Programa de Incentivo à Inovação na UFMG Programa de Incentivo à Inovação na UFMG
ISBN 978-85-86428-65-4
9 788586 428654
Realização
Belo Horizonte-MG
PROGRAMA DE INCENTIVO À INOVAÇÃO – PII UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – ufmg A inovação e o conhecimento são diferenciais competitivos e fatores que determinam a competitividade de setores, universidades e empresas. O êxito empresarial depende da capacidade da empresa inovar tecnologicamente, colocando novos produtos no mercado, a um preço menor, com uma qualidade melhor e a uma velocidade maior do que seus concorrentes. A inovação tecnológica tem sido inadequadamente vinculada apenas aos setores de alta tecnologia. O desenvolvimento de um país, a geração de melhores empregos e salários depende de incorporar conhecimento gerado nas universidades aos setores da economia. A relação de dependência entre inovação tecnológica e desenvolvimento sustentável é verdadeira quando se examina a interação das empresas e das universidades e centros de pesquisa, já que a inovação é um dos principais determinantes do crescimento econômico, sendo um instrumento alavancador de negócios. Esta publicação apresenta os vinte projetos do Programa de Incentivo à Inovação, desenvolvidos na Universidade Federal de Minas Gerais, em parceria com o Sebrae-MG e a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. O objetivo do PII é fomentar a cultura empreendedora nas universidades por meio da: I) c onscientização e mobilização da comunidade acadêmica, órgãos de fomento, empresas e parceiros locais; II) i nvestigação e apoio ao desenvolvimento de tecnologias acadêmicas capazes de gerar inovações tecnológicas de produtos e processos. Foram apresentados 48 projetos, sendo 20 projetos selecionados para a fase de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica, Comercial e Ambiental, sendo estes projetos apresentados nesta publicação.
Programa de Incentivo à Inovação na UFMG
Belo Horizonte-MG
A Universidade contribuindo com o mercado A Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG é uma das melhores instituições de ensino e pesquisa do Brasil, portadora de enorme capital intelectual avançado, que muito contribui para o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural do país. Destacase, ainda, pelo volume significativo de patentes depositadas, inclusive no exterior, e pela tradição no campo da transferência de tecnologia para o setor empresarial, com enorme impacto no desenvolvimento regional e nacional devido ao fluxo e a qualidade do conhecimento transferido para os setores social e econômico, cumprindo seu papel na sociedade contemporânea. Neste cenário propenso à inovação e ao empreendedorismo, foi implantado o Programa de Incentivo à Inovação - PII na UFMG, em 2008, que rastreou as tecnologias desenvolvidas em seus laboratórios e destacou, finalmente, 20 (vinte) delas nas áreas de química, farmácia, bioengenharia, mecânica, eletrônica, nanotecnologia e computação para comporem a etapa 1 do Programa. Nesta etapa, pesquisadores, alunos de graduação da UFMG e o Núcleo de Tecnologia da Qualidade e da Inovação – NTQI foram envolvidos na elaboração de sumários executivos e Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica, Comercial e de Impacto Ambiental e Social – EVTECIAS, que avaliaram detalhadamente o potencial real do produto, processo ou serviço dos vinte casos estudados, considerando ainda o estágio de desenvolvimento, caráter inovador, benefícios, vantagens e riscos. Participando ativamente na disseminação e fortalecimento da cultura pró-inovação nos diversos setores acadêmicos das Universidades Federais, como de Lavras - UFLA, Juiz de Fora - UFJF, de Itajubá - UNIFEI e Viçosa - UFV, o PII possibilita a integração das instituições de pesquisa e de seus pesquisadores ao mercado e suas necessidades de inovação tecnológica, criando oportunidades para o nascimento de empresas de base tecnológica, transferências de conhecimento e tecnologias e protótipos desenvolvidos, como acontece presentemente com a UFMG. Além de contribuir diretamente para a criação de riquezas, com novos empregos e renda, outra significativa contribuição do PII é a formação de líderes empreendedores, de novas empresas de base tecnológica e a atração de investimentos, como capital semente, para empreendimentos inovadores. Com a construção do Parque Tecnológico de Belo Horizonte – BHTec, que também conta com o apoio do Governo do Estado de Minas Gerais, as ações do PII certamente irão auxiliar a ampliação e o fortalecimento das atividades do Parque na região metropolitana de Belo Horizonte, contribuindo significativamente para o desenvolvimento sustentável de Minas Gerais.
Evaldo Ferreira Vilela Secretário-Adjunto de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
Programa de Incentivo à Inovação – PII O PII é uma iniciativa inédita e ousada do SEBRAE/MG e da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais, SECTES/MG. O PII atua no sentido de aproveitar a capacidade de produção tecnológica das universidades e setores econômicos, gerando diversos benefícios, como a criação de renda, emprego e arrecadação através do nascimento de empresas de base tecnológica e a transferência de tecnologias, gerando royalties para as universidades. Outro fator importante é o incentivo aos pesquisadores e estudantes a adotarem uma postura voltada para o atendimento às demandas da sociedade. Em dois anos, e com seis programas em desenvolvimento nas mais importantes universidades mineiras, já foram apresentados 274 projetos, sendo realizados 109 Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica, Comercial e Ambiental e 60 Planos Tecnológicos, que resultaram no nascimento de 11 novas empresas de base tecnológica, 24 patentes depositadas ou em andamento, 8 transferências de tecnologias e 4 licenciamentos. Este balanço é ainda mais positivo pela mudança cultural provocada pelo PII nas universidades. Mais focados no mercado, as instituições e seus pesquisadores conseguiram mapear o portfólio de tecnologias, aumentar as oportunidades de comercialização, de obtenção de recursos para pesquisa e a geração de empregos para estudantes graduados e pós-graduados. A UFMG é uma das maiores universidades do país e não poderia ficar de fora deste Programa. O Sebrae/MG é parceiro da Universidade Federal de Minas Gerais em outras importantes ações de inovação e tecnologia como o apoio a incubadora de empresas – INOVA, projetos de consultoria tecnológica – SEBRAETEC e o BH-TEC. Com o PII na UFMG, o Sebrae/MG e a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, parceiros desde a criação e a concepção do PII, chegam a 105 pesquisas publicadas e impulsionam o nascimento de novas micro e pequenas empresas de base tecnológica. Nesta publicação, apresentamos os vinte projetos realizados na UFMG, destacando a qualidade das pesquisas e a possibilidade de aplicação das tecnologias no mercado.
Roberto Simões Presidente do Conselho Deliberativo do SEBRAE/MG
O papel da Universidade no processo de inovação nacional O Programa de Incentivo à Inovação – PII é iniciativa absolutamente inovadora. Ele tem como principal objetivo identificar projetos de pesquisa com potencial para se transformarem em inovação tecnológica, seja por meio da criação de novas empresas de base tecnológica, seja através da transferência dessas tecnologias para empresas do mercado, gerando emprego e renda. Lançada na UFMG no final de 2008, a primeira edição do PII vem cumprindo o papel de estimular projetos inovadores de diversas áreas do conhecimento: Engenharias, Química, Ciência da Informação, Biotecnologia e Ciências da Computação. O Programa está dividido em duas fases. Na primeira etapa, foram selecionados vinte projetos de pesquisa. Para cada um deles elaboraram-se estudos de viabilidade técnica, econômica, comercial, além do impacto ambiental e social. Dez dos vinte projetos iniciais foram aprovados para a segunda etapa, que consiste no desenvolvimento do protótipo de produtos, processos ou serviços e realização do plano de negócios estendido. Este plano é um plano de negócios tradicional, acrescido de um planejamento tecnológico elaborado sob a consultoria de núcleos formados por estudantes da própria Universidade. A partir do PII, espera-se que sejam abertas novas oportunidades para o estímulo a projetos empreendedores e à formação de spin-offs através de pesquisas de base tecnológica. Isto é essencial para a real interação entre universidade e empresas. Esse projeto pioneiro vai certamente incentivar outras iniciativas dirigidas ao fomento de práticas inovadoras, essenciais ao desenvolvimento de um país autônomo, livre e democrático, em que se compreenda a importância dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação para a cidadania de todos os brasileiros.
Ronaldo Tadêu Pena Reitor da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Índice SEBRAE – MG Roberto Simões Presidente do Conselho Deliberativo Afonso Maria Rocha Diretor Superintendente
Apresentação.................................................................................................. 10 Vidros bioativos aplicados à odontologia.......................................................... 12
Luiz Márcio Haddad Pereira Santos Diretor Técnico
Órtese funcional para mão............................................................................... 17
Matheus Cotta de Carvalho Diretor de Operações
Nova formulação para o controle da hipertensão.............................................. 22
Anízio Dutra Vianna Gerente da Unidade de Inovação e Tecnologia
Avaliação auditiva fisiológica objetiva.............................................................. 28
Andréa Furtado de Almeida Analista da Unidade de Inovação e Tecnologia Lauro Diniz Assessor de Comunicação Antônio Augusto Vianna de Freitas Gerente da Macrorregião Centro
Enzimas mais eficientes para exames de diagnóstico......................................... 32 RESWeb – Registro Eletrônico de Saúde na Web............................................... 36 Monitoramento domiciliar de pacientes........................................................... 41
SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR DE MINAS GERAIS Alberto Duque Portugal Secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Evaldo Ferreira Vilela Secretário Adjunto de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e Gerente do Projeto Estruturador Rede de Inovação Tecnológica Vicente José Gamarano Subsecretário de Estado de Inovação e Inclusão Digital Anna Flávia Lourenço E. M. Bakô Gerente Adjunta do Projeto Estruturador Rede de Inovação Tecnológica
Sistema para rastrear animais de cativeiro........................................................ 46 Mentol a partir de óleo de eucalipto................................................................ 52 Siderurgia mais eficiente.................................................................................. 56 Soldagem mais precisa com nova pistola semiautomática................................. 61 Poste para instalações elétricas utiliza fibra de vidro e resina............................. 66
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Ronaldo Tadêu Pena Reitor Heloísa Maria Murgel Starling Vice-reitora
Monitoramento do consumo de energia via internet......................................... 71 Pilhas superpoderosas...................................................................................... 76
Carlos Alberto Pereira Tavares Pró-Reitor de Pesquisa
Gerenciamento de vídeos digitais..................................................................... 81
Rubén Dario Sinisterra Millán Pró-Reitor Adjunto de Pesquisa Diretor da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT)
Tecnologia para deficientes visuais................................................................... 86
Prof. Jorge Tadeu de Ramos Neves Prof. Pedro Guatimosim Vidigal Coordenadores do Programa de Incentivo à Inovação Virna Fabrini Lagoeiro Lins (Assistente do PII) Tânia Mara Gomes Magalhães (Assistente do PII) Gustavo Menezes Aleixo (Assistente de Comunicação) Equipe INOVA
Tecnologia para descontaminação de efluentes da indústria farmacêutica.......... 90 Alta tecnologia para descontaminar resíduos.................................................... 95 Pesquisadores desenvolvem pó com nanopartículas magnéticas........................ 99
Programa de Incentivo à Inovação – PII Uma análise de indicadores de Ciência e Tecnologia mostra que as nações mais bemsucedidas são as que investem, de forma sistemática, em Ciência e Tecnologia e são capazes de transformar os frutos desses esforços em inovações.
juntamente com indicadores gerados fornecem aos agentes indutores um conjunto de informações para constante evolução da metodologia. E o mais importante, uma consistente base de dados de projetos inovadores e demandas em nosso Estado.
O Brasil tem atualmente um reconhecimento da comunidade científica mundial pela sua capacidade na produção de artigos indexados nas revistas especializadas e na formação de recursos humanos para as atividades de pesquisa. No entanto, ainda encontra dificuldades de transformar este conhecimento em inovação produtiva e competitividade.
O Programa de Incentivo à Inovação (PII) foi elaborado e é realizado por meio de parcerias com aporte de recursos da SECTES, do SEBRAE, em todas as iniciativas.
Os investimentos em P&D no país são, em sua maioria, realizados pelo Governo por meio das suas Universidades, as quais detêm uma grande competência de profissionais e laboratórios. No entanto, essas instituições ainda apresentam um certo distanciamento com as demandas do setor produtivo, dificultando, portanto, a transformação de resultados de pesquisa em inovações tecnológicas. Destaca-se, por outro lado, o arcabouço legal criado no país e no estado, com a aprovação das Leis de Inovação Federal e Estadual, que somadas a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, tê sua importância na promoção da inovação tecnológica, pois contempla novas formas de contratação que favorecem a mobilidade de pesquisadores das instituições públicas de modo a permitir sua atuação em projetos de pesquisa de empresas ou para constituir empresas de base tecnológica, facilitando o ingresso do pesquisador no mundo empresarial Outro ponto favorável são os ambientes inovativos, os habitat´s de inovação, que estão surgindo na maiorias das universidades mineiras, criando um espaço adequado para transformar os projetos em produtos e/ou processo inovadores, gerando empresas e empregos especializados por meio das Incubadoras, Núcleos de Transferência de Tecnologia e Parques Tecnológicos. Resumindo, temos os seguintes aspectos: - necessidade de transformar o conhecimento em valor econômico; - concentração de pesquisas tecnológicas em universidades públicas; - disponibilidade de uma legislação que permita ao pesquisador uma maior interação com o mercado e, - necessidade de surgimento de projetos inovadores que criem massa crítica para as incubadoras e parques tecnológicos. Neste contexto e, considerando ainda a experiência adquirida com a realização de ações de fomento à pesquisa inovativa, em especial, por meio de parceria junto à Universidade Federal de Minas Gerais e Universidade Federal de Viçosa, a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – SECTES e o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais – SEBRAE-MG, apresentam o Programa de Incentivo à Inovação – PII. O PII atua no sentido de aproveitar a capacidade latente de produção tecnológica das ICTs, gerando diversos benefícios, como a criação de renda, emprego e arrecadação através das empresas geradas (“spin-offs” universitários) e dos contratos de licenciamento, o mapeamento do portfólio de tecnologias das universidades, a promoção do aprendizado institucional das metodologias utilizadas e o incentivo aos pesquisadores e estudantes a adotarem uma postura voltada para o atendimento às demandas da sociedade. Além disso, devem ser levadas em conta os benefícios externos das inovações, especialmente no tocante à melhoria da produtividade dos agentes econômicos. Foi desenvolvido baseado no cenário mineiro, organizando e integrando ações pontuais já existente, proporcionando um suporte técnico completo até as fases de inserção mercadológica, Esta integração das fases que compõem o processo é o diferencial que garante o sucesso do PII. A gestão do processo inovativo otimiza o desenvolvimento dos projetos e
Regionalmente esta parceria se completa obrigatoriamente com uma instituição local fomentadora (pública ou privada). Além disso, a Instituição de Ciência e Tecnologia (ICT) beneficiada fornece como contrapartida apoio logístico e operacional. Assim, a cultura da inovação atinge as articulações locais. O programa é dividido em fases distintas: organização do trabalho e estudo inicial de viabilidade; estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTECIA); e planejamento e desenvolvimento de produto e negócio (PDPN) e relação mercadológica. Inicialmente, é feita uma chamada pública de projetos para pesquisadores da ICT envolvida, designada uma comissão de avaliação e governança local, são definidos critérios de avaliação e é realizada a seleção dos projetos aprovados para a segunda fase. Além disso, é nessa fase que ocorrerá o recrutamento dos analistas que realizarão os trabalhos da segunda fase, com divulgação da oferta de vagas em departamentos responsáveis por estágios, em empresas Jr, e em incubadoras universitárias. Posteriormente, é feito um treinamento dos analistas, com introdução à metodologia do SEBRAE e a noções de planejamento tecnológico, seguido pela coleta dos dados e pela produção dos relatórios. Será, então, feito mais um corte, selecionando os melhores projetos para a etapa final. Por meio de uma metodologia pioneira de Gestão de Desenvolvimento de Produtos e de Planejamento Tecnológico, em conjunto com o pesquisador, desenvolve-se o protótipo, para planejar seu modo de exploração econômica. É feita então a opção entre o licenciamento e o empreendedorismo, de acordo com as especificidades de cada tecnologia gerada. As ações de apoio mercadológico, visam divulgar os estudos de viabilidade e os protótipos junto a investidores e empresas interessadas. São efetuadas rodadas de negócios e uma revista é produzida e distribuída para um público maior. Caso a opção apontada pelo plano tecnológico seja o licenciamento, o projeto é encaminhado ao Núcleo de transferência de tecnologia da ICT. Caso a opção seja empreender um negócio, será feito o encaminhamento a uma incubadora de empresas de base tecnológica (IEBT). Com iniciativas simples, inovadoras e ousadas como esta, o SEBRAE e a SECTES cumprem o seu papel de gerar projetos e empresas de base tecnológica e de fomentar a transferência de tecnologia. Em dois anos, e com seis programas em desenvolvimento nas mais importantes universidades mineiras, já foram apresentados 274 projetos, sendo realizados 109 Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica, Comercial e Ambiental e 60 Planos Tecnológicos, que resultaram no nascimento de 11 novas empresas de base tecnológica, 24 patentes depositadas ou em andamento, 8 transferências de tecnologias e 4 licenciamentos. Anna Flávia Lourenço Esteves Martins Bakô Gerente Adjunta do Projeto Estruturador Rede de Inovação Tecnológica da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior - SECTES Anízio Dutra Vianna Gerente da Unidade de Acesso à Inovação e Tecnologia – SEBRAE-MG
Vidros bioativos aplicados à odontologia Novo produto pode diminuir o número de intervenções, acelerar o tratamento odontológico e eliminar o uso de anti-inflamatórios
Materiais bioativos são capazes de se integrar ao corpo humano com o mínimo de efeitos indesejados. Implantes em geral devem ser feitos ou recobertos por esses materiais para que possam se ligar ao tecido vivo. Os biovidros são exemplo desse tipo de material. Quando o implante é recoberto com vidro bioativo, formase uma interface amigável entre o implante e o organismo por meio de uma propriedade chamada osteoindutora, que facilita a regeneração óssea. Entretanto, a fabricação de vidro sempre envolve altas temperaturas, impossibilitando a incorporação de substâncias sensíveis ao calor. Para contornar esse problema, várias pesquisas dedicam-se a encontrar novas formulações que permitam abaixar a temperatura de fabricação do vidro. Esse foi o foco da pesquisa de Rosana Zacarias Domingues e Ângela Leão Andrade, do Departamento de Química da UFMG. As pesquisadoras conseguiram sintetizar vidro utilizando o método chamado sol-gel a temperatura ambiente e foram além: trabalhando com temperaturas baixas, as pesquisadoras conseguiram introduzir medicamentos no vidro sintetizado. “Como não são expostos a altas temperaturas, os princípios ativos dos medicamentos permanecem estáveis e o vidro se torna um meio de transporte, uma espécie de condutor desses fármacos dentro do organismo”, explica Rosana. A aplicação priorizada pela equipe de pesquisa foi a utilização do vidro bioativo associado a antibióticos e anti-inflamatórios em procedimentos cirúrgicos da área odontológica. Nos testes realizados em parceria com a Escola de Odontologia da UFMG, a aplicação do vidro bioativo em forma de pó, contendo medicamento, foi capaz de induzir a formação de tecido ósseo, a partir do crescimento da hidroxiapatita. Essa substância é a principal constituinte desse tipo de tecido, levando a uma ligação do material de implante com o tecido ósseo e também capaz de
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controlar o processo inflamatório resultante da intervenção. “A intervenção com vidro bioativo é mais efetiva porque leva o medicamento exatamente para o local que demanda o tratamento”, conta Rosana. “Ele pode diminuir o número de intervenções, acelerar o tratamento e ainda eliminar o uso de anti-inflamatórios por via oral, comuns em cirurgias odontológicas”, complementa. VIDRO BIOATIVO COM PRÓPOLIS O próximo teste com o vidro bioativo será utilizá-lo no tratamento de crianças com Síndrome de Down. Esses pacientes têm dificuldade de fazer a higienização diária dos dentes, o que favorece o aparecimento de cáries. Nesses casos, a prevenção é ainda mais importante. Pensando nisso, Ângela Leão e Rosana Domingues associaram própolis – que já tem ação antibiótica e anti-inflamatória comprovadas – ao vidro bioativo. Por meio de microimplantes, a própolis poderá ser liberada gradativamente na boca do paciente. Segundo Rosana, o resultado foi bastante satisfatório na prevenção do aparecimento de doenças. A aplicação do vidro bioativo em odontologia representa muitas vantagens. O tratamento fica mais rápido, eficiente e mais confortável para o paciente que terá que ir menos vezes ao consultório. “Quando uma pessoa vai ao dentista tratar uma cárie, por exemplo, o profissional retira a cárie e faz um curativo. Ele tem que retornar depois para colocar a restauração definitiva. Com o vidro bioativo, o curativo não será mais necessário”, conta Rosana. Ao mesmo tempo o cirurgiãodentista terá que usar menos osso bovino e, em alguns tratamentos, não será mais
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Outras aplicações A tecnologia de associação de vidros bioativos a medicamentos pode ter várias aplicações. Uma das mais interessantes é no revestimento de nanopartículas magnéticas para tratamento de células cancerígenas. Quando encontram um campo magnético, sob condições controladas, essas partículas aquecem. Ao contrário das células saudáveis, as células tumorais morrem com temperaturas em torno de 40ºC. “Se pudermos levar um medicamento para o local do tumor e aplicar um campo magnético, será possível matar células malignas, sem atingir as células saudáveis como ocorre na quimioterapia”, explica Rosana. Células normais suportam temperaturas de até 43ºC sem sofrer alterações. Como condutores de medicamentos, os vidros bioativos têm grande potencial de atender a uma tendência recente em medicina: a opção por abordagens locais em vez da abordagem sistêmica. Todo medicamento administrado por via venosa percorre todo o organismo até atingir o local onde é realmente necessário. O ideal é atacar localmente uma doença que atinge apenas um sistema no organismo, poupando os sistemas saudáveis.
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Órtese funcional para mão UFMG desenvolve primeira órtese dinâmica para mão
Desde as atividades mais simples como escovar os dentes, dirigir, cozinhar, digitar um texto, até segurar um copo de cerveja depois de um longo dia de trabalho, são poucas as atividades no dia a dia em que não utilizamos as mãos. Por essa razão, perder o movimento da mão tem impactos significativos na qualidade de vida das pessoas, incluindo consequências socioeconômicas, pois muitos pacientes ficam fora do mercado de trabalho. Um grupo de pesquisadores do Laboratório de Bioengenharia (Labbio), da UFMG, coordenado pelo professor Marcos Pinotti, desenvolveu uma órtese dinâmica para mão que permite os movimentos de flexão e extensão dos dedos, restaurando o movimento de pinça para o usuário que perdeu esse movimento. A tecnologia é inédita, já que no Brasil não há órteses como essa, que possibilitam restaurar a capacidade funcional dos membros superiores.
necessário o uso da hidroxiapatita, barateando o tratamento. A hidroxiapatita pode custar R$ 60,00 o grama. Já foi feito o pedido de patente para proteção da tecnologia que será comercializada pela empresa CeelBio – Tecnologia em Cerâmicas, spin-off do Departamento de Química da UFMG. Não existe no mercado nacional e internacional um concorrente direto para os vidros bioativos com aplicação odontológica. O Brasil é atualmente o quinto mercado mundial em implantes dentários. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo), o mercado deve assistir a um crescimento de 8,5% para o segmento de implantes, configurando um cenário favorável para o lançamento do produto no mercado. Equipe: Departamento de Química Ângela Leão Andrade Rosana Zacarias Domingues | E-mail: rosanazd@ufmg.br 16 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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As próteses e órteses são dispositivos que auxiliam alguma função prejudicada do corpo humano. As próteses têm uso indefinido, elas substituem membros quando ocorre uma amputação, por exemplo. Órteses são dispositivos ortopédicos destinados a alinhar, prevenir ou corrigir deformidades ou melhorar a função das partes móveis do corpo. As órteses têm, portanto, ação corretiva e são, em geral, de uso temporário nos casos de lesões em que o membro foi preservado. Em acidentes ou lesões nas mãos, elas são usadas para ajudar na recuperação do paciente, restaurando a capacidade funcional desses membros superiores. No Brasil, existem vários tipos de órteses disponíveis. No entanto, todas são estáticas ou passivas, ou seja, não proporcionam movimentos. “A função da órtese estática é colocar a parte do corpo que está sendo tratada em determinada posição, a partir da qual o paciente consegue realizar algum movimento específico. A órtese dinâmica atua nas articulações, provocando o movimento”, explica Pinotti. “Por isso ela pode devolver o movimento para quem o perdeu e ajudar no processo de neuroplasticidade de quem tem chance de recuperação”, diz. Neuroplasticidade é a capacidade de adaptação do sistema nervoso de reprogramar suas funções em resposta às mudanças nas condições em que o indivíduo interage com o ambiente a sua volta. A nova órtese de mão é composta por três módulos principais: uma luva, um músculo artificial eletromecânico e um módulo de controle. A luva possui tendões artificiais ligados a um motor que faz a mão abrir e fechar. O acionamento da órtese é realizado pelo usuário por meio da captação de sinais mioelétricos gerados pela contração voluntária de músculos preservados. Eletrodos de superfície são responsáveis pela captação desses sinais. “Nossa ideia foi criar um dispositivo pequeno e leve, que fosse muito confortável. Foi daí que chegamos a uma luva que usa sinal mioelétrico”, conta Pinotti. “Quando a pessoa tem intenção de fazer um movimen-
Cresce número de lesões nas mãos Lesões nas mãos podem ter diversas origens. Entre as não traumáticas destacam-se as provocadas por tumores, infecções, doenças vasculares e degenerativas. Tem aumentado, no entanto, o número de pessoas com lesões nas mãos principalmente devido a traumas provocados por acidentes de trabalho, acidentes automobilísticos e de motocicletas, esportes e quedas.
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to, ocorre uma ativação elétrica nos músculos, que aciona o motor. A escolha dos músculos que vão acionar a luva depende do tipo de lesão, mas eles têm que ser antagônicos, isto é, ter movimentos opostos para que os movimentos sejam intuitivos para o usuário”, explica. Segundo o professor, o novo equipamento é capaz de realizar o movimento de abertura e fechamento da mão em indivíduos com paralisia, restabelecendo os movimentos necessários para a realização de tarefas diárias. O estabelecimento do movimento de pinça, principal movimento da mão, já é um grande avanço para a reintegração dos pacientes. Quando recuperado pela mão comprometida, ela poderá exercer, no mínimo, um papel complementar, servindo de apoio à outra mão, que ainda possui os movimentos preservados para desempenhar o papel principal na realização das atividades. A órtese tem protótipo funcional que já foi submetido aos primeiros testes clínicos, ou seja, em pacientes. “Fizemos testes em voluntários com lesão do plexo branquial e os resultados foram muito favoráveis. Pessoas que tinham perdido o movimento da mão voltaram a pegar objetos, o que representa um ganho importante em termos de qualidade de vida”, conta Pinotti. O plexo braquial é um conjunto de nervos localizado na região do pescoço, responsável pelos movimentos do membro superior. Lesões no plexo braquial são comuns em adultos, principalmente por acidentes de moto. A luva é feita com um polímero termomoldável. Personalizada, ela é moldada no paciente. “Para o futuro pensamos em usar um material ainda mais leve, desenvolvido também no Departamento de Engenharia Mecânica,
utilizando compósitos nanoestruturados. Com isso o produto final deve ficar mais barato”, adianta o pesquisador. A próxima fase dos testes será realizada na Universidade Estadual de Pernambuco, instituição parceira da UFMG. A tecnologia já foi patenteada. A equipe de pesquisadores tem como objetivo criar uma spin-off para comercializar a nova órtese e, posteriormente, desenvolver uma linha de produtos nessa área, a partir dos conceitos utilizados na órtese dinâmica para mão. Equipe: A driano Amâncio Afonso Claysson Bruno Santos Vimieiro Daniel Neves Rocha Danilo Alves Pinto Nagem Fábio Lúcio Corrêa Júnior – E-mail: flcjunior@uol.com.br Marcos Pinotti Barbosa – E-mail: pinotti@ufmg.br Mauricio Ferrari Santos Corrêa Tálita Saemi Payossim Sono 20 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Nova formulação para o controle da hipertensão Tratamento pode resultar em maior adesão do paciente
Uma pesquisa de dois laboratórios da UFMG – o de Química e o de Fisiologia e Biofísica – resultou em um novo medicamento para o tratamento de hipertensão. Os pesquisadores Rubén Dario Sinisterra, Robson Augusto Souza dos Santos e Pedro Pires Goulart Guimarães associaram um fármaco já utilizado por hipertensos – o Losartan e um peptídeo produzido pelo organismo humano, a angiotensina (1-7) – obtendo uma nova formulação. Com isso, a regulação da pressão arterial ocorre de forma mais eficaz do que os medicamentos disponíveis hoje no mercado. A tecnologia encontra-se na fase dos testes pré-clínicos. A próxima etapa, que são os testes clínicos em humanos, deve ser conduzida em parceria com uma empresa farmacêutica interessada na tecnologia. A hipertensão acontece quando a pressão do sangue na parede das artérias é muito elevada, ficando o valor maior que o normal, que é de 12 por 8 (120/ 80 mmHg). Quando a hipertensão arterial ou pressão alta não é tratada, torna-se o principal fator de risco para acidente vascular cerebral (AVC), doenças do coração, paralisação dos rins, lesões nas artérias, podendo também causar alterações na visão. A doença não tem cura, mas tem controle. O tratamento é realizado por toda a vida e consiste em medicação associada à mudança de hábitos dos pacientes, por exemplo, na alimentação e prática de atividade física. “A hipertensão é uma doença multifatorial. É difícil detectar a origem do desequilíbrio do sistema que controla a pressão”, explica Rubén Sinisterra, do Departamento de Química da UFMG e coordenador do projeto. Como forma de ajudar o paciente a controlar os níveis da pressão, os médicos podem testar diversos tipos de medicamentos e dosagens. Atualmente, existem vários fármacos para o tratamento da pressão alta, mas boa parte deles provoca efeitos colaterais e a eficiência no controle da pressão não é satisfatória. Em muitos casos o indivíduo tem que tomar mais de um tipo de medicamento. Cerca de 70% dos pacientes precisa de dois ou mais fármacos, que, aliado aos efeitos colaterais provocados por esses fármacos, torna a adesão ao tratamento baixa. Para chegar a uma formulação farmacêutica mais eficiente, os pesquisadores do Laboratório de Desenvolvimento Farmacêutico da UFMG (LABFAR-UFMG) com-
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Multidisciplinaridade O projeto que resultou na nova tecnologia é fruto de uma parceria entre o Departamento de Química e o Departamento de Fisiologia e Biofísica da UFMG, que, juntos, formaram o LABFAR. O laboratório já depositou mais de 40 patentes, entre nacionais e internacionais. A aproximação começou com um projeto multidisciplinar dos cursos de pós-graduação em Química e Fisiologia-Farmacologia da UFMG, financiado com recursos da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa – Fundep e, posteriormente, com recursos vindos de dois processos de transferência de tecnologia, realizados entre o LABFAR e duas indústrias farmacêuticas nacionais. Recentemente, essa parceria resultou na criação de um curso de Mestrado Profissional em Inovação Biofarmacêutica, com três áreas de concentração: formulações, usando nanobiotecnologia; testes pré-clínicos; e propriedade intelectual e inovação. “Muitas vezes estamos dentro da mesma universidade sem conhecer o que o pesquisador no instituto ao lado está fazendo. Ao unir competências, ficamos mais fortes”, afirma Sinisterra. O LABFAR será transferido para o Parque Tecnológico de Belo Horizonte, que está sendo construído ao lado do campus da UFMG. Com a mudança, o laboratório poderá estreitar relações com a indústria farmacêutica nacional e internacional por meio de pesquisa e desenvolvimento, formação de recursos humanos, prestação de serviços e consultorias.
binaram dois princípios ativos conhecidos em um único medicamento. O Losartan é um fármaco largamente utilizado no Brasil e no mundo. É considerado um dos mais seguros porque tem efeitos colaterais reduzidos. A angiotensina (1-7) é um peptídeo endógeno, isto é, produzido naturalmente pelo organismo humano, com função vasoativa no mecanismo que controla a pressão arterial nos seres humanos e animais em geral. “Nós fomos os primeiros pesquisadores a relatar a possibilidade de absorção desses peptídeos por via oral, uma vez que eles sofrem degradação no sistema gastrintestinal”, conta Sinisterra. “Nossos testes comprovaram que as duas substâncias juntas – o Losartan e a angiotensina (1-7) – têm efeitos sinérgicos”, relata o farmacêutico Pedro Pires Goulart. Segundo ele, a expectativa é que a tecnologia possa reduzir o uso de vários medicamentos diferentes pelo paciente, aumentando, com isso, a adesão ao tratamento.
Administração oral O medicamento só irá liberar o Losartan e a Angiotensina 1-7 na presença das bactérias do intestino grosso
Ciclodextrina
Losartan e Angiotensina 1-7
Biomembrana Absorção
NANOBIOTECNOLOGIA Para aumentar ainda mais a eficácia e a segurança do fármaco obtido, os pesquisadores encapsularam molecularmente o composto em ciclodextrinas utilizando técnicas de nanobiotecnologia. As ciclodextrinas (CDs) são unidades de compostos de glicose solúveis em água, cuja propriedade mais importante é receber uma grande variedade de moléculas hóspedes – por isso que elas são utiliza24 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
Medicamento na Circulação Losartan Molécula de açúcar formando um invólucro de proteção e transporte do Losartan e da Angiotensina 1-7
Angiotensina 1-7 Relaxamento da musculatura da artéria
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Inimiga silenciosa Só no Brasil, mais de 35 milhões de pessoas têm pressão alta, segundo dados de 2004 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Mas esse número pode ser ainda maior, pois a maioria das pessoas com hipertensão não apresenta nenhum sintoma no início da doença, por isso ela é chamada de “inimiga silenciosa”. A única forma de saber se a pressão está alta é verificando regularmente seus valores. Segundo informações do Ministério da Saúde, os sintomas decorrentes do aumento da pressão arterial são dor de cabeça, cansaço, tonturas, sangramento pelo nariz. Porém, esses sintomas podem não estar associados à hipertensão, o que dificulta o diagnóstico.
das para transportar compostos farmacêuticos. Essa estratégia de encapsulamento permitiu um aumento da chamada biodisponibilidade do fármaco no organismo, sua duração e intensidade de seus efeitos biológicos, além de liberar seletivamente o medicamento. Isso permitirá também a administração do fármaco em intervalos maiores de tempo. A grande vantagem é que o tratamento poderá ser menos tóxico para o paciente, garantindo maior adesão. Portanto, implicará maior sucesso no controle da doença. Como a nova formulação associa um fármaco, já conhecido e testado, auma substância endógena, supõe-se que haverá redução significativa nos efeitos colaterais nos pacientes. Essa é uma das principais causas da não adesão ao tratamento, segundo dados da Associação Brasileira de Cardiologia. Em geral, o Losartan é administrado em doses de 50 miligramas por dia. Graças ao encapsulamento com ciclodextrina, em outra formulação desenvolvida na UFMG esses 50 miligramas têm atividade de controle da pressão arterial por uma semana. “Isso significa que, do ponto de vista farmacológico, diminuímos a quantidade de doses e os possíveis efeitos colaterais com o mesmo efeito farmacológico esperado. Trata-se, portanto, de um fármaco que pode ser mais eficiente e mais seguro porque é menos tóxico”, afirma Sinisterra.
até a prateleira da farmácia, os custos podem chegar a US$ 800 milhões em um tempo médio de 10 a 12 anos. Diante desse cenário, já se desenha uma tendência entre as grandes indústrias farmacêuticas multinacionais de estabelecer novas e sustentáveis parcerias com universidades e centros de pesquisa, em busca de tecnologias em estágios mais avançados de desenvolvimento. O objetivo da equipe de pesquisadores é transferir a tecnologia da nova formulação para que uma empresa que dê sequência aos testes clínicos, ou seja, em seres humanos. Para proteger o composto, foi feito pedido de patente nacional e internacional. Assim, a tecnologia desenvolvida no LABFAR encontra um cenário extremamente favorável para ser oferecida no mercado.
PARCERIAS COM UNIVERSIDADES Desenvolver novos medicamentos é um processo lento e oneroso para as empresas. Segundo o coordenador do projeto, dos primeiros testes em laboratório
Contato: Laboratório de Desenvolvimento Farmacêutico da UFMG (LABFAR-UFMG) Farmacêutico Pedro Pires Goulart – E-mail: pedrofarmag@gmail.com Prof. Robson Augusto Souza dos Santos – E-mail: robsonsant@gmail.com Prof. Rubén Dario Sinisterra – E-mail: sinisterra@ufmg.br
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Avaliação auditiva fisiológica objetiva Método elimina resposta subjetiva do paciente
Um equipamento capaz de realizar pesquisa fisiológica dos limiares auditivos por meio da resposta cerebral a estímulos sonoros em amplitude modulada (ASSR). Essa foi a tecnologia desenvolvida pelo professor Carlos Julio Tierra-Criollo e sua equipe, no Núcleo de Estudos e Pesquisa em Engenharia Biomédica (NEPEB) do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG. Denominada AudioStim, a tecnologia consiste em um software que detecta e analisa os limiares auditivos, de forma automática sem envolver respostas diretas do paciente. A nova técnica destaca-se nos casos em que a audiometria tonal convencional não se mostra efetiva. Um bom exemplo são crianças muito pequenas e idosos
com algum tipo de doença incapacitante. Outro diferencial é a portabilidade, já que o novo equipamento dispensa a cabine à prova de som usada nos exames audiométricos convencionais. Com o aperfeiçoamento da tecnologia, esse tipo de exame poderá ser feito em bebês recém-nascidos, somando-se às já utilizadas emissões otoacústicas (EOA) na Triagem Auditiva Neonatal, aumentando assim as chances de detectar prematuramente problemas auditivos. O teste de audiometria tonal convencional é considerado subjetivo por depender da participação do paciente em responder às perguntas realizadas pelo fonoaudiólogo ou médico. O paciente deve sempre responder se está ou não escutando os sons emitidos em diferentes frequências e intensidades. Realizado em cabina acusticamente tratada, o teste tem por objetivo a obtenção dos limiares de sensação auditiva e, ainda, é o principal método para o diagnóstico de perdas auditivas, indicando seu grau e tipo. “Muitas vezes, no entanto, o paciente se engana nas respostas, o que compromete o resultado do teste”, explica Carlos Tierra-Criollo, que coordena a pesquisa na UFMG. “No teste que desenvolvemos, a atividade elétrica cerebral é captada por eletrodos no couro cabeludo e avaliamos a resposta do cérebro ao estímulo sonoro em amplitude modulada, sem depender da resposta do paciente. Por isso o chamamos de avaliação auditiva fisiológica objetiva”, conta ele. Além dos testes de limiares auditivos ASSR, o AudioStim poderá realizar outros exames. Dependendo dos resultados encontrados na audiometria tonal, outros testes poderão ser solicitados pelo médico, entre eles a Audiometria por Resposta Evocada do Tronco Cerebral (BERA). Nesse tipo de exame os fones emitem um click sonoro e a resposta também é captada por eletrodos no couro cabeludo. A resposta obtida é o potencial evocado auditivo transiente. A principal indicação é no estudo das lesões do nervo auditivo e também para estudos de limiares auditivos quando o paciente não colabora (respondendo de forma satisfatória) no exame de audiometria tonal. TESTE DA ORELHINHA Outra futura aplicação para o AudioStim é na realização de testes em bebês recém-nascidos, o chamado teste da orelhinha, que serve para detectar problemas auditivos prematuramente. Estudos indicam que um bebê que tenha um diagnós-
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tico e intervenção fonoaudiológica até os seis meses de idade pode desenvolver linguagem muito próxima, ou até mesmo igual à de uma criança ouvinte. O grande problema é que a maioria dos diagnósticos de perda auditiva em crianças acontece muito tardiamente, com três ou quatro anos, quando o prejuízo no desenvolvimento emocional, cognitivo, social e de linguagem da criança está seriamente comprometido. Atualmente o teste da orelhinha é feito com o exame de emissões otoacústicas (EOAs). Um fone, acoplado a um computador, é colocado na orelha do bebê, emitindo sons de fraca intensidade para recolher respostas que a orelha interna do bebê produz. A desvantagem das EOAs é que não avalia o limiar auditivo, portanto a severidade da perda auditiva. “Com o AudioStim e o exame de ASSR, a avaliação auditiva do bebê poderá ser feita de forma mais rápida que o BERA e com informações sobre a severidade da perda auditiva”, explica Tierra-Criollo. As principais vantagens dos equipamentos do AudioStim ASSR são: maior rapidez na avaliação do limiar auditivo fisiológico; dimensões reduzidas que lhe confere uma portabilidade para aplicações remotas; e fácil instalação e utilização, uma vez que todo protocolo de estimulação (estímulo, intensidade, frequência, duração) pode ser visualizado e ajustado pelo usuário em uma mesma tela no computador. O AudioStim foi projetado para ser usado em clínicas especializadas em avaliações audiométricas, hospitais públicos e privados e laboratórios de pesquisa. “No início nosso objetivo era desenvolver um equipamento mais versátil para nossas pesquisas, mas tivemos contato com profissional da fonoaudióloga não seria da Fonoaudiologia? que se interessou pelo que estávamos fazendo. Identificamos, então, que essa tecnologia era uma demanda desse mercado e passamos a trabalhar em conjunto com fonoaudiólogos e médicos otorrinolaringologistas para desenvolver um novo produto”, conta Carlos Tierra-Criollo. “Os testes realizados até agora e toda etapa de desenvolvimento do protótipo foram acompanhados por profissionais da área médica. “A participação deles foi fundamental para direcionar o trabalho, de forma a atender às necessidades tanto dos profissionais de saúde quanto dos pacientes”, conta Matheus Romão, que integra a equipe de pesquisa do NEPEB. 30 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
A pesquisa está na fase de protótipo laboratorial, mas, segundo o pesquisador, a previsão é que em meados de 2011 o AudioStim esteja pronto para comercialização. Para concretizar esse cronograma, está em fase de incubação a empresa Axoon Medical na incubadora de empresas INOVA, da UFMG. Para desenvolvimento em escala industrial do produto espera-se concretizar parceria com empresa, da cidade de Belo Horizonte, especializada em projetos e produtos voltados para aplicação hospitalar. Há atualmente no mercado alguns concorrentes que comercializam produtos que fazem avaliações audiométricas de forma objetiva. A maioria desses concorrentes, no entanto, é de grandes empresas estrangeiras localizadas principalmente nos Estados Unidos e na Europa. De acordo com Carlos Tierra-Criollo, a nova tecnologia possui todas as funcionalidades encontradas nos concorrentes, porém os parâmetros podem ser ajustados em uma faixa mais ampla e com uma resolução maior. O objetivo principal dos pesquisadores é possibilitar à sociedade o acesso a uma tecnologia de ponta, desenvolvida no Brasil, a um preço cerca de 40% abaixo do preço praticado no mercado, por meio da substituição de importação. Equipe: C arlos Julio Tierra-Criollo | carjulio@cpdee.ufmg.br Matheus Wanderley Romão | matheusromao@gmail.com Henrique Resende Martins | henriquerm@gmail.com programa de INCENTIVO À inovaçÃO 31
Enzimas mais eficientes para exames de diagnóstico Novo produto deve substituir importação de matéria-prima, diminuindo custos de fabricação
A Uniclon Biotecnologia – empresa pré-incubada na Inova, incubadora da UFMG, cujos sócios são pesquisadores do Laboratório de Genética Celular e Molecular e da Enzytec Consultoria em Biotecnologia – desenvolveu um conjunto de enzimas de alta qualidade para testes de diagnóstico bioquímico in vitro. A principal inovação da tecnologia é a aplicação de conhecimentos de engenharia de proteínas e bioinformática que permitem modificar a estrutura química das enzimas e, assim, gerar novas variedades. O resultado é um produto mais eficiente, mais estável e, ao mesmo tempo, fabricado com menor custo de produção. O novo produto atende à demanda das empresas que fabricam e comercializam kits de diagnóstico e que, hoje, precisam importar as enzimas.
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Exames de diagnóstico in vitro (IVD) servem para identificar e quantificar substâncias químicas em amostras de tecidos, sangue, urina, secreções do corpo humano etc. Vários tipos de exames, como os reagentes de glicose, ácido úrico, colesterol e triglicérides, utilizam enzimas fabricadas sinteticamente em suas formulações. As enzimas são proteínas com atividade catalítica, ou seja, elas aceleram reações químicas que regulam diversos processos biológicos no organismo. Entretanto, as empresas que atualmente fabricam kits de exames de diagnóstico precisam importar enzimas para montar os kits. “Em Minas Gerais, por exemplo, há um parque industrial muito dependente desses componentes, que vêm de fora do país”, conta o professor Vasco Azevedo, sócio da Uniclon. “Nós vimos aí uma oportunidade de negócio, já que dominamos a técnica de engenharia de proteínas para produzir enzimas para esses exames”, diz ele. RECONSTRUINDO PROTEÍNAS Vasco e Túlio Santos desenvolveram um processo que permite aperfeiçoar qualquer proteína por meio do conhecimento da relação entre a estrutura da enzima e seus diversos parâmetros funcionais. Assim, modificando certos elementos da sequência de aminoácidos, características como a velocidade de reação e a estabilidade físico-química podem ser melhoradas. “O processo envolve recursos de bioinformática e o conhecimento científico acumulado nos bancos de dados, tornando-o mais ágil e menos dispendioso, já que exige menos tempo em laboratório e menor quantidade de testes para o desenvolvimento de uma determinada enzima”, explica Santos. Além desses diferenciais, o método possibilita o melhoramento de mais de um parâmetro funcional da enzima ao mesmo tempo, o que na maioria das vezes não é permitido nos métodos tradicionais. “Produzimos uma enzima melhor, mais barata”, conclui. Outra vantagem para o mercado-alvo da tecnologia está no aspecto logístico. As empresas que montam os kits poderão substituir a importação de
matéria-prima e contar com suporte técnico e atendimento diferenciado, que não são oferecidos pelas multinacionais que fornecem essas enzimas atualmente. As primeiras enzimas desenvolvidas para produção em escala comercial pela Uniclon foram a Glicerol Quinase (GK), Glicerol-3-fosfato Oxidase (GPO) e Lipoproteína Lipase (LPL), principais componentes do reagente de triglicérides, utilizado no kit de diagnóstico do nível de triglicérides no sangue. Segundo os pesquisadores, trata-se de uma escolha estratégica porque o reagente para a determinação de triglicérides apresenta alta repetibilidade de compra no mercado, com alto consumo pelos laboratórios clínicos. Os triglicerídeos constituem uma forma de gordura que circula na corrente sanguínea e é armazenada no tecido adiposo do corpo como reserva alimentar. O nível alto de triglicerídeos, no entanto, está relacionado a um aumento no risco de doenças do coração, especialmente quando associado a colesterol alto e outros fatores de risco. Daí a importância do monitoramento dos níveis de triglicerídeos, feito por meio de exames de sangue. Os testes em escala laboratorial já foram concluídos. A próxima fase do projeto consiste em validar esses resultados em uma planta-piloto, com o objetivo de evidenciar o atendimento às especificações técnicas exigidas pelas empresas que montam os kits de diagnóstico. De acordo com Azevedo e Santos, depois da produção e avaliação funcional das enzimas GK, GPO e LPL, será feito o pedido de patenteamento dessas variedades, obtidas por engenharia de proteínas. Atualmente não há no país uma empresa que produza e forneça enzimas para reagentes de exames in vitro. Com essa tecnologia, a Uniclon, residente na Inova, pretende se consolidar nesse mercado, oferecendo um produto nacional, de melhor desempenho e menor custo. Equipe: U niclon Biotecnologia Ltda Laboratório de Genética Celular e Molecular Márcio Henrique Lacerda Arndt – E-mail: marcio@enzytec.com.br Túlio Marcos Santos – E-mail: santos_tm@hotmail.com Vasco Ariston de Carvalho Azevedo – E-mail: vasco@icb.ufmg.br
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RESWeb – Registro Eletrônico de Saúde na Web Software auxilia na gestão de informações na área de saúde
A área de Informática em Saúde da Escola de Ciência da Informação da UFMG desenvolve pesquisas sobre como organizar a informação gerada por registros em saúde. Foi a partir dessas pesquisas que o professor Marcello Bax e sua equipe do Departamento de Teoria e Gestão da Informação criaram um sistema de registro eletrônico desses eventos no prontuário do paciente. Trata-se do RESWeb – Registro Eletrônico em Saúde. O software prevê um conjunto de módulos com funcionalidades que abrange a marcação de visitas, passando pelo atendimento médico, cobrança, procedimentos executados e transmissão eletrônica de dados. O foco de aplicação inicial do RESWeb são as clínicas e consultórios médicos que, em geral, não dispõem de recursos para informatizar os registros de saúde dos pacientes. O modelo de negócio é inovador para a área: o software estará disponível gratuitamente para o profissional, via web, e as receitas virão da inserção de espaços publicitários nas páginas do programa, de forma discreta, sem interferir no fluxo de trabalho dos profissionais. O novo software não precisa ser baixado pelo médico que vai utilizá-lo. O profissional precisa apenas acessar a internet. Isso garante mobilidade total, já que os dados coletados e armazenados podem ser acessados de qualquer lugar, incluindo computadores de mão ou smartphones. Se, por exemplo, o médico que atendeu o paciente no consultório quiser ver seu histórico no hospital, basta entrar na página do programa e acessá-lo. “Hoje o cidadão não tem suas informações médicas à disposição dos diversos sistemas de informação e instituições médicas pelos quais ele pode passar ao longo da vida. Não existe um repositório eletrônico para esse tipo de informação”, explica Marcello Bax. “Foi pensando em minimizar esse problema que começamos a trabalhar nesse software”, conta. O RESWeb armazena o documento da visita inicial (anamnese), a evolução clínica do paciente, os resultados de exames laboratoriais, prescrições, imagens (radiografias etc.), além de documentos de ordem geral, como autorizações de cirurgias e outros. “As informações contidas nos documentos são extraídas no momento da assinatura digital do profissional e armazenadas de forma estruturada no banco de dados, permitindo sua exploração avançada por outros sistemas de informação”, complementa Bax. 36 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Parcerias A equipe do professor Marcello Bax colabora com a Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais em um projeto que visa a armazenar componentes básicos dos prontuários dos pacientes da rede pública estadual. Quando o sistema estiver funcionando, hospitais da rede poderão acessar, com segurança, esse repositório. “O tema é obviamente polêmico e muito complexo, mas o que se está construindo é, na verdade, uma grande biblioteca, absolutamente segura, de prontuários eletrônicos organizados que podem salvar vidas, já que a informação é o fundamento de qualquer atendimento médico”, conta Marcello Bax. Nesse caso, segundo ele, para chegar a uma representação conceitual comum para os diversos registros em saúde, o projeto conta com o uso de padrões nacionais que estão sendo definidos por várias instituições, em um esforço coordenado, em parte, pela Sociedade Brasileira de Informática em Saúde (SBIS). BIBLIOTECA PARA A SAÚDE Outro diferencial da tecnologia é o uso de inteligência artificial nos módulos de diagnóstico e de prescrição que, agregado a todas as informações médicas do paciente presentes no prontuário, auxilia a tomada de decisão do médico. Segundo Marcello Bax, o sistema pode, por exemplo, alertar o médico sobre a intolerância do paciente ao princípio ativo do medicamento considerado na prescrição, devido a alergias. Com a adesão de vários profissionais, o sistema constituirá em um importante banco de dados com informações médicas, que auxiliará o médico na escolha da terapêutica ou tratamento específico para cada patologia. Outro recurso é a CID10 (Código Internacional de Doenças), uma tabela padrão internacional que estipula um código para cada doença. Isso permite que seja feita uma relação entre doenças e as terapêuticas mais utilizadas pelos médicos usuários. Em breve o RESWeb vai incorporar também a Troca de Informações em Saúde Suplementar (TISS), padrão que permite o intercâmbio eletrônico de dados entre as operadoras de plano de saúde e prestadores de serviços, elaborado pela Agência Nacional de Saúde (ANS). Um dos grandes desafios para esse tipo de tecnologia é criar uma linguagem que possa ser compartilhada por todos os usuários e sistemas de saúde. “Eles precisam compartilhar padrões de representação da informação em saúde para que possam operar juntos. O nome técnico para isso é interoperabilidade”, explica Bax. 38 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
“Eles têm de compartilhar o significado de cada dado ou informação; todos têm de ter, por exemplo, a mesma conceituação para o termo alergia, ou exame de sangue”, complementa. De acordo com ele, mesmo que sistemas de gestão de saúde sejam desenvolvidos localmente, o ideal é que usem acepções comuns, formalizadas por meio de ontologias – em ciência, é uma representação formal e compartilhada de um conjunto de conceitos – e vocabulários controlados. Outra preocupação é com a segurança das informações, por isso, informações como nome e endereço, dentre outros, são criptografados no banco de dados para garantir a privacidade dos pacientes. MODELO DE NEGÓCIO INOVADOR Sob a ótica empreendedora, o objetivo do pesquisador é que sua equipe comercialize a tecnologia. Como os milhares de médicos e clínicas brasileiros poderão usar o software gratuitamente, as receitas devem vir da exploração de espaços de publicidade (banners) nas telas do programa. “O modelo é desafiador, mas se der certo pode proporcionar às empresas que atuam na área de saúde, programa de INCENTIVO À inovaçÃO 39
Monitoramento domiciliar de pacientes Chip para rede de sensores sem fio coleta, processa e envia sinais vitais a distância
A Wisecomm, empresa que nasceu a partir do Laboratório de Sistemas de Computação Integrados (LabSCI) da UFMG, desenvolveu, em conjunto com esse laboratório, um chip para o monitoramento de sinais vitais a distância para atendimento domiciliar (health care). A tecnologia baseia-se em sensores autônomos miniaturizados que coletam, processam e enviam informações como temperatura, batimento cardíaco e posicionamento, via canal de rádio, para uma estação base. A
como as de equipamentos e fármacos, um espaço privilegiado para publicidade altamente segmentada, em geral difícil de encontrar no mercado publicitário convencional”, aponta Bax. A tecnologia já está sendo usada em três clínicas de cardiologia na Flórida, Estados Unidos, com resultados satisfatórios. Um dos recentes aperfeiçoamentos realizados no sistema foi a sua internacionalização, ou seja, sua interface pode apresentar no navegador web os mesmos conteúdos em línguas diferentes. O RESWeb é baseado em software livre e deverá ser licenciado sob a forma de General Public License, em que o acesso ao código da linguagem de programação é livre para qualquer pessoa e permite trabalho conjunto no aperfeiçoamento do programa. Pode-se, assim, incorporar todas essas modificações ao código inicial. Equipe: D epartamento de Teoria e Gestão da Informação Escola de Ciência da Informação José Serufo Luciana Diniz Marcelo Rodrigues Marcello Peixoto Bax | E-mail: marcello.bax@gmail.com Matheus Assis Peter Thorun 40 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Qualidade de vida A solução para monitoramento de idosos, além de reduzir a taxa de queda e suas consequências, poderá ainda melhorar a qualidade de vida desse público e de seus familiares, assim como humanizar o tratamento dos pacientes. Quando a pessoa recebe o tratamento em casa, isso não altera, ou pouco muda, sua rotina, sem privá-lo do convívio familiar. Já existem pesquisas demonstrando que a recuperação é mais rápida quando o paciente está em casa. Além disso, os distúrbios causados na vida dos familiares também são menores, já que, muitas vezes, eles precisam se afastar das atividades profissionais e sociais para dar assistência ao membro da família internado no hospital.
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primeira aplicação pensada pelo grupo de pesquisadores da Wisecomm é o acompanhamento de idosos, com objetivo de detectar e reduzir quedas, diminuir gastos com internações hospitalares, dando mais autonomia e segurança para essas pessoas. De acordo com Diógenes Cecílio da Silva Júnior, coordenador do LabSCI e sócio da Wisecomm, a tecnologia utiliza o conceito de redes de sensores sem fio. “Um conjunto de circuitos (nós sensores) autônomos se integra em uma rede que é, na verdade, a soma das funções de cada um deles”, explica. “Cada nó sensor tem inteligência local, ou seja, capacidade de processamento local”. Segundo Diógenes, na telemetria convencional os dados são transmitidos e processados fora dos sensores. A função deles é apenas captar e transmitir os dados. “Se ocorre um defeito em algum sensor, o sistema como um todo fica comprometido. No nosso caso, como os sensores são autônomos, isto é, eles também processam a informação; se um sensor não funciona, outro pode assumir suas funções e continua coletando, processando e enviando informações”, complementa o pesquisador. DETECÇÃO DE QUEDAS O público-alvo inicial definido pela Wisecomm para comercializar a tecnologia foi o health care: acompanhamento dos sinais vitais para detecção e prevenção de quedas de idosos. O novo dispositivo terá a capacidade de monitorar temperatura, batimento cardíaco, nível de oxigênio no sangue, posição do usuário, dentre outros dados que serão disponibilizados em ambiente web, fornecendo uma base de dados sobre o motivo da queda. “Caso ocorra essa queda, pessoas previamente cadastradas receberão uma mensagem pelo celular para que possa acionar socorro”, explica Diógenes. Por meio dos sensores que a pessoa vai carregar junto ao corpo, será possível saber se ela está parada, movimentando-se e em que direção. “Uma movimentaprograma de INCENTIVO À inovaçÃO 43
ção vertical muito brusca, por exemplo, pode significar que a pessoa caiu”, diz o pesquisador. “Você não impede que o idoso caia, mas, ao detectar pequenas quedas, que muitas vezes não são relatadas, podemos prevenir uma futura queda mais grave”, completa. Segundo as pesquisas realizadas pela empresa ao longo do desenvolvimento do produto, há relatos de casos em que o idoso cai e quebra o fêmur. Como não consegue se levantar, permanece horas, às vezes dias, sem socorro, o que pode agravar o caso. Com o monitoramento 24 horas por dia, o socorro pode ser rápido, evitando sequelas mais graves. A prevenção de quedas é uma tarefa difícil devido à variedade de fatores que a predispõe. Assim, como o monitoramento envolve vários fatores ao mesmo tempo, a nova tecnologia criada na UFMG surge como alternativa para minimizar o problema. As quedas representam a sexta causa de morte de pessoas acima de 65 anos. Em 2006, o Sistema Único de Saúde (SUS) gastou R$ 50 milhões com internações de idosos por fratura de fêmur. O atendimento domiciliar possibilita uma redução de custos que gira em torno de 20% a 60%, quando comparados aos custos de interna-
ção hospitalar para a mesma enfermidade. Como o projeto do chip, que é a base dos sensores autônomos, foi desenvolvido no LabSCI, a intenção dos pesquisadores, após o patenteamento, é licenciá-lo para a Wisecomm. Com o desenvolvimento de um chip de um nó para a RSSF, a Wisecomm se colocaria como a primeira empresa no Brasil, e entre as pioneiras no mundo, com um sistema compacto para a área de home health. A comercialização da tecnologia deve seguir duas estratégias: vendê-la para empresas que fabricam equipamentos médicos para que elas integrem o componente a dispositivos já existentes no mercado que fazem medição de sinais vitais como medidores de pressão, de batimentos cardíacos e glicosímetros. Isso poderá aumentar as funcionalidades desses equipamentos e agregar diferencial competitivo. Outra opção é a prestação de serviço para hospitais e clínicas que fazem o tratamento e acompanhamento de idosos. “Utilizando o monitoramento a distância, o hospital pode aumentar o número de pessoas assistidas sem aumentar a estrutura física”, lembra Diógenes. Além disso, o health care poderá também diminuir ou eliminar as horas pagas para acompanhantes. Estima-se que o mercado de empresas de home health care, especializadas em atendimento domiciliar, juntamente com o de telemedicina, vai movimentar em 2009 cerca de U$ 3 bilhões no mundo. As propriedades da tecnologia desenvolvida pela Wisecomm abrem um leque amplo de aplicações, além do foco inicial de atuação definido pelos pesquisadores: construção civil, automação residencial e industrial, mineração, extração de gás natural e petróleo, diversas aplicações militares, são alguns exemplos. Equipe: W isecomm Soluções em Sensores Inteligentes Laboratório de Sistemas de Computação Integrados (LabSCI), Diógenes Cecílio da Silva Júnior | diogenes@wisecomm.com.br
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Sistema para rastrear animais de cativeiro Testes de DNA mitocondrial inibem comércio ilegal de aves
A grande diversidade da flora e da fauna brasileira admirada em todo o mundo é também alvo do comércio ilegal de espécies. No caso do tráfico de animais, as aves, os peixes e os pequenos mamíferos são as principais vítimas. Uma equipe de pesquisadores do Laboratório de Biodiversidade e Evolução Molecular (LBEM), da UFMG, coordenada pelo professor Fabrício R. Santos, está propondo
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uma nova tecnologia para fazer o rastreamento de aves pelo DNA mitocondrial como forma de inibir o comércio de aves retiradas ilegalmente da natureza. Com os testes será possível emitir um certificado com uma etiqueta de DNA, nome, espécie, histórico, filiação e características físicas da ave, comprovando que ela realmente nasceu em cativeiro. A tecnologia atende a uma tendência crescente no mercado internacional de adoção de medidas que comprovem a procedência e a integridade sanitária dos animais comercializados. Os criatórios que emitirem os certificados terão mais credibilidade com seus clientes e órgãos de controle governamentais. A comercialização de animais silvestres só é permitida legalmente para aqueles nascidos em cativeiros legalizados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). A dificuldade de fiscalização desse comércio, pela ausência de métodos de certificação dos animais, é o maior problema enfrentado pelo órgão. Há casos de fraudes que burlaram os mecanismos de controle feitos atualmente feitos por meio da identificação por anilhas ou microchips
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implantados nos animais. “Infelizmente hoje o uso de anilhas ou chips não impede que um animal capturado ilegalmente na natureza seja comercializado como se tivesse nascido em cativeiro”, conta Fabrício Santos, que coordena o projeto. MEDIDA COMPLEMENTAR A ideia não é eliminar o uso das anilhas, mas complementar e aperfeiçoar o sistema atual de controle do comércio de aves silvestres. “Trata-se de uma demanda dos próprios criatórios interessados em certificar, de modo mais eficaz, os animais que comercializam, de coibir as fraudes e de se diferenciarem no mercado”, acredita Santos. O Consórcio Brasileiro de Criatórios de Aves (CBRAS) segue essa tendência, incentivando em seu estatuto a elaboração de métodos eficientes de certificação de origem. A tecnologia proposta pelos pesquisadores do LBEM baseia-se em testes de DNA mitocondrial, ou DNAmt, que tem eficiência já comprovada pela comunidade científica. O DNA mitocondrial não se localiza no núcleo da célula, mas sim na mitocôndria (uma das partes que compõe a célula). Sua especificidade se dá pelo fato de o DNAmt ser passado para os descendentes pelas mitocôndrias maternas. “O DNAmt carrega a marca da linhagem de cada matriz (fêmea apreendida pelos órgãos de controle como o IBAMA e cedida ao criador) do cativeiro que é passada aos filhotes comercializados”, explica o pesquisador Anderson
Inspiração bovina A certificação por rastreamento de animais silvestre teve como referência a certificação de origem para bovinos. O Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos (Sisbov) tem como objetivo o controle e a rastreabilidade do processo produtivo em propriedades rurais de bois e búfalos. É de adesão voluntária para os produtores rurais, mas é obrigatória no caso de comercialização de carne bovina e bubalina para mercados que exijam a rastreabilidade, como a União Europeia. “Esperamos que, no médio prazo, certificados de rastreabilidade sejam também exigidos na comercialização de animais silvestres para garantir a procedência do animal, inibindo o tráfico ilegal, e também por questões sanitárias, como no caso de uma eventual epidemia de gripe aviária”, conclui Fabrício dos Santos.
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Chaves “Além disso, trabalhar com essa técnica é mais simples e mais barato que com o DNA do núcleo da célula, que é um marcador biparental tradicionalmente usado em exames de paternidade”, complementa. Segundo ele, usando o DNA mitocondrial, é possível separar, com alto grau de confiabilidade, os indivíduos nascidos em cativeiro daqueles provenientes da natureza. “Embora o DNA nuclear seja um exame mais completo, nosso interesse não é identificar cada animal, mas certificar que eles sejam filhotes nascidos no cativeiro a partir de uma matriz legalizada, criando uma ferramenta barata, rápida e eficiente de rastreamento desses animais”, acrescenta. A exigência de uma marcação de animais silvestres com um certificado conferido a partir de um teste de DNAmt poderá inibir as vendas ilegais de animais retirados da natureza e de documentados. Além disso, todo o material genético coletado no processo de identificação será armazenado em uma coleção fiel do patrimônio genético brasileiro, para futuras comprovações acerca da origem do animal. O LBEM é cadastrado no Ministério do Meio Ambiente (MMA) para manter esse banco de DNA da fauna silvestre, que atualmente pode ser mantido apenas em instituições públicas. Estudos conduzidos no Laboratório da UFMG mostraram que os testes com DNAmt são eficazes para espécies de psitacídeos, que incluem papagaios, maritacas e araras, que estão entre os animais silvestres mais comercializados pela sua beleza, colorido das penas e facilidade de imitar a fala humana. programa de INCENTIVO À inovaçÃO 49
de comercialização dessa espécie, sendo que esse valor pode ser reduzido com o aumento da demanda. Depois das aves, os animais com maior potencial de agregar a certificação por rastreamento de DNAmt são mamíferos e répteis, como macacos, tartarugas, cobras e lagartos. Segundo o coordenador do projeto, Fabrício Santos, além de garantir que um animal tenha sido gerado em cativeiro, o certificado pode ser também um atestado de que o animal comercializado não possui doenças. “A tecnologia pode ser usada, ainda, para controle sanitário, já que também não há controle de doenças entre animais capturados na natureza”, exemplifica.
Segundo dados do MMA, as aves são os animais mais procurados pelo comércio ilegal, representando 82% do total. O tráfico ilegal movimenta mais de US$ 1 bilhão somente no Brasil, de acordo com dados da ONG WWF-Brasil. O papagaio é a ave mais vendida (legal e ilegalmente) no Brasil e no exterior. Em seguida estão as araras, os periquitos, e os tucanos, assim como outros animais silvestres, como micos, jiboias e tartarugas. Os primeiros testes utilizando a tecnologia foram feitos em 2007 no chamado papagaio-comum (Amazona aestiva) com resultados promissores. Os testes foram realizados em parceria com o criatório de aves Vale Verde, localizado em Betim (MG). A estimativa é que a certificação represente entre 2,5% a 4% do custo 50 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
APLICAÇÃO INÉDITA O objetivo inicial dos pesquisadores seria prestar serviços via Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), da UFMG, para criatórios interessados na emissão do certificado. O Vale Verde, um dos primeiros criatórios aviários de Minas Gerais a ser autorizado pelo IBAMA, já demonstrou interesse em agregar a tecnologia aos animais que comercializa. Mais de 150 espécies de aves silvestres e exóticas são reproduzidas e tratadas. Alternativamente pode-se também estabelecer uma parceria com algumas empresas que já fazem rastreamento por DNA de animais domésticos como bovinos, eqüinos, caprinos e ovinos. De acordo com Santos, essas empresas usam uma técnica de identificação por microssatélites, que consiste em analisar diferentes regiões do genoma do animal. “Essa técnica seria atualmente inviável para a certificação de animais silvestres devido ao alto custo de implantação, e pela grande diversidade de espécies comercializadas, o que exigiria o desenvolvimento de um sistema diferente para cada espécie silvestre”, explica o pesquisador. Para os animais domésticos, como o boi ou o cavalo, não há esse problema porque já existem sistemas de microssatélites específicos desenvolvidos, e o serviço pode ser oferecido a um baixo custo. O serviço, oferecido em parceria com empresas parceiras, poderia associar o know-how da UFMG nos estudos com animais silvestres e a credibilidade da coleção credenciada no MMA com a experiência de mercado e tecnologia da empresa associada. Os pesquisadores esperam que essa iniciativa tenha apoio de Associações de Criadores e de ONGs que trabalham pela preservação da natureza, como a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais (Renctas) ou o Greenpeace.
Equipe: Laboratório de Biodiversidade e Evolução Molecular Anderson Vieira Chaves | E-mail: avc.bio@gmail.com Fabiano Assunção Fabrício Rodrigo dos Santos | E-mail: fsantos@icb.ufmg.br Rodrigo Melo Mendes Rodrigo Octavio de Paiva Queiroz Filho programa de INCENTIVO À inovaçÃO 51
Mentol a partir de óleo de eucalipto Tecnologia agrega valor a produto abundante no Brasil
Balas, produtos de limpeza, pasta de dente, pastilhas para garganta, medicamentos, cosméticos. O que esses produtos têm em comum? Todos possuem, em sua composição, mentol – produto químico aromático amplamente utilizado em vários segmentos industriais, encontrado de forma natural em óleos essenciais de plantas do gênero mentha, mas há formas de obtê-lo a partir de outras substâncias. Coordenado pela professora Elena Goussevskaia, um grupo de pesquisadores do Departamento de Química da UFMG desenvolveu uma tecnologia para produzir mentol sintético a partir de óleo essencial de eucalipto. Com isso, um produto abundante no Brasil poderá ser transformado quimicamente em outro de maior valor agregado. Como quase todo o mentol usado hoje no Brasil é importado, a tecnologia desenvolvida na UFMG pode resultar, também, na substituição dessas importações por um produto nacional. O novo produto é resultado da aplicação de um processo químico inovador – o uso de um catalisador que transforma o citronelal, presente no óleo de eucalipto da espécie Citriodora (Eucalyptus citriodora), em mentol. “Utilizamos uma pequena quantidade de catalisador não corrosivo que depois é facilmente separado por meio de reação por decantação ou centrifugação, permitindo sua recuperação e reutilização em outro processo”, conta a pesquisadora Patrícia Robles-Dutenhefner. Os testes de laboratório demonstraram ótimo rendimento do processo criado na UFMG, sendo que o mentol produzido possui as mesmas características de aroma do produto disponível no mercado. A reação química que obtém mentol a partir de óleo de eucalipto utiliza condições mais brandas de temperatura e pressão, implicando menor gasto energético. Além disso, segundo Patrícia Robles-Dutenhefner, como o processo de transformação é simples, com poucas etapas o escalonamento industrial da tecnologia poderá ter custos reduzidos, tornando a produção industrial mais barata que a dos concorrentes internacionais. “Como usamos o citronelal do óleo de eucalipto, um produto que a natureza oferece, nosso processo dispensa as etapas químicas para sintetizar outros precursores adequados para o processo, o que acontece em outras tecnologias utilizadas para produzir mentol sintético”, explica. “Ao economizar etapas, aumentamos a viabilidade econômica do produto 52 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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final. Esse é o diferencial que torna nosso processo mais rápido e possivelmente mais barato”, completa. SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES O Paraguai e a Índia fornecem 80% de todo o mentol consumido no mundo. Há também a opção de comprar mentol sintético no Japão ou na Alemanha. O mentol obtido pelos pesquisadores da UFMG é produzido de forma mais acessível, com menor consumo de energia e a partir de um precursor natural e abundante no Brasil: o óleo de eucalipto. Essas vantagens desenham um cenário favorável para a penetração do novo processo de produção de mentol, tanto no mercado brasileiro quanto no exterior. Já foi solicitado o pedido de patente nacional para o processo e há interesse em requerer também a patente internacional. O objetivo da equipe é criar uma empresa para produzir e fornecer mentol para vários mercados, como o de alimentos, perfumes, cosméticos, indústria farmacêutica, de produtos sanitários e outros. O mercado inicial serão as empresas do ramo de aromas e fragrâncias localizadas na região Sudeste, principalmente em São Paulo. Essa estratégia visa a facilitar a distribuição do produto. Segundo aromatizante mais utilizado no mundo, o mentol provoca uma sensação de frescor e um aroma específico de menta. Na área cosmética, seu uso é amplamente disseminado devido a essas propriedades refrescantes e, dentre suas propriedades terapêuticas, é reconhecido por amortecer os nervos na transmissão da sensação de dor, por isso é comum encontrá-lo na formulação de pomadas para contusões. O consumo mundial de mentol natural chega a 15 mil toneladas por ano e 3 mil toneladas de mentol sintético.
LARANJA E PINHO Paralelamente às pesquisas com óleo de eucalipto, a equipe da professora Elena Goussevskaia estuda outros óleos essenciais como o de pinho e o de laranja. “Hoje o Brasil não tem tecnologia para beneficiar óleos essenciais. Mesmo sendo grandes produtores, nós exportamos o óleo bruto desses óleos essenciais”, conta Patricia Robles-Dutenhefner. “Nosso objetivo é agregar valor a outros óleos abundantes em nosso território, como os óleos de pinho e de laranja”, diz. Segundo a pesquisadora, esse óleo é obtido da casca da laranja no processo normal de produção de suco. Outra oportunidade de mercado nessa área são os blendies, ou seja, a mistura de aromas que formam fragrâncias ou flavors únicos, com alto valor comercial, principalmente nas indústrias de perfumes e de alimentos. Equipe: B runo B. N. S. Brandão Elena V. Goussevskaia – E-mail: elen@ufmg.br Kelly A. da Silva Rocha – E-mail: kellyrocha@ufsj.edu.br Marcelo Gomes Speziali Patricia A. Robles Dutenhefner – E-mail: pard@iceb.ufop.br
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Siderurgia mais eficiente Redutores de placa de mistura aumentam produtividade na indústria do aço
Modificar o padrão de escoamento do aço no molde para diminuir a produção de placas de mistura durante o processo de lingotamento contínuo. Esse foi o objetivo de Fernando Fonseca Torres, Renata Alves Elias e o professor Roberto Parreiras Tavares, pesquisadores do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da UFMG. A equipe criou uma peça para ser usada dentro do molde que forma as placas de aço, que permite diminuir o tamanho das placas de mistura, aumentando com isso a produtividade na indústria siderúrgica. As perdas com esse problema podem chegar a US$ 150 mil por ano, dependendo da produção da empresa e da diversidade dos aços produzidos. Segundo dados da indústria siderúrgica, a produção desse tipo de placa comercialmente desqualificada pode alcançar 3,5% em relação ao volume total produzido. Nesse setor, em que todos os processos envolvem volumes muito grandes, essa perda é muito significativa. “Quanto mais diversificada a produção, maiores serão as perdas”, explica Roberto Tavares, pesquisador que coordena o projeto de redução dos desperdícios em uma fase crítica do processo de solidificação do aço. A produção do aço tem várias etapas. Na fase final de fabricação ocorre a transformação do aço do estado líquido para sólido. O processo de lingotamento contínuo é a tecnologia para a solidificação do aço mais utilizada pelas indústrias siderúrgicas atualmente. Nessa etapa, o aço fica em um recipiente revestido de refratários denominado panela, que pode comportar até 300 toneladas de aço líquido. Dali ele vai para o distribuidor, que alimenta o aço líquido nos moldes que vão formar placas de larguras e espessuras variadas. O processo de lingotamento opera continuamente, isto é, as panelas estão constantemente abastecendo o distribuidor, que, por sua vez, vai alimentando os moldes. No entanto, a produção do aço que abastece as panelas não é contínua. “Os equipamentos que produzem o aço que abastece as panelas fazem isso com intervalos de 30 a 60 minutos aproximadamente”, explica Tavares. “Conforme o tipo de aplicação, o aço tem teores diferentes de carbono e de demais elementos.” Em indústrias que fabricam vários tipos de aço, durante a troca da panela, dois tipos de aço com composições químicas diferentes entram no distribuidor e no molde e formam as chamadas placas de mistura (placas com composições químicas não homogêneas). Essas placas não podem ser comercializadas porque não atin56 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Semelhança entre água e aço possibilita experimentos em laboratório A siderurgia exige condições muito severas de trabalho, com altas temperaturas, materiais robustos e grandes volumes. Para simular o escoamento do aço no laboratório, os pesquisadores usam o chamado modelo físico, que simula as condições reais da indústria siderúrgica, mas em menor escala. O curioso é que se usa a água no lugar do aço líquido, já que ambos possuem propriedades de escoamento (viscosidade cinemática) semelhantes. “Seria muito difícil utilizar o aço líquido em experimentos em escala de laboratório e conseguir resultados satisfatórios. Com a água podemos conduzir os experimentos de forma segura, sabendo que os resultados poderão ser aplicados na indústria, sem termos que lidar com as condições severas que encontramos dentro de uma grande siderúrgica”, conta Tavares. “Fazemos uma réplica com água para estudar o que acontece com o aço”, diz.
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gem a qualidade suficiente para os chamados usos nobres. Para aplicações nobres, como na indústria automobilística, há restrições severas para a composição química do aço. “A saída é vender essa placa de mistura por um preço inferior para aplicações menos rigorosas, ou reaproveitar como sucata no próprio processo siderúrgico. De todo modo sempre ocorre uma perda”, diz o pesquisador. MUDANÇA NO ESCOAMENTO DO AÇO LÍQUIDO Uma alternativa para evitar a mistura seria interromper o processo de lingotamento no momento da troca de panelas. Entretanto, já foi comprovado em estudos conduzidos na indústria siderúrgica que a parada do processo causaria maiores perdas do que a geração de placas de mistura. Para reduzir a formação das placas e, portanto, aumentar a produtividade do aço na siderurgia, os pesquisadores da UFMG começaram a estudar mudanças na maneira como o aço líquido escoa no distribuidor, diminuindo o tamanho das placas de mistura. “Já sabíamos, por estudos anteriores, que, mudando o padrão de escoamento do aço nesses equipamentos, modificaríamos o tamanho da placa de mistura”, afirma Tavares. Os modelos físicos instalados no Laboratório de Simulação de Processos do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais foram fundamentais para desenvolver o estudo, pois permitem reproduzir de forma integrada o ciclo completo de escoamento do aço no lingotamento contínuo, desde as panelas até os moldes. “Isso nos permitiu reproduzir exatamente o que ocorre na prática industrial”, destaca o pesquisador. “Depois de fazer observações relativas ao escoamento do aço ao longo de todos os equipamentos, constatamos que, para alcançar reduções ainda mais significativas no comprimento das placas de mistura, seria interessante mudar a forma como o aço escoa no interior do molde”, complementa. A partir dessa conclusão, Fernando Fonseca Torres, aluno da graduação do Departamento de Engenharia Metalurgia da UFMG, criou um dispositivo que modifica o padrão de escoamento do aço líquido no interior do molde, resultando numa redução de até 20% no comprimento da placa de mistura. “É uma peça refratária a ser posicionada no topo do molde, introduzida no seu interior nos instantes de troca de panelas, contendo aços diferentes, interferindo positivamente na maneira como o aço escoa e resultando em placas de mistura de comprimento menor, que é o que interessa à indústria”, esclarece Tavares. Mais recentemente a pesquisadora Renata Cristina Alves Elias fez simulações matemáticas do escoamento do aço molde de lingotamento contínuo. Esse tipo de simulação tem ganhado cada vez mais espaço em diversos ramos industriais. A simulação matemática é uma área de conhecimento multidisciplinar que aplica modelos matemáticos para analisar e compreender problemas complexos em áreas tão abrangentes quanto as engenharias, ciências biológicas, economia e ciências ambientais. Ao analisar fenômenos físicos (neste caso o escoamento do aço nos equipamentos do processo de lingotamento), modelos matemáticos conseguem programa de INCENTIVO À inovaçÃO 59
Soldagem mais precisa com nova pistola semiautomática Ferramenta pode abrir novas oportunidades no mercado de trabalho
propor e avaliar soluções para problemas científicos, que posteriormente serão testadas nos modelos físicos antes de serem aplicadas na prática industrial. Isso permite grande economia de tempo e de recursos financeiros. “Com os estudos matemáticos e os testes nos modelos físicos, podemos ter um grau de certeza maior de que o dispositivo funciona realmente, para oferecermos a tecnologia ao mercado”, acredita o pesquisador.
A soldagem é um processo que visa a unir materiais, similares ou não, de forma permanente. É o modo mais utilizado para a união definitiva de peças industriais. Uma equipe de pesquisadores do Laboratório de Robótica, Soldagem e Simulação (LRSS), da UFMG, criou uma pistola semiautomática para solda com eletrodo revestido. A nova ferramenta permite automatizar o processo de soldagem a arco elétrico (SMAW, na sigla em inglês) porque é programada para monitorar e controlar automaticamente as variáveis do processo de solda, como temperatura, tensão e corrente elétrica. Com isso, tem-se apenas que movimentar o instrumento ao longo da junta da solda, tornando o trabalho mais confortável para si e proporcionando uma soldagem mais eficiente e uniforme.
ECONOMIA DE ÁGUA A indústria de aço é a maior consumidora de energia em todo o mundo. Segundo Tavares, os gastos com energia representam aproximadamente 40% do custo de produção do aço. “Qualquer economia com energia tem impactos significativos no custo final desse produto”, afirma. Ao diminuir a formação de placas heterogêneas, ou com composições químicas variadas, reduz-se o desperdício de energia na produção de placas. Assim, dispositivos que minimizam a formação de placas de mistura, como o desenvolvido na UFMG, representam uma solução inovadora e eficiente para aumentar a produtividade e otimizar processos na indústria siderúrgica. O Brasil possui 25 usinas produtoras de aço. A capacidade instalada de produção de aço bruto é de 37 milhões de toneladas por ano. Diante desse cenário, os pesquisadores da UFMG pretendem licenciar a tecnologia para grandes indústrias siderúrgicas que utilizam o sistema de lingotamento contínuo para solidificação do aço na produção de placas para fins variados e que, por isso, têm perdas significativas devido à formação de placas de mistura.
Contato: D epartamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Roberto Parreiras Tavares | E-mail: rtavares@demet.ufmg.br 60 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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A maioria das soldas na indústria hoje é realizada por robôs. Entretanto, em alguns casos, é necessária a figura do soldador para executar tarefas específicas com uma máquina de solda manual, de menor porte, que utiliza o eletrodo revestido. “O soldador tem que mergulhar gradativamente o eletrodo à medida que ele faz a solda, que exige grande habilidade. Um soldador experiente é um tipo de mão de obra muito valorizada no mercado. Já para quem não tem prática, é difícil fazer este trabalho”, conta Eduardo José Lima II, que coordena a pesquisa no Departamento de Engenharia Mecânica, onde fica o LRSS. Alguns exemplos de defeitos e empecilhos mais característicos da soldagem com eletrodos revestidos são a dificuldade em manter o arco elétrico com comprimento constante, respingos na região da solda, solda com superfície rugosa, trincas, falta de penetração da solda, problemas que comprometem a qualidade e segurança do processo de solda. “A nova pistola semiautomática desenvolvida na UFMG é um porta-eletrodo com um motor que controla o mergulho do eletrodo, sem a necessidade de controle do operador. Com isso, a solda fica mais precisa e a execução do trabalho mais confortável para o soldador”, explica Lima II. Por meio de algoritmos computacionais, a ferramenta é programada para alimentar o eletrodo na poça de solda, acompanhando variações do processo como tensão, temperatura e corrente elétrica. Segundo o pesquisador, a tecnologia deve substituir o porta-eletrodo manual por uma haste semiautomática, guiada por um algoritmo capaz de controlar a tensão da soldagem e outras variáveis do processo, gerando benefícios como redução dos gastos com treinamento de mão de obra, economia com eletrodos e maior produtividade no processo de solda. SEM DESPERDÍCIO Uma característica importante do novo equipamento é o menor gasto de eletrodos. Atualmente, 35% de todo eletrodo revestido adquirido pelas empresas é desperdiçado com as pontas descartadas no processo de solda, sem a possibilidade de reciclagem. Segundo Eduardo Lima II, o design da pistola possibilita consumir quase todo o eletrodo. Outra vantagem é que a nova ferramenta utiliza as mesmas fontes usadas hoje para a soldagem manual, substituindo apenas o porta-eletrodo. Assim, as empresas que optarem por utilizar a pistola não precisarão trocar todo o equipamento. NOVAS OPORTUNIDADES Em todo o mundo, as indústrias têm gastos elevados com treinamento de soldadores devido à grande habilidade de que esse profissional necessita para lidar com todas as variáveis envolvidas no processo de soldagem manual. “Hoje são necessários anos de experiência para que um soldador efetue uma solda de qualidade”, conta Lima. “Com a pistola semiautomática, o eletrodo é alimentado automaticamente. O soldador só fica encarregado de movimentar a pistola ao lon62 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Eletricidade, calor e faísca A máquina que faz a solda SMAW nada mais é do que uma fonte que fornece uma corrente elétrica altíssima, de até 200 ampères. O eletrodo está acoplado a ela por um material condutor. A corrente elétrica gera um curto-circuito entre o eletrodo e a peça, que provoca uma grande faísca (arco elétrico) de cor amarelo-avermelhada. O arame, aquecido pelo arco elétrico, funde-se, sendo então depositado nas peças a serem soldadas, que também sofrem fusão pelo calor gerado. Como o ar é um isolante natural da corrente elétrica, o eletrodo possui um revestimento que, ao ser queimado, cria uma camada de proteção gasosa, permitindo a passagem da corrente.
go da trajetória a ser soldada”, complementa. Wagner, penso que poderia retirar essa fala, uma vez que já foi citado e não acrescentou praticamente mais nada. Ao automatizar parte do processo da soldagem com eletrodo revestido, mais soldadores poderão ser admitidos no mercado e fazer um trabalho com boa qualidade, mesmo aqueles com menos experiência. A equipe pretende criar uma empresa para desenvolver o protótipo comercial e vender o produto. O grupo tem parcerias com a ESAB, empresa fabricante de produtos para soldagem, e com a FAR-X, uma consultoria em pesquisa e desenvolvimento na área de automação industrial. Ao oferecer economia de matéria-prima e maior produtividade, a tecnologia pode se converter em produto atraente para empresas dos setores de construção civil, gasodutos, estaleiros e serralherias. Mesmo sendo utilizada em várias áreas, o principal mercado-alvo inicialmente definido para comercializar a pistola semiautomática são as empresas fornecedoras de estruturas metálicas para a construção civil, setor em crescimento no Brasil. Além disso, políticas públicas como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a isenção do IPI para linha branca em 2009 configuram uma tendência positiva para setores da indústria brasileira que utilizam solda em larga escala. Equipe: Laboratório de Robótica, Soldagem e Simulação (LRSS) Alexandre Queiroz Bracarense Eduardo José Lima II | E-mail: eduardo@demec.ufmg.br Emanuel Barbosa Silva Frederico Allevato Ramalho Filho Jordano Fernandes Cordeiro 64 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Poste para instalações elétricas utiliza fibra de vidro e resina Resistência e leveza são diferenciais do novo produto, que também pode ser aplicado na geração de energia eólica
Dois pesquisadores da Escola de Engenharia da UFMG desenvolveram uma nova tecnologia para fabricação de postes para redes elétricas. Carlos Alberto Cimini Junior e Estevam Barbosa de Las Casas aplicam a configuração semimonocoque em um material composto com fibra de vidro e resina. O conceito é inspirado em estruturas aeronáuticas como as usadas em fuselagens de aviões. Por isso o poste é extremamente leve e, ao mesmo tempo, rígido e resistente, podendo ser alternativa para substituir os postes de iluminação convencionais de concreto, aço ou madeira nas redes de transmissão de energia elétrica. Grandes empresas, como a Cemig, já manifestaram interesse pela tecnologia. Outra possibilidade de aplicação é como suporte de turbinas eólicas, mercado em expansão no cenário internacional. O conceito de estruturas semimonocoque nesse tipo de poste se baseia em seções cilíndricas concêntricas, reforçadas por barras longitudinais fabricadas com resina epóxi e fibra de vidro. Esse material foi escolhido por apresentar alta resistência e baixo custo quando comparado à fibra de carbono ou de aramida, por exemplo, dois materiais com alta resistência mecânica. Já a resina epóxi foi preferida no projeto por apresentar resistência elevada e boa adesão com as fibras. Mas também existem outras opções, dependendo do tamanho e da configuração desejada na aplicação final. “Ao contrário do projeto tradicional, em que se
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busca as dimensões dos componentes estruturais necessárias para resistir a uma determinada solicitação, o uso de materiais compostos possibilita se projetar o próprio material, adequando-se a composição e a distribuição à resistência almejada”, explica Las Casas, um dos idealizadores do projeto. Os protótipos laboratoriais submetidos a testes de flexão, compressão e torção demonstraram bons resultados. “Nossa ideia inicial era fazer um poste com um projeto diferenciado e os resultados obtidos com os protótipos mostraram que o novo poste é uma estrutura otimizada quanto à resistência e mais leve que os postes convencionais”, acrescenta. LOGÍSTICA E SEGURANÇA Os postes convencionais podem ser feitos de aço, madeira e concreto. Apesar de terem custo reduzido, eles são pesados, o que influencia diretamente nas despesas de transporte. “Em muitos casos esses postes percorrem longas distân-
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cias para chegar a locais isolados, como áreas rurais que estão sendo atendidas pelo programa do governo federal Luz para Todos”, lembra Cimini Junior, que coordena o projeto. Em Minas Gerais, a Cemig tem previsão de construir, até o fim de 2010, 65 mil quilômetros de redes, instalar 120 mil transformadores e 580 mil postes. Além da dificuldade e do alto custo de transporte, os postes convencionais também apresentam baixa resistência à fadiga quando comparados ao produto feito com materiais compostos poliméricos e fibras, como o desenvolvido na UFMG. “O poste que idealizamos é muito resistente e suporta grande carga. Por isso, em locais de difícil acesso, ele poderia ser também uma alternativa à instalação daquelas torres de aço usadas para implantar linhas de transmissão de energia”, acredita Cimini. Por serem mais pesados, os postes de concreto e de aço exigem fundações mais robustas, que impactam nos custos da instalação. O poste de madeira tem aplicação limitada devido às baixas rigidez e resistência, além de apresentar proble-
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Quanto mais alto, melhor Outra possibilidade de aplicação do poste feito de fibra de vidro e resina é como suporte de turbinas eólicas, pois o mercado de fontes limpas de energia está em franca expansão mundialmente. Para me-
Monitoramento do consumo de energia via internet Equipamento atende a projetos industriais e domésticos de eficiência energética
lhor aproveitamento da potência do vento são necessárias torres de, no mínimo, 30 metros de altura. A estrutura semimonocoque permite a fabricação de postes com alturas mais elevadas, mantendo a leveza e a resistência, o que permite que sejam usados em usinas de geração de energia eólica.
mas de deterioração pelo meio ambiente, como, por exemplo, pelo fogo, excesso de umidade ou ação de animais. Utilizar postes fabricados com fibra de vidro e plásticos reforçados solucionaria esses dois problemas. Além disso, materiais plásticos absorvem melhor o impacto no caso de uma colisão. “Em acidentes de trânsito, danos no veículo e no motorista são menores”, exemplifica Cimini. Outro diferencial dessa tecnologia é o fato de estar associada a um software que possui a metodologia de projeto implementada. “Um programa computacional faz o projeto do poste automaticamente, considerando tamanho, modelo e materiais escolhidos”, complementa Cimini. Essa característica também poderá viabilizar mais facilmente o escalonamento da tecnologia. Segundo o pesquisador, apesar de o custo por quilograma de matéria-prima ser superior ao dos materiais utilizados convencionalmente para fabricação de postes, o novo produto é competitivo porque a quantidade de material utilizada é menor, os materiais são recicláveis e o projeto possibilita ainda redução nos custos de fundação, logística e instalação. Os pesquisadores devem optar pela transferência da tecnologia para uma empresa interessada em fabricar os postes. As empresas distribuidoras de energia que instalam postes de iluminação e torres de transmissão são o mercado-alvo. Além dessas empresas, outro cliente potencial para os novos postes são prefeituras e empreendedores privados interessados em modernizar e inovar a paisagem, melhorar a infraestrutura de distribuição de energia e oferecer mais segurança em empreendimentos como condomínios residenciais, polos industriais ou estádios.
A preocupação com o uso racional de energia elétrica vem crescendo significativamente nos últimos anos, principalmente após o racionamento imposto pela crise de fornecimento de energia elétrica em 2001 e 2002. Desde aquela época, o professor Fábio Gonçalves Jota, do Laboratório de Controle de Processos Industriais da UFMG; Patrícia Romeiro, do Centro Federal de Educação Tecnológica (CefetMG); e o engenheiro Eduardo Carvalhaes, da Cemig, têm trabalhado no desenvolvimento de equipamentos para ajudar as pessoas a controlar o consumo de energia elétrica. Um dos resultados dessas pesquisas é o Centro de Monitoramento de Usos Finais (CMUF), um sistema de monitoramento e controle de cargas elétricas de bai-
Equipe: C arlos Alberto Cimini Junior | E-mail: carlos.cimini@gmail.com Estevam Barbosa de Las Casas | E-mails: estevam@dees.ufmg.br ou estevam.lascasas@gmail.com 70 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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xo custo e fácil instalação, capaz de medir a energia consumida em uma residência ou indústria. O diferencial é que a medição é feita por uso final, isto é, em cada tipo de aparelho separadamente e em tempo real. O CMUF possibilita ainda a medição do consumo geral, do consumo por andar, por sala ou por conjuntos de unidades, como aparelhos de ar-condicionado, luzes e computadores. Essa setorização é definida de acordo com a necessidade do usuário. “Consideramos importante saber onde há desperdício potencial de energia. Muitas vezes o consumidor gasta sem perceber. Daí a importância de um monitoramento setorizado e em tempo real, porque, com isso, podemos conter os gastos antes da conta de luz chegar”, explica Fábio Jota, da UFMG. Se o consumidor souber que está gastando muito com o computador, por exemplo, ele pode tomar medidas para diminuir esse consumo específico. “Tratase, portanto, de estimular o consumo racional de energia”, complementa. Para fazer esse monitoramento setorizado é necessário ter um sistema de custo muito baixo. “Em geral os sistemas convencionais de controle de energia são tão caros que não compensa instalar. O que fizemos foi desenvolver um sistema completo, desde o hardware até o software, que chega a ser dez vezes mais barato que as tecnologias disponíveis no mercado, e que pode ser usado tanto em residências quanto em indústrias”, conta Jota. 72 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
Em conjunto a essa plataforma-base foram desenvolvidas outras tecnologias com o intuito de incrementar o sistema e oferecer um modelo mais completo do ponto de vista funcional. A primeira delas foi a disponibilização, em uma interface interativa, de análises gráficas, estatísticas, de tendências e valores de referência, geradas pelo processamento dos próprios dados recebidos por meio de um software. Segundo o pesquisador, a interface é bastante amigável. “O usuário entra na internet usando qualquer navegador e, na página do programa, aparecem todos os equipamentos ou conjuntos que estão sendo monitorados. Não há necessidade de baixar um programa”, explica. As formas e os tipos de análises disponibilizados podem ser adequados às necessidades do usuário. Uma segunda tecnologia permite ao sistema desligar, ligar ou modular o uso das cargas remotamente. Esta última, acoplada a uma tecnologia desenvolvida para medir variáveis ambientais, como temperatura e umidade (interna e externa) ou luminosidade, possibilita a criação de um sistema inteligente, capaz de fazer relações entre as variáveis e o consumo de energia necessário. Isso ativa, desativa ou modula o consumo de cargas automaticamente, como por exemplo, regulando a utilização do ar-condicionado ou da intensidade da luz de acordo com a temperatura e a luminosidade. Outra funcionalidade desenvolvida foi a possibilidade de o usuário ter acesso às informações e análises geradas e de poder controlar as cargas remotamente, em tempo real, de qualquer computador ou celular com conexão à internet. PEQUENO CONSUMO, GRANDES GASTOS Em relação ao consumo doméstico de energia elétrica, é comum acreditar que haja vilões do consumo, como o chuveiro, o ferro de passar roupa e a geladeira. No entanto, segundo Fábio Jota, isso não é totalmente verdadeiro. Equipamentos como o chuveiro certamente consomem muita energia, mas existem outros que ficam ligados o dia inteiro e que, por isso, também acabam consumindo muito. É o caso dos aparelhos que tem o chamado stand-by (modo de espera). “Embora a maioria das pessoas acredite que as luzinhas ligadas espalhadas pela casa tenham gasto irrisório, isso não é verdade”, lembra Jota. “A questão é que elas ficam ligadas 24 horas por dia, todos os dias da semana, todos os meses do ano e é justamente isso que faz a diferença no consumo final de energia”, esclarece. Um estudo feito no Departamento de Estradas e Rodagens (DER) mostrou que o gasto com o stand-by dos aparelhos de ar-condicionado durante a noite e fins de semana era maior que o gasto com os equipamentos ligados o ano inteiro. A tecnologia desenvolvida na UFMG e no Cefet permitiu uma economia de R$ 6 mil reais por mês. Além do DER, o CMUF tem protótipos instalados em outras 14 edificações em Belo Horizonte e na cidade de Juiz de Fora, com resultados de desempenho e eficiência positivos. O sistema funciona sem falhas 24 horas por dia, mostrando alta confiaprograma de INCENTIVO À inovaçÃO 73
bilidade. O equipamento tradicional para determinar o consumo de energia elétrica é o medidor eletromecânico. Ele se limita a registrar o consumo total no fim do mês e ainda requer o envio de um técnico para realizar a leitura. A principal vantagem competitiva do novo equipamento é a integração de diversas funcionalidades em um sistema único, ou seja, ele é capaz de analisar informações, transmitir e acionar remotamente medidas para aumentar a eficiência energética. Além disso, o preço é dez vezes (ou mais) inferior ao dos medidores disponíveis hoje no mercado. EFICIÊNCIA ENERGÉTICA A tecnologia já foi submetida a um pedido de patente nacional e internacional. Um dos mercados-alvo são as empresas especializadas em projetos de eficiência energética (as ESCOs, do inglês Energy Service Companies). Outro mercado potencial podem ser as concessionárias de energia que necessitam de ferramentas para monitorar a própria rede. Elas poderiam, ainda, oferecer projetos de eficiência energética para seus clientes de maneira geral ou usar a tecnologia para fazer monitoramento em residências de baixa renda para implantar ações de aumento da eficiência energética. Segundo determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as distribuidoras devem destinar 0,5% do seu lucro operacional líquido a projetos de eficientização.
Eficiência e baixo custo Como a tecnologia desenvolvida tem custo reduzido de fabricação e implantação, uma das potenciais aplicações é em uma residência onde vivem famílias de baixa renda. Em Minas Gerais, essas famílias têm desconto na conta de luz quando consomem até 80 kW por mês. Mas, se ultrapassam esse consumo, o valor da conta pode aumentar significativamente, com impacto importante no orçamento familiar. Com isso, muitas famílias se tornam inadimplentes. A Cemig se interessou pela tecnologia porque, por meio do monitoramento, pode gerar boletins de aviso para que as famílias não ultrapassem o limite de consumo, continuem a ter descontos e possam pagar suas contas. “Para a empresa o custo do monitoramento é bem menor do que os prejuízos com a inadimplência”, acredita o professor Fábio Jota.
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O crescimento da demanda por energia elétrica nem sempre é acompanhado pelo crescimento nos investimentos em novas formas de geração de energia, o que faz aumentar o preço da energia. Na prática, isso se traduz em uma conta de luz mais alta para pagar. No Brasil, onde a energia elétrica é uma das mais caras do mundo, o aumento no preço das tarifas de energia elétrica foi de 155% em um período de cinco anos. Um dos fatores que faz aumentar o preço que é pago pela eletricidade é o desperdício. Estimativas indicam que 16,5% de toda a energia elétrica produzida no país é desperdiçada. Assim, a busca por práticas de eficiência energética é uma tendência mundial. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), os investimentos em eficiência energética e tecnologias limpas devem ser de US$ 400 bilhões por ano durante as próximas duas décadas. Equipe: L aboratório de Controle de Processos Industriais – UFMG Centro de Pesquisa em Energia Inteligente – CEFET-MG Cemig Eduardo Carvalhaes Nobre Fábio Gonçalves Jota | E-mail: fabio@cpdee.ufmg.br Patrícia Romeiro da Silva Jota programa de INCENTIVO À inovaçÃO 75
Pilhas superpoderosas Empresa originada na UFMG vai fabricar pilhas com material cerâmico
A CeelBio é uma empresa em fase de pré-incubação na Incubadora de Empresas da UFMG (Inova) dedicada à fabricação de materiais cerâmicos. Ela nasceu a partir de pesquisas no Laboratório de Materiais e Pilhas a Combustível (Lampac), do Departamento de Química da UFMG. Uma das aplicações desses materiais é a fabricação de pilhas a combustível que podem fornecer energia para qualquer tipo de sistema, desde aparelhos portáteis até grandes cidades e indústrias. Os pesquisadores Tulio Matencio, Rosana Zacarias Domingues e Rose Marie Belardi trabalham no desenvolvimento da Pilha a Combustível de Óxido Sólido (PaCOS), fonte de energia limpa, silenciosa e de rendimento energético muito superior em relação aos atuais modelos energéticos, como os baseados em combustíveis fósseis. A PaCOS é um dispositivo que, em temperaturas entre 650ºC e 850ºC, converte eletroquimicamente combustíveis químicos em eletricidade usando hidrogênio e oxigênio. Como toda pilha, ela é formada de um catodo, um anodo e um eletrólito. Os três componentes básicos do dispositivo são elaborados com materiais cerâmicos que demandam tratamento térmico em fornos que alcançam até 1700ºC. Segundo Tulio Matencio, pesquisador do Lampac e coordenador do projeto, a PaCOS opera entre 650ºC e 850°C e é justamente por funcionar em alta temperatura que essa pilha adquire características diferenciadas. “Na PaCOS, o calor gerado na reação química que produz eletricidade também pode ser aproveitado, o que aumenta o rendimento desse tipo de pilha”, afirma. Para efeito de comparação, a eficiência do carro a gasolina é surpreendentemente baixa, ficando em torno de 20%. Todo calor expelido como gases da exaustão ou que vai para o radiador é desperdiçado. A pilha a combustível feita a partir de material cerâmico pode alcançar rendimento superior a 80%. “Como ela trabalha em temperaturas altas, o calor gerado na reação química que libera energia para movimentar algum tipo de sistema também pode ser aproveitado, por isso o rendimento aumenta tanto”, explica. Outra vantagem da PaCOS é o que os pesquisadores chamam de reforma interna. O hidrogênio – necessário para a reação química que ocorre no interior da pilha – pode ser obtido internamente a partir do etanol, uma fonte renovável e fartamente disponível no Brasil. “Por trabalhar em altas temperaturas, a PaCOS pode transformar o etanol dentro da pilha para obter hidrogênio”, acrescenta Matencio. 76 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Mundo movido a hidrogênio Segundo pesquisas da empresa de consultoria Fuel Cell Today, com sede em Londres (Inglaterra), a utilização da tecnologia baseada em células a combustível vai provocar grandes impactos ambientais e sociais. Um dos setores que deve sofrer grandes mudanças é o de transporte. Carros e ônibus podem se tornar mais baratos, rápidos e eficientes. Um exemplo de aplicação é no setor ferroviário, no qual Minas Gerais se destaca, já que possui a segunda maior malha ferroviária, atrás apenas do Estado de São Paulo. Com as células a combustível será possível fornecer eletricidade para os trens sem a necessidade de grandes redes de cabos, com maior torque e força e menores riscos de panes elétricas por causas meteorológicas.
Corrente Elétrica
eDe acordo com o pesquisador, as temperaturas altas também dispensam o uso de catalisadores para acelerar a reação química. Esses catalisadores normalmente são caros, o que aumentaria o custo da geração de energia. Em termos de engenharia isso significa economia de espaço e de processos, já que não é necessário agregar outros equipamentos para fornecer hidrogênio para a pilha funcionar. O objetivo dos pesquisadores é desenvolver um protótipo comercial de 500 watts da pilha a combustível para pequenas aplicações domésticas e comerciais. SUBPRODUTOS VALIOSOS Enquanto segue o desenvolvimento da PaCOS, os subprodutos gerados nesta pesquisa poderão ser explorados comercialmente pela CeelBio, podendo ser aplicados em diversos mercados do setor de cerâmicas para aplicações avançadas. “Na indústria siderúrgica, por exemplo, esses materiais podem ser usados para medir a quantidade de oxigênio nos metais. Também podem ser usados na indústria eletrônica ou na área de nanotecnologia biomédica”, conta Matencio. Os subprodutos isolados também têm potencial comercial de venda para outros desenvolvedores de pilhas e outras pesquisas científicas que utilizem esse tipo de material. São filmes, fitas, anodo, catodo e eletrólito feitos a partir de material
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Entrada de combustível
O2-
H2
H2O
e-
Entrada de ar O2
e-
O2Saída de água e combustível
Saída de ar anodo
catodo
eletrólito
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UFMG integra rede nacional de pesquisa O Laboratório de Materiais e Pilhas a Combustível da UFMG faz parte da Rede PaCOS, rede nacional para o desenvolvimento de sistemas de geração de energia baseados em pilhas (células) a combustível de óxido no Brasil. A Rede funciona no âmbito do Programa Brasileiro de Células a Combustível (PROCaC) do Ministério da Ciência e Tecnologia. Criada em 2004, a Rede PaCOS tem como meta fomentar o desenvolvimento de pilhas a combustível de óxido sólido no Brasil e fortalecer os grupos de pesquisa e desenvolvimento que trabalham nessa área e em outras correlatas.
cerâmico, além de pó cerâmico e pó cerâmico em suspensão. A comercialização desses subprodutos tem a importância de substituir a importação por produtos de fabricação nacional. Hoje a fabricação da pilha a combustível é completamente dependente de laboratórios estrangeiros. No Brasil e no mundo, as pesquisas para o desenvolvimento de pilhas com células a combustível têm-se intensificado devido à busca por fontes alternativas de energia. A produção de eletricidade por meio do hidrogênio gera baixa emissão de gás carbônico (CO2) e de outros poluentes ambientais. A grande inovação contida na pilha pesquisada na CeelBio, a PaCOS, é seu alto rendimento, além de ser uma fonte de energia limpa, que não emite poluentes, não consome água e que tem baixíssima degradação com o passar do tempo. Na empresa da UFMG o estágio de desenvolvimento das pilhas está avançado, próximo de gerar um produto comercialmente viável, o que pode colocar o Brasil em posição de destaque na produção desses dispositivos. “Em nossa pesquisa estamos fazendo a superposição de várias pilhas para aumentar a potência”, adianta Tulio Matencio. O mercado de pilhas a combustível é bastante amplo, abrangendo quase todas as aplicações que demandem alguma fonte energética, desde eletrônicos portáteis até usina elétricas.
Gerenciamento de vídeos digitais Tecnologia pode evitar a circulação de vídeos com conteúdo impróprio
A mãe viajou com as crianças. O pai não pôde ir. Para registrar momentos especiais com os filhos, ela grava pequenos vídeos com o telefone celular. Em seguida os arquivos digitais são enviados, pelo mesmo aparelho, para uma rede de relacionamento, por meio da qual o pai pode acessar os vídeos e, mesmo que remotamente, compartilhar da alegria da família que está distante. Cenas como essa são cada vez mais comuns, graças ao avanço da tecnologia de transmissão rápida de dados e por telefones móveis com cada vez mais recursos. A equipe de pesquisa do Núcleo de Processamento de Imagens (NPDI) da UFMG, coordenada pelo professor Arnaldo Albuquerque, criou a dFliqz, Plataforma de Gerenciamento Automático de Conteúdo em Vídeos Digitais, que permitirá reconhecer, detectar eventos e objetos em vídeos e gerar pequenos resumos. O resultado é facilitar a recuperação de vídeos e imagens digitais, além de impedir a disseminação de conteúdos impróprios.
Equipe: Rosana Zacarias Domingues Rose Marie Belardi Tulio Matencio | E-mail: tmatencio@ufmg.br 80 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Cada vez mais rápido A principal característica da terceira geração de telefonia celular é a velocidade. As redes 3G garantem uma velocidade de transmissão de dados até 15 vezes maior que as atuais. A telefonia 3G está para a telefonia 2G assim como a internet banda larga está para a conexão discada. A transmissão de dados em alta velocidade permite o acesso a conteúdo multimídia como vídeos, TV e animações em alta resolução, assim como e-mails e mensagens instantâneas, possibilitando o download rápido de grandes quantidades de dados.
Análise de conteúdo
Captura digital
Upload para o servidor
Conteúdo impróprio
Publicação na internet apenas do conteúdo permitido
O sistema consiste em criar um repositório de imagens exclusivo para vídeos feitos em telefones celulares com tecnologia de terceira geração (3G). Por meio de algoritmos de processamento de dados, o dFliqz é capaz de observar o ambiente capturado e extrair informações úteis para posterior utilização. “O diferencial do dFliqz é a capacidade automática de avaliar os vídeos e determinar se eles têm algum tipo de conteúdo agressivo ou pornografia, evitando assim a disseminação de conteúdo impróprio, um dos grandes problemas das redes de relacionamento atualmente”, adianta Albuquerque. Assim, o sistema pode devolver os vídeos para o repositório e os usuários poderão acessá-los rapidamente. 82 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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A tecnologia detecta eventos que são determinados tipos de cena ou movimentos dentro de um vídeo como, por exemplo, o gol em uma partida de futebol. Além disso, o sistema identifica objetos específicos, ou seja, imagens que representam objetos reais em um vídeo. Uma bola seria um objeto, um carro azul seria outro e assim por diante. Segundo Albuquerque, o programa classifica essas cenas e objetos pelas cores, formas, textura, baseado em pontos de interesse e pacotes de atributos. “O dFliqz é treinado para analisar e detectar pornografia e cenas de agressão. Por isso pode barrar a chamada pornografia disfarçada quando, por exemplo, em meio a um filme infantil, são inseridas cenas com pornografia”, explica. “Em geral, os sistemas não conseguem detectar estes conteúdos impróprios porque baseiam suas buscas apenas nos textos, e não nas imagens”, complementa. Hoje a recuperação de informação na rede é feita, principalmente, por meio de palavras-chave (ou tags). “Nossa proposta é fazer a busca de vídeos e imagens baseada em objetos e eventos automaticamente identificados. Isso facilita a busca pelo usuário também. Em vez de usar uma palavra, você usa uma imagem para buscar imagens e vídeos”, conta Igor Calil, outro pesquisador deste projeto. REDES SOCIAIS MÓVEIS Este produto faz parte de uma tendência mais recente, a das redes sociais móveis, caracterizadas por propiciar a interação entre os usuários em tempo real por meio de textos, imagens, voz e vídeo transmitidos por telefones celulares. A inovação do dFliqz é o processamento do vídeo em servidor próprio, imediatamen-
Em quase todas as casas O número de celulares também mostra o crescimento contínuo no Brasil. A cada ano mais pessoas adquirem aparelhos telefônicos. Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), divulgados em agosto de 2009, o Brasil atingiu a marca de 165 milhões de celulares. O índice de densidade de telefones celulares no país é de 85,91 acessos por 100 habitantes. O avanço das redes 3G, aliado à proliferação dos smartphones, como são chamados os celulares com recursos de acesso à internet, deve facilitar ainda mais o acesso do usuário brasileiro às redes sociais via telefone celular.
te antes do seu compartilhamento na rede. Com isso, grande volume de conteúdo digital poderá ser exposto de forma organizada e segura na internet, proporcionando agilidade no rastreamento de informações e evitando a circulação de material ofensivo. Os pesquisadores pretendem criar uma spin-off para comercializar a tecnologia. Já existe uma parceria com a empresa SumSys, graduada na incubadora de empresas de base tecnológica da UFMG, Inova. Redes de telefonia móvel são potenciais clientes para essa tecnologia, já que poderão oferecer a seus usuários um recurso para acesso a diversas redes de relacionamento que crescem vertiginosamente no Brasil. De acordo com dados de um estudo da consultoria ComScore, publicados pelo site especializado em tecnologia TI Inside, o Brasil é o segundo país do mundo em número de acessos a redes sociais. Cada usuário brasileiro visita, em média, 1,22 mil páginas de sites de relacionamento por mês, gastando em média 6,3 horas com redes sociais. O país também é campeão mundial de usuários do Orkut e o segundo colocado em número de acessos ao YouTube, configurando um cenário que demanda novas tecnologias para veiculação, acesso e recuperação de vídeos digitais na internet. Com o dFliqz, os usuários da telefonia celular poderão compartilhar conteúdos quase em tempo real, criando, assim, redes móveis ainda mais interativas. Equipe: A rnaldo Albuquerque | E-mail: arnaldo@npdi.dcc.ufmg.br Bruno Teixeira Fernando Lauriano Igor Calil
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Tecnologia para deficientes visuais Produto facilita acesso ao transporte público
Chegar a um ponto de ônibus, esperar, sinalizar quando o ônibus se aproxima, entrar no veículo. Rotina comum para milhões de pessoas, mas ainda um desafio para alguém com deficiência visual. Afinal, essas pessoas têm, na maioria das vezes, de contar com o auxílio de outra pessoa no ponto para que leia os itinerários e pare o ônibus certo. Pensando em facilitar o acesso de deficientes visuais ao sistema de transporte público, o pesquisador Julio Cezar David de Melo, do Laboratório de Sistemas Inteligentes da Escola de Engenharia da UFMG e sócio da Geraes Tecnologias Assistivas, desenvolveu o DPS2000. A tecnologia é um dispositivo de interface que permite ao usuário com problemas de visão usar os serviços do transporte urbano de forma autônoma e segura. Em estágio avançado de desenvolvimento, o novo produto deve começar a ser fabricado já em 2010.
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Ações para inclusão Nos últimos anos tem aumentado o número de ações com objetivo de facilitar o acesso e garantir a inclusão de pessoas com algum tipo de deficiência. Em Belo Horizonte, por exemplo, a partir de 1990, as empresas de transporte foram obrigadas a instalar elevadores nos ônibus. A partir de 1994 foram instaladas rampas com corrimão em todas as escolas públicas da cidade, visando a garantir o acesso de pessoas com dificuldades de locomoção. Percebe-se, assim, um contexto favorável para o lançamento da tecnologia desenvolvida na UFMG, uma vez que o novo dispositivo é mais uma ferramenta de acesso e inclusão.
O DPS2000 é um sistema de comunicação por radiofrequência similar ao utilizado em controles remotos. É formado por um transmissor, que fica com o usuário, e um receptor, instalado nos veículos. “No ponto de ônibus o usuário aciona o aparelho, que emite um sinal para o dispositivo instalado nos ônibus. O motorista vê o sinal no painel e sabe, antecipadamente, que no próximo ponto deve parar”, explica Julio de Melo. Quando o ônibus estaciona no ponto, uma mensagem é reproduzida em um alto-falante localizado na porta de entrada do veículo para avisar o usuário. As linhas de ônibus utilizadas são programadas previamente pela pessoa que usa o sistema, por meio de menus de áudio. “Toda a comunicação do usuário com o receptor é feita por mensagens de áudio. Isso é possível porque usamos um chip de memória flash em que ficam armazenados arquivos de voz digitalizados”, conta Melo. Segundo ele, o aparelho que ficará com o usuário será pequeno, do tamanho de um aparelho de telefone celular comum, e funcionará com uma bateria recarregável, similar à desses aparelhos. A tecnologia utilizada no produto é baseada em um conceito chamado Sistemas Embutidos, que utiliza componentes eletrônicos similares a um computador (microcontroladores) para controlar um equipamento com funções específicas. Esses microcontroladores têm baixo custo, alto desempenho, baixo consumo de energia e pequeno volume, sendo ideais para a fabricação de equipamentos portáteis como o DPS2000. O projeto está sendo testado em laboratório com resultados satisfatórios. Em seguida começam os testes em campo, em uma das linhas de ônibus do sistema de programa de INCENTIVO À inovaçÃO 87
transporte urbano de Belo Horizonte. “Acreditamos que essa fase seja concluída em cerca de oito meses, e que, já no segundo semestre de 2010, comece a produção industrial do equipamento”, prevê o pesquisador. O detentor da patente original é Dácio Pedro Simões, que dá nome ao projeto, e que desde 2000 procurava auxílio financeiro e técnico para tentar concretizar a ideia que teve ao se deparar com o problema do acesso de pessoas cegas ao sistema de transporte público urbano. IMPACTO SOCIAL Pesquisas realizadas pela equipe do projeto em instituições frequentadas por deficientes visuais demonstram que a nova tecnologia terá grande receptividade. “Em nossos questionários, eles contam que a maior dificuldade não é subir ou descer dos ônibus, mas, sim, parar a linha certa. Eles têm sempre que depender de alguém para pegar o ônibus que desejam e isso limita sua autonomia. Em muitos casos, se não encontra ninguém para pedir ajuda ele tem que parar todos os ônibus que passam”, conta Melo. As pesquisas da equipe detectaram, ainda, que, por conta das dificuldades enfrentadas para usar os ônibus, parte desse público deixa de utilizar esse meio de transporte. Não dispondo de outros recursos para se locomover, eles deixam de participar de atividades fundamentais como trabalho, estudos e lazer. Diante desse cenário, o DPS2000 tem característica altamente inovadora. Hoje não há outros produtos ou tecnologias que garantam a utilização do sistema de transporte de forma autônoma e independente para o público com limitações visuais. Outro diferencial do novo produto é que além de ser simples, não exige grandes investimentos para instalação. De acordo com Melo, o principal fator do dispositivo não é sua complexidade, mas a forma como várias tecnologias foram agrupadas em um único produto. Belo Horizonte foi definida como o público-alvo inicial para implantação do dispositivo. Segundo a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans), ligada à prefeitura, o sistema da capital mineira beneficia diariamente 1,4 milhão de usuários, dos quais 5,1 mil são deficientes visuais que usufruem da gratuidade nas viagens, em uma população estimada em torno de 35 mil. Podem-se somar a esse número pessoas idosas e outras com dificuldades visuais, os chamados deficientes parciais. O sistema de transporte urbano por ônibus da cidade abrange 300 linhas e possui uma frota de 2.874 veículos (dados de outubro de 2009).
Equipe: Laboratório de Sistemas Inteligentes – EEUFMG Geraes Tecnologias Assistivas Ltda Júlio Cezar David de Melo – E-mail: demelo@cpdee.ufmg.br 88 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Tecnologia para descontaminação de efluentes da indústria farmacêutica Processo pode substituir a incineração de medicamentos, permitindo a reciclagem de materiais descartados
A indústria farmacêutica se depara, invariavelmente, com sérios problemas ambientais e sanitários relacionados ao descarte de medicamentos com validade de uso vencida. Mais comumente, os rejeitos são encaminhados para incineração, um procedimento, em escala industrial, caro e de alto risco ambiental. Pesquisadores do Departamento de Química da UFMG desenvolveram um tratamento químicocatalítico que degrada substratos orgânicos em meio líquido dos princípios químico-ativos, por fragmentação de grandes moléculas orgânicas dos fármacos, para formar estruturas moleculares menores e mais simples, facilmente biodegradáveis. A tecnologia baseia-se, em termos gerais, em dois processos oxidativos avançados (POAs), especificamente, Fenton e fotocatálise. Os reagentes são misturados aos efluentes em um reator químico, promovendo a degradação química. “A grande vantagem é que vamos transformar os fármacos que têm de ser descartados em um resíduo líquido de baixa periculosidade, que pode ser seguramente tratado, pois os princípios ativos ambientalmente mais agressivos são destruídos”, explica Rochel Montero Lago, um dos pesquisadores do projeto. Hoje, os lotes de medicamentos vencidos das indústrias farmacêuticas são encaminhados para incineração. Além de ser um processo dispendioso, com alta demanda energética e que gera emissões de gases que impactam no efeito estufa, a incineração não possibilita qualquer recuperação de outros resíduos sólidos, como papel, plástico ou vidro das embalagens dos medicamentos. Se preservados no processo de descarte do medicamento, esses materiais poderiam ser reciclados. No limite das reações químicas de oxidação, o objetivo é produzir, como resíduo final, gás carbônico e água, como os que são gerados da respiração dos seres vivos, que não são ameaças químicas diretas ao ambiente. “Esse tipo de descontaminação permite que o resíduo líquido resultante do processo entre no fluxo normal de descarte da empresa. A ideia é sair do procedimento tradicional de queima para adotar o processo catalítico”, explica José Domingos Fabris, que coordena o
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Demanda por processos mais limpos No Brasil e em âmbito global, várias organizações buscam conscientizar as empresas e os governos sobre as desvantagens e os perigos da incineração de rejeitos da indústria químico-farmacêutica. A Associação de Combate aos Poluentes Orgânicos Resistentes (ACPO), ligada à Global Alliance for Incinerator Alternative (GAIA), luta pela erradicação dos incineradores e incentivam alternativas menos agressivas para tratamento do problema, representado pelos lixos urbano, industrial e hospitalar. Essas organizações consideram a incineração uma prática que promove a emissão de poluentes tóxicos, contamina o meio ambiente e expõe as populações ao risco real de contaminação química. A Convenção de Estocolmo, da qual o Brasil é signatário, reconhece os incineradores como principal fonte primária de dioxinas e de diversos metais pesados. A Convenção levou a um tratado internacional, assinado em 2001, em Estocolmo (Suécia), para eliminar globalmente a produção e o uso de algumas das substâncias tóxicas ao ambiente produzidas pelo homem. Adaptação no processo da Indústria Farmacêutica
Tecnologia FENTON
Efluente Contaminado Triturador de embalagens
H2O2 Bomba
Lavagem + separação por densidade
Fe2+ Efluente Tratado
Vidro Plástico Papel
Esquema da montagem do processo Fenton clássico, homogêneo, com bombeamento contínuo de Fe2+, para o meio em que ocorre a reação de oxidação do substrato. Na versão alternativa, com Fenton heterogêneo, o Fe2+ é diretamente suprido pela fase sólida, contida no meio reacional.
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projeto. De acordo com o pesquisador, outra vantagem está no fato de a tecnologia ter equipamentos e custos de operação mais baixos do que a incineração. Os processos Fenton e fotocatalítico são conhecidos e estudados em escala laboratorial, mas a aplicação para descontaminação de efluentes da indústria farmacêutica é ainda inédita. “A inovação está no arranjo físico do sistema de tratamento, que associa os equipamentos industriais aos processos oxidativos”, explica Fabris. A tecnologia será licenciada para a empresa Verti Ecotecnologias, voltada para o desenvolvimento de soluções ambientais. A empresa fará o escalonamento da tecnologia em planta piloto, que possibilitará testes para otimização e adaptação do processo às diferentes necessidades de cada empresa. Outro segmento industrial que pode se beneficiar da tecnologia é o de agrotóxicos. Para essas indústrias, o descarte de resíduos também é uma questão ambiental delicada, que envolve custos elevados e riscos ambientais. Os contaminantes presentes nesses rejeitos não são biodegradáveis. Assim, não podem ser tratados por processos biológicos, que consistem, essencialmente, na adição de micro-organismos ao meio, com objetivo de deixar os resíduos atóxicos. Com a fotocatálise, no entanto, degradam-se os resíduos, para produzir substâncias menos ou, de preferência, ambientalmente não agressivas. Os efluentes aquosos, gerados pelas indústrias, e que são lançados no meio ambiente, contaprograma de INCENTIVO À inovaçÃO 93
Alta tecnologia para descontaminar resíduos Pesquisa possibilita novos usos para mantas industriais encharcadas com óleo
Mantas de polipropileno são usadas em larga escala pela indústria química e petrolífera para absorver óleo derramado. Mas quando estão encharcadas, tornam-se um passivo ambiental perigoso. O descarte desses materiais diretamente na natureza tem alto potencial de contaminação de corpos de água, rios, mares e lençóis freáticos. As formas de descarte mais comuns hoje, a incineração ou o coprocessamento em cimenteiras, liberam gases tóxicos no meio ambiente. A limpeza de mantas e de qualquer outro material contaminado com óleo tem impacto positivo e direto sobre a natureza. Para tentar solucionar esse problema, o professor Rochel Montero Lago e a pesquisadora Aline Almeida da Silva minam a água, o solo e a atmosfera. Os processos oxidativos, propostos na nova tecnologia industrial, podem contribuir para a redução de resíduos quimicamente danosos, sistematicamente descartados pelas empresas. O mercado-alvo da tecnologia são as indústrias farmacêuticas e as fabricantes de agrotóxicos que fazem descarte interno de resíduos, além das empresas prestadoras de serviço, que tratam resíduos para terceiros. O Brasil tem apresentado crescimento na indústria farmacêutica. Em 2008, o mercado cresceu 12% em relação a 2007, sendo que Minas Gerais concentra 11% da indústria desse setor – 64% dessas indústrias estão na região Sudeste. Aliado à legislação ambiental, que obriga as empresas a gerenciarem seus resíduos, isso mostra que uma alternativa mais barata e eficiente para o tratamento de efluentes encontra um cenário excepcionalmente favorável para a aplicação.
Equipe: D epartamento de Química Fabiano Magalhães José Domingos Fabris | E-mail: jdfabris@ufmg.br Lucas Kemp Márcio César Pereira Rochel Montero Lago 94 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Oliveira, do Departamento de Química da UFMG, desenvolveram uma tecnologia inédita para remover o óleo dessas mantas usando gás carbônico (CO2) supercrítico. O processo permite reaproveitar tanto as mantas quanto o óleo removido, configurando, assim, uma alternativa mais eficiente e ambientalmente sustentável para o tratamento do resíduo industrial. A maioria das empresas convive com vazamentos de óleo em suas atividades corriqueiras, como durante a manutenção de máquinas ou transporte de óleo combustível. Um exemplo de uso de mantas de polipropileno é nos portos, que recebem navios com petróleo ou outros tipos de óleo combustível. Depois de os depósitos de óleo serem esvaziados, os petroleiros têm de ser limpos para receber nova carga de combustível. No processo de limpeza, muito óleo se espalha. É aí que entram as mantas, uma espécie de cobertor macio com alto poder absorvente, que é jogado sobre o óleo derramado. Depois de sujas de óleo, as mantas tornam-se inflamáveis e são consideradas como resíduo classe I (perigoso). O material contaminado exige um descarte criterioso, e, normalmente, caro. O destino mais comum atualmente é a incineração, a um custo médio de R$ 500 por tonelada. “As cimenteiras usam as mantas encharcadas de óleo como combustível alternativo para alimentar grandes fornos, mas cobram por isso”, conta Lago. “Quem usa a manta tem então dois problemas: o alto custo das mantas, que não podem ser reaproveitadas, e o descarte caro”, diz ele. Para remover o óleo das mantas de polipropileno, os pesquisadores da UFMG utilizam a tecnologia de extração com fluido supercrítico (SPC). O CO2 é submetido à temperatura e pressão acima de seu ponto crítico. Nessas condições, o fluido possui propriedades de líquido e gás, simultaneamente, aumentando o poder solvente do CO2, que remove todo o óleo. Depois do processo de extração SPC, as mantas podem ser reutilizadas. Além disso, o óleo extraído é enviado para novo processo de refino. “Nessa tecnologia, parte do custo investido para limpar as mantas pode ser recuperado com a revenda das mantas e do óleo. Além disso, ao fim do processo, o CO2 volta ao estado gasoso e pode ser reutilizado”, explica o pesquisador. “Uma alternativa para reutilização das mantas limpas, que já está sendo testada por uma empresa parceira dos pesquisadores, é a confecção de barreiras de contenção de óleo em forma de bisnagas”, conta Aline Oliveira, que participa da pesquisa. MAIS SEGURANÇA Existe atualmente uma tecnologia disponível para remover o óleo das mantas. A limpeza é feita com solventes orgânicos como acetona e benzeno. A desvantagem é que essa técnica deixa resíduos nas mantas. A separação entre o produto extraído e esses solventes orgânicos é um dos grandes problemas desse tipo de extração. Há também o problema do descarte do solvente que é tóxico e inflamável. Além disso, a extração com os solventes industriais exige temperaturas mais altas, em geral acima de 50 ºC, o que demanda alto consumo de energia. 96 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Recuperação de mantas de Polipropileno
Pesquisadores desenvolvem pó com nanopartículas magnéticas Tecnologia tem aplicações ambientais, industriais e médicas Mantas limpas prontas para reutilização
Mantas sujas Reator
Segundo Rochel Lago, na tecnologia com CO2 supercrítico o processamento é feito a baixas temperaturas, entre 30º C e 40º C, o que significa baixo custo energético e maior segurança. O processo também não deixa resíduos de solvente nas mantas e permite a recuperação do gás carbônico usado na remoção do óleo.
Um pó formado com nanopartículas com características magnéticas, recobertas por estruturas de carbono: esse o resultado da pesquisa desenvolvida por Maria Helena Araújo, Rochel Montero Lago e Juliana Cristina Tristão, do Departamento de Química da UFMG. As principais características do produto são o processo simplificado de fabricação e o baixo custo. Essas nanopartículas são nanoestruturas de ferro ou magnetita que são atraídas por ímã, podendo assim ser facilmente manipuladas. O pó magnético poderá ter aplicações nas áreas de catálise industrial, médica e ambiental.
REVERTENDO IMPACTO AMBIENTAL O fluido supercrítico já é utilizado na indústria alimentícia na descafeinação do café solúvel, na extração de óleos essenciais e substâncias aromáticas, mas a aplicação para remoção de resíduos oleosos é inédita. Após a conclusão do protótipo laboratorial, os pesquisadores devem levar a tecnologia para uma escala maior e prosseguir com os testes. Uma planta piloto será construída em parceria com a Verti Ecotecnologias, empresa nascente de base tecnológica voltada para o desenvolvimento de soluções alternativas para o descarte, incineração e coprocessamento de resíduos. A empresa tem experiência em escalonamentos pré-piloto e piloto, até a instalação da solução em escala industrial. Outra possibilidade é criar uma spin-off para prestar serviço de remoção de óleo de mantas. Os clientes potenciais da tecnologia são as indústrias que utilizam as mantas ou, ainda, empresas distribuidoras que poderiam adquirir as mantas por um preço inferior e utilizá-las para confeccionar, por exemplo, barreiras de contenção utilizadas em caso de derramamento de óleo no mar. Equipe: D epartamento de Química Aline Almeida da Silva Oliveira | E-mail: alinealmeida@ufmg.br Rochel Montero Lago | E-mail: rochel@ufmg.br 98 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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Por meio de manipulação em laboratório, as nanopartículas magnéticas – de ferro ou de magnetita – são recobertas com nanotubos de carbono, formando uma espécie de invólucro. Além de preservar as características magnéticas da nanopartícula, o carbono também pode se ligar a diversas substâncias, como metais, catalisadores, polímeros e compostos orgânicos. Essa característica permite, por exemplo, aplicações na área médica. As nanopartículas podem ser carregadoras de medicamentos dentro do organismo. REMOÇÃO DE CONTAMINANTES Um dos usos do pó magnético, associado a outros materiais, é como adsorvente para remoção de contaminantes. Na adsorção, as moléculas de uma substância se fixam à superfície de outra substância. O carbono é um ótimo adsorvente. Quando certas substâncias químicas passam próximas às nanoestruturas de carbono, unem-se a essa superfície e são aprisionadas.
Mundo pequeno, grandes descobertas Tida como tecnologia revolucionária, a nanotecnologia manipula materiais em escala nanométrica – um nanômetro equivale a um bilionésimo do metro. Uma exploração de materiais nesse nível permite descobrir propriedades que seriam inacessíveis em escala maior. A nanotecnologia tem gerado inovações em medicina, eletrônica, biologia, ciência da computação, física, química e engenharia de materiais.
Um exemplo de material que está sendo testado por esse grupo de pesquisa é a vermiculita, um mineral abundante no Brasil. Quando aquecida, a vermiculita libera água e adquire o aspecto de uma estrutura sanfonada e leve, parecida com uma esponja que flutua na água. Por conta disso, pensou-se em usar a vermiculita em sistemas de contenção de óleo derramado no mar. “O problema é que ela absorve mais água do que óleo”, conta Lago, um dos pesquisadores do projeto. Segundo ele, várias pesquisas têm buscado aumentar a chamada hidrofobicidade da vermiculita, isto é, tratar este material de forma que ele não retenha água. “Nós conseguimos um bom resultado depositando uma pequena parte deste pó magnético na superfície da vermiculita. Com isso, a capacidade de absorção de óleo aumenta em 10 vezes e a de água cai quase para zero”, ressalta. Outro uso na área ambiental que está sendo testado na UFMG é o uso do pó como adsorvente magnético de contaminantes como o clorobenzeno. Utilizado na fabricação de pesticidas, corantes e borracha, o clorobenzeno é um líquido incolor, altamente inflamável. O composto tóxico está associado a uma série de problemas de saúde, como anemia, lesões na pele, vômitos, dores de cabeça, irritações nos olhos, garganta e pulmões, câncer, disfunções dos sistemas hormonal, endometriose e efeitos no desenvolvimento de crianças e do feto. O clorobenzeno é classificado como um dos Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs). Os POPs são as substâncias mais perigosas já produzidas pelo homem, porque são bioacumulativas e persistem por muito tempo no meio ambiente – daí a importância de se desenvolver tecnologias eficientes de manipulação e descarte dessa substância. 100 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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CATÁLISE O mercado inicial para as nanopartículas recobertas de carbono é seu uso como base para catalisadores, materiais usados para acelerar reações químicas. Esse produto, na forma de pó, já pode ser utilizado em escala industrial. “Precisamos apenas de um ímã para removê-lo do leito da reação”, explica Tristão. Um dos grandes atrativos para investimento nesse projeto é sua demanda por equipamentos e matérias-primas simples como etanol, metano e óxidos
Tirando o pó Para cada 100 litros de biodiesel são produzidos 10 litros de glicerina muito suja. Por conta da necessidade de purificação, essa glicerina é tratada como resíduo com descarte oneroso para os produtores de biodiesel. “Utilizando a tecnologia desenvolvida na UFMG é possível transformar a glicerina em supressor de poeira”, explica Rochel Montero Lago. O transporte do minério de ferro da região de Belo Horizonte para o Espírito Santo é feito por trens. Sem proteção cobrindo os vagões, o vento arrasta boa parte do minério. “Além do problema econômico, existe o problema ambiental, uma vez que a poeira pode incomodar muita gente. Nós fizemos testes nos quais o pó com nanopartículas é adicionado à glicerina. A intenção é usá-la para recobrir o minério de ferro, diminuindo a dispersão provocada pelo vento, mas sem interferir na composição desse minério”, acrescenta Lago. A tecnologia pode substituir material importado hoje para essa operação.
de ferro. Já foi feito pedido de patente da tecnologia ao INPI. Levantamentos na área não encontraram concorrentes diretos para o novo produto, e catalisadores disponíveis no mercado têm desempenho inferior. As nanopartículas apresentam melhor desempenho devido ao aumento da área de reação. Um grama do pó magnético com nanopartículas tem capacidade de reação até dez vezes maior que um grama de carvão ativado, produto usado pelas indústrias hoje. Outra vantagem é que, após a reação, as nanopartículas podem ser recuperadas magneticamente, usando ímãs para reutilização. O grupo de pesquisa planeja criar uma spin-off para comercializar o pó com nanopartículas. A planta piloto será construída na Verti Ecotecnologias, empresa de pesquisa e desenvolvimento na área ambiental. “A prova de conceito, realizada por meio desse piloto, é fundamental porque dá uma ideia dos custos operacionais, se o produto testado em laboratório vai funcionar em escala maior, ou como será o processo contínuo”, acredita Lago. Outro parceiro na área de pesquisas e comercialização é a empresa Nanum, spin-off da UFMG especializada em nanotecnologia. A indústria de química fina e de metais nobres é visualizada como primeira oportunidade para mercados potenciais para o novo produto.
Equipe: J uliana Cristina Tristão Maria Helena Araújo Rochel Montero Lago | E-mail: rochel@ufmg.br ou rochellago@yahoo.com.br 102 programa de INCENTIVO À inovaçÃO
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