9 minute read

PÍLULAS DO FUTURO - __________________________________ Marta Ferreira

PÍLULAS DO FUTURO

Marta Ferreira

Advertisement

Ilustração; Ana Beatriz Salvino

PÍLULAS DO FUTURO

Marta Ferreira

Zélia, filha de Raimundo Félix e Maria constantina, nasceu no dia 28/04/1956, em uma situação muito delicada, sua mãe estava prestes a perder sua filha no parto, e resolveram chamar uma grande parteira de sua região, então mesmo em meio uma gravidez de risco, ela nasceu, destinada a uma vida sofrida e cheia de lutas e muitas vitórias. A bela criança, tinha cabelos pretos reluzentes, como era de se esperar, seu nascimento trouxe muitas alegrias para família, Constantina fez uma grande festa para comemorar a vida da sua filha. No dia da festa, Zélia vestia um vestido branco de boneca, feito por sua mãe, Constantina, tinha muitos talentos e a costura era um deles, solicitada por amigos e familiares, e assim Zélia, foi apresentada com sua roupa de boneca, no ano seguinte, nasceu o irmão de Zélia, e mais uma festa e comemorações, a vida era boa, Constantina forte e uma casa feliz.

Zélia por ser a primeira filha e ter tido complicações no parto, eles tinham um cuidado com ela, e quando nasceu o próximo irmão dela, a atenção com Zélia, foi diminuindo, já se passaram três anos, nasceu outro filho, já o segundo irmãozinho.

Zélia costumava pegar as bonecas de pano que constantina sua mãe fazia, e dava para ela brincar, mas com a idade de 3 aninhos, ela já queria brincar com seus irmãozinhos, um dia Zélia pegou seu irmãozinho, Osvaldo que foi o segundo que nasceu,e foi brincar de banhar ele.e foi no banheiro que ficava no quintal da casa, e pegou uma água que estava numa cuia no chão perto da tina que ficava no canto do banheiro.

Mas Constantina esqueceu ter um penico com xixi no banheiro. Aí já se pode imaginar né o que aconteceu, ela pegou o xixi e levou para banhar seu irmãozinho por que viu sua mãe banhar Osvaldinho.

Constantina vendo Osvaldinho chorar veio correndo e quando chegou, viu que a criança estava na rede molhado e chorando seus olhinhos arregalados e Constantina olhou para Zélia com um copo pequeno na mão, mas não acreditava que ela teria feito algo com seu irmão, mas ela toda feliz foi novamente lá no banheiro buscar mais água para ajudar a mamãe banhar Osvaldinho, aí a mãe viu que ela tava trazendo o xixi que estava no penico lá no banheiro que estava perto da tina de cimento no canto esquerdo da porta, e a Zélia era tão travessa mesmo tendo só três aninhos, que tinha visto como banhava seu irmão, aí nunca mais deixava ela sozinha com ele por medo de ela brincar com ele achando ser um boneco.

Zélia já estava crescendo um pouco e já ia ajudar o seu pai tirar leite das vacas para trazer pros seus irmãozinhos também.

Ela adorava beber leite" mugido", isso deixava ela muito feliz e ela dizia querer ficar forte, os anos se passando e Zélia vendo seu irmãozinho de cor diferente, ela foi tirar o leite com seu pai, e quando o seu pai terminou de tirar o leite ele foi soltar os bezerros, e quando voltou se separou com uma cena inusitada, ele viu Zélia no balde de leite, ele gritou e perguntou a ela o que era aquilo, por que ela estava fazendo aquilo, ela falou — papai quero ficar da cor do meu irmãozinho e seu pai perguntou porquê você quer ser como ele? E ela respondeu a ele; “papai é por que na escola eles brincam com ele e abraçam ele, e ninguém gosta de mim Zélia começou a chorar, disse, porque eu não sou da cor dele e começou novamente a chorar, e seu pai não teve outra reação a não ser pegar ela naquele momento e abraçá-la, por conta da dor que ela estava sentindo naquele momento ela, não tinha lhe falado nada, então ele abraçou ela e levou ela para casa, E falou o que ela não tinha nada de diferente para se culpar pela sua cor.

A menina na sua inocência, pergunta ao seu pai; papai, se eu tomar bastante leite, eu fico da cor do meu irmãozinho? Seu pai chorou muito abraçado com ela, e resolveu tomar atitudes sobre o assunto. Raimundo Félix, foi na fazenda vizinha, falou com outros fazendeiros e resolveram a construir uma escolinha para os filhos dos fazendeiros para não precisar ir tão longe estudar. E assim aconteceu, que logo a notícia se espalhou na região, e eles ficaram felizes por aprender um ensino de qualidade e respeito. As coisas foram evoluindo e compraram uma tv preto e branco e por muitos anos eles ficaram assistindo com muita alegria aquelas novelas da época, filmes Mas ali todos eram iguais, não tinha branco nem preto naquela tv. Os anos passavam e constantina falou que tinha chegado na cidade uma tela colorida que ia mudar o modo de ver a tv preto e branco, então foram à cidade comprar essa tela para colocar na tv, aí a alegria mudou tudo, era gente de toda cor, A alegria invadia grandes e pequenos. Zélia já estava grandinho e foi vendo que a cor não é motivo para ser diferente, ela começou a se aceitar do jeitinho que ela era e assim ela não via mais diferença entre ela e seu irmãozinho, porque na escola todos eram iguais.

No ano seguinte, Zélia estava prestes a ganhar outro irmãozinho, esse era o último da família, nasceu forte saudável, mas logo depois seu nascimento, ele adoeceu ficou muito debilitado porque constantina não tinha leite o suficiente para amamentar. Mas mesmo assim ele venceu e se criou saudável. Passaram-se mais três anos, constantina adoeceu, Zélia era uma menina Negra, magrinha, usava vestidos de chita, andava descalça e descabelada. E andava sempre com sua boneca de pano que sua mãe fez. O nome da boneca era sol. Zélia continuava sua rotina de ir tirar o leite das vacas, mas agora levava seu irmão Osvaldo, e lhe ensinava a tirar o leite e levar para casa para seus irmãos. Logo depois Zélia foi até a casa da curandeira, em busca de raízes para fazer chá para sua mãe, ao chegar em casa, Constantina já muito cansada não aguentava mais levantar para cuidas dos filhos. Seu marido Raimundo Félix, ia cortar a lenha para fazer o fogo e fazer a comida para família, Zélia pediu à seu pai para fazer o remédio para sua mãe e logo depois ela deu o chá para constantina.assim foi passando os tempos e constantina não tinha mais forças, já na idade de adolescente,

Zélia falou para sua mãe que ela não se preocupasse, ficasse boa logo que ela nunca ia lhe dá trabalho, ia cuidar de tudo até ela ficar boa. Mas logo depois de Zélia prometer tudo a sua mãe, ela foi dormir e não mais acordou, seus irmãos e ela mesmo chorando inconsolavelmente diante de sua mãe morta. Zélia não teve mais alegrias, precisou amadurecer, teve que cuidar de seus irmãos e seu pai. E o tempo foi passando e Zélia se tornou uma espécie de mãe de seus irmãos, viu eles crescerem e cuidar de suas vidas, suas primeiras namoradas, chafurdos, brigas de namoradas, a vida ir indo. Seu irmão Valfrido, conheceu uma moça pelas redondezas,o nome dela era Maria,conhecida como Mariquinha Começou a namorar e logo depois casou-se logo também por que ele disse que já tinha virado adulto apesar da pouca idade, e foi um orgulho para todos, trabalhava duro na roça e a vida continuava, Zélia acordava cedo ia pra sua rotina e logo depois levava seus irmãos até a escola que ficava próximo.

Um dia lembrando de sua mãe, resolveu sentar numa cadeira na máquina antiga e tentou remendar o calção de um de seus irmãos, e começou ali um novo ofício que a ajudou a manter sua família, apesar de ainda pequena para a idade, sempre conseguiu fazer tudo que se propunha, pediu ajuda ao pai que ajudou da forma que soube, ela aprendeu o novo ofício e foi ensinando Neusa e Vilma a cuidar da casa.

Ensinou Olavo a cortar a lenha e fazer o fogo, e Stela a debulhar milho, colocar de molho e depois moer e fazer o cuscuz, deu a cada um de seus irmãos uma tarefa, sem atrapalhar os seus ensinos da escola.

Zélia sempre se preocupou com seus irmãos menores, já fazia o papel de mãe deles.

O tempo foi passando e seus irmãos crescendo e cada um tomando seu rumo,

Osvaldo, era o encostado de Zélia, casou-se com a Mundica, que era filha de uma das professoras que ensinava na escola, eles estudavam juntos, começou tudo em uma grande amizade, era a melhor amiga de Zélia, e teve o apoio dela para o casamento, se sentia muito orgulhosa de seus irmãos. Olavo, esse foi para São Paulo,morar com os tios ainda jovem, esse não dava muitas notícias, quando resolveu mandar notícias, foi pra dizer que já era casado e tinha 5 filhos

Zélia então resolveu casar, com um aluno da escola também onde eles estudavam, José Francisco, era o nome do seu marido, um jovem tão magro e bem alto! branco, (olhos) cor de mel, só andava bem-vestido usava chinelas de sola, chapéu de couro, e tinha um jumento que era seu transporte, o Celestino.

Um jumento muito bonito, gordo andava com ele sempre selado.

Então Zélia resolveu casar, mas não deixou seu pai sozinho, eles fizeram uma casa de taipa ao lado da casa grande, só assim ela continuava cuidando de tudo.

Seu esposa e pai, eram bons amigos, proseiam muito o tempo todo, até quando estavam trabalhando na roça e tirando leite, Zélia teve o prazer de acompanhar a vida de todos que estavam ao seu redor.

Neusa, a irmã do meio, casou-se com um caboclo bem mais velho que ela, ele era negro, alto, canela-fina usava sempre um calção preto e uma blusa verde, até parecia que só tinha ela, e ainda andava descalço, seus irmãos chamava ele de uma roupa só, e ela ficava envergonhada porque ele só tinha 2 roupas, mais uma era para ele sair para outros cantos mais importante, casou e teve muitos filhos. Vilma, a outra irmã de Zélia também casou-se, mas essa teve mais um pouco de sorte, seu noivo era filho do dono da vendinha, conhecido como Zeca, esse era o nome do dono da venda o marido de Vilma era chamado Zequinha da bicicleta, ela dizia que ele era rico, pois ele tinha uma bicicleta preta, e um par de bota de vaqueiro, se exibindo com as botas dele em cima da bicicleta, chamava muita atenção de todos, a vida foi acontecendo, e essa foi a vida de Zélia, uma mulher negra, em um tempo que as mulheres não tinham muitos sonhos, a realidade lhe fez mãe de seus irmãos e a vida lhe trouxe dores, mas também algum amor.

Apesar de tudo ter ocorrido dessa forma, Zélia parou e olhou para o futuro e percebeu que todos os seus filhos e filhas estavam vivos e construindo suas vida, apesar de se sentir sozinha, ela desejou a felicidades de todos e pensou que sempre pode ser melhor, que o futuro é um exercício diário, construído por alguma divindade para fazer nossas certezas mudar.

59

This article is from: