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2.5 Do conhecimento do defloramento pela família
más companhias, e quantas vergonhas e desgraças tem entrado pela casa por descuido e facilidade dos pais! seja a vigilância christã o cordão sanitário que preserve o sanctuario doméstico do flagello da immoralidade, de todas as pestes a mais temerosa”103 .
Em sua maioria, as mães das meninas dos processos-crimes de defloramento trabalhavam realizando serviços domésticos. Elas eram lavadeiras, engomadeiras, costureiras, lavradoras. Os poucos pais que aparecem nos processos eram empregados no serviço terciário e lavradores. Em condições melhores viviam os tutores das menores, que tinham profissões ligadas ao serviço público ou eram pequenos comerciantes. Portanto, essas pessoas trabalhavam, não podendo exercer uma vigilância mais estreita em relação ao comportamento de seus filhos e/ou tutelados.
As meninas viviam em pequenas casas ou quartos alugados, em vilas, cortiços e área dos bairros periféricos da cidade, em que a proximidade dos pequenos cômodos e casas era a marca. Transitavam frequentemente no espaço da rua, trabalhando, vendendo frutas, levando recados, roupas, saindo para comprar pão, o que lhes possibilitava criar mais oportunidades de conhecer pessoas e ter maior liberdade para marcar encontros amorosos. Todas essas situações apontam para os motivos que nos ajudam a entender a flexibilidade do comportamento das menores e da vigilância de seus pais e/ou responsáveis.
2.5 Do conhecimento do defloramento pela família
Muitas vezes, após saber da relação da filha com um namorado, e da ocorrência da primeira relação sexual, os país e/ou tutores da menor não procuravam imediatamente as chefaturas de polícia como estratégia para restabelecer a relação da filha com o ofensor. A mãe de Odina diz, em seu depoimento, que não levou o fato do defloramento da filha “À polícia a mais tempo porque supunha poder de alguma forma Arlindo fazer o casamento sem que o facto fosse levado ao conhecimento das autoridades”104. A mãe de Maria de Nazareth, de 18 anos, ao perceber que a filha “não tivera mais o incômodo” e que ela abortara um filho de seu vizinho, foi até este: “Que promettera reparar
103 Costa, Macedo Antonio. Deveres da Família. Escola Salesiana, Niterói. 1906. 104 Ver Processo-crime n° 46.
o mal, por isso não trouxe o facto à polícia a mais tempo. Como elle declarara ultimamente não fazê-lo ella trouxe o caso à polícia”105 .
Poder evitar os aborrecimentos e a demora de um processo de defloramento, correndo o risco dele não ser julgado ou possa parecer improcedente, passar pelos incômodos da publicidade referente ao defloramento, realizar o exame de corpo de delito, ter que passar pelas inevitáveis avaliações de hábito e comportamento da menor e de sua família: todas essas são questões que fizeram com que o responsável pela menor buscasse esgotar os diversos mecanismos fora da esfera da justiça para resolver esses dramas de amor. Tomar a decisão de ir à justiça parece ser, na maior parte dos casos, antecedida de conversas, ameaças e pressão de amigos e conhecidos dos réus em relação ao mesmo, particularmente quando esse e a menor ofendida são pessoas conhecidas em um cortiço, um conjunto de casas, uma vila, ou de velhos conhecidos. A feita de um acordo, a fuga do réu ou suanegativa em casar-se, faz com que a chefatura de polícia seja o último recurso a ser buscado, para manterem uma relação de namoro que resultou em defloramento, por parte dos pais das menores.
A tomada da decisão de denunciar o defloramento à polícia geralmente também só era feita naqueles casos em que a menor ficava grávida. Os parentes de uma maneira geral não se mobilizavam com relação ao conhecimento da situação de amasiamento da menor, da realização de cópulas carnais ou de encontros a sós com seus namorados. Mas, se a menina engravidava, as pressões se faziam presentes, não para que necessariamente se realizasse o casamento, mas para que o amante não fugisse e assumisse a relação com a menor, passando ou continuando a viver com a mesma, mesmo que fosse amasiado, “Para que esta não caísse na prostituição”, como disse o pai de Maria de Nazareth, ao justificar o motivo pelo qual queria o casamento da filha106 .
Permitir a moradia de homens jovens e solteiros em suas casas, convivendo com as filhas solteiras; dormir durante os encontros do casal na casa; não levar a queixa imediatamente à polícia, buscando resolver o conflito através de outros caminhos; aceitar, embora muitas vezes sem preferir, o amasiamento da filha; permitir que as filhas andassem a sós na rua e que fossem dormir em casa de amigas; saber que a filha não era mais virgem e nem por isso
105 Ver Processo-crime n° 53. 106 Ver Processo-crime n° 53.