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INTERSEÇÕES
Após a análise desses dois espaços, o banheiro e o Grindr, podemos perceber que ambos permitem visões espaciais que filtram o real e o que é normatizado. Resumidamente, no caso dos banheirões, a subversão ocorre ao ocupar o espaço com um uso que além de ser diferente do proposto, é uma prática que não é bem vista, principalmente entre pessoas do mesmo sexo. As práticas acontecem de forma rápida e momentânea. Diferentes ao que é proposto, não são alheias ao real, elas se apresentam como simultâneas e sobrepostas. A potência de subversão que o lugar tem, se instala no espaço através das brechas coexistindo com o uso comum do ambiente. Podemos considerar assim, a prática do banheirão como uma prótese ao banheiro: algo que não é originário dali, mas que se acopla e possibilita uma nova forma de utilizar o local.
No caso do Grindr, a plataforma virtual já é preparada para possibilitar esses encontros sexuais a partir de um filtro voluntário do espaço real, porém possui um contexto curioso. Ao considerarmos que ela é uma prótese do nosso corpo, podemos afirmar que ela também é o nosso corpo. As relações que se estabelecem dentro do aplicativo, não são menos reais do que face a face, apenas de outra natureza. O espaço em que o Grindr opera então, não é o espaço da interface do aplicativo, e sim o campo real em que o corpo vaga rotineiramente. Por se tratarem de locais públicos, o compartilhamento do estar é presente, porém em contextos diferentes. No caso dos banheiros, vimos que o efeito da desatenção civil faz com que esse reconhecimento de corpos seja mínimo possível. Já os praticantes do banheirão, partem da máxima explicitação de seu interesse para os corpos favoráveis a receber esses sinais dentro de condições e configurações espaciais variáveis.
No aplicativo, a exposição é total, mas de forma selecionada pelo usuário. Em um contexto onde muitos procuram as mesmas coisas, existe uma vontade de se destacar em meio a essa totalidade de possibilidades. Porém em contrapartida à essa superexposição, o interesse é volátil:
“Na sociedade expositiva cada sujeito é seu próprio objeto-propaganda; tudo se mensura em seu valor expositivo. A sociedade exposta é uma sociedade pornográfica; tudo está voltado para fora, desvelado, despido, desnudo, exposto. O excesso de exposição transforma tudo em mercadoria que está à mercê da corrosão imediata, sem qualquer mistério”
Em ambos os espaços, todos se veem e estão cientes de suas presenças, dependendo do interesse e do desejo dos indivíduos para partirem da visão para o tato. E quando os contatos são estabelecidos, as práticas são veladas e acontecem “fora” dessa exibição dos corpos.
Outra semelhança entre os dois modos de relações sexuais, é a impossibilidade de apontar especificamente a localização de seus agentes. As práticas em banheiros acontecem geralmente de forma espontânea a partir do desejo de um indivíduo à outro(s). Não é possível indicar o ponto geográfico dessas práticas, quando elas são mapeadas, já terminaram. O Grindr por outro lado, apesar de disponibilizar a distância na qual outro usuário se encontra, não determina a sua posição em um mapa, logo, sua localização pode se encontrar na distância dada, em qualquer direção partindo de onde se está.
20 HAN, Byung-Chul. Sociedade da transparência. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.