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Restauração do Cerrado
PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DOS VEADEIROS APROXIMA A SOCIEDADE DA CONSERVAÇÃO
Coordenação geral: Alexandre Bonesso Sampaio (Centro Nacional de Avaliação da Biodiversidade e de Pesquisa e Conservação do Cerrado - CBC/ICMBio). Coordenação executiva: Alba Cordeiro (Rede de Sementes do Cerrado). Gestão dos recursos e gerenciamento: Camila Motta (Rede de Sementes do Cerrado).
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Unidades de Conservação do Cerrado geralmente contam com áreas degradadas com histórico de pasto, onde a disseminação de gramíneas invasoras impede a regeneração natural e torna os incêndios mais severos. “O maior problema da restauração de áreas degradadas no Cerrado é a questão das gramíneas invasoras usadas como pastagem, como as braquiárias, que geralmente não são adequadamente controladas. Além disso, os esforços de restauração do Cerrado focam exclusivamente no plantio de árvores, sendo que a maior parte da biodiversidade do Cerrado está no estrato herbáceo-arbustivo. Associado a este problema, temos um baixo conhecimento e valorização das espécies herbáceo-arbustivas do Cerrado pelas pessoas em geral, o que favorece a conversão da vegetação nativa em atividades agropecuárias”, explica Alexandre Sampaio, analista ambiental do Centro Nacional de Avaliação da Biodiversidade e de Pesquisa e Conservação do Cerrado (CBC/ICMBio). Para colocar em prática um plano de restauração, que privilegiasse a vegetação herbáceo-arbustivo, onde está a maior parte da biodiversidade, gestores do ICMBio buscaram apoio nas parcerias de ensino e com a comunidade local. INSPIRAÇÃO
A visita técnica ao projeto Y Icatú Xingu em Canarana/MT, em 2015, que envolve a coleta de sementes por indígenas e a restauração das nascentes dos rios das Terras Indígenas localizadas em grandes propriedades do entorno. Em 2017, essa iniciativa foi premiada como o melhor projeto de restauração por votação dos participantes durante a conferência bianual da Sociedade de Restauração Ecológica (SER). A troca de experiências durante o evento e a premiação serviram de inspiração para continuar e ampliar o projeto.
PERFIL
Localizado no nordeste do estado de Goiás, entre os municípios de Alto Paraíso e Cavalcante, protege diversas formações vegetais, rochas com mais de um bilhão de anos, além de centenas de nascentes. Desde 2001, a unidade é reconhecida como Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco.
OBJETIVOS
Desenvolver técnicas de restauração com melhor custo benefício aplicáveis em larga escala para áreas degradadas do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros e entorno. Mobilizar a comunidade local durante a prática e estabelecer assim a aproximação com a equipe gestora da Unidade de Conservação.
RESULTADOS
ࡿ Desenvolvimento da técnica de semeadura direta para restauração de vegetações savânicas e florestais do Cerrado, incluindo 80 espécies entre árvores, arbustos e gramíneas nativas. Até o momento, o projeto conta com 105 hectares em processo de restauração, com 25 toneladas de sementes coletadas e semeadas.
ࡿ Rede de coletores de sementes estabelecida, mobilizada e organizada para fornecimento a outras regiões. Proprietários rurais mobilizados pela prática recuperaram áreas degradadas do entorno.
ࡿ 60 famílias de agricultores tradicionais beneficiadas. As comunidades locais receberam R$ 170 mil pelo trabalho de coleta e beneficiamento de sementes. Criação da Associação Cerrado de Pé de Coletores de Sementes. A Rede de Sementes do Cerrado permite que os coletores de forma autônoma disponibilizem sementes no mercado além dos limites da Chapada dos Veadeiros. ࡿ Ampliação de parcerias entre instituições locais, como UnB Cerrado, Secretarias de Educação e de Meio Ambiente da Prefeitura de Alto Paraíso, OCA Brasil, Associações de Assentamentos Rurais. O projeto foi tema de uma série de produções científicas, com nove pesquisas autorizadas, cinco trabalhos de mestrado e um de doutorado, além de diversos resumos de congresso e artigos em preparação.
METODOLOGIA
As equipes do parque e do Centro Nacional de Avaliação da Biodiversidade e de Pesquisa e Conservação do Cerrado (CBC/ICMBio) trabalharam em conjunto na elaboração e execução do projeto. A prática teve início como projeto de pesquisa no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (PNCV) com financiamento do ICMBio em 2011. Pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e da Universidade de Brasília (UnB) realizaram as primeiras experiências de restauração e os treinamentos com os coletores de sementes. A iniciativa recebeu apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e da Rede de Sementes do Cerrado, por meio de projeto apoiado pela Petrobras Ambiental.
Durante o estudo, os pesquisadores desenvolveram técnica de restauração por semeadura direta, que possibilita substituir a cobertura de gramíneas exóticas por espécies nativas do estrato herbáceo-arbustivo do Cerrado, o que aumenta a possibilidade de sucesso em longo prazo. Em seis meses, espécies do estrato herbáceo-arbustivo já florescem e frutificam atraindo a fauna nativa de polinizadores e dispersores. O custo da semeadura de 80 espécies nativas de árvores, arbustos e ervas, com aproximadamente 200kg de sementes por hectare, produzindo cobertura de até 50% de gramíneas nativas e em torno de aproximadamente 6.000 plântulas de árvores, palmeiras, arbustos e trepadeiras/ha é pelo menos a metade do custo de plantar 1.111 mudas/ha de árvores produzidas por sementes e espécies de outros locais. A restauração das áreas aumentou a biodiversidade local em todos os estratos e contribui para o restabelecimento do regime natural de fogo, já que as gramíneas exóticas alteram esse equilíbrio e tornam assim os incêndios mais severos em comparação com aqueles que ocorrem na vegetação nativa. Em 2015, o desmatamento para construção da linha de transmissão de energia que liga Araraquara/SP a Porto Velho/RO teve entre as medidas compensatórias, a reposição florestal nativa no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Por interferência do ICMBio, a ação foi realizada com as técnicas desenvolvidas no projeto de pesquisa, priorizando mão de obra local para coleta, preparo do solo e plantio das sementes.
O trabalho das comunidades locais é essencial já que a técnica depende da coleta de grande volume de semente e beneficiamento. Para os moradores,
a atividade é uma alternativa de renda sustentável que valoriza as plantas do Cerrado, garante mais autonomia aos agricultores e diminui a dependência dos serviços prestados ao agronegócio. Cerca de 30 voluntários também participaram da iniciativa. Anualmente, o projeto é avaliado e planejado pela equipe gestora da unidade.
PERÍODO
Novembro de 2011 – em andamento.
PARCEIROS DO PROJETO
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); Universidade de Brasília (UnB); Rede de Sementes do Cerrado; Associação Cerrado de Pé; Pequi - Pesquisa e Conservação do Cerrado; Norte Brasil Transmissão de Energia.
Foto: Amalia Robredo
INSPIRE-SE!
ࡿ Conheça o Guia de Restauração do Cerrado, volume 1 – Semeadura Direta, que aborda desde a escolha do método até monitoramento, incluindo resultados de experimentos. http://bit.ly/guiasemeaduradireta ࡿ Ações de pesquisa também podem agregar além dos pesquisadores, outros parceiros, como a comunidade local, reforçando assim a conexão entre os atores sociais. Estimular a participação de comunidades locais contribui para a disseminação da cultura de preservação de espécies nativas. ࡿ Restaurar áreas degradadas além dos benefícios evidentes ao ecossistema é ainda uma excelente oportunidade para sensibilizar as pessoas sobre a importância de ações que contribuam com o propósito das áreas protegidas. ࡿ Priorizar a mão de obra local em ações de conservação permite favorecer o desenvolvimento regional, por meio da remuneração, além de estimular um novo olhar para o bioma local.
Foto: Fernando Tatsgiba