Carlos Calado
21. A BOMBA DESATIVADA “É como a química de uma bomba de hidrogênio: faltando algum dos elementos, ela não explode mais.” Comentando sua parceria musical com Arnaldo e Rita, mais de vinte anos após a separação dos três, Sérgio Dias usa uma analogia que se aplica perfeitamente aos cinco últimos anos da banda. Sem Rita e Arnaldo, os Mutantes ainda viveram momentos de razoável popularidade, mas o impacto musical do grupo nunca mais foi o mesmo. Se a saída de Rita significou o abandono do humor e do deboche, sem Arnaldo a banda também perdeu em carisma e nas letras. Apesar de sua declarada vocação de acompanhante (“mais pra índio do que cacique”, dizia), ao perder os velhos parceiros Sérgio foi obrigado a assumir pela primeira vez o papel de líder. Achava que se a “filosofia” da banda fosse mantida, atitude que passava necessariamente pelas experiências com o LSD, a música dos Mutantes poderia continuar viva, mesmo feita por outros músicos. Superado o choque inicial da saída de Arnaldo, a solução encontrada por Sérgio, Liminha e Dinho foi tentar substituí-lo por Manito. Ex-The Clevers e Os Incríveis, ele era um músico virtuose e bastante experiente, que além dos teclados também tocava três tipos de saxofone, flauta, bateria e violino. Manito chegou a fazer alguns shows com a banda, mas por mais que brilhasse como instrumentista, não tinha as ideias e sacadas de Arnaldo. Na verdade, não era o tipo de músico que os Mutantes estavam precisando. Depois de algumas semanas de convivência, ele mesmo desistiu da banda, amigavelmente. Preferiu continuar tocando com o Som Nosso de Cada Dia, outro popular grupo de rock progressivo de São Paulo, do qual já fazia parte. A saída de Manito precipitou os Mutantes em uma espécie de conexão carioca. Para a vaga novamente aberta, Sérgio convocou um pianista que acabara de conhecer no Rio de Janeiro: Túlio Mourão, um mineiro de Divinópolis, ex-aluna do erudito Instituto Villa-Lobos. Túlio tocava com o Veludo Elétrico, um grupo carioca de rock progressivo pelo qual passaram, curiosamente, outros futuros mutantes: o baterista Rui Motta, o guitarrista Paul de Castro e os baixistas Antônio Pedro e Fernando Gama. Mal começaram os ensaios com Túlio, a banda teve de enfrentar uma nova perda. Com um problema físico na mão direita, que não respondia direito a seus comandos, Dinho também entrou em crise pessoal e profissional. Desanimado, começou a questionar até se continuaria sendo músico e acabou saindo da banda. Foi a vez de Túlio sugerir o nome de Rui Motta, um fluminense de Niterói, que tinha tocado muito em bailes de subúrbio antes de mergulhar no rock carioca. Depois de passar por um teste, junto com alguns bateristas paulistas, ele foi oficializado na banda. As duas substituições aconteceram tão rápido que, na estreia da nova formação, em 26 de outubro de 73, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, os mais fanáticos pela banda tomaram um susto, por não encontrarem Arnaldo e Dinho. Ansioso pelo bom e velho rock & roll dos Mutantes, um público de quase 5 mil pessoas lotou o ginásio Cava do Bosque, mas não se animou com o novo material composto por Sérgio e Liminha: canções como Eu Sou Você, Cada Dia Pinta Um Louco Mais Louco do que Eu e Hare Krishna. Na verdade, Rui quase não tivera tempo de ensaiar com a banda e Túlio ainda nem estava com seus teclados — tocou apenas piano acústico. Por pouco os novos Mutantes não enfrentaram uma sonora vaia, como nos velhos tempos dos festivais. Passado o sufoco inicial, o quarteto conseguiu se entrosar rapidamente. Na primeira aparição da nova banda no Rio de Janeiro, no final desse ano, quase 3 mil fás 154