novo idioma não está restrito ao mercado de trabalho ou à vida acadêmica. “Esse aprendizado faz de você uma pessoa diferente, capaz de observar novos mundos e de compreender novos costumes e novas culturas,” afirma Matheus, que completa dizendo: “Eu creio que o principal ganho que você pode ter é justamente conhecer pessoas do mundo inteiro e poder se comunicar com elas. Quando você aprende um idioma, você está se abre portas para novas oportunidades”.


samambaia

GOIÂNIA, DEZEMBRO DE 2016

- pol í tica -

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O impeachment e a dúvida do brasileiro Brasil vive momento histórico,

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‘‘ ‘‘ ‘‘ Chrisley Hernan Ximenes, 18 anos, produtor cultural

Temer não respeitou nem a Constituição, nem o eleitor, nem a sua presidenta e líder quando fez conchavo e ‘acordão’ com outros partidos. Pensa que o povo é bobo.

Aury Martins, 54 anos, pedagoga

‘‘ ‘‘ É o que temos para hoje. Então, o jeito é apoiá-lo para que, pelo menos, nesses dois próximos anos de governo, ele diminua a inflação, elefaça gerar empregos. Não vamos exigir do Temer que em 2 ou 3 meses ele arrume o Brasil, diante do enorme estrago deixado pelo governo anterior.

Wilson Lopes Barbosa, 67 anos, aposentado

A chance de uma reforma política que mude a forma de se fazer política no país ser aprovada é praticamente nula, pois não há interesse daqueles que estão no poder de tocarem essa reforma. Talvez, a gente não possa ter assim tão poucas esperanças, porque isso acaba atraindo e dando força para aqueles que prejudicam a sociedade, para aqueles que fazem com que a sociedade perca direitos! Esse é um momento de autocrítica, principalmente para os movimentos sociais e partidos de esquerda. Se eles conseguirem mergulhar nessa autocrítica, gerarão algo construtivo. A gente poderia frear essa guinada conservadora e eleger algum candidato ou candidata capaz de continuar as reformas que foram iniciadas em 2002, reformas que trouxeram direitos.

Lucas Ribeiro de Almeida, 25 anos, analista de suporte

Vejo um cenário de indefinições e crise. Tenho dúvida sobre a legitimidade do processo de impeachment e sobre a acusação de crime de responsabilidade fiscal. A esperança é de mudança administrativa, um melhor uso das fontes de renda e de melhorias para a população.

Oseas Freitas Rosa, 28 anos, administrador de TI

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Eu penso que o Brasil precisa de uma reforma política, em todo seu modo de fazer política. Tudo é ligado a questão economica e financeira, nada parte da população, os interesses nunca são os nossos.

Luiza Campos Ribeiro, 36 anos

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A Dilma estava colocando o Brasil no fundo do poço. Democracia é uma faca de dois gumes: ao mesmo tempo em que é algo bom, é um veneno para sociedade. E não é justo para honrar a democracia que um país caia no fundo do poço.

Breno Santos, 30 anos, terceirizado.

Ilustrações: reprodução

o dia 31 de agosto de 2016, o Brasil foi novamente palco de um impeachment. Dilma Rousseff, primeira mulher a chegar à presidência da república no país, foi destituída do cargo através de um processo de impeachment promovido por setores conservadores, que se articularam contra a gestão da petista baseando-se na ideia de crime de responsabilidade. Dilma Vana Roussef vinha de uma reeleição conturbada e acirrada. Outros elementos já faziam parte do argumento da oposição, comandada pelo PSDB. O mais polêmico deles foi a Operação Lava Jato. Outro argumento usado pelos opositores de Dilma era o de pedaladas fiscais, partindo-se da ideia de que houve um desrespeito à lei de improbidade administrativa e à lei orçamentária. No total, 37 pedidos foram protocolados, até que um dos processos foi aceito após o governo recusar um acordo com Eduardo Cunha, que tentava evitar sua cassação. Alguns juristas brasileiros eram contra o uso de pedaladas fiscais como motivo para improbidade administrativa, negando qualquer uso proposital por parte da presidenta, e alegando que esse tipo de operação já era feita nos governos anteriores de Lula e de Fernando Henrique Cardoso. Várias movimentações começaram nas ruas. Porém, as pessoas reagiram de forma diferente diante do fato ocorrido, de acordo com seu posicionamento político e também sua faixa etária. Um lado vê ilegitimidade nos atos de Dilma. O outro busca manter os avanços que foram consolidados nos últimos anos, relacionados às políticas públicas. Com o impeachment efetuado, o atual presidente, Michel Temer, propôs mudanças em leis trabalhistas e já preocupa os setores ligados a políticas sociais. Nesse momento, surgem opiniões diversas em variados setores, favoráveis e contrárias às mudanças.

Espero consciência da população em 2018. Acredito que todo esse processo fomentou muita discussão e isso é importante. Até lá, é importante tentar barrar qualquer tipo de retrocesso.

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Lucas Botelho

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REPORTAGEM Jefferson Ribeiro EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO

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gritante

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de opiniões é

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16OLHARES samambaia

GOIÂNIA, DEZEMBRO DE 2016

FOTOS E TEXTO

Retratos de luta

Bruno Destéfano | EDIÇÃO E DIAGRAMAÇÃO Lucas Botelho

O ato que ocorreu em Brasília surpreendeu até os mais preparados. No dia 29 de novembro, estudantes e servidores públicos foram se manifestar no Senado contra a aprovação da PEC 55 que corta gastos públicos, principalmente nas instâncias da saúde e da educação. Contudo, o que era para ser um ato pacífico se transformou em um ataque à democracia e ao livre direito de manifestação. Muitas pessoas presentes no local foram recebidas com gás lacrimogêneo e spray de pimenta, inclusive fotógrafos que registravam os acontecimentos. No mesmo dia, a proposta de emenda foi aprovada em primeira sessão com a maioria dos votos - em conjunto com o veto da lei anticorrupção. A segunda e última sessão ocorrerá no dia 13 de dezembro.


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