Jornal Samambaia - Julho de 2017

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goiânia, julho, 2017

nº 78/ ANO XVII

trabalho

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RECÉM-FORMADOS ENFRENTAM ALTO ÍNDICE DE DESEMPREGO

mobilidade

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DESAFIOS DE QUEM RECORRE ÀS BICICLETAS COMO MEIO DE TRANSPORTE

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Foto: Fausto André

jornal laboratório do curso de jornalismo da Universidade Federal de Goiás

saúde

CONVÍVIO ENTRE MACACOS E PESSOAS GERA DÚVIDAS

samambaia Iniciativa aproxima comunidade ao promover plantio de vegetais e legumes em praças e escolas Pgs. 8 e 9

Foto: Amanda França | Diagramação: Lethycia Dias | Edição de Capa: Amanda Sales, Bruna Alecrim, Pedro Ferreira

Mãos à horta


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- OPINIÃO -

ALIMENTAÇÃO COM AMOR

RUMO R

E D I T O R I A L

POR Amanda Calazans | DIAGRAMAÇÃO: Fausto André

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era de acesso à informação trouxe diversos debates para a mesa, inclusive sobre a refeição que se come durante a discussão em família. O alimento envenenado de agrotóxicos já não desce tão facilmente e alternativas populares a ele já começam a ser pensadas, como o projeto de cultivo de hortas orgânicas em comunidades de Goiânia, realizado pelo grupo ComAmor, que você conhece nesta edição do Samambaia. A consciência alimentar faz parte do despertar da atual geração sobre questões que se engolia sem resistência até pouco tempo. Entre os mitos derrubados no pro-

- CRÔNICA -

UM SALTO PARA O MUNDO POR Ana Carolina Petry Da janela do quarto a vejo abrir os braços. Espalmar o corpo todo e tocar os pássaros,

serenos, livres de preocupações, donos do céu. Ela rasga a tela de proteção, pula da sacada e cai de cabeça em um mundo justo. Já estava a observando há dias – ela andava de um lado para o outro, conversava sozinha, gesticulava para os céus. Após um momento de agitação, tudo se silenciava, ela deitava em posição fetal e assim permanecia por horas. De repente espreitava a realidade pela sacada e quase parecia que cairia, mas nunca caia. Voltava para seu mundo e ali ficava. Era visível em sua expressão a tomada de decisões ponderadamente, quase como se eu pudesse absorver todos os seus pensamentos. Acho que a observei tanto tempo que me desfiz de mim e tomei seu corpo e sentimentos como meus. Talvez seja por isso que não me surpreendi quando a vi se jogar. Na verdade, senti alívio, como se o ar passasse livremente pelas narinas depois de dias sem respirar direito por causa de uma sinusite. Foi assim, exatamente como respirar consciente dessa respiração, que me senti ao vê-la.

cesso de reflexão sobre o que comemos, está o da inacessibilidade da alimentação saudável. Prova disso é apresentada na seção Olhares, que traz um ensaio fotográfico de projetos de agricultura familiar desenvolvidos em Itapuranga, interior de Goiás, sem incentivos governamentais. Iniciativas que oferecem mais do que resistência, mas alternativas acessíveis ao agronegócio tóxico são mais impactantes que o simples boicote ou a migração para o mercado de alimentos orgânicos ainda elitizados, porque a produção é comunitária. A revolução alimentar será com toda a comunidade ou não será.

Do rádio sai o som de uma música do Coldplay e tudo parece efêmero, exceto o momento do voo dela. Esse momento dura quase todo o tempo que a observei, dias e dias. O mundo justo em que ela caiu de cabeça perpassa o tempo e o espaço. Esse mundo simplesmente se encaixa, como se fosse feito para existir, para ser visto, para ser encontrado. Mulheres correm, lindas, cientes da autonomia de seu próprio pensamento, atitude e corpo. Vacas, lontras, cães e cavalos pertencem à natureza e ao seu equilíbrio. A beleza é se amar, se aceitar e se (re)descobrir. Ela mergulha. Cada vez mais fundo. Olha para o buraco na tela de proteção, tão

ocupadas demais em seus próprios mundinhos para sentir tamanha beleza. É uma pena! É um momento tão único, quase não vemos acontecendo por aí. Mas talvez o fato de não ter um público, uma plateia, tornou a situação mais bela, ela se tornou mais completa. Após tantos e tantos dias confinada em seu quarto ela se descobriu, se reinventou, respirou. Abraçou o céu e respirou poesia, deixando o oxigênio de lado. Tornou-se sua e apenas sua. E é uma honra ter visto esse processo acontecer, é uma honra poder escrever sobre isso e também sentir o que ela sentiu. Ninguém na rua a viu, mas eu a vi, eu a senti e a contemplei. Mas nada disso importa. Quem importa é ela, como ela Foto: Reprodução se viu e como ela se sentiu. Quem importa é ela, ela mulher, ela pássaro, ela dona de si. Lá no alto ela voa longe, vez ou outra solta um assovio, voa quase para o infinito e volta. Sobrevoa o prédio, observa seu quarto e observa o buraco na tela de proteção novamente. E então algo incomum acontece, ela olha diretamente para mim, através de mim e de minha alma e tudo faz sentido. Eu me tornei ela. Esse corpo que percebe tudo é apenas isso, um corpo. Pego novamente o bloquinho de notas e vejo, sinto, até cheiro a palavra escrita: liberdade. Ela voa, voa para longe e deixa tudo para trás, o cativeiro, o sufocamento, a vida que não era dela. Eu voo, voo para longe e deixo tudo para trás, o cativeiro, o sufocamento e, principalmente, a vida que não era minha.

distante... Tão utópico, tão irreal. Ela vira um borrão e se afoga. Mas não em agonia... Ao contrário, ela aceita o esplendor da água, contempla esse mundo. Eu a vejo tornar-se andorinha e se juntar aos pássaros no céu. Eu sorrio, pois sei que ela está sorrindo, mas seu sorriso sai em forma de canto, um canto como de um rouxinol. Digno de poesia, respiro esse canto e respiro a beleza por detrás dele. Pego um bloquinho de notas ao meu lado e escrevo uma palavra, que descreve puramente o seu voo, o mergulho, o afogamento e a sua poesia. Da rua ninguém a vê, ninguém presencia esse momento. As pessoas simplesmente estão

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Orlando Afonso Valle do Amaral Luciene Dias Izabella Mendes reitorValle do Amaral coordenadoraLuciene geral do samambaia monitora Orlando Afonso Dias Izabella Mendes reitor coordenadora geral do samambaia monitora Angelita Pereira de Lima Luana Borges Turma de Jornal Impresso II Ano XVII - Nº 78, Julho de 2017 diretoraAngelita da faculdade informação produtora executiva edição Pereira de Lima Luana Borges Turma deexecutiva Jornal Impresso II Ano XVII - Nº 74,do Maio de 2017 Jornal Laboratório curso e comunicação diretora da faculdade informação produtora executiva edição executiva Jornal Laboratório do curso de Jornalismo Salvio Juliano Farias Turma de Jornal Impresso I e comunicação Rosana Maria Ribeiro Borges editor de diagramação produção Salvio Juliano Farias Turma de Jornal Impresso I FaculdadededeJornalismo Informação coordenado do curso de Rosana Maria Ribeiro Borges editor de diagramação produção Faculdade de Informação e Comunicação jornalismo Turma de Laboratório Orientado coordenado do curso de e Comunicação Universidade Federal de Goiás jornalismo Turma diagramação de Laboratório Orientado Universidade Federal de Goiás diagramação


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- TRABALHO -

DESEMPREGO ESPERA RECÉM-FORMADOS Foto: Reprodução

enquete mostra distância entre graduação e mercado de trabalho Reportagem Ariel Franco Edição Amanda Calazans ana Carolina Petry Diagramação Juliana França

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dificuldade de encontrar o primeiro emprego é um problema recorrente para os jovens egressos das universidades. Em enquete realizada com 50 pessoas que se formaram na Universidade Federal de Goiás (UFG) entre 2013 e 2016, descobriu-se que 50% estão desempregadas desde a formatura. Dos entrevistados, 10% encontraram emprego entre seis meses e um ano após a graduação, enquanto 4% levaram de um ano e meio a dois anos para ingressarem no mercado de trabalho. Já 36% responderam que foram empregados logo após a saída da faculdade. Maísa Cardoso é formada em Psicologia pela UFG, na Regional Catalão. Após se formar, a psicóloga conta que ficou três anos desempregada até ser aprovada e nomeada em um concurso público do Tribunal de Justiça. Para ela, a principal dificuldade em arranjar emprego deve-se à escassez de oportunidades para sua área na cidade onde se formou, além da reserva das vagas de trabalho para quem já tem contato com empregadores.

Foi-se o tempo em que você saía empregado de um curso superior sandro monsueto Professor da UFG

A ex-aluna avalia que as graduações não preparam os estudantes para enfrentar a realidade do mercado de trabalho. “Durante a graduação, muita teoria é ensinada sem que sua aplicabilidade seja apresentada na prática. Acredito que as matrizes deveriam ser repensadas. Muitas vezes chegamos ao mercado de trabalho sem saber coisas simples, como nos comportar em uma entrevista de emprego, por exemplo.” O desemprego também é enfrentado por Kaysmer Wunder, bacharel em Ciências Sociais pela Regional Goiânia da UFG, formada há dois anos, quanFoto: Sabrina Monteiro

Jovens são os mais prejudicados com o desemprego

do tinha 35 anos. “A dificuldade que tenho encontrado dá-se principalmente por não haver oferta de emprego na minha área de formação, pois fiz a opção do bacharelado ao invés da licenciatura; assim, eu tenho que concorrer para vagas em outras áreas de atuação”, explica. “Fora isso, minha idade e o tempo que fiquei fora do mercado de trabalho estão fazendo o processo da busca de emprego ser muito desgastante”, desabafa. A cientista social também denuncia o peso de se ter um contato influente no processo seletivo. “Não sou chamada para entrevistas e fica muito nítido que, no meu caso, eu precisaria de indicação.” dicas Para o professor da Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Ciências Econômicas (Face) Sandro Monsueto, o desemprego na juventude é um fenômeno comum no mundo, não apenas no Brasil, e ocorre independentemente da crise. Monsueto explica que as empresas não têm muitas informações sobre o jovem, porque possui menos experiências e tem menos relações pessoais e trabalhistas do que um profissional mais antigo no mercado de trabalho. Segundo o professor, o estudante não pode parar de se qualificar após a formatura. “A faculdade não é pedra de salvação para tudo. Foi-se o tempo em

que você saía empregado de um curso superior. Sala de aula é o básico que você vai aprender. Ao longo da graduação, é preciso buscar cursos extras para se qualificar, como aprender um software que a sua faculdade não ensina, um idioma etc.”, sugere. A psicóloga Maísa Cardoso concorda que qualificar o currículo e criar uma boa rede de contatos são as principais armas para entrar na busca por um emprego. Wunder aconselha os estudantes de cursos que têm duas áreas de formação – como bacharelado e licenciatura, por exemplo – a fazer as duas. “Também é importante criar vínculos com os professores através dos programas de bolsas científicas e estágios, para a criação de uma rede de contatos para posteriores processos de pós-graduação ou trabalho”, recomenda a cientista social. impactos Segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a juventude é o setor que mais sofre com o desemprego. No balanço do terceiro trimestre de 2016, enquanto a taxa geral de desemprego no país era de 11,8%, o desemprego entre a faixa etária de 14 a 24 anos somava 27,7%. O professor Monsueto opina que as polêmicas reformas do Governo Federal, como a trabalhista, vão permitir um refreamento no aumento do desemprego. “De modo geral, toda lei que flexibiliza as condições trabalhistas tende a contribuir para pelo menos não aumentar o desemprego. Um dos efeitos imediatos que a gente acredita que vai ter, crítico ou não crítico à reforma, é que pode facilitar a contratação, porque fica um pouco mais fácil do ponto de vista da empresa.” O professor, no entanto, assume que a reforma trabalhista pode levar a um aumento da precarização das relações de trabalho, principalmente por meio da contratação via pessoa jurídica, ou seja, sem assinar carteira de trabalho. Segundo ele, esse fenômeno, conhecido como pejotização, permite que as empresas contratem trabalhadores sem a garantia dos direitos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como férias e décimo terceiro, por exemplo. Comentando sobre como a reforma atinge os jovens, Monsueto avalia que a situação não vai se alterar tanto. “Eu acredito que não muda muita coisa. Ainda é o mesmo mercado de trabalho, só que com outra gente atuando ali de maneira mais ativa. A empresa vai continuar contratando pessoas mais experientes, com sinalização e qualificação melhor.”


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- MOBILIDADE

ANSIEDADE SEM FREIO Foto: Ismael Trindade

Detran Goiás tem Índice de aprovação abaixo do estabelecido pelo Contran REPORTAGEM Bruno Destéfano e Fernanda Peixoto EDIÇÃO Wilton Morais DIAGRAMAÇÃO Ana Carolina Petry

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A instrutora Tyciara Gomes ministra aula prática em direção veicular baliza é a seta, tenha sempre cuidado”. Esse é parte do cotidiano de diversas pessoas que pretendem obter sua carteira de habilitação. O processo para garantir a CNH é comum em todas as cidades do Estado de Goiás, tendo início por meio de cadastro, emissão das taxas e de averiguação dos locais para o primeiro exame, que consiste em análise psicotécnica. Adiante, o candidato passa por aulas teóricas seguidas de outro exame e, por fim, o Detran delibera o início das aulas práticas que servem de base para o exame final que avalia a direção dos candidatos. - Agora nós vamos fazer a baliza amarela.

Essa realidade apresentada pela instrutora Tyciara é o que espera Lideane da Silva, que tem 21 anos, é residente de Goiânia e ainda não chegou à fase das aulas práticas. Porém, confessa ter medo dos próximos passos pelo seu temperamento ansioso desde o início do processo. “Eu garanto minhas capacidades, mas não consigo fugir de precipitações. Tenho um amigo que é inseguro por achar que não consegue passar de primeira, já eu acredito que não vou passar é de jeito nenhum”, relata. O seu problema de ansiedade reflete dois fatores que parecem estar interligados: as crescentes taxas de reprovação, sobretudo em Goiânia, e a barreira autoimposta pelo candidato por razões psicológicas.

Foto: Bruno Destéfano

36%, bem abaixo da porcentagem mínima estabelecida pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que é de 60%. Nos anos anteriores (2014 e 2015), os níveis eram ainda menores. Rodrigo Rezende, gerente de habilitação e exame do Detran-GO, associa as altas taxas de reprovação a diversos aspectos, especialmente o fator emocional dos candidatos. “Nós fizemos uma pesquisa e identificamos que 80% das pessoas reprovam dentro do pátio, que é um local fechado. Isso é uma cultura que foi criada ao longo dos anos. Aquela questão de achar que todo mundo reprova dentro do Detran só gera um grande estresse psicológico no candidato”. - Pode fazer uma parada.

Tenho um amigo que é inseguro por achar que não consegue passar de primeira, já eu acredito que não vou passar é de jeito nenhum LIDEANE DA SILVA Estudante

Lideane da Silva ainda está em processo para retirar a CNH

odo candidato tem três tentativas para fazer a baliza na prova de direção, sendo cinco minutos a duração máxima da etapa. Não se desespere, é tempo demais da conta! O relógio marca 13 horas em ponto. A mulher com cabelo de tom arruivado se posiciona no banco passageiro e observa pelos óculos escuros, que se tornam peças íntimas em climas abafados, as mãos inquietas de sua aluna ao volante, enquanto diz as instruções para começar a primeira aula de baliza. Tyciara Gomes, de 29 anos, é instrutora de autoescola desde janeiro. Passados alguns segundos, outras orientações surgem: “Aperta o freio antes de puxar o freio de mão”. “Cuidado para não engatar a marcha errada. Dois pontos de penalização”. “Isso! Você fez certinho. Mas, olha, finge que eu sou o examinador. Não vou te aprovar logo de cara porque ainda pode derrubar as balizas.” “Pra sair, é uma volta e meia no volante”. “O que reprova na

Enquanto isso, dentro do carro de Tyciara, a aula continua e ordens são proferidas: - Faz esse movimento aqui, ó. Alinha o carro. Em 2016, segundo dados divulgados pelo site do Detran-GO, a taxa de aprovação não passou dos

Flávia Martins coordena o projeto “Transitando Psicologia” e reconhece a ansiedade como um dos principais problemas enfrentados pelos candidatos à CNH. A psicóloga afirma que a situação é tão complicada que, por vezes, seus pacientes se sentem afortunados


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MOBILIDADE -

O NA HORA DA PROVA Foto: Ismael Trindade

pelo simples fato de saírem do percurso interno. Jacqueline Oliveira, de 21 anos, é prova viva de que esse cenário faz parte do cotidiano de quem realiza o processo de obtenção da carteira, em Goiânia. A excandidata reprovou cinco vezes e só conseguiu passar quando se “entupiu” de calmantes. - Parei. O que eu faço agora? - Agora você sente a embreagem. VIA DUPLA

Os candidatos ainda vêm a ansiedade como maior fator limitante na hora de fazer a prova prática do Detran

A ansiedade é, assim, uma barreira imposta pelo próprio candidato. Contudo, como afirma Jacqueline, o processo desempenha papel fundamental para agravar ainda mais os transtornos psicológicos que o candidato traz consigo, sobretudo no exame prático e na relação com os examinadores. “Nas aulas, eu dirigia de cima para baixo, sem problema nenhum. O problema era na prova prática. Teve um examinador que ficou me apressando logo que eu entrei no carro, sendo que o instrutor da autoescola havia me falado várias vezes que a gente tinha que seguir o nosso tempo, que, até dar partida no carro, a prova não tinha começado ainda. Afinal, o único lugar que tinha tempo contado era na baliza”, conta. Marcelo Abrão, instrutor na autoescola Rio Negro, em Goiânia, afirma que o primeiro problema é o ideal da prova, ou seja, a pressão que recai no candidato em “passar de primeira”, já que o processo de aplicação no estado de Goiás tem duração máxima de um ano e o período para reteste – em que é cobrada a taxa específica – é de 15 dias após a divulgação do resultado. - Saiu, desliga a seta. Marcelo ainda ressalta que a própria Universidade Estadual de Goiás, instituição que em parceria com o Detran aplica a prova prática, reconhece o problema ao disponibilizar gratuitamente serviço de psicologia para quem atinge mais de três reprovações. Entretanto, o projeto não tem o alcance esperado. “Eu não tinha ideia de que existia esse programa da UEG. Descobri hoje, inclusive”, conta Jacqueline. Além disso, há outros candidatos que apresentam sinais evidentes de ansiedade desde o início do processo – como é o caso da Lideane. “Eu brigo comigo mesma, etapa por etapa e precipito as situações. É a questão de obter o resultado de algo e colocar isso na cabeça. Eu não saberia explicar, porque eu ainda pro-

Aquela questão de achar que todo mundo reprova dentro do Detran só gera um grande estresse psicológico no candidato RODRIGO REZENDE Gerente de habilitação e exame do Detran-GO

curo entender a ansiedade”, admite. E é essa mesma sensação que faz com que os alunos, quando estão ao volante, não consigam compreender a movimentação robótica que as aulas práticas exigem. No carro “Up” vermelho de Tyciara Gomes, os movimentos são coordenados. O corpo é máquina, e o bem-estar psicológico dos candidatos fica em segundo plano. - O que eu fiz de errado? - Nada. - É porque você colocou a perna. - Eu só estiquei. INTERIOR Em Aparecida de Goiânia, o índice de aprovação da prova prática sobe para 46%, enquanto em Inhumas a porcentagem está acima da média mínima estabelecida pela Contran (60%), chegando a 63% de pessoas aprovadas. Embora o de Aparecida esteja abaixo do defini-

do, a diferença entre essa cidade e Goiânia é de 10%. Isso quer dizer que a Capital, com seus 36% de aprovados, consegue atingir índices de reprovação mais altos do que as cidades da região metropolitana. A divergência pode estar no percurso: em Aparecida e Inhumas há apenas percurso externo, com pouco tráfego, enquanto na metrópole há também um trajeto interno e, fora do Detran, as ruas são congestionadas. Muitos candidatos preferem realizar a prova em cidades do interior e buscam a transferência. Entretanto, como lembra o instrutor Marcelo Abrão, entrou em vigor uma legislação que veda a obtenção da carteira em determinada cidade, caso o aluno more em outra. Dessa forma, o candidato deve apresentar um comprovante de endereço, além do número do CPF e do RG antes do início do processo.

O Detran de Goiânia abriu o percurso interno para treinamento do candidato nos momentos em que não estão realizando a prova prática, a fim de diminuir os índices de reprovação e igualar a prova com o interior.

Programa Educando e Valorizando a Vida (EVV) A Universidade Estadual de Goiás (UEG) em parceria com o Detran criou o Programa Educando e Valorizando a Vida (EVV), que oferece serviços atendimento psicológico aos candidatos à obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O projeto, criado em 2006, reconhece que a ansiedade é fator primordial na reprovação dos candidatos na prova prática e por meio de sessões individuais procura amenizar o efeito nos candidatos que já foram reprovados pelo menos uma vez. O agendamento é feito por telefone, pelo número (62) 3522 5714 ou pessoalmente na Coordenação Pedagógica do Programa Educando e Valorizando a Vida, situado à Rua C-158, Qd. 314, Lt. 17, Setor Jardim América.


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- SAÚDE -

HOSPITAL VETERINÁRIO RECEBE ALTAS DEMANDAS DEMORA NO

Foto: Thallya Rodrigues

AGENDAMENTO DE CONSULTAS OFUSCA QUALIDADE NO ATENDIMENTO

REPORTAGEM Bárbara Luiza e Victor Lisita EDIÇÃO Luciana Gomides e Ludmilla Lobo DIAGRAMAÇÃO Stefany Vaz

Hospital Veterinário encontra dificuldades em suprir a comunidade

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Neurologia, Medicina Laboratorial, pós chegar à faculdade e ficou doente no início de 2016 e falMedicina de Urgência e Terapia Intenver um cachorro vira-latas eceu, mesmo após ser tratado por uma siva, Toxicologia, Coleta de Amostras escondido embaixo de uma ONG protetora de animais. Citológicas, Setor de Patologia Animal, mesa, no auditório do prédio, com diPatologia Clínico-Cirúrgica, Cirurgia versos ferimentos pelo corpo, a estuCAPACIDADE de Pequenos Animais, Cirurgia de dante de Jornalismo, Verônica Aragão, Grandes Animais, Radiologia e Ulimediatamente se compadeceu com O Hospital Veterinário da UFG é trassonografia. Os atendimentos são o animal. “Naquele momento, não a única clínica capacitada nas redonrealizados por estudantes, profissionais havia ninguém para ajudá-lo”, relata. dezas que atende animais de pequeno das áreas e professores. Sua primeira reação foi telefonar para e grande porte. De acordo com o site Entretanto, não foi encontrado um o Hospital Veterinário da UFG, que da instituição, todos os procedimenposicionamento quanto aos animais fica no próprio Campus Samambaia, tos clínicos, complementares (Raiosabandonados que perambulam denporém, não obteve resposta aos teleX e Ultrassonografias) e cirúrgicos tro do próprio Camfonemas. Verônica, então, pus Samambaia, onde entrou em contato com a Acho muito contraditório um Hospital se encontra o espaço Organização Não Governafísico da policlínica. mental Vida Lata. Poucas Veterinário funcionando no campus Para Verônica Aragão, horas depois, uma volunque não ajude os próprios animais que os animais do campus tária da ONG chegou ao lodeveriam ser responcal e levou o cão para recevivem por lá. sabilidade do Hospital ber o devido tratamento. Veterinário da UFG. O caso ocorreu em no“Acho muito contravembro de 2016, período VERÔNICA ARAGÃO ditório um Hospital em que diversas faculdades Estudante de Jornalismo Veterinário funcionado Campus Samambaia enndo no campus que contravam-se ocupadas em não ajude os próprios protesto contra a PEC 241 animais que vivem por lá”, opina. e por melhorias na segurança do local. são cobrados, além de ser necessário Tupac, como é chamado, apenas pero agendamento antecipado das conespera ambulava semanalmente pelo campus, sultas. A política do Hospital rege mas recebia cuidados de uma dona, que preços não sejam repassados por Andreia Pereira conta que, em que vive nas imediações da Univertelefone. É destacado que o atendimarço deste ano, sua cadela Shi-Tzu sidade, no setor Itatiaia. Atualmente, mento emergencial seja restrito aos teve um dos olhos lesionado por moapós a tentativa em vão de tratamento casos graves, relacionados aos que tivos desconhecidos e tentou levá-la na UFG e o sucesso com a ONG, o aninão podem esperar o agendamento para obter tratamento no Hospital mal encontra-se recuperado e retornou de consultas. Ainda assim, existe um Veterinário da UFG (HV-Ufg). Geralpara sua casa de origem. limite para este atendimento difemente, Andreia utiliza serviços médiO que aconteceu com Verônica é rencial, pois a quantidade pode ser cos prestados em petshops, todavia, rotineiro para quem frequenta o Camreduzida caso algum caso exija expor ter recebido referências do atenpus Samambaia. No trajeto entre o enclusividade de atenção por parte do dimento oferecido pela UFG, resolveu torno da Faculdade de Educação Física veterinário. Além disso, às sextastentar pela primeira vez. “Eu fiquei e Dança (FEFD) até a Escola de Música feiras, o Hospital Veterinário não preocupada e precisava de ajuda. Ela e Artes Cênicas (EMAC), foram enconatende emergências. estava com o olho bem inflamado e trados 15 cachorros diferentes perampoderia até perder a visão”, conta. Enbulando pela área. Relatos no grupo da tretanto, ao contatar o Hospital, foi UFG no Facebook afirmam que o camserviços informada de que sua cadela só podepus é o destino de muitos cães e gatos ria ser atendida ao fim de abril, ou, que são abandonados por seus donos. De acordo com o portal do Hosaté mesmo em maio. “Eu gostaria que Um grande número é alimentado pepital, os serviços contemplam Clínica o atendimento tivesse sido feito pelo los estudantes que andam pelo local, Médica Animal, da Geral de Pequenos Hospital Veterinário da UFG porque, porém, nem todos conseguem sobreAnimais e Grandes Animais, departaa princípio, seria uma referência para viver por muito tempo. Foi o caso do mentos de Cardiologia, Dermatologia, mim em termos de credibilidade, mas, cão conhecido como Linguinha, que Oncologia, Odontologia, Ortopedia,

não pude usufruir disso”, relata. Devido à falta de retorno imediato pelo HV, Andreia precisou levar o animal a um petshop, onde foi devidamente tratado. Assim, hoje a Shi-Tzu está recuperada e passa bem. A questão é que a cadelinha de Andreia não é o primeiro animal impossibilitado de ser atendido no Hospital Veterinário por falta de horários. A cadela de Rosair Pessoa desenvolveu câncer de mama e precisava de tratamento urgente. Apesar do caráter emergencial do caso, visto a necessária realização de cirurgia em quadros desse tipo, Rosair teve de esperar dois longos meses até que o atendimento fosse realizado. Apesar da excelência do serviço, a usuária afirma não ter sido nada fácil a consulta pela UFG. “Eu marquei com 60 dias de antecedência, e ainda tive que esperar pela vaga. Acho que a demanda está grande demais no Hospital Veterinário”. No entanto, ela garante que o atendimento é de qualidade e se sentiu satisfeita com a educação com a qual foi tratada pelos profissionais da clínica. custo Estabelecer uma relação de custo do Hospital Veterinário da UFG com outras clínicas da cidade é uma ação que deve ser feita com cuidado. A clássica frase “cada caso é um caso” se aplica perfeitamente aqui, visto que o valor para determinado tratamento pode variar conforme a resposta do animal. Por exemplo, se na UFG o valor cobrado para cirurgia é X, em outro local pode ser X + Medicamentos. Rosair coloca, ainda, outro fator: a distância. “Às vezes o animal da pessoa não tem condições de ir várias vezes ao Samambaia”, lembra. A cirurgia para sua cadela ficaria R$819,00 na UFG, sem contar uma consulta ao cardiologista, necessária no pré-operatório, porém seu caso era irremediável e o Hospital infelizmente não pôde fazer nada a respeito Para Rosair, o mais interessante seria diminuir os custos para a população poder levar seus animais, pois, algumas pessoas não possuem condições de pagar altos valores. “Se fosse um preço mais acessível, os tutores poderiam levar seus bichinhos de estimação ao invés de deixá-los na rua”, uma vez que o abandono de animais pode se dar devido a essa problemática. “Eu tenho uma vizinha que cuida, sabe? Dá comida e remédio para animais de rua. E assim, se fosse um custo menor, ela os levaria até para consultar. Mas, também o abandono tem a ver com a consciência de cada um. Eu nunca teria coragem de abandonar um amigo”.


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- MEIO AMBIENTE-

UM OLHAR SOBRE OS MACACOS Foto: Fausto André

presença dos animais na universidade não oferece perigo A frequentadores REPÓRTER Caroline Alvares e AdrielAbreu EDITORA Juliana França DIAGRAMAÇÃO Gabriela Campos

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uem convive no Campus Samambaia da Universidade Federal de Goiás (UFG) vez ou outra já ouviu algum comentário sobre a presença peculiar dos macacos tão próxima aos humanos. A dúvida é se essa intimidade pode gerar alguma doença transmissível para quem circula diariamente pelo local. A resposta é não. Os bichinhos que pulam de galho em galho e ora ou outra desfilam sobre plataformas de aço do teto do pátio são vítimas, assim como nós. Eles não transmitem doenças, no máximo usam a habilidade para tentar roubar o café da manhã dos alunos. São autoritários e participam da alimentação dos estudantes na primeira brecha que aparece, deixando todos furiosos e com a barriga vazia. O intervalo é de vinte minutos, mas isso só na ordem cronológica, pois o tempo nas filas das lanchonetes passa voando. Quando alguém finalmente consegue a disputada ficha de um salgado, após enfrentar uma fila deprimente, pronto, já é hora de retornar para a sala de aula. Como todo processo de conhecer o outro leva um tempo e um estranhamento, na faculdade não é diferente com os animais. A princípio os macacos são considerados “fofinhos” e alvo de várias fotos por calouros enamorados pelo contato tão próximo. Mas é só uma questão de tempo para a convivência se estabilizar e as artimanhas para espanta-los, e não perder o lanche, entrarem em ação. O grito de “xô, sai pra lá” se torna parte do vocabulário diário dos que frequentam o local. Durante os anos, o macaco é considerado um companheiro de graduações, pós-graduações e de uma sequencia de títulos lattes. Embora estejam sempre do lado de fora, eles conseguem presenciar a rotina exaustiva dos alunos. A espécie que circula pelo Campus Samambaia é a sapajus libidinosus, mais conhecida como macaco-prego. Apesar dos transtornos o macaco-prego é considerado um personagem inesquecível para quem passa por ali diariamente. Guar-

O macaco-prego, sapajus libidinosus, em habitat no Campus Samambaia da UFG dadas a sete chaves, tanto lembranças boas quanto ruins são acompanhadas sempre por um riso nostálgico. Há sempre histórias como a da Érica Andressa, estudante da Faculdade de História da UFG. Ela conta que perdeu um suco de laranja por um “mala” (adjetivo de intruso por ela), no prazo em que deixou o copo em cima da mesa e se virou para mexer na mochila ao lado. Mas ela ri, e diz: “Pelo menos não aconteceu comigo o mesmo que aconteceu com a Gabi. Um macaco roubou seu café e ainda deu uma copada na cara dela. Acho que ele não gostou muito do café não.” A estudante afirma que os pequenos ladrões são exigentes. Se o café não estiver docinho e quente, você se torna um alvo certeiro. Febre amarela O Centro de Informações Estratégicas e Resposta em Vigilância em Saúde (CIEVS) de Goiânia recebeu o laudo da análise constatando o resultado positivo para febre amarela em um macaco encontrado morto no Campus Samambaia em outubro do ano passado. Entretanto, não foi necessário decretar alerta para a comunidade. Segundo os especialistas da Secretária Municipal de Saúde (SMS), a presença deles não gera perigo para quem está

vacinado, embora os macacos que estão espalhados pelo local correm o mesmo risco de contaminação que os humanos. O mosquito que contém o vírus tem capacidade de matar tanto um como o outro. O lado positivo da pesquisa é que os números de casos comprovados de febre amarela reduziram drasticamente desde 1942 no Brasil devido o árduo trabalho das campanhas de vacinação. A universidade se manifestou diante dessa suposta “epidemia”, garantindo segurança a quem estava ingressando na faculdade. Foi feita uma campanha de vacinação no ato da matrícula para os novos alunos. Em Goiânia, a patologia do vírus está controlada. Segundo dados da SMS, estima-se que 94% da população está vacinada. Vacinação Antes de procurar um posto de vacinação, a SMS recomenda que os documentos necessários estejam todos em mãos. Pode ser apresentada toda documentação legível com foto, por exemplo, carteiras de motorista, de identidade, de trabalho. Para as pessoas que vacinaram há mais de 10 anos a orientação é procurar o posto de saúde mais próximo para atualização da vacina. Se no cartão de vacinação já possuir as duas vaci-

nas, automaticamente está livre de se contaminar, e não é necessário se prevenir novamente. Para os casos de pessoas alérgicas a algum componente específico da medicação, a orientação é fazer uma reavaliação médica. Crianças menores de seis anos de idade, pacientes com câncer, gestantes e mães que estejam amamentando crianças com menos de seis meses de idade também não podem se vacinar. Já para os idosos é necessária uma consulta médica, pelo risco de encefalite pelo vírus vacinal. A quem possui o comprovante do cartão de vacinação, constando apenas uma, é necessário se prevenir pela segunda vez. O biólogo Wellington Tristão, da SMS, questionado sobre quais são os cuidados que a universidade tem de ter com o bosque, afirmou: “A área do campus é de responsabilidade do campus, certamente a UFG deve ter uma estratégia de manutenção”. Embora a equipe de reportagem tenha tentado entrar em contato com a instituição, ela não obteve resposta. No bate-papo sobre as campanhas de vacinação, Tristão explica sobre a importância da prevenção: “A campanha de vacinação é para todas as pessoas que não possuem a segunda dose da vacina antiamarílica, ou seja, toda a comunidade”.


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Goiânia, julho de 2017

- SUSTENTABILIDADE

ASSOCIAÇÃO CONSTRÓI Iniciativa de voluntários busca atingir espaços PÚBLICOS NÃO UTILIZADOS REPORTAGEM Letícia Rocha EDIÇÃO Amanda França DIAGRAMAÇÃO gustavo motta

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orta. Todos nós já vimos alguma, e muito provavelmente sua avó já te mandou ir ao quintal de casa buscar cebolinha, lá naquela hortinha que fica nos fundos da casa. No entanto, com toda essa correria, plantar se tornou algo distante de nossa realidade. Tudo que consumimos é comprado em grandes supermercados e de preferência no dia da promoção, em que tudo sai a “preço de banana”. Cultivar não é uma opção. Ao menos, não nos dias atuais, em que o tempo é escasso, porque plantar exige dedicação, empenho e certa regularidade. Tudo que a maioria de nós diz não ter. Uma pena, pois este “hobby” traria consigo inúmeros benefícios. Isso porque nosso país é o campeão mundial no uso de agrotóxicos. Segundo estudos realizados pela Universidade de São Paulo cada pessoa ingere em média 5 litros dessas substâncias por ano, o que não é nada saudável e pode causar diversos problemas desde tonturas, náuseas, até paralisias, tumores e nos casos mais extremos levar à morte. Ciente disso, a advogada Jordana Mendonça organizou uma equipe de voluntários para instalar hortas comunitárias em locais ociosos e de vulnerabilidade alimentar, como em escolas públicas, asilos, praças e lotes baldios. O grupo se chama EcomAmor e atua em diversos pontos da cidade de Goiânia. Apesar do pouco tempo de atuação, já realizaram diversas ações em prol da vida saudável com diversas temáticas, entre elas estão: a luta contra o desperdício de alimentos e o cultivo de hortas no quintal de casa utilizando materiais recicláveis. AÇÃO A EcomAmor já foi responsável pela implementação de uma horta na Escola Municipal Professora Edna de Roure, na Vila Irany em Goiânia, por um jardim medicinal na Praça Univer-

sitária, próximo a Biblioteca Marietta

Voluntários trabalham na construção de horta em espaço estudantil da UFG Teles. Os voluntários também fizeram uma horta na praça C-114 e no Centro de Educação Infantil Maria Sabino, ambos no setor Jardim América. Além disso, o grupo construiu uma horta específica de ervas medicinais na entidade de assistência a idosos Solar Colombino no Parque Amazônia, e instalou uma horta de verduras e ervas no Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal de Goiás situado no campus do setor Universitário. Para tornar o projeto de construir uma horta em realidade, todos cooperam. Moradores de bairros, estudantes, crianças, todos aqueles que se interessam pelo trabalho duro de preparar o espaço e mexer com terra, muitas vezes sob sol quente, são bem recebidos pelo grupo de agricultura urbana.

Para Jordana Mendonça o projeto significa uma ação política, pois cria uma relação de proximidade das pessoas com os alimentos que consomem dando autonomia para quem os cultiva. Os voluntários podem acompanhar todo o processo de plantio e colheita do alimento, conhecem todo o ciclo que permite com que a comida chegue até o prato, assim possuem a segurança de que estão ingerindo alimentos saudáveis. A iniciativa coopera com educação ambiental de crianças, jovens e adultos. No caso das crianças a intervenção do grupo é ainda mais perceptível, porque elas começam a se interessar por legumes, verduras, temperos que antes desconheciam e isso as encoraja a provar e a aprender a consumir alimentos saudáveis. Além disso, o plantio estimula o contato mais próximo delas com a natureza e,

consequentemente, um maior cuidado com a mesma. Segundo a mentora do grupo, os irmãos Lara e Henrique, de 6 e 8 anos respectivamente, são os últimos a irem embora nos dias em que há a instalação de hortas pela cidade. A agrônoma Janice Morais, que é integrante do EcomAmor, reitera a importância da horta para a socialização “a horta é um mecanismo muito interessante para aproximar as pessoas que moram no mesmo bairro, para ocupar a mente de maneira saudável, retirar os solitários de seus lares, curar depressão (como já foi comprovado em hortas urbanas nas periferias de Paris), além de melhorar a alimentação, empoderar as pessoas e ensinar as crianças a mexer com a terra desde cedo”. No entanto, como Janice relata, as ações do grupo ocorrem devido ao


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SUSTENTABILIDADE -

I HORTAS EM GOIÂNIA HORTOTERAPIA Terapia usada como instrumento de cura. Isso porque ela estimula as funções sociais, cognitivas, físicas e psicológicas, reduzindo a ansiedade e melhorando o humor e a qualidade de vida dos pacientes. Segundo a terapeuta Eleni Alves Rosa, o contato com a terra ajuda na movimentação dos músculos e diminui as chances de encurtamento ou algum tipo de atrofia, além de gerar a sensação de bem estar e satisfação.

Todos esses benefícios ajudam no combate à depressão, à solidão, ao sedentarismo, ao estresse, e a ansiedade. Os estudos nessa área surgiram no século XIX e comprovaram a melhora de pacientes com problemas psiquiátricos que mantinham contato com a natureza. Além de auxiliar no tratamento psicológico e físico, as hortas tem grande importância no meio urbano, pois elas dão a chance de consumir um alimento saudável, livre de agrotóxicos e de boa procedência. É por esse motivo que alguns estados brasileiros têm criado projetos que focam nessa temática como, por

exemplo, o Espírito Santo. No município de Alfredo Chaves, interior capixaba, há uma oficina de hortoterapia que atende pacientes que sofrem de transtorno mental grave com o intuito de oferecer um espaço para a socialização dos usuários. A integrante do EcomAmor Janice Morais afirma que o contato com a terra estimula a ligação com a natureza. O trabalho do grupo é um projeto de educação ambiental que sensibiliza as pessoas quanto a responsabilidade que todos temos sobre o meio ambiente e na conscientização de crianças e adultos.

Foto: Amanda França

o consumo da família, sendo o excesso vendido para a comunidade.

A horta é um mecanismo muito interessante para aproximar as pessoas que moram no mesmo bairro JANICE MORAIS Agrônoma

Foto: Amanda França

engajamento de um grupo que busca melhorias para a cidade, não provém de uma política governamental, como a agrônoma considera que seria o correto. Segundo ela, a iniciativa é muito válida, mas a abrangência é pequena. Em toda Goiânia, cidade com mais de 1 milhão e 400 mil habitantes (segundo estimativas do IBGE de 2016), existe apenas um grupo que conta com 100 voluntários cadastrados, de acordo com a gestora do grupo Jordana, o que, é claro, não abrange toda a população. Em Lagoa Prata, município de Minas Gerais, cada aposentado é responsável pela manutenção de um canteiro e recebem da prefeitura todo material necessário para realizar tal tarefa. O que ajuda as famílias carentes quanto ao acesso a esses alimentos e contribui como renda, uma vez que a produção muitas vezes é maior que

Coordenadora do EcomAmor, Jordana Mendonça, entrega mudas para plantio


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- CIDADES -

A FRÁGIL ESTRUTURA DA MAGRELA faz parte da rotina de ciclistas

Foto: Uirá Lourenço

Insegurança

em Goiânia REPORTAGEM Lucas Lima EDIÇÃO Ana Carolina Petry DIAGRAMAÇÃO Amanda França

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ão 7 horas da manhã, e o sol não teve tempo ainda de derramar calor nos inúmeros trabalhadores e estudantes da cidade de Goiânia, que agora levantam apressados numa segunda feira, 10 de abril. Para alguns a bicicleta ainda é instrumento de trabalho A bicicleta que peguei emprestada de um amigo é até bem cuidada, apesar de velha. A magrela é hoje uma desconhecida saúde humana. Os benefícios começam tentativa de fazer um trabalho de educação para mim, mas, em um passado não muito pela prevenção de dores ou problemas nas juntamente com os órgãos de fiscalização distante, eu e ela fomos íntimos. No entanarticulações, não somente nos joelhos, mas de trânsito. A ideia seria aplicar multas aos to, hoje em dia ela não passa de algo que também nas costas. A posição levemente carros que estacionassem em local proimarcou uma época na minha vida, mas inclinada do ciclista faz a musculatura das bido. Mas essa proposta não saiu do papel que hoje foi trocada sem muita culpa por costas ficar sob tensão e se vê obrigada a espor dificuldades de acesso da Polícia Milium motor de 200 cilindradas. tabilizar o tronco, assim se fortalecendo. tar dentro da UFG. Ricardo Romano durante sua graduNo entanto, o uso do carro como meio No centro esação em Administração na UFG utilizade transporte é muito superior ao da biciportivo da UFG, está va a bicicleta como meio de transporte. cleta. Se levarmos em conta esse gráfico sendo construído um Ao sair de casa com a sua “Katy” (apelido sobre a forma de deslocamento dos alunos estacionamento com dado por ele à sua bicicleta), eu me lematé a UFG, percebemos que a quantidade espaço adequado bro das recomendações que eu ouvi: “É de pessoas utilizando a bicicleta é muito repara bicicletas. A ideigual na selva, cara! A lei do mais forte é duzida em relação aos automóveis. ia inicial era fazer um a que impera!”, dizia ele. “Não tenta disSegundo a professora Erica Cristine, bicicletário equipado putar espaço com carros. Por mais certo coordenadora do livro Projeto Cidade, com banheiros, onde que você esteja, é melhor sair da frente entre os motivos da bicicleta não ser uma os estudantes pudesporque eles passam por cima...”. escolha de mais pessoas, está o fato de a sem tomar banho ao Durante meu percurso de 13 quilôlei não ser cumprida. Por mais que exchegar, e com uma metros na magrela até a UFG, me assustei ista uma ampla base legal, não há políticas oficina para pequecom a velocidade e a proximidade dos carpúblicas que efetivem os espaços urbanos nos reparos de biciros, principalmente nos lugares em que o com qualidade para o uso da bicicleta. A cletas. No entanto, a acostamento era pequeno demais. A senimplementação de vias mais lentas e com falta de verbas não sação de insegurança era muito grande. A calçadas mais largas seria algo que faria dos permitiu que essa frágil estrutura da bicicleta lida com um espaços urbanos lugares mais acolhedores ideia fosse executada. enorme contingente de motores barulhenpara os ciclistas. Então foi escolhido tos. Os imensos gigantes de metal cresciam Às 10 horas da manhã, o sol já castiga o Centro Esportivo mais ainda por conta da velocidade com um pouco e depois de um longo tempo para a construção do que passavam ao meu lado. Nessas horas, sofrendo entre os carros, ônibus e caminbicicletário, levando me sentia minúsculo. No entanto, a granhões, eu chego enfim ao meu destino. E, se em conta a existência deza da pequena “Katy” está nas possibilio caminho até a universidade é tão complidos banheiros que já dades que ela proporciona. cado quando feito de bicicleta, a chegada estão lá perto. não é menos perigosa e complexa. BENEFÍCIOS SEGURANÇA LIMITE? Os benefícios do uso da bicicleta são Além de todos esses fatores, exmuitos. De acordo com a Organização Já na entrada da UFG, os carros – estaiste ainda um risco maior: ser vítima Mundial da Saúde (OMS), o uso cotidiano cionados irregularmente – fazem a rua, que da violência urbana. Goiânia e Apada bicicleta melhora aspectos da saúde tanjá é muito curta, ter o espaço diminuído recida de Goiânia aparecem juntas to para a prevenção de doenças, como para ainda mais. Teoricamente, é proibido estana 29º posição do ranking das 50 a promoção de uma melhoria na condição cionar nesses locais. Demorei a achar um cidades mais violentas do mundo, de vida. Pesquisas realizadas pelos Cenlocal para deixar a bicicleta, não existem elaborado pela ONG Conselho Citros de Saúde e Esporte das Universidades bicicletários na UFG. dadão para Segurança Pública e de London, Bristol e Oslo reuniram, em Ao conversar com o diretor do CenJustiça Penal, do México. Dos 21 um relatório chamado “Saúde e Bicicleta”, tro de Gestão do Espaço Físico da UFG, locais brasileiros que aparecem na os principais benefícios dos pedais para a Marco Antônio de Oliveira, já houve uma lista, a área goiana está na 11ª colo-

cação. Por essas questões, o fator da segurança pública acaba sendo importante, tanto dentro quanto fora da universidade. No contra fluxo de todo esse cenário de risco e de falta de estímulos, há bicicletários em alguns dos terminais do transporte público de Goiânia. Seu Assis deixa a sua bicicleta no terminal Recanto do Bosque de manhã para ir trabalhar todos os dias. Porém reclama da falta de segurança, diz que já teve uma bicicleta roubada no terminal, e que já viu um homem armado tentar roubar a bicicleta de outra pessoa. A frágil estrutura da magrela é forte o suficiente para carregar sobre si uma via imensa de perigos, num trânsito tumultuado nessa selva de pedra. Carrega a inserção social, e uma parte significativa da solução para o inevitável problema do transporte de pessoas nas cidades grandes. Carrega o estigma do desrespeito dos motoristas apressados, que não se importam em colocar a vida de ciclistas em perigo. A frágil estrutura carrega a possibilidade de viver a cidade de maneira mais ín-

tima, e mais próxima. Carrega sobre si uma escolha, e uma opção de sustentabilidade. Ao se colocar no fino e frágil metal da bicicleta, o repórter se assusta. Por entre montes monstruosos de ferro, no asfalto quente das violentas vias de Goiânia e lidar com a exposição que essa atitude provoca é que ele percebe: a fragilidade da estrutura da magrela suporta tudo isso e, mesmo assim, não se dobra ao imenso peso das forças que tornam essa escolha algo tão desafiador.


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- COMPORTAMENTO-

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REDE VIRTUAL UNE MULHERES propõe apoio compartilhando serviços e produtos feitos por elas

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REPORTAGEM Aline Goulart EDIÇAO Letícia Michalczyk DIAGRAMAÇAO Larissa Ferraz

ely Cristiny, mestranda pela UFG, é professora de Educação Física, trabalha e estuda o dia inteiro, todos os dias. No intervalo das aulas, Kely checa suas redes sociais. O celular é o seu instrumento de convívio virtual. Por ele, Kely participa de alguns grupos, principalmente no facebook. Alguns deles, de trocas. Ano passado, entrou em um voltado para indicar e procurar serviços especializados “de” e “para” mulheres. Ou seja, elas procuram e elas indicam. Somente elas. “Indico sempre mulheres do grupo, consegui revisoras de texto, troquei e vendi roupas”, relata. Para Kely, o grupo é uma forma de união das mulheres. O grupo “Indique Uma Mana! - Em Goiás” foi criado em 2016, não tem fins lucrativos e é gerenciado por 11 moderadoras. Nele, mulheres procuram e indicam produtos e serviços feitos por elas. Sophia Pinheiro, moderadora do grupo, mestranda pela UFG, estudiosa de cinema e gênero, relata os acontecimentos que vieram de encontro ao surgimento do grupo. Quando foi convidada por uma revista goiana a falar sobre alguma indicação de uma mulher do Audiovisual em Goiânia, não soube responder. “Eu

travei. Conheço algumas, mas me vinham muito mais nomes de homens do que de mulheres”. Isso provocou uma inquietação. “Ora, por que tenho essa dificuldade? Por que há menos mulheres?”, indaga. A partir daí, inspirada pelo grupo nacional, que concentra os estados do Rio de Janeiro e São Paulo, Sophia criou o grupo, fez as regras, as artes e chamou algumas manas. O grupo cresceu e hoje são mais de 30 mil mulheres. A proposta principal do grupo é impulsionar o mercado de trabalho, oferecendo e indicando produtos e serviços executados por mulheres. “É extremamente importante termos representatividade e referências locais. Não por um bairrismo, mas por uma questão de identidade mesmo. Isso fortalece as mulheres dentro do nosso Estado”, constata.

Foto: Divulgação

Indique Uma Mana

O “desapego das manas” é representatividade e consumo sustentável

FEMINISMO Sendo moderado por feministas, o grupo é pautado no feminismo interseccional, que tenta englobar todas as mulheres cis e trans. Para Sophia o “Indique Uma Mana!” serve como uma representatividade da mulher goiana. “Para mim, esse é um dos alicerces do feminismo: é se identificar e dialogar com aquela que está ao seu lado para além da que está longe. É a mais pura representatividade,” observa. Kely Cristiny informa que são criados sub-grupos de facebook e whatsaap a partir de micro interesses e necessidades. “Desse grupo surgem outros como de venda, trocas, amizades, atividades ao ar livre e comunicação. Neles, a mulher é o elemento central”, relata. Há inúmeras correntes do feminismo no grupo, alguns debates teóricos e discussões. “O grupo trata de temas específicos de mulheres, e nós precisamos nos conhecer mais, representar os nossos interesses”, aconselha. Para SoFoto: Aline Goulart

Manas no campus: amizade que ultrapassa o campo virtual

phia, ter uma comunidade de mulheres com necessidades específicas em Goiás é muito importante. “Diferentemente de um grupo ‘nacional’, o recorte para Goiás possibilita troca e articulação das mulheres de todo o Estado que, mesmo não estando na mesma cidade, podem se conectar, se conhecer, trocar referências de trabalho, de vida”, revela. Luciana Marcolino, moderadora, acredita que o grupo se tornou uma rede de apoio: “Não apenas na busca de profissionais, mas um lugar onde as mulheres podem trocar ideias, sem medo de julgamentos”. Em um questionário aplicado no “Indique uma mana”, 233 mulheres responderam de forma anônima sobre a importância do grupo em seu cotidiano. Dentre as alternativas estavam questões sobre relacionamentos de amizade e afeto, troca/venda de produtos e serviços, ações de solidariedade e/ou humanitárias, procura de emprego, inserção no mercado de trabalho e procura/indicação de serviços especializados realizados por mulheres. Em cada opção foi dado um grau de importância de um a cinco. Houve, também, 23 respostas discursivas sobre a relevância do grupo na vida delas. O questionário serviu para identificar nuances individuais sobre uma ação coletiva. O que um grupo de facebook voltado para mulheres pode fazer por elas individualmente? A ideia “indicar e procurar serviços e produtos executados por mulheres” foi destacada com grau cinco por 142 manas (60% das mulheres). Enquanto 144 (62%) delas consideram ações de solidariedade e/ou humanitárias com um grau cinco de importância. Esses dados são um elo entre a proposta do grupo e as respostas escritas no questionário. Uma das respostas enfatiza a sororidade presente no grupo. “Percebo que este grupo serve para que haja uma sororidade feminina e um esforço coletivo humanitário.”, identifica. Para

Sophia, o envolvimento de mulheres cria uma rede. “Uma rede de apoio que considera que todas somos iguais, mas que somos diferentes também. Cada uma aqui possui um contexto social, racial e emocional completamente diferente do outro, é uma ideia interseccional”, constata. Em uma das respostas individuais do questionário, percebemos um sentido contextual da individualidade: “Dá-nos esperança de dias melhores! Sempre quando estou passando por um dia ruim, entro na página e fico olhando as postagens! Isso me acalma!”. VAMOS JUNTAS? Outra ação desenvolvida para mulheres foi o projeto “Vamos juntas?”. Em 2015, a jornalista Babi Souza criou o movimento devido à constante insegurança pessoal de voltar para casa sozinha à noite. No site do movimento, Babi explica a importância da união das mulheres. Afinal, apenas elas sabem da insegurança que sentem estando sozinhas. O movimento cresceu e a ideia também: há grupos tanto com enfoque regional quanto em outros países, como Peru, com comunidades de carona e viagens. Ida para o trabalho ou para a faculdade? Hora de colocar o “Vamos juntas” em prática! A estudante de pedagogia Keila Vieira conheceu o “Vamos juntas” em um grupo de carona e de lá para cá perdeu a vergonha de pedir companhia. “Descobri que pedir um favor não é somente uma gentileza para mim, mas, também, para a outra. Nós, mulheres, compartilhamos das mesmas inseguranças, não somos rivais”, declara. Hoje, Babi trabalha como jornalista autônoma fazendo palestras em todo o Brasil sobre o movimento, com o objetivo de fazer a ideia crescer.


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- CULTURA

TERRA DO SERTANEJO T Foto: Reprodução

festivais e bandas goianas conquistam seu espaço REPORTAGEM Gustavo Paiva e Stefany Vaz EDIÇÃO Bruna Alecrim e Larissa Ferraz DIAGRAMAÇÃO Caroline Brandão

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uando se colocam as palavras “música” e “Goiânia” na mesma frase, rapidamente o sertanejo vem à mente da maioria dos brasileiros. Em uma breve pesquisa em qualquer site de buscas é possível confirmar a ideia de “terra do sertanejo” que a cidade possui, já que os mesmos termos geram majoritariamente resultados de links com sugestões de músicas, duplas e notícias voltadas para tal gênero musical. Apesar de carregar o forte estereótipo, Goiânia também é reconhecida nacionalmente pelo seu cenário de rock alternativo, que se concretiza cada vez mais na cidade. Além das bandas locais, os festivais goianos conseguem muito destaque em todo o país. A trajetória até um meio consolidado que o rock alternativo ocupa em uma cidade que conserva muitas tradições, que é o caso de Goiânia, foi difícil e cheia de fases. Mesmo que não existam registros exatos, o documentário Goiânia Rock(s)(2016) mostra que o movimento começou a surgir a partir da segunda metade da década de 80. As pessoas procuravam algo diferente do clichê sertanejo, foi aí que se formaram bandas. Naquela época, os grupos de rock tinham grande influência da música norte-americana e investiam no estilo punk rock de garagem. consolidação Apesar de experimentar um crescimento no número de bandas e pessoas interessadas no gênero, existia a falta de um espaço onde esse grupo conseguisse se reunir. Foi nesse contexto que apareceu o Centro Cultural Martim Cererê, considerado por muitos dos envolvidos no cenário alternativo como o berço do rock e primeiro lar dos festivais em Goiânia. Sob a administração do jornalista e músico Carlos Brandão, o local, que estava abandonado, se tornou um espaço determinante para o crescimento e consolidação do rock na cidade. “Comecei no Martim em 1987, no governo do Henrique Antônio Santillo. O secretário de cultura da época me

Carlos Brandão, pioneiro do centro cultural Martim Cererê chamou para olhar umas caixas d’água no Setor Sul, achando que daria para transformar em alguma coisa cultural. Era uma área da Celg, a qual a Saneago doou para quitar uma dívida. Era só umas caixas d’água e mato. Então eu fiz um projeto chamado Novas Águas e mandei para o Ministério de Cultura, fiz a parte arquitetônica, tudo, eu e o Gustavo Veiga, que é músico e arquiteto. É aquilo que está lá hoje. Eu saí de lá ao final do governo do Santillo, em 91, e em 1999 fui chamado para assumir o Centro novamente”, explica. Embora o Martim Cererê não tenha sido criado especificamente para o público alternativo, ele acabou tomando conta do espaço. Foi a falta de locais para evento que fez com que os produtores buscassem o Martim como uma alternativa. Foi uma relação mútua e estreita, o Centro Cultural ajudou o cenário do rock a crescer, assim como os festivais produzidos nele, colaboraram para o Martim Cererê se fortalecer na cultura goianiense. “O público do rock acabou se apossando do Martim. Na verdade, foi o público do Martim que fez com que ele fosse pra frente. A ideia era tocar o Centro Cultural, mas quando eu vi a Monstro [gravadora e produtora] pingando cada ano em um lugar, fazendo seus festivais, o Goiânia Noise e o Bananada [agora da Construtora],

eu sentei com eles e os convidei para fazer os festivais todo ano lá. Acabou virando.”, pontua Carlos. Porém, o principal espaço para shows da cidade fechou para reforma em 2012, ficando inativo por 1 ano e 10 meses. Nesse período, os eventos alternativos de rock tiveram que procurar outros locais, crescendo, na cidade, diversas casas de shows voltadas para esse gênero, como é o caso do Capim Pub, Diablo Pub, República e do Old Studio. Mesmo com as novas opções, tocar no palco do local onde nasceram tantos festivais e lançaram-se tantas bandas reconhecidas ainda é algo muito gratificante e representa um sonho para músicos goianos. “Desde moleque eu tenho banda, desde os 15 anos, e era meu sonho tocar no Martim Cererê. Por que, pra mim, o Martim é o nosso Circo Voador [famoso espaço de shows do Rio de Janeiro]. Depois que eu toquei e todas as vezes em que eu toco é especial, porque o Martim é o centro onde tudo já passou. Coisa de fora, coisa daqui, todo tipo de música. Tudo que foi feito em Goiânia já passou por aqui. Então, isso aqui tem que ser preservado para o resto da vida. Isso aqui é sensacional”, comenta Michel Edere, vocalista da banda Chimpanzés de Gaveta.

festivais Mais do que espaços para reunir músicos e públicos com gosto em comum, os festivais de rock alternativo goiano se tornaram uma peça fundamental para o aumento da visibilidade e da qualidade musical produzida na terra do pequi. Eles são os grandes responsáveis por colocar Goiânia no mapa do rock brasileiro. À medida que os festivais foram crescendo, as bandas goianas também foram se fortalecendo. Antes tocavam para 20 pessoas, agora tocam para milhares. O foco dos produtores deixou de ser a quantidade de apresentações e passou a ser a qualidade. O público ficou mais exigente e o rock que era muito “americanizado” e apenas reprodutor precisou se personalizar e se tornar algo autoral, um grande diferencial que algumas bandas goianas apresentam hoje no meio musical. Apesar do pouco ou nenhum investimento recebido, os festivais eram realizados, em sua maioria de forma independente. Isso fez Goiânia ser considerada a capital brasileira de festivais independentes durante alguns anos. Um dos primeiros festivais que surgiu na região foi o Goiânia Noise, que já é realizado há 22 anos seguidos e serviu como espaço para muitas bandas se lançarem. Mesmo sendo tradicional na cidade, o produtor do evento, Leonardo Razuk, comentou que após tantos anos ainda não é fácil trabalhar com rock em Goiânia. De acordo com ele, por muitos anos a falta de apoios financeiros dificultou a realização do evento, que no final acabava sendo patrocinado pelo próprio público. Apenas nos últimos anos começou a haver investimento do estado nesse tipo de evento através das leis de incentivo, antes os produtores dependiam de patrocínios privados ou apoiadores. “É difícil! Há 15, 20 anos eram outras adversidades: de equipamento, estrutura, de logística. Só muda um pouco o tempero, mas sempre tem dificuldade e obstáculos para quem quer produzir música, sobretudo rock no Brasil, encarar.” completou Léo Bigode, o sócio de Razuk na produtora Monstro Discos. Seja o Bananada, Vaca Amarela, Goiânia Noise, Grito Rock ou qualquer um dos outros festivais goianos de rock menores, hoje pode ser considerado como uma espécie de vitrine. Neles é possível ver apresentações e bandas que antes não teriam chance nem espaço. Grupos como Black Drawing Chalks e Boogarins [que concorreu ao Grammy Latino] são alguns dos exemplos que


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CULTURA -

TAMBÉM É “ROCK CITY” Bárbara Noleto

Banca Señores se apresentando no Tomada Rock Festival 2017

aproveitaram as oportunidades que os festivais propiciam, mostraram trabalho de qualidade e hoje tocam no mundo inteiro e inspiram bandas goianas que estão começando. Por outro lado, mesmo com mais de 10 anos de banda e diversas participações em festivais Michel Edere ressalta “eu ainda acho super importante pra gente participar dos festivais, dá visibilidade. É o momento de interagir, trocar experiências e assistir o show do outro”. Rodolfo Santos, músico e produtor independente, começou a organizar eventos ainda adolescente. Hoje, depois de trabalhar na Monstro e com mais experiência, tem o seu projeto Tomada Rock já consolidado. Apesar de nunca ter conseguido ajuda da Lei de Incentivo à Cultura, diz que hoje em dia é difícil organizar um evento apenas contando com o dinheiro da bilheteria. “Ultimamente eu ando com muita preguiça, porque isso [os editais para leis de incentivo] virou

um mercado. Está igual concurso público, tem um monte de gente que nem organiza nada e inscreve projeto só para poder receber o dinheiro”, critica. O evento, ultimamente realizado em parceria com o Estúdio República, já trouxe bandas renomadas do cenário nacional de punk rock, como o Cólera e o Flicts. Rodolfo explica que, mesmo às vezes tendo que tirar dinheiro do próprio bolso para levar o show pra frente, encara os prejuízos como um investimento para a vida e que o segredo para o sucesso que o projeto vem tendo é a união que ele traz. “A gente tem conseguido criar isso e, com essa união, as coisas começam a fluir. Bandas começam a se destacar, o público começa a comparecer, a achar legal. Tem que mostrar que o negócio é divertido, porque ninguém vai lá só pra ajudar, as pessoas tem que achar legal. Esse é o maior objetivo do Tomada Rock. Resistência, união, punk rock e diversão!”

MACHISMO NO CENÁRIO DO ROCK GOIANO

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preconceito de seus companheiros de banda. Porém, no início, quando estava a procura de pessoas para tocar, recebeu respostas negativas pelo simples fato de que a banda teria um vocal feminino. “Já aconteceu também, depois de ter formado a Sixxen, outro dizer que ‘banda de mulher nunca será tão boa quanto banda de homem’. Eu fico com nojo, raiva, repulsa. Às vezes eu respondo diretamente, outras, ignoro. Sinceramente, se eu visse esse cara que disse que não bota fé em banda com vocal feminino no nosso show, eu pediria pra ele sair, sem receio algum, porque o som da Sixxen não é pra ele”, desabafa. Leidiana Marinho frequenta shows de punk e hardcore em Goiânia há 16 anos. Seu primeiro show foi um evento de aniversário da loja Hocus Pocus e, no mesmo dia, foi em um show no Máquina Rock. Ela afirma que nunca sentiu o machismo de forma direta, mas de forma indireta, em forma de piadinhas ou ao ser questionada sobre uma banda simplesmente por estar usando uma camiseta. “Tive que contar toda a história da banda para legitimar o porquê

de eu estar usando determinada camiseta. Não vejo esses questionamentos para com os rapazes. Também é comum algumas pessoas acharem que você gosta de rock por causa de algum namorado. O

que nunca foi o caso. Uma vez estava com uns discos e um cara pediu pra olhar. Quando ele terminou de ver olhou pra mim e disse: ‘é, você pode ganhar uma carteirinha de metal’”. Foto: Divulgação

anda com vocal feminino nunca será tão boa”. Essa parece uma frase antiquada, que remete à retirada da Rita Lee dos Mutantes, quando foi considerada “sem calibre” pelos seus colegas de banda, mas é algo que ainda se ouve hoje por traz dos bastidores do mundo do rock. O machismo no Brasil ainda é um grande problema. As mulheres, apesar de possuírem maior número populacional [de acordo com pesquisa do IBGE realizada em 2014] e da crescente luta feminista, ainda possuem pouca voz social. No cenário do rock goiano, além de quase não possuírem bandas com integrantes femininos e produtoras de eventos, as mulheres também são minoria no público. O machismo no meio do rock é pouco, mas não nulo. Erika Alves, vocalista da banda Sixxen, diz que a banda nunca foi barrada de festivais por ter um integrante feminino, tendo já tocado em dois dos maiores eventos da cidade, o Goiânia Noise e o Vaca Amarela, e que sempre foram muito bem recebidos pelo público. Apesar de ser a única mulher da banda, Erika conta que nunca sofreu

Erika Alves é vocalista da banda de rock goiana Sixxen


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samambaia

Goiânia, julho de 2017

- COLUNA -

Mulher no foco da câmera

CINESTESIA Por Amanda Sales

Memória é resistência (ou os motivos para assistirAquarius) O bafafá

O corpo

A memória Um país em que mal se lembra dos candidatos da última eleição precisa se lembrar da importância da memória. E Aquarius faz isso muito bem. Quando a protagonista Clara (Sônia Braga) se recusa a vender seu apartamento para uma construtora que quer demolir o edifício Aquarius ela está protegendo suas memórias construídas no lugar. O que a imobiliária faz então, é o que a ordem social dominante (branco, cis, hétero, cristão, masculino) faz com os grupos desviantes, a deslegitimação do discurso. Clara passa a ser a “louca do Aquarius”.

O espaço Um recurso bastante interessante utilizado no filme é o foco visual em objetos. Ora em uma cômoda que fora da tia Lúcia, a primeira moradora do apartamento, ora em um molho de chaves ou na paisagem. Tudo isso ambienta muito bem o espectador e contribui para ter uma ideia geral do filme, as memórias humanas estão vinculadas simbolicamente ao espaço que a compõe. Não somos somente nosso espaço mas é difícil que nos desvinculemos dele.

Foto: Reprodução

Foto: Reprodução No momento em que foi lançado no Brasil, em setembro do ano passado, Aquarius, do pernambucano Kleber Mendonça Filho, sofreu o impacto da polarização política do país. Por conta do posicionamento político do diretor e de um protesto contra o governo Temer realizado pela equipe de produção no festival de Cannes, a película foi taxada com a alcunha de “filme político”.

As lembranças não estão apenas nos objetos que cercam Clara. A mulher, ainda na juventude, lutou contra um câncer de mama e guarda no corpo já envelhecido a conseqüência da doença que lhe roubou um seio. Essa mulher de 65 anos, sem um seio, com o corpo marcado pelo tempo em momento nenhum é ocultada. E em sua presença firme Clara ensina que memória é resistência.

O velho “Quando você gosta é vintage, quando você não gosta é velho”. É a resposta de Clara para a filha que chama o apartamento de velho. A jornalista aposentada vive cercada de discos de vinil, fitas e álbuns de fotografia que aos olhos de quem não os viveu em seu auge pode parecer velharia. Mas se couber no enquadramento do Instagram, com um filtro bonito e uma legenda em inglês pode ser vintage. Você escolhe.

O país O filme como um todo é um recorte do cenário cultural brasileiro desde 1979, com uma Clara jovem, até 2016 com a mulher já velha e sozinha em seu apartamento no sétimo andar do edifício Aquarius. As músicas que compõe a trilha sonora ambientam o país nos anos 70/80 com um pouco de tudo que tocava na época e toca ainda hoje no apartamento de Clara seja na vitrola ou no MP3. Não ouvir nada recente mostra que a mulher parou no tempo, suas memórias a prendem demasiadamente, mas não a ponto de impedirem suas ações no presente. Isso nunca.

Reportagem Amanda de Oliveira Edição Amanda Sales Diagramação Amanda Sales

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Foto: Gabriela Gregório

ESTUDIOSAS PENSAM REPRESENTATIVIDAde FEMININA NO CINEMA

m uma comunidade de pescadores no litoral da Bahia, forma-se uma roda de samba. Cota, mulher negra, dirige-se ao centro e dança ao som das palmas e dos As estudantes Amanda e Mayara na UEG pandeiros. “Que mulata bela, pois que natureza, se eu me casasse era uma beleza”, brada um pescador por analisar os olhares sobre as mulheres que puxa o enredo enquanto ela entra em filmes sobre a família”, contou. em cena. Nesse momento o enquadraAlém da pesquisadora holandesa, mento da câmera em um contra plonque em seu artigo aborda os pontos de gée, quando a imagem é vista de baixo vista femininos, as teorias das minorias para cima, evidencia os seios da persoe o contra-cinema feminista, Amanda nagem, fazendo-os tomar conta de todo também utiliza como base teórica de reo foco da tela. ferência para seu trabalho a autora Laura Esta é uma das muitas cenas do priMulvey, que propõe a produção de uma meiro longa-metragem de Glauber Rocrítica feminista ao cinema narrativo tracha, Barravento (1962), que objetificam dicional e, entre seus diversos trabalhos, os corpos das mulheres negras. A forma sugere a criação de outras possibilidades como elas foram colocadas como objeto de olhar, para além do masculino, a parde olhar de dois personagens mascutir também de um projeto de contra-cilinos, entre planos e enquadramentos nema feminista. Essa prática de cinema que retratavam de forma exacerbada sugere a necessidade de rejeitar a narseus corpos, fez com que a pesquisarativa hollywoodiana, muito construídora Conceição (Ceiça) Ferreira, que da a partir do “olhar masculino” e das utilizava o filme para estudar as repreestruturas patriarcais e dedicar-se à sentações das religiões afro-brasileiras práticas experimentais. no cinema em seu mestrado, tivesse o Arlequina, uma das personagens interesse despertado em voltar suas pesprincipais de Esquadrão Suicida (2016), quisas para os estudos de gênero. é um bom exemplo. Em uma cena ela, “Foi essa inquietação que me insquebra uma vitrine e rouba uma bolsa. tigou a fazer, no doutorado, uma pesA câmera, posicionada atrás da vilã, foca quisa sobre os regimes de visibilidade sua bunda enquanto ela se curva durante impostos às mulheres negras no cinea ação. Na sequência, percebe-se o quão ma brasileiro, buscando assim analisar proposital é a escolha do plano, já que, a intersecção das assimetrias de gêneao se curvar, o bumbum de Arlequina ro e raça”, revelou Ceiça. A pesquisaé nítido alvo do olhar do personagem dora, em sua tese, “Mulheres negras e masculino que a acompanha. É a partir (in)visibilidade: imaginários sobre a dessas recorrentes criações imagéticas na intersecção de raça e gênero no cinema indústria do cinema que os sujeitos femibrasileiro (1999-2009)” analisa o imaninos são objetificados. ginário sobre a mulher negra, que nos A pesquisa e produção de conhecifilmes é evidenciado pela predomimento sobre as mulheres, quando feitas nância de imagens limitadas à sepor elas mesmas, ganha outra dimensão, xualidade e estereótipos. pois se torna um ato de reconhecimento e compartilhamento de experiências e HOLLYWOOD estratégias de enfrentamento. “Ocupar o espaço da academia e fazer ciência, doLogo que ingressou na universidamínios ainda muito masculinos (e brande, Amanda se interessou e começou cos), é muito caro para as mulheres, em a estudar o feminismo, que promoveu especial para as negras, que embora já seu encontro com o artigo Feminist estivessem em militância desde os anos Film Theory, escrito pela pesquisadora 1980 e ja reivindicassem o reconheciholandesa Annek Smelik. “Desde o dia mento de outras assimetrias, somente em que li esse artigo, decidi que queria agora, quando ingressaram nas univercomo tema de pesquisa analisar o papel sidades, é que o pertencimento racial das mulheres na cinematografia munpassou a ser considerado elemento fundial, mas com o tempo percebi que era damental na constituição de gênero no um tema muito amplo e acabei optando país”, enfatizou Ceiça Ferreira.


samambaia

Goiânia, julho de 2017

- COLUNA -

POR TRÁS DO ACORDE UM OLHAR PELO ATUAL ATRAVÉS DA ÓTICA DA MÚSICA FAIXA 4: DESPIROCAR

FAIXA 12: Cartão Postal Quem nunca sonhou em tentar a vida naquele outro lugar, onde tudo parece funcionar melhor e mais fácil, e onde os dias parecem quase mágicos e lotados de bons momentos? Quando os brasileiros finalmente chegam ao exterior, embora bons momentos sejam possíveis, eles não vêm sem uma bela quantidade de estresses para os imigrantes, que muitas vezes se desmotivam e se desiludem da ideia de uma vida às mil maravilhas. Um dos principais estresses é conseguir um emprego condizente com uma qualidade de vida decente, já que boa parte

dos trabalhos delegados aos recém-chegados é de caráter exploratório e voltados para uma mão de obra barata, com poucos direitos garantidos. Além disso, há toda uma dificuldade para a adaptação para a cultura estrangeira, visto que em muitos casos o imigrante não chega ao outro país com conhecimento sobre sua cultura e o acesso a uma comunidade local de brasileiros é complicado. O “Apanhador Só” canta: “Eu tô sentado dentro de um cartão-postal / olhando aqui de perto tudo é tão normal / a imagem mais bonita de uma capital / impressa na revista me deixou feliz / mas olhando aqui de perto, eu admito / tudo é tão normal”.

m 2013, a banda gaúcha “Apanhador Só” lançava o seu mais recente álbum até hoje: o Antes Que Tu Conte Outra. Neste álbum, o trio gaúcho formado por Alexandre Kumpinski, Felipe Zancanaro e Fernão Agra mantém a tradição da produção e disponibilização independentes de seus trabalhos. A banda incorpora neste trabalho a sua também já consolidada poética baseada em FAIXA 5: LÍQUIDO PRETO Com a crise econômica, a vida não anda fácil para muita gente no Brasil. Até para a Coca-Cola. A empresa registrou em fevereiro uma queda em sua projeção de lucro em 4% devido a gastos não planejados com despesas. Mesmo assim, o investimento no mercado brasileiro foi elevado para três bilhões de reais para 2017, cerca de 10% a mais em

relacionamentos, tratados existencialistas e crônicas descritivas. No entanto, também traz neste álbum uma nova identidade de áudio fundamentada em estilos desconjuntados, desconectados e propositalmente imprevisíveis, tornando cada faixa uma experiência única e, tal como as experiências nelas descritas, algo difícil de ser descrito em sua completude, apenas vivenciado. O álbum possui pouco mais de quarenta minutos de duração em 12 faixas, dentre as quais algumas das mais memoráveis são a Despirocar, Líquido Preto, Mordido, Não Se Precipite e Cartão Postal. média aos últimos cinco anos. Mesmo com a crise, o Brasil ocupa o posto de quarto maior mercado da CocaCola no mundo, o que, em conjunto com a pesada máquina de propaganda da empresa, causa o mesmo questionamento do “Apanhador Só”: “Como é que pode tanto engodo assim num líquido preto”, já que a bebida pode causar danos na saúde bucal, diabetes e problemas no metabolismo. Ah, e cura ressaca! Foto: Divulgação

A reforma trabalhista, proposta pelo deputado federal investigado pela operação Lava-Jato, Rogério Marinho (PSDB), é um dos principais alicerces do governo de Michel Temer, e também um dos principais motivos de sua abissal impopularidade (chegando a apenas 5% em pesquisa realizada após os eventos em Brasília no dia 24 de maio). No caso desta reforma, mesmo aliados no governo foram contra a aprovação do texto integral da proposta, que já passou por várias revisões.

Entre os diversos pontos contemplados pela proposta, um dos que mais causam repulsa na população é a possibilidade de acordos entre empregado e empregador se sobreporem ao que está previsto pelas leis trabalhistas, o chamado acordado sobre o legislado. Isso, combinado com a alta taxa de desemprego, abre a possibilidade para diversos acordos que beneficiem o empregador. Ou como canta o “Apanhador Só”, “Depois do chacoalhaço / to no trampo e o palhaço / mesmo me vendo um bagaço / já começa a me ordenhar”.

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Autor FAUSTO ANDRÉ Editor JULIANA FRANÇA Designer FAUSTO ANDRÉ

FAIXA 1: MORDIDO De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as eleições municipais do ano passado registraram um total de 38,29% de votos não válidos (somandose o total de votos brancos, nulos e abstenções), sendo um total de quase 7,1 milhões de eleitores. Esse número é maior do que os já altos 29,23% das eleições de 2012. Segundo a avaliação do presidente do TSE, Gilmar Mendes, uma das causas principais para essa evasão ao voto é a sensação FAIXA 6: NÃO SE PRECIPITE A pesquisa “Futuro Digital em Foco Brasil 2015” mostrou que os brasileiros são líderes mundiais em tempo gasto em redes sociais. Os dados apontam que os brasileiros gastam uma média de 650 horas por mês e 60% a mais do que a média mundial. Atrás do Brasil, seguem as Filipinas, Tailândia, Colômbia, Peru e Portugal. Outra pesquisa feita na Universidade de

de “estranhamento” em relação aos candidatos a vereador e prefeito. Mesmo com a falta de confiança do eleitor, os apelos dos candidatos por votos ainda se sustentam em gastos milionários em campanhas eleitorais (só no caso de Goiânia, o limite estipulado pelo TSE, somando o 1º e 2º turnos, chega a quase sete milhões e meio de reais). A isso, “Apanhador Só” canta pelo eleitorado todo: “O teu esquema sempre foi lograr / criar uma imagem boa pra vender / na captura do nosso querer / tá conseguindo é nos provocar”. Pittsburgh (EUA), mostra que o uso prolongado e compulsivo das redes sociais pode aumentar o risco de causar depressão. As evidências combinadas de ambas as pesquisas geram mudanças profundas na maneira das pessoas se relacionarem. A poesia do “Apanhador Só” ilustra bem o sentimento em “No escuro, o muro se arma. / Quanto mais alto, mais silêncio, mais nos afasta”, afinal, quantas mesas com pessoas que não conversam entre si, mas que se prostram diante de um monte de celulares já vimos por ai?

Se interessou pelo som?

Arte do álbum Antes Que Tu Conte Outra

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A Apanhador Só publica suas músicas de forma independente e as disponibilza gratuitamente em seu site na internet! O álbum Antes Que Tu Conte Outra pode ser baixado sem custo nenhum para seu smartphone através deste QR Code


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samambaia

Goiânia, julho de 2017

OLHARES FOTOS E TEXTO: Larissa Ferraz EDIÇÃO: Luciana Gomides DESIGNER: Izabella Pavetits

Na cidade de Itapuranga, interior de Goiás, agricultores ampliam possibilidades ao desenvolver variadas atividades no campo, como produção de laticínios, piscicultura, lavouras, plantações de hortaliças e fruticultura. Com isso, a agricultura familiar encontra formas de driblar a falta de programas de incentivo.


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