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COMPORTAMENTO

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LOCAIS

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No nosso dia a dia, nos habituamos a, em um ambiente cheio de pessoas, agir como se estivéssemos sozinhos. O antropólogo Erving Goffman chama esse efeito de desatenção civil. Em uma troca de olhares, “[...] uma pessoa dá a outra um aviso visual suficiente para demonstrar que ela compreende que a outra está presente (e que admite abertamente tê-la visto), e no próximo momento ela retira sua atenção para expressar que a segunda não constitui um alvo de curiosidade ou intenção especial”. Nos banheiros públicos masculinos, esse processo se dá de uma maneira muito cuidadosa, afinal, o olhar pode incitar uma forma de desejo e a masculinidade, que é frágil, evita qualquer tipo de contato com outros homens dentro desses espaços. E é neste mar de desencontros de olhares que os praticantes estabelecem contato, e a partir dessa “atenção civil” a aproximação acontece.

Todo o ato se resolve no olhar, na linguagem corporal e nos sinais que os corpos emitem, tudo sem emitirem uma palavra. O silêncio pode ser considerado um marco de uma ausência, mas, dentro de um banheiro, ele é uma presença constante de uma “normalidade” instaurada neste ambiente tão íntimo e ao mesmo tempo compartilhado. Dentro das práticas entre homens em banheiros públicos, o silêncio é fundamental para manter a fachada de naturalidade enquanto esses atos velados acontecem.

7 GOFFMAN, Erving. Comportamento em Lugares Públicos. Rio de Janeiro: Vozes, 2010.

O sexo, como um ato que grita, só se relaciona com o silêncio quando o tratamos com repressão, e a repressão funciona, decerto, como condenação ao desaparecimento; o que não deve ser visto nem ouvido ocupa lugares de quietude e desaparece aos olhos da “normalidade”. Desse modo, a visão e a audição abrem caminho para um outro sentido, o tato.

Existem algumas condições que fazem certos banheiros e vestiários abrigarem práticas sexuais entre homens. Talvez o mais importante seja o fato desses lugares se localizarem em regiões muito movimentadas com uma rotatividade intensa de pessoas que frequentam objetivamente e permanecem por curtos períodos. Os usuários do banheiro que desejam apenas aliviarem suas necessidades fisiológicas, geralmente não abrem seus olhares para perceberem os homens que estão ao seu redor e o que fazem, apenas compreendem a presença do outro – através da atenção civil – e ao atingirem seu objetivo, saem do espaço sem perceber que algo poderia estar se acontecendo. Dessa forma, os adeptos à pegação conseguem facilmente fingir “normalidade”, ao passar bastante tempo lavando as mãos, penteando o cabelo, de pé em frente ao mictório, ou de prontidão dentro das cabines, enquanto aguardam o momento certo para (re)começarem suas práticas. Aqui, o papel do olheiro é importante pois assegura que as práticas aconteçam sem interrupções da “normalidade” do lugar. Banheiros de redes de fast-food e rodoviárias são ótimos exemplos que permitem esses encontros rápidos e invisíveis ao constante movimento de pessoas. Esses longos gestos de fachada, aliados ao olhar e ao silêncio, são as principais regras de como se comportar no banheirão.

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