Jornal SôFoca 2021.1

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SÔ FOCA

Saúde

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Cidades de Mato Grosso registram surto da doença Mão-pé-boca

Meio Ambiente

16

Racismo ambiental: um atentado às terras quilombolas de Mato Grosso

Cultura

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Jovens universitários inovam em iniciativas de incentivo à leitura na internet


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Conflito entre Rússia e Ucrânia têm impactado no dia a dia dos brasileiros Dhyego Rodrigues

C

omo o conflito entre a Rússia e a Ucrânia têm impactado no cotidiano dos brasileiros? Você, com certeza, ficou sabendo, por meio dos veículos de comunicação, do aumento no valor do litro da gasolina e, mais recentemente, no quilo do pãozinho francês, não é mesmo? Pois é, aparentemente parece apenas uma mera coincidência, mas esses sucessivos aumentos são reflexos da guerra que, além de interferir no andamento da inflação, aumento contínuo e generalizado dos preços em uma economia, também desacelera o processo de retomada econômica pós-pandemia. A tensão política entre essas potências têm causado impacto em diversos países pelo mundo e não é apenas o Brasil que tem sentido essa mudança. Em alguns países, o conflito gerou problemas em relação a valorização da moeda local, baseada no preço do dólar, mas a alta no valor da moeda não chega a ser o Calcanhar de Aquiles do Brasil porque a economia do nosso país tem uma gran-

de produção de commodities, ou seja, detemos de uma grande produção agrícola, de minérios e de petróleo. Esses fatores também não significam que estejamos melhores que alguns outros países, afinal, logo após o início da guerra, tivemos um aumento no preço da gasolina, o que tem muito haver com a alta no preço do barril de petróleo que é importado da Rússia, a maior produtora mundial. Isso acontece porque, mesmo o Brasil sendo conhecido em todo o planeta pela sua produção, não somos autossuficientes. No setor agropecuário, o Brasil compra cerca de 20% de seus fertilizantes do mercado russo, e importa trigo da Rússia e da Ucrânia que são, respectivamente, a primeira e quarta maiores produtoras no mundo. O resultado disso é a alarmante ascensão do valor do trigo, que, em tempos pré-guerra, já vinha em alta. De acordo com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, a guerra contra a Ucrâ-

nia afeta aproximadamente 74 países, atingindo cerca de 1,2 bilhões de pessoas. Durante uma reunião, juntamente com o Conselho de Segurança da ONU, ele afirmou que o conflito impacta num todo, os que estão presentes nele ou aqueles que têm acompanhado de fora, independente da sua regionalização socioeconômica. “Nossa análise indica que esses países em desenvolvimento são particularmente vulneráveis ao aumento dos preços de alimentos, energia e fertilizantes”. Desse modo, percebe-se que uma cadeia de fatores acaba pesando, de certa forma, no bolso do consumidor final. Para tentar minimizar a situação, o Brasil tem buscado alternativas em outros mercados externos, enquanto o mundo ainda vivencia esse palco de horror e matança de civis e militares no continente europeu. Como ainda não há uma previsão para o fim do conflito, cerca de 10 milhões de ucranianos seguem divididos entre refugiados e deslocados internos, sem saber como será o amanhã.


“Prevemos que o ano eleitoral de 2022 será de muito embate em razão da polarização que percorre a sociedade”. Luiz Octavio Saboia



“Em um país onde há 54% da sua população de negros e pardos, só 17% dos parlamentares são negros” Alfredo da Mota


“Ao mesmo tempo que a pauta na Assembleia foi encerrada, aqui fora a luta vai seguir. Sempre buscamos que a nossa juventude se empodere e ocupe o espaço deles, principalmente na política, educação, dentro das universidades e nas escolas”. Daniel Vitor Abreu



“Era uma cena muito triste ver aquelas pessoas dormindo na rua embaixo de árvores à espera de um alimento que muitas vezes são dados aos animais domésticos. Não vejo esperança nas autoridades e nem em nossos governantes. É preciso olhar melhor para os menos favorecidos que estão passando fome”. Muryllo Monteiro


“A ideia surgiu como a oportunidade de fazer um dinheiro extra, visto que não me sentia segura para trabalhar para terceiros durante esse instante de caos”. Ana Carolina Souza



“Isso aumentou a demanda por petróleo. O barril saiu de U$$ 40 e dobrou [o preço]. Isso acabou tendo um reflexo nas bombas”. Nelson Soares


“Quando você tem uma vacina, isso faz com que você não precise se preocupar com parte do que está relacionado ao vírus, diminui bastante a questão da ansiedade frente às questões da pandemia”. Matheus Musis


“Aqui os testes rápidos são de graça e oferecidos em diversos pontos da cidade com resultado em 15 minutos” Moema Lamb


“É importante manter as medidas de higiene mais adequadas possíveis, lavar as mãos com frequência, sempre após usar o banheiro. E, claro, manter superfícies, objetos, utensílios e brinquedos limpos e desinfectados”. Thalita de Oliveira

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Ser quilombola é estar constantemente em luta para se reafirmar como indivíduo dotado de direitos básicos, como a saúde e educação, além do direito material das terras onde vivem.


O sistema capitalista de produção é um dos maiores contribuintes para a persistência do racismo ambiental nas comunidades, levando em consideração a busca incessante pelas terras, minérios e solo, visando o lucro.

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“Embora tenha sido liberada a pesca, a fiscalização continua em relação a quantidade e captura de espécies proibidas”. Alan Silveira



“A gente fala que não temos uma sede, a gente tem um lar temporário, para que todos os animais que estão ali com a gente fiquem só de passagem e encontrem lares com pessoas responsáveis que amem, cuidem deles até poderem ficar bem velhinhos e ter essa experiência de sentir o amor”. Carla Fahima


“A gente mata um leão por dia abraça o desconhecido, o emprego que vier. Se tiver medo, vai com medo mesmo, a necessidade fala mais alto nessas horas. Acho que um dos momentos que somos mais vulneráveis na vida”. Sandra Rocha



“Quando viu que quem iria atender a ocorrência seria somente eu e a motorista do rabecão, disse: ‘depois reclamam que o serviço sai mal feito, mandam duas mulheres para atender um caso como esse’” Núbia Esther


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“Quando o Cuiabá disputava a série D, raramente viam jogos de expressão tanto no antigo Verdão, que foi demolido para abrigar a Arena Pantanal, quanto na própria Arena. Após os jogos da Copa do Mundo, que ocorreu em 2014, e com a ascensão do Cuiabá nas divisões de acesso, mais e mais torcedores foram se aproximando e, hoje, todo comércio do arredor da Arena lucra com isso”. Carlos Martins



“O [futebol feminino em] Mato Grosso tem muita qualidade. Acho que se as pessoas começarem a acreditar e derem uma estrutura para o nosso trabalho, nós vamos colher mais frutos”. César Fuscão


“O Projeto visa manter crianças e adolescentes longe da criminalidade e hoje já atende mais de 200 alunos”. Ana Carolina Souza



“O hábito da leitura se forma desde a valorização dentro do lar. O primeiro contato que a criança tem com um livro é com a mãe ou com o pai e é mais fácil formar um leitor quando alguma pessoa leu para essa criança antes mesmo dela falar”. Joelma Carvalho


“As editoras que são empresas e precisam se manter e lucrar, se sentem mais seguras publicando pessoas de fora do que pessoas daqui” Mateus Elias



“Ser escritor aqui no Brasil é muito difícil, você precisa ter uma profissão secundária porque você não vai conseguir se manter apenas com a publicação de livros”. Helena Werneck

Anna Rodrıgues é mineira e gosta de ler desde quando foi alfabetizada, mas nunca teve amigos leitores. Durante a pandemia ela sentiu falta de um contato maior com as pessoas, então ela decidiu “juntar o útil ao agradável e começar a falar de livros na internet”. Ela apoia o trabalho dos escritores independentes e faz questão de interagir com eles pelas redes sociais, além de deixar resenhas e avaliações em plataformas de leitura. Eduarda Antunes é carioca. Ela sempre foi incentivada a ler e escrever pela mãe, então escreve desde criança. Conforme Eduarda foi crescendo, foi evoluindo e descobriu que queria trabalhar com isso. Seu sonho é tornar um de seus livros um best-seller e ser reconhecida por seu trabalho.

Fernanda Freıtas é paulista e escreve desde os 13 anos, quando a melhor amiga dela mostrava textos que fazia e a fez querer tentar também, descobrindo que era o que queria fazer pelo resto da vida. Seus maiores desejos são tocar as pessoas com os seus livros e ganhar um prêmio de literatura.

Geovanna Torquato é mato-grossense e começou

a escrever através de fanfics no wattpad. Sua primeira história ocupou seis cadernos escolares e a fez escolher sua profissão. Publicou o seu livro com 17 anos e o evento de lançamento foi feito pela sua própria família, que sempre a apoiou. O seu sonho no momento é vender todos os exemplares do livro.

Helena Werneck é mato-grossense e publicou o seu livro de poesia com 16 anos, após ganhar o prêmio de literatura de Mato Grosso. Ela escreve desde criança. Quando tinha 14 anos começou a escrever poesias e a participar de concursos na escola, o que foi desenvolvendo ainda mais o seu apreço pela arte da escrita. Mateus Elıas (também conhecido como Xomano do Saber) é mato-grossense e sempre gostou de escrever. Incentivado pelos pais desde o início, ele escreve poemas e prosas e tenta inserir em seu trabalho a sua característica cuiabana. Mateus possui um blog (Memórias do Xomano) e um canal no youtube (Xomano do Saber).


“Vale muito a pena fazer aquilo que a gente gosta, que faz o nosso coração bater mais forte e que nos motiva a seguir adiante. E o melhor é que podemos começar isso em qualquer momento e fase da nossa vida”. Samantha col Debella



“O

tempo para produção acaba sendo prejudicado, porque é preciso produzir uma peça até uma certa data, fica difícil cumprir prazos, uma vez que existe pouca mão de obra qualificada”. Luiz Pita

“Eu compro tecido em menor quantidade e por isso o preço final fica mais caro. Então, eu tento diminuir os custos, tentando comprar zíper de São Paulo que geralmente é importado da China, entre outros utensílios para a produção”. Einstein Halking


“As pessoas amam a sonoridade do linguajar cuiabano e são expressões que só temos aqui, são nossas. É de extrema importância manter o linguajar cuiabano vivo, ele é a nossa cara e nossa identidade. É mantendo a cultura de um lugar que atrai o turismo, além das belezas naturais”. André D’Lucca


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Histórias da pandemia Vinícius de Jesus

T

elevisão ligada. Jornal no ar. Mais um dia de notícias sobre o que estava acontecendo. Novos vídeos, novos relatos, mais países acometidos pelo vírus. Dia após dia assim, até a primeira notícia de que bateu em nossa porta. Apareceu um caso aqui e ali, outro em tal lugar. Mais um e mais um. “Soube que fulano pegou?”. “Pedimos oração por beltrano”. “Sicrano não resistiu”. De estado em estado, de cidade em cidade, não era mais um assunto reservado à televisão. Estava cada vez mais próximo. — Aqui onde eu moro, o primeiro caso confirmado foi de uma senhora que mora no Condomínio Granville do Serrado — relembrou uma amiga, que mora na cidade de Rondonópolis, em Mato Grosso. — Ela havia voltado de uma viagem do Egito e já chegou aqui com os sintomas, contaminou toda sua família e sua secretária do lar, que não resistiu ao vírus e veio a óbito. Conhecidos de conhecidos, vizinhos, amigos e familiares. A cada novo dia, o número de casos aumentava e a situação parecia só piorar, como se déssemos um passo para frente e dois para trás. Naquela altura, estávamos diante de uma grande incerteza, recheada de preocupações, inseguranças e dúvidas — muitas dúvidas. Algumas pessoas conseguiram lidar melhor do que outras — enquanto alguns indivíduos decidiram aliviar o que estava acontecendo, para o azar daqueles que tentaram tomar os devidos cuidados (quem não se deparou com as cor-

rentes, mais voltadas para a transmissão do que para a informação, repassadas no famoso aplicativo de mensagens?). Novas descobertas vinham aos poucos e as orientações iam sendo formuladas e repassadas. Para muitos, a rotina se desmontou inteira e virou o que talvez só chegou a imaginar como enredo de filme de ficção. “Fique em casa”. — Minha mãe, que na época trabalhava como caixa em um supermercado, pediu demissão dez dias depois do primeiro caso confirmado aqui na cidade. As aulas das minhas irmãs, que iriam começar em março, só retornaram em maio e por meio remoto. Os únicos que saíam de casa era minha mãe e meu padrasto para fazerem as compras mensais — contou uma amiga, que acrescentou: — Tudo que chegava em casa era higienizado de acordo com as recomendações disponibilizadas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Eu e minhas irmãs tivemos isolamento total até dezembro de 2020. Para muitos, foi um longo período sem ver os amigos, parentes e colegas, mantendo contato por meio da internet, que uniu famílias, possibilitou o trabalho e ensino remoto e permitiu a interação entre pessoas. Inseridos nesse mundo virtual, tentavam dar continuidade ao que não era possível de se fazer presencialmente, enquanto em casa, isolados, sofriam (ou buscavam maneiras de superar) os efeitos dessa reconstrução de rotina no corpo e na mente.

Direta ou indiretamente, a realidade de cada um, durante esse tempo, foi conduzida conforme os diferentes momentos da pandemia, como os primeiros casos, o distanciamento social, o lockdown, cada novo avanço científico e, por consequência, a vacinação, que nos permite reexperimentar o que o vírus nos impossibilitou de fazer. Essa oportunidade que surge diante de nossos olhos, infelizmente, não apaga o que passamos e encaramos. Quando será que vai cicatrizar? Cada pessoa que foi modificada pela pandemia vai conseguir se recuperar e sentir que esses dias terríveis não são mais seu presente e sim seu passado? Foi um processo de aprendizado, de acertos e erros. Em meio as mudanças, ajeitando aqui e ali, continuamos — bem, tentamos, não é? Nem todos caminharam no mesmo ritmo, embora o ritmo de quase tudo ao nosso redor tenha acelerado. Para acompanhar, nós tropeçamos, abrimos mão de alguma coisa e deixamos de ser exatamente o mesmo indivíduo de antes da pandemia, de todo esse caminho percorrido. Pouco ou muito, perceptível ou não, nós mudamos, aprendemos nossos limites e, em várias ocasiões, tivemos que agir dando mais do que um passo de cada vez. “É preciso continuar”. Mas de que jeito? Com pressa e tudo de uma vez para tentar compensar o tempo paralisado? Ao mesmo tempo que muitos se sentiram limitados em espaço, com uma vida parada, levando uma tentativa de

rotina, também sentiram que não eram capazes de acompanhar cada efeito e cada momento ao mesmo tempo, sem tempo para organizar os pensamentos. Por causa da pandemia, o que fez ou deixou de fazer? Quais marcas ela deixou em sua história? Imagino que a maioria irá contar daqui alguns anos sobre o que viveu até aqui. Como será? Qual sua história de pandemia? Uma pergunta que fiz e uma amiga dividiu comigo (e com vocês) sua resposta: “Tudo começou quando eu estava assistindo o JN (Jornal Nacional) Estava passando relatos e vídeos de hospitais lotados e cremação em massa. Eram cenas assustadoras, parecia trailer para promover um novo filme de ficção científica — tema: zumbi (eu morro de medo de zumbis, não me perguntem o porquê). E sim, eu fiquei aterrorizada. Pensava que iria chegar aqui no Brasil, mas não pensei que seria tão rápido”. — Não tive muitos problemas nos primeiros quinze dias de isolamento, eu já era acostumada a ficar dentro de casa por estudar por conta própria para o vestibular. O caos só veio à tona e se intensificou um tempo depois, principalmente entre a convivência com as minhas irmãs. Apesar de estarmos sempre no mesmo ambiente, nunca ficamos tanto tempo juntas, tudo foi modificado, rotina mesmo a gente pegou e jogou no ralo, a constância de todos os dias foi diminuindo e eu fui perdendo o ânimo nos estudos. A tensão familiar e o estresse eram nítidos. Nesse período minhas crises de an-

siedade passaram a ser mais fortes, posteriormente me vi tendo ataques de pânico, um ano depois fui diagnosticada com ansiedade e depressão profunda, me encaminharam para o psiquiatra onde foi receitado um tratamento químico — continuou. — Um escape que eu tive em 2021 foi a caminhada, mas com o tempo parei de ir pelo medo da contaminação, pois as pistas ficavam lotadas. Acho que também estavam procurando um escape. Cheguei a arrumar um emprego, mas não fiquei muito tempo devido a minha situação mental. Pensei que as coisas iriam fluir melhor com a chegada da vacina (errado, existiam os antivacinas). Mas, apesar dos pesares, tudo (ou o que realmente importa) está dando certo aos poucos... Quantos mais se sentiram sem preparo e pressionados? Embora melhores dias estejam batendo na porta, seguimos com algumas dúvidas, em busca do tempo para cada coisa e sem a resposta se estamos caminhando para mais perto de como era antes ou mais longe do tempo que considerávamos normal. A cada dia, escrevemos mais um pouco de nossa história, que pega rumos que não podemos controlar — mais um dia normal em nossas vidas. Somos personagens que, depois de passarmos por grandes emoções, enredos inesperados e reviravoltas, se preparam (ou não) para o amanhã, para o novo dia, uma nova fase, um novo momento, em que todos, cada qual com sua história de pandemia, continuam a tentar.


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