EDITORIAIS: Politicagem e violência FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAIS editoriais@grupofolha.com.br 08/10/2016 às 02h00
Com quase 60 mil homicídios ao ano, o Brasil é o país com o maior número absoluto desse crime no mundo. Apesar desse recorde aviltante, sucessivas administrações federais têm-se mostrado pouco empenhadas em coordenar uma estratégia nacional a fim de reverter a escalada da violência. O governo de Michel Temer (PMDB) mal começou e já parece se enquadrar na regra do descaso. Em julho, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que o Ministério da Justiça apresentasse em 60 dias um plano de ação para implantar o Programa Nacional de Redução de Homicídios. O prazo terminou, mas nada se fez. Elaborada no ano passado na forma de um pacto, a proposta evocada pelo TCU contou com a participação de especialistas e previa a colaboração dos governos estaduais, legalmente responsáveis diretos pela segurança pública. Entre as iniciativas estavam ações preventivas voltadas a jovens negros (maiores vítimas de homicídio), melhoria de estatísticas e aprimoramento da investigação. As medidas não saíram do papel, mas ao menos tinham sido gestadas. No afã de se distanciar da gestão anterior, porém, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, afirmou que a proposta não diz respeito ao atual governo e prometeu um novo plano, ainda sem data. Diante dessa rotina de descontinuidade, são oportunas as observações dos sociólogos Ignácio Cano e Renato Sérgio de Lima em artigo publicado nesta Folha. Os especialistas criticam o eterno e ineficaz recomeço das políticas públicas de segurança — um mal infelizmente não restrito a essa área– e argumentam que o combate à violência não deveria se ver preso a picuinhas partidárias. Diante da inação, ganham força no Congresso propostas com o intuito de desfigurar o Estatuto do Desarmamento. Estudo recente do Instituto Sou da Paz mostra que, no ano passado, foram apresentados 36 projetos com esse foco. Trata-se de perigoso sintoma do fracasso do Estado. Em lugar de políticas públicas eficazes, vendem-se falsas soluções simplificadoras que, se aprovadas, contribuirão mais para aumentar do que para diminuir o número de assassinatos. É muito fácil encontrar governos que anunciem a prevenção dos homicídios como sua prioridade; difícil é demonstrar que tal objetivo prevalece sobre a politicagem.
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Menos impunidade FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAIS editoriais@grupofolha.com.br 09/10/2016 às 02h00
A decisão não teve nada de consensual. Por 6 a 5, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a possibilidade de que pessoas condenadas em segunda instância sejam presas, considerando desnecessário esperar até que se esgotem todos os recursos à disposição. Estavam em jogo, na sessão de quarta-feira (5), princípios constitucionais básicos em qualquer democracia: ninguém deve ser conduzido à prisão sem culpa e ninguém deve ser considerado culpado antes do devido processo legal. Com frequência, mesmo os mais claros fundamentos jurídicos se abrem a interpretações diversas, e estas permeiam-se das tendências do momento e das lições trazidas pela experiência concreta. Na prática, o sistema penal brasileiro tem-se caracterizado por flagrante impunidade seletiva. Réus que disponham de alta condição financeira valem-se de excelentes advogados para realizar incontáveis manobras protelatórias nos tribunais, adiando a execução da pena. Estão no direito de fazê-lo. A situação tem criado, entretanto, inúmeros exemplos de injustiça. Em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso citou alguns. Condenado por desviar mais de meio bilhão de reais (em valores atualizados), num crime que remonta a 1992, o ex-senador Luiz Estevão foi condenado em 2006, mas terminou preso só em 2016, após apresentar 34 recursos judiciais. Muitas vezes, quando finalmente esgotados todos os meios de defesa, a pena prevista para o crime cometido encontra-se prescrita. Como considerar que alguém já sentenciado em dois tribunais ainda possa ter sua inocência presumida pelo Estado? Tal complacência é recusada em qualquer país do mundo, mas está inscrita na nossa Constituição e tinha sido avalizada pelo STF em julgamento de 2009. Em fevereiro deste ano, contudo, os ministros trouxeram novo entendimento. Dada a controvérsia suscitada, fizeram bem em voltar agora à discussão; a reafirmação do que se decidira meses atrás fortalece a posição do tribunal. Há alguns anos, esta Folha chegou a defender a necessidade de uma palavra do Superior Tribunal de Justiça antes de se proceder à execução da pena. Cabe reconhecer, no entanto, que a convicção do STF mostra-se mais pertinente. O clima de impunidade que vigorava até agora tem o efeito perverso de induzir a criação de leis cada vez mais severas ou até estimular respostas como linchamentos e esquadrões da morte. Desde que não se retire dos acusados o direito a eventuais revisões processuais, a maior efetividade criminal corrige em parte essa situação em que, escarnecida a Justiça e impotente 2
o Estado, a sedução da barbárie acompanha, como uma sombra, um excesso de garantias à disposição de quem pode financiar a própria impunidade.
Piso para o futuro FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAIS editoriais@grupofolha.com.br 10/10/2016 às 02h00
Caso seja aprovada, a proposta que limita a expansão dos gastos públicos no Brasil representará a primeira grande inflexão na trajetória da despesa estatal desde a Constituição de 1988. A mudança é necessária porque ao crescimento da máquina pública sempre corresponde aumento da carga tributária ou contração de dívidas —isso quando não ocorrem as duas coisas. De 1997 a 2015, a despesa federal avançou 6,2% ao ano acima da inflação, no que foi acompanhada de mordidas cada vez maiores no bolso do contribuinte. No agregado dos três níveis de governo, ambas (despesas e carga) subiram cerca de seis pontos percentuais do PIB no período e hoje correspondem a um terço da economia —fatia bem superior à de países em desenvolvimento. A dívida pública, por sua vez, não só atingiu patamar muito alto para o nível de renda do Brasil como está em trajetória explosiva. Saiu de 51,7% do PIB em 2013 para 70,1% em agosto deste ano; estima-se que, mantido o ritmo atual, passará de 90% até 2020. A fim de conter a voracidade do Estado e controlar a dívida, o governo de Michel Temer (PMDB) propõe que os gastos públicos sejam congelados, sofrendo correções apenas pela inflação por até 20 anos. Ou seja, nesse período, em tese nenhum governo precisará recorrer a novas altas de impostos (mas são necessárias reformas para tornar a tributação mais justa). Em contrapartida, dado que o bolo total se tornará inelástico, qualquer alteração no volume de uma despesa (por exemplo, salário de servidores) implicará redução de outra (como investimento). Daí surgiram as preocupações com setores fundamentais para a maioria da população: saúde e educação. Pelas normas atuais, essas rubricas são vinculadas a um percentual da receita: aumentam quando a economia vai bem, mas despencam se há queda na arrecadação. O novo regime, ao contrário do que sugerem seus críticos, protegerá a saúde e a educação e tornará essas despesas mais previsíveis. Haverá um piso para desembolsos nessas áreas, não um teto. O Congresso poderá aumentá-los se quiser, desde que sejam compensados pela redução de outros gastos. Para que as novas regras funcionem, entretanto, é essencial reformar a Previdência, que já absorve metade dos recursos da União e cresce 4% ao ano acima da inflação. Sem mudanças, a expansão do deficit previdenciário achatará as demais rubricas.
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Se, como se espera, o país voltar a crescer de forma sustentável, é provável que o enxugamento da máquina pública se prove excessivo antes de 20 anos –nesse caso, o problema poderá facilmente ser resolvido pelo Congresso. O importante é que, agora, se estabeleçam as condições não só para a retomada da confiança na economia brasileira, com equilíbrio das contas públicas, mas também para um avanço no debate acerca de prioridades orçamentárias e eficiência do gasto estatal.
As notas do Enem Das 100 escolas com as médias mais altas, 97 são privadas, têm alunos de nível socioeconômico alto e funcionam com turmas pequenas Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 08 Outubro 2016 às 03h08 Divulgadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, do Ministério da Educação (MEC), as notas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2015 revelaram que, das 100 escolas com as médias mais altas, 97 são privadas, têm alunos de nível socioeconômico alto e funcionam com turmas pequenas. Das três escolas da rede pública, todas são colégios de aplicação vinculados a uma universidade federal. Por erro técnico, que já está sendo corrigido, o MEC não incluiu na listagem os institutos técnicos federais. Mesmo assim, a exemplo dos colégios de aplicação, os institutos técnicos têm regime pedagógico e orçamento diferenciados. No grupo das mil melhores do Enem de 2015, apenas 49 são escolas públicas – no ranking de 2014, eram 93, o que dá a medida da tragédia em que se converteu a rede pública de ensino médio. Em outras palavras, as escolas públicas com as maiores médias são exceções no âmbito de um sistema de ensino absolutamente incapaz de assegurar uma formação de qualidade a alunos pobres, cujas famílias enfrentam dificuldades no acesso a serviços essenciais. Com base nas notas de 1.212.908 estudantes de 14.998 escolas do País, o Enem de 2015 revela, assim, que o sistema educacional brasileiro está longe de cumprir uma de suas principais atribuições, que é a de alfabetizar e formar adolescentes e jovens pobres – condição indispensável para que o País possa reduzir a pobreza. O abismo entre alunos ricos e pobres em matéria de desempenho escolar mostra o aprofundamento da desigualdade social e econômica e, por tabela, a incapacidade da rede pública de formar o capital humano de que o Brasil necessita para voltar a crescer. O mais grave é que, nesse momento em que o Brasil precisa adotar novas tecnologias e modernizar a economia, o desempenho médio tanto das escolas públicas quanto das escolas privadas piorou em três áreas fundamentais. A nota de Matemática recuou de 481 para 475 pontos, entre 2014 e 2015. Em Linguagens, caiu de 511 para 504 pontos. Em Ciências da Natureza, a queda foi de 487 para 478 pontos. As notas aumentaram apenas em Ciências Humanas e Redação. Essas provas avaliam competências essenciais, como raciocínio matemático, capacidade de relacionar conhecimentos de diversas áreas, habilidade para resolver problemas, leitura e interpretação de textos. Ao avaliar os números do Enem, dispensando especial atenção para o reduzido número de escolas públicas na lista das mil melhores e apontando a necessidade de reformas urgentes no ensino médio, vários pedagogos lembraram que a situação social dos alunos é um dos fatores que mais pesam na nota. Assim, adolescentes e jovens pobres, além de contarem com pais e mães pouco escolarizados, têm limitado acesso a bens culturais – o que, como um círculo vicioso, reforça sua condição socioeconômica. 4
Outros pedagogos chamam a atenção para um fator ainda mais importante, lembrando a maneira errática e inepta com que a educação foi tratada nos 13 anos de lulopetismo, ora valorizando a expansão do ensino superior, ora anunciando mudanças de programas concebidos às pressas e com objetivos eleiçoeiros. Os governos do PT deixaram-se levar pela ilusão de que a crise do ensino básico – no qual está incluído o ensino médio – poderia ser superada com aumento dos recursos propiciados pelos royalties do petróleo. As notas do Enem mostram que essa ilusão resultou em enorme desperdício de dinheiro com programas irrealistas e que faltou gestão competente e um conjunto integrado de ações que envolvessem planejamento, definição de padrões de qualidade, metas realistas e melhor avaliação de resultados. Se a proposta de reforma do ensino médio imposta recentemente por medida provisória pelo presidente Michel Temer vai mudar esse cenário, isso só poderemos saber depois que ela for implementada, o que não deve acontecer antes de 2019. Até lá, as próximas edições do Enem estarão retratando os desastres de 13 anos de lulopetismo no ensino básico.
Os sólidos fundamentos Como cabalmente provado no processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff infringiu gravemente a legislação fiscal Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 08 Outubro 2016 às 03h07 Como cabalmente provado no processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff infringiu gravemente a legislação fiscal. Porém, mesmo com todo o conjunto probatório apresentado no processo, houve quem continuasse alegando inexistir fundamento jurídico para o afastamento da presidente, como se fosse mera manobra política. Tal posição, se algum dia foi minimamente crível, a cada dia se distancia mais dos fatos. Na quarta-feira passada, foi a vez de o Tribunal de Contas da União (TCU) corroborar os crimes fiscais imputados a Dilma Rousseff no processo de impeachment. Após análise das contas do governo de 2015, o tribunal deu, por unanimidade, parecer orientando o Congresso a rejeitar a prestação de contas da expresidente. O fundamento do parecer do TCU pela rejeição é claro. O tribunal encontrou dez graves irregularidades na prestação de contas do governo relativa ao exercício de 2015. Sete delas referem-se às pedaladas fiscais, as famosas manobras do Tesouro Nacional de atrasar o repasse de recursos para bancos públicos por pagamentos feitos por estas instituições em nome do governo. Conforme dispõe a Lei de Responsabilidade Fiscal, essas operações de crédito são ilegais. No ano passado, o TCU já havia dado semelhante parecer, propondo a rejeição pelo Congresso das contas do governo de Dilma Rousseff do exercício de 2014. A ex-presidente é, portanto, reincidente em irregularidades fiscais. Para o relator do processo no TCU, ministro José Múcio Monteiro, não há dúvida de que o governo de Dilma Rousseff desrespeitou os princípios constitucionais e legais na execução do Orçamento federal e nas demais operações feitas com recursos públicos. Entre as medidas irregulares, Múcio apontou o atraso de recursos do Plano Safra ao Banco do Brasil e a edição de decretos de suplementação orçamentária sem o aval do Legislativo. Esses atos foram justamente o fundamento jurídico da denúncia apresentada contra a presidente Dilma no processo de impeachment. Segundo a análise do TCU, as manobras do governo em 2015 envolveram o Banco do Brasil e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. O parecer do tribunal apontou 5
também a ocorrência de falhas na regularização do estoque das operações de 2014. Ao não registrar os passivos junto aos bancos nas estatísticas da dívida pública, o Banco Central maquiou o resultado fiscal do País, afirmou o TCU. No mesmo dia do julgamento das contas do governo de Dilma Rousseff em 2015, o TCU também se debruçou sobre outro processo envolvendo irregularidades fiscais durante o mandato da ex-presidente. Tratava-se de julgar a responsabilidade de 17 autoridades nas pedaladas fiscais praticadas em 2014. A decisão puniu oito pessoas, entre elas o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e o ex-secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin. Em razão das manobras, os dois foram inabilitados para o exercício de cargos em comissão no serviço público. A sanção a Mantega tem duração de cinco anos, e a de Augustin, de oito anos. Cada um também foi multado em R$ 54 mil. O ministro José Múcio Monteiro, também relator desse processo, destacou a gravidade das infrações praticadas pelos ex-titulares da Fazenda e do Tesouro. Segundo Múcio, eles tinham o “maior nível de autoridade” e foram coniventes com as ilicitudes. Por exemplo, Mantega, como ministro da Fazenda, assinou portarias que permitiram os atrasos nos repasses aos bancos. Se o parecer do TCU pela rejeição das contas de 2015 corrobora o fundamento jurídico do impeachment, a outra decisão do tribunal joga luzes sobre outro ponto do processo contra a ex-presidente – a manobra, no momento final do julgamento de Dilma no Senado, de permitir o fatiamento da sua pena, livrando-a da inabilitação por oito anos para o exercício de função pública. Os executores da política econômica foram punidos com a inabilitação. Já Dilma, de quem emanou a orientação para a ilegal condução econômica, saiu ilesa.
O não-voto é preocupante Cerca de 25 milhões de cidadãos brasileiros aptos a irem às urnas deixaram de votar nos candidatos a prefeito e vereador no primeiro turno das eleições municipais Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 08 Outubro 2016 às 03h06 Os números são preocupantes. Cerca de 25 milhões de cidadãos brasileiros aptos a irem às urnas deixaram de votar nos candidatos a prefeito e vereador no primeiro turno das eleições municipais, seja por não terem comparecido às secções eleitorais, apesar da obrigatoriedade do voto – o que configura abstenção –, seja por terem votado em branco ou, principalmente, anulado o voto. Em São Paulo, por exemplo, a abstenção de 1,94 milhão dos 8,8 milhões de eleitores registrados, somada aos 367,5 mil votos em branco e 788 mil nulos, resultou em quase 3,1 milhões de não-votos, praticamente o mesmo número de sufrágios que elegeu João Doria. Em cinco das capitais, onde de modo geral a ausência dos eleitores foi mais expressiva, a soma aos votos brancos e nulos ultrapassou os 21%. O índice mais alto foi registrado no Rio de Janeiro, 24,28%, seguido por Porto Alegre, 22,51%; São Paulo, 21,84%; Belo Horizonte, 21,66%; e Salvador, 21,25%. A capital paulista, porém, encabeça a lista dos não-votos em números absolutos. O fenômeno da abstenção somado aos votos brancos e nulos é um indício claro da insatisfação e da falta de confiança dos brasileiros nos governantes e na chamada classe política. Há dois fatores aparentemente predominantes na criação desse estado de espírito: o desencanto e a desilusão com um partido cujo grande líder, Lula, chegou a ter um índice de aprovação popular superior a 80% no momento em que deixou a Presidência da República e a indignação e o desalento diante da revelação da corrupção generalizada na gestão da coisa pública, cujas 6
investigações não têm poupado figuras relevantes de praticamente nenhuma legenda partidária. A decepção com o desastre econômico provocado pela soberba, pelo sectarismo ideológico e pela incompetência política e administrativa do governo Dilma Rousseff foi claramente manifestada pelos brasileiros com a fragorosa derrota imposta ao PT. Durante os dois mandatos de Lula, uma conjuntura econômica internacional favorável havia abastecido os cofres públicos com recursos suficientes para financiar uma gastança populista que se tornou insustentável quando a “nova matriz econômica” sentiu-se, irresponsavelmente, capaz de moldar à sua feição o mercado interno e desdenhar do externo. Foi o começo do fim da ilusão do paraíso lulopetista, que Dilma Rousseff se encarregou de acelerar com sua inacreditável inabilidade política e incapacidade gerencial. O descrédito em relação à política e aos políticos, portanto, pode ser debitado ao vexame da aventura populista do lulopetismo, mas também à descoberta, propiciada pela Operação Lava Jato e congêneres, de que os autoproclamados pais da Pátria chefiavam uma quadrilha que se locupletava com dinheiro público. O PT havia se tornado eleitoralmente competitivo com a insistente promessa, repetida ao longo de seus primeiros 20 anos de existência, de passar o País a limpo e livrá-lo de tudo de errado que faziam “eles”, os não petistas. No momento em que as investigações policiais demonstraram que o rei estava nu, que até os “paladinos das causas populares” metiam a mão no dinheiro do povo exatamente como as velhas raposas às quais se haviam aliado, é natural que muitas pessoas de boa-fé, desiludidas, tenham optado por esquecer que os políticos existem, preferindo cuidar apenas da própria vida, como se fosse possível haver vida em comunidade sem política. Esse é mais um desserviço prestado ao País pelos petistas, que no fundo só valorizam o exercício de liberdades democráticas – como votar e se manifestar nas ruas – por parte de cidadãos “confiáveis”, aqueles que a nomenclatura partidária consegue manter sob controle por meio de entidades e organizações sociais dependentes do Estado. A alarmante incidência do não-voto neste primeiro turno do pleito municipal deve ser interpretada como uma advertência aos políticos brasileiros, como declarou o presidente Michel Temer: “A abstenção foi muito significativa. Portanto, é um recado que se dá à classe política brasileira para que reformule eventuais costumes inadequados”. Com longa experiência na política, Temer sabe do que está falando. Como chefe do governo, cabe-lhe a responsabilidade de um papel importante na identificação e correção de “costumes inadequados”.
O modelo funciona Se antes o dinheiro das empresas permitia que os candidatos disputassem a eleição sem sair de casa, agora se tornou imperativo conversar diretamente com o eleitor Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 A primeira eleição sem o financiamento empresarial de campanha foi plenamente exitosa. Embora a queixa sobre a falta de dinheiro tenha sido mais ou menos generalizada, os candidatos saíram em busca de votos, os eleitores fizeram suas escolhas livremente e os eleitos tomarão posse no prazo legal. Tudo isso significa que a democracia pode perfeitamente funcionar sem a injeção de recursos de empresas interessadas somente em ganhar favores e contratos dos políticos que ajudaram a eleger. Aliás, pode-se dizer que a democracia saiu fortalecida dessa eleição exatamente porque foi rompido esse vínculo danoso entre políticos e empresas, transformadas em eleitoras privilegiadas. Deu-se um grande passo para restaurar o princípio de “um homem, um voto”. 7
É evidente que os partidos e os políticos têm muitos motivos para lamentar a mudança no financiamento eleitoral, sacramentada pelo Supremo Tribunal Federal em 2015. Dependentes da fartura proporcionada por generosas pessoas jurídicas – e entre as mais generosas, não por acaso, encontravam-se as empreiteiras que passaram os últimos anos a nutrir relações obscenas com o poder, muitas vezes exercendo-o elas mesmas –, não foram poucos os políticos que, padecendo de síndrome de abstinência, propuseram o restabelecimento do antigo modelo. Aquela situação pode ser resumida em uma palavra: farra. A doação eleitoral por parte de empresas, que se tornou legal a partir de 1994, provocou uma explosão nos custos das campanhas – que saltaram de R$ 792 milhões em 2002 para R$ 5,1 bilhões em 2014. Proporcionalmente, o custo do voto no Brasil tornou-se um dos mais altos do mundo, transformando a política em uma atividade limitada aos candidatos bem relacionados com poderosos financiadores. Quando esse fenômeno grotesco começou a tomar forma, nos anos 90, o governador Mário Covas chegou a defender a simplificação da propaganda eleitoral para reduzir os custos, sugerindo que a campanha na TV tivesse apenas o candidato, sem maquiagem nem truques, a pedir o voto. Nem é preciso dizer que a ideia de Covas foi prontamente rechaçada por aqueles que já estavam a lucrar com o financiamento empresarial de campanhas. Neste ano, sem essa abundância de recursos, foi necessário gastar sola de sapato, algo a que os candidatos já não estavam mais habituados. Se antes o dinheiro das empresas permitia que os candidatos disputassem a eleição sem sair de casa, agora se tornou imperativo conversar diretamente com o eleitor e convencê-lo não apenas a lhe dar o voto, mas também a ajudar no financiamento da campanha. Não faltarão aqueles que apontarão os dados sobre fraudes nas doações de pessoas físicas – inclusive beneficiários do Bolsa Família, de quem ninguém esperaria nenhuma doação eleitoral – como prova de que não é possível evitar que os candidatos encontrem maneiras de burlar a lei. Ora, mesmo que se comprovem todas essas fraudes – o Tribunal Superior Eleitoral suspeita que o volume de doações irregulares nas eleições deste ano pode atingir R$ 554 milhões –, nada é comparável ao prejuízo que causou, nos últimos anos, a captura do poder político pelo poder econômico, proporcionada pelas doações empresariais. Espera-se, assim, que uma eventual discussão sobre a necessária reforma política não inclua o restabelecimento do financiamento empresarial, como querem vários líderes partidários. Espera-se também que não prospere a ideia de alguns políticos, noticiada nos últimos dias, de criar um “fundo eleitoral” que bancaria as campanhas com dinheiro público – fazendo com que o contribuinte colabore com candidatos nos quais ele não pretende votar. Qualquer coisa que não seja o financiamento de campanhas por pessoas físicas seria um lamentável passo atrás, fruto muito mais de cálculos eleitoreiros e de interesses escusos do que de uma suposta valorização da democracia. Como a campanha eleitoral de 2016 mostrou, o voto pode ser conquistado sem a necessidade de enganar o eleitor com promessas elaboradas por marqueteiros e sem precisar recorrer a financiadores que não têm compromisso senão com seus balanços contábeis.
A judicialização da saúde Só nos primeiros seis meses deste ano, o Ministério cumpriu 16,3 mil ações judiciais que o obrigaram a fornecer gratuitamente remédios que não constam da lista do SUS Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 8
Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) não julga em caráter definitivo um recurso sobre o limite da responsabilidade dos Estados e do Distrito Federal de distribuir gratuitamente remédios de alto custo não incluídos nas listas do Sistema Único de Saúde (SUS), os tribunais continuam tomando decisões polêmicas nessa matéria. Tomada por um juiz federal de Guarulhos e referendada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 3.ª Região, a mais recente obriga a União a usar verbas da publicidade oficial, e não os recursos orçamentários do Ministério da Saúde, para pagar remédios importados para uma jovem com doença genética rara. Na defesa do governo, a Advocacia-Geral da União alegou que a Justiça não pode interferir nas verbas orçamentárias do Executivo aprovadas pelo Legislativo. O argumento foi rejeitado pelo TRF da 3.ª Região, sob a justificativa de que o Código de Processo Civil autoriza os juízes a recorrerem a todos os meios para preservar os direitos fundamentais previstos pela Constituição, como o direito à vida. As duas instâncias da Justiça Federal entenderam que, se os recursos do SUS são limitados, as verbas para o custeio dos remédios devem sair do orçamento de áreas não prioritárias da máquina governamental. “Ao manter a propaganda estatal, muitas vezes de caráter de promoção do governante, enquanto há pessoas morrendo por falta de tratamento, o Executivo comete inconstitucionalidade”, diz o juiz federal Paulo Rodrigues, da comarca de Guarulhos. “A Justiça está recordando a verdade sublime que o Estado existe para o cidadão, e não o contrário”, afirmou o desembargador Johnson di Salvo, do TRF da 3.ª Região. Esse é mais um capítulo da novela sobre a judicialização da saúde, que se arrasta há anos, à espera de uma manifestação definitiva do STF. O recurso que a Corte julgará nas próximas semanas foi impetrado pelo Estado do Rio Grande do Norte. Alegando que não dispõe de recursos orçamentários para cumprir as centenas de liminares concedidas em matéria de distribuição gratuita de medicamentos caros, o governo potiguar pleiteia que o direito à saúde seja apartado dos direitos fundamentais. A reivindicação é apoiada por todos os Estados e pelo Ministério da Saúde. Só nos primeiros seis meses deste ano, o Ministério cumpriu 16,3 mil ações judiciais que o obrigaram a fornecer gratuitamente remédios que não constam da lista do SUS. Em São Paulo, entre liminares e antecipações de tutela, o governo estadual cumpriu no ano passado 18 mil ordens judiciais, que custaram aos cofres estaduais R$ 1,2 bilhão. No último triênio, o Ministério da Saúde gastou R$ 1,76 bilhão com o cumprimento de ações judiciais – um aumento de 129%. Para 2016, a estimativa é de que os gastos da União, dos Estados e dos municípios cheguem a R$ 7 bilhões. No embate com os tribunais, os secretários e o ministro da Saúde alegam que 69% das decisões judiciais provêm de prescrições de médicos privados e sugerem que parte do receitado não é urgente e tem similar nas listas de remédios do SUS. Afirmam, igualmente, que as decisões de primeira e de segunda instâncias têm priorizado direitos individuais, em detrimento de direitos coletivos. As cúpulas das Justiças Federal e Estaduais respondem que é cada vez maior o número de juízes que buscam informações técnicas nos órgãos públicos de saúde, antes de emitirem uma decisão. Também afirmam que a magistratura tem sido cuidadosa ao compatibilizar atos administrativos com princípios constitucionais. A verdade é que os dirigentes governamentais têm razão quando afirmam que as decisões judiciais retiram do poder público a competência para gerir a área da saúde. Já os juízes alegam que os problemas da saúde não devem ser vistos apenas pelo lado financeiro. Cabe ao STF encontrar um meio-termo, reconhecendo o direito à saúde como direito fundamental, por um lado, mas obrigando a Justiça a levar em conta as limitações orçamentárias do poder público num contexto de crise fiscal, por outro.
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Investimento, fator incerto Será um erro muito perigoso depender apenas da iniciativa dos empresários, como indicam os últimos números do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 Se o governo pretende usar o investimento produtivo para mover a economia e tirá-la da recessão, deve cuidar com urgência de seus projetos de infraestrutura. Bons projetos poderão atrair capitais privados e dinamizar os negócios de vários setores. Será um erro muito perigoso depender apenas da iniciativa dos empresários, como indicam os últimos números do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Segundo o novo levantamento, o valor aplicado em máquinas, equipamentos e construções – na formação bruta de capital fixo, portanto – diminuiu 2,8% de julho para agosto, na série com ajuste sazonal. O indicador já havia recuado em julho, depois de um avanço de 8,2% no mês anterior. Pouco sobra, nesta altura, do avanço observado em boa parte do primeiro semestre. O investimento em projetos do governo continua muito baixo. No setor privado há pouco estímulo para investir. Num país com 12 milhões de desempregados, famílias empobrecidas e consumo em crise, para que ampliar a capacidade produtiva? Além disso, há muita capacidade ociosa na indústria. Apesar disso, houve algum investimento no primeiro semestre, mas insuficiente para diminuir de forma sensível a queda acumulada em 12 meses – ou, de fato, nos últimos 2 ou 3 anos. Nos primeiros seis meses de 2016, o indicador mensal do Ipea cresceu 11,14% (tomando-se como base a posição de dezembro do ano passado). Mas a aparente recuperação foi muito frágil. No trimestre móvel terminado em agosto, o índice caiu o,4% em relação ao trimestre móvel anterior. Em agosto, o número foi 10,16% inferior ao de um ano antes. Diminuíram em agosto tanto as compras de máquinas e equipamentos como os gastos em construções. O consumo aparente de máquinas e equipamentos – produção nacional, mais importações, menos exportações – foi 2,5% menor que o do mês anterior, enquanto a construção civil diminuiu 3,8%. Com a quase paralisia dos programas habitacionais e a crise geral no setor imobiliário, as construtoras foram condenadas a um baixíssimo nível de atividade. Do lado das obras públicas, a estagnação se manteve na maior parte do ano. As grandes estatais, a começar pela Petrobrás, encolheram seus programas de investimentos, atoladas em dificuldades financeiras e em escândalos. Várias das maiores empreiteiras do País, investigadas na Operação Lava Jato, foram forçadas a reduzir amplamente suas atividades. Suas operações provavelmente seriam afetadas de toda forma pela crise financeira das estatais, suas grandes clientes. O governo e o mercado projetam para o Brasil um crescimento econômico pouco superior a 1% no próximo ano. O Fundo Monetário Internacional (FMI) calcula uma expansão em torno de 0,5%, depois de uma contração de 3,3% em 2016. Em qualquer caso, a produção só aumentará se houver alguma intensificação da demanda. Dificilmente um impulso poderá provir dos gastos públicos, porque o governo terá de se empenhar, por vários anos, em tapar o enorme buraco de suas contas. Do lado do consumo privado pouco se pode esperar, pelo menos com base no cenário atual e na evolução mais provável. As expectativas dos consumidores têm melhorado, mas falta saber de onde sairá o dinheiro para qualquer aumento de gastos. O desemprego dificilmente recuará com rapidez nos próximos meses. Sobra como fonte possível de dinamismo o investimento financiado principalmente com capital privado. Mas 10
esse investimento só parece provável se for vinculado a projetos elaborados pelo setor público. Daí a importância da retomada das concessões na área de infraestrutura. A partir desse estímulo inicial, a economia ganhará impulso e o empresariado terá algum motivo para arriscar-se em negócios mais amplos. Mas isso dependerá também da confiança na seriedade e na firmeza da política econômica. O presidente Michel Temer e seus ministros devem saber disso, mas terão de mobilizar apoio político para trabalhar com segurança.
Oportuna ampliação do supersimples Constatação é de que o Supersimples, ao agregar com o tempo um número maior de profissões e atividades, tem representado um poderoso estímulo para que milhões de empreendedores deixem o mercado informal Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 A aprovação há pouco pelo Congresso Nacional do projeto de lei que amplia o Simples Nacional, ou Supersimples, sistema diferenciado de tributação para as micro e pequenas empresas, vem fortalecer o empreendedorismo no País, como forma de modernização do mercado de trabalho e geração de empregos. A partir de 1.º de janeiro de 2018, os limites de receita bruta para enquadramento no programa passarão de R$ 60 mil para R$ 81 mil por ano, para as Microempresas Individuais (MEI), e de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões por ano, para as pequenas sociedades limitadas. A intenção original era de que os novos limites entrassem logo em vigor, mas havia resistência da Receita Federal, que estimava uma perda de R$ 800 milhões para os cofres da União em 2017, o que agravaria a crise fiscal. Foi, então, negociado um período de transição, de modo que os novos limites só entrem em vigor em 2018. Para evitar perdas para os Estados e municípios em situação financeira crítica, o limite continua a ser de R$ 3,6 milhões no Supersimples, ficando o faturamento que exceder esse valor sujeito a recolhimento do ICMS e do ISS por fora, de acordo com regras variáveis de cada Unidade da Federação. O Congresso Nacional também se mostrou sensível aos efeitos da crise econômica sobre as micro e pequenas empresas. Estima-se que cerca de 700 mil empresas desse porte enquadradas no Simples Nacional tenham dívida tributária em atraso. Para aliviar sua situação, o projeto estende de 60 para 120 meses o prazo para que elas parcelem seus débitos tributários, evitando, assim, que sejam excluídas do programa, o que poderia forçá-las a encerrar as atividades. O prazo para iniciar a regularização de débitos valerá a partir da publicação da lei no Diário Oficial. A constatação é de que o Supersimples, criado em 1996, ao agregar com o tempo um número maior de profissões e atividades, tem representado um poderoso estímulo para que milhões de empreendedores deixem o mercado informal, passando, inclusive, a contribuir para a Previdência Social. Além de redução da carga tributária, o Supersimples elimina a burocracia ao possibilitar que oito impostos, federais, estaduais e municipais, sejam recolhidos por meio de uma só guia, o que é significativo num país sempre apontado como aquele que, em todo o mundo, exige das empresas o maior tempo para pagar impostos.
O modelo funciona
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Se antes o dinheiro das empresas permitia que os candidatos disputassem a eleição sem sair de casa, agora se tornou imperativo conversar diretamente com o eleitor Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 A primeira eleição sem o financiamento empresarial de campanha foi plenamente exitosa. Embora a queixa sobre a falta de dinheiro tenha sido mais ou menos generalizada, os candidatos saíram em busca de votos, os eleitores fizeram suas escolhas livremente e os eleitos tomarão posse no prazo legal. Tudo isso significa que a democracia pode perfeitamente funcionar sem a injeção de recursos de empresas interessadas somente em ganhar favores e contratos dos políticos que ajudaram a eleger. Aliás, pode-se dizer que a democracia saiu fortalecida dessa eleição exatamente porque foi rompido esse vínculo danoso entre políticos e empresas, transformadas em eleitoras privilegiadas. Deu-se um grande passo para restaurar o princípio de “um homem, um voto”. É evidente que os partidos e os políticos têm muitos motivos para lamentar a mudança no financiamento eleitoral, sacramentada pelo Supremo Tribunal Federal em 2015. Dependentes da fartura proporcionada por generosas pessoas jurídicas – e entre as mais generosas, não por acaso, encontravam-se as empreiteiras que passaram os últimos anos a nutrir relações obscenas com o poder, muitas vezes exercendo-o elas mesmas –, não foram poucos os políticos que, padecendo de síndrome de abstinência, propuseram o restabelecimento do antigo modelo. Aquela situação pode ser resumida em uma palavra: farra. A doação eleitoral por parte de empresas, que se tornou legal a partir de 1994, provocou uma explosão nos custos das campanhas – que saltaram de R$ 792 milhões em 2002 para R$ 5,1 bilhões em 2014. Proporcionalmente, o custo do voto no Brasil tornou-se um dos mais altos do mundo, transformando a política em uma atividade limitada aos candidatos bem relacionados com poderosos financiadores. Quando esse fenômeno grotesco começou a tomar forma, nos anos 90, o governador Mário Covas chegou a defender a simplificação da propaganda eleitoral para reduzir os custos, sugerindo que a campanha na TV tivesse apenas o candidato, sem maquiagem nem truques, a pedir o voto. Nem é preciso dizer que a ideia de Covas foi prontamente rechaçada por aqueles que já estavam a lucrar com o financiamento empresarial de campanhas. Neste ano, sem essa abundância de recursos, foi necessário gastar sola de sapato, algo a que os candidatos já não estavam mais habituados. Se antes o dinheiro das empresas permitia que os candidatos disputassem a eleição sem sair de casa, agora se tornou imperativo conversar diretamente com o eleitor e convencê-lo não apenas a lhe dar o voto, mas também a ajudar no financiamento da campanha. Não faltarão aqueles que apontarão os dados sobre fraudes nas doações de pessoas físicas – inclusive beneficiários do Bolsa Família, de quem ninguém esperaria nenhuma doação eleitoral – como prova de que não é possível evitar que os candidatos encontrem maneiras de burlar a lei. Ora, mesmo que se comprovem todas essas fraudes – o Tribunal Superior Eleitoral suspeita que o volume de doações irregulares nas eleições deste ano pode atingir R$ 554 milhões –, nada é comparável ao prejuízo que causou, nos últimos anos, a captura do poder político pelo poder econômico, proporcionada pelas doações empresariais. Espera-se, assim, que uma eventual discussão sobre a necessária reforma política não inclua o restabelecimento do financiamento empresarial, como querem vários líderes partidários. Espera-se também que não prospere a ideia de alguns políticos, noticiada nos últimos dias, de criar um “fundo eleitoral” que bancaria as campanhas com dinheiro público – fazendo com que o contribuinte colabore com candidatos nos quais ele não pretende votar.
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Qualquer coisa que não seja o financiamento de campanhas por pessoas físicas seria um lamentável passo atrás, fruto muito mais de cálculos eleitoreiros e de interesses escusos do que de uma suposta valorização da democracia. Como a campanha eleitoral de 2016 mostrou, o voto pode ser conquistado sem a necessidade de enganar o eleitor com promessas elaboradas por marqueteiros e sem precisar recorrer a financiadores que não têm compromisso senão com seus balanços contábeis.
Investimento, fator incerto Será um erro muito perigoso depender apenas da iniciativa dos empresários, como indicam os últimos números do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 09 Outubro 2016 às 05h00 Se o governo pretende usar o investimento produtivo para mover a economia e tirá-la da recessão, deve cuidar com urgência de seus projetos de infraestrutura. Bons projetos poderão atrair capitais privados e dinamizar os negócios de vários setores. Será um erro muito perigoso depender apenas da iniciativa dos empresários, como indicam os últimos números do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Segundo o novo levantamento, o valor aplicado em máquinas, equipamentos e construções – na formação bruta de capital fixo, portanto – diminuiu 2,8% de julho para agosto, na série com ajuste sazonal. O indicador já havia recuado em julho, depois de um avanço de 8,2% no mês anterior. Pouco sobra, nesta altura, do avanço observado em boa parte do primeiro semestre. O investimento em projetos do governo continua muito baixo. No setor privado há pouco estímulo para investir. Num país com 12 milhões de desempregados, famílias empobrecidas e consumo em crise, para que ampliar a capacidade produtiva? Além disso, há muita capacidade ociosa na indústria. Apesar disso, houve algum investimento no primeiro semestre, mas insuficiente para diminuir de forma sensível a queda acumulada em 12 meses – ou, de fato, nos últimos 2 ou 3 anos. Nos primeiros seis meses de 2016, o indicador mensal do Ipea cresceu 11,14% (tomando-se como base a posição de dezembro do ano passado). Mas a aparente recuperação foi muito frágil. No trimestre móvel terminado em agosto, o índice caiu o,4% em relação ao trimestre móvel anterior. Em agosto, o número foi 10,16% inferior ao de um ano antes. Diminuíram em agosto tanto as compras de máquinas e equipamentos como os gastos em construções. O consumo aparente de máquinas e equipamentos – produção nacional, mais importações, menos exportações – foi 2,5% menor que o do mês anterior, enquanto a construção civil diminuiu 3,8%. Com a quase paralisia dos programas habitacionais e a crise geral no setor imobiliário, as construtoras foram condenadas a um baixíssimo nível de atividade. Do lado das obras públicas, a estagnação se manteve na maior parte do ano. As grandes estatais, a começar pela Petrobrás, encolheram seus programas de investimentos, atoladas em dificuldades financeiras e em escândalos. Várias das maiores empreiteiras do País, investigadas na Operação Lava Jato, foram forçadas a reduzir amplamente suas atividades. Suas operações provavelmente seriam afetadas de toda forma pela crise financeira das estatais, suas grandes clientes. O governo e o mercado projetam para o Brasil um crescimento econômico pouco superior a 1% no próximo ano. O Fundo Monetário Internacional (FMI) calcula uma expansão em torno de 0,5%, depois de uma contração de 3,3% em 2016. Em qualquer caso, a produção só aumentará se houver alguma intensificação da demanda.
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Dificilmente um impulso poderá provir dos gastos públicos, porque o governo terá de se empenhar, por vários anos, em tapar o enorme buraco de suas contas. Do lado do consumo privado pouco se pode esperar, pelo menos com base no cenário atual e na evolução mais provável. As expectativas dos consumidores têm melhorado, mas falta saber de onde sairá o dinheiro para qualquer aumento de gastos. O desemprego dificilmente recuará com rapidez nos próximos meses. Sobra como fonte possível de dinamismo o investimento financiado principalmente com capital privado. Mas esse investimento só parece provável se for vinculado a projetos elaborados pelo setor público. Daí a importância da retomada das concessões na área de infraestrutura. A partir desse estímulo inicial, a economia ganhará impulso e o empresariado terá algum motivo para arriscar-se em negócios mais amplos. Mas isso dependerá também da confiança na seriedade e na firmeza da política econômica. O presidente Michel Temer e seus ministros devem saber disso, mas terão de mobilizar apoio político para trabalhar com segurança.
Um país afundado em dívidas Endividamento público e privado impõe desafios à política fiscal Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 10 Outubro 2016 às 05h00 Com o governo atolado em dívidas e sem perspectiva de arrumar suas finanças a curto prazo, as empresas brasileiras mais endividadas terão de buscar no mercado a solução para seus problemas. As condições internacionais ainda são benignas, mas poderão piorar quando os juros subirem de novo nos Estados Unidos. Quando isso ocorrer, muito dinheiro hoje disponível para os emergentes será provavelmente desviado para aplicação em ativos americanos. Riscos financeiros são hoje elevados em todo o mundo e a situação de alguns grandes bancos europeus preocupa os mercados. Mas governos do mundo rico e de alguns países emergentes têm algum espaço para socorrer companhias endividadas e facilitar o ajuste do sistema bancário. No Brasil, o setor público terá de se empenhar prioritariamente, por muitos anos, em melhorar o próprio balanço. Este quadro resume informações importantes – e pouco animadoras – de dois documentos liberados na semana passada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e comentados por diretores da instituição. Um relatório sobre finanças globais mostrou um cenário de curto prazo melhor que o esperado e uma coleção de riscos significativos a médio prazo. Outro relatório mostrou como o enorme endividamento público e privado impôs desafios à política fiscal. Nos dois estudos, mas especialmente no segundo, o Brasil aparece em situação especialmente vulnerável. A dívida bruta do setor empresarial, das famílias e dos governos atingiu US$ 152 trilhões no ano passado, valor correspondente a 225% do produto bruto mundial. Oito anos depois do estouro da última grande crise financeira, em 2008, o risco financeiro permanece elevado. A recessão foi superada na maior parte do mundo, mas o crescimento continua insatisfatório, desajustes importantes subsistem e o endividamento excessivo ameaça de novo a estabilidade mundial. Vários fatores negativos diferenciam a posição brasileira nesse quadro. Depois de dois anos de recessão, a economia continua em marcha lenta, a inflação ainda é elevada, as contas públicas estão arrasadas e o setor não financeiro – público e privado – enfrenta os efeitos do endividamento acumulado nos últimos anos. Com a contração dos negócios e o aperto do crédito, a situação financeira das empresas, principalmente das grandes, ficou muito complicada. 14
Segundo o FMI, as firmas “fracas”, isto é, com dificuldade para cobrir os juros, devem cerca de US$ 51 bilhões, aproximadamente 11% de todo o débito corporativo. Num cenário adverso, a dívida em risco poderá subir para US$ 88 bilhões. A recomendação é aproveitar as condições internacionais por enquanto favoráveis. Em países com menor aperto fiscal os governos poderão socorrer as firmas endividadas. O caso do Brasil é muito diferente. A dívida bruta do setor público bateu em 73% do Produto Interno Bruto (PIB), 30 pontos acima da média de outros emergentes. Se o governo conseguir arrumar as próprias contas nos próximos anos, já fará um serviço muito importante. Se mostrar forte compromisso com a pauta de ajustes e de reformas, empresários e investidores privados se animarão a intensificar os negócios e isso facilitará a recuperação geral da economia. Pelas projeções do FMI, o saldo primário das contas públicas – sem os juros, portanto – continuará deficitário até 2019. Para 2020 está estimado um saldo positivo equivalente a 0,3% do PIB. O resultado deverá chegar a 0,7% no ano seguinte. Mas isso ainda será insuficiente para impedir a deterioração geral das contas. O saldo nominal – com o custo dos juros – continuará no vermelho, com valores negativos de 7% em 2020 e 6,4% em 2021. Como o dinheiro, até lá, será insuficiente para o pagamento integral dos juros, a dívida bruta chegará a 90,8% do PIB em 2020 e a 93,6% no ano seguinte. Em 2021, a dívida pública dos emergentes e dos países de renda média corresponderá a 52,6% do PIB, de acordo com o FMI. Para a América Latina, a média projetada é 63,6%. Também a deterioração da situação financeira do setor público brasileiro expressa nesses números é parte da herança deixada pelo PT.
A choradeira dos sem votos O PT insiste em se apresentar como vítima Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 10 Outubro 2016 às 05h00 Ao debater os rumos do partido depois da devastadora derrota eleitoral que lhe custou a perda de 379 (60%) das 635 prefeituras que comandava em todo o País, a Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) chegou à conclusão de que a culpa pelo desastre deve ser debitada ao fato de que “há um Estado de exceção em andamento” e nesse contexto “o aprofundamento da crise econômica, a criminalização do PT e a ação corrosiva da mídia monopolizada erodiram a base eleitoral progressista”. Em resumo, o PT e os petistas são apenas vítimas e não responsáveis pelo retumbante fracasso. O PT insiste em se apresentar como vítima daqueles que não querem o bem do País, ignorando o fato de que o “massacre” nas palavras de seu presidente, Rui Falcão que resultou em sua derrota nas urnas não é a causa, mas a consequência dos seus próprios erros e contradições reiterados ao longo dos 13 anos em que permaneceu no poder. Para o secretário nacional de assuntos institucionais do partido, deputado federal Reginaldo Lopes – que ficou em terceiro lugar na disputa pela prefeitura de Belo Horizonte, “os valores que o PT defende estão cada vez mais vivos na sociedade”, mas “há uma criminalização do PT, da marca, não do nosso conteúdo”. A dar crédito a essa singular interpretação dos fatos, a conclusão é de que os petistas têm sido extremamente incompetentes na defesa do tal “conteúdo”. A tentativa dos dirigentes petistas de explicar a acachapante derrota eleitoral reúne argumentos que não param em pé. Para começar, o de que “há um estado de exceção em 15
andamento no País”. Pela ótica petista, são duas as evidências dessa anomalia: o impeachment de Dilma Rousseff e a “perseguição” ao PT pela Operação Lava Jato. A cassação da expresidente foi resultado de um processo jurídico e político de cujos fundamentos os petistas até podem discordar, mas que foram plenamente avalizados pelos Poderes Judiciário e Legislativo. De resto, a manifestação das urnas legitima politicamente o impeachment e confirma o repúdio dos brasileiros ao desempenho do partido à frente do governo. Quanto à Lava Jato, fala por si a coincidência de que no mesmo dia em que a Executiva se reunia, Lula era mais uma vez indiciado pela PF, agora por suspeita de favorecimento da Odebrecht em transações no exterior em que teria sido beneficiado também um contraparente seu. Não por coincidência, o mensalão, o petrolão e traficâncias congêneres ocorreram durante os governos petistas. Daí a “perseguição” a figuras do partido. Outra desculpa, maliciosa, é “o aprofundamento da crise econômica”. Este é um problema de total responsabilidade da desastrada administração petista. É ridícula, pois, a insinuação de que o PT foi prejudicado nas urnas por uma crise pela qual o culpado é o “governo usurpador” de Temer. Quanto à “criminalização do PT”, é decorrência natural do fato de o lulopetismo ter estabelecido a divisão do País entre “nós” e “eles”, sendo estes últimos todos aqueles que não idolatram Lula nem estão dispostos a comprar os lotes que o PT oferece na Lua. Quando tudo está dando errado, “nós” somos vítimas. Quando dava tudo certo, “nós” éramos heróis. Não poderia faltar no tiroteio petista a referência à “ação corrosiva da mídia monopolizada”. O monopólio em questão tem conotação política e se refere ao fato de que predomina na mídia uma postura crítica ao populismo irresponsável do PT. Do ponto de vista econômico, é impossível sequer imaginar a configuração de monopólio nessa área. “Monopólio” político, de qualquer modo, é um termo mais adequado para definir aquilo que o PT armou com o aparelhamento de uma ampla estrutura estatal de comunicação que foi sempre muito mais eficiente na generosa distribuição de prebendas a apaniguados do lulopetismo do que na produção de conteúdos dignos de índices mínimos de audiência. Olívio Dutra, petista histórico, diverge da Executiva Nacional e com razão: “O PT tem de levar uma lambada forte mesmo, porque errou seriamente”.
OPINIÃO: Para não repetir erros históricos, reforma eleitoral será gradual
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Em 1958, o deputado Carlos Lacerda constatou que o Parlamento resistiria a uma reforma política FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RONALDO CAIADO 08/10/2016 às 02h00 Reforma política é tema recorrente na história do Brasil. Em 1870, numa reunião ministerial, dom Pedro 2º, citado por Humberto de Campos ("Brasil Anedótico", 1945), dizia: "As eleições, como elas se fazem no Brasil, são a origem de todos os nossos males políticos". Todos, frisou – não só de alguns. Em 1930, fez-se uma revolução, de cujo temário central constava a questão eleitoral: voto direto e secreto, voto feminino, partidos nacionais. Mas o país esperaria 15 anos para eleger pelo voto direto um presidente da República. Em 1958, Carlos Lacerda, então deputado federal, constatou que a reforma política, na profundidade necessária, jamais ocorreria, pois o Parlamento resistiria a mudar um sistema que, bem ou mal, o tinha eleito. Desde a redemocratização, há 31 anos, entra governo, sai governo, e, a cada novo escândalo que surge, repete-se que a reforma política é prioridade, a mãe de todas as reformas. No entanto, a reforma não sai. E não sai basicamente pelo motivo que Lacerda diagnosticou. Só a pressão da sociedade –e ela, hoje, mais do que nunca, se faz presente– muda essa equação. Em 2007, fui relator de uma proposta de reforma política abrangente na Câmara que, entre outras coisas, alterava o sistema político. Foi derrotada. O erro foi tentar fazê-la de uma vez, abrangendo todos os aspectos. Não houve consenso. Hoje, já temos data para votá-la: 8 de novembro, começando no Senado. Optou-se desta vez sabiamente pela gradualidade, buscando-se o consenso das duas Casas legislativas. 17
As lideranças na Câmara e no Senado decidiram iniciar o processo pelos pontos mais convergentes: cláusula de desempenho, estabelecendo quociente mínimo para que um partido tenha funcionamento parlamentar, acesso às verbas do fundo partidário e tempo de rádio e TV; e fim das coligações proporcionais, em que um candidato a deputado bem votado arrasta consigo outros sem votos suficientes para eleger-se, ensejando as mais bizarras alianças. Como regra de transição ao fim das coligações proporcionais, concebeu-se a criação de uma federação de partidos. Consiste em permitir que as legendas que ainda não estão em condições de cumprir a cláusula de desempenho se coliguem nas eleições proporcionais. Mas, diferentemente de hoje, terão de se manter unidas na ação parlamentar por pelo menos três anos. Hoje, a coligação proporcional cessa após as eleições. Unem-se partidos antípodas, com objetivo meramente utilitário, produzindo verdadeiros adultérios ideológicos, que ludibriam o eleitor e depreciam moralmente a política. Esses três pontos, uma vez aprovados, já farão enorme diferença. Reduzirão o espectro partidário, que hoje ultrapassa 30 partidos, anomalia que torna disfuncional e caótica a ação parlamentar, além de estimular o "toma lá, dá cá" que desmoraliza a política brasileira e que, extrapolando todos os limites, desembocou no mensalão e no petrolão. Fez do Congresso um balcão de negócios. Falta muita coisa, é verdade: definição do sistema eleitoral (distrital puro, distrital misto, distritão ou proporcional), financiamento de campanha (público, privado –pessoa física ou jurídica– ou misto), voto em lista (fechada ou aberta) etc. Mas, quando se quer tudo de uma vez, corre-se o risco de nada se obter, como mostra a experiência histórica. A discussão do financiamento, sem que se saiba qual sistema eleitoral será adotado, perde substância. Por isso, ficou para depois. A aprovação desses tópicos já dará às eleições de 2018 um novo perfil. Já será um freio de arrumação na bagunça partidária.
Plantio de soja avança e atinge 11% da área a ser semeada Marcelo Justo - 27.mar.2012/Folhapress
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Colheita de soja em fazenda próxima a Tangará da Serra (MT) FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, MAURO ZAFALON 08/10/2016 às 02h00 O plantio de soja da safra 2016/17 atingiu 11%, em média, no Brasil, conforme dados apurados pela AgRural, de Curitiba, até quinta-feira (6). É no Paraná onde as máquinas estão com ritmo mais acelerado. Os produtores do Estado já semearam 29% da área a ser utilizada com a oleaginosa. Mato Grosso também acelera o plantio, com 19% da área já plantada. No ano passado, devido às dificuldades climáticas, as máquinas haviam avançado em apenas 5% da área do Estado. Mato Grosso do Sul, outro Estado importante na produção da oleaginosa, não tem a mesma sorte de Paraná e Mato Grosso. Devido à seca em algumas regiões de Mato Grosso do Sul, os produtores semearam apenas 6% da área. A AgRural prevê uma área de 33,5 milhões de hectares com soja no país, com aumento anual de 0,8%. A produção potencial é calculada em 101 milhões de toneladas, com alta de 5%. Os dados divulgados na quinta-feira (6) pela Conab indicam que o país deverá semear até 34,2 milhões de hectares com soja. Essa área poderá render até 104 milhões de toneladas. Carne nos EUA O Brasil começa a enviar carne "in natura" para o mercado norte-americano. No mês passado, as exportações brasileiras somaram 127 toneladas, no valor de US$ 501 mil. O valor médio foi de US$ 3.960 por tonelada, conforme dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior). Preços melhores O preço médio do açúcar deverá ficar em US$ 0,215 por libra-peso no próximo ano, uma alta de 7,5% em relação ao que se previa. Já os do café sobem para US$ 1,5 por libra-peso, com evolução de 7%. 19
Deficit Os dados são do Índice de Commodities do Itaú, cujos analistas projetam deficit global de açúcar em 10 milhões de toneladas na safra 2015/16. Em 2016/17, serão 4 milhões de toneladas. Risco Índia e Tailândia poderão ser, no entanto, um elemento de risco para esses números, principalmente se a produção recuar ainda mais do que está prevista. Para baixo Os preços dos produtos agropecuários praticados no mercado atacadista recuaram 1,56% em setembro, conforme dados apurados pelo IGP-DI. Em 12 meses, a alta acumulada é de 21,6%. Etanol O etanol hidratado foi negociado em R$ 1,7604 por litro no período de 3 a 7 deste mês, com aumento de 1,8% em relação ao da semana anterior. Os dados são do Cepea, que aponta, ainda, alta de 1,8% para o anidro: R$ 1,9690 por litro. Nos postos Na cidade de São Paulo, o preço médio do etanol hidratado foi a R$ 2,412 nos postos, conforme pesquisa semanal da Folha. Houve alta de 3% na semana.
Estatuto do Nascituro – qual é o problema? Tramitação não avança porque seria uma barreira para projetos abortistas no Congresso Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Odilo P. Scherer 08 Outubro 2016 às 03h05 Desde 2005 a Igreja Católica no Brasil, por iniciativa da assembleia-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dedica a primeira semana de outubro à valorização e defesa da vida e, no dia 8, comemora-se o Dia do Nascituro. Durante essa semana também é lembrado São Francisco de Assis, patrono da natureza e dos animais. No centro dessas iniciativas está a valorização da vida em todas as suas formas. O papa Francisco dedicou ao cuidado da “casa comum” sua encíclica Laudato Sì (2015), na qual trata da natureza como o ambiente da vida, que abriga e sustenta todas as formas de vida; por isso, precisa ser respeitada e zelada pelo homem, para que ela preserve a sua rica diversidade e não venha a ser destruída. E que seja espaço de solidariedade e de fraternidade, onde todos tenham acesso aos bens necessários para viver. O texto do papa, mais do que uma “encíclica verde”, é um documento de cunho social e ético, que trata das relações do homem com a natureza e das relações sociais no contexto da “casa comum”. O cuidado prudente da natureza, ou o seu descuido, não traz consequências apenas para a própria natureza, mas também para o homem. Por isso, o pontífice traz na encíclica os conceitos de ecologia humana, relativos ao ambiente dignificante para a vida humana, e de ecologia do homem, referido à natureza do próprio ser humano, que deve ser respeitada, e não manipulada ou deturpada. Quando se trata da defesa da vida, penso, acima de tudo, na dignidade e inviolabilidade da vida humana e na promoção de tudo o que possa evitar agressões a ela. O ser humano é parte da natureza e depende dela; ao mesmo tempo, ele ocupa uma posição absolutamente única no conjunto dos seres deste mundo; e isso também lhe confere uma responsabilidade ímpar em relação ao cuidado da casa comum e dos outros homens. Persistem as agressões contra a vida humana e até assumem formas cada vez mais preocupantes. As guerras matam, ferem e desalojam, obrigando populações inteiras a migrar; e onde não há conflitos declarados, como no Brasil, as várias formas de violência matam mais 20
que as guerras em andamento nos vários países. E há também as vítimas das injustiças sociais, da fome ou de doenças e da falta de condições de vida digna e saudável. E quantas são as vidas humanas excluídas do seu direito de ver a luz! No Supremo Tribunal Federal (STF) está pendente uma decisão sobre a legalidade do aborto de bebês com microcefalia, o que poderá vir a configurar-se como mais um caso de aborto “legal” no Brasil. As questões envolvidas não são poucas, como o conforto da mulher gestante e de sua família, a frustração dos sonhos que toda mãe tem em relação ao filho que gera, o ônus social decorrente do cuidado de pessoas não totalmente autônomas... Mas está em jogo, sobretudo, a decisão de tirar a vida de um ser humano, que teve a infelicidade de ser afetado no seu desenvolvimento cerebral por causas absolutamente alheias à sua responsabilidade. Além do mais, coloca-se o problema do diagnóstico seguro para cada caso, pois, pelo que se sabe, a microcefalia não é passível de ser constada com segurança antes de um estágio avançado da gravidez. Na cultura tecnocrática e da eficiência, temos dificuldades para lidar com as deficiências e fragilidades humanas! Os “defeituosos” não terão o direito de viver? Só os sadios, os perfeitos, os que saíram conforme a encomenda? Se o aborto de bebês com microcefalia for aprovado, será aberta uma porta perigosa para a eugenia, que dificilmente poderá ser, depois, fechada de novo. Quais seriam as próximas categorias de fetos ou bebês defeituosos a serem incluídos na lista dos “legalmente abortáveis”? Alega-se que outros países já resolveram essa questão pela legalização ampla e generalizada do aborto, conforme desejo da gestante ou de terceiros. Infelizmente, isso é verdade, mas não deveria ser tomado como bom exemplo, ou sinal de avanço jurídico e moral a ser imitado. Regimes totalitários, ao longo da História, recorreram à eugenia para “depurar” a população, mas isso tem sido rejeitado pelo senso moral dos povos civilizados. No Brasil ainda falta uma legislação específica que valorize e tutele a vida humana antes do nascimento. A Constituição brasileira consagra o direito inviolável à vida e no capítulo quinto, inciso décimo, reconhece que a vida humana começa na concepção; apesar disso, a violação do direito à vida de seres humanos ainda por nascer é tolerada e até promovida por projetos que pretendem tornar legal o aborto, quer de maneira generalizada, quer de maneira pontual, para situações específicas. No Congresso Nacional tramita o Estatuto do Nascituro há vários anos, mas não avança, e os motivos são conhecidos: ele seria uma barreira para projetos abortistas, que também não faltam no Congresso. O estatuto poderia ser um válido instrumento de proteção da vida nascente e causa estranheza constatar que a legislação brasileira não tenha avançado nessa linha. Também falta uma legislação adequada sobre a manipulação genética e mesmo de embriões. Essas questões, relativamente novas, mas complexas do ponto de vista ético, deveriam merecer uma atenção especial dos legisladores. O Estatuto do Nascituro não anularia a legislação vigente, nem o Código Penal; e não deixaria de proteger a mulher gestante. Ao contrário, traria maior segurança a ela, dando-lhe garantias para uma gravidez digna e segura. O equívoco praticado com frequência consiste em opor a gestante ao seu bebê e, com facilidade, é negado o direito deste para resguardar o direito da mãe. O Estado tem a obrigação de cuidar de ambos e de proteger, mais ainda, a parte mais frágil e indefesa. *Cardeal-arcebispo de São Paulo
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ICC na ONU – comércio e competitividade Precisamos incrementar o debate sobre abertura, competitividade e nossa inserção global Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, *Daniel Feffer 08 Outubro 2016 às 03h02 A Assembleia-Geral da ONU será palco, nesta segunda-feira, de uma votação da maior importância para a melhoria do comércio global. Os Estados-membros terão à frente projeto de resolução que visa a conceder status de “observador” na ONU à International Chamber of Commerce (ICC), cujo comitê brasileiro tenho a honra de presidir. A Confederação Nacional da Indústria é grande aliada do ICC Brasil. Quase centenária, a ICC é uma instituição que emergiu em 1919, na conjuntura do pós-1.ª Grande Guerra e está voltada para a promoção do livre-comércio e a solução negociada de controvérsias. Assim, seus objetivos coincidem com os da ONU. O pioneirismo da ICC no estabelecimento de padrões para cartas de crédito ou na Corte Internacional de Arbitragem é reconhecido por todos. Vale também destacar que a ICC conta em seus quadros com algumas das lideranças empresariais mais influentes do mundo. Espaços que congreguem as comunidades empresariais e diplomáticas são crescentemente relevantes. Tanto mais quando se observa num contexto mais amplo a dramática evolução de forma e conteúdo por que passa o comércio global. Há 25 anos, no rescaldo da guerra fria, as trocas internacionais apontavam para uma grande interdependência das cadeias produtivas – primado das manufaturas, integração econômica e política regional como tendências irreversíveis. Hoje, no entanto, há uma escalada do protecionismo em diferentes nações. A esse fenômeno em geral se associam argumentos de visão parcial. Essa tendência se verifica mesmo em economias mais afeitas aos princípios de livre mercado. EUA e Europa, em reação atabalhoada à crise de 2008, flertam com mais protecionismo e “conteúdo nacional”. Isso se reflete na corrida à Casa Branca, nas motivações mais nacionalistas que levaram ao Brexit e no atual debate político em países como França e Alemanha. O resultado a pagar é alto. O mundo está “menos plano”. Com isso, retórica e prática antiglobalizantes ganham força. Se companhias americanas ou europeias perderam eficiência, difunde-se a miopia com mais fechamento. Talvez tais medidas mantenham, no curto prazo, empregos locais e geração de impostos nas jurisdições nacionais. Resulta disso que o atual volume de comércio global retornou ao patamar de 2009 – onerando sobretudo os consumidores nos mais diferentes países. Em paralelo a vetores antiglobalizantes, o comércio internacional também ruma para maior complexidade e mesmo sua “desmaterialização”. Cloud computing, inteligência artificial, modelagem, design e impressão em 3D compõem o que se vem chamando de Indústria 4.0. Nesse quadro complexo, que inclui paradoxos como menor propensão ao comércio e a ascensão de bens intensivos em alta tecnologia, uma cooperação mais intensa entre ICC e ONU é fundamental. Ela também ajudaria a fortalecer, de forma indireta, a missão da Organização Mundial do Comércio, competentemente dirigida pelo embaixador Roberto Azevêdo. Além disso, essas tendências desglobalizantes não durarão para sempre. No atual cenário, poucos países apresentam desempenho brilhante. Isso convidará em breve à retomada de maior interdependência econômica. Com presença ainda mais efetiva na ONU a ICC ajudará a defender e propagar novas formas de comércio. E, portanto, também a conceber mecanismos que permitam a inclusão competitiva de empresas de pequeno e médio portes, bem como países de menor desenvolvimento relativo. 22
A atual elevação dos custos de produção na China cria novos fluxos de comércio em que nações de menor custo relativo ingressam competitivamente na cadeia de fornecimento – é o caso da vizinhança asiática ou mesmo para parceiros na África e na América do Sul. Com a arremetida de outras estrelas asiáticas, como Índia e Indonésia, inauguram-se correntes globalizantes na consolidação de novos hubsindustriais e no surgimento de novos choques de demanda por commodities – o que beneficiará países de menor grau de complexidade econômica. Ao longo da História o Brasil preteriu a questão da competitividade. Daí não surpreender ostentarmos a posição de país mais fechado dentre as 20 maiores economias do mundo. Comércio exterior e tecnologia, mais que eliminar postos de trabalho, transformam-nos mediante treinamentos e estratégias inovadoras e criam mais oportunidades para trabalhadores e empresas. Países de diferentes regiões, desenvolvimento relativo e trajetória cultural utilizaram o comércio como principal motor de sua ascensão nos últimos 70 anos. Isso vale para Japão ou Chile, Alemanha ou Coreia do Sul, China ou Espanha. Precisamos – governo, academia e empreendedores – aumentar o debate sobre competitividade e abertura no Brasil. Temos, assim, de incrementar a governança de nossa inserção global. É por isso que temos feito gestões para que o governo do País endosse o status de observador à ICC na ONU. Isso lhe permitirá somar esforços ao lado do Brasil no restabelecimento da confiança do setor privado e na retomada do crescimento econômico do País. O Brasil pode se beneficiar da articulação com os mais de 90 comitês nacionais da ICC para melhorar o fluxo de comércio com tais países, além de contar com o apoio de comissões temáticas em políticas de investimento, financiamento do comércio, inovação, propriedade intelectual, meio ambiente e energia em ações transacionais que promovam a melhoria do ambiente de negócios. Nesta conjuntura adversa de protecionismo e populismo, mesmo em democracias avançadas, garantir a presença da ICC na ONU é de particular relevância – tanto mais no momento em que o País precisa, como nunca, expandir sua fatia no comércio global. *Chairman do icc brasil, é vice-presidente do conselho da Suzano papel e celulose
A Lava Jato e o crime desorganizado no Brasil Chamar de organização o vale-tudo do petrolão é ofender ‘instituições’ como a Máfia siciliana Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Barry Wolfe 09 Outubro 2016 as 05h00 Ao apresentar recente denúncia contra o ex-presidente Lula, procuradores do Ministério Público Federal acusaram-no de ser comandante de uma “organização criminosa”. O uso dessa expressão forte, que continua causando ruídos no Fla-Flu que o cenário político brasileiro se tornou, merece exame mais atento. Para ser bem claro, a verdade é que os esquemas de propina investigados pela Lava Jato podem ser muita coisa, mas chamá-los de “organização” não parece correto. Há um sutil erro no uso desse termo que vale a pena analisar. Os criminologistas italianos Della Porta e Vannucci demonstram que para um esquema corrupto funcionar, quando envolve muitas partes e grandes quantias, a corrupção tem de ser sistêmica. E corrupção sistêmica tem duas características principais. Primeiro, tem de haver regras de jogo claras e respeitadas por todos os envolvidos – por exemplo, estabelecendo que, uma vez combinado o valor da propina, o “prestador do serviço” entrega exatamente o prometido pelo preço acertado. 23
A outra regra fundamental é a obrigação de sigilo, nunca falar da transação e jamais dedurar os participantes. Esta segunda característica mostra a existência de um sistema de “governança” para garantir a adimplência das regras. Em termos de dinâmicas organizacionais, esses são nada mais, nada menos que os dois pilares do crime organizado propriamente dito. A obrigação de sigilo é o vínculo de coesão dos envolvidos, de comprometimento mútuo – chamado no Brasil de “rabo preso”. Para entrar no grupo um novo integrante tem de ter o “rabo preso” com seus confrades. Na Máfia siciliana, o arquétipo de crime organizado, esse processo tem nome, Omertà. Para ser aceito como membro pleno da família o novato deve cometer um assassinato. Assim ele fica comprometido. Não só ele, cada participante está da mesma maneira comprometido com os outros. Cada indivíduo possui informações que podem incriminar os demais. Daí, se todos ficam quietos, todos estão protegidos; se um abre a boca, todos se tornam vulneráveis – e a casa pode cair. O outro pilar é a contrapartida do primeiro. Toda organização criminosa tem um mecanismo para manter seus membros na linha, o que, na prática, envolve ameaçar e intimidar o potencial violador das regras, até usar da violência física se e quando necessário. No Brasil, essa parte é conhecida como “queima de arquivo”. Porém aqui esse conceito é mais restrito e tem origem na ditadura, quando se referia à eliminação de provas. Numa organização criminosa, a destruição de evidências comprometedoras é só um aspecto, nem sequer o mais básico, de seu modus operandi. Mais importante é garantir o cumprimento das obrigações, sendo a mais fundamental a de calar a boca. Isso implica enviar uma mensagem clara a potenciais dissidentes advertindo sobre o que vai acontecer com eles se transgredirem. Olhando pelo prisma desses conceitos, o esquema de corrupção investigado pela Lava Jato representa o ápice do crime desorganizado. Para começar, não havia regras claras – e as que havia nem sempre eram cumpridas. Quem pagava propina não tinha certeza se o acordo seria honrado. Os ditos “lobistas” e outros intermediários ofereciam resolver situações, aceitavam de bom grado o dinheiro e nem sempre entregavam o serviço. Ou pediam mais dinheiro e, ainda assim, às vezes não davam o prometido. Pior, alguns exigiam pagamento de propina na caradura, sem nenhuma oferta em troca e sob ameaça de prejudicar o pagador. Extorsão pura. Isso ocorria porque não havia ninguém para controlar as transações – isto é, para garantir o cumprimento das regras. O que se percebe agora, com uma certa perspectiva, é que os esquemas revelados pela Lava Jato eram uma mistura de gula, Lei de Gerson e da mais imaculada sensação de impunidade. Quem pagava propina aceitava seu papel de vítima e otário. Quando a Lava Jato começou, usando prisão preventiva para forçar delação premiada, com base no modelo italiano da Operação Mãos Limpas, a atividade de dedurar virou bola de neve, superando todas as expectativas dos promotores. Trata-se apenas do antigo jogo do dilema do prisioneiro. Nele, dois presos são postos em celas separadas. Se os dois ficam quietos, ambos se salvam. O objetivo dos captores é convencer ao menos um deles de que seu colega abriu a boca. Se ele acredita nisso, tem de falar também para se salvar ou, pelo menos, mitigar sua situação. Para usar uma dessas metáforas de filme de máfia, no caso da Lava Jato a delação corre solta porque não há uma equipe de gângsteres durões para passar simples mensagem: cale a boca ou você ou sua família serão mortos. Claro, isso é apenas metafórico – mas, como se viu, a existência de algum tipo de controle pela ameaça é condição sine qua non para configurar a organização criminosa. 24
Chamar de “crime organizado” os esquemas de falcatruas que envolveram Petrobrás, políticos, empreiteiras, agências de publicidade e outros atores, portanto, chega a ser quase ofensivo a “instituições” como a Máfia, esta, sim, organizada. Talvez o modelo criminoso mais próximo do que ocorreu no Brasil seja o das gangues, nas quais o vale-tudo impera. Ou, caso se queira ficar em terminologia próxima à eleita pelos procuradores federais, bem cabe a expressão “desorganização criminosa”. Seja qual for a escolha das palavras, isso demonstra que a situação é ainda mais assustadora do que aquela que seria traduzida por uma “organização”. Nesta, ao menos, há regras, ou seja, algum tipo de limite. No vale-tudo, não. Chamar de organização o vale-tudo do petrolão é ofender ‘instituições’ como a Máfia siciliana *ADVOGADO PÓS-GRADUADO EM DIREITO ECONÔMICO PELA YALE LAW SCHOOL, MESTRE EM DIREITO INTERNACIONAL POR CAMBRIDGE, É DIRETOR DA WOLFE ASSOCIATES (WWW.WOLFE.COM.BR), CONSULTORIA EM COMPLIANCE PREVENTIVA, AVALIAÇÃO DE RISCOS E INVESTIGAÇÃO DE FRAUDES CORPORATIVAS
Bomba para 2018 Desemprego aumenta a pressão da população pelo atendimento na área social Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Amir Khair* 09 Outubro 2016 as 05h00 Neste mês, o governo joga todas as suas fichas para aprovar a PEC 241, que congela por 20 anos a despesa primária (que exclui juros) do governo federal. Após isso, quer a reforma da Previdência, considerada fundamental para permitir a gestão da PEC 241. Segundo o governo, ou são aprovadas essas propostas pelo Congresso, ou o Estado quebra. Não penso assim, pois existe alternativa melhor como se verá à frente. A PEC 241 vai congelar as despesas primárias no nível de R$ 1.280 bilhões em valores atuais, sendo 40% com Previdência, 20% com pessoal, 20% com outras despesas obrigatórias e 20% com despesas não obrigatórias. Como a despesas com Previdência têm crescimento vegetativo anual de cerca de 4% irá comprimir as demais despesas, como as sociais destinadas a Estados e municípios. Além disso, a renegociação da dívida dos Estados com o governo federal irá impor, também, congelamento de despesas aos Estados, o que reduzirá suas despesas sociais e para seus municípios. Assim, serão reduzidos os recursos a serem destinados às áreas sociais no governo federal, estadual e municipal. Por seu lado, o desemprego elevado e crescente aumenta a pressão da população pelo atendimento na área social e o congelamento vai agravar mais ainda essa situação a cada ano pelo crescimento da população. Isso aponta para tensão social crescente. Outra tensão social é a mudança nas regras da aposentadoria, que já está trazendo desgastes. Há alternativas melhores para tratar o problema fiscal da Previdência. Volto ao tema proximamente. A proposta do governo descarrega o peso da crise em cima da classe média e de menor renda e preserva os bancos e rentistas. Em vez de atacar os juros ataca as despesas sociais. Vejamos a questão fiscal. De 2010 a 2013 o déficit fiscal do setor público esteve sempre abaixo de 3% do PIB, com média de 2,5% do PIB. Foi um bom desempenho na comparação histórica e internacional. É em 2014 que ocorre o problema fiscal, com forte elevação de despesa devido à disputa eleitoral.
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Em 2015, apesar da contenção de despesas, o aprofundamento da recessão e elevação das despesas com juros, o déficit público explodiu atingindo 10,4% do PIB, sendo causado em 82% por juros, 13% por perda de arrecadação e apenas 5% pela elevação de despesas, mesmo tendo pago R$ 55,6 bilhões de pedaladas fiscais feitas antes de 2015. Neste ano, o déficit fiscal deve se aproximar novamente de 10% do PIB, com explicação semelhante à ocorrida em 2015. Assim, para enfrentar a questão fiscal é fundamental atacar suas causas: juros, recessão/perda de arrecadação e contenção de despesas, nessa ordem. A proposta do governo foca só nas despesas. Considera juros e perda de arrecadação em segundo plano e dependentes do sucesso na contenção de despesas. As análises, no entanto, mostram que pela proposta do governo a relação dívida/PIB vai continuar subindo dos atuais 70% do PIB podendo ultrapassar 100% do PIB em poucos anos caso não recuem de forma significativa as taxas de juros que incidem sobre ela. O problema é que, no nível atual da dívida, soluções que não reduzam rapidamente os juros só vão agravar o déficit fiscal. Isso implica, como tratado nesta coluna, eliminar até o fim de 2017 vários desperdícios fiscais: a) excesso de US$ 200 bilhões em reservas internacionais; b) R$ 1 trilhão de disponibilidade do Tesouro Nacional (TN) no Banco Central sem rendimentos e; c) R$ 521 bilhões emprestados pelo TN ao BNDES (bolsa empresário). Junto com a eliminação desses desperdícios a Selic deveria ir para o nível da inflação projetada para os próximos doze meses como se faz internacionalmente. Essas medidas, não dependem do Congresso e podem ser implementadas gradualmente até o fim de 2017. Permitirão ao final do próximo ano levar a relação dívida/PIB para o nível de 40% em linha com a média dos países emergentes. Penso que ao atingir a classe média e de menor renda este governo pode estar criando uma bomba para 2018. * Mestre em finanças públicas pela FGV e consultor. Escreve quinzenalmente.
O 'AT' e o 'DT' Temer dá sua maior cartada nesta semana, mas a Lava Jato continua Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Eliane Cantanhêde 09 Outubro 2016 as 05h00 A votação do teto de gastos públicos, principal item da agenda política desta semana, tende a ser um divisor de águas do governo Michel Temer. Pela ansiedade no Planalto, a efervescência no Congresso, o envolvimento direto de Henrique Meirelles e a ofensiva política e midiática do próprio Temer, a expectativa é de AT e DT: “Antes do Teto” e “Depois do Teto”. Até aqui, o “Fora, Temer”, a desconfiança da população, a economia estagnada, os empregos evaporando, as críticas e as concessões políticas para aprovar propostas essenciais contra a crise que Dilma Rousseff criou e não teve força política nem competência para frear. O melhor exemplo dessas propostas é a meta fiscal, mas essa não foi a única vitória do novo governo no Congresso. Depois da aprovação do teto, possivelmente nesta terça-feira, Temer parece convencido de que far-se-á (estilo dele...) a luz: o mercado vai cair de amores pelo governo, os investimentos virão aos borbotões, deputados e senadores serão menos vorazes, a imprensa ficará menos cética, a população vai olhar para ele com novos olhos. E tudo isso vai desembocar na recuperação da economia e dos empregos. É preciso combinar direitinho com todos esses russos para sair de um ambiente tão sombrio para um outro tão solar, além de rezar bastante para que a Lava jato não afogue um ministro daqui, outro dali. Posta a ressalva, a vida do governo tende a ficar bem melhor quando, e se, a 26
proposta de emenda constitucional (PEC) que estabelece um teto de gastos por 20 anos for aprovada. É o aval para a volta da responsabilidade fiscal e a normalização da vida econômica – logo, da vida nacional. É preciso 306 votos, mas nas contas palacianas o projeto já tem 350 e pode engordar para 380, porque Temer não poupou calorias: tomou café da manhã com governadores, almoçou com jornalistas, jantou com parlamentares e hoje mesmo abre as portas do Alvorada para uma ceia de 300 talheres para deputados e suas mulheres já estarem em Brasília amanhã cedo. Por falar nisso, Temer não gosta nada quando lê, ou ouve, que o governo “usa” a bela e jovial primeira-dama Marcela para amenizar a sisudez e o machismo da equipe (ou do próprio Temer?). Mas o fato é que Marcela adentrou o espaço político com o Criança Feliz e vai com o marido à Índia e ao Japão, enquanto cuida de um outro símbolo da Presidência: a mudança do Jaburu para o Alvorada. No DT, também é prevista uma relação cada vez mais institucional com movimentos que estão no lado oposto. Eliseu Padilha, da Casa Civil, já recebeu o MST e depois Guilherme Boulos, do MTST, líder em ascensão da esquerda urbana. Primeiro resultado: Temer vai liberar todos os documentos de posse de terra que estavam engavetados com Dilma. E estuda-se um elo entre MTST e o Minha Casa Minha Vida. Tudo muito bem, tudo muito bom, mas... a Lava Jato continua. Temer ganhou gás com a eleição municipal (que furou o balão do PT) e pretende voar alto com a aprovação do seu principal projeto, mas Justiça, MP, PF e delatores não mudarão um tico do AT para o DT. Logo, o governo deve caminhar cada vez mais desenvolto, mas com a Lava Jato nos calcanhares. Ou melhor, nos calcanhares de todo o mundo político. Paz. O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, agora Nobel da Paz, mandou três recados para Lula e Dilma numa entrevista que me deu em 2010: a guerrilha era um problema interno da Colômbia, não aceitava mediação brasileira nem da Unasul e reclamava que o Brasil (enfim) declarasse as Farc como “grupo guerrilheiro”. “A única forma de abrir algum diálogo com eles (as Farc) é abdicarem de ações terroristas, e o Brasil e o mundo precisam compreender isso”, alertava. Assim foi feito. Parabéns a Santos!
Lógica militar Ela é direcionada para ações de combate a inimigo, não ao controle do povo do seu país Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Mario Cesar Flores* 09 Outubro 2016 as 05h00 Ela é direcionada para ações de combate a inimigo, não ao controle do povo do seu país Vem sendo comum o emprego das Forças Armadas – principalmente do Exército e, em certas circunstâncias, dos Fuzileiros Navais – na segurança pública, com intervenções tipicamente policiais. Esse apoio federal aos Estados costuma ser ou, pelo menos, deveria ser provido inicialmente pela Força Nacional de Segurança Pública, força policial criada para essa finalidade e controlada pelo Ministério da Justiça. Como nem sempre isso é possível, suficiente ou adequado ao problema, recorre-se às Forças Armadas. Cria-se, assim, uma corresponsabilidade militar federal numa atividade em princípio da alçada policialestadual. Corresponsabilidade que o povo, anestesiado pela farda e pelos carros do Exército nas ruas, tende a ver como a protagônica. O artigo 142 da Constituição de 1988, de fato, admite esse tipo de atuação das Forças Armadas – “(...) destinam-se à defesa da pátria, dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer
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um destes, da lei e da ordem” –, mas, na realidade, a iniciativa tem sido dos governadores. O presidente da República apenas autoriza. O que se depreende do preceito constitucional? É evidente que ele deva abranger o emprego das Forças em situações graves e transitórias, que estejam além da capacidade policial por exigirem efetivos maiores do que os disponíveis nos sistemas policiais no controle do Rio de Janeiro durante a Olimpíada Rio 2016 foram usados 23 mil militares federais e/ou táticas e equipamentos só existentes nelas. Mas abrangeria o controle policial rotineiro? O policiamento parapolicial, por longo tempo, de favelas do Rio de Janeiro, por exemplo? O secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro preconizou recentemente, em entrevista à TV, a continuidade do imenso esquema federal de segurança que o Estado teve à disposição durante a Olimpíada! O fato é que, embora não deva ter sido esse o propósito dos constituintes de 1988, o emprego das Forças Armadas vem sendo frequente nas vicissitudes da insegurança pública. Essa prática induz dois tipos de problema. O primeiro, o risco cultural. Povo e políticos tendem a ver as Forças (novamente, sobretudo o Exército) mais – o povo menos informado, até apenas – como instrumento da segurança pública do que da defesa nacional clássica. Essa tendência é transparente na mídia: a participação das Forças Armadas na esfera policial é objeto de referência frequente, aprovando-a ou criticando eventuais falhas. A conveniência da participação nunca é posta em dúvida. Já os percalços do preparo para a defesa nacional raramente merecem atenção. É a mídia refletindo a preocupação do povo com o nível da insegurança pública atualmente vigente no País e sua despreocupação com a defesa. Até mesmo nas Forças Armadas há o risco de emergir a sensação, ainda que inconsciente, de que elas se justificam no Brasil porque seriam essenciais à imposição do respeito à lei e ao controle da ordem. Realmente, justificam-se também por isso; mas em que grau, como e quando? O segundo problema, complemento do primeiro, é a tendência à complacência com as restrições que vêm cerceando o preparo militar para a defesa nacional, obviamente a contragosto nas Forças. O preparo para a defesa é caro e a não percepção de ameaças propriamente militares (até quando isso é seguro...?) estimula a tendência, simpática a políticos e ao povo, que, alheios à complexidade do preparo militar projetado no tempo, olham a defesa clássica como tema vago e secundário o povo até compreensivelmente, mas não o mundo político, corresponsável por ela. E simpática à burocracia financeira da União também compreensivelmente sob a perspectiva funcional, que vê no sufoco orçamentário uma injunção inexorável do quadro fiscal brasileiro. Em suma: a patrulha parapolicial típica do dia a dia da segurança pública não condiz rigorosamente com a lógica que alicerça as Forças Armadas, naturalmente direcionada para ações de combate a inimigo, e não ao controle do povo de seu próprio país. O apoio federal na superação das deficiências estaduais, conveniente aos Estados porque estende suas responsabilidades à União e bem visto pelo povo pressionado por sua insegurança, é atuação que, levada à frequência, à intensidade (na ação) e à extensão (no tempo) excessivas, tende a “desmotivar” o preparo para a missão básica das Forças Armadas e razão de sua existência. O assunto está a exigir cuidado. Não se trata de rejeitar o papel das Forças na segurança interna e pública. Isso seria inviável no Brasil de hoje, onde as atribuições dos sistemas policiais precisam de fato ser atendidastambém pelas Forças Armadas. Repetindo: também, mas apenas em ocasiões ou episódios em que se caracterize a insuficiência ou incapacidade dos sistemas policiais e uma vez esgotado o potencial de apoio da Força Nacional de Segurança – o que inclui grandes eventos, como foi a Olimpíada Rio 2016. 28
Mais do que nessas atividades ao estilo policial, a contribuição militar para a segurança pública deve ocorrer, aí, sim, rotineira e intensamente, onde ela é compatível com a sua missão básica: o controle da fronteira terrestre, permeável ao fluxo de armas e drogas, que pesam forte na epopeia da insegurança pública. Pela mesma razão, também o controle da fronteira marítima, que, inexistindo guarda costeira, é encargo da Marinha. O crédito popular e político, de relevância significativa, à atividade parapolicial das Forças Armadas “fortalece” o governo federal no âmbito interno e fragiliza a expressividade brasileira no internacional. É preciso deixar claro que a relevância deve caber à defesa nacional, de conformidade com a lógica militar de país organizado, com suas instituições corretamente estruturadas e preparadas para suas atribuições. *Almirante
Desobediência cidadã Do alto de seu livre-arbítrio, eleitor avisa ao Estado que não aceita o voto impositivo Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Dora Kramer 09 Outubro 2016 as 05h00 Pelo que se viu nas análises sobre o resultado das eleições municipais, ficaram todos muito impressionados com o índice de abstenção. Na verdade, quase igual ao registrado em 2012. Na época foi pouco mais de 16% e agora pouco menos de 18%. Isso no cômputo da votação geral do País. Vistos do ponto de vista local, porém, os números são maiores, sendo o Rio de Janeiro o campeão de ausências com algo em torno de 26%. Um quarto do eleitorado. A julgar pelo que restou de escolha no segundo turno na cidade realmente maravilhosa, capital do Estado de fato em situação falimentar – Marcelo Crivella contra Marcelo Freixo, duas pontas extremas do espectro ideológico – o prezado leitor e a cara leitora não se iludam e preparem-se: o número de ausentes vai aumentar. Crescerá também a quantidade dos que consideram mais fácil anular ou optar pelo voto branco do que depois ir atrás de um cartório eleitoral para pagar multa irrisória (na média, menos de R$ 3), a fim de não ficar impedidos de tirar passaporte e carteira de identidade. Não são apenas essas as penalidades. Quem não vota não pode obter qualquer documento no caso de diplomatas e funcionários do Itamaraty; é excluído de participar de concorrências públicas nos âmbitos federal, estadual e municipal; não pode obter empréstimos em entidades direta ou indiretamente ligadas ao governo; é vetado na renovação de matrículas em escolas do ensino oficial e da inscrição em concursos públicos ou da tomada de posse nos cargos. Os funcionários públicos não recebem salários no segundo mês subsequente à eleição e todo e qualquer cidadão está impedido de praticar ato de exija quitações do serviço militar ou do Imposto de Renda. Portanto, as sanções não são leves quando faz crer a vã assertiva segundo a qual o voto no Brasil na prática é facultativo. Entre outros e principal motivo em decorrência da multa irrisória. Importante que as pessoas saibam das restrições e dos aborrecimentos decorrentes da abstenção eleitoral para que não se iludam com a ideia de que na prática o voto é facultativo devido a uma penalidade sem maior significado. O Estado castiga pesado quem não vota, exercitando um direito de não ir às urnas. Coisa que na maioria ampla das democracias no mundo é garantida aos cidadãos. Nelas, o voto é um direito. Aqui é tratado como obrigação. Imposição negada por boa parte do eleitorado que, por isso, é tratada como alienada, boboca, sem noção. Convicção compartilhada por partidos à direita e à esquerda, que na Constituinte de 1988 derrotaram a proposta do voto facultativo sob o argumento (até hoje vigente) de que o voto obrigatório seria uma garantia democrática em país de pouca educação. Por essa ótica, seria necessário 29
esperar que o Brasil e os brasileiros tivessem um grau cultural tido como “razoável” para ter a liberdade de votar. Ou não. O eleitor que não quer votar é alvo de preconceito. Visto como alienado, não engajado, praticamente um pária da civilidade. Isso porque se convencionou dizer que o voto obrigatório é uma garantia do exercício da cidadania. Bobagem. O cidadão exerce seus direitos na plenitude se tiver liberdade para tal. Conforme ocorre na quase totalidade das democracias de mundo, nas quais neste aspecto o Brasil é exceção. Posta na mesa e reconhecida a jabuticaba quase que exclusivamente brasileira, resta reconhecer: o eleitor depôs, derrotou no cotidiano a obrigatoriedade do voto, numa das mais belas, contundentes e definitivas rejeições ao voto obrigatório. Só falta o universo dos políticos cair em si, abrir mão da reserva de mercado e se adequar ao mundo real para defender e adotar o voto facultativo já.
Os riscos de uma democracia plebiscitária Consultas populares são avessas a debates aprofundados Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Helio Gurovitz 09 Outubro 2016 ‘as 05h00 “Conservadores”, desses que habitam as redes sociais, comemoraram o resultado de plebiscitos recentes, como a rejeição do acordo de paz com as Farc na Colômbia ou a saída do Reino Unido da União Europeia. Mas conservadores como Edmund Burke ou James Madison sempre preferiram a democracia representativa à direta e desconfiavam dos plebiscitos. “Eles acreditavam em liderança política e na influência popular – nenhuma das duas estaria certa o tempo todo, mas o equilíbrio ajudaria a corrigir as falhas de ambas”, escrevem os cientistas políticos Christopher Achen e Larry Bartels no livro Democracy for Realists. Consultas populares são avessas a debates aprofundados, reféns de máquinas de propaganda e do interesse de grupos específicos, em detrimento da maioria. Achen e Bartels citam plebiscitos americanos dos anos 1950 e 1960, que rejeitaram, por maioria superior a 60%, a adição de flúor à água, apesar do benefício comprovado à saúde dentária. Em Oakland, na Califórnia, mais de 73% da população aprovou uma medida que reduzia gastos com bombeiros. Anos depois, um incêndio devastador demorou a ser contido – deixou 25 mortos e 100 casas destruídas. A imprensa em peso com Hillary Já declararam apoio à candidatura Hillary Clinton:New York Times, Washington Post, Los Angeles Times, USA Today, Boston Globe e dezenas de outros jornais regionais, entre eles os tradicionalmente republicanos Arizona Republic, Cincinnati Enquirer eDallas Morning News. No Wall Street Journal, uma integrante do conselho editorial disse apoiar Hillary. Theresa May não é Margaret Thatcher A premiê britânica, Theresa May, decepcionou quem acreditava que ela adotaria uma versão menos radical do “Brexit”. Para agradar ao eleitorado nacionalista, defendeu, na conferência do Partido Conservador, não apenas o controle da imigração, mas também um anátema para os Tories: a intervenção estatal na economia. Não faz sentido compará-la a Margaret Thatcher. A espionagem, estilo Marissa Mayer Não está claro o que motivou a CEO do Yahoo, Marissa Mayer, a autorizar, dois anos após as revelações de Edward Snowden, e à revelia da própria equipe de segurança, a varredura de emails para fornecer dados à Agência de Segurança Nacional (NSA). As empresas denunciadas
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por Snowden – Microsoft, Apple e Facebook – diziam agir sob mandado judicial, depois revogado. No Yahoo, a NSA encontrou agora outro meio para espionar. Mark Zuckerberg aposta na África O CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, fez uma visita surpresa à sede da empresa em Lagos, na Nigéria. Conheceu startups nigerianas e ensinou crianças de 7 e 8 anos a programar. Seu interesse, além de fortalecer a indústria de software na região, é disseminar o Free Basics, programa em favor do acesso universal à internet. Ops, ao Facebook. O véu que encobre o xadrez Uma questão atormenta os organizadores do campeonato mundial de xadrez de 2017, no Irã. A campeã americana e 98.ª colocada no ranking mundial, Nazi Paikidze, de 22 anos, afirmou que se recusa a usar o véu enquanto jogar, como determina a lei iraniana. Mais de 3 mil já subscreveram um abaixo-assinado solicitando que o evento mude de lugar ou que o traje não seja obrigatório. A identidade fiscal de Elena Ferrante O jornalista Claudio Gatti foi enxovalhado por revelar que Elena Ferrante, pseudônimo da italiana cujas vendas chegam a 4 milhões de exemplares, é na verdade Anita Raja, tradutora casada com o juiz e escritor napolitano Domenico Starnone. Gatti apontou uma tentativa de elisão fiscal na compra de uma cobertura de 230 metros quadrados na capital, Roma, registrada por Starnone em junho. Só nos últimos dois anos, Raja recebeu € 10,7 milhões. Globalização "Cabe a nós escrever um novo futuro. Deve ser de crescimento econômico não apenas sustentável, mas compartilhado" - Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, em artigo na Revista The Economistem defesa da globalização.
Oportunidade para voltar a crescer FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, ROBERTO EGYDIO SETUBAL 09/10/2016 às 02h00 Desde 2011, o Brasil vem experimentando uma taxa de crescimento econômico de 1% ao ano, abaixo da média mundial (3,5% ao ano) e até mesmo abaixo da dos países latino-americanos (2,8% ao ano). Considero esse desempenho no mínimo constrangedor para um país com nosso potencial. Nos últimos anos, essa baixa performance se acentuou como consequência dos impactos negativos da deterioração das contas públicas. Entre 2013 e 2016, saímos de um superavit para um deficit primário crescente e estrutural. A dívida pública acelerou e ultrapassou 70% do PIB, acima da média de 50% de outros países emergentes. A desconfiança quanto à sustentabilidade fiscal brasileira trouxe consequências muito ruins para a sociedade: a inflação e o desemprego voltaram ao patamar de dois dígitos e o PIB recuou 7%, afetando dramaticamente o bem-estar das famílias brasileiras. Nesse mesmo período, os demais países do mundo cresceram em média 2,5% ao ano, demonstrando claramente que cometemos erros na condução das políticas macroeconômicas, independentemente dos problemas da economia global. O pior de tudo, a meu ver, foi constatar que a renda per capita do brasileiro atingiu o menor nível desde 2007.
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Acredito que boa parte desse baixo crescimento econômico nesses seis anos -e a acentuada piora nos últimos três- seja consequência da tendência ininterrupta de extraordinário aumento do gasto público, que nos últimos 20 anos cresceu a uma taxa média de 6% ao ano, acima da inflação. Evidentemente, essa é uma trajetória insustentável, pois é uma evolução muito acima daquela que tivemos na atividade econômica no mesmo período. Para manter um frágil equilíbrio fiscal, o aumento dos gastos teve como contrapartida semelhante crescimento na arrecadação de impostos, comprimindo excessivamente a capacidade de investimento do setor privado. Enfim, essa política mostra-se claramente esgotada, incapaz de reestabelecer o crescimento econômico. O governo propõe, através da PEC 241, o controle da expansão dos gastos públicos como forma de restabelecer o equilíbrio fiscal, condição necessária, a meu ver, para atingir esse objetivo. A história econômica mostra que países que efetuaram ajustes fiscais pelo controle de despesas voltaram a crescer mais rapidamente do que aqueles que optaram por fazê-lo através do aumento de impostos. Dessa forma, é importante observar que a proposta não inventa nada, não é uma nova "jabuticaba", já foi testada e funcionou com sucesso em diversos países. Se aprovada a PEC, retomaremos no Brasil a capacidade de planejar e de prever cenários e haverá, portanto, menos incertezas para decidir investimentos. Adicionalmente, reduziremos o prêmio de risco, hoje muito alto no Brasil. Deixaremos de sofrer com a instabilidade financeira, em que câmbio e juros variam excessivamente em prazos curtos, o que torna muito difícil a administração de empresas, particularmente a das pequenas e médias. Acredito ainda que, com a aprovação da PEC 241, finalmente estaremos criando as condições necessárias para termos inflação e juros reais baixos e, muito importante, de forma sustentável. Ainda, se aprovada a PEC, o Congresso, representando a sociedade, retomará seu papel de decidir a melhor forma de alocar recursos públicos através do Orçamento da União, em linha com as melhores práticas da governança democrática. Em suma, considero que o controle dos gastos proposto pelo governo é uma reforma-chave para o reequilíbrio das contas públicas e para a retomada do crescimento econômico. A proposta limita o aumento dos gastos à inflação e reduz gradualmente o descompasso entre receitas e despesas. É um ajuste suave, que se dará ao longo do tempo e com um resultado previsível. Reconheço, porém, que, para que tudo isso aconteça, outras reformas terão de seguir, sendo a mais óbvia a da Previdência. Mas há outras, como a política, a trabalhista, a do Judiciário, a tributária e ainda uma reforma do sistema financeiro. Entendo que precisamos tornar o sistema financeiro mais eficiente, reduzindo o custo da intermediação financeira. Para isso, precisamos reduzir o direcionamento, hoje excessivo, de recursos para fins específicos. A retomada do crescimento sustentável em níveis superiores à média mundial deve ser nosso objetivo, e teremos uma longa jornada para chegar lá. O primeiro passo é a aprovação da PEC 241.
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Qual a alternativa a ela? Aceitando que precisamos recuperar o equilíbrio fiscal (pois fora disso caminhamos para o caos, no estilo Venezuela), a única opção seria aumentar impostos. Entretanto essa é uma solução com resultados piores, como demonstra a experiência internacional. Aprovada a PEC, não será necessário aumentar tributos nos próximos anos. Neste momento, estamos claramente diante de uma decisão que pode mudar o destino do nosso país. A aprovação da PEC 241 propiciará, a meu ver, a retomada de um crescimento sustentável, que terá como consequência uma melhoria extraordinária das condições de vida da população brasileira. Não podemos perder essa oportunidade! ROBERTO SETUBAL é diretor-presidente do Itaú Unibanco Holding S.A.
Repensando o Brasil FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RUY MARTINS ALTENFELDER SILVA 09/10/2016 às 02h00 A Constituição brasileira de 1988 fixou o princípio segundo o qual a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com igual valor para todos. Estabeleceu ainda que o alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para os maiores de 18 anos e facultativos para os analfabetos, os maiores de 70 e os maiores de 16 e menores de 18. A nossa lei maior não permite proposta de emenda tendente a abolir, dentre outros, o voto direto, secreto, universal e periódico. As eleições municipais realizadas no último dia 2 de outubro registraram um fato que merece profunda reflexão: abstenções cresceram significativamente. A porcentagem de eleitores que não votaram alcançou 17,58%, contra 16,41% em 2012. No maior colégio eleitoral do país, a cidade de São Paulo, o número foi recorde: 21,84%, quase 2 milhões de pessoas, deixaram de votar. A soma de abstenções com votos brancos e nulos é superior ao total de votos obtidos pelo prefeito eleito, João Dória (PSDB) -3,096 milhões contra 3,085 milhões. No momento em que os brasileiros discutem as mudanças básicas de que o país precisa vem à tona o debate sobre a obrigatoriedade do voto, parte do núcleo básico da reforma política. As penalidades impostas aos que não cumprem o dever do sufrágio -como a multa brandanão fazem com que o ato se traduza, de fato, em uma obrigação. É necessário persuadir a população a participar do processo eleitoral. Eleitores de 55 cidades voltarão às urnas no dia 30 de outubro para escolher seus prefeitos. O eleitor deve se conscientizar da importância do seu voto. A tônica da avaliação reside na criteriosa escolha do candidato, priorizando os que mostram respeito ao cidadão e ao comportamento ético. A ética será um bom balizador para nortear o voto consciente, mas é preciso que o eleitor compareça às urnas. Ele tem o poder de repensar e transformar os destinos do seu município e do país. 33
RUY MARTINS ALTENFELDER SILVA é presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas, presidente emérito do CIEE - Centro de Integração Empresa-Escola e curador do prêmio Fundação Bunge
Governo consegue vitórias, mas país ainda está no brejo
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, VINICIUS TORRES FREIRE 09/10/2016 às 02h00 O governismo parece feliz feito pinto no lixo. Comemora a derrota da esquerda na eleição, que não chegou a ser vitória do Planalto. Antecipa vitória decisiva, a aprovação do "teto" de gastos no Congresso Nacional, que seria porém apenas a garantia de sobrevida em um tratamento longo e incerto. Mas há motivos para acreditar que vai se assentando o novo bloco de poder. O governo junta forças e vitórias relevantes, razões que a oposição quer desconhecer. A tunda na esquerda contribui para desmoralizar a oposição às reformas de Michel Temer. Encoraja quem pretende atravessar a "ponte para o futuro" mais liberal. Não mais que isso. Mais relevante, o governo até aqui demonstra organização parlamentar. Arregimenta apoio prático mais amplo entre os donos do dinheiro, mas não só, visível na campanha empresarial pela aprovação do "teto". Temer aprova leis importantes e distribui graças pacificadoras. Assim atenua oposições e assenta peças do "bloco de poder", a junção de forças políticas e socioeconômicas que acabam dando direção geral e base ao governo.
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Não é novidade, mas convém ressaltar as vitórias no Congresso, desde maio. O governo acaba de aprovar a mudança no pré-sal. Alivia a Petrobras, que aliás vai reformando, e atrai petroleiras privadas, bloco importante de investimento. Acaba de ampliar o Simples, menos imposto para a massa de pequenos empresários. Noutra frente, Michel Temer apaziguou os servidores por uns dois anos, com reajustes. Amenizou o arrocho de gasto público e social enquanto estiver no poder. Enfrenta o problema quase insolúvel da ruína iminente de vários Estados, mas aliviou a dívida de todos e ainda soltará algum capilé. Conversa bem com os governadores. Faz aliados no mundo de quem tem voz. "As ruas" se esvaziam. Apesar da impopularidade do presidente, que no entanto jamais foi popular, a confiança no futuro da economia ainda cresce. O conjunto dessa obra precária e a crença de que a aprovação do "teto" está no papo suscitam propagandas e autocongratulações precoces. Isto é, de que vai começar a era do milagre do crescimento temeriano. Não é assim. Caso aprove o "teto", o governo tem mais chance de sobreviver. Não necessariamente de dar certo. Os juros cairiam bem, fator de algum otimismo adicional e de recessão menor. O que viria depois é incerto. Mesmo o aumento de renda e massa salarial (de 1%) das estimativas otimistas para 2017 não basta para recuperar o que se perdeu desde 2013. A previsão de crescimento do crédito é zero. O investimento do governo não crescerá; o das estatais deve cair. A ociosidade nas empresas é imensa. Concessões de infraestrutura começariam apenas no fim do ano que vem, se tanto. Andam mal paradas, sem projetos, sem editais e com indefinição grave de financiamento. O impulso externo, exportações maiores do que a importações, vai diminuir, dados o real mais forte e alguma retomada do consumo doméstico. Algo se move, sim, mas num pântano grudento. A esquerda acha que o governo não passa de um golpe reacionário e inviável. A direita, que está por cima da carne seca. Nem isso nem aquilo. O país pode começar a sair do brejo. Mas cá ainda estamos.
Incômodo com Clara FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, SAMUEL PESSÔA 09/10/2016 às 02h00 O Brasil é um país desigual, injusto e de renda média baixa. A nossa tendência é sempre achar que a culpa é do outro: as multinacionais, ou, simplesmente, o capital.
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Não há, no entanto, nenhuma evidência de que o Brasil tenha sido explorado por esses agentes. Os juros da dívida externa e a remuneração do investimento estrangeiro são equivalentes aos que ocorrem nos demais países. Os bancos seriam outro candidato. No entanto, aproximadamente metade do sistema bancário brasileiro é público. Além disso, o Imposto de Renda sobre os seus lucros, incluindo a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, é de 50%. Finalmente, se a sua rentabilidade fosse tão elevada com se pensa, diversos bancos estrangeiros, como o HSBC, no ano passado, e o Citibank, agora, não estariam deixando o país. O Brasil possui uma elevada carga tributária em comparação com países em semelhante estágio de desenvolvimento, que prejudica o crescimento econômico. No entanto, a nossa oferta de serviços públicos decepciona, incluindo a capacidade de construir a infraestrutura física: portos, estradas, metrôs na grande cidade e saneamento básico. Como argumentei há duas semanas na coluna "Aquarius", várias distorções fazem com que parcela significativa dos impostos seja utilizada para transferir recursos a indivíduos que pertencem muitas vezes à elite da distribuição de renda. O caso mais claro é o gasto previdenciário, que atinge 13% do PIB (Produto Interno Bruto) ante gasto de 5 ou 6% em países com a mesma pirâmide demográfica. Há inúmeras distorções: os créditos subsidiados do BNDES; universidade pública gratuita; os regimes tributários especiais, lucro presumido e simples; as aposentadorias especiais no serviço público; aposentadorias aos 50 anos; baixas alíquotas do imposto sobre herança; acúmulo de pensão por morte com a própria aposentadoria etc. O resultado dessas distorções é a baixa capacidade de poupança do setor público, fato que está na raiz dos elevados juros reais necessários para segurar a pressão inflacionária, e, portanto, no elevado custo de rolagem da dívida pública. Este, portanto, é consequência, e não causa, para desespero daqueles que desejam achar um responsável externo pelos nossos males. Em muitos casos cada uma das distorções se justifica. Encerram benefícios obtidos na forma da lei, que, muitas vezes, requerem elevado sacrifício individual. Porém, os sacrifícios individuais não invalidam que esses programas foram subsidiados com expressivos recursos da sociedade, em muitos casos para grupos entre os 5% mais ricos. A justificativa caso a caso dos direitos e benefícios individuais não garante que o resultado agregado seja sustentável e socialmente justo. Ignorar as restrições econômicas e não priorizar com mais ênfase a justiça social são os pecados de nossas escolhas coletivas. No final das contas, escreveu meu amigo Marcos Lisboa há 15 anos, como no caso de Édipo, descobrimos que os responsáveis pela nossa miséria somos nós mesmos, os 5% mais ricos que se consideram classe média e objeto de inúmeras das distorções. Clara, a heroína de "Aquarius", é a nossa versão de Édipo. Nos próximos anos a sociedade terá de fazer um acerto de conta consigo mesma. Se não formos bem-sucedidos, retornaremos aos anos 80.
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O Brasil na liderança em favor do planeta FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, FABIO FELDMANN, DURWOOD ZAELKE E STELA HERSCHMANN 10/10/2016 às 02h00 A divulgação de uma imagem do buraco da camada de ozônio sobre a Antártica, na década de 1980, foi o grande gatilho que despertou a opinião pública mundial sobre os impactos da humanidade no planeta. A partir de então, a própria ONU convocou a célebre reunião ocorrida no Rio, em 1992, que culminou com importantes tratados internacionais, notadamente a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Poucos sabem que, antes da Eco 92, a Convenção de Viena de 1985 e o Protocolo de Montreal de 1987 já tratavam desta matéria, estabelecendo um calendário para a substituição dos CFCs (clorofluorcarbonos), os grandes responsáveis, à época, pela diminuição da camada de ozônio. É bom salientar que a camada de ozônio nos protege dos raios ultravioletas. Sua redução tem impactos adversos, como câncer de pele, catarata, diminuição da produtividade agrícola, dentre outros. Há países que medem constantemente a incidência desses raios, objetivando alertar a população para que se previna dos seus malefícios, com o uso de cremes protetores, e evite a exposição solar em certos horários do dia. O foco da opinião pública no início foi o uso dos CFCs como propelentes de aerossóis. Além dessa utilização, esses gases e seus substitutos, os HCFCs (hidroclorofluorcarbonos), são substâncias importantes na indústria da refrigeração e do ar condicionado, fazendo parte do nosso cotidiano. Entretanto, os HCFCs, embora com impactos amigáveis em relação à camada de ozônio, são potentes gases efeito estufa (GEEs). Infelizmente nem sempre existiu uma adequada sinergia entre os tratados internacionais sobre o clima e sobre a camada de ozônio. Por essa razão, pretende-se, na reunião das partes do Protocolo de Montreal, em Kigali, Ruanda, aprovar uma emenda para reduzir gradativamente o uso dos HCFCs, até sua eliminação total. E por que se enfatizar essa discussão no âmbito do Protocolo de Montreal? Porque ele possui instituições eficazes, como o Fundo Multilateral, para financiamento dos ônus a serem gerados aos países em desenvolvimento, além do engajamento de setores empresariais. O Protocolo adquiriu credibilidade pelo sucesso alcançado: reduziu de 10 a 20 vezes as emissões de CO², equivalente à meta do primeiro período de compromisso do Protocolo de Quioto (1997). O Acordo de Paris representou um outro patamar em termos de soluções efetivas para o combate ao aquecimento global, pois reforçou o compromisso entre mais de 180 países de não se permitir um aumento da temperatura média do planeta em 2ºC até o final do século, indicando a meta de 1,5°C como ambição necessária. 37
Vale lembrar que esses países representam 94% das emissões globais atuais de GEEs e 97% da população mundial. Há grande expectativa de que o Acordo de Paris possa entrar em vigência ainda neste ano, ou seja, em um tempo muito mais breve do que o Protocolo de Quioto, assinado em 1997, efetivado apenas em 2005. A China, os Estados Unidos, o Brasil, dentre outros países, já o ratificaram, sinalizando que não há tempo a perder. Uma emenda para reduzir drasticamente os HCFCs seria uma contribuição fundamental para o Acordo de Paris, representando 1/4 do caminho para ficar abaixo do limite de 2°C, o que seria elogiado na próxima Conferência do Clima, COP 22, a ser realizada em Marrakech, Marrocos, em novembro. Diante desse contexto, acreditamos que o Brasil precisa manter o seu reconhecido protagonismo, atuando de maneira firme para se garantir a aprovação da emenda em Kigali. FABIO FELDMANN é vice-presidente da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS). Foi secretário estadual de Meio Ambiente de São Paulo (gestão Mário Covas) *DURWOOD ZAELKE * é fundador e presidente da ONG Institute for Governance & Sustainable Development (IGSD), em Washington (EUA) *STELA HERSCHMANN * é assessora para relações institucionais da ONG Uma Gota no Oceano
PEC 241 ou morte! FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, CARLOS EDUARDO GONÇALVES, MAURO RODRIGUES E IRINEU CARVALHO FILHO 10/10/2016 às 02h00 O governo está prestes a colocar em votação a proposta de emenda constitucional que limita o crescimento do gasto público no país. Que fique claro o que está em jogo: sem essa Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241), perderemos nossa independência. Voltaremos à condição de servos do dragão inflacionário, ressurgido das cinzas para lançar-nos ao caos econômico. O que nossos estamentos insistiram em ignorar por muito tempo é que, em economia, infelizmente, não há mágicas. Há restrições orçamentárias que precisam ser respeitadas. Quando uma família gasta mais do que tem, por exemplo, endivida-se para cobrir a diferença. Aí, no mês seguinte, se não gastar menos, a dívida cresce, como a proverbial bola de neve de potencial esmagador. Invariavelmente, a coisa termina em desastre. O CPF fica sujo, a Justiça bate à porta. Se a dívida é com amigos, "tchau, tchau, amizade". E se é com a família? O endividado cai no ostracismo, vira ovelha negra. No trabalho, as coisas pioram. Uma pessoa atolada em dívidas se torna menos produtiva. O desemprego pode chegar, piorando uma situação já ruim. E nada de crédito adicional, o que significa que o ajuste vem de qualquer maneira, só que muito mais dolorosamente. 38
os governos têm uma opção extra, emitir moeda para abater parte da dívida. Mas há um custo sinistro: a sociedade se torna serva da inflação. Velha conhecida nossa, a inflação tupiniquim foi domada só quando tampamos a panela do deficit público, há cerca de 20 anos. No caso, com aumento incessante da carga tributária e uso de receitas extraordinárias (não recorrentes). Foi como uma família em que o casal arruma dois empregos e, ao mesmo tempo, recebe da tia falecida uma herança que chega na hora certa: a conta passou a fechar sem cortes de gastos. Mas esse alívio é temporário. Se os gastos continuam crescendo, o que fazer? Três empregos é algo inviável e a tia rica só morre uma vez. A carga tributária no Brasil parou de crescer já faz algum tempo. Começou a cair, recentemente, por causa da recessão. Mas, do outro lado da balança (ou do balanço), os gastos cresceram como sempre, como se não existisse amanhã. Num primeiro momento, o descompasso foi absorvido com elevação de dívida. Porém, como no exemplo da família endividada, a dívida, sem estancarmos os gastos, só pode terminar em bola de neve. Escrevendo agora, em outubro de 2016, estamos certos: não há mais coelhos para tirar da cartola. Dificilmente a sociedade aceitará mais impostos enfiados pela goela. E os financiadores já vão ficando desconfiados com o tamanho da conta. Que o leitor não se iluda: o ajuste vai acontecer de qualquer modo. Resta-nos escolher como. A PEC 241 sugere uma saída suave. Limita o crescimento dos gastos totais pela inflação do ano anterior e garante, assim, uma redução gradual do enorme endividamento. Fará isso respeitando limites mínimos constitucionais de gastos com saúde e educação e devolvendo ao Congresso a tarefa de escolher em que lugar alocar recursos arrecadados da sociedade -o que fortalece o processo democrático e ajuda a limitar as barganhas entre Executivo e Legislativo. Há duas opções à PEC 241: o calote explícito da dívida, que nos levaria ao caos econômico, ou o uso do recurso inflacionário, que nos levaria exatamente ao mesmo lugar. O país chegou à encruzilhada. Ou fazemos o ajuste fiscal ou descemos ao desagradável reino de Hades -sem poeta para nos guiar. CARLOS EDUARDO GONÇALVES é professor e doutor em economia pela USP MAURO RODRIGUES é é professor de economia da USP IRINEU DE CARVALHO FILHO é doutor em economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT)
Renda fixa com rentabilidade de Bolsa Alessandro Shinoda - 8.ago.2011/Folhapress
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Operadores do pregão na BM&FBovespa, em São Paulo FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO MARCIA DESSAN 10/10/2016 às 02h00 Você também sentiu falta das cotações do Tesouro Direto durante o dia? Pois é, em virtude de restrições operacionais, o programa ficou fora do ar durante o dia por pouco mais de um mês. Nesse período, as aplicações foram realizadas somente no horário noturno, das 18h às 5h. As operações de resgate não sofreram alteração, garantindo liquidez diária aos investidores. O horário voltou ao normal a partir de 30 de setembro, das 9h às 18h para comprar e das 18h às 5h para vender. E essa não é a única razão para comemorar. Os investidores devem estar contentes com a rentabilidade de suas aplicações. Importante lembrar que a rentabilidade apresentada aqui ocorre em caso de venda antecipada. Os títulos mantidos até a data de vencimento garantem a rentabilidade contratada. A generosa rentabilidade se explica em razão da queda na taxa de juros desses títulos. É contraintuitivo, mas a relação entre movimento dos juros e preço é inversamente proporcional. Como a taxa de juros caiu, o preço subiu. E, quanto maior o prazo, maior o ganho. Veja na tabela ao lado a rentabilidade de alguns títulos se vendidos em 30/09. Se você ficou com vontade de investir, não espere essa rentabilidade para os próximos meses. Ela pode ser maior ou menor, dependendo do rumo da taxa de juros daqui pra frente. Quem comprar agora, na taxa de juros atual, precisa contar com queda continuada nos juros para colher ganho semelhante. E atenção! Se a taxa de juros subir, os preços caem e a estratégia de tentar um ganho extra vai por água abaixo. Nesse caso, espere recuperação do mercado ou vencimento do título. RENTABILIDADE TESOURO DIRETO, EM % Até 30.set.2016 40
Título e vencimento
No ano
12 meses
T. Selic mar.17
10,37
14,15
T. Selic mar.21
9,99
13,75
T. Prefixado jan.17
12,01
16,01
T. Prefixado jan.21
33,81
34,36
T. Prefixado (juros semestrais) jan.21
28,34
29,09
T. Prefixado (juros semestrais) jan.25
38,23
36,75
T. IPCA+ mai.19
14,79
21,22
T. IPCA+ mai.35
45,11
49,73
T. IPCA+ (juros semestrais) mai.17
11,12
17
T. IPCA+ (juros semestrais) mai.35
28,79
34,07
T. IPCA+ (juros semestrais) mai.50
32,03
38,7
Não custa nada repassar os atributos de investir em títulos públicos via Tesouro Direto. Segurança: são os ativos de menor risco da economia já que o governo federal garante o seu pagamento. Ficam registrados em nome do investidor no ambiente seguro da BM&FBovespa. O investidor pode mudar de instituição financeira, se necessário, sem colocar em risco sua aplicação. Rentabilidade: o rendimento é bastante competitivo se comparado com outras aplicações de renda fixa. Como as taxas de administração e de custódia são baixas, você pode obter ganhos elevados mesmo quando investe pouco dinheiro. Custo baixo: para investir em fundo de investimento de um banco de varejo com taxa de administração de 0,5% ao ano o investidor deve depositar cerca de R$500 mil. No Tesouro Direto, você consegue essa taxa aplicando apenas R$ 30. Tributação: o Imposto de Renda só é cobrado no pagamento de juros, no vencimento do título ou na venda antecipada, ou seja, somente quando rendimentos entram no seu bolso. Liquidez: o Tesouro Nacional garante a recompra diária dos títulos, permitindo que você venda antecipadamente os títulos, a preços de mercado. O dinheiro entra na sua conta no dia útil seguinte. Inclusão: Não é preciso muito dinheiro para começar a investir nem ser um especialista em investimentos. Qualquer pessoa física com CPF e conta em uma instituição financeira habilitada pode se tornar um investidor do Tesouro Direto. 41
Diversificação: você pode montar sua própria carteira de acordo com o seu perfil e objetivos financeiros. Tem autonomia para gerenciar seus investimentos e ainda pode agendar suas aplicações com antecedência e regularidade. Você escolhe que tipo de rentabilidade quer receber: títulos prefixados, indexados à taxa Selic ou à inflação. Escolhe também o prazo da aplicação e ainda, o fluxo de pagamento dos juros, optando por recebe-los semestralmente ou no vencimento. Tudo isso sem sair de casa –todas as transações são realizadas pela internet.
Controle da rede avança no Congresso
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RONAL LEMOS 10/10/2016 às 02h00 Quando o Congresso Nacional —em meio a tantas tarefas importantes— decide priorizar a análise de projetos de lei para censurar e controlar a internet, é porque algo vai realmente mal na agenda do país. Tramita em alta velocidade na Câmara um projeto de lei do pastor Franklin (PP-MG) que quer criar um Cadastro Nacional de Acesso à Internet. Nele constará "a relação de todos os usuários da internet no país". Esse "índex" vai além. Deverá conter a lista de "todos os sites que divulguem conteúdos inadequados para crianças e adolescentes". Ganha um doce quem souber definir o que é "inadequado". O projeto obriga todos os serviços de internet no país, inclusive estrangeiros, a pedirem o CPF do usuário antes do acesso. O serviço deverá então checar com a Receita a veracidade do documento e a idade do usuário. Só aí o acesso será permitido. Pelo projeto, será também obrigatório que todos os aparelhos capazes de acessar a internet vendidos no Brasil venham com um aplicativo pré-instalado para controlar os usuários. De 42
acordo com o próprio texto: "todos os dispositivos que acessem a internet terão um aplicativo que permita o cadastramento dos usuários, exija a identificação antes de qualquer acesso e impeça a remoção destas funcionalidades". Essas são medidas típicas de países autoritários, como a Coreia do Norte ou a Arábia Saudita. No Ocidente, só um país ousou propor um projeto similar: o Paraguai. E por causa disso sofreu uma série de críticas nacionais e internacionais. Não é o modelo que o Brasil deveria copiar. O projeto quase foi aprovado pela Comissão de Ciência e Tecnologia e Informática (CCTI) na semana passada, mas houve pedido de vista. O relator do projeto é o missionário José Olimpio (DEM-SP). O missionário é por sua vez autor de outro projeto de lei que foi aprovado na semana passada pela CCTI. Trata-se de proposta para modificar para pior a chamada Lei Carolina Dieckmann. A proposta do missionário é que se torne crime no Brasil "acessar indevidamente sistema informatizado ou nele permanecer contra a vontade de quem de direito". Em outras palavras, o projeto quer mandar para a cadeia quem desrespeitar os "termos de uso" de qualquer site ou serviço, aquele documento extenso e cheio de letras miúdas, que praticamente ninguém lê. Mas não é só. Pela proposta, a conduta criminalizada é o mero "acesso", sem que haja a necessidade de qualquer dano. Isso faz cair por terra toda a atividade de empresas de segurança no Brasil, cuja missão é exatamente "acessar indevidamente" dispositivos de informática, justamente para procurar brechas de segurança. Em vez de fortalecer a rede brasileira, vai enfraquecê-la. É preocupante quando a Comissão de Ciência e Tecnologia e Informática abraça o obscurantismo e se torna liberticida. No mínimo, deveria iniciar um processo de consultas públicas antes de legislar sobre temas tão complexos. E de preferência, chamar quem entende de ciência para opinar.
Reforma do ensino médio demanda outra reforma Sem o equacionamento financeiro propostas podem não levar ao resultado esperado Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Wagner Victer* 10 Outubro 2016 às 05h00 Os recentes resultados divulgados do Ideb trouxeram de volta ao debate da sociedade as graves dificuldades enfrentadas na aprendizagem dos jovens brasileiros. Os resultados negativos reforçam a percepção de que o atual currículo do ensino médio é ultrapassado e merece profunda reforma. Um dos maiores desafios do Brasil é aumentar a atratividade das aulas, dando mais dinamismo ao processo ensino-aprendizagem, estimulando o protagonismo juvenil e reconhecendo as diferenças individuais e geográficas dos alunos, alinhados com a ampliação dos programas da formação inicial e continuada dos professores. Como consequência desse cenário, o governo federal editou a Medida Provisória (MP) 746/2016, que se junta ao Projeto de Lei 6.840/2013, que já tramitava no Congresso, que propõe alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, tendo como pilar a instituição de jornada em tempo integral no ensino médio e a reorganização do currículo por áreas de conhecimento.
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Entre os maiores interessados nessas mudanças estão as Secretarias de Estado de Educação, responsáveis pela maioria dos alunos desse segmento de ensino. Esses avanços, no entanto, criam um dilema: por um lado, a MP traz sugestões importantes que realmente trarão melhoria ao ensino médio; por outro, até em função da crise econômica, não há no cenário atual como dar sustentabilidade financeira a essas importantes reformas. O projeto, por exemplo, estabelece jornada escolar de pelo menos sete horas diárias e determina que ao menos 50% das matrículas em 50% das escolas estejam em horário integral em um prazo de dez anos. O prazo para a implantação universal nas redes seria de 20 anos. Além disso, e nada mais coerente para a solidez dessa iniciativa, que é louvável e desejada, a MP prevê a possibilidade de opção formativa ao estudante no último ano, podendo este seguir a ênfase em “linguagens”, “matemática”, “ciências da natureza”, “ciências humanas” e “formação profissional”. Para poder acompanhar as melhorias implantadas no ensino integral diurno, as turmas noturnas teriam um ano a mais, passando a quatro. Tais medidas envolverão, na maioria das escolas, um rearranjo em salas de aulas disponíveis, o que nem sempre é possível sem fazer grandes adaptações e, consequentemente, diversas obras. Os planos são os melhores possíveis, mas nosso desafio também é matemático. Para dar um exemplo, o Estado do Rio de Janeiro tem atualmente cerca de 446 mil alunos no ensino médio público, 42 mil em horário integral. Alcançar 50% das matrículas em horário integral em dez anos significará o equivalente à necessidade de implantação de mais de uma centena de novas unidades escolares, considerando os importantes reflexos na folha de pagamento e nos recursos de merenda e manutenção. Com as metas estabelecidas pela MP, pelos cálculos preliminares o Estado do Rio de janeiro teria de construir 19 unidades escolares anualmente nos próximos 20 anos. Nos valores de hoje, ao fim da implantação e sem considerar o investimento nas novas escolas, o aumento estimado de gastos poderia chegar a R$ 1,5 bilhão ao ano, com reflexos atuariais futuros e permanentes na previdência estadual. Os debates sobre o financiamento da educação também nos remetem ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e à compreensão equivocada de que os recursos direcionados a todos os Estados são procedentes de tributos federais. Diferentemente do que entende o senso comum, o Fundeb na maioria dos Estados não recebe recursos federais. O Fundeb destinado ao Rio de Janeiro, por exemplo, é financiado basicamente pelo ICMS do Estado. Essa transferência estadual é a principal fonte de receita dos municípios fluminenses para as políticas de educação infantil e do ensino fundamental. No ano passado, os recursos da arrecadação de ICMS repassados ao fundo que não foram revertidos diretamente à rede estadual chegaram a cerca de R$ 3 bilhões. Somada a essas dificuldades, a importante e necessária ampliação da oferta de vagas nas creches públicas causa outro reflexo que não pode ser desconsiderado: aumenta-se o denominador de alunos e entes que compartilham os mesmos recursos do Fundeb sem que haja a alteração no numerador desta equação. Ou seja, cada vez mais cidadãos e administradores dos Estados e municípios disputam as mesmas verbas. O tema torna-se ainda mais crítico e controvertido se se adiciona a ele o debate em torno da eventual desvinculação das receitas voltadas para a educação prevista na PEC 241/2016, em discussão no Congresso Nacional, que prevê limitar o crescimento dos gastos públicos inclusive por segmentos, isso sem falar na redução dos repasses previstos pelo salário-educação, que tem caído vertiginosamente em razão do desemprego e da desaceleração econômica. Portanto, mesmo com as necessárias melhorias na gestão dos recursos por todos os entes federativos, se não tivermos a revisão e a apresentação de novas fontes de financiamento, o futuro da educação pode ser mais sombrio do que o presente.
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Assim como o ensino médio, o desenho do financiamento da educação pública – tão bemsucedido na universalização do ensino fundamental após a Constituição de 1988 – precisa ser reformado. Para que a vitória daqueles que almejam uma educação de qualidade para os jovens brasileiros não se torne mais uma lei classificada como letra morta, é fundamental que a aprovação da MP traga consigo também os caminhos para pôr esse projeto verdadeiramente de pé e que uma questão fundamental se responda: haverá um novo imposto ou fonte com recursos significativos e permanente destinada a financiar fundo reservado para esse fim? Essa pergunta não pode ficar sem resposta, já que as propostas sem o equacionamento financeiro podem não levar ao importante resultado esperado por todos. *Secretário de Educação do Estado do Rio de Janeiro
Pichações, bofetadas na cidade As cicatrizes que desfiguram o rosto de São Paulo e do Brasil podem ser superadas Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Carlos Alberto di Franco 10 Outubro 2016 às 05h00 No dia seguinte ao debate dos candidatos à Prefeitura de São Paulo na TV Globo, em que a pichação foi criticada por João Doria (PSDB) e Marta Suplicy (PMDB), o Monumento às Bandeiras, no Ibirapuera, zona sul, e a Estátua do Borba Gato, em Santo Amaro, na mesma região, amanheceram cobertos de tinta colorida: rosa, verde, amarela e azul. A barbárie é ponta do iceberg de algo mais grave: a degradação das cidades e a incompetência arrogante das suas autoridades. A reação do prefeito Fernando Haddad (PT) foi emblemática. Em campanha na zona leste, Haddad disse achar que as pichações podem ser fruto da radicalização criada no debate. “Acho que tem a ver com o tipo de provocação que foi feito no debate. Quando você instiga as pessoas, desafia as pessoas, como Doria e Marta fizeram, dizendo que ‘não vai acontecer nunca mais’. Não é assim que se fala com as pessoas, se dialoga”, afirmou. Lamentável. É a defesa do diálogo demagógico e transgressor. O crime não deve ser punido. A lei não deve ser cumprida. No episódio, a cidade de São Paulo foi demitida por seu governante. O centro antigo de São Paulo, por exemplo, está à deriva. Edifícios pichados, prédios invadidos, gente sofrida e abandonada, prostituição a céu aberto, zumbis afundados no crack, uma cidade sem alma e desfigurada pela ausência criminosa do poder público. Nós, jornalistas, precisamos mostrar a realidade. Não podemos ficar reféns das assessorias de comunicação e das maquiagens que falam de uma revitalização que só existe no papel. Temos o dever de pôr o dedo na chaga. Fazer reportagem. Escancarar as contradições entre o discurso empolado e a realidade cruel. Basta percorrer três quarteirões. As pautas não estão dentro das redações. Elas gritam em cada esquina. É só pôr o pé na rua e a reportagem salta na nossa frente. Os jornais precisam ter cheiro de asfalto. Jornalismo é isso: mostrar a vida, com suas luzes e suas sombras. São Paulo, a cidade mais rica do País e um dos maiores orçamentos públicos, é um retrato de corpo inteiro da falência do Estado. Também o Brasil, um país continental, sem conflitos externos, com um povo bom e trabalhador, está na banguela. Os serviços públicos não funcionam. Basta pensar na educação. A competitividade global reclama crescentemente gente bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da recente “pátria educadora”. 45
Governos sempre exibem números chamativos. E daí? Educação não é prédio. Muito menos galpão. É muito mais. É projeto pedagógico. É exigência. É liberdade. É humanismo. É aposta na formação do cidadão com sensibilidade e senso crítico. O custo humano e social da incompetência e da corrupção brasileira é assustador. O dinheiro que desaparece no ralo da delinquência é uma tremenda injustiça, uma bofetada na cidadania, um câncer que, aos poucos e insidiosamente, vai minando a República. As instituições perdem credibilidade em velocidade assustadora. Os protestos que tomaram conta das cidades precisam ser interpretados à luz da corrupção epidêmica, da impunidade cínica e da incompetência absoluta da gestão pública. Há uma clara percepção de que o Estado está na contramão da sociedade. O cidadão paga impostos extorsivos e o retorno dos governos é quase zero. Tudo o que depende do Estado funciona mal. Educação, saúde, segurança, transporte são incompatíveis com o tamanho e a importância do Brasil. Os gastos públicos aumentaram assustadoramente. A Lava Jato trabalha bem. Mas a percepção de impunidade é ainda muito forte. Ela empurra a democracia para uma zona de risco. Os governantes precisam acordar. As vozes das ruas, nas suas manifestações legítimas, esperam uma resposta efetiva, e não um discurso marqueteiro. A crise que está aí é gravíssima. A gordura dos anos de bonança acabou. A realidade está gritando no bolso e na frustração das pessoas. E não há marketing que supere a força inescapável dos fatos. Os governos podem perder o controle da situação. Promessas surrealistas e imagens produzidas fazem parte da promoção de alguns políticos e governantes. Assiste-se, diariamente, a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas, no fundo, vazio de conteúdo e carente de seriedade. Nós, jornalistas, temos um papel importante. Devemos dar a notícia com toda a clareza. Precisamos fugir do jornalismo declaratório. Nossa missão é confrontar a declaração do governante com a realidade dos fatos. Não se pode permitir que as assessorias de comunicação dos políticos definam o que deve ou não ser coberto. O jornalismo de registro, pobre e simplificador, repercute o Brasil oficial, mas oculta a verdadeira dimensão do País real. Precisamos fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação. Só assim, com equilíbrio e didatismo, conseguiremos separar a notícia do lixo declaratório. Transparência nos negócios públicos, ética, boa gestão e competência são as principais demandas da sociedade. Memória e voto consciente compõem a melhor receita para satisfazê-las. Devemos bater forte na pornopolítica. Ela está na raiz da espiral de violência que sequestra a esperança dos jovens e ameaça a nossa democracia. A sociedade está cansada da inconsistência de alguns governantes, de tanto jogo de faz de conta, de tanto cinismo. Quer mudança. Quer um projeto verdadeiramente transformador. As cicatrizes que desfiguram o rosto de São Paulo e do Brasil podem ser superadas. Dinheiro existe, e muito. Falta vergonha na cara, competência e um mínimo de espírito público. *Jornalista
NOTÍCIAS: Itaú compra varejo do Citibank Brasil por R$ 710 milhões
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Negócio, que ainda tem de passar pelo Cade, envolve agências, empréstimos, cartões de crédito, gestão de recursos e seguros Fonte Aline Bronzati e Mônica Scaramuzzo, Jornal O Estado de S. Paulo 08 Outubro 2016 às 09h13 O Itaú Unibanco anunciou ontem a compra da unidade de varejo do Citibank no Brasil, desbancando o banco espanhol Santander, apontado como o favorito para levar o negócio. A operação, avaliada em R$ 710 milhões, envolve toda operação de varejo do banco americano voltada a pessoas físicas da instituição, incluindo empréstimos, depósitos, cartões de crédito, agências, gestão de recursos e corretagem de seguros. As negociações entre as duas instituições financeiras se intensificaram nas últimas duas semanas, com o banqueiro Roberto Setubal, dono do Itaú Unibanco, cuidando pessoalmente dos detalhes da transação, apurou a reportagem. Na edição de sexta-feira, a colunista do Estado Sonia Racy informou na sexta-feira que o valor pago pelo Itaú deveria ficar bem abaixo dos R$ 1,5 bilhão sonhados pelo banco norte-americano. Foto: Daniel Reixeira/ estadão
Em comunicado ontem ao mercado, o Itaú informou que a operação envolverá a reestruturação societária de algumas sociedades do conglomerado Citibank, de modo que o negócio de varejo no Brasil seja cindido e transferido para sociedades que serão objeto da aquisição. A operação de varejo do Citibank conta com 71 agências e aproximadamente 315 mil clientes correntistas, com R$ 35 bilhões entre depósitos e ativos sob gestão (valores brutos na database de 31 de dezembro de 2015), além de 1,1 milhão de cartões de crédito e R$ 6 bilhões de carteira de crédito. Com essa aquisição, o Itaú Unibanco passa a ter R$ 1,404 trilhão em ativos. O Citi anunciou em fevereiro a intenção de se desfazer de suas operações de varejo no Brasil, Argentina e Colômbia e a expectativa era concluir as negociações até setembro (ver texto abaixo). A expectativa, conforme fontes, é que o aval dos reguladores saia no primeiro trimestre do ano que vem. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já sinalizou que deve ser ainda mais rigoroso na análise de fusões e aquisições do setor bancário ao aprovar, em junho último, o negócio entre Bradesco e HSBC, a maior transação do setor. Na visão da conselheira Cristiane Schmidt, a venda das operações de varejo do Citi no Brasil e qualquer negócio que envolva o setor deve ser considerado “complexo” desde o início do seu julgamento. Isso porque, além do atual nível de concentração do setor no País, tem potencial para afetar uma parte importante da sociedade. 47
Apetite. O maior interesse do Itaú pelas operações do Citi no Brasil surpreendeu o mercado. O Santander era tido como o favorito para levar o ativo após perder a disputa pelo HSBC para o Bradesco. Pesou no apetite do Itaú Unibanco, segundo fontes, a base de alta renda do Citi e a sobreposição com os seus clientes. Um executivo próximo as negociações destacam que o Itaú poderá ter sinergias na área digital que vem expandindo dentro do banco. Isso porque o Citi estaria um passo atrás nesta questão. Também fez diferença, de acordo com fontes, o relacionamento com o vendedor. Em 2013, o Itaú comprou a Credicard por R$ 2,8 bilhões. Na semana retrasada, o banco de Setubal anunciou sua 25.ª aquisição, ao comprar a fatia de 40% do BMG na joint venture que constituiu com o banco mineiro na área de crédito consignado (com desconto em folha). O banco também tem demonstrado maior apetite por aquisições em meio à crise no País, que dificulta o crescimento orgânico. Como consequência, o banco acumula mais de R$ 60 bilhões de sobra de capital oriunda, principalmente, da baixa demanda por crédito. Ao final de junho, o Itaú somava quase R$ 136 bilhões de patrimônio de referência, praticamente o dobro do montante mínimo requerido pelo regulador em seu caso, de cerca de R$ 74 bilhões. Seu índice de Basileia, que mede quanto um banco pode emprestar sem comprometer o seu capital, está em 18,1%, bem acima dos 11% mínimos exigidos pelo Banco Central.
Diretor-geral da OMC vai aos EUA para 'defender o comércio' Brasileiro Roberto Azevêdo quer refutar o sentimento protecionista no mundo e irá se encontrar com dirigentes do FMI e do Banco Mundial Fonte Cláudia Trevisan, correspondente, Jornal O Estado de S. Paulo 07 Outubro 2016 às 12h01
Notícias relacionadas: Banco Mundial melhora projeção para Brasil e prevê alta de 1,1% do PIB em 2017 Para FMI, fatores políticos podem prolongar crise global Recuperação de Brasil e Rússia deve ajudar a acelerar PIB mundial, diz FMI Temer deve abordar ajuda ao setor automotivo em visita à Argentina WASHINGTON - Preocupado com o aumento do sentimento protecionista ao redor do mundo, o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo, decidiu levar sua defesa do livre comércio aos EUA. A maior economia do mundo é o epicentro da retórica que culpa a derrubada de barreiras pelo desemprego, que tem sua face mais visível no candidato à presidência do Partido Republicano, Donald Trump. A mensagem de Azevêdo é a de que o protecionismo é um "remédio" equivocado, que poderá deteriorar o já frágil estado de saúde da economia global. O brasileiro questionou o "diagnóstico" que aponta o comércio como a causa da destruição de empregos em nações industrializadas e disse que 80% dos casos estão relacionados a avanços tecnológicos, inovação e aumento de produtividade.
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Foto: Edgar Su/Reuters
O diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo O brasileiro disse que o objetivo de sua viagem a Washington é "defender o comércio" e refutar o sentimento protecionista com fatos. Na tarde de hoje, ele participará de um evento sobre o assunto ao lado da diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, e do presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim. O evento ocorre no âmbito da reunião anual das duas organizações multilaterais, da qual participam ministros da área econômica e presidentes dos bancos centrais de todos os países-membros. Apesar da crítica ao protecionismo, o título do painel indica uma tentativa de contemplar as preocupações dos que se consideram vítimas dos deslocamentos provocados pela globalização: "Tornar o comércio um motor de crescimento para todos". O diretor-geral da OMC também falará hoje no National Press Club, a entidade centenária que reúne jornalistas e formadores de opinião em Washington. "Nós sentimos que há uma forte retórica anticomércio vinda deste e de outros países", disse Azevêdo ontem a um grupo de jornalistas brasileiros e americanos, sem mencionar o nome de Trump. O candidato do Partido Republicano é crítico de acordos comerciais, defende a imposição de tarifas de até 40% para importação de produtos da China e do México e chegou a dizer que os EUA podem sair da OMC, caso ele seja eleito. Apesar da preocupação com o aumento de medidas protecionistas, Azevêdo ressaltou que elas não explicam a recente desaceleração do comércio global. Segundo ele, o movimento decorre principalmente do baixo crescimento. Mas ele ressaltou que a eventual adoção de medidas impedirá que o comércio funcione como um motor da recuperação global.
Um milhão de famílias entrará para as classes D e E até 2025 Mesmo com retomada da economia, haverá expansão da pobreza FONTE JORNAL O GLOBO, DAIANE COSTA 09/10/2016 ÀS 09H44 49
Glória e Anderson com os filhos no terraço que virou cozinha - Mônica Imbuzeiro RIO - Estica, aperta e corta se tornaram palavras de ordem para lidar com o desemprego e a alta de preços na casa de Glória de Oliveira Brito e Anderson Ornelas, ambos de 42 anos. Depois que Anderson perdeu o cargo de gerente num areal, no início do ano, a renda da família foi reduzida a um terço, para R$ 1.300. A rotina sofreu mudanças drásticas: TV a cabo é coisa do passado, assim como as idas ao shopping e a lanchonetes com as três crianças — Maria Fernanda, de um ano e 7 meses, Daniel, de 6 anos, e Gabriela, de 10 —, que abandonaram as aulas de judô e balé. As viagens habituais para Belo Horizonte e para a Região dos Lagos já não fazem parte dos planos. E até os livros escolares dos filhos mais velhos de Glória só puderam ser comprados no meio do ano. Nos últimos anos, desde que a economia mergulhou na recessão, o cotidiano das famílias de baixa renda se tornou mais austero. E tudo indica que o cenário vai demorar a mudar. Estudo da Tendências Consultoria Integrada mostra que, até 2025, haverá expansão da pobreza mesmo com a perspectiva de retomada da economia. As famílias das classes D e E — com renda mensal de até R$ 2.166 — continuarão a crescer e chegarão a 41 milhões. A comparação 50
das projeções para este ano e o de 2025 indica que as classes D e E devem ganhar mais um milhão de famílias. Diversos fatores contribuem para a projeção, como a migração de famílias da classe C que não conseguem manter o padrão de vida conquistado, e o surgimento de novas famílias, que se formam em condições piores. Veja também:
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Renegociação de dívidas soma R$ 430,5 bi e alimenta recuperações de crédito A deterioração do cenário impressiona, especialmente à luz das conquistas da década passada. Entre 2006 e 2012, quando o Produto Interno Bruto (PIB) crescia, em média, 4% ao ano, 3,3 milhões de pessoas ascenderam das classes D e E para a C, que abrange lares com renda entre R$ 2.166 e R$ 5.223, de acordo com o critério de classificação econômica da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep). Com a recessão e a alta da inflação, os ganhos desse período se perderam de 2014 a 2016, período em que as classes D e E tiveram aumento de 3,5 milhões de famílias. Com base no estudo, nem mesmo uma década será capaz de aliviar integralmente os efeitos da recessão. O aumento na base da pirâmide deve ocorrer em ritmo mais moderado, mas, ainda assim, somente de 2019 a 2025, período para o qual se prevê expansão da economia, serão mais 438 mil lares. — Quando você conduz mal a política econômica, deixa a inflação subir, as mais prejudicadas são as famílias de menor renda. Aliado a isso, se deixou que os gastos públicos subissem muito. A combinação de BNDES inchado, isenções de impostos e incentivos a setores não beneficiou os mais pobres. A economia mais fechada e com viés estatizante impediu maior concorrência e oferta de preços menores. Isso privilegia alguns poucos e prejudica a maioria — avalia Adriano Pitoli, economista, autor do levantamento e diretor da área de Análise Setorial e Inteligência de Mercado da Tendências. MODELO FRÁGIL DE MOBILIDADE SOCIAL O problema nos próximos anos, segundo Pitoli, é que a “fórmula mágica” que permitiu a ascensão dos mais pobres entre 2006 e 2012 — com expansão do consumo das famílias no dobro da velocidade do PIB e ampla criação de vagas para mão de obra menos qualificada em comércio e serviços — não deve se repetir. Especialistas destacam também outros componentes que impulsionaram a mobilidade social na década passada, como a política de valorização do salário mínimo, que acumulou crescimento real de 72,31% entre 2003 e 2014, o crédito facilitado, a inflação controlada e a entrada de mais mulheres no mercado de trabalho. — Há muita coisa errada para consertar na economia. O mercado vai continuar muito fraco. As empresas vão demorar a voltar a contratar. Daqui por diante não tem mágica. As famílias vão ter de se acostumar a viver com menos por mais tempo — resume Pitoli. Com o quadro adverso na economia nos últimos anos, o nível de endividamento das famílias saltou de 18% da renda em 2005 para 30% no ano passado. Para especialistas, a rápida deterioração evidencia a vulnerabilidade do último quadro de expansão.
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— Chama a atenção a intensidade do movimento. Ele sugere uma fragilidade da mobilidade social promovida anteriormente. É claro que é bom ter geladeira, carro, televisor e viagem de avião, mas não torna permanente a capacidade de a pessoa se sustentar, dar educação e saúde de qualidade aos filhos — avalia Gesner Oliveira, economista, professor da FGV e pesquisador na área de infraestrutura social. Para as famílias que sentem no dia a dia o retrocesso na qualidade de vida, o jeito é se adaptar ou escolher criteriosamente quais gastos preservar. Glória e Anderson, que estão desempregados, tiveram de abrir mão do conforto de viver numa casa de dois andares, em Bangu. Eles alugaram o térreo a uma outra família. Junto com o aluguel de outro imóvel, herdado por Glória, está se tornou a renda familiar no momento. Além de jogo de cintura, a mudança exigiu que eles transferissem a cozinha para o terraço e instalassem uma escada caracol para garantir o acesso direto ao segundo andar. Segundo Glória, a prioridade é preservar a qualidade da alimentação dos filhos. — Eles têm de ter na mesa aquilo ao que já estão acostumados. A gente deixa de comprar roupa, estica dali, mas não corta alimentação. Os meses que meu marido trabalhou na Ceasa foram ótimos. Ele podia trazer para casa o que não era vendido. Chegava com “tonelada” de inhame, melancia, brócolis e couve-flor — conta Glória, em referência a um bico de três meses que o marido fez transportando alimentos. PERDA DE BEM-ESTAR Para Miguel Foguel, economista e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) nas áreas de mercado de trabalho e desigualdade, a perda de bem-estar é um dos efeitos mais duros sobre as famílias, principalmente porque pode respingar na educação: — Não é de se estranhar que crianças deixem de ir à escola para trabalhar ou que jovens adiem a entrada na faculdade pela mesma razão. Apesar do prognóstico negativo para os próximos anos, Carlos Antonio Costa Ribeiro, sociólogo e pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Uerj, avalia que a perda de bem-estar é longe de ser irreversível. Ele aponta duas razões: a chamada mobilidade intergeracional, que mede se os filhos vivem em condições melhores que os pais, tem mostrado resultados positivos, e o ritmo menor de crescimento da população: — As pessoas estão tendo menos filhos. O Brasil tem taxa de reposição menor do que dois, está em 1,8 filho por família. Se a população diminui, e o sistema educacional continua se expandindo, isso significa menos gente entrando na economia ao longo do tempo, com maior escolaridade. Veja também:
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— Precisamos de foco na eficiência e na qualidade da infraestrutura social para obter resultados melhores do que as projeções. Caso a família perca o plano de saúde e a possibilidade de manter o filho em escola particular, poderia encontrar bons hospitais públicos. Um grande investimento nessas áreas pode fazer a diferença e criar ascensão social mais lenta. Com isso, não ocorreriam grandes movimentos de consumo ou euforia, mas a construção de uma nação mais igualitária. Enquanto a realidade se mostra menos acolhedora, as pessoas se adaptam como podem: topam ganhar menos, fazem trabalhos temporários, dirigem Uber ou trabalham por conta própria, lista Foguel: — Elas aceitam para se defender, mas acabam contribuindo para piorar a renda. Glória está desempregada há três anos. Reclama que o mercado é cruel com quem tem mais de 40 anos e três filhos. Desde então, a técnica em TI só conseguiu um trabalho temporário de três meses, durante os Jogos Olímpicos. Comemorou como se fosse promoção: — Trabalho desde os 15 anos. É muito difícil ser só dona de casa. Cansa. Mexe com o emocional. Resolvi aceitar essa oportunidade e invertemos os papéis. Foi ótimo. O Anderson cuida das crianças melhor do que eu. É muito rígido com os horários: elas dormiam cedo, só faziam as refeições na mesa, e, antes do meio-dia, o almoço estava pronto. Glória cansou de procurar emprego. Investiu R$ 400 em equipamentos e montou um salão de beleza em casa, que deve abrir esta semana. Anderson vai usar a experiência na direção para trabalhar como motorista do Uber. Esperam, assim, aumentar a renda da família em, pelo menos, R$ 1.000.
Brics negocia acordo para baratear remédios de alto custo Setor é um dos temas de encontro do grupo na Índia, na próxima semana FONTE JORNAL O GLOBO, GABRIELA VALENTE 09/10/2016 ÀS 04H30
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Remédios caros, como os do tratamento da AIDS no foco do acordo - Norm Betts / Norm Betts/Bloomberg BRASÍLIA - O governo brasileiro começou a negociar um acordo entre o Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) para produzir, comercializar e baratear medicamentos. O foco são os remédios de alto custo, caso daqueles que tratam doenças crônicas como a Aids. Segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, os cinco países discutem como quebrar patentes e fabricar os medicamentos com um custo menor. Esse é um dos temas que estarão nas conversas da 8ª Cúpula do Brics, que será realizada no próximo fim de semana em Goa, na Índia. Os países devem debater quais tipos de medicamentos podem entrar em um acordo de livre comércio. A discussão não é simples. Afinal, cada nação tenta proteger a sua própria produção. Esse acordo ainda está em fase inicial e não deve ser concluído no encontro. — É uma discussão que está no início, mas que é muito importante e pode significar uma revolução para a distribuição de medicamentos de alto custo entre o Brics. Mas ainda temos um longo caminho de negociação — disse uma alta fonte do governo brasileiro. EFEITO EM ATÉ DEZ MEDICAMENTOS Inicialmente, um acordo de quebra de patente incluiria um número limitado de medicamentos. Seria algo entre cinco e dez remédios que não são produzidos pelos países do Brics. Se vingar, cada país será responsável pela fabricação de um ou dois itens e deve fornecer para os demais integrantes do grupo. A ideia desse acerto para a troca de tecnologias entre os países foi levada pelo Brasil ao encontro da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. Nos bastidores, as conversas têm sido conduzidas pelo ministro das Relações Exteriores, José Serra, que tem experiência no assunto. Em 2001, em meio a uma guerra de preços com laboratórios, Serra ameaçou quebrar patentes de medicamentos para a Aids, mas não precisou cassar a licença. Ao verem que os cientistas de Manguinhos tinham condições de desenvolver os produtos, os laboratórios farmacêuticos 54
responsáveis passaram a negociar reduções de preços. Na época, Serra era ministro da Saúde do governo Fernando Henrique Cardoso. De acordo com fontes ouvidas pelo GLOBO, ele tem usado a experiência brasileira como exemplo. A patente garante ao inventor de um produto os direitos de reprodução e comercialização de seu invento. No Brasil, a patente pode ser quebrada em caso de interesse nacional. O Brasil também quer exportar o modelo de genéricos. No entanto, há grandes diferenças entre os modelos de saúde dos países. Na Índia, por exemplo, não há laboratórios públicos como no Brasil. Isso encarece o remédio fornecido para a população, porque sobre o produto público não há incidência de impostos. PROPOSTA DEPENDE DE AVAL DE INDIANOS Um grande acordo como esse tem um longo caminho a percorrer antes de ser fechado. O que deve ser assinado na cúpula de Goa é um memorando de entendimento em cooperação e regulação de produtos farmacêuticos entre a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o órgão correspondente na Índia. Após muita negociação, o texto está pronto e espera o aval dos indianos para ser fechado. É o primeiro passo para o acordo de comércio e investimentos na área de medicamentos. Ajustes são acordados por uma equipe de diplomatas e representantes da Anvisa. O objetivo inicial é firmar a cooperação com os indianos, mas a tratativa não tem sido fácil. Desde 2013, o governo indiano quer avançar na proposta de um acordo com o Brasil. Essa é uma das prioridades da Índia no relacionamento entre os dois países. Com a crise política e a indefinição de qual seria o governo no Brasil, o diálogo foi suspenso. As conversas foram retomadas em junho, já no governo interino do presidente Michel Temer. Foram apresentadas três propostas de memorandos de entendimento pelo governo indiano, nas áreas de medicina tradicional e homeopatia, plantas medicinais e cooperação universitária. Uma cátedra de medicina indiana deve ser criada no Brasil. O Ministério da Saúde apresentou uma contraproposta, mas, pouco antes da reunião bilateral, ainda não havia resposta dos indianos. Brasil é grande importador O Brasil tem interesse no acordo, considerado estratégico pela Anvisa por causa do perfil da indústria farmacêutica indiana, sobretudo no setor de genéricos, dos quais o Brasil é grande importador. Com o acerto, seria possível facilitar o processo de inspeção e promover o reconhecimento de inspeções homologadas. A equipe de Temer deve fechar o acordo bilateral no início da semana que vem. Uma reunião entre o presidente brasileiro e o primeiro-ministro Narendra Modi deve selar o entendimento. Os dois países têm muito em comum: ambos buscam implementar reformas estruturais para aumentar a competitividade. O encontro entre os dois chefes de Estado acontecerá após a reunião do Brics. É o oitavo encontro do grupo. Desde 2012, já foram anunciadas iniciativas como a criação de um banco
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de desenvolvimento e um contingente de reservas. Desde que a Índia assumiu a presidência do bloco, há alguns ruídos entre os membros. — Há interesse da Índia em avançar em assuntos nos quais não há consenso — diz uma fonte do Itamaraty. Nesse sentido, a cúpula em Goa é vista como uma chance de estabelecer novos entendimentos.
Redução da Selic poderia gerar economia de R$ 18 bi em 12 meses, calcula analista Estimativa considera estoque de R$ 3,6 tri da dívida pública FONTE JORNAL O GLOBO, MARCELLO CORRÊA 08/10/2016 ÀS 08H32
Prédio do Banco Central, em Brasília - Roberto Stuckert Filho / Agência O Globo RIO - O possível corte da taxa básica de juros em 0,5 ponto percentual — esperado por analistas para outubro ou novembro — deve reduzir o custo do governo para se financiar. Segundo cálculo do economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, o governo pode deixar de desembolsar R$ 18 bilhões em pagamento da dívida ao longo de 12 meses, a cada 0,5 ponto cortado da taxa. Veja também:
Com inflação menor, mercado aumenta aposta em corte de juro 56
Inflação de setembro foi 'surpresa positiva', diz presidente do BC
Meirelles afirma que inflação mostra a volta à normalidade O cálculo do analista se baseou no estoque de aproximadamente R$ 3,6 trilhões da dívida interna, segundo dados do Banco Central. O analista aplicou 0,5% sobre esse saldo. — Há um impacto no déficit fiscal nominal (que considera o pagamento de juros da dívida). Se tem uma mudança de expectativa de mercado de que os os juros vão cair mais, vamos ter menos despesas de juros no ano que vem — avalia. Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria, afirma que os efeitos sobre os custos de financiamento já começaram a aparecer na curva de juros futuros. Na prática, o mercado financeiro se antecipou ao BC e começou a cobrar menos em alguns contratos, o que se refletiu em uma diminuição do pagamento de juros da dívida pública. No acumulado em 12 meses, o montante pago em juros pelo governo passou de R$ 464 bilhões, em abril, para R$ 418 bilhões, em agosto. Esse volume chegou a R$ 539 bilhões no acumulado em 12 meses até janeiro. — Os benefícios na área fiscal já estão acontecendo há alguns meses. Com a mudança de governo, teve uma melhora de expectativa que bateu nos juros futuros. Isso já vem se traduzindo nos custos de financiamentos. Com a Selic menor, isso vai se aprofundar — afirma Alessandra. Na última quarta-feira, o economista-chefe do Banco Mundial, Augusto de La Torre, avaliou que o Brasil tem pela frente o desafio de fazer o ajuste fiscal mais difícil da América Latina. Segundo o organismo internacional, as altas taxas de juros no país respondem por 80% do déficit fiscal brasileiro.
Brasil está a anos de distância de recuperar grau de investimento, diz S&P
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S&P tirou o selo de bom pagador do Brasil em setembro de 2015
FONTE REUTERS 08/10/2016 às 18h31 A aprovação inicial de um limite de gastos públicos é um passo na direção certa, mas ainda vai levar anos e serão necessárias outras difíceis reformas para o Brasil recuperar a cobiçada classificação grau de investimento, afirmou Lisa Schineller, analista sênior da agência de classificação de risco Standard & Poor's. A S&P tirou o selo de bom pagador do Brasil em setembro do ano passado. Agora, a agência classifica o país como BB, dois degraus abaixo do grau de investimento. Em uma entrevista por telefone, à margem da reunião do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial em Washington, Lisa Schineller, da S&P, disse que, para mudar a perspectiva negativa do Brasil, a agência precisa ver ações concretas do novo governo para reforçar suas esgotadas contas fiscais. "A aprovação é certamente um avanço, mas estamos nos estágios iniciais", disse Schineller, acrescentando que o governo precisa avançar com outras medidas para tornar o limite de gastos viável, entre elas uma revisão do seu caro sistema de previdência. "Agora, o que nós realmente estamos focando são os detalhes das reformas e o que será colocado sobre a mesa e que pode ser aprovado." Na última quinta-feira, a comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou a PEC que freia o crescimento dos gastos públicos, estabelecendo um limite por 20 anos para o avanço das despesas primárias, com possibilidade de alteração no índice de correção a partir do 10º ano. O texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) obteve 23 votos a favor e 7 contra no colegiado, em uma vitória para o governo de Michel Temer. A PEC segue para o plenário da Câmara, onde precisa passar por dois turnos de votação. A proposta está no coração do plano de austeridade de Temer para fechar uma lacuna fiscal que custou ao Brasil seu grau de investimento no ano passado. Schineller disse que as experiências passadas na Índia, Rússia e Colômbia mostram que um retorno ao rating grau de investimento é um processo difícil que leva muitos anos. É um "processo multiadministração e multiano para realmente recuperar e consolidar a trajetória fiscal", disse Schineller. "Quando você olha para os desafios fiscais no Brasil é difícil ver isso (recuperação do grau de investimento) acontecendo muito rapidamente." O ministro das Fazenda, Henrique Meirelles, disse à Reuters na quinta-feira que o governo deve apresentar neste mês ao Congresso Nacional uma proposta de reforma da Previdência e que vai continuar trabalhando para cobrir um déficit orçamentário.
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AVALIAÇÃO DE RISCO Escala de notas de crédito globais das agências de classificação:
COMO A S&P ATRIBUI NOTAS DE CRÉDITO AAA: rating mais alto atribuído pela S&P. Devedor tem capacidade extremamente forte para honrar seus compromissos financeiros AA: capacidade muito forte para honrar compromissos A: capacidade forte para honrar seus compromissos, mas é mais suscetível a efeitos adversos de mudanças na economia BBB: capacidade adequada para honrar compromissos, mas condições econômicas adversas podem levar a um enfraquecimento na capacidade de pagamento BB: primeiro grau de rating especulativo. Devedor é menos vulnerável no curto prazo do que os devedores com ratings mais baixos. No entanto, enfrenta grandes incertezas no momento e 59
exposição a condições adversas poderiam levá-lo a uma capacidade inadequada para honrar compromissos B: atualmente tem capacidade para honrar seus compromissos financeiros, mas condições adversas de negócios, financeiras ou econômicas provavelmente prejudicariam a capacidade e a disposição de pagamento CCC: atualmente vulnerável e dependente de condições favoráveis para honrar seus compromissos financeiros CC: devedor está atualmente altamente vulnerável. A avaliação CC é utilizada quando o default ainda não ocorreu, porém a S&P espera que seja praticamente certo R: devedor avaliado como R está sob supervisão regulatória em decorrência de sua condição financeira SD e D: devedor avaliado como SD (default seletivo) ou D está em default em uma ou mais de suas obrigações financeiras, incluindo obrigações financeiras avaliadas ou não. O rating ‘D’ também será usado quando a Standard & Poor’s acredita que o default será geral e que o devedor não conseguirá pagar todas, ou quase todas, as suas obrigações no vencimento
Os ratings de AA a CCC podem ser modificados pela adição de um sinal de mais (+) ou de menos (-) para mostrar a posição relativa dentro das principais categorias de rating Fonte: Standard & Poor`s, a Moody`s e a Fitch Ratings
Entenda por que o Brasil precisa da PEC do teto Projeto pretende impor limites à farra de gastos que levou o país a uma das maiores crises econômicas de sua história Marcos Santos/USP Imagens
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Notas e moedas de real FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, 09/10/2016 às 08h00 O Brasil está em grave crise fiscal. O governo, por não conseguir gastar menos do que arrecada, vai impulsionando a dívida pública. Uma dívida elevada é também mais arriscada para quem empresta. Alguns param de financiar o governo pelo medo de calote no futuro. Quem ainda topa emprestar, nessas condições, passa a exigir taxas de juros cada vez mais altas. E esses juros altos contribuem ainda mais para o drama nacional. O governo precisa desesperadamente parar essa sangria. Essa é a motivação da proposta de emenda constitucional 241, a PEC 241. Também chamada de PEC do teto de gastos, ela já foi aprovada por comissão especial da Câmara. Agora, para seguir prosperando, depende de votação em dois turnos na Casa. A proposta: limitar o crescimento dos gastos do governo à inflação do ano anterior. Por exemplo, se a inflação for de 5% ao ano em 2017, os gastos públicos poderiam aumentar no máximo em 5% ao ano em 2018. COMO CHEGAMOS A ESSE PONTO? Os gastos públicos no Brasil crescem mais rapidamente que o PIB há mais de duas décadas. Isso vinha sendo acomodado com aumentos de impostos. Nossa carga tributária seguiu na mesma toada de crescimento e hoje é bastante elevada, se comparada às de países com nível de desenvolvimento próximo ao nosso. Sabíamos que, em algum ponto no futuro, teríamos de fazer um ajuste para limitar o crescimento desses gastos. Afinal, os impostos poderiam chegar a um patamar tal que comprometeriam seriamente a atividade econômica. Só que as coisas ficaram mais graves já no início desta década. Principalmente, no primeiro mandato da então presidente Dilma Rousseff. O governo pisou no acelerador. Aumentou fortemente seus gastos e reduziu impostos. Boa parte desse arranjo serviu não a programas sociais, educação, saúde ou infraestrutura —que ajudariam a melhorar a distribuição de renda e a produtividade de longo prazo de nossa economia. Fatia relevante dos recursos foi usada para turbinar o caixa do BNDES, para que, depois, fossem emprestados a juros subsidiados para empresas e setores selecionados. NO QUE DEU A POLÍTICA ECONÔMICA NESTA DÉCADA? A produtividade da economia despencou e o crescimento, relativamente elevado nos anos anteriores, minguou. A arrecadação do governo também parou de crescer. Essas duas coisas gastos crescendo muito e arrecadação parada ou caindo levaram a uma deterioração nas contas do governo. Pedaço desse buraco foi, inclusive, escondido da população no balanço de bancos públicos as tais das pedaladas fiscais. E a dívida pública cresceu assustadoramente.
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QUAIS AS CONSEQUÊNCIAS DO ENDIVIDAMENTO ACELERADO? Quando acordamos, em 2015, ficou claro o tamanho do estrago: governo gastando muito mais do que arrecada, dívida e juros crescendo de maneira insustentável e perda do grau de investimento. Isso tudo culminou em uma das maiores crises econômicas de nossa história, com queda de mais de 3% no PIB por dois anos consecutivos. Quando acabar 2016, a renda média do 62
brasileiro (renda per capita) terá encolhido cerca de 10% em apenas três anos. E a recessão aumenta a crise fiscal, por derrubar a arrecadação. Como dito, a trajetória de longo prazo dos gastos não era lá muito sustentável. Isso mesmo se a extravagância do início da década não fosse cometida. Essa extravagância, na verdade, só antecipou o problema. O ajuste fiscal é imprescindível para evitar que esse movimento desastroso das contas públicas continue. Precisa ser feito o quanto antes. Mas, até agora, nada de concreto foi realizado. Estávamos paralisados por uma crise política, que acabou derrubando a presidente Dilma. A PEC do teto de gastos é, finalmente, um passo na direção de uma solução possível. O QUE ACONTECE SE NADA FOR FEITO? A dívida continuará crescendo de maneira insustentável, simples assim. Se nada sair do papel, uma hora acontece um calote. Pense em quando você opta pelo pagamento mínimo da fatura no cartão de crédito. Amanhã ela vem mais gorda, com juros. Para saldar a dívida, você precisa de outras fontes de recursos: basicamente, tem de parar de gastar mais do que ganha. Caso contrário, não terá como pagála. Algo similar pode ocorrer no caso do governo brasileiro. Com um agravante: a maior parte da dívida pública é interna (denominada em reais). Os credores do governo são quem? Predominantemente, pessoas e instituições brasileiras —em sua maioria, bancos. Um eventual calote provocaria uma bagunça no setor financeiro. Bancos poderiam quebrar. Muita gente perderia, nesse caso, montantes poupados durante anos. E faltariam recursos a ser emprestados para empresas considerem tocar e expandir seus negócios. Resumindo, um verdadeiro apocalipse econômico. NÃO É MELHOR IMPRIMIR DINHEIRO E PAGAR A DÍVIDA? Dificilmente o governo vai escolher o caminho do calote. Há uma segunda opção, que, embora um pouco menos dolorosa, também é terrível: ao contrário de nós, reles mortais, o governo pode imprimir dinheiro para pagar suas contas. Já vimos esse filme na década de 1980 e começo da década de 1990. Essa saída dá em inflação alta ou, possivelmente, hiperinflação. Com mais dinheiro em mãos, as pessoas querem comprar mais coisas. Só que o governo não aumenta a capacidade produtiva da economia quando coloca mais dinheiro em circulação: não cria novas pontes e estradas, não aumenta a qualidade educacional etc. O que temos então? Maior demanda por bens e serviços para uma mesma oferta. E os preços sobem! Quanto mais o governo imprime dinheiro, maior o ritmo de aumento dos preços, ou seja, a taxa de inflação.
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Ajustar as contas do governo, limitando o crescimento dos gastos, é a única forma de evitar esses cenários tenebrosos. O QUE A PEC 241 PROPÕE? A ideia básica da PEC é conter o crescimento dos gastos públicos. A despesa de um ano (descontando o pagamento de juros da dívida) não pode crescer mais do que a inflação no ano anterior. Dito de outra forma: pelas regras escritas na PEC, a quantidade de coisas que o governo vai poder pagar ficará relativamente constante. Suponha o nível de 4,5% ao ano para a inflação. E digamos que o governo tenha recursos suficientes para pagar por uma determinada quantidade de bens e serviços. Amanhã, o preço dos bens e serviços, com esse nível de inflação, será 4,5% mais alto. Logo, se os gastos do governo puderem subir 4,5% ao ano, respeitando o nível de inflação anterior, como proposto na PEC, a quantidade de bens e serviços que o governo conseguirá comprar será a mesma do ano anterior. Em outras palavras, o gasto total (sem contar juros da dívida) ficará relativamente constante em termos reais. Isso deverá valer por 20 anos, com possibilidade de revisão das regras após 10 anos da aprovação. A expectativa é que, com a recuperação da economia brasileira, a arrecadação volte a crescer, reduzindo o rombo entre despesas e receitas do setor público. Com isso, nossa dívida pública pode caminhar para níveis sustentáveis. Uma situação fiscal mais confortável também garante uma dívida com menor risco de calote, o que permite juros menores. E a dívida fica menos cara, consequentemente. É O IDEAL? A PEC 241 coloca uma camisa de força nos gastos. Quer gastar mais comprando um portaaviões novinho para a Marinha? Ok. Mas o governo tem de diminuir o gasto em outro lugar. Importante: na proposta atual, essa redução não pode ocorrer (em termos reais) nos gastos com saúde e educação, ao contrário do que tem sido difundido aos quatro ventos, à exaustão, nas redes sociais. O ideal seria um pouco mais de flexibilidade. Em particular, a possibilidade de aumentar gastos em momentos de recessão, para estimular a atividade econômica. Mas, para isso, teríamos de cortar gastos nos momentos de vacas gordas, para que a dívida no longo prazo não fuja de controle. Reduzir gastos nos tempos de bonança foi justamente o que não fizemos no passado recente. Por isso, a possibilidade de gastar mais para combater crises não se aplica ao quadro fiscal brasileiro. Não tem outro jeito. Só resta a camisa de força dos gastos como alternativa disponível para evitar o desastre. AUMENTAR IMPOSTOS É UMA ALTERNATIVA À PEC 241?
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A sociedade já está farta de pagar tanto imposto para receber muito pouco em troca. Além disso, se tudo continuar na mesma, os gastos crescerão ainda mais. Até que patamar aumentaremos os impostos para financiar isso? Fora a necessidade, há uma grande vantagem do limite nos gastos imposto pela PEC 241: ele torna mais claros os custos envolvidos em usar o dinheiro público. Os gastos totais estarão congelados (em termos de poder de compra). Toda vez, por exemplo, que um empresário pedir um subsídio para seu setor ou que funcionários do judiciário demandarem aumento, o governo terá de pensar duas vezes ou mais: vai precisar tirar de algum outro lugar. Na prática, isso já acontece. O governo não tem uma quantidade infinita de recursos —se aumenta um gasto, precisa taxar mais as pessoas ou gastar menos em outra área, no presente ou no futuro. Mas esse processo não é óbvio para a grande maioria da população. Com a PEC 241, esses mecanismos se tornarão transparentes: um subsídio a determinado setor sairá de onde? Dos recursos do Bolsa Família? Do investimento em saneamento básico? Da infraestrutura? Os termos propostos pela PEC tendem a escancarar negociações de verbas e as prioridades de nossos políticos. POR QUE A PEC PODE TRAZER MAIS TRANSPARÊNCIA? Pouca clareza no Orçamento facilita a vida de corporações e grupos interessados em se beneficiar com a expansão dos gastos públicos. É só pressionar políticos. Só que, agora, com a PEC, os políticos terão mais dificuldade em ceder a tais pressões. Eles terão que, explicitamente, reduzir outros gastos para acomodar novas demandas. O novo arranjo pede maior participação nossa, como cidadãos, para evitar que, na calada da noite, uma mudança de gastos seja aprovada para beneficiar pequeno grupo de interesses. Quando isso acontece, quem paga a conta é a maioria. Sobretudo, a parcela mais carente. A opinião pública será fundamental. Da mesma forma que hoje rechaçamos quaisquer mudanças contrárias ao combate à corrupção, precisaremos ser vigilantes quanto à aplicação no nosso escasso dinheiro público. APROVADA A PEC, ACABARAM OS PROBLEMAS? Outro ponto importante da PEC 241: ela torna ainda mais gritante a necessidade de outras reformas. Neste momento, a mais urgente delas é a da Previdência. Nos próximos anos, a população brasileira será muito mais velha, pressionando fortemente as despesas com aposentadorias. Com a aprovação do limite de gastos, teremos de diminuir, progressivamente, as demais despesas. Sem isso, não vai dar para acomodar o crescimento das aposentadorias.
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A conta não fecha sem a reforma da Previdência. Com as regras da PEC em vigor, ficará claro para a população que não há alternativa a não ser enfrentar o problema. Nesse sentido, fixar uma idade mínima é imprescindível. A PEC É DOLOROSA? Não. Na realidade, a PEC 241 nos poupa da dor que uma escalada da dívida nos causaria. O setor público precisa ganhar eficiência. E eficiência significa ser capaz de fazer mais e melhor com uma mesma quantidade de recursos. Nesse sentido, o Brasil depende de mudanças na carreira do servidor, com maiores incentivos para prover serviços de excelência para a população premiando bons profissionais e punindo os incompetentes, em alguns casos, até com demissão. A PEC 241 representa uma oportunidade para uma gestão mais transparente e eficiente dos recursos públicos. Regras de governança que coíbam efetivamente casos de corrupção também são necessárias e vão além da questão ética. Passou da hora de impedir que o dinheiro da saúde, da educação e de demais políticas sociais continue indo parar no bolso de criminosos infiltrados na política. Num cenário de restrição e limite de gastos, isso passa a ser ainda mais prioritário.
Idade mínima para obter benefício assistencial pode subir para 70 anos Lalo de Almeida/Folhapress
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Idosos aguardam atendimento em agência do INSS, no centro de São Paulo
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, LAÍS ALEGRETTI e VALDO CRUZ DE BRASÍLIA 09/10/2016 às 02h00 Além de desvincular do salário mínimo o benefício assistencial que a Previdência paga a idosos e deficientes de baixa renda, o governo estuda elevar a idade mínima exigida para o acesso ao benefício dos atuais 65 para 70 anos. O Benefício de Prestação Continuada (BPC) garante o pagamento mensal de um salário mínimo a idosos e pessoas com deficiência com renda familiar per capita inferior a 25% do salário mínimo. Como o benefício tem caráter assistencial e não exige contribuição, o governo teme que algumas pessoas recorrerão a ele em vez de pagar a Previdência, se o Congresso aprovar as reformas propostas pelo presidente Michel Temer e as regras para aposentadoria ficarem mais duras. A proposta de reforma em estudos no governo estabelece idade mínima de 65 anos para a aposentadoria de homens e mulheres e exige pelo menos 25 anos de contribuição com a Previdência. Em relação ao BPC, o governo ainda estuda como fazer a transição para o novo modelo. Um dos cenários considerados é a elevação da idade mínima em um ano a cada dois anoscalendário. O governo ainda não sabe que regra propor para o reajuste do benefício se ele for desvinculado do salário mínimo. Um novo índice poderia ser usado para isso, mas os técnicos do governo acham que nada obriga a lei a prever reajuste automático do BPC. O governo também terá de mudar a regra que dá direito ao benefício, por causa de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou o critério de renda, de 25% do mínimo, insuficiente para caracterizar a miséria. Estudo feito pelo Ministério da Fazenda ainda no governo Dilma Rousseff, ao qual a Folha teve acesso, já apontava necessidade de mudar as regras do BPC se a idade de aposentadoria aumentasse. Uma comparação internacional feita pelo documento mostra que benefícios assistenciais não são vinculados ao salário mínimo na maioria dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Enquanto o BPC corresponde a 100% do salário mínimo no Brasil, benefícios similares equivalem a 65% na Holanda e na Bélgica, 64% na Nova Zelândia e 63% na Irlanda. A proposta de Orçamento para 2017 enviada ao Congresso prevê gastos de R$ 51 bilhões com o pagamento do BPC e R$ 562 bilhões com as aposentadorias de trabalhadores da iniciativa privada.
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Vivo vai trocar presidente em 2017; sai Amos e entra Eduardo Navarro Navarro é o atual presidente do Conselho de Administração da empresa no Brasil Fonte Jornal O Estado de S.Paulo 09 Outubro 2016 às 22h56 A Telefônica Brasil, dona da marca Vivo, terá novo presidente a partir de 1º de janeiro do ano que vem. Eduardo Navarro, atual presidente do Conselho de Administração da empresa no Brasil, assumirá a presidência da companhia no lugar do israelense Amos Genish, que ocupava o cargo desde 2015 e foi encarregado de executar o processo de integração da Telefônica com a GVT, adquirida pela empresa. A indicação de Navarro foi feita pelo Conselho da empresa na sexta-feira, depois que Genish manifestou intenção de deixar o cargo por motivos pessoais. Ele vai presidir o Comitê de Estratégia da empresa no Brasil, que acaba de ser criado, e também será membro do Conselho da Telefônica. De acordo com a empresa, em quase um ano e meio à frente da empresa, o executivo conseguiu alcançar R$ 22 bilhões de sinergia com a integração das duas empresas. A meta foi atingida antes do prazo inicialmente previsto. Em nota, a Telefônica diz que a troca do comando marca o início de uma nova fase da empresa no País, após o processo de integração formal com a GVT. "Durante este período, a Telefônica Brasil reforçou a sua competitividade e liderança no País com os seus principais indicadores financeiros (receitas, EBITDA e geração de fluxo de caixa) apresentando desempenho acima da média do mercado, assim como elevados níveis de qualidade", diz o comunicado. Navarro, o novo presidente da Tlefônica, é engenheiro metalúrgico pela Universidade Federal de Minas Gerais e ingressou na companhia 1999, tendo ocupado várias posições na empresa. Anteriormente, foi consultor da Mckinsey & Company, atuando em projetos de infraestrutura e telecomunicações na América Latina.
Meirelles se reúne com Lagarde e vê concordância de diagnósticos com FMI sobre Brasil Reforma da previdência e teto de gastos públicos foram alguns dos assuntos discutidos em Washington Fonte Altamiro Silva Junior, Jornal O Estado de S. Paulo 09 Outubro 2016 às 15h16 O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, teve neste domingo seu último compromisso oficial na reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Washington, um encontro com a diretora-gerente da instituição, Christine Lagarde. Na reunião, segundo Meirelles, o tema principal foi o cenário da economia brasileira. O ministro ressaltou para Lagarde que há uma concordância de diagnósticos do governo e do FMI sobre o que precisa ser feito para restaurar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Meirelles falou das reformas estruturais que estão sendo implementadas e de novas medidas que serão enviadas ao Congresso. Segundo o ministro, o encontro foi muito "produtivo". 68
"Estou encorajada pelo foco e direção destas reformas. Aprová-las em um período razoável ajudará a reforçar a credibilidade do conjunto de políticas macroeconômicas, estimular a confiança na economia e ancorar o retorno para um crescimento mais forte, inclusivo e sustentável do Brasil", afirmou Lagarde em um comunicado. Lagarde e Meirelles discutiram ainda medidas mais específicas para o ajuste fiscal, incluindo a proposta de um teto que limita a expansão do gasto público, que deve ser votada na Câmara nesta segunda-feira. Outro tema das conversas foi a reforma da previdência. Segundo Meirelles, o governo está acertando os detalhes finais do texto e a proposta deve ser enviada aos congressistas em breve. O FMI prevê expansão de 0,5% para o PIB brasileiro em 2017, mas economistas da instituição ressaltaram durante o evento que para a economia voltar a crescer é preciso que o ajuste fiscal ande. "Assumimos em nossa previsão para 2017 que a proposta de teto dos gastos deve ser aprovada em breve. Também levamos em conta que haverá algum tipo de reforma da previdência", afirmou o diretor assistente e economista do Fundo, Krishna Srinivasan, a jornalistas na sexta-feira.
Sem aprovação da PEC do Teto, governo terá de aumentar impostos, diz Temer Presidente disse em entrevista exclusiva à Rádio Estadão que aprovação é plano A para contornar a atual crise fiscal Fonte Álvaro Campos, Daniel Weterman e Elizabeth Lopes, Jornal O Estado de S. Paulo 10 Outubro 2016 às 10h07 Saiba mais sobre a Pec do Teto: Ministros das Cidades e de Minas e Energia deixam cargos e devem reforçar votação da PEC do Teto Procuradoria diz que PEC que limita gastos públicos é inconstitucional Na TV, Meirelles defende corte de gastos, mas promete preservar saúde e educação Temer faz jantar para aprovar PEC do Teto Temer liga para deputados indecisos na véspera da votação da PEC do Teto SÃO PAULO - O presidente da República, Michel Temer, afirmou em entrevista exclusiva à Rádio Estadão que o governo não está trabalhando com a hipótese de não aprovação da PEC dos gastos. "Não pensamos em plano B, apenas no plano A. Vamos esperar o que vai acontecer na votação, mas é perfeitamente possível aprová-la", afirmou. Temer ainda ressaltou que aprovação na véspera de feriado, "resgatará imagem do parlamento".
Michel Temer afirmou que o seu governo trabalha para contornar a atual crise fiscal com a PEC do teto dos gastos, como alternativa à não elevação dos impostos. Ele lembrou que há seis, sete meses se falava muito sobre uma possível volta da CPMF, mas hoje o assunto não está na pauta de sua gestão, justamente pelo foco estar na aprovação da PEC 241, que limita os gastos públicos. "Não falamos mais disso, vamos tentar, por meio da PEC, contornar a situação, para não agravar mais os tributos no País".
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Presidente diz que a aprovação 'resgatará imagem do Parlamento' Questionado sobre a possibilidade de elevar a carga tributária caso a PEC não seja aprovada, Temer explicou que sem corte de gastos só é possível equilibrar as contas públicas com aumento de impostos ou inflação, que são métodos onerosos para a população. "Tem sido alardeado isso (possível alta de tributação) e com efeito por vir a ocorrer (caso a PEC não seja aprovada pelo Congresso)", afirmou. Na entrevista, Temer afirmou que o governo tem se esforçado para divulgar a necessidade de se aprovar a PEC, mas admitiu que existem grupo de oposição que lançam "inverdades" sobre o projeto, especialmente com acusações de que haverá corte nos recursos para saúde e educação. Comentando a manifestação da Procuradoria-Geral da República contrária à proposta, Temer afirmou que o parecer foi dado através de uma nota técnica, o que não representa uma manifestação jurídica do órgão. "Mais para frente, quando a Procuradoria se manifestar formalmente, penso que poderá dar parecer favorável (à PEC)", disse o presidente, sobre um eventual questionamento jurídico da mudança constitucional. Ele ressaltou que a afirmação foi feita por setores da Procuradoria, que ele respeita, e não pelo procurador-geral, Rodrigo Janot. Temer garantiu que os investimentos em saúde educação serão mantidos. "Teto não é teto para saúde, educação e cultura. É um teto global, quando for formalizar qualquer proposta talvez tenhamos que tirar de obras públicas ou alguns setores para compensar sempre saúde e educação", comentou. O presidente afirmou que recebeu uma ligação do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, contando que a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, lançou uma nota afirmando que o teto de gastos é fundamental. Michel Temer não comentou se a exoneração dos ministros da Cidades e Minas e Energia que são deputados federais, publicada no Diário Oficial da União, foi feita para garantir votos à proposta do governo. E destacou a reunião feita ontem com parlamentares e o jantar no Palácio da Alvorada para angariar apoio necessário à aprovação em plenário da medida. Para 70
que a matéria seja aprovada em primeiro turno, são necessários votos de 308 parlamentares."A classe política toda está preocupada com o Brasil, e por isso trabalhei o dia todo, liguei para alguns ditos como indecisos, e não há nenhum problema em relação a isso". Nesse ponto, o presidente voltou a defender sua tese da pacificação nacional, afirmando que o Brasil não pode mais continuar dividido. "Não vamos governar para uma área só, como se fez por muito tempo nesse País", comentou. Temer explicou que seus ministros estão se reunindo com sindicatos e inclusive movimentos de esquerda, como o MTST, liderado por Guilherme Boulos. "São movimentos que têm sua expressão e nós vamos conversar, dialogar, asfaltar o caminho. Vamos conversar com todos os setores que estiverem dispostos. Isso é fundamental para termos unidade, pacificação". Temer lembrou a fala de um senador que, quando o governo interino tinha quase dois meses no poder, atribui-lhe os 12 milhões de desempregados no País. "Eu não levo em conta isso, vejo com tranquilidade. O que interessa são programas que possam tirar o País da crise". O presidente lembrou, no entanto, que isso não vai acontecer de uma hora para a outra. "Não vamos pensar que tomamos uma medida hoje e amanhã está tudo azul. Ainda vai levar algum tempo". Participaram da entrevista exclusiva à Rádio Estadão com Temer os âncoras do Estadão no Ar, Haissem Abaki e Alessandra Romano. Também participam o jornalista Marcelo de Moraes, da Coluna do Estadão, e a colunista de política do Estadão, Eliane Cantanhêde.
Elite estatal ocupa 6 das 10 profissões mais bem pagas Levantamento a partir de declarações do imposto de renda mostra que promotor, procurador, juiz, auditor são campeões em ganhos Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Alexa Salomãon 10 Outubro 2016 às 05h00 Entre as dez categorias profissionais mais bem remuneradas do País, seis fazem parte da chamada elite do funcionalismo público – como promotores, procuradores e juízes – e uma tem concessão pública, o dono de cartório. Em outras palavras, sete das atividades profissionais mais rentáveis do Brasil estão associadas à estrutura estatal. O ranking foi elaborado pelo pesquisador José Roberto Afonso, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). A sua base de dados é oficial: o relatório “Grandes Números”, divulgado recentemente pela própria Receita Federal a partir de declarações de imposto de renda pessoa física de 2015, com valores de 2014.
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A categoria recordista em ganhos é o titular de cartório, atividade híbrida entre o público e o privado. Na média, o rendimento anual apresentado na declaração do imposto de renda do dono de cartório fica em R$ 1,1 milhão. Um detalhe que impressiona é o nível de concentração de riqueza nessa camada. Os ganhos dos 9.409 donos de cartórios somam quase R$ 11 bilhões. A cifra é equivalente ao resultado de grandes conglomerados empresariais, como a cervejaria Ambev, que tem lucro anual R$ 12 bilhões. Na sequência, em segundo, terceiro e quarto lugares, bem como sexto, sétimo e oitavo, entre os recordistas de ganhos estão carreiras típicas do Estado. Promotores e procuradores do Ministério Público ganham anualmente, em média, quase R$ 530 mil. Juízes e integrantes dos tribunais de contas, mais de R$ 512 mil. Diplomatas, R$ 332 mil, na média, por ano. Aqui cabe uma ressalva. Como lembra o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), as declarações de imposto de renda reúnem informações sobre a 72
camada mais privilegiada da população que não se encontram em outras fontes. “A declaração dá uma radiografia das pessoas de renda mais elevada e vários trabalhos recentes só foram possíveis após a divulgação e o cruzamento de dados da Receita Federal”, diz Appy. O relatório atual traz informações de 27 milhões de pessoas, distribuídas em 133 categorias profissionais. O rendimento do conjunto, no agregado, soma R$ 1,4 trilhão por ano. Ao fazer uma divisão simples do bolo, o pesquisador Afonso chegou à conclusão de que a fatia da população brasileira que declara imposto de renda ganha, na média, por ano, R$ 87 mil. Detalhe: 58 categorias recebem acima desse valor e 77, abaixo disso. Nessa ótica, promotores, procuradores, juízes e integrantes de tribunais de contas recebem cerca de seis vezes mais que a média dos declarantes de imposto de renda no País. Afonso atribui a disparidade, entre outras razões, à dinâmica do orçamento e dos gastos entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário: “A crise fiscal atual revela que o debate das dificuldades está concentrado no poder Executivo, enquanto os demais poderes seguem gerindo as suas folhas salariais e os seus orçamentos como se nenhuma crise estivesse ocorrendo no País”, afirma. “Reajustes fortes têm sido dados para essa elite do setor público, enquanto a imensa maioria dos servidores públicos não é tão beneficiada”. Empresários e altos executivos têm rendimento isento Três categorias do setor privado estão entre as dez com maior rendimento, segundo dados de declarações do imposto de renda: médico, com R$ 305 mil por ano, em média (5º lugar), piloto de avião, com R$ 253 mil (9º) e atleta, com R$ 219 mil (10º). Segundo o pesquisador José Roberto Afonso, autor do levantamento, há uma razão para explicar a ausência de uma categoria que, todos intuem, está entre as campeãs de ganhos, donos e altos executivos de empresas. Parte dos ganhos dessa categoria enquadra-se como rendimento não tributável, como lucros e dividendos. Cerca de 707 mil dirigentes e executivos ganham R$ 214 bilhões que são isentos. Outra parcela recebe como pessoa jurídica. Por causa disso, na lista de ganhos sujeitos a tributação na pessoa física, o dirigente de empresa aparece em 30º lugar, com ganho médio anual de R$ 138 mil. Afonso reforça que essa categoria é ampla e diversa. Inclui o presidente de uma multinacional, o dono de uma loja de ferragens e o profissional “contratado” como empresa, porque cresce a chamada “pejotização”. Segundo Afonso, altos executivos devem, sim, estar entre os dez mais bem pagos do País, mas mesmo que fosse possível definir em que posição, não alteraria a predominância das funções públicas na lista das mais rentáveis.
Nobel de Economia premia estudos da "teoria dos contratos" Prêmio foi concedido ao britânico Oliver Hart e ao finlandês Bengt Holmstrom Fonte Reuters 10 Outubro 2016 às 08h10 Notícias relacionadas: Reação ao Nobel da Paz ilustra polarização de colombianos Japonês vence Prêmio Nobel da Medicina de 2016 Nobel da Química vai para as menores máquinas do mundo Britânicos ganham Prêmio Nobel da Física de 2016
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O britânico Oliver Hart e o finlandês Bengt Holmstrom venceram o prêmio Nobel de Economia de 2016 por suas contribuições para a teoria dos contratos, ajudando a entender questões como o pagamento baseado em performances para executivos de cargos elevados. "O trabalho cria uma fundação intelectual para a criação de políticas e instituições em muitas áreas, da legislação de falência às constituições políticas", afirmou a Academia Real Sueca de Ciências ao anunciar o prêmio de 8 milhões de coroas suecas (US$ 928 mil). Hart é professor de economia na Universidade de Harvard, enquanto Holmstrom é professor de economia e administração no Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Foto: Stina Stjernkvist/EFE
Britânico Oliver Hart e finlandês Bengt Holmstrom ganham o Prêmio Nobel de Economia de 2016 O trabalho de Hart tem ajudado a entender quais companhias devem se fundir e o equilíbrio correto de financiamentos e quando instituições como escolas devem ser privadas ou públicas, informou a academia em comunicado. O trabalho de Holmstrom ajuda a formular contratos para executivos, de acordo com o comunicado. Até o momento, foram anunciados os vencedores do Prêmio Nobel da Paz, para o presidente colombiano Juan Manuel Santos; de Física, para os britânicos David Thouless, Duncan Haldane e Michael Kosterlitz; de Medicina, para o japonês Yoshinori Ohsumi; e de Química, para o francês Jean-Pierre Sauvage, o britânico J. Fraser Stoddart e o holandês Bernard Feringa. Resta ainda a divulgação do premiado na categoria Literatura, que deve ser divulgado nesta quintafeira, 13.
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Uso de informações de redes sociais para investir em ações esconde perigos Usuários compartilham informações de veracidade duvidosa para tentar mexer com o valor dos papéis; CVM começa a fiscalizar perfis Fonte Fernanda Guimarães, Malena Oliveira e Lígia Morais, especial para o Estado, Jornal O Estado de S Paulo 10 Outubro 2016 às 08h10
Notícias relacionadas: Ações da Petrobrás sobem 12% na semana e puxam valorização da Bovespa Petróleo e cenário político fazem Bolsa atingir novo pico no ano SÃO PAULO - As redes sociais impulsionaram a propagação de informações sobre o mercado financeiro e muitos investidores, em especial pessoas físicas, utilizam esse suporte para tentar potencializar ganhos. Ao mesmo tempo, contudo, há operadores utilizando a rede de forma duvidosa, compartilhando notícias sem procedência para influenciar o desempenho de ações na Bolsa. A troca de informações nessas plataformas já chamou a atenção do regulador do mercado de capitais. O presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Leonardo Pereira, afirma que as mídias sociais vêm sendo fiscalizadas, mas admite que o desafio é grande dada a amplitude da rede. O executivo explica que o regulador precisa avaliar qual o tipo de interação de determinado perfil, uma vez que o compartilhamento de notícias já públicas ou a simples troca de ideias não chegam a ser prejudiciais. É preciso vasculhar a credibilidade do perfil em rede social antes de seguir os conselhos. Uma das formas é exatamente verificar na CVM se existe qualquer processo em aberto contra o dono de determinado perfil. Outra dica é passar um pente-fino no histórico de publicações do perfil em questão. Para confiar plenamente, só as páginas oficiais das empresas, destaca o coordenador do Mestrado em Administração da FGV, Marcelo Coutinho.
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Foto: SERGIO CASTRO | ESTADÃO CONTEÚDO
Ceticismo. O publicitário Alexandre Peregrino, que investe em ações desde 2001, usa o ceticismo como arma. “Se alguém conseguisse prever os preços das ações, usaria a informação a seu favor e não divulgaria na internet”, diz. Ele não acredita ser possível influenciar cotações por meio das redes sociais e argumenta que quem faz uma postagem não tem a garantia de que ela terá o efeito desejado. Há menos tempo em contato com o mercado de ações, o advogado André Soutelino buscou, no início do ano, respaldo em cursos específicos para aprender a operar. Já o estudante Wellington Nakayama investe em ações há sete anos e checa as informações que recebe nesses grupos. “Algumas pessoas têm conhecimento, mas muita coisa é ‘achismo’”, alerta. Há situações em que perfis dizem apostar na alta de alguma ação e afirmam que “uma notícia bombástica sairá dentro dos próximos dias”. O efeito é simples: a pessoa propaga a informação para que o papel valorize e, em seguida, vende seu lote de ações a um preço maior do que comprou. Coutinho, da FGV, explica que as redes sociais digitalizaram os boatos e aumentaram a velocidade de troca de informações, que sempre existiram no mercado acionário. 76
Mercado financeiro prevê inflação menor em 2016 e 2017 Relatório de Mercado Focus mostra que a mediana para o IPCA - o índice oficial de inflação este ano passou de 7,23% para 7,04%; há um mês, estava em 7,36% Fonte Fabrício de Castro, Jornal O Estado de S. Paulo 10 Outubro 2016 às 09h24 Notícias relacionadas As expectativas que o IPCA baixo alimenta Confiança do consumidor tem alta de 7,1% BRASÍLIA - Após a divulgação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de setembro, na última sexta-feira, os economistas do mercado financeiro reduziram suas projeções para a inflação em 2016 e 2017. O Relatório de Mercado Focus, divulgado nesta segunda-feira, 10, mostra que a mediana para o IPCA - o índice oficial de inflação - este ano passou de 7,23% para 7,04%. Há um mês, estava em 7,36%. Já a projeção para o ano que vem foi de 5,07% para 5,06%. Há quatro semanas, apontava 5,12%. As mudanças ocorreram porque, na sexta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou uma inflação de apenas 0,08% em setembro, abaixo do esperado pelo mercado financeiro (entre 0,10% e 0,23%) e da taxa de agosto (0,44%). Em especial, houve deflação entre os alimentos, de 0,29%, algo que não ocorria desde agosto do ano passado. Foto: REUTERS
Previsão do índice oficial de inflação - este ano passou de 7,23% para 7,04% No Relatório Trimestral de Inflação (RTI), divulgado na semana anterior, o BC havia atualizado suas projeções para a inflação para os próximos anos, pelo cenário de referência: 7,3% em 2016, 4,4% em 2017 e 3,8% em 2018.
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No relatório Focus de hoje, entre as instituições que mais se aproximam do resultado efetivo do IPCA no médio prazo, denominadas Top 5, a mediana das projeções para este ano caiu de 7,30% para 7,02%. Para 2017, a projeção passou de 5,50% para 5,13%. Quatro semanas atrás, as expectativas eram de, respectivamente, 7,50% e 5,50%. Já a inflação suavizada 12 meses à frente voltou a ceder, passando de 5,15% para 5,07% de uma semana para outra - há um mês, estava em 5,24%. Entre os índices mensais mais próximos, a estimativa para outubro passou de 0,40% para 0,39%. Um mês antes, estava em 0,42%. No caso de novembro, a previsão do Focus seguiu em 0,45%. Há quatro semanas, era de 0,47%. No RTI, o BC também apresentou suas estimativas mensais para o IPCA: 0,19% para setembro (acima do efetivamente verificado), 0,40% para outubro e 0,45% para novembro. PIB. Pelo documento, as estimativas para o Produto Interno Bruto (PIB) este ano passaram de retração de 3,14% para queda de 3,15%. Há um mês, a perspectiva era de recuo de 3,18%. Para 2017, o cenário é mais favorável, com perspectiva de PIB positivo. O mercado continuou prevendo para o País, conforme o relatório Focus divulgado hoje, um crescimento de 1,30% no próximo ano, mesmo valor projetado há um mês. No segundo trimestre de 2016, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB brasileiro recuou 0,6% ante o primeiro trimestre do ano e teve retração de 3,8% ante o segundo trimestre de 2015. No ano, o PIB acumula baixa de 4,6% e, em 12 meses, recuo de 4,9%. No Relatório Trimestral de Inflação (RTI), o Banco Central atualizou suas projeções para o PIB. No caso de 2016, foi mantida a expectativa de recuo de 3,3%. Para 2017, a projeção do BC é de alta de 1,3%. As estimativas para a produção industrial ainda indicam um cenário difícil. A queda prevista para este ano seguiu em 5,96%. Para 2017, a projeção de alta da produção industrial foi de 1,10% para 1,11%. Há um mês, as expectativas para a produção industrial estavam em recuo de 5,93% para 2016 e alta de 1,11% para 2017. Neste ano até agosto, conforme o IBGE, a queda acumulada na produção industrial é de 8,2%. Já as projeções para o indicador que mede a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB para este ano passaram de 44,90% para 44,80% no Focus, mesmo patamar de um mês atrás. Para 2017, as expectativas no boletim Focus foram de 49,50% para 49,65%, ante projeção apontada um mês atrás de 49,00%. Câmbio. O Relatório mostrou estabilidade nas estimativas para o câmbio deste ano e do próximo ano. O documento indicou que a cotação da moeda estará em R$ 3,25 no encerramento de 2016, mesmo patamar de uma semana antes e de um mês atrás. O câmbio médio de 2016 seguiu em R$ 3,44, também o mesmo valor de uma semana e um mês antes. Para o fim de 2017, a mediana para o câmbio seguiu em R$ 3,40 de uma divulgação para a outra, ante os R$ 3,45 de quatro semanas atrás. Já o câmbio médio de 2017 permaneceu em R$ 3,36 - estava em R$ 3,38 um mês atrás. Nas últimas semanas, o Banco Central seguiu com sua estratégia de leilões diários de swap cambial reverso, cujo efeito nas cotações é equivalente à compra de dólares no mercado futuro. Com isso, vem reduzindo gradativamente sua posição vendida em swaps cambiais tradicionais, hoje em torno de US$ 31 bilhões.
MUDANÇAS CLIMÁTICAS
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A conta vai custar cada vez mais cara e nós continuaremos pagando muito porque não fazemos seguros Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Antonio Penteado Mendonça 10 Outubro 2016 às 09h27 As catástrofes de origem natural, entre elas as mudanças climáticas, estão aí, causando prejuízos de bilhões de dólares , a maior parte não coberta pelas apólices de seguros. Lamentavelmente, o Brasil está entre os países que não contratam seguros para estes riscos, apesar de nossas apólices darem garantia para vários deles.
TEMPO ESCURO No primeiro semestre de 2016, os eventos de origem natural causaram perdas na ordem de 70 bilhões de dólares. Deste total, mais ou menos 20 bilhões de dólares foram pagos pelas seguradoras. O dado delicado é que no período houve um significativo aumento das perdas, em comparação com todo o ano de 2015. Da mesma forma que houve um aumento da participação das seguradoras no total das indenizações pagas. À primeira vista, se o aumento dos prejuízos é uma notícia ruim, o aumento da participação das seguradoras no pagamento das indenizações deveria ser uma notícia boa. No entanto, não é. O que gerou indenizações de 20 bilhões de dólares foi uma maior ocorrência destes eventos em países onde há forte tradição de compra de seguros pela população. Ou seja, nos países desenvolvidos. Nos países mais pobres, o quadro em relação à transferência do pagamento das indenizações para as seguradoras continua como no passado, não se verificou qualquer aumento significativo na contratação de seguros contra estes riscos. Boa parte da Ásia, África e América do Sul permanecem praticamente sem seguros para fazer frente aos danos decorrentes dos eventos de origem natural, especialmente os de origem climática. É um quadro dramático porque estes países não possuem grande capacidade de poupança, o que, no caso de perdas mais elevadas, obriga os governos a suspenderem novos investimentos essenciais para a geração de riquezas para fazer frente aos custos de reconstrução das áreas atingidas. Este cenário aumenta a diferença do grau de riqueza entre as nações, com os países desenvolvidos mantendo sua capacidade de investir em novos projetos porque parte dos prejuízos sofridos pela população é reposta pelo setor de seguros. Enquanto isso, nos países onde a prática da contratação de seguro é a exceção à regra, a população afetada fica mais pobre, em função das perdas diretas e da incapacidade dos governos assumirem rapidamente os custos com a reconstrução das áreas atingidas e a reposição dos patrimônios perdidos. O Brasil não foge do desenho. Pelo contrário, parte importante das perdas acontecidas anos atrás, em função das chuvas na região serrana do Rio de Janeiro, não foram repostas até hoje. E a mesma realidade se espalha pelo enorme território nacional. O governo fala que vai fazer, mas fica na conversa, enquanto os cidadãos atingidos ficam com os prejuízos, muitas vezes capazes de destruir as condições mínimas de sobrevivência autônoma de milhares de famílias afetadas. Em 2015, quase 22% dos municípios brasileiros estavam em situação de emergência ou calamidade pública reconhecida pelo Governo Federal. 1206 cidades tiveram esta condição reconhecida pelo Ministério da Integração Nacional. A grande maioria (707 cidades), fortemente atingida pela estiagem, 358 atingidas pela seca e 141 atingidas pelas chuvas, ventos fortes e granizo.
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Quer dizer, o Brasil, em função de sua área continental, vai, de um extremo a outro, sofrendo severos prejuízos causados pelos mais diversos eventos de origem climática, tanto em regiões urbanas, como em grandes áreas rurais. Os prejuízos vão de perda de vidas humanas, à perda de bens e de lavouras em uma ampla área do nosso território. Com a agravante de estarmos entre as nações com pouca contratação de seguros, o que faz com que as vítimas arquem com seus prejuízos, até que sejam minimamente ressarcidas pelo governo, o que pode não acontecer ou levar muitos anos, como mostra a demora até hoje para o pagamento e reconstrução de boa parte das perdas sofridas pela região serrana do Rio de Janeiro. O duro é que este quadro não deve se modificar nos próximos anos. Mesmo com o setor de seguros disponibilizando garantias para parte dos danos de origem climática, tanto nos seguros patrimoniais, como nos seguros rurais, a contratação de seguros no país deve continuar baixa. É verdade que temos a capacidade de mudar rapidamente, mas, neste caso, isso não deve acontecer, porque contratação de seguro é consequência de educação e desenvolvimento social.
Produto personalizado é opção para queda de juros Certificado de Operações Estruturadas, para quem pretende tomar risco e se proteger de mudanças no mercado, ganha fôlego com corte na Selic Fonte Malena Oliveira, Jornal O Estado de S. Paulo 10 Outubro 2016 às 08h47
Notícias relacionadas GUIA DO TESOURO DIRETO Poupança volta a perder recursos e saque no ano já soma R$ 50,5 bi Uso de informações de redes sociais para investir em ações esconde perigos SÃO PAULO - Entre os produtos que podem se tornar mais atraentes com a queda dos juros e a retomada da economia, o Certificado de Operações Estruturadas (COE) é uma opção para quem deseja tomar algum risco e proteger o que foi investido contra perdas. Especialistas alertam, porém, que o investidor deve atentar à composição dos COEs, que é determinante para a rentabilidade da aplicação. Produto que combina renda fixa e renda variável, um COE oferece parte do retorno obtido com investimentos mais arriscados, como em Bolsa ou câmbio, e dá a opção de blindar o capital. Com a Selic menor e a concretização das expectativas sobre a melhora da atividade, analistas esperam atratividade menor para investimentos em renda fixa, como Tesouro Direto, por exemplo, diante da possibilidade de retorno maior na renda variável. A vantagem do COE estaria na opção de evitar a perda do dinheiro aplicado.
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Com a Selic menor e a concretização das expectativas sobre a melhora da atividade, analistas esperam atratividade menor para investimentos em renda fixa, como Tesouro Direto Com um estoque de R$ 9,4 bilhões até agosto considerado pequeno diante do de aplicações como CDB, Letra de Crédito Agrícola (LCA) e Letra de Crédito Imobiliário (LCI), as emissões têm crescido em ritmo constante. A possibilidade de distribuição dos COEs por corretoras, antes vendidos apenas em bancos, contribuiu para esse avanço. Fábio Zenaro, superintendente de Produtos da Cetip, explica que há dois obstáculos para a disseminação do produto: “O nível de taxa de juros torna outras aplicações, como LCI e LCA, mais atraentes. O fato de o produto ainda ser desconhecido também é um entrave”, diz. Além disso, as populares Letras de Crédito são aplicações isentas de Imposto de Renda. Os COEs podem ser personalizados de acordo com o objetivo do investidor. No Santander, eles são construídos levando em conta a possibilidade de alta ou de queda do dólar. A aplicação mínima é de R$ 15 mil e o prazo é de seis meses. “Em julho, passamos a oferecer o produto para o segmento de renda entre R$ 3 mil e R$ 10 mil”, diz Simon Peled, superintendente de vendas da Tesouraria do banco. Já no Bradesco, que também tem uma forte demanda relacionada ao câmbio, a aplicação mínima varia entre R$ 20 mil e R$ 50 mil e os prazos podem chegar a três anos. “No Brasil, o dólar é tido como medida de riqueza”, diz Paulo Eduardo Waack, diretor da Tesouraria do banco. Devido à garantia do capital, oferecida em 94% dos COEs emitidos no mercado, há produtos com os ganhos limitados até certo patamar, como à variação de 1,5 vezes a alta do dólar ou à alta de 20% da Bolsa no período da aplicação. “Não há risco de perda, mas há o risco de não ganhar nada”, explica o chefe da área de Private Banking e Gestão de Recursos da XP Investimentos, Beny Podluby.
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Além disso, os COEs não são cobertos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Ou seja, se o banco emissor quebrar, o cliente perde o dinheiro investido. Outro ponto que merece atenção é o fato de o investidor raramente conseguir liquidar um COE antes de seu vencimento, devido à baixa liquidez dessa aplicação. “Não recomendamos COEs para quem não tem conhecimento sobre o mercado financeiro devido à sua complexidade”, diz Luciano Tavares, diretor presidente da startup de investimentos Magnetis.
Robôs entram nos chats de empresas para melhorar atendimento ao cliente Song Weiwei/Xinhua
Empresas instalam "chatbots" em aplicativos de conversa por celular para melhorar serviço
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, FILIPE OLIVEIRA DE SÃO PAULO 10/10/2016 às 02h00 Quer amigos sempre dispostos a dar dicas de restaurantes e turismo, ajudar a encontrar passagens de ônibus ou pôr música para tocar? O AskRio2016, o Bigode Passagens, a Meeka e o Zack são perfis no Facebook que estão sempre prontos para isso. Basta procurá-los no aplicativo Messenger (da empresa) e começar a escrever.
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O único inconveniente é que a variedade de assuntos de que eles falam é pequena. Não por antipatia, mas porque são robôs. O uso de "chatbots", como são chamados, está em fase inicial, mas é uma aposta das empresas porque usam ferramentas de inteligência artificial para melhorar os resultados das centrais de atendimento ao consumidor. O Facebook passou a dar suporte à inclusão dos "chatbots" em seu aplicativo de troca de mensagens em abril. IBM e Microsoft têm plataformas de inteligência artificial que podem ser contratadas por outras empresas como base na construção dos robôs, incluindo estrutura para reconhecer intenções e sentimentos. Já a brasileira Movile, dona de aplicativos como iFood e PlayKids, lançou em agosto o Chatclub, uma espécie de mercado de compra e vendas de robôs, que podem ser customizados por empresas compradoras e adicionados ao perfil delas no Messenger. Dário Dal Piaz, líder de parcerias de produtos do Facebook para o Brasil, diz que existem cerca de 30 mil bots em desenvolvimento no mundo, mil deles no Brasil. Por e-mail, ele afirmou à Folha que proporcionar uma comunicação ágil, escalável e personalizada é o principal objetivo dos "chatbots". "Empresas de todo o mundo têm lançado bots no Messenger para se comunicar com clientes. Hoje, você pode comprar comida, checar saldo bancário, mudar assentos de passagem, receber dicas personalizadas e se informar trocando algumas mensagens de texto", escreve ele. Por aqui, outras iniciativas do gênero incluem o "chatbot" do cantor Luan Santana e do UFC, que oferecem agenda de eventos e conteúdo (ambos feitos pela Movile) e o do Banco Original, que dá informações sobre tarifas, taxas e investimentos. MAIS BARATO Por proporcionarem atendimento automático e padronizado, os "chatbots" oferecem esperança de redução de custos e aumento da qualidade de centrais de atendimento de empresas. Desenvolvedoras de "chatbots" afirmam que, devido à busca por soluções que proporcionem economia na crise, estão registrando aumento na demanda. A Direct Talk, que tem hoje 40 projetos de "chatbots" (incluindo robôs em sites da Natura e do Magazine Luiza), espera dobrar o número em 2017. Já a Bluelab, com 12 em atividade, quer terminar o ano com cerca de 25.
As pessoas esperam que as notícias venham até elas, diz editor do 'Washington Post' Divulgação
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Martin Baron, editor do Washington Post
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, SYLVIA COLOMBO ENVIADA ESPECIAL A MEDELLÍN 10/10/2016 às 02h00 O jornalista Martin Baron, 61, disse que colegas de profissão de sua idade ou em meio de carreira precisam "passar logo por um período de luto e olhar para a frente, porque o jornalismo que eles conheciam acabou, mas há vida adiante". Para um público composto basicamente de jornalistas latino-americanos e dos EUA, Baron abriu, no final de setembro, o Festival Gabo 2016, promovido pela Fundación Nuevo Periodismo Ibero-Americano, em Medellín. Em seu discurso, contou como o jornal que edita, o "Washington Post", vem se adaptando aos novos tempos –em que o setor da mídia impressa sofre com a queda da arrecadação publicitária, a competição com novos meios digitais e o impacto das redes sociais. Baron ficou conhecido do grande público ao ter sua passagem pelo "Boston Globe" retratada no filme "Spotlight", quando sua equipe de repórteres especiais revelou um escândalo nacional que envolvia a Igreja Católica com pedofilia. O caso abalou as estruturas da instituição na época. Já o filme, em que Baron é encarnado pelo ator Liev Schreiber, ganhou o Oscar neste ano. O "Washington Post" é uma das publicações mais bem-sucedidas no mundo, tendo passado, em 2015, o "New York Times" em visitantes únicos mensais nos EUA. Falando um bom e 84
fluente espanhol, Baron explicou que hoje seu diário compete de igual para igual com o NYT, mas o foco é sair de Washington e das fronteiras dos EUA. Após a conferência, Baron concedeu entrevista à Folha Folha - O sr. diz que os jornais devem ir aonde o leitor está e ouvir o que os leitores estão conversando. Ou seja, devem ir para as redes sociais. Mas este não é um ambiente hostil a um jornalismo que se pretenda imparcial? Como evitar a polarização desse meio? Martin Baron - Esse é o grande desafio do jornalismo hoje. Muita gente se pergunta se a imprensa tradicional tem mesmo de desempenhar uma função num cenário polarizado como o das redes sociais. Principalmente a imprensa independente, justamente a que não está aliada nem com a esquerda, nem com a direita, nem com nenhum partido. Mas eu acho que há um papel muito importante para nós dentro das redes sociais, porque a maioria das pessoas que está lá de fato está polarizada e buscando fontes informativas que confirmem ou estejam alinhadas ao que pensam. Porém, eu também acho que muita gente vai às redes porque quer saber a verdade e valoriza aqueles que lhe trazem a verdade, independente de quem seja o alvo da cobertura. Mas o sr. não acha que a imparcialidade tem sido um valor em baixa para quem busca notícias nas redes sociais? Em primeiro lugar, não sei se temos de buscar a imparcialidade primeiro. O prioritário é trazer a verdade e chegar a uma conclusão. Se trazemos algo novo e relevante, não importa se estamos castigando a esquerda ou a direita, estaremos cumprindo nosso papel. Às vezes, a mídia dita plural se importa demais em contemplar os dois lados de uma história e eu creio que isso precisa continuar sendo feito. Mas, às vezes, isso chega a um ponto em que diminui o impacto da notícia. Insisto, não estou dizendo que não há que ouvir os dois lados, obviamente que sim. Mas é essencial que, no final, tenhamos algo a dizer, temos de chegar a um ponto e indicá-lo de modo mais enfático do que fazíamos antes. Temos de desenterrar e encontrar as evidências, sermos justos na apuração e fiéis à verdade que revelarmos. Mas, ao final, temos de chegar a uma conclusão, e essa conclusão, nesses tempos, parece-me que tem de ser apresentada de forma mais explícita. Os jornais precisam ter uma posição editorial mais clara com relação a cada cobertura que fazem. E sobre as redes sociais, creio que não há que se ter ilusões. As pessoas nos dias de hoje já não irão buscar a notícia na página de um jornal, elas esperam que as notícias venham até elas, e preferencialmente por meio das redes sociais. E em que estratégias editoriais e operacionais vocês vêm apostando? Em várias frentes. Hoje temos gente de tecnologia trabalhando lado a lado com os jornalistas como algo regular. Temos mais blogs cobrindo áreas bastante especializadas, que vão de ciência e animais a como criar seus filhos e outros assuntos.
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Também tornamos mais dinâmica nossa seção de opinião. Em muitos casos, os nossos colunistas já não estão mais presos a um dia fixo de publicação. Se algo ocorre em suas áreas, pedimos para que expressem seus pontos de vista imediatamente. E mudamos horários na Redação. Temos muito mais gente trabalhando desde muito cedo, temos gente monitorando as redes todo o tempo, especialmente durante a madrugada, para detectar quais tópicos serão assunto no dia seguinte. E estamos estudando e aprendendo muito sobre como e quando postar uma história. O sr. disse que o "Washington Post" está armando uma rede de freelancers, usando jornalistas que ficaram desempregados devido à crise no setor. Isso aponta para um futuro em que jornalistas atuarão como motoristas de Uber, fazendo trabalhos sob encomenda? (Risos) É uma forma de ver a coisa, um pouco pessimista. É verdade que estamos fazendo isso, mas também estamos contratando de acordo com as nossas necessidades. Acho que o segredo para nós, empresas de comunicação, hoje é sermos mais ágeis nessas contratações fora da sede, principalmente se quisermos ser um jornal global, como o "Washington Post" quer. Primeiro, a rede de freelancers está funcionando bem, os profissionais que oferecem bom conteúdo têm sido mais acionados e têm seu perfil valorizado no mercado, ainda que só atuem eventualmente. Por outro lado, estamos sendo mais rápidos ao identificar onde precisamos contratar gente "full time" e onde podemos usar recursos locais. Por exemplo, recentemente, contratamos novos correspondentes na Europa e na Turquia, porque o noticiário lá tem exigido. E há um terceiro recurso que estamos usando mais que é usar o trabalho de quem já mora nos lugares onde precisamos de uma cobertura. Como funciona na América Latina? É um caso claro. Temos um correspondente que vive em Cuba (Nick Miroff), mas também precisamos cobrir direito a Colômbia, o Brasil. Então contamos com uma rede de colaboradores que se reportam a esse correspondente, e ele viaja quando há algo importante. Agora, por exemplo (estávamos a dois dias do plebiscito pela paz), Miroff está na Colômbia. Mas a substituição do olhar do correspondente pelo jornalista local não muda a essência do trabalho do correspondente, que é justamente o de ver o país em questão com o olhar estrangeiro? Não vejo isso como um valor tão essencial. Geralmente, os jornalistas locais estão mais por dentro da situação de suas comunidades e têm mais capacidade de reagir de modo mais imediato a eventos noticiosos. Às vezes, a um local de difícil acesso, é mais fácil e seguro usar alguém que sabe e pode chegar lá mais rápido. Portanto, é um modelo mais eficiente num quadro em que a rapidez passou a ser uma necessidade mais urgente para um jornal. Mas repito, isso não quer dizer que não estejamos mais contratando ou que vamos enxugar nossa equipe no exterior. Creio que são dois modos de trabalhar a serem combinados, usando 86
a equipe do "Washington Post" e essa rede de freelancers, que está sendo avaliada e recebendo cotações dos editores, além de receber visibilidade por seu trabalho. Associated Press
Marty Baron foi representado por Liev Schreiber (2º da esq. para dir.) no filme Spotlight
O jornalismo dito tradicional demorou muito a reagir às mudanças da era digital? Sem dúvida. Quando a internet chegou, nós a vimos só como uma nova maneira de distribuir nosso trabalho, mas não pensamos naquilo como algo que nos atingiria ou de que podíamos nos apropriar. Agora, estamos diante de uma situação inevitável, vivemos numa sociedade que é digital e mobile, e precisamos acolher essa mudança com entusiasmo e esforço, por mais que sintamos saudades do antigo modo de trabalhar. O sr. diz ter passado por um período de luto quando percebeu que os meios tradicionais de se fazer jornalismo tinham mudado. Como foi isso? Eu fiquei muito triste, gostava do jeito de se fazer jornal antes. Mas, quando cheguei ao "Washington Post", em 2012, percebi que a direção e o ritmo da mudança eram inexoráveis. Vi que os jornalistas que estavam trabalhando mais com as plataformas digitais estavam tendo mais êxito em atrair os leitores do que os tradicionais. E passei a estudar o que faziam melhor. Sua narrativa era outra, seu modo de apresentar as histórias, seu estilo, seus títulos eram
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diferentes. Nesse momento, entendi que todos tínhamos que mudar, os da velha geração também. E do que mais sente nostalgia do velho jornalismo? (Risos) Ah, da segurança, de ter menos competidores, de ter mais tempo para trabalhar as histórias. Hoje eu trabalho o tempo todo, estou sempre ligado. Antes não, era uma época mais confortável em vários sentidos. Do ponto de vista prático, como vocês estão mudando o modo de contar histórias? Estamos buscando fazer com que os textos sejam mais acessíveis e abertos à interação. Há, ainda, uma tendência de o público querer ouvir mais a voz de quem escreve. Os leitores querem ter mais da personalidade de quem lhes transmite uma notícia, parece que sentem aí que o conteúdo é mais legítimo. Estamos tentando enfatizar mais isso também. O sr. mencionou que o "Washington Post" vem tendo problemas com o candidato republicano. Sim, sempre somos críticos com todos os candidatos, e a candidata democrata (Hillary Clinton) parece entender melhor o papel da imprensa. Já Donald Trump tem dito que, se eleito, defenderá o endurecimento das leis de difamação, sugerindo multas, aumento de impostos e que nos submeterá a sanções. Contra nós, sua atitude beira a ameaça. Trump acha que o proprietário do jornal, Jeff Bezos, encomendou uma cobertura negativa de sua campanha. Mas nada disso tem sentido, Bezos não influi em nossa cobertura. Estamos diante de um risco de que, se Trump for eleito, queira se vingar. Mas aí o enfrentaremos, e com jornalismo. A jornalista viajou a Medellín a convite da Fundación Nuevo Periodismo Iberoamericano
Veja como poupar para aposentadoria com reforma da Previdência Rivaldo Gomes/Folhapress
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Fila no INSS; trabalhadores terão regras mais restritas para a aposentadoria
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, FERNANDA PERRIN e TÁSSIA KASTNER DE SÃO PAULO 10/10/2016 às 02h00 "Daqui a seis, sete anos, quando eu, aposentado, for ao governo para receber o meu cartão, o governo não terá dinheiro para pagar". A frase, dita pelo presidente Michel Temer para defender sua proposta de reforma da Previdência, pode parecer alarmista, mas não está distante do cenário esperado por especialistas em finanças pessoais ouvidos pela Folha. Para eles, a crise no INSS e os planos para reformá-lo aumentam ainda mais a importância de o trabalhador guardar dinheiro para a aposentadoria, diante da falta de garantia de como o benefício funcionará quando chegar a vez de quem está entrando no mercado agora. O teto do INSS hoje é de R$ 5.189,82. Pela proposta em discussão apenas os trabalhadores que contribuírem por 50 anos vão receber esse valor. Para quem começa a trabalhar aos 20, isso significa se aposentar aos 70 anos. MAIS TEMPO TRABALHANDO Além da idade mínima, projeto de reforma da Previdência deve impor tempo maior de contribuição para aposentadoria integral 89
Se você começou a trabalhar aos...
...aos 65, quando puder se aposentar, terá contribuído por...
...mas, para receber 100% do benefício, terá que trabalhar até os...
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Para encerrar a vida profissional antes disso será necessário ter ao menos 25 anos de contribuição e 65 anos de idade, recebendo 75% do teto mais 1% a cada ano adicional de contribuição, segundo as regras em discussão. De acordo com a proposta, ainda não enviada ao Congresso, as mudanças vão valer para mulheres com até 45 anos e homens com até 50 anos de idade. Uma regra de transição será criada para trabalhadores mais velhos. "Analisando o histórico de mudanças no teto do INSS, quem se aposentar daqui a 20 anos vai receber um benefício equivalente a três salários mínimos, se continuar a atual política de correção", afirma Renato Follador, consultor na área e ex-secretário de Previdência do Paraná. PREPARO Falar da aposentadoria pode parecer um futuro remoto para quem está na faixa dos 20 anos de idade e uma preocupação menor para quem, entre os 30 e os 40, está pressionado com gastos mais urgentes com casa e filhos. Mas, quanto mais cedo essa poupança começar, menor será o sacrifício. A reportagem conversou com quatro especialistas para saber quanto e como economizar em cada etapa da vida para se aposentar aos 65 anos mantendo a mesma renda. PARA NÃO TRABALHAR PRA SEMPRE Como investir em cada fase da vida para ter uma aposentadoria confortável
SE VOCÊ COMEÇA A POUPAR AOS…
20 anos
QUANTO E COMO OMO POUPAR
E AS OUTRAS COISAS QUE EXIGEM POUPANÇA
15% a 20% do salário / Renda fixa e É possível fazer investimentos em planos de fundos de previdência. Nessa idade, cabe curto prazo, como na formação também fazer investimentos em renda profissional, para ajudar na renda futura variável 90
SE VOCÊ COMEÇA A POUPAR AOS…
QUANTO E COMO OMO POUPAR
E AS OUTRAS COISAS QUE EXIGEM POUPANÇA
30 anos
20% a 25% / Renda fixa e fundos de previdência
O recomendado é separar investimentos para planos de médio prazo, como a compra da casa, da poupança da aposentadoria
40 anos
25% a 30% / Renda fixa e fundos de previdência. Nessa faixa, investimentos em fundos variáveis não são aconselháveis
O mais indicado é ter uma reserva de emergência, em renda fixa atrelada a juros pós-fixados, caso precise resgatar
AOS 20 ANOS O jovem pode guardar por volta de 15% a 20% do salário porque tem um longo tempo para esse dinheiro render. Também é possível escolher investimentos mais arriscados e deixar uma parte menor na renda fixa. "Quanto mais jovem for a pessoa, mais tempo ela tem para recuperar as perdas [na renda variável] que ocorrerem em momentos de crise", diz Renato Follador, consultor em previdência. Para ele, a economia de 8% da renda é suficiente, desde que apenas para a velhice. Fundos de ações que invistam em empresas voltadas para o mercado interno e que pagam dividendos (como bancos e elétricas) são uma boa opção de renda variável, segundo Follador, porque essas companhias incluem a inflação em seus custos, protegendo o investidor de ver seu rendimento corroído pela alta de preços. Na renda fixa, a recomendação são os títulos do Tesouro IPCA, que rendem a inflação e mais uma taxa de juros. Aproveitar os fundos de previdência da empresa é outra opção, mas é preciso atentar para as regras para retirada do dinheiro –sobretudo com a alta rotatividade entre jovens–e à taxa de administração cobrada. AOS 30 ANOS Quem começa a guardar dinheiro aos 30 precisa reservar entre 20% e 25% do salário e investir mais em renda fixa do que em variável. Ao escolher um plano de previdência, é preciso pesquisar taxas de administração (o ideal é que seja inferior a 1%) e de carregamento (o melhor é um plano que não cobre), afirma a planejadora financeira Letícia Camargo.
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A economia para outras preocupações, como a compra da casa própria e as despesas com a criação dos filhos, deve ser separada da poupança para a aposentadoria, diz Follador. Com essa organização, a reserva pode ser de 8% do salário, diz. AOS 40 ANOS O trabalhador na faixa dos 40 anos de idade que ainda não tem nenhuma reserva para a aposentadoria vai precisar guardar entre 25% e 30% de sua renda. "É nessa idade que a janela se fecha", diz William Eid Júnior, professor de finanças da FGV. Já Follador afirma que guardar 16% do salário é suficiente nessa fase, desde que todo esse dinheiro seja destinado à aposentadoria. Aos 40, a pessoa não pode perder dinheiro, por ter pouco tempo para recuperá-lo. Por isso, a recomendação é que a carteira se concentre em investimentos de renda fixa. Se a opção for pelo título público, é preciso escolher o prazo mais próximo da aposentadoria, para não perder dinheiro na hora de resgatar. Para quem já vinha poupando, a chegada aos 40 marca o momento de ver o quanto já foi guardado, quanto tempo espera-se viver depois da aposentadoria e mapear o consumo supérfluo. E, com base nisso, estimar quanto ainda é preciso guardar nos próximos anos.
Com dólar mais baixo, importação de pneus cresce 77% neste ano Marlene Bergamo/Folhapress
FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, MARIA CRISTINA FRIAS 10/10/2016 às 11h00 As importações de pneus aumentaram 77% entre janeiro e agosto deste ano, aponta a Anip, associação do setor. 92
"A alta tem uma relação direta com a variação do real perante ao dólar. A cotação caiu de cerca de R$ 4,00 para R$ 3,20", diz o presidente da entidade, Alberto Mayer. A indústria nacional vinha ganhando fatia de mercado devido à alta do dólar. Com a variação cambial, porém, a participação dos produtos de fora subiu de 23% para 31% do início deste ano a agosto. "A produção nacional tem pouca competitividade pelos impostos de importação sobre insumos usados na produção, como a borracha." Os pneus importados são destinados principalmente ao mercado de reposição, segmento que se mostrou mais resiliente durante a crise, mas cujo desempenho também foi afetado. Apesar do crescimento nos últimos meses, o volume de importações de agosto deste ano ainda é 15% inferior ao do mesmo período de 2015. A produção nacional da indústria teve uma retração anual de 2,1% no acumulado deste ano até agosto. As vendas também diminuíram 2% no período.
POLÍTICA: Hotel de Brasília vira QG de delação da Odebrecht Grupo aluga espaços e quartos do Windsor Plaza para equipe de advogados que participam das negociações na Procuradoria-Geral da República; Emílio Odebrecht acompanha as reuniões Fonte Beatriz Bulla e Fabio Serapião, Jornal O Estado de S. Paulo 08 Outubro 2016 às 05h00 Notícias relacionadas: Delação da Odebrecht afeta outros acordos Infográfico: O esquema da Lava Jato Palocci pede a Moro que libere R$ 79 mil de sua empresa para pagar funcionários BRASÍLIA - Em reuniões que entram madrugada adentro, regadas a água, café e vinho branco, o empresário Emílio Odebrecht, patriarca do grupo Odebrecht, dá ordens e debate com os advogados que participam das negociações daquela que pode se tornar a mais explosiva delação premiada da Operação Lava Jato. O detalhe é que, da sala de reuniões onde estavam, na cobertura do Windsor Plaza Brasília, é possível avistar o lugar onde tudo começou, dois anos e sete meses atrás: o Posto da Torre, que deu nome à operação e levou a Polícia Federal até a contabilidade secreta do doleiro Alberto Youssef. No Windsor, Emílio permanecia o tempo todo com a filha Mônica e o marido dela, Maurício Ferro – responsável pela área jurídica do conglomerado –, e Newton de Souza, atual presidente do grupo. São eles que ditam os rumos da tentativa de acordo com a ProcuradoriaGeral da República, para que Marcelo, filho de Emílio, e cerca de 50 executivos confessem seus crimes em troca de punições menores.
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Foto: Estadão Empresário Emílio Odebrecht no Windsor Plaza A cena se repetiu várias vezes ao longo da semana e foi acompanhada pela equipe do Estado, hospedada no Windsor. A Odebrecht alugou espaços para reuniões e quartos para as cerca de 20 pessoas que participaram das negociações na sede da PGR. Além do local para as conversas internas, o grupo ocupava um lounge anexo, onde permaneciam duas secretárias prontas para resolver qualquer problema de logística dos presentes, e um refeitório com TV e buffet variado. O acesso ao buffet está disponível a qualquer hóspede mediante o pagamento de uma taxa extra. O Windsor Plaza transformou-se em um “bunker” da empreiteira número 1 da América Latina, que tenta fechar um dos maiores acordos judiciais já assinado no mundo – o Ministério Público quer impor uma multa de ao menos R$ 6 bilhões. Marcelo, que era presidente do grupo até sua prisão, um ano e quatro meses atrás, e os executivos estão dispostos a contar os bastidores da distribuição de milhões de reais em propina para “conquistar” obras e apoio político nos governos federal, estaduais e municipais e outros ilícitos cometidos em diversos outros países. 94
Em contrapartida, além de terem as penas de seus executivos diminuídas, a empresa tenta virar a página dessa história que a arrastou para um dos maiores escândalos de corrupção do mundo. Os advogados são orientados a manter sigilo sobre a negociação e, principalmente, o conteúdo dos depoimentos.
Foto: Estadão César Rocha (de camisa clara) e advogados Seleção. As negociações não têm sido fáceis e o clima de tensão domina a cobertura do hotel. Descontração apenas em alguns momentos, como o da quinta-feira à noite, quando os advogados e Emílio esqueceram o trabalho por minutos para acompanhar a goleada da seleção brasileira sobre a Bolívia pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2018. “Nunca na minha vida achei que ia ter que negociar assim”, comentava uma advogada com os colegas, enquanto o Brasil marcava seu segundo gol e iniciava a primeira goleada da era Tite. Nesse mesmo dia, Emílio ficou das 18 horas até perto de meia-noite entre uma conversa e outra. Parou só para pedir uma salada caprese – sem folhas, mas com reforço na muçarela de búfala – e conferir o placar do jogo do Brasil. O Estado apurou que uma das negociações mais duras envolve Marcelo Odebrecht. Investigadores consideram que o caso do mais poderoso e rico dos executivos presos na Lava Jato deve servir de exemplo contra a impunidade. Exigem mais quatro anos de regime fechado para o ex-presidente da empresa, à frente da companhia entre 2009 e 2015, e responsável pela criação do setor de operações estruturadas – popularmente conhecido como departamento da propina. A meta dos advogados coordenados pelo criminalista Theodomiro Dias Neto, o Theo Dias, é convencer os investigadores de que o executivo já passou muito 95
tempo na prisão e tentar reduzir a pena de reclusão para dois anos e meio – já descontado o ano e quatro meses cumprido na carceragem da PF de Curitiba. A delação de Marcelo, mais do que qualquer outra, provoca terror no meio político com potencial para derrubar líderes que ainda se sustentam após dois anos e sete meses de investigação ininterrupta. Enquanto bebia um vinho, um dos advogados previa muitas operações após o acordo. Os executivos têm sido divididos em faixas pela PGR, por características comuns dos crimes. Marcelo tem uma faixa única. E seu pai concentra todos os esforços em Brasília para diminuir o tempo do filho atrás das grades. “Minha mãe pediu para nós dois, eu e meu pai, não viajarmos no mesmo avião. Mas meu pai não vai embora antes, ele não vai embora deixando a gente aqui”, dizia Mônica aos advogados, na manhã de ontem, quando todos fizeram as malas para deixar Brasília, ainda sem conseguir assinar o acordo de Marcelo. “Na manhã foi ruim. Mas à tarde, dado o contexto, foi bom”, comentava um advogado recémchegado das conversas com procuradores aos colegas, no início da noite de anteontem. Nem todos sentam à mesa de negociação com o grupo de trabalho do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Um dos que encararam negociações de madrugada chegou faminto para o café da manhã do hotel. “Eu não jantei.” Depois explicou: “Se você negocia só um é fácil. Se você negocia 50, cada um tem um caso. ‘Olha, minha mãe está doente’, ‘meu filho é menor de idade’...”, disse ao dar as justificativas dos executivos aos investigadores para terem suas penas reduzidas. No total, 53 executivos negociam a colaboração. Anteontem, pelo menos 15 casos teriam sido fechados segundo as conversas dos presentes no último andar do hotel. Entre eles, o do exdiretor financeiro da empresa César Ramos Rocha. Com seu acordo fechado e com um envelope pardo com logo oficial em mãos, o executivo se preparava para chegar a um acordo com uma pena de 8 meses. Tempo. Embora estivesse prevista para ontem, a assinatura de todos os acordos ainda deve levar ao menos mais uma semana. Há casos considerados mais simples, como o de Benedicto Barbosa Júnior, ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura, e outros, emperrados. Uma das negociações travadas é a de Alexandrino Alencar. Ele foi diretor de Relações Institucionais da empresa e vice-presidente da Braskem. Alencar tinha contato direto com líderes políticos, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com quem foi flagrado em conversas interceptadas pela Polícia Federal. Por isso, é pressionado a entregar mais informações. As conversas refletem a quantidade de advogados atuantes na negociação, vindos de bancas criminalistas de São Paulo, Rio, Paraná, Brasília e do corpo jurídico da própria empreiteira, que tem sede na Bahia. Apesar da diversidade de advogados, o objetivo é um só e transparece na frase mais ouvida nas conversas travadas na cobertura do Windsor Plaza: “Virar a página da empresa”. Para isso, Emílio negocia, advogados estendem reuniões na Procuradoria-Geral da República e a irmã de Marcelo pede a uma das integrantes da equipe: “Não vamos desistir agora”.
A Reconstrução do Brasil: a batalha contra os privilégios Série especial aborda os desafios do País depois do impeachment Fonte José Fucs, especial para, Jornal O Estado de S. Paulo 07 Outubro 2016 às 23h19 Notícias relacionadas: A Reconstrução do Brasil FHC fala sobre reforma política 96
O desafio de cortar na carne Parlamentarismo e voto distrital devem ficar para depois O Estado brasileiro – gigante, pesado e lerdo – costuma ser comparado a um mamute. Seu peso se faz sentir sobre os cidadãos e as empresas de forma implacável. Ele se expressa nos impostos de Primeiro Mundo que os brasileiros têm de pagar, em troca de serviços de Terceiro Mundo, na burocracia que emperra o cotidiano das famílias e o desenvolvimento dos negócios e na corrupção endêmica, que cria dificuldades para vender facilidades. Mas, hoje, talvez, nada simbolize tanto o fardo que a sociedade tem de carregar para manter o mamute em pé quanto o funcionalismo e seus privilégios.
Na edição deste domingo, o Estado publica uma reportagem especial sobre o tema, a quarta da série “A reconstrução do Brasil”, dedicada à discussão dos principais desafios do País depois do impeachment. Na reportagem, o Estado mostra que, nos últimos anos, o número de funcionários públicos se múltiplicou e os gastos com os salários cresceu em ritmo ainda mais acelerado. Para conter as despesas com pessoal, resultado de aumentos generosos concedidos nos governos Lula e Dilma, o governo terá de mexer na Previdência do setor público, hoje responsável por mais de 50% do rombo previdencário. Para acabar com os privilégios, terá de restringir a estabilidade no emprego, regulamentar a lei de greve e a sindicalização dos servidores e implantar a meritocracia.
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