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IMPRESSO ESPECIAL CONTRATO No 9912233178 ECT/DR/RS FUNDAÇÃO PRODEO DE COMUNICAÇÃO CORREIOS

Porto Alegre, 16 a 30 de junho de 2009

Ano XIV - Edição No 540 - R$ 1,50

Voltando para casa

A luta a favor do morador de rua de Porto Alegre Jovem tem vez

o cole repousa n ses, e s: sa io g li há 18 me filiações re políticos ou diversas entidades civis, oluntários e s o id rt a p , is cia sa os v de classes so rupo de pessoas, ligada asa para morar. São tod m lé a e a im ida e uma c ário está ac Alegre, um g O gesto solid boa vontade. Em Porto queles que não têm com o de por a ração human gaçar as mangas e olhar Página 7 e s. rr to a s propósi resolveu sões para seu esperam ade

Beatificação de João Luiz Pozzobon

Constanza Formolo Ferronatto, 18 anos, estudante universitária de Ciências Biológicas, residente em Caxias do Sul, é destaque em nossa edição. Página 2

Desde início de junho último, cinco malas de documentos estão em poder da Congregação Para as Causas dos Santos, no Vaticano, para criteriosa avaliação do pedido de beatificação do diácono leigo gaúcho João Luiz Pozzobon. Segundo o postulador da causa, Padre Argemiro Ferracioli, o exame e a favorável acolhida, ou não, deve levar pelo menos cinco anos. O processo está sendo acompanhado pela advogada argentina Sílvia Correale que também trabalha em outros processos semelhantes que estão em andamento. Na diocese de Santa Maria, de onde Pozzobon, devoto e andarilho das “Capelinhas” de Schoenstatt, é natural, já reina grande expectativa.

Mutirão da Comunicação terá abertura solene no dia 12 de julho

Está confirmada a presença do presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais do Vaticano, arcebispo Cláudio Maria Celli, para a abertura oficial do Mutirão Latinoamericano e caribenho de Comunicação, às 19 horas de 12 de julho próximo, no Centro de Eventos da PUCRS. A abertura acadêmica, em sequência e em formato de programa televisivo, terá mesa composta por Ismael González (Cuba), Fernando Montúfar (CIESPAL), Carlos Santos (Paraguai) e Gabriel Mariotto (Argentina), entrevistados por Juremir da Silva (Brasil) e Washington Uranga (Argentina). Programa completo do Mutirão estará na próxima edição do Solidário.

A Irmandade do Arcanjo São Miguel e Almas patrocina a impressão desta edição CianMagentaAmareloPreto


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Cidadania

Jovem

Editorial

J

REPARTIR O PÃO

esus era um obsessivo pelo encontro com as pessoas em volta da mesa. São muitas as passagens bíblicas em que aparece essa quase obsessão. O início de sua assim chamada “vida pública” se deu numa festa de casamento, onde a gente celebra a alegria do amor e da convivência em volta da mesa, com comida e bebida. Ele compara o céu a um grande banquete, para o qual todos são convidados, especialmente os que estão “à beira dos caminhos”. Na oração maior da identidade cristã, inclui o pedido pelo pão de cada dia. E na noite da despedida de seus amigos, num dos momentos mais solenes e emblemáticos, novamente em volta de uma mesa, Jesus é explicito: “Há tanto tempo desejei comer convosco esta Páscoa”. Não é sem razão que se diz que partir e repartir o pão é a característica central do cristão, tantas e de tão diversas maneiras, Jesus fez da mesa e do pão seu principal lugar de encontro, de perdão, de missão, de amor, de vida. Após a ressurreição, Jesus é reconhecido quando, no episódio dos discípulos de Emaús, ele parte e reparte o pão. Diz o teólogo Érico Hammes que existe uma identidade muito estreita entre Jesus e a mesa, a comensalidade, o banquete definitivo e a aproximação de outras pessoas. O estar de Jesus no meio de nós, que repetimos tantas vezes em nossas celebrações, é o estímulo e o desafio para ir ao encontro dos outros, com particular carinho e responsabilidade, daqueles que não têm ninguém por eles. Por a mesa aos outros é a continuidade da mesa eucarística (página 6). A Eucaristia, que é partir e repartir o pão, só ganha seu verdadeiro sentido quando se transforma, naquele que comunga o corpo do Senhor, em continuidade da presença de Jesus, reconhecido e identificado nos mais necessitados, nas crianças, nos doentes, nos presos, nos migrantes e estrangeiros, nos sem pão, sem chão, sem casa, sem mesa. O que pode ser apenas uma bela teoria religiosa cristã para muitos – ser uma presença eucarística na vida dos mais necessitados - é realidade para outros. O Espírito suscita corações generosos que não se contentam com apenas serem honestos, justos, cumpridores de seus deveres sociais ou comunitários, bons cidadãos. Não. Eles e elas sentem necessidade de um “algo mais” para darem sentido mais pleno e plenificante para suas vidas. Estes corações generosos podemos encontrar exercendo atividades solidárias em organizações, como a Pastoral Operária da Arquidiocese de Porto Alegre, ou em iniciativas, como a Fundação de Solidariedade, ecumênica, educacional e comunitária, ligada à Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Se são grandes os dramas pessoais e familiares de milhares de necessitados de tudo, mas, principalmente, de dignidade, o Solidário resgata e traz para seus leitores os exemplos de pessoas que se transformam em eucaristia... em pão partilhado, em mão estendida, em presença de vida onde a vida tantas vezes já perdeu o sentido (página 7). attílio@livrariareus.com.br

tem vez

C

onstanza Formolo Ferronatto, 18 anos, estudante universitária de Ciências Biológicas, residente em Caxias do Sul, revela-nos importantes aspectos de sua vida.

* Fala um pouco de ti. Sou alguém com muitos objetivos na vida, sempre querendo transmitir coisas boas para as pessoas, estou sempre feliz, tento ao máximo fazer com que as pessoas que estão ao meu redor se sintam bem também, e aproveitando a vida. *O que pensas fazer no futuro? Penso em me formar, e como estou seguindo na área da biologia que estuda a origem da vida, pretendo fazer o máximo para que haja uma mudança no que se refere aos problemas ambientais, que estão ocorrendo no planeta, e que a natureza e o homem consigam viver em harmonia.

* Fala de teus amigos. Os amigos representam todos os momentos de felicidade e tristezas, porque em todos os momentos eles estiveram ao meu lado me aconselhando e me dizendo o certo a fazer. *O que consideras positivo em tua vida? As minhas conquistas, tanto no trabalho quanto na faculdade, e poder sempre estar ao lado de pessoas que me fazem realmente bem. *Um livro que te marcou. O macaco nu. *Um filme inesquecível. P.S. Eu Te Amo. *Uma música? Three Little Birds - Bob Marley

CNPJ: 74871807/0001-36

Conselho Deliberativo

Presidente: José Ernesto Flesch Chaves Vice-presidente: Agenor Casaril

Voluntários Diretoria Executiva

Diretor Executivo: Jorge La Rosa Vice-Diretor: Martha d’Azevedo Diretores Adjuntos: Carmelita Marroni Abruzzi, José Edson Knob e Ir. Erinida Gheller Secretário: Elói Luiz Claro Tesoureiro: Décio Abruzzi Assistente Eclesiástico: Pe.Attílio Hartmann sj

*Um defeito do qual gostarias de te livrar? De não ter paciência para certas coisas. *Qual o maior problema dos jovens, hoje? A falta de conscientização, a solução é eles abrirem os olhos e começarem aos poucos a mudar a forma de pensamento e o modo de agir com os muitos problemas que vêm ocorrendo na sociedade. *Qual o maior problema no Brasil de hoje? A falta de compreensão das pessoas, de entenderem o que está realmente acontecendo e não fazerem nada para que isso mude.

*Fala de tua família. Minha família representa grande parte das minhas conquistas, porque sempre esteve ao meu lado me apoiando, em todas as minhas escolhas, e sempre acreditando em mim.

* Um medo.

Fundação Pro Deo de Comunicação

De o mundo continuar do jeito que está.

Conselho Editorial Presidente: Carlos Adamatti Membros: Paulo Vellinho, Luiz Osvaldo Leite e Renita Allgayer Diretor-Editor Attílio Hartmann - Reg. 8608 DRT/RS Editora Adjunta Martha d’Azevedo

*O que pensas da política? Que poderia ser muito melhor, se não fossem todos esses políticos corruptos. Os jovens teriam que se interessar cada vez mais na política, pois é a partir deles que isso pode melhorar. *O que pensas sobre a felicidade? Um bem necessário para todo mundo, é o que faz com que as pessoas tenham vontade de viver. *Já fizeste algum trabalho voluntário? Qual? Ainda não, mas pretendo fazer. *O que pensas de Deus? O que deu a missão para que nós, que O estamos aqui representando, façamos o melhor para todo mundo, como Ele fez. *Uma mensagem aos jovens. Vamos representar bem a nossa geração, vamos fazer o possível para que todos os problemas tanto políticos quantos ambientais sejam cada vez mais extintos, porque a gente tem capacidade e é a gente que vai mudar o mundo.

Redação Jorn. Luiz Carlos Vaz - Reg. 2255 DRT/RS Jorn. Adriano Eli - Reg. 3355 DRT/RS Jorn.Thais Palharini (voluntária) Revisão Nicolau Waquil, Ronald Forster e Pedro M. Schneider (voluntários) Administração Paulo Oliveira da Rosa (voluntário), Elisabete Lopes de Souza e Davi Eli Impressão: Gazeta do Sul

Rua Duque de Caxias, 805 Centro – CEP 90010-282 Porto Alegre/RS Fone: (51) 3221.5041 – E-mail: solidario@portoweb.com.br Conceitos emitidos por nossos colaboradores são de sua inteira responsabilidade, não expressando necessariamente a opinião deste jornal.


Família e sociedade

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Autoridade dos pais André Pessoa Mestre em Orientação Familiar

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autoridade dos pais é um direito natural conferido por Deus e reconhecido pela sociedade. Mas, muito mais do que um direito, é um dever ou responsabilidade que os pais contraem frente àqueles que lhes conferiram o citado direito. Esta autoridade equivale à capacidade de mandar, proibir e decidir. Os filhos serão eternamente agradecidos aos pais pelo exercício da autoridade, pois deles terão aprendido com clareza e com carinho o que é certo e o que é errado. Há um século, o estilo predominante era o do vaidoso pai mandão. Exercia sua autoridade com tal zelo, que absorvia parte da autoridade da mãe, por culpa de seu forte temperamento, ou por culpa da pusilanimidade da mãe. Mas no mundo moderno é mais frequente o inverso, o debilitamento da autoridade paterna, agravada por um distanciamento progressivo do pai do lar, quase sempre por motivos de trabalho. A ausência física acaba por provocar abatimento moral, desinteresse, abandono ou delegação irrestrita da autoridade para a mãe. Este caso desdobra-se, algumas vezes, no debilitamento duplo de autoridade, quando a mãe se ausenta pelo mesmo motivo, com delegação à avó ou babá. Um quarto desajuste possível são as ânsias, por parte de algumas mães, de posse territorial, assumindo o lar como seu feudo, buscando para si todas as funções familiares, incluindo a educação.

A autoridade dos pais é sadia na medida em que ambos a compartilham equilibradamente ... e se complementam ao exercê-la. Cada um tem estilo próprio de exercer a autoridade, que deve ser respeitado e potencializado, na pressuposição de que os cônjuges se aceitam reciprocamente como pessoa, e que cada um deseja que o outro seja livre. Conflitos e disputas nesta área podem desprestigiar os pais perante os filhos e a consequência será o enfraquecimento da autoridade de ambos. Esta mesma autoridade permanece sadia se é educativa, adaptando-se a cada fase do desenvolvimento e amadurecimento das crianças ao longo dos anos. O prestígio é fundamental a quem quer que queira exercer autoridade. O prestígio pode fazer de uma pessoa um líder, ou desacreditá-la caricaturescamente. Os pais levam grande vantagem de início, pois são admirados como heróis pelos filhos. Mas os defeitos dos pais são logo percebidos, desde a tenra idade. Serão, entretanto, eternamente respeitados, se os filhos notarem que os pais lutam por adquirir virtudes do bom-humor, da serenidade, da sinceridade, da fortaleza, entre outras. O pai se faz respeitar em casa se

é homem de uma só peça, se igualmente se faz respeitar profissionalmente, entre os amigos, no lazer, etc. O que prestigia um homem é a luta que trava consigo mesmo para ser melhor, para crescer, para ser virtuoso. O homem desprestigiado perde força moral de exigir, pois demonstra não ser exigente consigo próprio. Para se fazer “amigo” dos filhos, barganha concessões... fazendo-se “carroça em vez de locomotiva”. O homem que luta por crescer interiormente não cede onde tem que ser firme, não se envaidece e nele predomina o afã de serviço. Sabe que a autoridade significa responsabilidade e muito trabalho, pois reconhece que muitos dependem dele, de sua disposição, de seu autocontrole, de sua força interior. O homem que se coloca à disposição daqueles que dependem dele, ganha simpatia, é por eles estimado e por isso tem “autoridade”. Os pais que exercem sua autoridade

na família através do serviço, fazendo-se às vezes tapete macio para estimular, e outras vezes cascalho intransigente por defender a verdade moral, dão segurança às passadas dos filhos, fazendo-os grandes seres humanos.


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Opinião

16 a 30 de junho de 2009

A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas pode ser vivida olhando-se para a frente. Sorlen Kirkegaard

O SOLIDÁRIO E A CONSCIENTIZAÇÃO J.Peirano Maciel Médico

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atólico porto-alegrense, já conheces o Solidário, o Jornal da Família? Dirijo-me, é claro, àqueles que ainda não são assinantes do jornal. Trata-se de um jornal já em seu ano XIV, até hoje com 540 edições, confeccionadas com especial cuidado e carinho, muito diferente dos outros jornais, porque, como já diz seu nome, é Jornal da Família, preocupase basicamente com assuntos que diretamente querem atingir a família católica e, em geral, essa família que nós bem sabemos encontra-se hoje ferida em seu coração, rachada, a ponto de nos permitir questionar: podemos ainda chamá-la de família, a célula da sociedade? Diante do que dissemos, uma conclusão já se impõe: que falta está nos fazendo um jornal com essas características? Na verdade, eis a importante conclusão. Vivemos numa época histórica em que a comunicação escrita, falada, etc. ocupa lugar privilegiado nas relações humanas. Isto é inquestionável. Os últimos pontífices romanos, reiterados apelos fizeram e fazem no sentido da mídia predominante. A CNBB reitera essa recomendação, chegando a dizer que um Pároco deve ser um expert comunicador. Então, leitor, acho que concordamos que nosso Solidário representa uma forma de comunicação indispensável, para a educação e evangelização de nossa família enferma. E eu refaço a pergunta: porto-alegrense, já conheces o Solidário, o Jornal da Família? A resposta, lamentavelmente, é negativa, sim, muito negativa, leitor. Em Porto Alegre, talvez tenhamos trezentas mil famílias católicas, que assim se denominam e vão às Igrejas, mas o Solidário não tem 4.000 assinantes, enquanto certos “concorrentes” tem tiragem de vários milhões de exemplares semanais! Sim, dirá um desavisado, são seitas, deixa pra lá! Certo, trata-se de um desavisado que não percebe que tais organizações, hoje espalhadas pelo orbe, estão a prejudicar, e muito, a Igreja Católica. Uma explicação para isso tudo: conscientização, falta de conscientização, consciência religiosa pequena, que nas quatro operações só diminui e divide. Há poucas semanas, estivemos numa grande paróquia, pedimos para fazer uma exposição para os fieis, o pároco concedeu um exíguo tempo, como soi ocorrer, ao término do qual chegamos à conclusão de que mais de 80 por cento dos presentes não conheciam o jornal, demonstraram pouco interesse, e os l7 que aceitaram uma ficha de assinante, até hoje não a efetivaram. Conhecemos outros casos semelhantes. Sim, falta conscientização, falta interesse das paróquias, dos fiéis, do mundo católico. Exige trabalho árduo e persistente, uma meditação de todos os atingidos.

ESPIRITUALIDADE Antônio Allgayer

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Advogado

cocatástrofes recentemente ocorridas fizeram com que a humanidade se desse conta de que os bens da Terra são limitados. Viuse que é urgente se ponha cobro ao consumismo desenfreado e se abandonem práticas danosas ao meio ambiente. Sem isso, a vida neste planeta não seguirá acontecendo. Duas cidades do Japão arrasadas por artefatos nucleares constituem sinistra amostragem do que é capaz o poder a serviço da morte. A Bíblia não situa o homem num mundo fora do mundo. Considera-o a parte consciente deste mundo. Define-o como co-criador, para tal vocacionado pelo Criador do Universo. Ninguém entendeu isto com maior lucidez, nem o expressou com mais clarividente intuição profética do que dois homens distantes no tempo por mais de seis séculos de história. Ambos possuiam o dom de vislumbrar o futuro a partir do presente. Poetas humildes, conseguiam entender em profundidade a beleza austera das matas a exuberância dos caudais, a imponência dos cumes, a textura harmoniosa do universo. Seus nomes? Francesco Bernardone e Seattle. Já no declínio da Idade Média, Francisco de Assis deu expressão poética à fraternidade universal, ao compor, numa encosta montanhosa da Úmbria, o Cântico do Irmão Sol. Eis que chamou de irmã a morte corporal e de irmãos o fogo, a água, o firmamento e a terra. Séculos depois, o cacique Seattle fez vibrar o seu estro poético em carta endereçada ao presidente Franklin Pearce. Proclamava o grande líder de um povo indígena que ferir a terra é desprezar o seu

DO PÓ

Criador. Antecipando-se aos ecólogos modernos, sustentou que tudo está ligado a tudo: “O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios.” E declarou que “as flores perfumadas são nossas irmãs”. Em ambos os vates o amor atingira dimensão cósmica. Haviam percebido que somos seres conectados, irmãos da rocha, da ave e do verme. Conscientes da pertença mútua dos seres, inauguraram a democracia cósmica. Do acima exposto depreende-se que não somos apenas condicionados pela vida presente. Nossa identidade possui amplitude maior. Há em nós elementos de vidas pregressas e potencialidades de vidas futuras. O corpo humano alberga matéria anorgânica como carbono, nitrogênio, enxofre e potássio, que já existiu em outros corpos e subsiste na cinza de remotos antepassados. Tal realidade nos vincula aos componentes minerais da biosfera. A chama do Espírito nos ilumina interiormente e sinaliza a nossa condição de seres divinizados. Há um elo bioquímico e um vínculo espiritual que nos une ao pó e à vida no mais amplo sentido da palavra. O próprio Deus, ao humanar-se em Jesus de Nazaré no seio da Virgem Maria, se fez vida em outras vidas, a depender de alimento, abrigo, segurança. O sangue que fluiu das cinco chagas do Cristo embebeu-se no chão do Gólgota e se fez presente na cadeia da vida. Eis que a Terra toda foi redimida e a criação nele recapitulada. Fomos programados para a imortalidade. A vida não é tirada e sim transformada. Importa que a enriqueçamos, na certeza de que o Senhor Ressuscitado nos resgatou da morte para a vida. Não vivemos no mundo. Somos o mundo. Não existimos pura e simplesmente. Co-existimos. Integramos a ecofesta...!

COMO SERÁ ? Dom Demétrio Valentini Bispo de Jales(SP) e presidente da Cáritas Brasileira

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empos atrás a gente só fazia esta pergunta para fantasiar como seria a vida após a morte. Se não era possível descer a muitos detalhes, ao menos se sonhava São Pedro de bom humor, abrindo a porta para a gente ir entrando. As atenções se voltavam para o outro mundo. Agora, com tantas mudanças em andamento, a pergunta vale para este mundo mesmo. Em meio ao ritmo alucinante de mudanças, nos perguntamos como será o dia de amanhã, como será a vida nos próximos anos. A pergunta é tão frequente, e angustiante, que muitas empresas já contratam futurólogos, para que tentem identificar estratégias de sobrevivência, num contexto de situações que mudam tão rapidamente. Um deles é o escocês Eamon Kelly. Ele aprendeu a pensar o futuro, constatando as mudanças radicais por que passaram trabalhadores nas minas de carvão na Escócia, que simplesmente foram desativadas. Ele faz algumas previsões, sempre aliadas a advertências. Supõe, por exemplo, que em poucos anos outros dois bilhões de pessoas no mundo serão integradas na economia mundial. Mas adverte que se esses dois bilhões assumirem o padrão de consumo dos americanos, seria necessário explorar cinco planetas como o nosso. Como só temos este, como se fará esta reeducação de costumes? O Brasil está agora festejando a descoberta de surpreendentes reservas de petróleo, no pré sal. Só o campo de Tupi poderia fornecer de cinco a oito bilhões de barris. Mas se perguntamos pelas conse-

quências da queima deste petróleo, quantos milhões de toneladas de gás carbônico seriam lançadas ao ar? Em que medida iria colaborar para o aquecimento global, que já está ficando perigoso? Aí a pergunta sobre o futuro se reveste de angústia. E se o processo de aquecimento atingir um patamar de descontrole total, numa dinâmica irreversível de mudanças climáticas, como ficará nosso planeta? Após a sua reciclagem total, quem sobraria para contar a história? Chegaria o fim da espécie humana? A pergunta pode ter incidências bem próximas e práticas. Como será o relacionamento entre as pessoas, que estarão com certeza superconectadas, mas com o risco de se desconectarem de valores vitais básicos, como a natureza, a família, a comunidade? Como ficará a vida sem este contexto salutar de convivência humana? Quem dará conta de administrar as tensões daí resultantes? Como ficará o sistema de comunicação através do rádio e da televisão, arduamente construido ao longo de décadas, se passar a ser usado sem nenhuma regulamentação e sem compromissos éticos? Como ficará o trânsito nas cidades e rodovias, se continuar o atual ritmo de novos veículos entrando em ação? Como ficará a vida e a economia quando finalmente se esgotarem as reservas de combustíveis fósseis? Fazem cem anos, apenas, que o avião levantou vôo. Foram tantas as mudanças de lá para cá. Daqui para frente, serão muito maiores, e mais rápidas. Como constatou a Conferência de Aparecida, vivemos não só uma época de muitas mudanças, mas uma mudança de época. Como será? Quem viver, verá!

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Educação e psicologia

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Espiritualidade

e desenvolvimento moral Juracy C. Marques Professora universitária. Doutora em Psicologia

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que é espiritualidade? Jorge La Rosa, em seu texto, no item Longevidade e espiritualidade, (Solidário Ed. No. 518,16-31 julho 2008, p. 5) destaca alguns aspectos que apontam para o desenvolvimento moral: “Ela envolve uma visão do ser humano, do significado da vida, dos relacionamentos, de Deus. Cultiva sentimentos de compaixão perante o sofrimento alheio, de respeito ao semelhante, de fraternidade, de solidariedade, de amor que se traduz em ações: espiritualidade é psicoterapia. As religiões incluem uma espiritualidade que decorre de suas doutrinas, e propõem de modo geral, sentimentos que são compartilhados”, realça ele em sua argumentação.

Desenvolvimento moral, por sua vez, diz respeito às noções de certo-errado, bem-mal, justiça-injustiça que se vão constituindo e mudando de configurações, através dos constantes intercâmbios da pessoa com os outros, com a sua cultura, com os grupos sociais aos quais pertence, pavimentando o caminho de suas aprendizagens e experiências, ao longo de seu ciclo vital.

Visão do ser humano

Tolerância e compaixão

Assim, “a visão do ser humano” é apoiada no princípio de ‘amar o próximo como a si mesmo’ – não fazer aos outros aquilo que não queres que te façam. Isto envolve “respeito ao semelhante”, fraternidade e solidariedade, requer aceitação de diferenças individuais e acolhimento tanto das diferenças quanto das fragilidades em si mesmo e nos outros. Os “sentimentos de compaixão” nos levam a nos identificar com os outros, a não aumentar, por nossa indiferença, seus sofrimentos, sejam de ordem orgânica (por doenças agudas ou crônicas), seja os decorrentes das injustiças sociais que levam aos desvalimentos, frente aos problemas da pobreza, da fome e da miséria.

Josué tem 14 anos, está no último ano do Ensino Fundamental de uma escola pública próxima a sua casa. É hiper-crítico em relação a seus colegas, bem como com professores, só escapa sua mãe a quem ‘idolatra’ como um ícone de perfeição, principalmente na Língua Portuguesa da qual ela é professora. Recentemente, resolveu implicar com seus colegas que cometem erros de português, tanto na fala como na escrita, está sempre na espreita de flagrar alguém que diga uma ‘barbaridade’ ou que se expresse de modo ‘ridículo’. Numa conversa com a mãe, esta lhe perguntou: Você não está sendo arrogante? Não seria melhor, convidar o Mário que escreveu “omem” para estudar junto contigo?

Justiça distributiva

Princípios de consciência

Doroti tinha cinco anos e seus pais preparavamse para sair, a fim de usufruir um jantar romântico, deixando-a com a tia. Ela, chorando e agarrada à barra da saia da mãe, queixava-se: “ Isto não é justo!”. Será que Doroti já tinha nessa tenra idade noção da ‘justiça distributiva’ em que os mais desvalidos devem receber maior atenção por parte daqueles que estão em situação mais privilegiada? Ou, seria apenas uma manifestação de criança, em seu imediatismo, para quem só vale o aqui e o agora, sem contemplar as possibilidades de um promissor depois? Se esta cena for acompanhada de um diálogo, à altura da compreensão da criança, pode se transformar num momento marcante de desenvolvimento moral, não só referente à polaridade justiça-injustiça, mas também em torno dos conceitos de certo-errado. Esta experiência pode ser a semente que frutificará, aos poucos, não só ao longo de seus anos de infância, ultrapassando a dificultosa adolescência, para chegar à vida adulta, com maturidade suficiente para lidar com eventuais frustrações..

Para atingir desenvolvimento moral é preciso conjugar princípios de consciência – valores universais, justiça, verdade, honestidade – com a transcendência: amor a Deus, sobre todas as coisas. Espiritualidade e desenvolvimento moral se fundem, a fim de evitar sofrimentos desnecessários, por falta de aceitação das fragilidades nossas e dos outros, olhando para frente com otimismo e esperança.

Divulgação


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tema em foco

16 a 31 de junho de 2009

‘Ele está no meio de nós até o fim dos tempos’

À

Divulgação

oportunidade da solenidade de Corpus Christi, Pe. Érico Hammes, professor de Teologia da PUC/RS reflete sobre a frase ‘Ele está no meio de nós’ que está no final dos evangelhos sinóticos, lembrando a despedida de Jesus. E faz oportuna resignificação e atualização teológica sobre a eucaristia e o comungar. Para Pe. Érico, “comungar a Jesus Cristo significa comungar na vida para poder continuar e estabelecer a comunhão dos outros com Deus. Nós nos tornamos mediadores e testemunhas dessa comunhão. E é importante perceber o valor eucarístico que tem, por exemplo, as nossas ações sociais. Não são ato meramente moral: são ato litúrgico. Em outras palavras: concretizam a liturgia numa continuidade de por a mesa para Deus. A eucaristia tem isso implicito: a mesa posta por Deus para nós a fim de que nós possamos por a mesa aos demais”. Presença nos necessitados

eucarística não é uma presença para consumo próprio, mas é uma presença para força própria a serviço dos demais. E nisso, a ilustração final cabal é o lava-pés na medida em que nós temos aí o gesto de Jesus, que, antes de iniciar a ceia, ele se despoja e vai lavar os pés dos seus discípulos, como esse sentido de se reduzir, abaixar e servir. E servir, inclui esse servir a mesa, por a mesa”.

“Os evangelhos dão a entender a continuidade da presença de Jesus a partir dos mais necessitados, das crianças, dos despossuídos, dos doentes, dos prisioneiros, dos estrangeiros, dos famintos, dos sedentos. ‘O que vocês fizerem ao menor dos meus irmãos (Mt 25), é a mim que o fazeis’. Ou ‘quem der de beber um copo de água por ser meu discípulo, terá sua recompensa’. Ou ‘o discípulo não é maior que o mestre e o que eu voz fiz, fazei uns aos outros’.

Ir ao encontro

A eucaristia e a vida “No capítulo seis de João - multiplicação dos pães - Jesus se identifica como sendo o pão da vida. ‘E quem comer deste pão viverá eternamente’. Essa frase, associada com capítulo seis de Marcos - a preocupação de Jesus com os famintos, isto é, os discípulos que vão para casa sem ter tomado refeição - podemos dizer que a partir dos evangelhos há uma estreita relação entre a eucaristia e a vida das pessoas”.

Comungar o próximo “Comungar com Deus na eucaristia implica comungar com o irmão. As duas coisas não podem ser separadas. Há uma relação clara e profunda. A eucaristia está na culminância das chamadas comunidades de mesa. Jesus vai na casa das pessoas tomar refeições. Estabelece comunidades com os pecadores. Isto é, com aqueles que no sistema religioso vigente estão, de certo modo, marcados, excluídos. Na realidade, estão alijados do sistema porque não cumprem os preceitos de inclusão, de pureza. E indica a necessidade de disponibilizar o pão, repartir pão. Quebrar o pão significa distribuí-lo”.

Pe. Érico Hammes

Mesa aberta para todos “O gesto de quebrar o pão era tão característico que Lucas o coloca como um sinal do Ressuscitado no encerramento do episódio de Emaús. ‘No partir do pão, os discípulos reconhecem que é Jesus’. Repartir o pão é a característica do cristianismo. E a eucaristia é essa mesa que se abre, que se põe por Deus para nós. Não é uma mesa fechada no sentido de que o círculo está fechado Mas é uma mesa aberta, para a qual todos são convidados, onde todos possam partilhar”.

Banquete aos agraciados “A eucaristia de fato deve ser, sob esse ponto de vista e teologicamente falando, o início de um banquete com aqueles que não podem pagar. Sempre vai implicar essa presença dos que não podem retribuir e só podem receber: são agraciados. Então a presença

“Existe uma identidade muito estreita entre Jesus e a mesa, a comensalidade, o banquete definitivo e a aproximação de outras pessoas. O estar de Jesus no meio de nós é nossa capacidade de ir ao encontro daqueles que não têm ninguém por eles. E que precisam que lhes seja posta a mesa, porque eles não têm mesa. Por a mesa aos outros é a continuidade da mesa eucarística. É uma questão de coerência cristã”.

Confirmar a eucaristia “Na igreja primitiva, após a celebração eucarística, muitas vezes se fazia um ágape, uma festa, onde todos eram convidados. Hoje nós observamos isso de uma forma indireta em diversas comunidades: na coleta de alimentos, na Campanha do Agasalho, Campanha da Fraternidade, as promoções de sopões a quem está com fome e em outros serviços. Isso deve ser incentivado. Confirmar a eucaristia implica realizar essa tarefa de olhar e agir pelo próximo. ‘Eu estarei no meio de vós’ implica o compromisso cristão com excluído, o morador de rua. Dom Luciano Mendes de Almeida fazia isso de forma bem organizada. E há outros que fazem isso. É hoje, provavelmente, um dos sinais mais marcantes dentro de uma cidade, até mesmo, Porto Alegre.


ação solidária

16 a 30 de junho de 2009

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Voltando para casa: lar para quem mora na rua

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entenas de meninos, meninas, adolescentes, jovens e adultos de Porto Alegre não voltam para casa no fim do dia, porque perderam seu último referencial de existência: não têm mais casa. Segundo levantamentos, são mais de dois mil seres humanos que passam a noite em prédios abandonados, sob pontes, viadutos e marquises e recuos de prédios públicos. Na Câmara Municipal tramita um projeto que institui uma política específica para essas criaturas humanas, visando a garantir padrões éticos de dignidade e não-violência na concretização de necessidades humanas e de direitos de cidadania. O Ministério Público também está ciente das necessidades primárias desses moradores e promete espaço no centro da cidade para montagem do centro de reciclagem de lixo. Embora compromisso constitucional, teria o poder público as melhores condições para minimizar o sofrimento desses semelhantes? Deve o bom cristão ficar indiferente? diálogo e criação de confiança. Sabemos que estão conosco, primeiro em função de terem o almoço no Restaurante Popular. Conseguimos as doações e tiramos do próprio bolso nosso. São 50 almoços por dia”.

Mobilização não governamental Tradicionalmente, várias iniciativas ligadas a entidades religiosas, não só em Porto Alegre como em outras cidades gaúchas, têm contribuido para minorar a sorte dos moradores de rua, especialmente migrantes. Entre essas, está a Pastoral Operária da Arquidiocese, viabilizada pela Fundação de Solidariedade que atua há mais de 20 anos. “Há 18 meses, estamos com eles com a meta de levá-los de volta para uma casa. Começamos um projeto de geração de trabalho e renda através da cata, do material reciclado. Trinta por cento das pessoas em situação de rua vivem com o que tiram da cata, isto é: o que para os outros é lixo - não serve mais - vira meio de sobrevivência para os que estão além da escala de produção e consumo. Mas eles têm muitas outras demandas: proteção contra a violência - inclusive policial - saúde, habitação, alimentação. Graças a Deus, já contamos com outras parcerias para essa ação conjunta: Comitê Gaúcho de Ação pela Cidadania que gestiona o restaurante popular, a Universidade Federal, via Departamento de Desenvolvimento Social e ainda a Ong Fala Mulher”, es-

Novo ânimo de vida

Roque Gazziola

Themis Rovera

clarece Roque Grazziola, coordenador da Pastoral Operária.

ecumênico, educacional e comunitário, e iniciei os contatos em meados de 2008. Nossa concepção de universidade é de não só restringir a gerar e passar conhecimentos profissionais e abrir caminhos, mas também fazer algo mais”, diz Themis, professora na Faculdade de Enfermagem, voluntária em todas as horas livres de sua atividade profissional e entusiasta pelo projeto ‘Voltando para Casa’. “Conseguir reunir os moradores de rua é parte de um processo longo, de

Fazer algo mais Esse é a inquietação de Themis Rovera, representante da UFRGS, que reúne os departamentos Social, de Arquitetura e Urbanismo e de Orientação Profissional da Faculdade de Enfermagem. “Conheci o trabalho da Ong FUNDSOL (Fundação de Solidariedade), de caráter

Busca de vida nova

“Fui drogado. Depois de um ano em fazenda terapêutica consegui refazer minha vida. Mas...voltei para a rua. Um dia quero voltar a ser vencedor. E para isso quero ajudar os outros a saírem do vício. Todos precisamos até mais da palavra amiga, do pequeno gesto de atenção, do abraço de solidariedade. Leandro Souza

“A sociedade tem que abrir os olhos para os moradores de rua e ver que também são seres humanos. Não pedimos para estar nessa situação. Precisamos apenas oportunidade, alguém que acredite em nós e em quem também acreditemos. Solano do Nascimento

“É nossa esperança de mudança de vida. Devemos aproveitar e agradecer aos que estão dando essa oportunidade. Moro há 14 anos na rua. Mas tenho o sonho de sair da situação”. Paulo Ferreira

Satisfeita a fome, os idealizadores pensaram mais longe e hoje estão conseguindo manter a atenção diária de 65 adultos em palestras úteis e oficinas, dadas uma hora antes do almoço no próprio restaurante popular da Rua da Conceição, no Centro de Porto Alegre. “No começo eram 15. Ninguém se conhecia. Agora são dezenas, sabem quem são seus companheiros e almoçam em clima de animado companheirismo e camaradagem. Através da discussão, da troca de idéias entre eles, nota-se um claro desejo e disposição de reconquistar sua plena dignidade humana e construir políticas públicas que lhes viabilizem. Nós os ajudamos a abrir as portas. Uma esperança de vida nova resplandece em seus rostos. Eles voltam a se sentir gente e se valorizam”, se emociona professora Themis A parceria de voluntariado também já mobilizou o Departamento Municipal de Habitação, que expôs aos moradores as possibilidades de conseguirem uma casa para morar. Também estiveram no Ministério Público para apresentar o projeto de oficinas sobre os riscos e os males das drogas.”Muitos deles saíram de casa por motivos de drogas e tuberculose”, diz Themis. “Mas precisamos da ajuda da comunidade para as oficinas – o espaço é enorme no restaurante . Voluntários: cabeleireiros, pedreiros, canto coral, música, etc.”, pede a professora.

Utilidade Pública Telefone da Fundsol: 322573.59. – 9102.1235. Falar com Tânia ou Roque.


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Saber viver

Psiu! Silêncio!

Abrir o coração Frei Ivo Bortoluz Pároco do Santíssimo Sacramento

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omo seria bom se eu tivesse a coragem de abrir meu coração e falar da dor. Eu sempre sofri em silêncio e o silêncio nos faz sofrer mais profundamente.” Esta é uma terrível tentação que muitos experimentam: na hora da dor e do sofrimento, fecham-se dentro de si mesmos, acreditando que, sozinhos e no silêncio, irão superar tudo aquilo que estão passando no seu interior. Ou, encontramos pessoas que, para manterem uma imagem de fortes, não tem a humildade de abrir seus corações e revelar que também precisam do apoio e do encorajamento dos outros. Outros, ainda, pensam: não vou tirar o tempo daquela pessoa, com meus problemas, pois ela tem tanta gente mais necessitada do que eu para atender. Estas são tentações que você deve superar, pois, do contrário, você irá mergulhar cada vez mais

no sofrimento e na dor. Na verdade, toda dor repartida é uma dor diminuída. Todo sofrimento, sofrido em silêncío, nos faz sofrer muito mais profundamente. Quem sabe seja por isso mesmo que Jesus nos diz: “Se você estiver cansado, aflito, abatido, desanimado, venha a mim e eu o aliviarei. “ Na vida; querer enfrentar a dor sozinho, é comprar um sofrimento cada vez maior e mais profundo. Nós precisamos redescobrir a arte de abrir os nossos corações. Abrir nossos corações, não para que o outro nos dê a solução para nosso sofrimento, mas para que ele nos ajude a buscar e encontrar esta mesma solução. Abrir nossos corações, não para que o outro nos dê a receita de como superarmos o sofrimento, mas para que ele nos ajude a enfrentarmos aquilo que está nos ferindo. Abrir nossos corações, não para que o outro nos diga o que precisamos fazer, mas para encontrar novas forças, sabendo que o outro irá nos ouvir por amor e por querer que sejamos mais felizes.

Você não pode ficar trancado dentro de sua dor, de seu sofrimento. É claro que você não vai abrir seu coração para todos aqueles que aparecerem na sua frente. Porém, você precisa buscar alguém. Alguém que seja muito especial para você! Alguém que tenha tempo para você. Alguém que o escute. Alguém que o entenda. Alguém que não aplauda o seu erro, mas que também não o condene por causa deste erro. Alguém que num silêncio-ouvinte, seja uma presença amiga junto de você. Junho! Mês do Coração de Jesus! Será que não chegou o momento de você abrir o seu coração para este Amigo que continua lhe dizendo: “Se você está cansado, aflito, abatido, desanimado, venha a mim e eu o aliviarei! Lembre-se sempre que, uma dor repartida, é uma dor diminuída. Lembre-se sempre de que, existe um Coração que o ama e que sempre tem tempo para escutá-Io. Tenha a coragem de abrir seu coração e de falar da sua dor. Não fique trancado dentro de você, pois todo sofrimento sofrido no silêncio, fará você sofrer muito mais.

Carmelita Marroni Abruzzi Professora universitária e jornalista

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m de nossos grandes poetas contava a história daquele sujeito que chegou desesperado ao consultório: - Doutor, doutor, por favor, me opere ! Quero ficar surdo, não aguento mais o barulho desse mundo! Lembrei-me dessa passagem quando li a matéria de Eduardo Veras: “Ensurdecido” (Zero Hora, 4 de abril de 2009). Ele comenta que a “sociedade contemporânea experimenta a abundância visual, mas essa é também uma sociedade de congestão sonora”, onde os sons estão por tudo... Esse assunto sempre me preocupou. Observo pessoas que não sabem ficar em ambiente silencioso. Precisam de ruído a sua volta; levantam pela manhã, ligam a TV e nem atentam para os programas; em clínicas ou restaurantes, pedem para aumentar o som. Constato muita dispersão nas crianças e jovens: alguns dizem que só conseguem estudar com a TV ligada; nas salas de aula, por vezes, os alunos estão com fones nos ouvidos.

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Nos parques, muitos caminham com fones nos ouvidos, o que os impede de discernir os sons da natureza. Em algumas igrejas, durante a missa, há excesso de ruídos: palmas, som muito amplificado nos cantos, pouco espaço para concentração. Em festas, jantares dançantes e, até nas reuniões familiares, coloca-se o som muito alto ou música agitada, o que acaba com nossa expectativa de rever amigos e conversar. Na rua, além dos ensurdecedores ruídos das descarga dos veículos, temos aqueles sons produzidos como sinais de advertência e os gritos dos alto falantes anunciando promoções. Em casa, os aparelhos domésticos também são bastante barulhentos. O apresentador de TV não suporta o silêncio, repete várias vezes a mesma informação ou insiste em descrever e interpretar o que vemos na tela. É como se devesse preencher um espaço em branco no texto de uma página a ser diagramada, como exemplifica Eduardo Veras. Todo esse ruído que nos rodeia parece sugerir uma conspiração universal para nos aturdir e impedir de pensar, condicionando-nos a determinados comportamentos de massa. Entretanto, o prof. Ivan Izquierdo (PUCRGS), citado por Veras, nos alerta: “O intervalo sonoro é importante. O corpo humano precisa disso para funcionar. É fisiológico. O corpo precisa tomar fôlego”. Convém lembrar, ainda, que excesso de ruído causa cansaço, estresse, dificuldade de concentração, perda de memória e, além disso, pode levar à surdez, como afirmam os especialistas. O que se poderia fazer para tornar o mundo menos barulhento ? Talvez seja um problema sobre o qual todos temos de pensar juntos, pois o silêncio é fundamental para nossa qualidade de vida. Sabemos que Deus é onipresente e está em toda a parte, logo está no silêncio e no barulho, porém, respeitando-se gostos e diferenças individuais, creio que é nos momentos de silêncio que nós O encontramos mais facilmente. debruzzi@ig.com.br


Espaço aberto

Antonio, João e Pedro:

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Sem fronteiras

Globais latinas

exemplos de santidade Diácono Nelsinho Corrêa Comunidade Canção Nova

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mês de junho é um daqueles em que a devoção católica aos santos se torna mais evidente. Temporada de Festas Juninas, neste mês grandes exemplos de santidade são comemorados: Santo Antônio (13), São João (24) e São Pedro (29). A diversidade de brincadeiras e comidas típicas dessas festas “caipiras” completa um cenário que quase sempre nos remete à infância – quando a ingenuidade e as tradições interioranas ainda tinham algum espaço, mesmo nas cidades grandes. A fogueira é outro ponto alto das atrações. Reza a tradição que ela tem origem na história bíblica do nascimento de São João Batista. Sua mãe, Isabel, teria feito uma fogueira para avisar Maria, Mãe de Jesus, que havia dado à luz. Nesse sentido, as fogueiras se constituem uma

espécie de louvor ao santo conhecido por profetizar a vinda do Salvador e por ser exemplo de retidão de caráter, humildade e ética. Com tantas e importantes qualidades, muitos confundiam João Batista com o próprio Messias, ao que ele respondia: “Eu não sou o Cristo” (Jo 3, 28) e “não sou digno de desatar a correia de sua sandália” (Jo 1,27). Antônio foi outro ser que se destacou pela humildade, entre outras virtudes. Nascido em uma família de fidalgos, resolveu, assim como São Francisco, levar uma vida de doação e de pregações. Antes de ser conhecido pelo dom da oratória e pela inteligência privilegiada, não se negava a realizar as tarefas domésticas com grande empenho no convento onde viveu, próximo à cidade de Bolonha. Sua simplicidade e humildade eram tão genuinas que os demais frades jamais suspeitaram dos seus profundos conhecimentos

Festa católica sem bebida alcoólica Rinaldo Alberton

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Advogado

lém de possuir ressonância pastoral, a frase, “festa católica sem bebida alcoólica”, tem sentido renovador e aponta para a conversão do coração do cristão católico. Ela evoca a promoção da paz e a prevenção da violência e da insegurança comunitária. Festa católica sem bebida alcoólica sugere virtude e inclusão, dando-nos um testemunho de maturidade cristã e esperança de mais vida. Verifica-se que essa frase não é inédita. Já foi estampada em cartão de festa de Padroeira, numa grande confraternização católica. Cada vez mais se constata: dá para fazer festa sem o uso da bebida alcoólica. Em abril, outra grata surpresa. Mais uma festa sem bebida alcoólica, numa de nossas Paróquias, revelando cada vez mais a conscientização dos católicos sobre os malefícios que a bebida alcoólica traz às pessoas, à família e à comunidade. Nessa mesma festa, na hora em que todas as pessoas “com cartão” entravam no salão para o almoço, três crianças estavam no pátio da igreja. Aproximei-me do menino e perguntei. O que está esperando? Envergonhado, respondeu-me. Nada! Voltei a perguntar-lhe. Está com fome? Sim, respondeu-me, baixinho. Então, disse-lhe: Vai lá e entra no salão. Disse-me ele, mas não tenho cartão. Naquele instante, a irmã chamou-o para entrar no salão junto com a outra irmãzinha, para sentarem-se à mesa e participar da festa. Uma senhora havia providenciado para que essas crianças pobres e famintas, “sem cartão”, pudessem, também, ser acolhidas. Gestos de amor e de compaixão, como esse caso das crianças, afloram quando uma Comunidade de Fé acolhe o Dízimo, Palavra de Deus, como instrumento bíblico de sustentação paroquial em detrimento da palavra dos homens; quando se promove a confraternização ao invés da busca do lucro excludente e quando se favorece a virtude da temperança no lugar do vício da bebida e do jogo. As crianças, nessa festa, não viram nenhum jovem ou adulto tomar bebida alcoólica, pois era festa católica sem bebida alcoólica.

teológicos. Quanto às qualidades de São Pedro, basta dizer que foi o escolhido por Cristo para ser a pedra que edificaria a sua Igreja. O Evangelho de São Mateus (16,15-23) diz que Jesus teria perguntado aos seus discípulos: “E vós, quem pensais que sou eu?” – ao que Pedro respondeu: “És o Cristo, Filho de Deus vivo”. E, então, disse Jesus: “Simão, filho de Jonas, és um homem abençoado! Pois isso não te foi revelado por nenhum homem, mas pelo meu Pai, que está no céu. Por isso, te digo: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e o poder da morte não poderá mais vencê-la. Dar-te-ei as chaves do Reino do Céu, e o que ligares na terra será ligado no céu, e o que desligares na terra será desligado no céu”. Neste mês de junho, devemos todos nos lembrar desses exemplos de fé, determinação, humildade e coragem. Vamos nos divertir nas Festas Juninas ao lado de quem amamos, resgatando nossa infância, e permitindo que ela permaneça conosco por mais tempo. Que nesse período ainda possamos refletir sobre a vida de Antônio, João e Pedro. Homens divinizados justamente porque fizeram de suas vidas um caminho no qual predominaram a verdade e a fé. (www.cancaonova.com)

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Martha Alves D´Azevedo

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Comissão Comunicação Sem Fronteiras

ourdes Casanova, autora do livro “Globais Latinas: Latin America´s Emerging Multinationals”, afirma que o sucesso econômico da China, da Índia e outros países asiáticos fez com que as companhias latino-americanas passassem desapercebidas no cenário internacional. Em “Globais Latinas”, Casanova analisa os fatores que tornaram possível para as companhias de de grande e médio porte da América Latina ter sucesso internacionalmente. Até 1980, os países da América Latina, principalmente Brasil e México, tinham um crescimento parecido com o da China. A partir de 1980, a chamada “década perdida”, o surpreendente crescimento estagnou. Pressionados pelas normas severas impostas nos anos 1990 pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelo Banco Mundial (BIRD), os governos da América Latina começaram a liberar suas economias. Nesta ocasião, entraram nos países as multinacionais estrangeiras para concorrer com as empresas nacionais. Diante da pressão sofrida, as empresas passaram a se sentir ameaçadas, e não tiveram alternativa a não ser crescer em escala e a se expandir no âmbito internacional. A melhor defesa foi o ataque. A partir dos anos 90, as empresas da América Latina se desenvolveram no plano doméstico e dentro dos seus mercados naturais. Ao começar de 2002, as empresas latino-americanas se globalizaram. Casanova identifica uma série de fatores que contribuíram para o sucesso das multinacionais latino americanas. Para a autora, as empresas latino-americanas desenvolveram certas capacidades como resultado de suas experiências domésticas únicas, como a compreensão a respeito das necessidades dos que estão na base da pirâmide populacional. Entre outros fatores que impulsionaram o crescimento das companhias latinoamericanas, talvez o mais importante na economia globalizada seja uma elasticidade desenvolvida após sobreviver a épocas de turbulência nos últimos 20 anos. A América Latina oferece vantagens que não se encontram em economias mais desenvolvidas, tais como um mercado interno grande e em crescimento, junto a uma população jovem e também em expansão. Para Casanova, as economias latino-americanas continuam a crescer apesar da desaceleração econômica internacional.

Visa e Mastercard


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Catequese solidária

O ESPÍRITO SANTO E A CATEQUESE Dom Sinésio Bohn

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Bispo de Santa Cruz do Sul

ia 24 de maio passado, cerca de 10.000 catequistas do Rio Grande do Sul se encontraram em Santa Cruz do Sul, numa jornada de animação. A partir da Catedral, caminharam pelo centro da cidade até o ginásio Poliesportivo. Com a presença de 13 bispos e muitos padres, foi celebrada a Eucaristia e, em seguida, grande confraternização, com música, canto e apresentações artísticas. O encontro encerrou com a bênção de envio. Uma das perguntas que ouvi sempre de novo é esta: Como se explica tamanha alegria e solidariedade, se ninguém é remunerado? Pois a catequese é ação puramente voluntária. Acresce ainda que os catequistas gastam tempo e dinheiro e, contudo, demonstram tanta felicidade! Segundo o Apóstolo João, anunciar a Jesus causa alegria: “O que vimos e ouvimos, vo-lo anunciamos para que estejais também em comunhão conosco... para que nossa alegria seja completa” (1 Jo 1, 3-4). Segundo o Catecismo da Igreja Católica, o catequista “ensina Cristo” (nº 428). Quando os apóstolos encontraram Cristo Ressuscitado, ficaram tão felizes, que até duvidaram. Quem conta é Lucas: “Por causa da alegria, não podiam acreditar ainda e permaneciam perplexos” (Lc 24, 41). A capacidade de trabalhar por amor é obra do Espírito Santo em nós, pois o amor é um dos frutos do Espírito Santo: “o fruto do Espírito que é amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio” (Gl 5, 22-23). Tradicionalmente, a função de catequista foi assumida pelas mulheres. No encontrão de Santa Cruz do Sul vi um número significativo de moços. É a evolução da sociedade. Testemunhar Jesus Cristo é tarefa de todos os discípulos: mulheres e homens. A presença do Espírito Santo na Igreja suscita também a evolução e a inculturação. Dom Albano Cavallin, grande catequista brasileiro, resume assim a evolução: Passamos de uma catequese individualista para uma catequese comunitária. Superamos a catequese nocional (perguntas e respostas), para assumir a catequese de união “Fé e Vida”. Deixamos a mera transmissão de verdades do “Depósito da Fé”, por uma catequese inculturada, com jeito e gosto de nosso povo. Também demos o passo de uma catequese por idade para uma catequese permanente. Atualmente damos, sim, catequese sistemática, mas procuramos a experiência de Deus, em estilo catecumenal, para formarmos discípulos e missionários de Jesus Cristo. Desça, pois, de novo sobre nós o Espírito Santo e vivifique a Igreja, torne vivo em nossa vida o Evangelho e derrame seus dons sobre a face da terra. Seja penhor de confiança e de esperança.

Eduardo A. Dias - 17/06 Paróquia S. Luiz Gonzaga - 23/06

Igreja e comunidade Voz do Pastor

A CRISE SOCIAL Dom Dadeus Grings

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Arcebispo Metropolitano de P. Alegre

pesar de termos garbosamente varado a barreira da escassez de alimentos, que angustiava a humanidade e exigia planejamentos econômicos cada vez mais sofisticados, não conseguimos superar o abismo que separa a riqueza da pobreza. Chega-se a falar, ainda hoje, de uma verdadeira iniquidade social. Os desequilíbrios, as desigualdades, as estruturas nacionais e internacionais estão bem longe de um equacionamento digno. Persiste, em toda parte, a chaga da pobreza, a crise do desemprego e a dor da exclusão. Para nuclear esta problemática basta apontar para as estatísticas. Mas quem não quisesse deter-se no labirinto científico destas pesquisas, pode contatá-la diariamente nas manchetes dos noticiários. E se nem isto lhe estivesse ao alcance, basta caminhar pelas nossas ruas, achegar-se às periferias das cidades... Sem entrar em pormenores, nem de dados nem de concepções sociais, é certo que existe algo de errado em nossa convivência humana. Não se trata apenas de problemas individuais. Por isso, a solução não está na ajuda, esporádica ou mesmo permanente, a alguns casos isolados. Há algo estruturalmente errado. Existem classes inteiras marginalizadas. Já não falamos da África, onde se costuma atribuir às guerras e à promiscuidade que gera Aids, grande parte da pobreza; nem nos queremos referir à Ásia, onde a superpopulação e a cultura da passividade se tornam entrave ao crescimento harmônico; nem à América Latina, com as consequências de uma colonização mal orientada, que marcaram nossa cultura e nosso modelo de viver. Isto tudo pode ser discutido e até negado. Saiamos do plano ideológico, para constatar a crise nua e crua. Ela existe também em nosso meio. Todos a constatam. E quando não se conformam com ela, se sentem angustiados. O problema não é mais – como no passado – fazer crescer o bolo antes de

reparti-lo. Ele já cresceu. Mas não foi repartido. Nosso orçamento – quando não se restringe a migalhas paternalistas – não contempla a solução do problema da exclusão, nem das favelas. Todos sabem que a solução não está em dar de comer a quem tem fome, nem de proporcionar habitação para quem vive desabrigado. o problema está em inseri-lo na sociedade, ou seja, tornar a sociedade uma convivência fraterna e solidária. Nem falo de igualdade, porque as diferenças devem ser respeitadas, mas de uma inclusão, que distribua as responsabilidades de modo mais equitativo. O ser humano não é um simples integrante de uma espécie, que põe em pé de igualdade todos os seus congêneres, respeitando apenas algumas peculiaridades, como no rebanho bovino, ovino, caprino, nas varas de porcos, nos cardumes de peixes, nos bandos de aves, nas matilhas de cães, nos enxames de abelhas... Cada ser humano é pessoa e, consequentemente, fim em si mesmo. Deve, pois, ser ajudado a realizar-se, de modo a atingir seu destino temporal e eterno. Mas é certo também que o ser humano necessariamente convive. E se não se dispõe ou se não é ajudado a conviver, na realidade, nem vive. Portanto, a realização social integra sua personalidade. É livre e responsável, mas em sociedade. E se não tiver vez na sociedade – porque ou não consegue o que comer, ou não tem onde morar, ou não tem como colaborar – não só ele, mas toda a sociedade se ressente. A marginalização de um é, na verdade, o fracasso da sociedade. Por isso, a crise social, que hoje enfrentamos, só encontrará solução definitiva na perspectiva do amor cristão. Cristo não só veio trazer o novo mandamento, de nos amarmos uns aos outros – o que equivale a não deixar ninguém excluido – mas também distribui sua graça para que isto se torne possível. Sem esta graça, a exortação, por mais pedagógica que se apresente e por mais sincera que seja, cairá no vazio. Só a graça, ou seja, só Deus por sua graça, salva.

UM DIA ESPECIAL

Antônio Mesquita Galvão

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Escritor

eus nunca rejeita a quem o ama. São inúmeros os exemplos e sinais realizados pela graça de Deus em favor de quem tem fé. Vou contar aqui um fato que escutei. Um bispo de uma pequena Diocese do interior nordestino dirigiu-se a um endereço, onde havia uma pessoa agonizando. Quando o sacerdote chegou ao local, constatou tratar-se de uma casa de prostituição. Com coragem de um ministro de Deus, resolutamente entrou na casa, disposto a atender o doente. Era uma das mulheres da casa, pessoa de meia-idade, abatida pelas agruras da vida. O homem entrou no quarto, onde a enferma estava deitada, e começou a conversar com ela, que se alegrou, contou sua vida e manifestou arrependimento por suas atitudes do passado. Envergonhada, ela disse que fora à igreja duas ou três vezes, que acreditava em Deus, venerava Nossa Senhora e, mesmo sem frequentar o templo, tinha adoração pelo “Corpo de Deus”, o sagrado Sacramento da Eucaristia, que ela admirava à distância, nas procissões e nas Missas. Ela manifestou fé, e exprimiu o desejo de fazer sua “Primeira Comunhão”. Na saída, perguntou ao sacerdote: “Quando vou receber o ‘Corpo de Deus’?”. Ele pensou e disse: “Terça-Feira eu volto aqui para conversarmos sobre o assunto”. No dia marcado,

o religioso chegou cedo e encontrou a mulher com dificuldade para respirar, mesmo assim falou-lhe sobre a Eucaristia, e os compromissos de quem recebe o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo. Na saída, notando que o caso era terminal, o bispo prometeu à enferma que voltaria alguns dias depois, e que ela iria receber o “Corpo de Cristo”. Na quinta-feira, por vários compromissos, ele só conseguiu visitar a doente ao final da tarde. Quando chegou na casa sentiu que alguma coisa estava diferente. Ao entrar no quarto, a imagem do colchão dobrado em dois, sobre a cama vazia, atestou de forma eloquente que a pobre mulher havia morrido. As pessoas informaram-lhe que ela havia morrido na madrugada e fora enterrada na tarde daquele mesmo dia. Uma mulher disse ao religioso: “Ela morreu em meus braços, falando no ‘Santíssimo Sacramento do Corpo de Deus’, e sobre seu desejo de receber a comunhão”. Ao unir os fatos, o bispo (já era idoso e “emérito” quando nos contou a história) sentiu um arrepio: de fato, a mulher havia concretizado, através do desejo, a sua “comunhão”. Ela, que afirmou adorar o “Corpo de Deus”, fora chamada por Ele em um dia muito especial. Não era uma quinta-feira qualquer, mas o dia de “Corpus Christi”, a festa do Corpo e do Sangue de Cristo. Deus nunca nega seu amor, sua graça e sua comunhão àqueles que creem. Ninguém que tenha fé fica excluído da graça.


Comunidade e Igreja

Rezar a vida Rodrigo Kuhn Chini

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Filósofo

inha intenção, com este artigo, é trazer presente duas correntes de espiritualidade que Anselm Grün (monge beneditino e teólogo) nos apresenta em seu Livro “Espiritualidade a partir de si mesmo”: a espiritualidade de baixo e a de cima que, por sua vez, poderá ser muito útil à nossa vida de oração – pessoal e comunitária -, à nossa vida de amizade e de intimidade com Nosso Senhor Jesus Cristo. A espiritualidade de baixo, que brota daquilo que nós pensamos, sentimos, através do nosso corpo, fraquezas, limitações, fracassos, doenças, enfim, do nosso real, ensina-nos que o conhecimento de Deus passa pelo conhecimento de nós mesmos. Em Delfos, a Inscrição no Pórtico de Apolo: “Conhece-te a ti mesmo” continua nos desafiando e nos convidando a que aprofundemos em nós mesmos, em busca de um maior autoconhecimento e encontro com Deus. A psicologia afirma que o homem chegará à verdade através de um autoconhecimento. Segundo os monges, a oração surge no mais profundo de nossas misérias e não de nossas virtudes. De fato, Deus não nos escolheu porque somos os melhores, nem por nossas virtudes. Escolheu porque Ele nos quis e nos ama. A Bíblia nos relata alguns personagens bíblicos marcantes que foram chamados por Deus. Também tinham suas fraquezas e limitações, a saber: Moisés era gago (Ex 6, 30) e matou um egípcio (Ex 2, 11-12); Davi matou Golias (1 Sm 17, 51); Oséias toma uma mulher prostituta e tem filhos com ela (Os 1, 2); Pedro negou a Jesus três vezes (Mt 26, 69-75); Paulo perseguiu a Igreja (At 8, 3; 9. 1, 2; 22, 4; 26. 10, 11), e assim por diante. Sem dúvida, o encontro com Deus passa pela nossa realidade, pelas nossas imperfeições e fragilidades, pelo nosso “barro”. São Paulo nos ensina que “é na nossa fraqueza que a força de Deus se manifesta”. Tratando-se da espiritualidade de cima, talvez vivida por muitos, ela salienta que Deus nos fala pela Bíblia, pelos sacramentos, pela Igreja. Não se interessa pela humanidade do ser humano. Esta espiritualidade frisa que para chegarmos a Deus devemos ser homens virtuosos, herois, sem falhas, perfeitos. Está mais ligada aos ideais e não à realidade como tal. É importante também esta espiritualidade, mas não basta a si mesma. Tendo em vista o que foi dito, ambas as espiritualidades devem caminhar juntas. O unilateralismo e o extremismo não nos levarão a nada. É essencial que haja uma profunda relação e tensão entre o nosso ser real e ideal. Para chegarmos ao nosso ideal, para intensificarmos a nossa comunhão e união com Nosso Senhor, em vista de uma maior santidade, deveremos, sem dúvida, aprimorar o nosso autoconhecimento para chegarmos a um maior encontro com Deus e conosco mesmos.

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Solidário Litúrgico 14 de junho – 11o Domingo do Tempo Comum (

verde)

1a leitura: Livro do Êxodo (Ex) 17,22-24 Salmo 91 (92), 2-3.13-14.15-16 (R/.cf 2a) 2a leitura: 2a Carta de S. Paulo aos Coríntios (2Cor) 5,6-10 Evangelho: Marcos (Mc) 4,26-34 Comentário:.Jesus falava em parábolas... contava histórias para seus discípulos e para quem quisesse ouvi-lo, levados pela fé ou por uma simples curiosidade. Sim, muitos que seguiam Jesus e o ouviam eram levados por esta curiosidade natural de conhecer melhor aquele homem, tão diferente de todos os mestres e de toda a gente que falava em público. Outra particularidade de Jesus era falar a partir do mundo da vida e do contexto conhecido por seus ouvintes. E em cada história que Jesus contava, havia sempre uma lição de vida. A grande lição da história que Jesus nos conta hoje e que Marcos coloca em seu Evangelho é que o Reino não vem imposto de cima, não vem com ruído nem é apresentado num show espetacular. Aliás, Jesus era avesso a toda manifestação espetacular e certamente não participaria de certos shows atuais onde se grita o seu nome, se monta uma pirotecnia celebrativa que é tudo menos uma celebração de fé eucarística cristã. A comparação que Jesus faz entre o seu Reino e a semente lançada na terra, que segue seu ritmo natural para nascer, crescer, transformar-se em árvore e produzir fruto, confirma o que dizemos: assim como independe da vontade do semeador que a semente por ele lançada na terra nasça, cresça e produza fruto, assim o Reino anunciado por Jesus é um Projeto de Deus onde Ele estabelece o ritmo para a semente da sua Palavra nascer, crescer e se transformar em fruto. E assim como o agricultor faz a sua parte, preparando a terra, semeando a semente e deixando que a natureza realize o milagre do seu nascimento, crescimento e da produção do fruto, assim cada mulher e cada homem de fé faz a sua parte acolhendo, generosamente, o Projeto do Reino e deixando, humildemente, que Deus estabeleça o ritmo e realize o milagre da planta e do fruto do seu Reino, Reino de justiça, de amor e de paz.

21 de junho – 12o Domingo do Tempo Comum (

verde)

1a leitura: Livro de Jó (Jó) 38,1.8-11 Salmo 106 (107), 23-24.25-26.28-29.30-31 (R/.1b) 2a leitura: 2a Carta de S. Paulo aos Coríntios (2Cor) 5,14-17 Evangelho: Marcos (Mc) 4,35-41 Comentário:.Naquele fim de dia, na poesia do entardecer, Jesus convida os amigos discípulos para um passeio de barco para a outra margem do lago. Para descansarem um pouco, depois do intenso trabalho do dia. Mas, enquanto Jesus dormia na parte de trás do barco, cansado, mas tranquilo, um forte vento colocou o barco em perigo e acabou com o prazer do passeio. Contrariados e com muito medo, eles acordam o amigo: Mestre, estamos perecendo e tu não te importas?! (4,38) Acordando, Jesus questiona seus amigos e relaciona seu medo à falta de fé. O medo é próprio dos acomodados e dos covardes. Tudo o que a humanidade conseguiu, o conseguiu correndo riscos. O medo freia a coragem de correr riscos; assim, medo e risco se excluem, se aniquilam. E o medo do risco quase sempre é, na verdade, uma falta de fé. Qualquer risco é vencido quando, primeiro, se tem fé que é possível vencê-lo e, logo, livrando-se das amarras que o medo impõe, se vive e assume os riscos que a verdadeira fé em Jesus traz consigo. Seguir a Jesus, como discípulo missionário, implica em desacomodar-se, sair do seu nicho seguro e tranquilo, e assumir os desafios e compromissos que a fé exige. Estes compromissos, assumidos com a coragem e o destemor das almas grandes e generosas, é que vão construindo e tornando realidade o tempo novo de mulheres e homens ternos e fraternos, sinal do Reino em processo de construção. E sempre contando com uma certeza: no barco da vida, Ele, Jesus, está sempre conosco quando assumimos e vivemos nossa fé, com todos os riscos que isso significa.

28 de junho – FESTA DE S. PEDRO E S. PAULO (

vermelha)

1a leitura: Livro dos Atos dos Apóstolos (At) 12,1-11

Salmo 33 (34), 2-3.4-5.6-7.8-9 (R/. 5) 2a leitura: 2a Carta de S. Paulo a Timóteo (2Tm) 4,6-8.17-18 Evangelho: Mateus (Mt) 16,13-19 Comentário: Para algumas pessoas poderia parecer estranho que Jesus quisesse saber o que a gente pensava e dizia dele. Há diferentes interpretações: há os que afirmam que Jesus não sabia, exatamente, o que diziam dele, o que tornaria sua pergunta real; para outros, Jesus fazia uma pergunta retórica para preparar o “clima” e fazer a pergunta central e desafiadora: E vós, quem dizeis que eu sou (16,15)? A resposta de Pedro, testemunhando que, para seus discípulos, Jesus era o Messias, lhe valeu uma especial e radical missão: Eu te darei as chaves do Reino: o que ligares na terra, será ligado nos céus; e o que desligares na terra, será desligado nos céus (16,19). Do poder conferido a Pedro por Jesus todos os que nele creem também participam. Todos nós, como cristãos, temos o poder das chaves do Reino anunciado por Jesus, de ligar e desligar. Este poder poderá ser exercido de formas diferentes, com diferentes responsabilidades, mas é o mesmo poder conferido a Pedro há dois mil anos. Neste sentido, é muito significativo que a Igreja associe, neste domingo, duas figuras emblemáticas da história cristã numa mesma festa: Pedro e Paulo. São Pedro, líder daquele primeiro grupo de discípulos missionários e São Paulo, que não conheceu Jesus, mas chamado apóstolo por viver radicalmente a sua fé no Senhor Jesus. Neste sentido, São Paulo nos representa a todos nós que também não conhecemos o Jesus histórico e somos desafiados a viver a coerência de nossa fé em nosso cotidiano. E sermos, hoje, aqueles que, por sua vida, são chaves que abrem as portas do Reino, Reino de mulheres e homens ternos, fraternos, solidários. attilio@livrariareus.com.br


Porto Alegre, 16 a 30 de junho de 2009

Cemitério São Miguel e Almas: acolhida e conforto para os que ficam Oferecer o melhor espaço e conforto físico e espiritual na hora da perda. É princípio inafastável que norteia a Irmandade do Arcanjo São Miguel e Almas desde sua instituição em 1773, na então Igreja Matriz do povoado de Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre. O que então era um pequeno cemitério de sepulturas sob a superfície, num ‘quadro de terra para o sepultamento dos irmãos falecidos’, localizado no terreno que se estendia desde os fundos da Igreja Matriz, até a Rua Coronel Fernando Machado, desde 1909, quando foi transferido para a colina do Bairro Azenha, começou a se transformar num dos melhores cemitérios do Rio Grande do Sul. Localizado na Av. Prof. Oscar Pereira, 400, ainda mantém ali sepulturas horizontais. Mas é também o maior cemitério – e de forma pioneira - vertical do sul do País. O primeiro sepultamento no novo endereço ocorreu em 14 de maio de 1909, acolhendo os restos mortais do senhor Manoel da Silva Braga que ainda permanecem na sepultura 0001.

Instalações e serviços As instalações do Cemitério São Miguel e Almas são modelares. Pelo que são tidas hoje como uma das melhores da América do Sul e conhecidas mundialmente. Suas principais capelas dispõem de climatização e área reservada para descanso

de parentes. Dispõe de serviços de encomendação das almas e conta com lancheria, segurança e área protegida UNIMED durante 24 horas. Ainda disponibiliza amplo estacionamento. Todos os ambientes são monitorados por câmeras de vigilância. Em sua capela central são celebradas missas todos os domingos às 9 horas e também em toda a primeira sexta-feira do mês às 16h30min. A secretaria de atendimento local funciona durante 24 horas. A Administração da Irmandade, na Rua Jerônimo Coelho 102, Centro de Porto Alegre, atende das 8h30min às 2h15min e das 13h15min às 17horas.

Contatos: Administração: (51)3227 2766, (51) 3228 5868, (51) 3228 5874 Cemitério: (51) 3223 2930, (51) 3217 0180, (51) 3223 1066 E-mail: cemiterio@cemiteriosaomiguel.org.br www.cemiteriosaomiguel.org.br

Novo impulso à catequese no Estado

Decisões do episcopado gaúcho

Foi o objetivo principal da Primeira Jornada Estadual de Catequistas, em comemoração ao Ano Catequético Nacional, realizada na cidade de Santa Cruz do Sul, na Festa da Ascensão do Senhor, dia 24 de maio último. Catequistas das 18 dioceses confirmaram seu chamado “Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda a criatura” (Mc 16, 15). E sairam fortalecidos para dar novo impulso à catequese como serviço eclesial e caminho para o discipulado. “O impulso hoje recebido nos motiva a encararmos a realidade mundial e eclesial em que vivemos, de tempos novos e exigentes. Convoca-nos a renovar a opção por Jesus Cristo e o seu seguimento, intensificando a dimensão missionária da catequese. Com o coração ardendo, renovamos nosso compromisso de caminhar com o Mestre. Por Ele somos chamados e enviados em missão. O Espírito Santo ilumine nossos sonhos, projetos e iniciativas, a fim de que possamos realizar nossa missão segundo a vontade de Deus” reflete a Carta Final tirada da Jornada e que está assinada por Dom Jacinto Flach - Bispo Referencial Animação Bíblico-Catequética e pelo Pe. Sérgio Silva - Coordenador do setor de Animação Bíblico-Catequética. Página 10

Diálogo, convivência e reflexão a partir de temas agendados, marcaram a recente reunião dos bispos de todas as 18 gauchas e dos superiores das ordens e congregações religiosas presentes no Estado, que encerrou dia 3 de junho último na Casa de Retiros Vila Betânia de Porto Alegre. Entre as decisões mais importantes, relacionam-se a visita ‘ad limina’ dos bispos à Santa Sé, entre 27 de novembro e 10 de dezembro próximos; criação de um Fundo Estadual de Solidariedade, formado a partir de 10 por cento da arrecadação da Campanha da Fraternidade; celebração em todas as dioceses do Ano Sacerdotal, em comemoração aos 150 anos do Cura d’Ars; lançamento em todas as respectivas catedrais do projeto Missão Continental, dia 18 de outubro próximo, Dia das Missões, como solicitado pela Conferência de Aparecida; e interrupção temporária do Mestrado de Teologia na PUC/RS para rever quadro de professores e eventual filiação à universidade Lateranense de Roma.

CianMagentaAmareloPreto


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