Resenha 22 10 à 24 10 2016

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EDITORIAIS: Partido da escola FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAL editoriais@grupofolha.com.br 22/10/2016 às 02h00

A Procuradoria-Geral da República (PGR) tomou posição na celeuma desencadeada pelo movimento Escola sem Partido. Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), considerou inconstitucional legislação do Estado de Alagoas patrocinada pelo grupo. Partiu da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação a ação contra a Assembleia Legislativa alagoana. Questiona-se norma estadual que veda a escolas públicas e particulares "doutrinação política e ideológica, bem como quaisquer outras condutas por parte do corpo docente ou da administração escolar que imponham ou induzam aos alunos opiniões político-partidárias, religiosa ou filosófica". A iniciativa, criada por pais contrários ao que consideram ser "contaminação políticoideológica das escolas", espalha pelo país um rastilho de desconfiança generalizada contra professores. Advoga aprovar legislações nos níveis municipal, estadual e federal com vistas a restringir o escopo do ensino e normatizar que a educação moral, sexual e política é competência só da família. A PGR não defende a doutrinação. Argumenta que a prática de eventuais abusos por alguns docentes não justifica impor o policiamento indiscriminado do que se diz e pratica em sala de aula. "Sem liberdade de ensinar e de aprender não há o próprio direito à educação", leciona o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. "Entre a vedação apriorística de conteúdos e a liberdade de ensino, esta é preferível." Abusos ocorrem, ninguém duvida. Basta passar os olhos por alguns livros didáticos para topar com exemplos flagrantes de marxismo vulgar, sobretudo no ensino de história e geografia, ou de obscurantismo religioso por exemplo na versão capciosa de que a evolução biológica por seleção natural seria "apenas uma teoria". Para além da questão constitucional, os projetos de lei preconizados pelo movimento Escola sem Partido subestimam a capacidade dos próprios alunos –e de seus pais– de encarar de modo crítico o que se veicula nas escolas. Embora a campanha se apresente como liberal, em defesa do pluralismo, ela termina por revelar-se paternalista ao pretender que aparelhos de Estado substituam os cidadãos no controle social do ensino oficial ou particular. Por fim, qualquer legislação do gênero padece de um vício de origem: a impossibilidade prática de apontar de modo inequívoco o conteúdo que seja ideológico, ou quando um docente

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ultrapassa o limiar da doutrinação. Na dúvida, sempre é mais prudente tomar partido da liberdade na escola.

Esperando Papai Noel Se Papai Noel surpreender e o fim de ano for melhor que o previsto neste momento, talvez o quarto trimestre seja o mais próspero de 2016, mas por enquanto há pouco entusiasmo nas apostas Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 22 Outubro 2016 às 04h07 Se Papai Noel surpreender e o fim de ano for melhor que o previsto neste momento, talvez o quarto trimestre seja o mais próspero de 2016, mas por enquanto há pouco entusiasmo nas apostas. As contratações para o período das Festas devem ser menores que as do ano passado e ficar em torno de 135 mil, segundo a última estimativa publicada pela Confederação Nacional do Comércio (CNC). Serão, nesse caso, parecidas com as de 2012. No terceiro trimestre, pelos números divulgados até agora, a economia ainda continuará a encolher – hipótese reforçada, nesta semana, por mais um Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br). O indicador diminuiu 0,91% de julho para agosto. No ano, ficou 5,42% abaixo do período correspondente de 2015. O recuo em 12 meses chegou a 5,6%. Todos esses números são da série com ajuste sazonal. Os dados oficiais do PIB do terceiro trimestre devem ser anunciados no fim de novembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O IBC-Br funciona como prévia e tem servido como um bom sinalizador de tendência. A continuidade da recessão até agosto parece indiscutível. Além disso, os poucos números setoriais de setembro e outubro já conhecidos – e produzidos principalmente por fontes privadas – confirmam a persistência de um nível de atividade muito baixo. O índice de confiança do empresário industrial apurado em outubro foi 1,4 ponto menor que o de setembro, informou a Confederação Nacional da Indústria (CNI). O número, 52,3, permaneceu na zona de otimismo, isto é, acima de 50. A queda foi registrada depois de cinco meses de aumento. Um dia depois a mesma fonte publicou a sondagem industrial de setembro, confirmando a dificuldade de se “iniciar um ciclo sustentado de recuperação”. Os únicos dados positivos são a manutenção dos estoques nos níveis desejados, mais pela baixa produção do que por aumento das vendas, e maior satisfação com a margem de lucro e a situação financeira. A produção continuou caindo. O índice de evolução ficou em 45,8 pontos. Na comparação com igual mês de 2015, superou o registrado em agosto (42), mas continuou abaixo de 50, divisor das avaliações negativas e as positivas. A indústria permaneceu com apenas dois terços de ocupação da capacidade produtiva. Poderá, portanto, entregar mais produtos, quando a demanda voltar a crescer, sem precisar, durante algum tempo, de mais equipamentos, máquinas e instalações. Continua muito baixa, portanto, a disposição de comprometer capital em novos investimentos produtivos. O índice de intenção de investimento ficou em 43,5 pontos, tendo oscilado dentro da margem de erro, e manteve-se 4,2 pontos abaixo da média histórica. Superou por 2,8 pontos, no entanto, o de outubro de 2015, mas isso de nenhum modo justifica celebrações nas empresas fabricantes de bens de capital. Uma semana antes a CNI havia divulgado suas novas estimativas de desempenho econômico em 2016. Houve uma pequena melhora no cenário da recessão. Pelas novas contas, o PIB deve encolher 3,1% neste ano. A projeção anterior apontava um recuo de 3,5%. A variação prevista para a produção industrial passou de -5,4% para -3,7%. O investimento geral em máquinas, equipamentos e obras, medido pela formação bruta de capital fixo, diminuirá 11%. No cenário 2


anterior, publicado em julho, apontava-se uma diminuição de 13,9% em relação ao valor de 2015. Vale a pena destacar dois pontos. Várias sondagens apontaram mudança de humor dos empresários a partir do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. O aumento de confiança é um importante fator para a recuperação da economia, numa fase de ajustes complicados e penosos. O governo tem de produzir fatos positivos, com rapidez, para evitar a perda desse ativo. Em segundo lugar, a baixa disposição de investir confirma, ainda uma vez, um dado crucial: caberá ao governo, com o programa de concessões, desencadear a recuperação do investimento. Qualquer demora custará muito.

Lava Jato não requer privilégios Como amplamente reconhecido pela sociedade, a operação tem prestado um relevante serviço no combate à impunidade e seria enorme retrocesso impedir ou, ao menos, dificultar o avanço das investigações Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 22 Outubro 2016 às 04h05 É necessário preservar as condições para que a Operação Lava Jato possa levar a bom termo os seus trabalhos. Como amplamente reconhecido pela sociedade, a operação tem prestado um relevante serviço no combate à impunidade e seria enorme retrocesso impedir ou, ao menos, dificultar o avanço das investigações. O reconhecimento das inúmeras qualidades da Lava Jato, porém, não implica conferir ao Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia Federal (PF) uma infalibilidade que, por certo, não possuem. É preciso reconhecer que nem sempre seus interesses corporativos expressam com exatidão o interesse público. Promovido pelo MPF e atualmente em análise pela Câmara dos Deputados, o conjunto das dez medidas anticorrupção pode, sem dúvida, contribuir para o combate à impunidade. Há, porém, pontos do projeto que merecem reparos. Nem tudo o que lá está proposto é bom para o País, ainda que o MPF diga que as medidas são absolutamente necessárias, como se o desacordo com alguma delas fosse sinônimo de conivência com a corrupção. Entre as dez propostas anticorrupção estão “ajustes nas nulidades penais”. Nesse tópico, inclui-se, por exemplo, a não exclusão, em determinados casos, da prova ilícita. O MPF pretende que provas ilícitas obtidas por boa-fé sejam aproveitadas no processo judicial. Ora, especialmente nessa área, é muito oportuno que as palavras não sejam relativizadas. Caso contrário, as garantias individuais acabam também sendo relativizadas. Prova ilícita é prova ilícita, por mais boa-fé que tenha havido em sua produção. A boa-fé não apaga eventual ilicitude e não se combate o crime estimulando outro crime. Alguém duvida que a utilização de prova ilícita – “em alguns casos”, “sob determinadas circunstâncias” – não será um incentivo à produção de mais provas ilícitas, violando direitos que devem ser invioláveis? É, portanto, sensata a posição do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator do projeto das dez medidas anticorrupção na Câmara, de analisar detidamente cada uma das propostas. Além da questão da prova ilícita, Lorenzoni estuda possíveis alterações na restrição à concessão de habeas corpus, na possibilidade de prisão preventiva para recuperar recursos desviados e no chamado teste de integridade para servidor público – “simulação de situações, sem o conhecimento do agente público ou empregado, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer crimes contra a Administração Pública”. Manifestamente abusivo, esse teste inverte o papel do Estado, atuando como se fosse o corruptor. 3


Também merece ir adiante, à revelia dos interesses corporativos do MPF e da PF, o projeto da nova Lei de Abuso de Autoridade. A legislação em vigor é de 1965. Além de ultrapassada, é genérica e pouco eficaz. Os críticos do projeto sustentam que sua aprovação inibiria os trabalhos da Lava Jato. Ora, o projeto foi apresentado em 2009, muito antes, portanto, do início da operação. Ele é resultado das observações de um grupo de trabalho formado por integrantes do Supremo Tribunal Federal, do Legislativo e do Executivo. Na ocasião, a iniciativa foi vista como parte de um novo “pacto republicano” para tornar a Justiça mais ágil, acessível e condizente com a proteção aos direitos fundamentais, conforme previsto na Constituição. É uma péssima defesa da Lava Jato sustentar que ela necessita de certa margem de tolerância com o abuso de autoridade. Quem assim atua desconhece o principal mérito da operação: mostrar e fazer valer que a lei é para todos, também para quem – por sua riqueza, seu poder ou sua popularidade – se achava imune à ordem legal. É, portanto, muito oportuna uma lei que reforce a necessária submissão de todas as autoridades à lei, com a previsão de consequências concretas no caso de violação dos limites legais. Um ordenamento jurídico equilibrado é condição, e não empecilho, para combater a corrupção.

Só vontade não basta No momento em que o Brasil discute que caminho seguir para retomar o crescimento, é conveniente atentar para as evidências que mostram que milagres não existem quando se trata de combater a pobreza Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 22 Outubro 2016 às 04h05 A redução da pobreza na América Latina, um dos grandes fenômenos econômicos e sociais dos anos 2000, atingiu seu limite e começou a declinar, mostra um estudo recente do Banco Mundial. Isso indica claramente os limites das políticas de redistribuição forçada de renda e da criação artificial de uma classe média por meio do estímulo ao consumo. No momento em que o Brasil discute que caminho seguir para retomar o crescimento, é conveniente atentar para as evidências que mostram que milagres não existem quando se trata de combater a pobreza e gerar oportunidades para o maior número possível de cidadãos. Apenas o reequilíbrio das contas públicas, imprescindível para restaurar a capacidade do Estado de oferecer os serviços de que as classes mais pobres tanto precisam, e a dinamização da economia, com a consequente recuperação dos investimentos privados e a ampliação da competitividade nacional, são capazes de gerar as condições para uma verdadeira redistribuição de renda. O estudo, lançado para coincidir com o Dia Internacional da Erradicação da Pobreza, em 17 de outubro, celebra a expressiva redução, de 25,5% para 10,8%, da pobreza extrema na América Latina e no Caribe entre 2000 e 2014. Indica, porém, que o recuo “tem ocorrido em um ritmo muito mais lento” desde 2012, “como resultado da desaceleração econômica”. O Banco Mundial calcula que a economia latino-americana deverá ter uma retração de 1,1% neste ano, depois dos anos dourados em que a alta dos preços internacionais das commodities, principais itens da pauta de exportações dos países da região, resultou em um crescimento médio de 6% em 2010 e 4% em 2011.

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Essa freada brusca deixou claras as fragilidades do modelo que pretendia eliminar a pobreza por meio do voluntarismo demagógico, prática que dominou a política econômica de países de peso na América Latina, como Brasil e Argentina. Sem se preocupar em criar condições para reduzir a dependência do mercado externo de commodities, particularmente da China, os países dominados pela certeza de que a bonança duraria para sempre apostaram tudo na irresponsabilidade fiscal, com o argumento de que cabia ao Estado capitanear o desenvolvimento econômico e fazer na marra a chamada “justiça social”. O aparente sucesso desses países – do Brasil de Lula da Silva em particular – deu a impressão de que eles haviam encontrado a fórmula mágica para erradicar a pobreza. Bastava, como alardeava Lula, ter “vontade”. A desaceleração da China e a crise internacional de 2008 demonstraram que esse modelo era frágil, com terríveis consequências justamente para os mais pobres e para aqueles recémalçados à categoria de “classe média”. A partir de 2012, a taxa de pobreza na América Latina continuou a recuar, ainda que num ritmo mais lento, mas esses cidadãos não se tornaram parte da classe média, e sim “vulneráveis” – ou seja, aqueles que têm renda acima da linha de pobreza, mas podem voltar a ser pobres, pois não têm as condições para continuar sua ascensão socioeconômica, como saúde e educação de qualidade. Já no ano passado, o Banco Mundial alertava que os salários pagos aos mais pobres na América Latina haviam crescido substancialmente, mas isso não significava melhores oportunidades de emprego. Era uma situação que escancarava a imensa fragilidade dessa “nova classe média”, despreparada para disputar as melhores vagas no mercado de trabalho. Esse cenário só será alterado significativamente, diz o Banco Mundial, se os países latinoamericanos trabalharem urgentemente para equilibrar suas contas e dinamizar sua economia, reduzindo a dependência do mercado de commodities e buscando diversificar sua participação, com maior valor agregado, no comércio internacional. Só então, sem mágicas populistas, será possível criar as condições para que haja fortes investimentos na oferta de serviços – especialmente saúde, educação, saneamento básico e acesso à internet – sem os quais não é possível ter uma vida produtiva.

Mais pressa FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAL editoriais@grupofolha.com.br 23/10/2016 às 02h00

A recuperação do crescimento econômico perdido desde 2014 depende muito de um plano de aumento de investimentos incentivados pelo setor público. A aceleração das obras em infraestrutura, porém, não poderá contar com recursos do governo federal. Na melhor das hipóteses, o montante reservado para investimento será igual ao deste ano. É necessário, pois, apressar o programa de concessões de obras de infraestrutura e de privatizações em geral. Dado o cronograma de leilões, apenas com muito otimismo algumas das obras em aeroportos, rodovias e ferrovias começarão antes do final de 2017 -e mesmo esse calendário corre risco. Não é tarefa fácil reavivar a confiança de investidores, reorganizar a regulação e encontrar fontes de financiamento, grande obstáculo para o momento. Tudo é terra arrasada depois da administração de Dilma Rousseff (PT).

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O problema é que não há alternativa a dedicar-se de modo emergencial; são raros os meios de recolocar a economia em movimento. Primeira tarefa, o governo de Michel Temer (PMDB) tem de resolver logo o problema das concessões que fracassaram por falta de crédito ou por envolvimento de atores centrais em escândalos. Segundo, é preciso criar forças-tarefas a fim de acelerar a elaboração de projetos e editais, além de uma espécie de comitê de crise para repensar o financiamento, com envolvimento do BNDES. Terceiro, é preciso estipular um prazo de solução dos nós regulatórios que impedem investimentos em, por exemplo, telecomunicações e mineração, tarefa que depende também do Congresso. Quarto, é preciso dar celeridade a leilões nas áreas de energia e petróleo, fracassados ou paralisados por anos de desgoverno. O mesmo empenho que se viu no encaminhamento do problema macroeconômico central -o deficit- deveria ser observado nos ministérios e agências responsáveis pela infraestrutura. Trata-se o assunto, porém, como se este fosse um país organizado, em crescimento estável. Falta competência técnica e sentido de urgência para lidar com a crise. Do mesmo modo que o governo estabeleceu metas de elaboração de projetos de lei e de tramitação de projetos no Parlamento para o problema fiscal, é preciso estipular prazos para a aprovação de nova ou reformada regulação. Verdade que leis importantes foram aprovadas nos últimos meses. Ocorre que o descalabro exige atitude mais enérgica, um plano em várias frentes para antecipar investimentos e indicar um horizonte de planejamento e oportunidades para as empresas.

A batalha por Mossul FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAL editoriais@grupofolha.com.br 23/10/2016 às 02h00

Sob diversos aspectos, a recém-iniciada ofensiva do Exército iraquiano para expulsar o Estado Islâmico (EI) de Mossul deverá mudar a dinâmica no Oriente Médio. A eventual perda da segunda maior cidade do Iraque, com cerca de 1,5 milhão de habitantes, seria um imenso revés para a facção terrorista. Trata-se de seu maior reduto, uma inestimável fonte de renda pelos impostos cobrados. O peso simbólico também é expressivo. Foi ali que o líder do EI, Abu Bakr al-Baghdadi, proclamou-se califa de uma vasta região entre o Iraque e a Síria logo após a surpreendente tomada da cidade, em junho de 2014. Mossul é ainda crucial para a estratégia geopolítica dos Estados Unidos, principais arquitetos do plano de ataque. Uma vitória rápida e com poucas mortes de civis seria um contraponto à

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carnificina na luta contra os terroristas em Aleppo, na Síria, onde a Rússia tem grande responsabilidade. Por outro lado, um combate prolongado e sangrento embute o risco de aumentar as divisões sectárias dentro do Iraque e pelo Oriente Médio, alimentadas por uma crise humanitária -a ofensiva poderia gerar cerca de 750 mil refugiados. Esse cenário constituiria um péssimo legado do presidente Barack Obama, que busca reverter as críticas contra a sua atuação na Síria, e uma grande preocupação para seu sucessor na Casa Branca, cujo mandato começa em 2017. Planejar os próximos passos depois da ação militar é outro aspecto importante para atingir alguma estabilidade no Iraque. O EI se alimenta do ressentimento de sunitas -a maioria em Mossul- com a perda de poder para os xiitas após a deposição do ditador Saddam Hussein, em 2003. Para evitar que a milícia terrorista seja simplesmente substituída por outras forças extremistas, a reincorporação de Mossul ao Estado iraquiano terá de levar em conta demandas das lideranças sunitas sobre um novo desenho de governança, uma complexa negociação que acumula fracassos. Decerto o Iraque precisará de respaldo internacional para lidar com tais desafios. Nesse sentido, foi auspicioso o encontro realizado na quinta (20) em Paris para discutir o futuro da cidade. Participaram o premiê iraquiano, Haider Al-Abadi (por videoconferência), e representantes de outros 21 países. A batalha por Mossul vai muito além das armas. A ação militar, como a invasão do Iraque em 2003 bem demonstra, pode ser apenas a parte mais fácil na busca por uma solução duradoura para os conflitos no Oriente Médio.

Investidor prefere papéis federais prefixados Redução das aquisições de títulos corrigidos pela inflação mostra aumento da confiança na política monetária Fonte Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 04h00 Em agosto, os investidores aumentaram as aplicações em papéis federais prefixados e reduziram as aquisições de títulos corrigidos pela inflação, segundo o Relatório Mensal da Dívida Pública Federal do Tesouro Nacional. É um sinal de confiança na política monetária, enquanto persistem as agruras da política fiscal. O Tesouro colocou R$ 36 bilhões líquidos em papéis prefixados, que garantiram aos aplicadores uma renda nominal de 14,78% em 12 meses. Mais difícil foi a colocação de papéis corrigidos por índices de preços: enquanto as emissões desses títulos atingiram R$ 16,4 bilhões, os resgates foram de R$ 98,8 bilhões, com saldo negativo de R$ 82,4 bilhões. As emissões líquidas de papéis com taxas flutuantes (ou seja, corrigidos pela Selic) foram de R$ 13,2 bilhões. Com a demanda, o peso dos prefixados atingiu 36,8% e supera a meta do Plano Anual de Financiamento da dívida, de 31% a 35%. Já os títulos corrigidos pela Selic, com 26,9% de participação, estão abaixo da meta de 30% a 34%. 7


Num mês com pesados vencimentos, o Tesouro evitou atender à demanda de rentabilidade dos investidores. Por isso, o estoque da dívida de R$ 2,95 trilhões em agosto ficou quase estável em relação a julho (houve redução do saldo de apenas 0,04%). Esse saldo teria caído mais de 1%, se não fosse a apropriação de juros de R$ 31,8 bilhões no mês. O aumento do interesse dos pequenos investidores que aplicam no Tesouro Direto foi um dos aspectos positivos da administração da dívida. Nessa modalidade já existem 930 mil aplicadores, dos quais 44,9 mil chegaram a esse mercado apenas em agosto. Em 12 meses, cresceu 68,4% o número de aplicadores no Tesouro Direto. Também melhorou o perfil da dívida, com redução de 2,5 pontos porcentuais da parcela vencível em 12 meses (18% do total). Avanços na política fiscal, como a aprovação da PEC 241, que fixa um teto para gastos, deverão permitir não apenas uma administração tranquila da dívida, como a futura redução de custos para o Tesouro. O custo médio da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna (DPMFi) atingiu 13,92% ao ano em agosto, alta de 0,11 ponto porcentual em relação a julho. O custo médio é menor que o de dezembro de 2015, de 15,06%, mas ainda é alto. O grau de confiança na política econômica permitirá atenuar mais o custo da dívida, ainda que esta continue a subir como proporção do PIB

Os catedráticos em bandalheiras Não é possível pensar num país melhor sem acabar com a roubalheira, punir exemplarmente os corruptos e aperfeiçoar a máquina do Estado Fonte Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 04h00 A luta contra a corrupção, que tem na Lava Jato seu símbolo mais vistoso, é uma luta dos brasileiros em geral. Não é possível pensar num país melhor sem acabar com a roubalheira, punir exemplarmente os corruptos e aperfeiçoar a máquina do Estado para resguardá-la dos ladrões. No entanto, infelizmente, há quem não veja a coisa dessa maneira. Para muitos petistas e associados, por exemplo, a força-tarefa da Lava Jato causa prejuízo ao País ao querer a todo custo combater a corrupção. Segundo esse raciocínio, os procuradores da República – e, por extensão, todos os brasileiros de bem – são ignorantes sobre como funcionam a política e a economia, restando aos cidadãos conformar-se com o fato de que a vida é assim mesmo, isto é, que a corrupção é incontornável e que só é possível governar e administrar o Brasil aprendendo a cultivar boas relações com os corruptos. Com a pretensão de ensinar aos brasileiros como devemos nos comportar diante da corrupção, esses catedráticos em bandalheira deram declarações esclarecedoras – e estarrecedoras – nos últimos dias. O ex-presidente Lula da Silva, por exemplo, assinou artigo no jornal Folha de S.Paulo no qual diz perceber “uma perigosa ignorância de agentes da lei quanto ao funcionamento do governo e das instituições”. Para o chefão petista, os delegados e promotores “não sabiam como funciona um governo de coalizão”. Infelizmente, a aula do mestre Lula terminou aí, mas os bons alunos haverão de entender a lição: a julgar pela experiência petista, um governo de coalizão funciona na base da compra, de preferência em dinheiro vivo, de apoio parlamentar, razão pela qual não é possível pensar num governo que arregimente apoio apenas na base de afinidade de ideias. Para Lula, é evidente que os agentes da lei tinham de saber disso. Movido pelo mesmo espírito didático, Eugênio Aragão, que foi ministro da Justiça do governo de Dilma Rousseff até o impeachment da presidente, deu uma entrevista à revista Carta 8


Capital na qual se propôs a explicar aos cidadãos por que a corrupção não apenas é “tolerável”, segundo suas próprias palavras, como também, em certos aspectos, é positiva. Como Lula, Aragão tratou de desqualificar os procuradores da República porque, segundo ele, desconhecem como funciona a corrupção. “Essa garotada do Ministério Público não tem a mínima noção de economia”, disse Aragão. Para ele, empresas pilhadas em corrupção, como aconteceu na Lava Jato, não deveriam ser punidas, porque, nesse caso, empresas estrangeiras tomariam seu lugar, roubando empregos dos brasileiros. “Aqui no Brasil a gente entrega nossos ativos com uma facilidade impressionante”, protestou Aragão. Os procuradores “não sabem como isso funciona” e “simplesmente botaram na cabeça uma ideia falso-moralista de que o País tem de ser limpo”, argumentou ele. Ora, diz o ex-ministro, “corrupção existe em todas as parte dos mundo” e “não é um problema moral, é sobretudo um problema estrutural simples”. E a aula prosseguiu. A corrupção acontece, explicou Aragão, “quando os processos administrativos de decisão são bloqueados” e, para desbloqueá-los, “a empresa distribui dinheiro”. Ao “molhar a mão dos fiscais para isso ir mais rápido”, conforme argumentou o exministro, a empresa consegue superar a burocracia “e entrar mais cedo como concorrente no mercado”, razão pela qual – atenção – “do ponto de vista econômico isso não é ruim, não”. Para Aragão, “a corrupção que, na verdade, serve como uma graxa na engrenagem da máquina, essa, do ponto de vista econômico, é tolerável”. E ele arremata: “A Lava Jato gaba-se de ter devolvido ao País R$ 2 bilhões. E quantos bilhões a gente gastou para isso? Do ponto de vista econômico, a conta não fecha”. Portanto, não se trata de entender a corrupção como parte de um mundo naturalmente imperfeito. O que se tem aqui está em outro patamar: para essa turma, temos que aceitar que o combate à corrupção é indesejável e prejudica o País. Felizmente, os brasileiros estão a dizer claramente para esse pessoal, nas urnas e nos tribunais, o que pensam disso.

Os tempos do STF Prisão de Eduardo Cunha revela a disparidade que existe entre a primeira e a última instância do Poder Judiciário a respeito do significado do tempo Fonte Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 04h00 Diante do que se sabe a respeito do personagem, a prisão preventiva de Eduardo Cunha tem um claro significado moralizador. A condescendência com o crime causa deletérios efeitos, e a ordem de prisão expedida pelo juiz Sergio Moro contra o ex-presidente da Câmara dos Deputados é um poderoso símbolo do combate à impunidade. A prisão revela também outra faceta, não menos importante, da vida institucional brasileira. Ela evidencia, mais uma vez, a disparidade que existe entre a primeira e a última instância do Poder Judiciário a respeito do significado do tempo. O pedido de prisão foi formulado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no início de junho, quando a ação ainda estava no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a relatoria do ministro Teori Zavascki. Na ocasião, Eduardo Cunha, ainda no exercício do mandato de deputado federal, tinha foro privilegiado. Pois bem, o pedido da PGR ficou por quatro meses sem qualquer resposta da parte de Zavascki. Uma vez cassado o mandato de Cunha, a ação foi remetida à 13.ª Vara Federal de Curitiba. O juiz Sergio Moro precisou de apenas uma semana para analisar o processo e expedir um fundamentado mandado de prisão. Não se trata de caso isolado. É evidente que a Lava Jato na primeira instância anda. Basta ver que, até meados de setembro, foram lavrados 106 condenações, 112 pedidos de cooperação internacional, 70 acordos de colaboração premiada, 49 acusações criminais contra 239 9


pessoas, R$ 38,1 bilhões em pedidos de ressarcimento e multas. Já na última instância, o ritmo é outro. Não se nega a existência de avanços na Lava Jato no STF, mas numa velocidade bem diferente da que se constata em Curitiba, por exemplo. Há quem pretenda justificar a lentidão do STF com o argumento de que esta não é uma corte penal. Alega-se que a sociedade brasileira deveria ter uma natural compreensão com um ritmo mais pausado do STF, tendo em vista sua natureza de tribunal constitucional. A desculpa, porém, não prospera. Não é de hoje que o STF tem competência penal nos casos de foro privilegiado. A Constituição de 1824, quando o Brasil ainda era Império, já previa a competência da mais alta Corte do País para julgar “delictos, e erros do Officio, que commetterem os seus Ministros, os das Relações, os Empregados no Corpo Diplomatico, e os Presidentes das Provincias”. Tal sistema foi mantido nas Constituições republicanas, com expressa previsão da competência do STF para julgar ações penais de algumas autoridades. Como, então, o Supremo não está preparado para se desincumbir de seu mister? Também não se pode alegar excesso de trabalho. É conhecido o expressivo número de processos que cada ministro do STF tem sob sua responsabilidade, mas cada um também tem – havendo necessidade – a prerrogativa de requisitar juízes que o auxiliem em seu abundante trabalho. A questão principal não é o volume de trabalho nem a identidade da Suprema Corte. Os tempos do STF revelam como a Corte administra suas prioridades. Tem-se a impressão que as questões penais de foro privilegiado entram na fila comum dos processos. Certamente, se assim for, razão há para um ritmo bem lento. Não faz muito o STF julgou uma ação de reconhecimento de paternidade que tramitava na Corte há 33 anos. Quando por unanimidade os ministros decidiram o desfecho do caso, o pai, a mãe e o filho já haviam falecido. É um caso escandaloso, mas afeto, enfim, a uma única família. Os casos da Lava Jato dizem respeito à moralidade da administração, à lisura da atividade política e à sanidade da vida social. Aqui, a família não é a família nuclear, mas a família nacional que está à espera de desfechos. A competência do STF nas ações penais em casos de foro privilegiado revela a importância desses julgamentos para a vida institucional brasileira. Tais ações merecem absoluta prioridade na pauta de cada ministro. Causaria muito mal ao País a ideia de que as autoridades que se deixam enredar pela Justiça e têm seus casos avocados pelo Supremo contem as horas em ritmo diferente dos mortais que começam a penar na primeira instância. Eduardo Cunha não precisou de muito tempo para perceber como a Justiça pode ser célere. Seria muito positivo que os investigados no STF pudessem ter também semelhante experiência.

Nova fase, velha Fiesp FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAL editoriais@grupofolha.com.br 24/10/2016 às 02h00

Que desfaçatez: num momento em que se discute um teto para a expansão dos gastos públicos, a Fiesp aproveita um encontro com a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, para pleitear que o banco, em vez de devolver ao Tesouro R$ 100 bilhões em empréstimos, use os recursos para ajudar o setor das indústrias. A dívida do BNDES com a União monta a espantosos R$ 525 bilhões. Teve origem na tentativa dos governos petistas de estimular a economia com o uso de dinheiro público.

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Na operação, o banco empresta ao setor privado com juros subsidiados e, para fechar as contas, recebe a diferença do Tesouro. Como este se financia pelas taxas de mercado, mais altas, sobra para o contribuinte um custo, estimado em R$ 27,4 bilhões apenas neste ano. A devolução antecipada de parte dessa dívida foi solicitada em maio pelo governo de Michel Temer (PMDB). O BNDES não apresentou objeção; entende não haver prejuízo para sua capacidade de fazer empréstimos -hoje há sobra de recursos por falta de demanda. Resta a aprovação do TCU (Tribunal de Contas da União), que avalia se a transferência não configuraria financiamento ilegal. É desejável que os valores voltem ao Tesouro. Seria uma demonstração de que o governo se dispõe a economizar onde for possível. Além disso, a essencial redução dos custos financeiros para as empresas será mais bemsucedida se os juros caírem para todos, e não só para quem tem acesso ao BNDES. Sabe-se o quanto é difícil a situação da economia, sobretudo do setor industrial. A combinação de recessão, queda de vendas e juros altos ameaça a sobrevivência de muitas empresas. Recorrer a remendos individuais ou setoriais, contudo, está longe de ser a melhor opção de que o Brasil dispõe. Muito da atual crise econômica decorre do protecionismo e do intervencionismo exagerado adotados nos últimos anos com o aplauso de diversos segmentos do setor privado que se viram beneficiados pelas boquinhas. Talvez acostumada a deixar a conta do pato para os outros, a Fiesp parece ignorar que o país já não comporta demandas paroquiais. O esgotamento do Tesouro e o teto dos gastos impõem um pensamento novo, com soluções amplas e sistêmicas, abrangendo toda a sociedade. Toda e qualquer política pública que importe em subsídios precisa estar alicerçada em análises de custo-benefício e em contrapartidas sólidas e mensuráveis. No fundo, o problema é um só: o orçamento é finito e deve privilegiar aportes com impacto econômico e social mais abrangente, ou seja, deve chegar a quem precisa, de forma eficiente e com critérios claros para desembolso.

Retrato justo FONTE JORNAL FOLHA DE S. PAULO, EDITORIAL editoriais@grupofolha.com.br 24/10/2016 às 02h00

Ineficiente e muito caro. Esse é o retrato que emerge do Poder Judiciário brasileiro a partir da leitura de mais uma edição da publicação "Justiça em Números", que acaba de ser divulgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). De 2009 a 2015, aumentou 19,4% no número de autos acumulados, que passou a 73,9 milhões. Apesar de ganhos recentes na produtividade, permanece a impressão de que os magistrados fazem pouco mais que enxugar gelo. No ritmo atual, seriam necessários três anos sem nenhuma demanda nova para que o estoque represado baixasse a zero. 11


O tamanho dessa pilha de ações, salvo pela atualização dos dados, não chega a ser novidade; há alguns anos ela é conhecida, talvez como a ponta de um iceberg. O relatório deste ano, contudo, traz uma novidade: o tempo médio de duração dos processos. Embora seja difícil reunir num único indicador temporal situações muito heterogêneas, a tarefa foi cumprida a contento pelos técnicos do CNJ, o que permite fazer comparações nem sempre favoráveis ao Brasil. Por aqui, leva-se em média um ano e seis meses para produzir uma sentença de primeira instância. Na Dinamarca, na Estônia, na Áustria e na Holanda, por exemplo, anuncia-se a decisão em menos de cem dias; em Portugal ou na Grécia, a tarefa toma em torno de dois anos. Na Europa, todavia, a prolação da sentença indica que o processo está chegando ao fim; no Brasil, trata-se apenas do começo. Depois dela ainda se somam mais quatro anos e quatro meses, o tempo médio para a decisão ser executada. O quadro se torna realmente assustador quando se consideram os custos. O Judiciário brasileiro consome 1,3% do PIB do país. O valor vai a 1,8% se a ele acrescentamos as despesas com os Ministérios Públicos e as Defensorias. Na Europa, nenhum país investe mais de 1% do PIB no Judiciário. O mais pródigo é a Bélgica, com 0,65%, mas a maioria das nações fica no patamar de 0,3%. O exemplo externo, infelizmente, pouco reflete aqui. Registra-se no Brasil uma tendência de aumento dos gastos como proporção do PIB. Como comprova o relatório, a alocação de cada vez mais recursos não basta, por si só, para conferir maior efetividade à Justiça. Nesse quadro desanimador, destaque-se o esforço do "Justiça em Números". Conhecer os gargalos e as dificuldades do Judiciário é um passo importante para que a primeira frase deste texto deixe de representar um retrato justo. Ajuste incompleto Por causa do aumento dos gastos com pessoal, oito Estados não se enquadraram nos limites do Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal (PAF) que se comprometeram a cumprir como condição para o refinanciamento de suas dívidas com a União 24 Outubro 2016 às 03h00 A notável queda da receita pública entre 2014 e 2015, consequência da recessão que o País enfrentou no período (e continua a enfrentar), forçou a administração pública em todos os níveis a fazer profundos ajustes nas suas finanças. Pelo menos no caso dos Estados e municípios, porém, esses ajustes foram notoriamente desproporcionais, preservando e até aumentando a remuneração real do pessoal empregado, mas prejudicando fortemente a capacidade de investimentos. Os números que acabam de ser divulgados pelo Tesouro Nacional a respeito das finanças dos Estados e municípios com mais de 200 mil habitantes são muito claros. Em valores nominais, a receita bruta dos Estados cresceu 5,74% entre 2014 e 2015, de acordo com a primeira edição do Boletim das Finanças Públicas dos Entes Subnacionais, que a Secretaria do Tesouro Nacional passará a publicar anualmente. Como a inflação no período medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) alcançou 10,57%, é óbvio que a arrecadação diminuiu em termos 12


reais. Por causa da quebra da receita real, os Estados e o Distrito Federal tiveram de cortar despesas, mas os cortes atingiram preferencialmente os investimentos, que caíram quase 40% em valores nominais no período considerado, de R$ 57,5 bilhões para R$ 35,9 bilhões. As despesas com pessoal, no entanto, aumentaram 13,06%, variação maior do que a inflação, o que resultou em crescimento real desses gastos (nos municípios com mais de 200 mil habitantes, o crescimento nominal dos gastos com pessoal foi de 8,29%). Os gastos com pessoal inativo, de sua parte, aumentaram 28,41% nos Estados e 12,10% nos municípios cujas finanças foram examinadas pelo Tesouro Nacional. Aumentos dessa grandeza, advertiu o Tesouro, mostram a importância da contenção desses gastos pelos Estados e municípios. Em boa parte, essas despesas são de difícil contenção, o que limita a capacidade da administração pública de enfrentar situações de dificuldades financeiras, como as atuais. Por isso, observa o Tesouro, “controle dos aumentos salariais, dos gastos comissionados e contenção de contratações de terceirizados são algumas medidas que podem ser adotadas”. Para o caso dos inativos, a solução exige a reforma do sistema previdenciários dos servidores. É provável que parte desses números seja subavaliada pois, na apresentação de seus relatórios financeiros, muitos Estados utilizam critérios técnicos diferentes dos empregados pelo governo federal. Como esclareceu o relatório do Tesouro, “em muitos casos não se consideram algumas rubricas de despesa, como as despesas com obrigações patronais e com aposentadorias e pensões especiais”, o que reduz o montante das despesas com pessoal Mesmo assim, por causa do aumento dos gastos com pessoal, oito Estados não se enquadraram nos limites do Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal (PAF) que se comprometeram a cumprir como condição para o refinanciamento de suas dívidas com a União concluído em agosto passado. Não cumpriram esses limites os Estados de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Paraíba, Distrito Federal, Goiás, Rio de Janeiro e Paraná. O refinanciamento da dívida dos Estados resultou na suspensão do pagamento das parcelas até o fim de 2016 e o reinício das quitações em janeiro de 2017, mas com valores crescentes, de modo que só em junho de 2018 a parcela será paga integralmente. A diferença será acrescentada ao saldo devedor, cujo prazo de quitação foi estendido para 20 anos. Essas medidas trouxeram grande alívio financeiro para os Estados, evitando o atraso de pagamentos, inclusive para o funcionalismo, embora, mesmo assim, algumas unidades da Federação tenham atrasado salários. Mas tudo isso poderá se mostrar inútil. “Caso os Estados não ajustem suas contas agora, estarão no mesmo quadro de insolvência de antes e a renegociação perderá seu sentido”, adverte o Tesouro.

Corrupção institucionalizada Não se pode considerar que quase duas dezenas de ministros de Estado tenham se envolvido em alguma forma de falcatrua sem que a roubalheira tenha sido considerada, em algum momento, como parte do próprio planejamento administrativo Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 24 Outubro 2016 às 03h00 A informação de que 18 ex-ministros dos governos de Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva são suspeitos de envolvimento em esquemas de corrupção, conforme levantamento feito pelo Estado em investigações que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF), é mais uma evidência de que a bandalheira não era nem episódica nem acidental ao longo do período lulopetista. A singularidade dos governos do PT nesse quesito se revela não pela corrupção em 13


si, pois a prática de desviar dinheiro público, infelizmente, é bastante antiga e recorrente no Brasil. O que torna tão especial esse nefasto período de nossa história é que, pela primeira vez, a corrupção tornou-se um método de governo, de onde resulta o envolvimento direto - e a mancheias - de tantos ministros de Estado. Os casos levantados dizem respeito somente àqueles ministros que estão formalmente sob investigação ou que já foram acusados ou condenados. Não incluem, por exemplo, os exministros que foram apenas citados em delações premiadas de envolvidos no esquema de corrupção investigado pela Operação Lava Jato. Também não citam os processos de exministros suspeitos ou acusados de envolvimento em crimes quando já não estavam mais no governo - caso, por exemplo, da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que foi ministra da Casa Civil de Dilma e responde a ação sob acusação de ter recebido dinheiro roubado da Petrobrás para financiar sua campanha ao Senado. Isso significa que, mais cedo ou mais tarde, a lista de auxiliares de Dilma e Lula com contas a prestar à Justiça deverá aumentar em breve. O quadro se torna ainda mais complexo quando se observa que os próprios ex-presidentes Lula e Dilma estão sob investigação. O primeiro, como é de amplo conhecimento, é réu em três ações penais sob acusação de corrupção, lavagem de dinheiro, obstrução da Justiça e organização criminosa - da qual, segundo o Ministério Público, o petista seria o chefe. Dilma, por sua vez, é suspeita de ter tomado providências, durante seu mandato, para obstruir as investigações da Lava Jato a respeito de Lula. O mais espantoso desse levantamento é o contraste entre as palavras e os atos de Lula e companhia. Criado como o partido da ética, o PT, uma vez no poder, revelou-se não apenas tão ou mais corrupto do que aqueles grupos políticos que vivia a denunciar, mas foi ainda mais longe do que todos eles jamais sonharam: a corrupção, até então praticada basicamente por políticos interessados em enriquecer, tornou-se sistêmica. Não se pode considerar que quase duas dezenas de ministros de Estado tenham se envolvido em alguma forma de falcatrua sem que a roubalheira tenha sido considerada, em algum momento, como parte do próprio planejamento administrativo. A “faxina” que Dilma promoveu logo que chegou ao poder, em 2011, custou o cargo a sete ministros e parecia desmentir essa percepção. Mas eis que, não muito tempo depois, Dilma não apenas reabilitou alguns desses políticos, como os transformou em interlocutores no processo de escolha de novos ministros, como se nada tivesse acontecido. Não foram poucas as vezes em que os petistas, diante dos escândalos que o PT e seus associados protagonizaram, deram a entender que, no Brasil da corrupção generalizada, não há outra forma de alcançar os nobres objetivos do partido senão dançando conforme a música. A história, bradavam, haveria de lhes fazer justiça. Essa visão deletéria, felizmente, foi devidamente desmentida pela multidão de brasileiros que saiu às ruas do País clamando pela ética na política, aquela que o PT prometeu e não entregou. A acachapante derrota do partido nas eleições municipais mostrou o tamanho da indignação dos eleitores com o embuste petista. As urnas e as manifestações populares, que fazem parte da alma da democracia, deixaram claro aos líderes do PT que, para a maioria dos brasileiros, a corrupção não é, em nenhuma hipótese, um meio aceitável para se atingir um fim.

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O MST e a Lei 12.850/13 Pela primeira vez, membros do MST foram acusados criminalmente com base nesse texto legal Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, 24 Outubro 2016 às 03h00 Ao julgar pedido de habeas corpus impetrado por quatro militantes do Movimento dos SemTerra (MST) envolvidos em invasões de duas propriedades privadas no Estado de Goiás, a sexta turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mandou soltar um deles, que estava preso desde maio, e decretou a prisão dos outros três, dois dos quais estão foragidos. As invasões ocorreram nas terras de uma usina de açúcar que está em processo de recuperação judicial e numa fazenda de propriedade do senador Eunício de Oliveira (PMDBCE), que os líderes do MST dizem ser um “latifúndio improdutivo”. Às vésperas do início do julgamento, a entidade colocou um grupo de manifestantes na frente do prédio do STJ e promoveu “vigílias” ao redor dos fóruns de Goiânia e de dez cidades do interior de Goiás. Também indicou um dos mais experientes membros da Rede Popular de Advogados para defender os quatro militantes e teve o apoio de centros de defesa de direitos humanos, do PT, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e do Conselho Latino Americano de Ciências Sociais. Embora o MST tenha um extenso rol de pendências no Judiciário, o julgamento dos quatro pedidos de habeas corpus foi aguardado com apreensão pelos líderes da entidade clandestina. Temiam os efeitos das inovações jurídicas que entraram em vigor nos últimos anos. Durante décadas, as decisões dos tribunais relativas às invasões do MST foram baseadas no velho Código Penal editado em 1940, especialmente no dispositivo que tipifica o crime de formação de quadrilha. Dado o anacronismo desse texto legal, os advogados do MST habilmente conseguiram explorar suas brechas e obter decisões favoráveis na segunda instância dos tribunais. Isso explica o pequeno número de militantes punidos pela Justiça, em comparação com o elevado número de invasões. No caso em questão, porém, o Ministério Público não baseou suas denúncias no Código Penal, mas na Lei 12.850/13, que trata das organizações criminosas e entrou em vigor em 2013. Foi a primeira vez que membros do MST foram acusados criminalmente com base nesse texto legal. Entre outras inovações, a lei prevê que os inquéritos criminais possam correr em sigilo. Também autoriza a delação premiada e permite infiltração de agentes, quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico. E, diferentemente do enquadramento das invasões pelo crime de formação de quadrilha, a Lei 12.850/13 pressupõe a teoria do domínio dos fatos, com base na qual qualquer militante de uma organização criminosa pode ser acusado em qualquer inquérito. Foi o temor do alcance dessas inovações que levou o MST a se mobilizar e a buscar apoio internacional para pressionar o STJ. A entidade mais uma vez acusou o Ministério Público de criminalizar os movimentos sociais. Alegou que os juízes das comarcas do interior de Goiás que determinaram a prisão preventiva dos quatro militantes agiram de forma ideológica. Criticou a ação articulada das polícias de Goiás e do Rio Grande do Sul para prender um dos militantes. E entoou o mantra de que a aplicação da lei das organizações criminosas nas invasões resulta da “articulação de forças conservadoras patrocinadas por expoentes do agronegócio” e da “coalizão das forças neoliberais para direcionar a política econômica para seus interesses”.

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Terminado o julgamento, o MST agiu como se esperava. Fez que não soube do enquadramento como criminosos de três militantes e comemorou, como vitória, a soltura do quarto militante. Em seu conhecido jogo de inversão de fatos e valores, a entidade clandestina mentiu deslavadamente. Afirmou que o STJ decidiu que “lutar pela terra não é crime” e que a Lei 12.850/13 se aplica apenas aos crimes de tráfico e lavagem de dinheiro. Não foi o que disseram os ministros da sexta turma da Corte – e o fato de terem determinado a prisão de três dos quatro acusados deixa claro por que os líderes do MST estão apavorados com os efeitos da Lei 12.850/13.

Opiniões: Os podres da República e a sorte de Moro No governo Temer, no Congresso, na oposição, quem tem rabo o preso está suando frio Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, *Marco Aurélio Nogueira 22 Outubro 2016 às 04h07 Bastou a prisão de Eduardo Cunha para que as nuvens ficassem mais carregadas e os dilemas da República se agigantassem. Já se sabia de tudo, mas a prisão trouxe à tona uma trajetória que chama atenção pela longevidade, pela desfaçatez e pelo tamanho das ilicitudes. Cunha tem peso próprio, não é um qualquer quando se trata de exploração das brechas existentes na legalidade e na cultura político-administrativa do Estado brasileiro. É um profissional. As acusações contra ele abrangem um leque impressionante de fraudes, negócios escusos, abusos e irregularidades. Vêm lá de trás, mais ou menos do final dos anos 1980. Como foi possível sobreviver durante tanto tempo e seguir uma carreira ascendente que poderia tê-lo levado à Presidência da República? O sistema assistiu impassível à performance, que teria continuado se não houvesse a Lava Jato. No mínimo por isso, o juiz Sergio Moro merece aplausos. Ele está a desnudar os podres de nossa vida estatal, valendo-se de uma obstinação que o tem ajudado a resistir a intempéries mil, ainda que o levando em certos momentos ao limite da temperança e da moderação. As vozes mais sensatas e certeiras da República afirmam que a pressão sobre Moro aumentará terrivelmente. A prisão de Cunha fará um tsunami desabar sobre o juiz, impulsionado tanto pelos ventos que sopram do lado dos que não desejam o prosseguimento da Lava Jato, quanto pelos vagalhões produzidos por aqueles que não gostam do estilo de Moro e o veem como autoritário. No governo Temer, no Congresso e na oposição, quem tem o rabo preso está suando frio. A lógica das coisas aponta na direção deles. Decaído o chefe, é de esperar que o restante dos dominós caia também, ou seja ao menos ameaçado. Sobretudo se Cunha der com a língua nos dentes, contar o que sabe, com quem tramou, por que o fez, quanto ganhou e quanto distribuiu. Nitroglicerina pura, que será por ele usada com inteligência estratégica e instinto de sobrevivência, atributos que não lhe faltam. No day after da prisão, não faltou quem fizesse a ilação apressada: Cunha derrubará Temer ou lhe roubará as bases de apoio a ponto de levar seu governo à asfixia. Setores da direita e sebastianistas de esquerda deram-se as mãos, desavergonhadamente, para atacar as detenções preventivas decretadas por Moro. Alegaram que elas ferem o Estado de Direito, que a prisão de Cunha não passaria de pretexto para prender Lula, que a Lava Jato teria criado a imagem da “corrupção sistêmica” só para justificar o arbítrio da república de Curitiba e “criminalizar o PT”. Cunha seria mais uma vítima desse procedimento judicial que fere a justiça, abusa da autoridade e desrespeita direitos. 16


Moro respondeu quase de imediato. Em palestra feita em Curitiba para desembargadores e juízes do Paraná, reiterou que a “aplicação vigorosa da lei” é o único meio de conter casos de “corrupção sistêmica”. As detenções cautelares seriam indispensáveis, até para deixar estabelecido que “processos não podem ser um faz de conta”. E explicou: “Jamais e em qualquer momento se defendeu qualquer solução extravagante da lei na decretação das prisões preventivas”. Seria preciso manter viva a “fé das pessoas para que a democracia funcione”, ou seja, impedir que se perca a “fé maior, de que a lei vale para todos”. Evidenciou-se assim que o juiz sabe que a pressão sobre ele continuará a crescer. A coisa toda, no fundo, pode ser vista de forma mais simples. Quando gente de direita e de esquerda se une para atacar um juiz, é porque há algo de muito errado no xadrez político. A causa, no mínimo, torna-se suspeita de antemão, especialmente quando estruturada para proteger pessoas que estão a ser investigadas há tempo, com provas que se superpõem e se acumulam. Um juiz tende a ter atrás de si todo o sistema da Justiça: outros juízes, promotores, procuradores, tribunais, leis, jurisprudências, ritos consagrados, policiais federais. Moro não é, evidentemente, uma unanimidade entre seus pares e há muito conflito entre os órgãos e os aparatos de investigação e penalização. Mas, de algum modo, atacar hoje um juiz como ele pode significar um ataque ao conjunto do sistema. Afinal, tudo parece indicar que a “corrupção sistêmica” está aí e atingiu níveis graves, que precisam ser contidos não só por uma questão de justiça, mas também por uma questão operacional: o sistema enfartará se não for “purificado” e esvaziado de trambiques e sujeira. Se é assim, em maior ou menor grau, Moro tem razão quando fala que “a condição necessária para superar a corrupção sistêmica é o funcionamento da Justiça”. Não haveria por que propor alguma espécie de “solução autoritária”, mas é preciso que se tenha vontade para que os processos cheguem a bom termo. Ações judiciais na esfera política são acompanhadas com interesse pela sociedade, especialmente numa época de informações intensivas e protagonismo das opiniões. O cidadão assiste àquilo como parte de uma “limpeza” que ele gostaria de ver realizada. Muitas vezes joga o bebê fora junto com a água do banho: condena todos os políticos sem se esforçar para perceber que há diferenças entre eles, raciocina com o fígado e bate em todos como se fossem farinha do mesmo saco. Se uma sociedade rejeita a corrupção sistêmica, o enriquecimento ilícito e os políticos “sujos”, com seus empresários a tiracolo, então não será o ataque a um juiz que vai convencê-la do contrário. Tal ataque, porém, se bem-sucedido, poderá fazer com que ela não se mobilize. Até prova em contrário, se a sociedade assim quiser e souber se manifestar, Moro seguirá em frente, contra o sistema político que deseja seu silêncio, contra o governo e a oposição, contra o histrionismo da direita e as lágrimas de crocodilo da esquerda. *Professor titular de teoria política e coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Unesp

PCC, o cartel do ‘Narcosul’ Mais uma herança perversa do populismo brasileiro. Há que agir enquanto é tempo Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, *Ricardo Vélez Rodríguez 22 Outubro 2016 às 04h09 Ao longo das últimas décadas o Primeiro Comando da Capital (PCC) converteu-se no cartel do “Narcosul”. Nascido da reação contra o massacre do Carandiru (1992), o PCC já domina a 17


maior parte dos presídios brasileiros. E dessa posição passou a dominar o tráfico de drogas no Brasil e na região do Mercosul. Daí o nome dado pelos meliantes à organização: “Narcosul”. É o que revela a pesquisa publicada pela revista Veja sob o título: O Carandiru e o PCC" (edição 2498, de 5/10, páginas 84-97). Era questão de tempo o Brasil ter o seu grande cartel das drogas. Acontece que, em política, se falta a perspectiva estratégica (que, infelizmente, está longe da mente dos nossos políticos), fica aberta a porta para eventos negativos. É o que está acontecendo com a força demonstrada pelo PCC em matéria de narcotráfico. Hoje ele é a principal organização criminosa brasileira, que rivaliza, em lucros, com as maiores empresas do País, chegando a ocupar a 16.ª posição, com ganhos da ordem de R$ 20,3 bilhões por ano, à frente de grandes empresas como a Volkswagen e a JBS Foods. Como se chegou a isso, depois de termos conhecido as desgraças patrocinadas na Colômbia pelo cartel de Medellín, de Pablo Escobar, nos anos 80 e 90 do século passado? A resposta é: descaso e populismo. Esse perigoso binômio nos levou a menosprezar a lição dada pela Colômbia após sofrer a dura guerra do narcotráfico e da narcoguerrilha, com os seus mais de 250 mil mortos. Lembro que no final dos anos 90 fiz uma palestra no Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio, no Rio de Janeiro, acerca das desgraças produzidas pelo narcotráfico na “Cidade Maravilhosa”, que se tornou incontrolável depois do ciclo populista dos dois governos de Leonel Brizola. Alertava, na época, para o risco de o Brasil se tornar palco do crescimento de grandes cartéis de drogas em decorrência do vácuo que o populismo abriu em matéria de segurança pública e também como consequência do vazio econômico provocado pela insegurança jurídica ensejada pelo “socialismo moreno” do caudilho gaúcho, que fez mais de 800 empresas abandonarem o Rio de Janeiro quando da primeira administração brizolista, que começou em 1983, à sombra da retórica socialista das “perdas internacionais” que o capitalismo teria trazido ao País. Brizola, efetivamente, deu o grande passo em matéria de abrir espaço para o crime organizado, ao pregar que a polícia não subia em morro. Os traficantes ocuparam rapidamente o vácuo aberto e, orientados pelos meliantes colombianos, começaram a adquirir armamento pesado. Data daí a explosão da violência que o narcotráfico ainda impõe aos cidadãos cariocas. O empurrão inicial dado pelo brizolismo ao narcotráfico no Rio veio ser potencializado, em nível nacional, pelos 13 anos de populismo lulopetista, que simplesmente abriram as portas para o mercado de tóxicos no Brasil. Lula, no palanque em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, com Evo Morales, no início do seu primeiro governo, ostentando no peito um colar feito de folhas de coca: foi essa a imagem que percorreu o mundo do narconegócio, indicando o “liberou geral” dos petistas para a produção e a distribuição das drogas. Rapidamente o Brasil viu aumentar de forma fantástica a entrada de pasta-base de coca boliviana. O cocalero Evo Morales não fez por menos: ao longo dos governos petistas, simplesmente duplicou a extensão que os bolivianos dedicavam ao cultivo da folha de coca, a fim de destinar a maior parte da produção ao mercado de tóxicos brasileiro. Resultado: viramos mercado para a droga, ao mesmo tempo que nos firmamos como corredor de exportação de narcóticos para a Europa. Do mercado americano, cada vez mais próspero, os nossos meliantes deixaram que cuidassem os mexicanos, que ocuparam rapidamente o vácuo deixado com a morte de Pablo Escobar, em 1993. As coisas facilitaram-se enormemente para os traficantes da América do Sul com a instauração, na Venezuela chavista, de um autêntico narco-Estado, que passou a proteger a narcoguerrilha colombiana das Farc e intermediou a compra de armas (lembremos que Fernandinho Beira-Mar era um dos elos da cadeia de aquisição de armas em troca de cocaína no mercado americano e também no Brasil). 18


O corredor brasileiro de exportação de cocaína transladou-se do Centro-Sul do País para as desguarnecidas cidades do Norte e do Nordeste, carregando consigo a sua procissão de assassinatos e violência generalizada, que explodiu nessas regiões. A África Ocidental, ocupada por narco-Estados, passou a ser a nova fronteira a ser atingida pelos traficantes brasileiros. Mas o Brasil virou também, como previam os mafiosos italianos no final dos anos 1980, um próspero mercado para o consumo de entorpecentes. Segundo a pesquisa divulgada pela revista Veja (na edição citada no início deste artigo), o Brasil tem 2 milhões de viciados em cocaína, 1 milhão de dependentes de crack e 1,5 milhão de usuários de maconha. Esses consumidores regulares de tóxicos garantem ao PCC um lucro que, como frisei anteriormente, chega hoje aos R$ 20,3 bilhões por ano. Vai ser difícil nos desfazermos dessa indústria da morte, hoje plenamente estabelecida e que funciona pelo País afora, dinamizada pela enorme e abandonada população carcerária (que já chega a 550 mil indivíduos), dominada em sua maioria pelo PCC. Um verdadeiro exército da morte, que espalha assassinatos nos presídios e em todos os cantos do Brasil! Mais uma herança perversa do populismo brasileiro. Abre-se, pois, nova frente para desmontarmos o descaso aberto no País pelo populismo. Mas é melhor agirmos enquanto é tempo. O PCC já mostrou que tem bala na agulha. *Coordenador do centro de pesquisas estratégicas da UFJF, professor emérito da Eceme, é docente da Faculdade Arthur Thomas, Londrina e-mail: rive2001@gmail.com

Maquiagem criminosa É criminosa a maquiagem feita por muitos Estados nas contas de despesas com o pagamento de pessoal e do déficit da Previdência Social dos seus servidores. E o mais grave: ela tem a conivência dos Tribunais de Contas dos Estados. A revelação feita pelo Tesouro Nacional de que a situação das finanças estaduais é bem pior do que a informada colocou o dedo na ferida e não deve ficar no esquecimento. Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Adriana Fernandes 22 Outubro 2016 às 06h00 É preciso punir os gestores que provocaram essa desordem nas contas públicas, principalmente depois que a ex-presidente Dilma Rousseff perdeu o cargo por crime de responsabilidade fiscal com as famosas “pedaladas fiscais”. A contrariedade dos governadores com a divulgação feita pelo Tesouro é tamanha que deve provocar a partir de agora uma guerra de números com o Ministério da Fazenda. Para muitos Estados, o governo federal avançou o sinal ao expor dados conflitantes que não deveriam ter sido apresentados num relatório oficial – muito menos às vésperas da votação em segundo turno da PEC do teto de gastos. O ponto fundamental, porém, é que o Tesouro começou a abrir a caixa preta dos finanças dos Estados e do relacionamento deles com a União. Nunca tinha acontecido antes. Sempre foi uma batalha reunir informações detalhadas sobre as finanças dos governos regionais. Por isso, é bombástico o conteúdo do Boletim das Finanças Públicas, divulgado na última quinta-feira. E é só o começo. No próximo relatório, que será divulgado em maio, a radiografia será ampliada com dados dos municípios acima de 100 mil habitantes. O polêmico documento, de 95 páginas, mostrou que sete Estados e o Distrito Federal estão com os gastos de pessoal acima do limite permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas apenas dois deles admitiram o descumprimento. 19


Os dados do déficit da Previdência são ainda mais alarmantes. A diferença total encontrada foi de R$ 18 bilhões. É gritante o caso do Rio. O Estado declarou um déficit da Previdência de R$ 542 milhões em 2015, mas o governo federal diz que o número real foi R$ 10,84 bilhões. Nesse caso em particular, há suspeitas de que a maquiagem nas contas do governo fluminense tenha sido feita com a conivência do próprio Tesouro. O Tesouro pode ter sido cúmplice da criatividade fiscal do governo do Rio ao fazer vista grossa à contagem dupla de receitas com royalties – que entravam no cálculo da receita corrente e depois no fundo previdenciário. Essa contabilidade permitiu a redução dos valores registrados do déficit da Previdência estadual. Ninguém no Tesouro sabia disso? Ninguém viu? São perguntas que precisam ser respondidas também pela Fazenda. E vale para os outros Estados. Afinal, aqueles que têm dívida com a União têm de ser monitorados permanentemente pela Fazenda. O boletim também expõe claramente a má gestão do Tesouro ao mostrar com números que a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) para que o órgão só dê garantias de empréstimos para Estados com notas de créditos (rating) mais altos – A e B – foi desobedecida. Entre 2012 e 2015, a maior parte das garantias foi dada justamente para os Estados com notas mais baixas. E o dinheiro, que deveria ter sido usado para investimentos, acabou sendo canalizado, na prática, para pagar outras despesas de custeio da máquina e conceder reajustes salariais para os servidores muito acima da inflação. É urgente a regulamentação do Conselho de Gestão Fiscal para barrar as operações de contabilidade criativa. Previsto na LRF, o conselho não foi criado mesmo depois de 16 anos de a lei ter sido sancionada. Ele terá a função de dar uma diretriz única para o registros das contas do setor público. Faca no pescoço. O primeiro teste do teto de gastos – o Orçamento de 2017 – poderá ser bem mais desgastante do que o governo esperava. O relator-geral, senador Eduardo Braga (PMDBAM), já deu sinais de que não vai deixar a vida fácil para a equipe econômica. Ex-ministro do governo Dilma Rousseff, Braga quer ampliar o teto das despesas para aumentar espaço para as emendas dos parlamentares. JORNALISTA DO BROADCAST

Por que não anda? Carlos Kawall, do Safra, tenta explicar por que a aguardada retomada da economia brasileira está com jeito de ser decepcionante. Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Fernando Dantas 21 Outubro 2016 às 19h23 Depois do tombo, a letargia. A economia brasileira, após cair 7% em 2015 e 2016, pode ficar quase parada em 2017, segundo uma corrente dos analistas que prevê crescimento em torno de 0,5% no próximo ano. É verdade que estes estão no campo mais pessimista do mercado, mas nos últimos dias são os otimistas, que projetavam até 2% para o PIB de 2017, que estão cortando suas previsões. Um festival de indicadores ruins – indústria, comércio, serviços, proxies do PIB, etc. – jogou as projeções do PIB do terceiro trimestre para território nitidamente negativo. O fundo do poço revelou-se bem mais embaixo, e as perspectivas de ritmo de retomada bem mais acanhadas. Para Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, que prevê crescimento de apenas 0,5% em 2017, uma das principais razões pelas quais a velocidade de arranque pós-contração no Brasil está tão comprometida é que o país vive uma “recessão de balanço”. 20


A expressão foi central no diagnóstico sobre a estagnação e o baixo crescimento do mundo avançado após a crise de 2008 e 2009 elaborado pelos economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart. A ideia é simples. Depois de tempos de euforia que terminam em estouro de bolha, empresas e famílias se veem com excesso de dívidas. Todo mundo tenta se desalavancar ao mesmo tempo, o que compromete a demanda e a renda, tornando mais difícil o saneamento dos balanços: por mais que se reduza a dívida, caem também os rendimentos de onde saem os recursos para servi-la. No Brasil, Kawall vê um recorte muito peculiar de recessão de balanço. A dívida subiu, mas nada comparável aos excessos do mundo rico. O problema, porém, é que a recessão foi tão brutal que, especialmente no caso das empresas, houve uma drástica queda de faturamento e receita líquida, que torna a desalavancagem muito mais difícil, segurando os investimentos. É claro que a grande ociosidade aberta em diversos segmentos da indústria também inibe as inversões. Por um lado, há pouca dúvida de que o processo de enfraquecimento do mercado de trabalho, do salário e do consumo se dá defasadamente (em momento posterior) em relação à recessão produtiva, e que, portanto, não é daí que virá o motor inicial de arranque da retomada. Tampouco o setor externo, em fase de baixíssimo crescimento do comércio global, terá condições de representar este papel. Resta, portanto, o investimento, que poderia repicar na onda de retomada da confiança com o relativo sucesso inicial da política econômica do governo Temer. É aí, porém, que mora o problema, na visão de Kawall. O crescimento do saldo de crédito total em 12 meses ficou negativo em 0,6% em agosto, com queda de quase 5% para empresas e crescimento de 4% para pessoas físicas. Este saldo total em 12 meses, é bom lembrar, é o indicador que crescia a 40% em 2008 e que ainda em 2013 crescia a 13% (e a 10% até meados de 2015). Desde 2009, os números para empresas são em geral piores do que os das pessoas físicas. A razão entre dívida líquida financeira e EBITDA das empresas abertas não-financeiras (excluindo Petrobrás) estava em 3,43 no segundo trimestre de 2016, já com redução ante os 4,06 do primeiro trimestre, mas quando o desejável seria um nível entre 2 e 2,5, segundo Kawall. Ele usou dados coligidos pelo centro de estudos CEMEC/IBMEC. Desde 2015, a razão entre EBITDA e serviço da dívida das empresas abertas não-financeiras (excluindo Petrobrás) é menor que 1 (0,69 no segundo trimestre de 2016), o que significa que as firmas não estão fazendo resultado suficiente para servir a dívida. Na verdade, 55% das 605 empresas abertas não-financeiras tinham EBITDA menor que o serviço da dívida financeira no segundo trimestre de 2016. A inadimplência vem crescendo desde o início de 2015, e a queda na margem que ocorreu recentemente está ligada ao aumento de renegociações e reestruturações de dívida. Mesmo a Petrobrás, nota Kawall, está em pleno processo de contenção de empresas operacionais e de investimentos, e de venda de ativos. “Estamos numa crise em que o setor empresarial ficou com endividamento excessivo por causa da queda das receitas, e vai demorar muito tempo para que voltemos ao nível de faturamento do passado – no setor automotivo se fala até em dez anos para que se volte aos níveis de demanda prévios”, comenta o economista. Assim, o investimento, que caiu durante dois anos e meio, acumulando um tombo de 25%, poderia voltar mais rapidamente, mas este movimento é tolhido pela capacidade ociosa, alavancagem, reflexos da Lava-Jato na construção, etc. 21


O programa de concessões e privatizações pode ajudar, mas é mais rápido vender ativos, como empresas elétricas, do que tocar o processo lento e laborioso de colocar de pé novos investimentos em infraestrutura. Ainda assim, para Kawall, a solução passa inevitavelmente pela privatização, capitalização, saneamento financeiro e venda de ativos. Neste sentido, ele conclui, “o capital estrangeiro tem um papel fundamental a desempenhar”. (fernando.dantas@estadao.com) Fernando Dantas é jornalista do Broadcast

Além dos erros do PT Algum reconhecimento dos equívocos até que existe, mas não apontam quais foram Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Celso Ming 22 Outubro 2016 às 18h00 Nas últimas semanas pipocam as advertências de dentro do próprio PT de que é preciso refazer o chão e começar de novo. Para que tenham um mínimo de consequência, essas coisas têm de começar com o reconhecimento dos erros e isso é complicado, porque depende de diagnósticos corretos e de concepção adequada das políticas, a que o PT não está acostumado ou não está disposto a fazer. Algum reconhecimento dos equívocos até que existe. Mas é iniciativa inconsistente de políticos e dirigentes que admitem – vá lá – que “alguns erros foram mesmo cometidos”, sem, no entanto, dizerem quais foram. Ou então, esse reconhecimento meia-boca vem acompanhado de observações vazias, de que errar é humano, quem não erra que atire a primeira pedra, etc. Foto: FOTO JF DIORIO / ESTADÃO CONTEÚDO

PT. E a autocrítica?

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Persiste o discurso conspiratório de que o PT é vítima de um golpe ou da perseguição sistemática praticada por políticos picaretas (sempre há pelo menos 300 na Câmara dos Deputados, como já avisou o ex-presidente Lula) mancomunados com as elites irresponsáveis, com membros da magistratura megalomaníaca e seletiva e com a mídia burguesa e monopolista. Enfim, trata-se de lenga-lenga idêntica à que se dedica agora o candidato republicano à presidência dos Estados Unidos, Donald Trump. Se de fato foi vítima de inimigos tão poderosos, então o PT também terá errado porque não levou em conta sua força no jogo político nacional. Mais do que simplesmente ter cometido erros, o PT falhou porque se concentrou na execução do seu projeto de poder. Deu prioridade à transformação do povão em consumidor classe C, sem proporcionar condições sustentáveis de redenção por meio de programas de educação, saúde, saneamento, segurança e, obviamente, emprego. Os projetos de reforma foram abandonados e, uma vez instalados nos aparelhos de Estado, os companheiros atiraram-se aos potes de melado e se lambuzaram – para resgatar aqui rara manifestação de sinceridade do ex-ministro Jaques Wagner. Mas, como este cantinho de jornal vem repetindo, o gatilho do impeachment (e, agora, também da derrota arrasadora do PT nas últimas eleições) tem diretamente a ver com a desastrosa política econômica adotada especialmente pelo governo Dilma. Mais do que um erro primário, agasalhar o ponto de vista de que o equilíbrio das contas públicas não tem importância para os objetivos de política social foi fatal para os resultados colhidos. Entre eles estão recessão profunda, desemprego de 11%, inflação beirando os 10% ao ano, juros básicos a 14,25% ao ano, desmonte da indústria, asfixia da Petrobrás e do setor elétrico... A política de austeridade “é rudimentar” – já dizia em 2005 a então ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, quando se referiu ao plano de resgate fiscal do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci. E esse entendimento teve consequências. Os documentos mais recentes mostram que as concepções esdrúxulas de política econômica continuam permeando a cúpula do PT. Recomendam queima de reservas, aumento de impostos, especialmente com criação de imposto sobre grandes fortunas, e derrubada imediata dos juros, desconsiderando-se as implicações do regime de metas de inflação. E isso mostra que não há arrependimento nem convicção. CONFIRA:

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Não dá para dizer que a inflação continua em desaceleração porque o IPCA de setembro foi de apenas 0,08% e, 15 dias depois, apontou para uma inflação nos 30 dias terminados no dia 15 de outubro, de 0,19%. Mas dá para apostar em inflação mais ou menos por esse patamar ao longo de todo este mês. Serviços O efeito da queda dos preços dos combustíveis e da energia elétrica ajudará a puxar a inflação para baixo. Mas, na outra ponta da corda, estão novas altas dos alimentos e a ainda renitente propensão à alta do setor de serviços.

Banco Central acertou ao reduzir taxa de juros? NÃO FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, ROGÉRIO MORI 22/10/2016 às 02h00 O DEBATE QUE NÃO OCORREU Um dos maiores desafios iniciais do governo Michel Temer foi a reconstrução da credibilidade. À esquizofrenia de um governo que, ao mesmo tempo, tentava controlar a inflação com juros mais elevados e aquecer a economia via estímulos ao crédito seguiu-se, nos últimos meses, a reordenação das diretrizes da política econômica. O governo tem sido relativamente bem-sucedido, até o momento, em reconstruir os pilares da política fiscal. No plano da política monetária, a prioridade foi pelo controle da inflação, mantendo o aperto dos juros desde que a nova direção do Banco Central (BC) assumiu. Por conta disso, a variação do IPCA acumulada em 12 meses tem dado sinais de queda, ainda que de forma lenta (até agosto, essa medida ainda situava-se na casa dos 9%). 24


Ao mesmo tempo, o comportamento da inflação tem registrado oscilações que não configuram uma trajetória de redução unidirecional: em certos momentos, o comportamento dos preços traz alguns repiques inflacionários. O patamar atual tem imposto um esforço hercúleo à política monetária para criar uma trajetória de convergência para o centro da meta. Isso é decorrência do elevado grau de indexação (ainda que em bases anuais) que persiste na nossa economia e da dispersão das expectativas de inflação, oriunda da leniência do BC com a dinâmica da alta dos preços durante tanto tempo. Nesse último quesito, a nova administração tem se mostrado eficiente em reconstruir a credibilidade em torno da política monetária, reafirmando seu compromisso com a estabilidade de preços. Todavia, tanto a inflação corrente quanto as perspectivas de curto prazo ainda apontam para um patamar elevado. O BC, apesar disso, optou por reduzir a taxa de juros em 0,25 ponto percentual, fundamentado tanto na trajetória de queda recente quanto nas suas projeções (e nas elaboradas pelo mercado), que indicam variação do IPCA de 4,4% a 5,0% no ano que vem. Nesse sentido, a construção analítica realizada pelo BC em torno do cenário econômico e do comportamento dos preços criou uma espécie de convergência entre os agentes, na qual o corte dos juros tornou-se não apenas uma unanimidade como também uma espécie de condicionalidade para o bom funcionamento dos instrumentos de comunicação do BC no futuro. Por conta disso, não houve o debate sobre a redução ou não dos juros. No entanto, existem argumentos que justificariam que a taxa Selic permanecesse inalterada na última reunião do Comitê de Política Monetária do BC. A manutenção dos juros ajudaria a consolidar o compromisso do BC com a inflação mais baixa, reforçando o realinhamento das expectativas. Segundo dados da sondagem de setembro da Fundação Getulio Vargas, os consumidores ainda esperam um patamar superior a 9% de inflação no acumulado dos próximos 12 meses. A manutenção dos juros, nesse sentido, estimularia uma convergência mais rápida, facilitando o trabalho do BC no futuro. Ao mesmo tempo, a inflação ainda tem oscilado em patamar elevado e qualquer choque de oferta adverso pode ter efeitos inflacionários nos próximos meses. Isso poderia proporcionar um repique, com impactos sobre a trajetória de variação dos preços e nas expectativas. Esse risco seria minorado na eventualidade de uma manutenção dos juros. De qualquer forma, a opção do BC em cortar os juros não é desprovida de coerência. O que ele precisa, a partir de agora, é que, de fato, a trajetória de inflação siga o projetado. ROGÉRIO MORI, doutor em economia pela Fundação Getulio Vargas, é professor de macroeconomia e economia brasileira na mesma instituição

Banco Central acertou ao reduzir taxa de juros? SIM 25


FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, FELIPE SALTO 22/10/2016 às 02h00 BOM COMEÇO, MAS QUEDA DEVERIA SER MAIOR O Banco Central tomou coragem e iniciou um ciclo de redução dos juros. A queda foi de 0,25 ponto percentual, para 14% ao ano. A intensidade deveria ter sido maior, mas já é um começo. Apesar das incertezas, a melhora das expectativas, resultado da atitude decidida do governo Michel Temer na seara fiscal, deu mais força à redução da Selic. Juros menores têm o condão de turbinar o investimento. A dívida das empresas cai e o gasto do governo se retrai. Nessa toada, voltaremos a crescer. Se a taxa interna de retorno de um projeto de investimento é inferior à remuneração oferecida nos títulos públicos (a Selic), o projeto não sai do papel. Logo, quanto menor a taxa de juros, maior o número de investimentos viáveis economicamente. O retorno de 10% em uma fábrica de sapatos é muito ou pouco? Depende de quanto eu ganharia colocando esse capital em títulos públicos. Ao fixar determinado nível de juros, busca-se certo patamar de inflação em um prazo de um ou dois anos, mas sem tirar o olho do lado real: produção, emprego e investimento. Por exemplo, para o ano que vem, o próprio BC já prevê uma inflação de 4,4%, abaixo do centro da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional (4,5%). Quanto ao PIB, nunca estivemos tão mal: um tombo, entre 2015 e 2016, de mais de 7%. Os analistas preveem inflação de 5% para os próximos 12 meses. Desde novembro do ano passado, a expectativa dos agentes econômicos já caiu quase dois pontos e meio. Isto é, o juro real, variável mais relevante para a decisão de investimento (pois desconta a perda com a inflação), estava subindo até a última quarta-feira (19), mesmo com a Selic inalterada. O juro brasileiro é uma espécie de jabuticaba. Amarga. Com dívida de 70% do PIB ou R$ 4,3 trilhões, o Brasil paga 8,5% de juros reais. Países com níveis similares de dívida têm taxas de juros reais negativas ou, quando positivas, iguais a 2% ao ano, no máximo. Os juros brasileiros estão muito acima do nível internacional acrescido do risco país. Isto é, estamos pagando muito mais do que o necessário para cobrir o diferencial de risco para o investidor que tem de decidir colocar dinheiro aqui ou mandar para os Estados Unidos. Isso cria um estímulo para a entrada de dinheiro especulativo no Brasil: entra, ganha o juro e vai embora depois do pernoite. Marcos Lisboa argumentou nesta Folha que o critério da taxa natural seria o relevante para a decisão sobre os juros. Trata-se do seguinte: observar como está se comportando o consumo (incluindo o governo) e a capacidade de produção e, na presença de pressões excessivas do primeiro sobre a segunda, juros para cima. Ora, mas se a economia está em depressão profunda, a léguas de distância do seu potencial (o máximo PIB possível dadas a mão de obra, a infraestrutura, a produtividade etc.), esse argumento não para em pé por mais de dois segundos. 26


Isso não anula a necessidade de ajuste fiscal duro, profundo e abrangente. O Estado precisa ganhar músculos e perder peso para financiar mais e melhores políticas públicas. Aliás, só como resultado da redução de 0,25 ponto percentual, o setor público deixará de pagar R$ 6,5 bilhões em juros ao setor privado. Do ponto de vista das empresas, menos dívidas e mais investimentos. O BC tomou a decisão certa, sobretudo diante da perspectiva de equacionamento do buraco das contas públicas com a PEC do teto de gastos. Todavia, é preciso intensificar a redução. Ao realinhar estruturalmente os juros, combateremos a tendência crônica de valorização artificial do real frente ao dólar e, com isso, desintoxicaremos a indústria e teremos a oportunidade de voltar a crescer e a reduzir a pobreza. FELIPE SALTO, economista, mestre em administração pública pela Fundação Getulio Vargas, é coautor do livro "Finanças Públicas: da Contabilidade Criativa ao Resgate da Credibilidade" (Record)

Esquerda delinquente gerou crise Alan Marques/Folhapress

Manifestante é expulso da votação da PEC do Teto

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FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RONALDO CAIADO 22/10/2016 às 02h00 A esquerda, PT à frente, não se cansa de plagiar a si mesma, colocando-se sempre na contramão de qualquer iniciativa que tenha como meta sanear e dar racionalidade à economia. Assim como, no passado, se opôs ao Plano Real e à Lei de Responsabilidade Fiscal –e à própria Constituição de 1988, que não quis assinar–, hoje se opõe à proposta de emenda constitucional (PEC) 241, que estabelece um teto para os gastos públicos. A alegação é que a PEC 241 vai impor cortes em programas sociais, sobretudo em educação e saúde, o que não é verdade. Os cortes começaram bem antes, no próprio governo Dilma Rousseff, pelo simples fato de que não havia, como não há, mais dinheiro. Gastou-se –e muito mal– o que se tinha e o que não se tinha. E foi por essa razão que o atual governo se viu premido a pôr um freio de arrumação nas contas públicas, proposto por essa PEC. Caso não o fizesse, o país caminharia para a insolvência, restando-lhe o calote da dívida (que afastaria de vez os investimentos), o descontrole inflacionário (com emissão sem lastro de moeda para pagar obrigações) ou o aumento de impostos, algo impensável num país que exibe uma das maiores cargas tributárias de todo o planeta. Mas a militância esquerdista omite essa realidade e o que a ocasionou: a tal "nova matriz econômica", insensatez concebida no governo Dilma, que, entre outras trágicas consequências, impôs um corte de R$ 10,2 bilhões na educação e suprimiu 24 mil leitos do SUS. A bagunça desembocou num Orçamento negativo, com um deficit de inéditos R$ 170 bilhões. Sem reconhecer sua responsabilidade na ruína econômica do país, a esquerda tenta difundir a ideia de que tudo não passa de perversidade da "direita", que não se conformaria com as conquistas sociais dos pobres, proporcionadas pelos governos petistas. Bem, essas "conquistas sociais" estão também condensadas em números: 12 milhões de desempregados, milhares de empresas fechadas em todo o país, além de estatais saqueadas, como a Petrobras, e aposentados lesados pela delinquência partidária. A PEC 241 não propõe cortes ou congelamento dos gastos sociais. Limita a correção da despesa primária do governo à inflação do ano anterior. Educação e saúde podem ter seus gastos ajustados até acima da inflação, desde que haja redução em outras rubricas. A isso, se chama estabelecer prioridades. Gestão. Se educação e saúde o são –e o governo Temer assegura que sim–, haverá meios de demonstrá-lo a partir dos procedimentos estabelecidos pela PEC e do manejo orçamentário. Há experiências análogas e bem-sucedidas em países que adotaram o mesmo caminho, como Austrália e Peru, que, a partir de um retorno à aritmética elementar, em que dois mais dois serão sempre quatro, conseguiram recuperar suas economias. Essa PEC não esgota o universo de providências necessárias ao rearranjo da economia nacional. Mas é o primeiro e indispensável passo. 28


A natureza meramente predadora dos protestos oposicionistas se revelou no comportamento que o PT e seus satélites (PSOL, Rede, PCdoB) adotaram nesta semana ao obstruir a votação de duas propostas que injetaram R$ 1,1 bilhão para a educação, sendo mais de R$ 700 milhões para o Fies, medida que beneficiará 2 milhões de estudantes. A mesma esquerda que acusa a PEC 241 de retirar verbas da educação. Como explicar essa contradição? Simples: não se explica. Apenas reconstitui o padrão histórico do PT, que investe no caos para dele emergir como força redentora. Só que o povo, escaldado pela crise e pelos escândalos, não cai mais nessa retórica golpista.

Encontrar o limite entre vigor e arbitrariedade Jason Silva/Agif/Folhapress

O ex-deputado Eduardo Cunha, que foi preso pela Operação Lava Jato, deixa o IML de Curitiba FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, ANDRÉ SINGER 22/10/2016 às 02h00 A prisão do ex-deputado Eduardo Cunha coloca problema difícil para a opinião pública brasileira. Por constituir personagem politicamente nefasto, cujas reiteradas atitudes de escárnio conseguiram a proeza de unificar centro, esquerda e direita contra si, há comemoração pela medida decretada pelo juiz Sergio Moro. De outra parte, o momento em que ela ocorre exige reflexão crítica, sob pena de coonestar o que parece uma escalada autoritária, ainda que sob o disfarce de rigor legal. O farol amarelo 29


foi ligado quando Moro prendeu e soltou o ex-ministro Guido Mantega no espaço de algumas horas um mês atrás. Embora diversos precedentes tenham ocorrido, o episódio do ex-titular da Fazenda, pelo que teve de evidentemente arbitrário, despertou uma consciência mais ampla a respeito do risco que correm os direitos civis fundamentais no país. Não obstante, Moro duplicou a aposta, mandando prender outro ex-ministro da Fazenda do PT, Antonio Palocci, poucos dias antes da eleição municipal. Talvez o histórico de problemas com os quais Palocci se envolveu no passado explique o silêncio que se seguiu à sua detenção. Mas persistiu a percepção de que há autoritarismo em Curitiba. Cito, a propósito, o editorial da última edição de "Veja". Insuspeita de proteger Lula, como certamente se dirá da presente coluna, a revista mostra que Moro gostaria de voltar a uma época em que determinado ponto de vista só podia ser publicado após passar por censura prévia. Para relembrar: em 11/10, o físico Rogério Cerqueira Leite publicou na Folha o artigo "Desvendando Moro", com uma visão negativa do juiz. No dia seguinte, o magistrado afirmava que a publicação de opiniões como a do conhecido professor "deveriam ser evitadas". Reparem: ele não queria o direito de discutir a análise do cientista, mas sim alertar o jornal para não voltar a editar manifestações como aquela. Ao decretar a prisão preventiva de Cunha, Moro, cujo timing de ações é pautado, entre outros motivos, pela política e pela relação com a mídia, voltou a ganhar apoio que periclitava. O editorial da Folha a respeito evitou entrar na discussão sobre se havia necessidade técnica de prender o ex-presidente da Câmara. Já "O Globo" apoiou abertamente a decisão. Moro sabe o que está em jogo. Afirma que "ninguém está propondo uma espécie de solução autoritária", mas sim uma "aplicação vigorosa da lei", devido ao quadro de "corrupção sistêmica" existente no Brasil. Encontrar o limite que separa arbitrariedade de aplicação vigorosa da lei é decisivo para manter o Estado de Direito. Oxalá a opinião pública consiga fazê-lo e, assim, preservar a liberdade que custou tanto construir.

PEC do Teto abre portas para muitas reformas, como a da Previdência

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Deputados da base do governo Temer comemoram a aprovação da PEC do teto dos gastos FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, PEDRO LUIZ PASSOS 21/10/2016 às 02h00 Os resultados da emenda constitucional conhecida por PEC do Teto deverão ser muito maiores que somente uma dura reforma fiscal. Ela amarra o crescimento dos gastos federais à inflação do ano anterior por pelo menos uma década. E não apenas os gastos do governo, mas também os do Judiciário e os do Congresso. Aprovada com folga na primeira de duas votações da Câmara (e haverá mais duas no Senado), o "novo regime fiscal", como o governo chama a PEC, traz o efeito de uma catarse inédita para a administração pública no país, ao induzir uma penca de reformas, começando pela da previdência privada e pública. As consequências apareceram antes mesmo da aprovação final. O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, por exemplo, pediu à Câmara dos Deputados a retirada de pauta de 32 projetos que criariam cem novas varas e abririam vagas para mais 200 juízes e 8.000 servidores a um custo de R$ 1 bilhão por ano. Desconhece-se tal desprendimento no setor público até onde a memória alcança. Já foi resultado da PEC do Teto. Segundo o presidente do TST, "o Estado brasileiro hoje está quebrado". A multiplicação da Justiça do Trabalho dificilmente seria aprovada com "o novo regime fiscal". Objetivo, o ministro pediu ao Congresso acesso aos rendimentos dos depósitos judiciais de processos trabalhistas como contrapartida. Demonstrações de altruísmo com os dinheiros sociais são raríssimas no setor público brasileiro. Mas esse talvez seja o maior efeito da indexação dos gastos fiscais à inflação – acordar os governantes e a burocracia para a impossibilidade de o orçamento público crescer à média anual de 6% reais, como observado nos últimos 25 anos. Não há mais de onde tirar, com a sociedade submetida a uma carga tributária de país europeu e pagando juros de insolvente, além de estar permanentemente enredada pela inflação, sem ter como compensação serviços públicos eficientes. Pode ser que decisões como a do presidente do TST se tornem comuns quanto mais os efeitos da PEC do Teto escancarem a porta do armário que oculta há anos distorções e deformidades na relação entre o Estado supostamente filantrópico e a sociedade. Não combinam, por exemplo, a suntuosidade dos palácios dos tribunais em Brasília, o número de funcionários e o custo do sistema de Justiça com o resultado extremamente moroso dos julgamentos. O Brasil ocupa a incômoda liderança mundial em despesas com sistema judiciário, como revela o estudo "O Custo da Justiça no Brasil", do professor Luciano Da Ros. O país gasta o equivalente a 1,3% do PIB com o Poder Judiciário, bem acima de economias avançadas, como os Estados Unidos (0,14%) e a Itália (0,19%), e de emergentes, a exemplo do Chile e da Colômbia, ambos situados na faixa levemente superior a 0,2%.

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Leis escritas com maior clareza serviriam melhor à sociedade que um Judiciário enorme e um vasto mercado de serviços jurídicos. Tome-se a área trabalhista. São milhões de ações anuais e milhares em países com população e economia maiores, como EUA e Índia. Isso não é normal, assim como é absurdo, na área tributária, o emaranhado de normas causadoras de litígios. Esse custo cresce desgovernado, como mostra o salto da dívida pública bruta de 51,7% do PIB em 2013, ou R$ 2,7 trilhões, a previstos 73% neste ano, R$ 4,5 trilhões. O deficit incluindo juros quase quintuplicou desde 2012: 10,4% do PIB em 2015. A isso se adicionaram subsídios de juros bancados com dívida pública e desonerações mal concebidas, como dos encargos previdenciários. A PEC do Teto é o tratamento de choque contra tanta insensatez. Se dermos chance para emergir um país de empreendedores, o teto de que se fala será piso, tamanho o potencial de transformações que estão à vista.

Como garantir verbas à saúde? Resposta da equipe econômica à pergunta do economista José Luis Oreiro, da UFRJ, sobre a PEC do Teto Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Alexa Salomão 22 Outubro 2016 às 18h30 Foto: Divulgação

Economista José Roberto Oreiro José Luis Oreiro, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): “A população brasileira cresce a uma taxa de 0,8% ao ano. Fazendo uma conta bem grosseira, significa que, em 10 anos, seriam 20 milhões a mais de brasileiros. Por mais que se corrijam as 32


ineficiências na gestão da saúde e da educação, não é plausível acreditar que, fazendo um congelamento dos gastos dessas áreas, em termos reais, será possível acompanhar o aumento da demanda, principalmente em relação à Saúde. Os gastos per capita vão cair. Eu defendo a seguinte regra: ajustar os gastos primários dessas áreas pela inflação do ano anterior mais o crescimento da população para, pelo menos, manter os gastos em termos per capita, ou seja, por habitante, constantes ao longo do tempo”. Resposta da equipe econômica: Em primeiro lugar, é preciso separar saúde de educação. A transição demográfica e o envelhecimento da população exigirão menos recursos para a educação (pois haverá menos jovens estudantes) e mais recursos para a saúde. No mais, o crescimento, de acordo com projeção da população do IBGE, será decrescente nos próximos dez anos, não chegando a 20 milhões - em 2016, segundo o IBGE, seremos 206 milhões. Em 2026, a estimativa é chegar a 219 milhões de pessoas, um crescimento de 13 milhões. Em 2016, estima-se que o Brasil tenha uma população de 49 milhões de jovens entre 5 e 19 anos. As pessoas nessa faixa etária, segundo o IBGE, serão 43,6 milhões em 2026. Ou seja, nos próximos dez anos, a população jovem será reduzida em quase 6 milhões de pessoas. Isso significa menor pressão por gasto na educação básica, que poderá ser alocado em outras áreas como saúde. A saúde será beneficiada tanto pelo aumento do piso mínimo constitucional já em 2017 em quase R$ 10 bilhões com a PEC 241. Além disso, a reforma da Previdência abrirá espaço no orçamento para outras despesas, principalmente, despesas com saúde. A Constituição já garante o piso mínimo para os gastos em saúde. A PEC 241 mantém, amplia e corrige esse mínimo pela inflação. O montante total a ser gasto em saúde, acima desse piso, deve ser definido ao longo do processo orçamentário, sempre submetido à restrição orçamentária geral existente. É preciso lembrar, ainda, que saúde e educação não são apenas aqueles bancados pelo setor público. Na saúde, por exemplo, 57% do gasto total das famílias é com a provisão privada de serviços de saúde. É fundamental ter um setor público equilibrado para permitir a recuperação da economia e reduzir a pressão sobre a provisão de serviços públicos.

Não é necessário incluir a questão dos juros? Leia a resposta da equipe econômica à pergunta da economista Mônica de Bolle, sobre a PEC do Teto 22 Outubro 2016 às 18h30

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Foto: Leo Aversa

Mônica de Bolle, economista Mônica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics, em Washington: "Eu entendo que neste momento o foco seja corrigir o enorme desajuste do resultado primário (grosso modo, como o governo gasta o que arrecada). Mas não entendo por que uma PEC que traz mudanças para 20 anos – espaço de tempo em que a inflação e os juros, se pretende, vão cair – não prevê em nenhum momento que esse instrumento evolua para conter a despesa nominal como um todo (o resultado nominal aborda o primário e também o resultado financeiro do governo, o que inclui despesas com os juros da dívida). Precisa ser assim se a gente almeja ser prudente. A maioria dos países que tem regras fiscais usa despesa nominal como referência. A zona do euro, por exemplo, tem teto de despesa nominal”. Resposta da equipe econômica: 34


Limitar o déficit nominal significa aceitar a possibilidade de não pagar os juros devidos sobre a dívida quando tal pagamento representar descumprimento do limite. Essa possibilidade representaria uma quebra de contrato, um default, com consequências sobre a credibilidade e a capacidade de financiamento do País e de suas empresas. As consequências seriam a aceleração da inflação, o aumento dos juros (países com histórico de default têm taxas de juros mais altas), a redução do investimento das empresas e a redução no crescimento da economia. Assim, o melhor caminho para chegarmos a juros mais baixos é iniciar com o reequilíbrio das contas primárias (receita e despesa não financeira do Tesouro). Se for possível conter o déficit primário, os juros cobrados por aqueles que emprestam ao Tesouro Nacional cairão por dois motivos: 1) o Tesouro precisará absorver uma parcela menor da poupança nacional; 2) aqueles que emprestam ao Tesouro vão requerer menor prêmio de risco. Assim, a queda da despesa financeira e do déficit nominal será a consequência natural do aumento do resultado primário, como ocorreu de 1999 a 2008, quando o Brasil teve superávits primários entre 3% e 4% do PIB. Em países com inflação elevada, como é o caso do Brasil, não faz sentido ter meta para pagamento de juros. Outro caminho importante para ajudar na redução da dívida púbica bruta é o retorno antecipado dos empréstimos feitos ao BNDES, que somarão R$ 100 bilhões até 2018. A redução do estoque da dívida diminui o montante total pago em juros.

Governar será o próximo teste Orçamento e PEC 241 são a receita do bolo. Falta ver se o governo saberá cozinhar Fonte Rolf Kuntz, Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 04h00 Governar será o próximo desafio para o presidente Michel Temer e seus ministros, se o Congresso trabalhar direitinho, sem muitos truques, e aprovar para o próximo ano um Orçamento parecido com aquele proposto pelo Executivo, com despesa corrigida apenas pela inflação e déficit primário, isto é, sem juros, de até R$ 139 bilhões. A primeira condição para a mudança fiscal, a aprovação do limite para o aumento de gastos, vem sendo cumprida. A Proposta de Emenda Constitucional 241, a PEC do Teto, passou pela primeira votação na Câmara. A segunda deve ocorrer em poucos dias. Se der tudo certo, o assunto estará resolvido no Senado antes do fim do ano. É um cenário positivo, mas ainda é preciso algum otimismo para imaginar uma tramitação normal da proposta de lei orçamentária, sem mágicas e sem distorções. Será complicado, já se sabe, acomodar as despesas no limite previsto. Cortes serão necessários para compensar um espaço maior para saúde. O truque de aumentar a previsão de receita, usado habitualmente pelos parlamentares há muitos anos, está fora da pauta. Nem teria sentido, porque a restrição, agora, está no lado da despesa. E se o governo gastar, neste fim de ano, mais que o previsto na última revisão das contas? Nesse caso, a base de cálculo será aumentada. A ideia já circulou no Parlamento. A receita de impostos e multas da repatriação de recursos – há quem fale em R$ 80 bilhões – poderia, quem sabe, permitir um dispêndio maior em novembro e dezembro. Se a correção for feita sobre essa base, a programação para 2017 poderá ser menos severa, com uma folga um pouco maior para emendas apresentadas por deputados e senadores. Mas o governo, segundo também se especula, poderá aproveitar aquele dinheiro extra para uma limpeza mais ampla de restos a pagar. É difícil imaginar uma escolha mais prudente que essa. De toda forma, dois pontos parecem claros. Primeiro, a seriedade fiscal continua longe de ser uma obsessão dos políticos brasileiros, ou da maior parte deles. Segundo, usar qualquer 35


despesa extra para ampliar a base de cálculo será uma irresponsabilidade, se essa despesa tiver sido coberta por uma receita excepcional. A mera consideração dessa hipótese, noticiada nos últimos dias, deveria bastar para mostrar a distância entre os velhos costumes, ainda muito vivos, e as propostas de maior responsabilidade na administração das finanças oficiais. Se o Orçamento sair de acordo com o melhor figurino, os maiores problemas de 2017 ainda nem terão começado. Para manter no limite de R$ 139 bilhões o déficit primário do governo central, será preciso garantir a receita de R$ 1,41 trilhão, ou 20,66% do PIB projetado para o ano. Controlar as despesas será fundamental, é claro, mas a contenção será complicada. O resultado final dependerá provavelmente mais da arrecadação que do freio nos gastos. Nada garante a receita projetada. O governo estima para o próximo ano um crescimento econômico de 1,60%, depois de uma contração de 3% em 2016. Os números são muito parecidos com aqueles coletados entre instituições financeiras e consultorias na pesquisa Focus, do Banco Central (BC). As medianas das projeções apontavam recuo de 3,19% neste ano e expansão de 1,30% no próximo. Bem menos otimistas, os técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI) calculam para 2017 um crescimento de 0,5%. Esse resultado, em todo caso, é melhor que a estimativa anterior, divulgada em julho, de expansão zero. Mesmo um crescimento modesto, de apenas 1,60%, dependerá de um impulso inicial difícil de prever neste momento. Nos três meses terminados em agosto o Brasil abrigou 12 milhões de desempregados e, além disso, mais de 4 milhões de pessoas subocupadas, isto é, com trabalho considerado insuficiente. Qualquer melhora do consumo será quase certamente muito limitada, nos primeiros tempos. A exportação poderá dar alguma ajuda, mas com certeza limitada, porque a indústria continua com baixo poder de competição. O investimento industrial deverá continuar deprimido, porque o setor opera com um terço de capacidade ociosa. O governo terá dois motivos muito fortes, nesse quadro, para negociar concessões na infraestrutura e na exploração de petróleo e gás. O primeiro, e mais óbvio, será o interesse em movimentar grandes investimentos em áreas de utilidade pública. Pelo tamanho, esses empreendimentos poderão criar empregos e movimentar negócios em vários setores – material de construção e máquinas, por exemplo. O segundo motivo será de ordem fiscal. A proposta de Orçamento inclui uma previsão de R$ 24 bilhões de receita proveniente dessas licitações. Não se pode, é claro, descartar a hipótese de uma história diferente, com o estímulo inicial derivado em boa parte de uma inesperada reativação do consumo. Vários fatores poderão combinar-se, mas, a julgar pelos dados hoje disponíveis, o empurrão mais importante dependerá da atração de capitais para a infraestrutura. Para isso o governo terá de provar, na condução dessa política, um realismo e uma competência quase nunca exibidos pela administração anterior. Se essas qualidades serão mostradas de fato pelo presidente e por sua equipe ministerial só se saberá nos próximos meses. Se o ajuste avançar e as pressões inflacionárias cederem de fato, o BC poderá continuar cortando os juros e criando condições de crédito mais favoráveis à retomada. Os bons efeitos serão passageiros, no entanto, assim como a confiança na autoridade monetária, se o afrouxamento da política depender do voluntarismo. Mas o desafio de governar deverá ir muito além da gestão fiscal do próximo ano e da reativação inicial da economia. Será preciso muito empenho para racionalizar a gestão e tornála eficiente. Os maiores obstáculos serão políticos.

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Bob Dylan e a Constituição brasileira Que os civilizados e pinaculares princípios de humanidade orientem as medidas contra a crise Fonte Carlos Ayres Britto, Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 04h00 Justa é a concessão do Prêmio Nobel de Literatura a Bob Dylan. Isso a partir da fidedignidade da decisão ao significado mesmo do termo “literatura”. Que traduz a arte de se expressar por letras ou signos linguísticos. Equivale a dizer: literatura e arte de se exprimir por letras de um dado vernáculo mantêm entre si uma relação necessária. Relação de olho e pálpebra ou de tímpano e audição. É só consultar “O Aurélio” para ver que literato é sinônimo de escritor. De homem de letras. De pessoa que faz da sua língua-pátria um veículo de comunicação intersubjetiva tão facilitada quanto clara e sedutora. Atraente. Que não é senão um modo estético-original de se comunicar. Ora, Bob Dylan costuma fazer as letras de suas próprias canções. É um letrista, portanto. Alguém reconhecidamente identificado com um tipo vocabular de comunicação que é meio de vida e razão de viver. O ar profissional, consciencial e ainda espiritual que ele respira. Por isso que letrista inatamente afeiçoado ao ritmo, à pulsão, à plasticidade, às pausas, à sonoridade, aos links e possibilidades semânticas dos termos e fraseados que adiciona à sua comunicação propriamente melódica. Fazendo-o por um modo inovadoramente poético. Poético na forma e de um conteúdo otimizadamente conciliador de emoções e ideias. Emoções tão profundas quanto abertas, ideias tão arejadas quanto corajosas, pois somente assim, pela mais entranhada simbiose entre quociente emocional (QE) e quociente intelectual (QI), é que letra de música se pode elevar à dimensão da poesia. À arte da poesia, que passa a se colocar a serviço da arte da música. Ou vice-versa: a arte da música a se colocar a serviço da arte da poesia, quando a letra que se faz poema vem antes da composição musical. Não se esgota, porém, nessa opinião do justo prêmio o ato da Academia Sueca. Ele também resgata o correto juízo de que literatura e poesia não são como água e óleo. São, isso sim, gênero e espécie, respectivamente. Continente e conteúdo, se se prefere dizer. A literatura a abarcar a poesia, então, assim como abarca o romance, o conto e a crônica, pouco importando se os respectivos conteúdos sejam obra de realidade ou de ficção. Ou de ficção e realidade, mescladamente. Tanto quanto é possível categorizar como literatura toda empreitada biográfica. Apenas com a peculiaridade de que as obras de cunho biográfico ainda ocupam o espaço das pesquisas e descrições historiográficas. Já no que toca aos artigos, reportagens e editoriais jornalísticos, bem, é do meu pensar constituírem eles uma realidade à parte. A realidade em si do jornalismo, tão distinta da literatura quanto diferentes são os escritos dos teóricos e dos profissionais do Direito. Cada qual dessas duas categorias com o seu preciso e elegante estilo redacional. Sigo em frente, agora para dizer que todo poeta verdadeiro, assim como todo artista de fato, substitui a memória pela imaginação (“Imaginação é a memória que enlouqueceu”, pontuou Mário Quintana). Faz a intuição ou percepção instantânea das coisas anteceder toda reflexão. Compreende primeiro e só depois é que busca entender. Autoconhece-se, antes de conhecer. Quase sempre chega às grandes sínteses sem precisar de nenhuma análise. Pega as coisas no ar, e não no tranco. Labora muito mais no campo da formação do que da informação. Além de personalizar tudo; isto é, o artista não coisifica ninguém e ainda personaliza as coisas. Por isso que humanista. Com esta superlativa diferença quanto aos poetas: eles personalizam até as palavras. Como ninguém o faz. Sabem que o sangue da vida também flui pelas veias de cada vocábulo. E pelos personalizados vocábulos é que mais recebem da Existência recados estalando de novo. O desconhecido a ter gosto em visitá-los, feito condecoração por intuírem e praticarem a máxima de que as palavras 37


são dados elementares do ser humano. Fazem parte da compostura neural do Homo sapiens. Acessam-no sem que ele, ser afetivo-racional e ainda anímico, precise fazer nada diferente daquela postura existencial da mais entranhada combinação entre QE e QI, nessa ordem (“Primeiro, estranha-se; depois, entranha-se”, na exata percepção de Fernando Pessoa). Novo passo adiante: é por efeito desse estado de alumbramento (Bandeira) com a silhueta e a aura de cada vocábulo que letristas-poetas como Bob Dylan combinam por um modo tão intenso e harmonioso emoção e razão, que frequentemente saltam para o topo da sua consciência. Ali onde a Vida coreografa a dança da sua própria unidade, diria a poeta Elvira de Macedo Nascimento. Ali onde Cecília Meirelles foi buscar inspiração para homenagear a língua luso-brasileira com estes versos (cito de memória): “Ai, palavras, ai palavras, que estranha potência a vossa! Todo o sentido da Vida começa à vossa porta”. Ali onde Hegel proclamou que “a poesia é a arte da palavra”, na linha do que muito depois, porém com o mesmo acerto, sentenciou Manoel de Barros: “Só a poesia salva a palavra da esclerose”. Que esse justo prêmio ao humanista Bob Dylan contribua para a sedimentação do juízo técnico de que também humanista é a Constituição brasileira. Por isso é que faz dos direitos sociais a necessária ponte entre o Constitucionalismo Liberal e o Constitucionalismo Fraternal. Assim está no inciso I do seu artigo 3.º, tanto quanto nestes precisos enunciados: o do artigo 170, cabeça, que imprime à nossa ordem econômica o fim de “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”; e o do artigo 193, que põe “o primado do trabalho” como base de toda a ordem social brasileira, também a ter por explícitos objetivos “o bemestar e a justiça sociais”. Se ainda é certo (e é) que a Constituição governa quem governa, o que se espera é que tais civilizados e pinaculares princípios não deixem de orientar a discussão das medidas legislativas de enfrentamento da atual crise econômica do País.

Juro começa a cair, devagar Marcos Santos/USP Imagens

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O Banco Central reduziu a taxa básica de juros de 14,5% ao ano para 14% FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, SAMUEL PESSÔA 23/10/2016 às 02h00 O Banco Central reduziu a taxa básica de juros, Selic, de 14,25% ao ano, nível que perdurava desde julho de 2015, para 14%. Redução mínima de 0,25 ponto percentual. A última vez que houve queda da taxa básica foi em outubro de 2012, há quatro anos. Nesses quatro anos em que o BC foi obrigado a realizar esse longo ciclo de aumento de juro, a inflação média foi de 7,5% ao ano, três pontos percentuais acima da meta inflacionária. De 2007 até 2014, a inflação acumulada de administrados foi de 30% aproximadamente, ante inflação de preços livres de mais de 60%. Houve forte controle dos preços da gasolina e de tarifas no período. Ou seja, boa parcela da inflação que tivemos nos últimos dois anos foi devolução dos preços administrados que estiveram artificialmente contidos por causa de equívoco de política econômica. É comum a heterodoxia criticar a política monetária de juros elevados, uma vez que em boa medida a inflação é de bens administrados: a recomposição das tarifas no ano passado produziu inflação de 18%, o que explica 4,5 pontos percentuais da inflação de 10,7% de 2015. Evidentemente, os técnicos do BC não são tão limitados quanto sugerem os heterodoxos. Eles sabem que não se combate choque de oferta com elevação dos juros. Mas eles sabem que se combate com elevação dos juros os efeitos secundários do choque de oferta. O que é isso? Suponha que haja recomposição das tarifas que eleve a inflação do ano em 4,5 pontos percentuais. Este aumento da carestia será repassado para os demais preços. Se não houver um combate duro e direto ao repasse, a inflação ganhará dinâmica própria, a inércia aumentará e a inflação se estabilizará em um novo patamar. Ao longo do final dos anos 70 e da primeira metade dos anos 80, esse fenômeno ocorreu a cada desvalorização do câmbio: a inflação sempre se estabilizava, em seguida à desvalorização, em um patamar superior ao precedente. É exatamente pela facilidade com que a inflação adquire inércia que não se pode brincar com o dragão. E é exatamente por esse motivo "que uma inflaçãozinha de 15% ao ano", como defendia uma ministra da Casa Civil da década passada, faz muito mal para a economia, para a sociedade e principalmente para os mais pobres. Há sinais de que a inflação vem cedendo. No entanto, como apontou o comunicado do Banco Central, há sinais também de que a desinflação de serviços, que vinha bem até junho, arrefeceu no terceiro trimestre. Trimestre horroroso para a economia: a recuperação da atividade rateia e a desinflação de serviços arrefece. Assim, frente a todos os riscos de surgir forte resistência dos serviços, penso que o Banco Central continuará com atitude mais cautelosa até o primeiro trimestre de 2017, quando teremos melhor noção da extensão do processo de desinflação dos serviços.

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O passado recente nos ensinou mais uma vez que o experimento tentado a partir de meados de 2011, de baixar a taxa básica de juros na marra, sob a hipótese de que o juro elevado representa equilíbrio ruim e conspiração da Faria Lima com o Leblon, não se sustenta. Os juros básicos de nossa economia são muito elevados porque nos últimos 20 anos a taxa de crescimento do gasto primário do setor público foi o dobro da taxa de crescimento do PIB real. Resultado da baixíssima capacidade de poupança pública, o que pressiona os recursos e, portanto, a inflação.

Elites acham que plano Temer sobrevive, apesar de crise política e policial FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, VINICIUS TORRES FREIRE 23/10/2016 às 02h00 Interessados na sobrevida de Michel Temer e de seu programa econômico parecem resignados quanto às durezas do caminho até 2018, mas crentes no sucesso relativo do governo. Não haveria o que fazer quanto ao corte de cabeça na crise político-policial, não haveria alternativa aceitável às "reformas" ou tempo para encaminhar troca de presidente. Haverá conflitos na Praça dos Três Poderes, prisões e denúncias que transformarão líderes políticos em zumbis, mas há crença em uma fuga para a frente inevitável: não há alternativa. Esse resumo da opereta não resulta de uma enquete. É o que se depreende de algumas conversas no Congresso e Planalto, com porta-vozes do dinheiro e palpites de consultorias políticas e econômicas. O presidente não pode renunciar ao único apoio social forte que tem, empresários e outros donos do dinheiro. Essa elite fez questão de demonstrar estima e consideração pelo plano Temer naquele manifesto publicitário pela aprovação do "teto". Essa comunhão reformista improvisada não vê alternativa a não ser apoiar e cobrar Temer nessa "janela de oportunidade que iria até o final de 2017: por um ajuste duro, sem impostos, que garanta "teto" e reforma da Previdência. Seria o modo de dar estabilidade econômica mínima ao país, uma plataforma de onde poderiam saltar candidaturas reformistas mais autênticas em 2018. Essa comunhão acabaria por amarrar PMBD e PSDB. É um resumo precário de opiniões talvez envelhecidas pelos acontecimentos da semana que passou. Quanto à economia, ficou ainda mais claro que faltam pernas no plano Temer, que não tem meios no curto prazo de reavivar a atividade, motivo de tensão social para 2017. Quanto à política-politiqueira, o caldo turvou uma semana depois da maciça vitória de Temer na votação do "teto". Nem se tratou de Eduardo Cunha, ainda, rolo para 2017. Renan Calheiros pisou no primeiro degrau do cadafalso, dadas a batida no Senado e delações. As acusações vêm da Transpetro, a mesma zona da Lava Jato que abateu o senador Romero Jucá do ministério. Nem começou a escorrer o veneno da Odebrecht. 40


Calheiros e Jucá são das figuras mais capazes da articulação política. Feridos, podem ser um problema para Temer na organização parlamentar, entre outras costuras. Mas faz tempo os dois "fogem para frente", "vida que segue", como aliás tanta gente no Congresso. Não agem como Cunha. De resto, delações podem ser desmoralizantes, quase fatais, mas a conclusão de processos leva anos. Conflitos previstos ainda não se configuraram de modo explosivo, se é que vão sê-lo, tais como as divisões do governismo na disputa pelas presidências de Câmara e Senado. A reforma política que a cúpula do Congresso quer tocar a partir de novembro pode ser um complicador. Partidos menores começam a se insurgir contra o enxugamento de legendas; se queixam muito de que Temer "paga pouco" pelos votos. Pode haver mais ruído, como revides de Calheiros contra o ministro da Justiça e tentativa de aprovar a reforma da Lei de Abuso da Autoridade, tida por juízes e procuradores como ameaça a sua independência e à Lava Jato. Mas, aos trancos e barrancos, a comunhão pró-Temer acha que chega até 2018. "Não há alternativa". Dizem.

Uma questão de sustentabilidade FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, ANA PAULA VESCOVI 23/10/2016 às 02h00 Um acordo para o clima foi aprovado em Paris, no final do ano passado, com o objetivo de coordenar a redução das emissões de gases de efeito estufa. O documento foi assinado por 195 países. O compromisso, que busca limitar até a metade do século o aumento da temperatura, representa uma renúncia dos interesses específicos para a preservação de um bem maior, a sustentabilidade ambiental. Sem coordenação ou regras claras, cada país seguiria atuando de acordo com seus interesses, ampliando o aquecimento global e os riscos para as próximas gerações. Essa situação apresenta similaridades com o problema fiscal, causa central da crise econômica no Brasil. Os gastos públicos federais vêm crescendo 6% ao ano acima da inflação nos últimos 25 anos, exigindo a criação de mais impostos. Recentemente, novos programas apoiados em subsídios foram criados sem consistência temporal, alcançando a média anual de R$ 63 bilhões nos últimos quatro anos e comprometendo as contas futuras. O desequilíbrio se acentuou nos últimos três anos, fazendo a dívida pública saltar de 52% em 2013 para 72% do PIB em 2016. Poderá ultrapassar 100% em cinco anos. Desde 2014, quando ficou clara a perda de credibilidade na política fiscal e cresceram dúvidas sobre a sustentabilidade da dívida, o Brasil não perdeu apenas o grau de investimento como também 2,2 milhões de empregos formais.

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Com queda de 9% da renda per capita em dois anos, o momento é singular e nos impõe escolhas. A PEC 241 foi proposta pelo governo como medida para limitar a expansão dos gastos públicos federais por 20 anos. Nos primeiros dez, as despesas são limitados à inflação do ano anterior (IPCA). Nos dez subsequentes, abre-se uma revisão a cada período de gestão. A PEC dos gastos também procura estabelecer compromisso futuro. Propõe ajuste gradual e nova disciplina, sem cortes bruscos e descontinuidades, mas capaz de evitar que a dívida pública se torne impagável. Saúde e educação terão tratamento especial, com a fixação de um limite mínimo, em vez de teto. No caso da saúde, os pisos previstos para 2020 já valerão em 2017, trazendo R$ 10 bilhões de recursos adicionais. Na educação, 80% dos recursos não ficarão sujeitos a limite. Em alguns anos, as despesas em proporção do PIB poderão voltar ao patamar de 2008, e o atual deficit primário de 2,7% do PIB se reverterá em superavit próximo a 3%. Isso contribuirá para a estabilização da dívida bruta sobre PIB. Num segundo período, poderemos reduzi-la a patamares prudentes. Assim, antecipamos para o presente ganhos de confiança, da redução da inflação e das taxas de juros. A PEC dos gastos acarretará Orçamentos mais realistas, expondo para sociedade os dilemas de escolhas a serem tomadas. Atualmente, apenas 16% do Orçamento federal é gasto com os 45% mais pobres. Os 84% restantes são direcionados aos 55% mais ricos, o que reflete a atuação de grupos organizados de pressão, vários deles contra a aprovação da PEC 241. Com uma evolução previsível para os gastos e sem a pressão permanente por mais impostos, cria-se ambiente favorável para a modernização do sistema tributário. É fundamental buscar mais equidade e mais eficiência arrecadatória, mas sem esquecer que a focalização dos gastos públicos é, pela evidência, o fator mais impactante para a redução da desigualdade. Enfim, o controle do gasto é necessário para que o país saia da crise e volte a crescer. O outro caminho já conhecemos: dívida pública impagável, inflação descontrolada, baixo crescimento, elevados desemprego e desigualdade. Torna-se inadiável, nesse momento singular do país, que os interesses corporativos deem lugar a um bem maior a todos, o compromisso com a sustentabilidade fiscal. ANA PAULA VESCOVI, mestre em economia do setor público pela UnB (Universidade de Brasília), é secretária do Tesouro Nacional. Foi secretária da Fazenda do Estado do Espírito Santo (governo Paulo Hartung)

A janela não responde pela paisagem FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, PIERRE MANIGAULT 23/10/2016 às 02h00 O ambiente de polarização política e a crise econômica, associados à Operação Lava Jato, colocaram a mídia brasileira como alvo daqueles a quem a cobertura dos fatos incomoda.

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Nada escapa. Emissoras de TV, rádios, os principais jornais e revistas e os grandes portais de internet são objeto de críticas diárias, responsabilizados pelos destinos de políticos e empresários que têm sido cobrados pelas instituições republicanas a dar explicações de seus atos. O fenômeno não é novo e, infelizmente, nem inédito na América Latina. Em décadas passadas, regimes ditatoriais censuravam e perseguiam a imprensa na região; hoje, uma parte dos líderes latino-americanos demonstra seu desejo de intimidar e controlar a mídia independente. Na Argentina, a Lei de Meios foi criada pelo governo de Cristina Kirchner para calar o "Clarín", um dos maiores grupos de mídia do continente, obrigando-o a vender parte de seus ativos. Na Venezuela, a ação dos governos de Chávez e Maduro está provocando feridas profundas: em 2015, quase 300 casos de violação contra a liberdade de imprensa foram reportados pela ONG EP (Espaço Público) no país. No Brasil, as críticas contra os meios de comunicação têm como origem aqueles que são eternamente inconformados com o livre exercício do jornalismo profissional e, mais recentemente, não concordaram com o impeachment de Dilma Rousseff, as prisões de exministros petistas e as decisões do Ministério Público e do Poder Judiciário. Ao noticiar amplamente esses fatos, a mídia é demonizada, apontada como participante de um processo golpista. É uma postura de intolerância, que não aceita o contraditório e não reconhece a pluralidade assegurada pela plena democracia. Ao desqualificar o jornalismo profissional, desqualifica toda a cobertura que se pretende isenta, além da própria Constituição brasileira, que prevê liberdade de expressão. A mídia brasileira, porém, está muito bem acompanhada nesse processo de depreciação. A narrativa do golpe ataca a todos e coloca os jornalistas lado a lado com importantes instituições: Procuradoria-Geral da República, Polícia Federal, Ministério Público e todas as instâncias do Poder Judiciário, das primeiras ao Supremo Tribunal Federal. Todas são fustigadas em diversas situações. Se há denúncias, pedidos de abertura de inquérito e investigações que partem das instituições republicanas, a culpa, para eles, é da "mídia golpista". Não importa que a abertura de inquérito seja notícia importante, que deve receber grande atenção; a simples exposição dos fatos é uma "atitude golpista". São incansáveis em atribuir às janelas a culpa pela paisagem. A mídia também erra. Mas há mecanismos previstos na legislação brasileira que protegem cidadãos ou organizações que se sentirem lesados ou vítimas de equívocos. Os erros são uma exceção no meio de tantos acertos, principalmente em uma imprensa que aprendeu, ao combater os regimes ditatoriais brasileiros, que o maior erro é ser submisso aos desejos de quem está no poder, seja quem for. Os líderes políticos brasileiros precisam entender que o problema deles não está na mídia. O problema real está nos fatos em si, que, se não existissem, não seriam reportados pela 43


imprensa. Notícia, como disse William Hearst, é algo que alguém não quer ver publicado; o resto é publicidade. PIERRE MANIGAULT é presidente jornal norte-americano "The Post and Courier". Foi presidente da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) de 5 de outubro de 2015 a 17 de outubro de 2016

De novo a Belíndia FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RICARDO ANTUNES 24/10/2016 às 02h00 O governo Michel Temer avança celeremente para o abismo social. Talvez tenha ficado impactado, em sua recente viagem à Índia, ao constatar que aquele espetacular país tem um bolsão monumental (dezenas, talvez centenas de milhões) de excluídos do mercado de trabalho. Lembro-me que em outubro de 2014, quando visitei a Índia para fazer conferência em Nova Déli, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, acabava de lançar um "novo" slogan. Dizia que, assim como a China celebrizou-se pelo made in China, a Índia deveria consagrar-se pelo make in Índia. No país das castas e classes, riquezas e vilipêndios, a superexploração do trabalho poderia ser ainda mais intensa que a chinesa. Temer não pôde ver com os próprios olhos, poucas semanas antes de sua viagem, a greve que foi considerada a maior do país, com mais de 180 milhões de participantes. No Brasil, o ministro do Trabalho, anteriormente, sugeriu que deveríamos aumentar a jornada de trabalho para 12 horas diárias. O desemprego, por aqui, não para de crescer -são quase 12 milhões de pessoas e outras tantas entre o subemprego e o desalento. O eixo central das ações de Temer nas relações de trabalho é implantar a flexibilização completa dos direitos. O sentido essencial do PLC 30/2015 é avançar na terceirização total, por meio da eliminação da disjuntiva entre atividade-meio e atividade-fim. O governo age alegando que está, na verdade, regulamentando o trabalho terceirizado. Todos sabem o real significado desse ato -a deterioração ainda maior das relações de trabalho, uma vez que os terceirizados receberão menos, trabalharão mais e terão ainda maior subtração de direitos. Enquanto isso, as empresas contratadas que fornecem os terceirizados poderão continuar fugindo das penalidades por meio de burlas que frequentemente praticam e pelas quais raramente são condenadas. Vou dar um exemplo emblemático que parece excitar o empresariado, global e tropical. Tratase do "zero hour contract" (contrato de zero hora), modalidade perversa de trabalho que viceja no Reino Unido e em outros cantos, onde os contratos não têm determinação de horas. Trabalhadores das mais diversas atividades ficam à disposição e, quando recebem uma solicitação, ganham estritamente pelo que fizeram. Nada recebem pelo tempo que ficam à 44


espera da nova dádiva. E os capitais informáticos, numa engenhosa forma de escravidão digital, cada vez mais se utilizam dessa pragmática de flexibilização total. Assim, de um lado deve existir a disponibilidade perpétua para o labor, facilitada pela expansão do trabalho on-line. De outro, propaga-se a precariedade total, que destrói ainda mais os direitos vigentes. É por isso que, neste mundo do trabalho digital e flexível, o dicionário empresarial não para de "inovar". "Pejotização" em todas as profissões -médicos, advogados, professores, bancários, eletricistas, cuidadoras. "Frila fixos" espalhados nas Redações dos jornais, com "metas" impostas que geram assédios, adoecimentos e depressões. Isso sem falar nos pilotos da aviação global que já são contratados nos países em que a legislação está em processo de desmonte. E "trabalho voluntário" em ritmo compulsório na Olimpíada, que enriquece ainda mais as corporações do entretenimento. Em breve teremos um Brasil com riqueza exuberante no topo, parecido com a Bélgica, e uma miserabilidade social que segue os padrões da Índia. Seremos novamente a Belíndia. RICARDO ANTUNES é professor titular de sociologia do trabalho na Unicamp. Escreveu, entre outros, o livro "Os Sentidos do Trabalho" (ed. Boitempo)

O Senado transparente para o cidadão FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, VIRGINIA MALHEIROS GALVEZ 24/10/2016 às 02h00 Encarar o sistema de comunicação do Congresso como algo dispendioso e desnecessário é desprezar o cidadão e negar a ele o direito à informação, um dos alicerces da cidadania e da democracia. O cenário político-parlamentar, que vem sendo revelado ao grande público pelas lentes da TV Senado há pouco mais de 20 anos, constitui uma das mais importantes fontes de informação, conscientização e formação de cidadania. Pela internet, o público tem acesso à TV Senado até pelo celular e pode assistir a um congressista, da tribuna, ser instado a falar do que não quer ou a votar abertamente a cassação de um colega ou o impeachment do presidente da República. Tudo o que acontece no plenário e nas comissões pode ser acompanhado ao vivo, sem qualquer corte ou edição. Isso é transparência. Isso é prestação de serviço público. É educação, é cidadania. A comunicação do Senado reúne veículos de distribuição de informação primária e oficial. Não há disputa por audiência com a mídia privada. Ao contrário. Parte do nosso trabalho é alimentar os jornais, portais e emissoras de rádio e televisão, que escolhem livremente o que e como desejam divulgar.

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Os sinais da TV e da Rádio Senado ficam disponíveis para retransmissão gratuita. A cobertura jornalística abrange toda a atividade legislativa em tempo real. É equilibrada, correta e de abordagem institucional. Nos seis dias de julgamento do impeachment, a TV e a Rádio Senado transmitiram mais de 60 horas ao vivo. Inúmeras emissoras retransmitiram nosso sinal, além de portais como o próprio UOL, do Grupo Folha. Esse aproveitamento reforça, estimula e dá sentido à nossa atividade. A página da TV Senado na internet somou quase 7 milhões de visualizações. O Portal de Notícias foi aberto 1,5 milhão de vezes -foram acessados 327 áudios, 299 vídeos, 192 matérias e 213 notas em tempo real. O "Jornal do Senado" saiu diariamente com todos os discursos. A Rádio Senado inaugurou transmissões ao vivo pelo YouTube com mais de 15 mil acessos. Recebemos a imprensa nos seis dias do julgamento. Emissoras de televisão, de rádio e fotógrafos puderam registrar tudo a partir do exíguo espaço das galerias do plenário. Foram 350 novos pedidos de credenciamento, totalizando 1.500 profissionais de imprensa de 14 países, de todos os continentes. Mas foi a logomarca da TV Senado que se viu nas telas dos aparelhos de televisão, de computadores e de celulares, no longo dia da defesa da ex-presidente Dilma Rousseff, nos debates acalorados e na posse do presidente Michel Temer. O cidadão está atento e as redes sociais constituem importante termômetro. Mais de 2 milhões de pessoas seguem o Senado no Facebook. Em janeiro de 2015 eram 200 mil seguidores. Esse crescimento surpreendente alçou o Senado ao 5º lugar no ranking das páginas institucionais de governo, ultrapassando 20 outros órgãos. No Twitter, o Senado também avança rápido e está em 9º lugar. Temos orgulho da missão e da responsabilidade de prestar serviço tão importante e necessário à sociedade, de aproximar o Senado do cidadão. Como servidores públicos e profissionais de comunicação, seguimos atuando para estreitar ainda mais esse vínculo, aperfeiçoando recursos de transparência e divulgação, integrando rotinas, atentos aos avanços tecnológicos, sempre com o cuidado ético de bem utilizar recursos materiais e humanos. VIRGINIA MALHEIROS GALVEZ, jornalista, é diretora da Secretaria de Comunicação Social do Senado Federal

A vez do petróleo em terra FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, JOSÉ ANTONIO DE MAGALHÃES LINS E RUBENS BOTTERI 24/10/2016 às 02h00

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Abandonado há anos, especialmente a partir do pré-sal, mas responsável por toda uma cadeia de desenvolvimento local, o setor de exploração e produção de petróleo em terra vive a expectativa de dias melhores. As dificuldades por que passa a Petrobras levaram a estatal a vender parte de seus campos terrestres, no projeto chamado Topázio, abrindo, finalmente, caminho para uma indústria independente que gera emprego e renda onde se instala, principalmente nos estados do Norte e Nordeste. Somam-se a isso a recuperação prevista para 2017 dos preços da commodity e a promessa de retomada dos leilões regulares, que começa a ganhar forma no novo programa de concessão do governo. Afinal, ter um horizonte certo de áreas para exploração é fundamental para os investidores. É preciso também que tudo venha acompanhado de um programa de longo prazo voltado ao setor, e que englobe não apenas a questão do calendário. Tanto a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) quanto o Ministério de Minas e Energia têm bons diagnósticos do que é relevante para as empresas. A política de conteúdo local, por exemplo, necessita ser adaptada, pois é sabido que alguns segmentos da nossa indústria encontram dificuldade em cumprir os percentuais mínimos de contratação em fornecedores brasileiros. A competitividade, então, fica prejudicada nesses casos. Mas, sem dúvida, o início do projeto Topázio por si só e a sua manutenção no plano de desinvestimento da Petrobras foi um excelente passo para a retomada. A produção em terra caiu 5,21% em 2015 na comparação com 2014 e 17,61% se levado em conta o ano de 2006. Os dados são do Anuário Estatístico 2016 da ANP. No processo em curso de cessão dos direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás de campos terrestres, foram ofertadas 104 concessões localizadas no Ceará, no Rio Grande do Norte, em Sergipe, na Bahia e no Espírito Santo. Estima-se que boa parte dos poços esteja inativa. A produção de óleo, nesses campos, é de 35 mil barris/dia segundo a Petrobras - 20% de sua produção em terra. O mercado calcula que a produção pode dobrar com a venda dessa primeira parte dos ativos. A Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás (Abpip) prevê R$ 2 bilhões em investimentos e a geração de 200 mil empregos nos cinco estados do projeto. Mais do que reativar sondas paradas, é, portanto, uma questão social recuperar milhares de empregos perdidos nos últimos dez anos, a despeito de protestos de sindicatos de petroleiros contra a venda das áreas. Em lugares carentes que vivem somente de atividades como comércio, extração e agropecuária, a indústria da perfuração em terra alavanca toda uma cadeia produtiva,

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formando microempreendedores, atraindo hotéis, empresas de catering, transporte, entre outros prestadores de serviços. São novas oportunidades de trabalho e renda para a população local. Ainda que movida por um momento difícil, a Petrobras, ao decidir se concentrar no pré-sal, passa a ser um catalisador desse processo com grande apelo econômico e social para o país. O Brasil tem um enorme potencial para essa atividade distante das plataformas do litoral. O futuro em terra também pode ser promissor. JOSÉ ANTONIO DE MAGALHÃES LINS E RUBENS BOTTERI são dirigentes da Great Oil Perfurações e das Câmaras de Comércio Brasil-Uruguai e Brasil-Equador

Lula e os pequenos favores Robson Ventura/Folhapress

Lula, na obra do Itaquerão, com o ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez e Emílio Odebrecht (dir.) FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, VALDO CRUZ 24/10/2016 às 02h00 Recentemente, antes do impeachment de Dilma Rousseff, conversava com dois petistas amigos de Lula sobre o futuro do ex-presidente. Garantiam que nada de corrupção seria provado contra ele. 48


Indagados sobre as investigações do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia, os interlocutores de Lula, muito próximos a ele, disseram-me quase no mesmo tom: este foi o erro dele, aceitar pequenos favores de empresários, ele não achava errado. Um deles, com certo ar de reprovação, afirmou: "O Lula tinha dinheiro para comprar aquele apartamento, fazer aquelas reformas no sítio, mas nada está no nome dele, não é dele, são pequenos favores que o mundo da política se permite". Lembrei-me desta conversa ao ler a manchete deste domingo da Folha, do excelente jornalista Mario Cesar Carvalho: "Itaquerão foi presente para Lula, diz Emílio Odebrecht". Revelação do que vem por aí da delação da construtora baiana. Conta que a construção do estádio do Corinthians, que custou R$ 1,2 bilhão, foi um presente para o corintiano Lula, apaixonado por futebol. Que torcedor no país não gostaria de dar a seu time de coração presente semelhante? Eu não daria. Simplesmente, primeiro, por saber como são administrados os times de futebol no Brasil. Segundo, porque, se ganho um presente deste tamanho, é porque algo me será cobrado em idêntica proporção ou já estarei sendo recompensado. Será que o Itaquerão entra na lista dos "pequenos favores" recebidos pelo ex-presidente Lula? Ele nega. Será que nada será provado contra ele? Até aqui, de fato, nada foi. Lula, porém, já é réu em três ações. Um dado da reportagem de Mario Cesar levanta suspeita sobre os presentes -o sítio de Atibaia teve reformas bancadas pela construtora. O faturamento do grupo Odebrecht, nos governos do PT (2003 a 2015), saltou de R$ 17 bilhões para R$ 132 bilhões. Enfim, que venha a delação da Odebrecht. Para o bem do país.

Bloqueio à internet no Brasil custou R$ 360 milhões

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Ícone do aplicativo do WhatsApp em smartphone; serviço foi bloqueado no Brasil mais de uma vez FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, RONALDO LEMOS 24/10/2016 às 02h00

Infelizmente o Brasil tem aparecido no clube de países que repetidamente mandam bloquear sites e serviços de internet diretamente na infraestrutura da rede. Esse clube inclui Arábia Saudita, Bangladesh, Paquistão, Síria, dentre outros. Os argumentos legais contra esse tipo de bloqueio são abundantes. No entanto, quais são os custos econômicos desses bloqueios? Essa pergunta ficou sem resposta até pouco tempo. No entanto, acaba de ser publicado um estudo do Brookings Institution, um dos principais centros de pesquisa dos EUA, fundado em 1916. Nele, o pesquisador Darrell West aponta que o custo dos bloqueios em todo mundo chega a US$ 2,4 bilhões anuais. Ele analisou também os valores específicos dos bloqueios para cada país. O Brasil aparece na quinta posição em termos de custos totais entre os países pesquisados. As ordens de bloqueio em nosso país produziram R$ 360 milhões de custos econômicos. Ficamos um pouco acima do Congo (com R$ 220 milhões em prejuízos) e logo abaixo do Iraque (com R$ 660 milhões). O estudo enfatiza a importância crescente da internet para a economia dos países. Por exemplo, só em 2015, a internet foi responsável por quase US$ 1 trilhão no PIB (Produto Interno Bruto) dos Estados Unidos e pela geração de mais de 450 mil empregos. Um estudo do Banco Mundial de 2012 demonstrou que "um aumento de 10% nas conexões de banda larga eleva o PIB per capita em 1,35% para os países em desenvolvimento e 1,19% para os países desenvolvidos". Outra referência importante é que a rede gera um "efeito multiplicador" sobre os empregos. Para cada dois empregos criados em atividades ligadas à internet, há a criação de um emprego adicional em outros ramos da economia. O estudo também mostra que cada país cria razões diferentes para bloquear a internet. No Paquistão, por exemplo, o motivo foi o medo de protestos no dia do principal feriado nacional. No Burundi, a justificativa foi a eleição de 2015, que deu um terceiro mandato para o presidente Pierre Nkurunziza, o que levou ao bloqueio preventivo de aplicativos como Viber e WhatsApp. Independentemente das razões de cada país, o fato é que a internet assume um papel central para a vida contemporânea. Não por acaso, a ONU lançou neste ano uma resolução que afirma que bloqueios à internet devem ser considerados como violação aos direitos humanos. Nas suas próprias palavras, a resolução "condena inequivocamente medidas que intencionalmente impeçam ou interfiram no acesso ou disseminação da informação on-line" e "conclama os Estados a abdicarem e cessarem tais medidas". É claro que muitas das questões de fundo que levam aos bloqueios precisam ser equacionadas, como é o caso do interesse legítimo de realizar investigações criminais. No entanto, interferir diretamente na infraestrutura da rede não é a solução adequada. Os danos colaterais são grandes demais. 50


PEC 241, para além do ajuste fiscal Ela pode também se revelar produtiva para a melhoria da nossa representação política Fonte Sergio Fausto, Jornal O Estado de S. Paulo 24 Outubro 2016 |às03h00 Dilma Rousseff levou ideias equivocadas às últimas consequências e assim demonstrou o mal que elas produzem em nome de boas intenções. Destaco uma: a disciplina fiscal seria uma criação de setores conservadores para impedir governos progressistas de promover o desenvolvimento do País e atender aos interesses da maioria da população. Ainda na condição de chefe da Casa Civil, em 2005, ela chamou de “rudimentar” o programa de ajuste fiscal proposto pela área econômica. A adoção da regra que limitava a evolução do gasto corrente a um porcentual do PIB teria ajudado o País a evitar a trombada sofrida em 2014/2015, quando mergulhou na maior crise econômica da sua História. Mas Lula comprou a ideia de Dilma, acelerou a expansão do gasto corrente (mais do que do investimento) e conduziu-a, com sua popularidade, ao Palácio do Planalto. A ex-presidente sofreu impeachment porque o desastre se deu sob sua direção. Ela conseguiu transformar um superávit primário de aproximadamente 3% do PIB num déficit de mais de 2% do PIB, em pouco mais de quatro anos. No mesmo período, a dívida pública bruta passou de pouco mais de 50% para quase 70% do PIB, não apenas porque o resultado primário despencou, mas também porque o Tesouro se endividou mais e mais para dar empréstimos subsidiados via bancos públicos. Para esconder a deterioração das contas públicas Dilma apelou para a contabilidade criativa e as pedaladas fiscais, estas últimas a principal razão jurídica do seu afastamento da Presidência. O novo governo pôs a nu a gravidade do quadro fiscal, sem truques contábeis: um estoque de dívida de R$ 4,2 trilhões e um déficit estimado neste ano em R$ 170 bilhões antes do pagamento de juros e de R$ 590 bilhões depois de pagá-los. Nessa toada, mais cedo do que tarde o Estado teria de emitir moeda para pagar suas obrigações, inflacionando a economia, ou deixar de pagar a dívida pública. Com a economia debilitada, cortar abruptamente os gastos e aumentar impostos aprofundaria a recessão. Acertadamente, o novo governo optou por uma estratégia gradual: a introdução de uma regra que freia a velocidade de expansão dos gastos primários por um longo período (20 anos, com revisão da regra no 10.º ano). Essa é a essência da PEC 241, aprovada em primeira votação na Câmara. Se aprovada em definitivo pelo Congresso, a despesa do governo federal deixará de crescer à média de 6% ao ano acima da inflação, como nos governos Lula e Dilma, e passará a evoluir no mesmo passo da inflação do ano anterior. Com isso o governo ancora as expectativas quanto à evolução das contas públicas. Cria condições propícias para a queda dos juros, a retomada do crescimento, o aumento da arrecadação, e assim por diante, favorecendo a inversão gradual do círculo vicioso dos últimos anos. O sucesso da estratégia depende da reforma da Previdência. Não insistirei nesse ponto, por óbvio (ver ótima matéria no Estadão de 16/10 sobre o assunto). Aprovadas ambas as medidas, o País deverá chegar a 2026 produzindo novamente superávits primários significativos e reduzindo a dívida pública como proporção do PIB. Naquele ano, prevê a PEC 241, o presidente poderá propor a revisão da regra de limitação dos gastos ao Congresso, por lei complementar. Ao País caberá discutir e aos parlamentares decidir se a regra deverá ser alterada para permitir maiores gastos ou ser mantida, para possibilitar maior redução da dívida pública ou da carga tributária. Hoje, com déficits recorrentes, mesmo antes do pagamento de juros, e a dívida galopando, não temos essa escolha.

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Significa que até lá as políticas públicas entrarão em piloto automático e a sociedade em modo de espera? Ao contrário, há muito a fazer para melhorar a eficiência e a equidade do gasto com os recursos disponíveis, incluindo o chamado gasto tributário (renúncias fiscais), fonte de muito desperdício e iniquidade. A melhora da qualidade do gasto começa pelo aprimoramento do processo orçamentário. A fixação de um teto para a despesa desestimulará o Congresso a inflar estimativas de receita para acomodar gastos não previstos na proposta orçamentária. Essa prática corriqueira desmoraliza a lei do orçamento aprovada no Parlamento e transfere ao Executivo o poder discricionário de decidir, na boca do caixa, de olho no ingresso real de receitas, o quinhão orçamentário para esta ou aquela ação governamental, em favor deste ou daquele setor ou parlamentar. Com o teto sobre os gastos, governo e sociedade serão levados a debater prioridades, avaliar resultados de programas governamentais, decidir o que vale a pena preservar, ampliar ou eliminar. Nesse processo se imporá a discussão sobre em que casos e até que ponto faz sentido manter regras que hoje vinculam, em caráter virtualmente permanente, a maior parte das receitas a despesas em áreas e funções predeterminadas do Estado. E reexaminar, como se tentou nos anos 1990, a extensão da estabilidade para todo o funcionalismo público. A ampliação da margem de liberdade sobre onde empregar os recursos do orçamento deverá valorizar os planos plurianuais como instrumento para a definição de prioridades de longo prazo para as políticas públicas. Dessa maneira, em lugar da repetição anual do jogo de pressões e contrapressões na boca do caixa, de ameaças e chantagens em torno do pagamento ou não de emendas parlamentares, Executivo e Congresso terão maiores e melhores razões para negociar democraticamente em torno de programas do interesse do País. Num ambiente assim, será maior a probabilidade de que despontem políticos e partidos menos fisiológicos e mais programáticos. Importante para o ajuste fiscal, a PEC 241 pode vir a se revelar produtiva para a melhoria da nossa representação política. Mas isso depende de que a sociedade entenda que essa possibilidade existe e se empenhe para concretizá-la.

Fundamentalismo e tolerância Não se deve demonizar quem diverge da nossa opinião, o confronto de ideias é enriquecedor Fonte Carlos Alberto Di Franco, Jornal O Estado de S. Paulo 24 Outubro 2016 às 03h00 “O sonho da razão produz monstros” – a frase, cunhada numa célebre pintura de Goya, veiome à lembrança ao refletir sobre a febre ideológica laicista que está tomando conta de certos ambientes europeus e, infelizmente, também daqui. O laicismo, tal como hoje se apresenta e “milita”, não é apenas uma opinião, um conjunto de ideias ou uma convicção, que se defende em legítimo e respeitoso diálogo com outras opiniões e convicções, como é próprio da cultura e da praxe democrática. Também não se identifica com a “laicidade”, que é algo positivo e justo e consiste em reconhecer a independência e a autonomia do Estado em relação a qualquer religião ou igreja concreta. E que inclui, como dado essencial, o respeito pela liberdade privada e pública dos cultos das diversas religiões, desde que não atentem contra as leis, a ordem e a moralidade pública. O laicismo militante atual, no entanto, é uma “ideologia”, ou seja, uma cosmovisão – um conjunto global de ideias fechado em si mesmo – que pretende ser a “única verdade” racional, a única digna de ser levada em consideração na cultura, na política, na legislação, no ensino, 52


etc. Por outras palavras, o laicismo é um dogmatismo secular, ideologicamente totalitário e fechado em sua “verdade única”, comparável – sem exagero – às demais ideologias fechadas, como o nazismo e o comunismo. Tal como as políticas nascidas dessas doutrinas desumanizadoras, o laicismo execra – sem dar audiência ao adversário nem manter respeito por ele – os pensamentos que divergem dos seus “dogmas” e não hesita em mobilizar a “Inquisição” de certos setores para achincalhar – sem o menor respeito pelo diálogo – as ideias ou posições que se opõem ao seu dogmatismo. Alegará que são interferências do pensamento religioso ou de igrejas, quando um democrata deveria pensar apenas que são outros modos de pensar de outros cidadãos, que têm tantos direitos como eles; e sem reparar que o seu laicismo militante, dogmático, já é uma pseudorreligião materialista e secular, como o foram o comunismo e o nazismo. Pratica-se, então, o terrorismo ideológico, pelo sistema de atacar os que, no exercício do seu direito democrático, pensam e opinam de modo diferente do deles, acusando-os de ser – só por opinarem de outra maneira – intransigentes, tirânicos, ditatoriais (três características das quais o laicismo, na realidade, parece querer a exclusividade). A humanidade, imaginam os defensores de uma cultura agnóstica e laicista, seria mais civilizada e feliz num mundo liberto das amarras espirituais. Será? Penso que não. O fundamentalismo islâmico é apresentado como a comprovação definitiva dos males que a religião provoca no mundo. Sonega-se um dado essencial: o terrorismo é um desvio covarde, uma instrumentalização cínica, uma apropriação criminosa de uma marca que não lhe pertence. Na verdade, a história das utopias da razão está manchada de sangue, terror e privação. Frequentemente, salienta Oscar Wilde com boa dose de argúcia, “as melhores intenções produzem as piores obras”. A Revolução Francesa, por exemplo, não produziu apenas um magnífico ideário. A utopia de 1789, em nome da “igualdade”, da “fraternidade”e da “liberdade”, desembocou no terror da guilhotina. A 2.ª Guerra Mundial não foi acionada por gatilhos religiosos. O holocausto do povo judeu, fruto direto da insanidade de Hitler, teve alguns de seus pré-requisitos precisamente na filosofia da morte de Deus. Nietzsche, o orgulhoso idealizador do super-homem, está na raiz imediata dos campos de concentração e de extermínio programado. E não foi a religião que desencadeou o Arquipélago Gulag do stalinismo. Feitas as contas, com isenção e honestidade intelectual, é preciso reconhecer que o sonho racionalista projetou poucas luzes e muitas sombras. A utopia, concebida no ambiente rarefeito dos gabinetes intelectuais, padece do mal da abstração. Perfila um homem impecável, um sistema irretocável. Depois, ao topar com o homem real, com suas grandezas e misérias, não admite a evidência das limitações teóricas. Brota, então, o delírio persecutório, a síndrome da conspiração. Radicaliza-se o sonho. A abstração quer se impor à realidade. E o humanismo inicial cede espaço ao obscurantismo. O autêntico fenômeno religioso, ao contrário, só pode medrar no terreno da liberdade. Na verdade, entre uma pessoa de convicções e um fanático existe uma fronteira nítida: o apreço pela liberdade. O fanático impõe, fulmina, empenha-se em aliciar. A pessoa de convicções, ao contrário, assenta-se serenamente em suas ideias. Por isso suas ideias não a movem a impor, mas a estimulam a propor, a expor à livre aceitação dos outros os valores que acredita dignos de serem compartilhados. Sabe que somente uma proposta dirigida à liberdade pode obter uma resposta digna do homem. Precisamos, todos, promover um clima da racionalidade e de tolerância na discussão das ideias. O debate não pode ser travado em clima de Fla-Flu, marca registrada de certas manifestações nas redes sociais. Não devemos demonizar quem diverge da nossa opinião. O 53


confronto das ideias é enriquecedor. O fechamento à discussão é tremendamente empobrecedor. É preciso, sem dúvida, desenvolver o senso crítico contra os desvios da intolerância, do fanatismo e de certas manifestações de estelionato religioso. Mas não ocultemos os estragos causados pelo fundamentalismo ideológico. A isenção é o outro nome da honestidade intelectual. A busca da verdade não enfraquece o afã de liberdade. Ao contrário, é sua mola propulsora, pois a autêntica liberdade é a adesão voluntária à verdade que se impõe a uma inteligência lúcida, aberta, e não condicionada por preconceitos, tabus ideológicos ou interesses.

Para o consumidor, efeito da queda da Selic no bolso vai demorar Fonte Fábio Gallo Jornal O Estado de S. Paulo Economia & Negócios 24 Outubro 2016 às 08h32 Em quanto tempo vamos começar a sentir os efeitos da redução da Selic? Os bancos vão repassar esse corte para o consumidor? A queda na taxa básica de juros de nossa economia, a Selic, deve provocar mudanças tanto para o investidor quanto para o credor. Mas a queda de 0,25 ponto porcentual é uma alteração importante a ponto de afetar as nossas vidas? A resposta é não. Para o devedor que está na esperança de sentir no bolso a redução dos juros cobrados no cheque especial ou para quem quer comprar uma TV nova a prazo com juros menores, a notícia é que isso ainda vai levar algum tempo para acontecer. O seu bolso vai demorar um pouco mais para sentir o alívio de juros menores. Embora a curva de juros de mercado tenha como base a Selic e, tecnicamente, quando esta taxa é reduzida todas as outras taxas de mercado deveriam ser igualmente reduzidas, na prática isso não ocorre instantaneamente. As instituições financeiras demoram para reduzir as taxas que tem maior grau de risco, alegando, entre outros fatores, alto grau de inadimplência do consumidor. Com a queda dos juros, investir na Bolsa vai ficar mais vantajoso do que na renda fixa? Devo migrar meus investimentos? A redução dos juros abre novas perspectivas para o investidor. Com taxas de juros muito altas, a renda fixa é um verdadeiro paraíso na Terra: investir com relativo baixo risco e com boa rentabilidade é o que todo mundo quer. Historicamente, os dados mostram isso. Quando comparamos o CDI, a referência da renda fixa, com o desempenho do Ibovespa, temos alguns dados bem marcantes. Por exemplo, quem tivesse aplicado R$ 100,00 no último pregão de 1995 e permanecesse com esse investimento até o final de 2015, na Bolsa teria acumulado R$ 841,94, enquanto que no CDI o valor seria de R$ 3.077,99, tendo o IPCA acumulado o equivalente a R$ 441,94. Nos últimos 10 anos, esses números seriam de R$ 139,83 na Bolsa, R$ 336,28 no CDI e o equivalente do IPCA seria de R$ 187,28, portanto a aplicação na renda variável sequer cobriria a inflação do período. Obviamente, há momentos de muitos resultados importantes na Bolsa, acima dos outros investimentos, como ocorreu em 2009, com quase 83% de ganhos. Em 2016, com a melhoria dos sinais da economia, a Bolsa tem reagido muito bem. O Ibovespa atingiu na semana passada marcas superiores aos 64 mil pontos, oferecendo ao investidor retorno anual de quase 50%. O ambiente que se vislumbra com taxa de juro mais baixa abre a porta para os investidores começarem a diversificar mais suas carteiras, agregando aos seus investimentos a renda variável, além da renda fixa.

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Notícias: Petrobras fecha acordo para encerrar ações de fundos na Justiça dos EUA Ueslei Marcelino - 30.set.2015/Reuters

Trabalhador pinta tanque da Petrobras em Brasília

FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, LUCAS VETTORAZZO e NICOLA PAMPLONA DO RIO 21/10/2016 às 21h46 A Petrobras fechou acordo com quatro grandes fundos de investimentos americanos para que as ações que essas instituições movem contra a empresa na Justiça americana sejam extintas. Desde que ficou comprovado que havia participação de diretores da Petrobras em esquemas de corrupção, fundos de investimento e investidores individuais abriram processos contra a estatal reclamando perdas com investimentos em ações chamadas ADRs, que são os papéis de empresas estrangeiras negociadas na bolsa de Nova York. Em fato relevante divulgado na noite desta sexta-feira (21), a Petrobras anunciou que chegou a acordo com os fundos Pimco, Dodge & Cox Internacional Stock Fund, Janus Overseas Fund e Al Shams Investments.

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O acordo havia sido negociado e foi aprovado pelo Conselho de Administração da petroleira, em reunião nesta sexta. O acordo não exclui, porém, ações coletivas que minoritários e investidores individuais moveram contra a petroleira na corte americana. Esses processos estão suspensos desde agosto, depois que a Petrobras consegui interpor recurso, que está sob avaliação da justiça americana. "No momento não é possível para a Petrobras fazer estimativa confiável sobre o desfecho das class action [ações coletivas]", diz a empresa no comunicado. Sobre as ações com os quatro grandes fundos de investimento, a estatal fará uma provisão de US$ 353 milhões, que será contabilizada no resultado de seu terceiro trimestre deste ano. "A Pimco é uma das maiores detentoras de bonds [bônus] do sistema Petrobras e o Dodge & Cox é um dos maiores acionistas da companhia após a União Federal e entidades relacionadas", afirma a empresa em nota. CULPA A Petrobras ressalta no comunicado que os acordos não constituem qualquer reconhecimento de culpa e que a empresa "continuará se defendendo firmemente nas demais ações em andamento". Segundo a empresa, o acordo tem como objetivo "eliminar incertezas, ônus e custos associados à continuidade dessas disputas".

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A Folha apurou que a estatal avalia, ainda, que o acordo com os grandes fundos melhora sua vantagem no julgamento da ação coletiva, ao reduzir o número de reclamantes e de escritórios de advocacia do outro lado. AÇÃO COLETIVA Em dois de agosto, a Petrobras anunciou que a Corte Federal de Apelações do Segundo Circuito, dos EUA, determinou a suspensão da ação coletiva e das ações individuais por perdas relacionadas aos crimes investigados pela Operação Lava Jato. A decisão correspondeu a recurso da empresa, que questiona as definições de classes de acionistas determinadas pelo juiz de primeira instância Jed Rakoff. Os investidores pedem ressarcimento pela perda de valor das ações após descoberta de esquema de corrução na estatal. Rakoff decidiu que investidores que compraram ações da Petrobras entre julho de 2010 e janeiro de 2015, além daqueles que negociaram títulos da dívida da empresa em 2014 e 2015 poderiam se juntar à ação contra a empresa. A definição das classes de acionistas determinará o tamanho da indenização, caso a empresa perca a ação nos Estados Unidos. Os processos nos EUA são vistos por analistas como um obstáculo ao trabalho da estatal para sair da crise financeira, já que uma eventual derrota pode custar bilhões de dólares. Em sua defesa, a Petrobras vem alegando que também foi vítima do esquema de corrupção. Com a decisão desta terça, está suspenso o julgamento do processo na primeira instância, inicialmente agendado para o dia 19 de setembro, até que a Corte Federal de Apelações decida sobre o recurso relacionado às classes.

Brasil avançou negociação de acordo comercial com a Índia, diz José Serra

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FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, 21/10/2016 às 22h56 O ministro das Relações Exteriores, José Serra, afirmou nesta sexta-feira (21) que a aproximação com Índia, devido ao seu "potencial de complementaridade com o Brasil", foi o principal destaque da viagem com o presidente Michel Temer nesta semana. "É um mercado imenso e com o qual o Brasil tem um potencial de complementaridade, seja na indústria de alimentos ou aeronáutica", afirmou Serra, após evento com empresários em São Paulo. O ministro disse que os países avançaram muito, mas ressalvou que as mudanças efetivas têm outro ritmo. "Em matéria de gigantes demográficos e econômicos, as coisas não acontecem de um mês para o outro. Mas já nos próximos meses teremos um acordo de liberação comercial com 500 produtos com a Índia, o que já representará um avanço grande. Vamos caminhando também na assinatura de um acordo de facilitação de investimentos brasileiros na Índia e o inverso, dando mais segurança e criando melhores condições para isso." Segundo ele, a Índia é um país estratégico. "Dentro dos Brics, hoje, a Índia é, sem dúvida, o país mais chamativo para nós." Questionado sobre as dificuldades em alavancar acordos multilaterais, Serra disse já ter conversado com o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo. "Eu sou defensor do multilateralismo, como ele também. Mas não pegou. O presidente da OMC não vai sair dizendo isso, mas o fato é que não caminhou porque as principais estrelas do comércio internacional livre, que são Inglaterra e Estados Unidos, não embarcaram nele. Então é muito difícil você imaginar que o multilateralismo esteja na ordem do dia. Para nós seria bom, mas é um problema prático. Não vamos nos amarrar nos entendimentos bilaterais, esperando o multilateralismo. Vamos continuar trabalhando. Se chegar o multilateralismo, está ótimo".

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Serra também comentou sobre a prisão do ex-presidente da Câmara, o deputado cassado Eduardo Cunha, negando preocupação com uma eventual delação de Cunha. "O quadro político para mim é questão de maioria no Congresso, perfil das propostas, há muita coisa para ser votada no Congresso", disse. Serra evitou comentar a movimento do Banco Central para redução da taxa de juros e a possibilidade de prévias no PSDB para a disputa pela presidência em 2018, assunto que ele diz considerar um "debate muito prematuro".

Inflação de serviços como cabeleireiro e aluguel estão no foco do BC Eduardo Knapp/Folhapress

Em salão de Higienópolis, o cabeleireiro João Boccaletto atende uma cliente

FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, MARIANA CARNEIRO DE SÃO PAULO 22/10/2016 às 02h00

Todos os olhos do mercado financeiro se voltaram, desde a última quarta-feira (19), para o comportamento de preços como cabeleireiro, aluguel residencial, condomínio e refeições fora de casa. 59


São itens que, segundo levantamento do Banco Central, sofrem mais influência do nível de atividade (no caso, da recessão) e representam dois terços dos serviços monitorados no cálculo da inflação. Na última quarta (19), ao anunciar o primeiro corte de juros em quatro anos, para 14% ao ano, os diretores do BC indicaram preocupação com a resistência de queda dos preços desses serviços. Apesar da profunda recessão, eles pararam de cair mais recentemente, dificultando a baixa da inflação, hoje em 8,48% ao ano. O alerta colocou em dúvida o futuro da taxa de juros entre investidores e analistas –que tentam antecipar as decisões do BC para lucrar. É consenso no mercado a opinião de que o BC continuará a reduzir os juros na próxima reunião, em novembro. Mas agora muitos preveem que o corte pode ser mais branda do que era esperado. Isso provocou movimentação no mercado nos últimos dois dias, com os investidores calibrando suas apostas. A redução de 0,5 ponto percentual na taxa em novembro perdeu fôlego e ganhou força a aposta de corte de 0,25 ponto. O BC mostrou-se mais conservador do que se esperava, dizem analistas.

Por força da recessão, a massa de rendimentos caiu 3% em agosto de 2016, ante o mesmo mês de 2015. A inflação dos serviços suscetíveis à recessão recuou de 9,7% em outubro de 2015 para 6,9% em setembro deste ano.

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Em setembro, porém, em vez de seguir em queda, eles subiram 0,4 ponto percentual. Na prévia deste mês, divulgada nesta sexta (21), houve nova oscilação para cima. Luis Otávio Leal, do banco ABC Brasil, afirma, porém, que a tendência é de desaceleração e vê corte de 0,50 na taxa. Marcelo Kfoury, do Citibank, concorda, mas diz acreditar que o BC será mais brando no corte de juros. "Esse não é o único oponente [ao corte mais agressivo], pesa também a percepção do BC de que a desaceleração da atividade em agosto foi temporária e que há uma melhora lenta da economia." A aparente intolerância do BC à inflação levou Kfoury a rever para baixo, pela segunda vez, também a previsão de inflação de 2017, para 4,8%. Elson Telles, do Itaú Unibanco, diz que os serviços no foco do BC são muito influenciados pela inflação passada (mais alta), como é o caso dos contratos de aluguel. "Eles se movem mais lentamente, mas estão moderando e ajudarão a baixar a inflação pelos próximos três a quatro anos".

‘Bomba fiscal’ aguarda novas administrações Situação se agravou neste ano porque os municípios contavam com repasse de R$ 99 bi do FPM, mas valor deve ficar em R$ 84 bi Fonte Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli / BRASÍLIA, Jornal O Estado de S. Paulo 22 Outubro 2016 às 18h15  

Municípios PEREGRINAÇÃO EM BUSCA DE RECURSO Em SP, greves afetam serviços básicos Passado o segundo turno das eleições, a situação financeira das prefeituras virá à tona. De 3.155 municípios que informaram o quadro de suas finanças ao Tesouro Nacional, 2.442, ou 77,4%, já estão com as contas no vermelho, segundo levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). E a situação vai piorar até o fim do ano, com a contínua queda da arrecadação, deixando a bomba fiscal para a próxima administração. Ao contrário dos governadores, que alardearam nos últimos meses a crise sem precedentes nos seus cofres para ganhar mais dinheiro do governo federal, as prefeituras empurraram os problemas para debaixo do tapete durante a campanha eleitoral – não é exatamente um trunfo eleitoral mostrar que as finanças estão descontroladas. Os futuros prefeitos, que vão herdar o rombo – no caso dos reeleitos, deles mesmos –, fizeram uma romaria nos últimos dias pelos gabinetes do Congresso em busca de dinheiro para 2017. Mas, com o teto de gastos já aplicado ao Orçamento federal do ano que vem, se depararam com uma grande dificuldade em emplacar seus pedidos de emendas aos deputados e senadores. As informações prestadas pelos municípios ao Tesouro não são obrigatórias. Por isso, boa parte dos 5.570 prefeitos não as enviam. Mesmo assim, o levantamento representa o retrato mais amplo disponível sobre as finanças das prefeituras. Ao analisar por Estados, todos os municípios do Amazonas e do Rio que divulgaram as informações estão no negativo. Em São

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Paulo, 402 prefeituras registram déficit. No Rio Grande do Sul, o quadro não é muito diferente, com 371 cidades nessa situação. “A bomba já estourou e vai ficar pior até o final do ano. No período eleitoral, quem vai dizer que está mal?”, diz o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. Segundo a confederação, 576 delas estão atrasando salários. Fundo menor. A crise se agravou porque os prefeitos contavam com R$ 99 bilhões de repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em 2016, mas a previsão é que esse valor não chegará a R$ 84 bilhões no fim do ano. A queda das transferências da União é mais dramática para Estados do Nordeste e Norte do País, onde boa parte das prefeituras depende desse dinheiro. As prefeituras também arcam com custos cada vez maiores com a Previdência. No ano passado, a despesa com servidores inativos cresceu 13,22% ante 2014, segundo dados do Tesouro Nacional para municípios acima de 200 mil habitantes. As receitas correntes, por sua vez, subiram apenas 6,81% no período. “Só vamos saber mesmo a situação quando sentarmos na cadeira”, diz o prefeito eleito de Brejo Grande (SE), Clysmer Ferreira. Membro do PSB, ele era o candidato da oposição no município e esteve no Congresso na última semana para pedir emendas aos parlamentares. Se para os prefeitos que vão assumir os cargos a perspectiva para o ano que vem não é animadora, para os que estão deixando o cargo com as contas deficitárias o risco é de uma condenação por crime de responsabilidade fiscal. Na avaliação da CNM, muitos prefeitos vão virar ficha- suja. A Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe uma série de práticas nos últimos oito meses do mandato, entre elas deixar ao sucessor restos a pagar a descoberto (sem dinheiro em caixa para honrar o pagamento). O economista José Roberto Afonso, pesquisador do Ibre/FGV e um dos formuladores da LRF, acredita que a sanção é correta, desde que em situação de normalidade econômica. “Não é o caso agora. Seria preciso encontrar uma solução que impedisse uma gastança, mas não levasse a punições de prefeitos por fatores que são alheios à sua atuação”. “Só vamos saber mesmo a situação quando sentarmos nas cadeiras”.

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Contribuição de servidores pode subir Rombo nas previdências estaduais, que já chega a R$ 77 bilhões, pode levar ao aumento da alíquota nos Estados de 11% para 14% Fonte Lu Aiko Otta de BRASÍLIA, Jornal O Estado de S. Paulo 22 Outubro 2016 às 06h00  

Notícias relacionadas Estados ‘escondem’ rombo nas contas TCU tem parecer favorável à devolução de R$ 100 bi do BNDES Foto: Carolina Antunes | DIV

A proposta de reforma da Previdência ainda nem chegou ao Congresso, mas o governo Michel Temer já pensa no passo seguinte: encontrar uma nova fonte de financiamento para o sistema de aposentadorias e pensões. O diagnóstico é que, mesmo se a reforma for aprovada, o sistema ocupará um espaço cada vez maior no Orçamento federal e seguirá impedindo a expansão das demais despesas, como investimentos e programas sociais. “Temos de ter coragem de colocar esse tema em debate”, disse um interlocutor do presidente. “Acho que temos de começar.” As opções seriam, por exemplo, aumentar as contribuições previdenciárias ou algum novo tributo, duas medidas altamente impopulares. Uma fonte de financiamento que não existe, mas que poderá ser criada até mesmo pela própria Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da Previdência a ser encaminhada nos próximos dias ao Congresso, é a elevação das contribuições previdenciárias dos servidores estaduais de 11% para 14%, conforme antecipou o Estado em setembro. Alguns governos estaduais já cobram esse nível mais elevado, mas a maioria tem dificuldade em aprovar, nas assembleias legislativas, esse aumento.

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É por isso que os governadores querem que Temer inclua, na PEC da Previdência, algumas medidas que os ajudariam a estancar o crescimento dos gastos com a folha de servidores ativos e inativos. Dados do Tesouro Nacional mostram que o rombo da Previdência dos Estados ultrapassa R$ 77 bilhões, R$ 18 bilhões superior ao que eles informavam. Oito Estados não cumprem os limites para gastos com pessoal. O presidente quer conversar com governadores, e também com sindicalistas e confederações empresariais, antes de encaminhar a matéria ao Congresso. Esses contatos ocorrerão após a votação na Câmara, em segundo turno, do projeto que limita o crescimento dos gastos públicos – a PEC do Teto – programada para terça-feira. A PEC da Previdência está redigida, mas o texto poderá ser modificado para dar “carona” às propostas dos governadores. Os governadores seriam beneficiados, por exemplo, se Temer desistisse da ideia de dar aos professores um plano mais longo de transição para o novo regime. Mas o Planalto não está inclinado a isso. Mudanças. Pela regra geral, a emenda fixa a idade mínima de 65 anos para as pessoas se aposentarem. Mas, para não prejudicar muito quem está próximo da aposentadoria, foi fixada uma idade de corte, de 50 anos para homens e 45 anos para mulheres, a partir do qual as pessoas pagarão apenas um “pedágio” para obter o benefício. Esse “pedágio” corresponde a um adicional de 50% sobre o tempo que falta para a aposentadoria. Para dar uma regra mais benéfica aos professores, a proposta prevê que eles terão o mesmo tratamento das mulheres. Ou seja, o corte será de 45 anos. Por causa do aumento da expectativa de vida, o governo havia cogitado estabelecer, na reforma, um mecanismo pelo qual a idade mínima de 65 anos poderia ser aumentada de forma automática. Mas a ideia foi descartada. “Era muita frente de guerra de uma vez só”, avaliou um integrante do núcleo político. Isso não quer dizer que esse debate não tenha de ser travado no futuro, pois muitos países já adotaram idade mínima de 70 anos. Principais pontos da reforma Idade mínima 65 anos para homens e mulheres. Haverá regra de transição para homens com 50 anos ou mais e mulheres com 45 anos ou mais. Pedágio Na transição, a pessoa pagará um “pedágio” de 50% do tempo que falta para se aposentar. Haverá uma regra de transição especial para professores. Eles deverão ter o mesmo tratamento das mulheres. Contribuição O tempo mínimo de contribuição deve subir de 15 anos para 25 anos; para ter o benefício integral serão necessários 50 anos. Não será permitido acúmulo de aposentadoria e pensão por morte Regras iguais Funcionários públicos e políticos terão regras de aposentadoria iguais às do sistema geral. Militares terão outra regra que ainda será definida. Benefícios assistenciais Loas e Renda Mensal Vitalícia, por exemplo, passarão a ser menores do que o salário mínimo.

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Agências começam a retomar autonomia Decreto a ser assinado nos próximos dias pretende dar maior fluidez ao funcionamento desses órgãos, que perderam poder no governo Dilma Fonte Lu Aiko Otta de BRASÍLIA, Jornal O Estado de S. Paulo 22 Outubro 2016 às 19h10 

Agências: Escolha de dirigentes dos órgãos reguladores será mais rígida Nos próximos dias, o presidente Michel Temer deverá assinar um decreto que faz duas alterações no dia a dia das agências reguladoras. Primeiro, vai permitir que os funcionários possam viajar a serviço sem depender de autorização do ministro da área. O texto vai garantir ainda às agências autonomia para firmar contratos na área administrativa, como os de limpeza e serviços terceirizados. Parece pouco, mas a mudança dará mais fluidez para o funcionamento desses órgãos. Segundo fontes, as agências operavam assim antes, mas foram alvo de um progressivo aumento de controle a partir do primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. “Era uma dificuldade inacreditável, pedir para o ministro autorizar cada viagem”, comentou um ex-dirigente de agência reguladora. “Era uma coisa muito Dilma”. A ex-presidente era conhecida, nos bastidores, por seu estilo centralizador e detalhista, apelidado de “dilmismo”. Técnicos que atuavam no governo à época dizem que ela via um excesso de autonomia nas agências reguladoras desde que assumiu o Ministério de Minas e Energia, em 2003. Essa visão teria levado o governo de Luiz Inácio Lula da Silva a propor, em 2004, uma nova lei para as agências reguladoras. O texto, cujo resultado principal seria a transferência de poderes das agências para os ministérios setoriais, ficou anos parado. Após idas e vindas, o projeto foi bastante modificado. A versão que aguarda votação no Senado antes de seguir para a Câmara dos Deputados, ajustado aos objetivos do atual governo, mantém as atribuições regulatórias das agências, procura profissionalizar sua gestão e lhes garante maior autonomia. O decreto que está em elaboração no Planalto, que trata de viagens e contratos, apenas antecipa alguns pontos dessa maior liberdade. Segurança. Com a nova lei, o governo espera garantir um ambiente mais seguro para as concessões em infraestrutura, negócios que envolvem investimentos elevados e contratos de longo prazo. A instabilidade de regras e a debilidade das agências são queixas recorrentes dos empreendedores no setor privado. “Queremos converter as agências em órgãos de Estado, e não de governo como elas se tornaram”, disse um interlocutor de Temer. “Na medida em que a agência fica vinculada ao titular do Executivo e seu partido político, suas ideologias, ela pode sofrer interferência indevida na regulação de contratos”. Além do funcionamento das agências, o atual governo elimina, das concessões rodoviárias que pretende leiloar, itens que foram marcas do Programa de Investimentos em Logística (PIL), uma vitrine do primeiro governo de Dilma. As concessões do PIL privilegiavam a menor tarifa possível e exigiam elevados investimentos. A conta era, teoricamente, equilibrada com financiamentos generosos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A modicidade tarifária e uma forte presença do Estado na economia eram outras manifestações do “dilmismo”.

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Esse modelo foi substituído, nas futuras rodadas, por um “realismo tarifário”, que admite pedágios mais altos e exige investimentos de acordo com a demanda. Essa mudança foi iniciada no segundo governo Dilma e mantida pela equipe de Temer. No setor de óleo e gás, está em fase de desmonte a atual política de conteúdo nacional, criada em 2005, que exigia que as petroleiras utilizassem uma elevada quantidade de bens e serviços produzidos no Brasil. A nova versão vai dar maior flexibilidade para comprar produtos no exterior. Por outro lado, dará bônus caso as operadoras adquiram equipamentos aqui para usar em suas áreas de exploração em outros países.

Escolha de dirigentes dos órgãos reguladores será mais rígida Indicado terá de ter, entre outras exigências, experiência de pelo menos dez anos na área a ser regulada Fonte O Estado de S. Paulo 22 Outubro 2016 às 19h10 Em fevereiro de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu, para a diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), o assistente social Ivo Borges. Na época, o indicado admitiu ao Estado que não tinha experiência no setor. No máximo, havia administrado a rodoviária de Brasília. Mesmo assim, teve seu nome aprovado pelo Senado e exerceu seu mandato como diretor – tendo, inclusive, chegado ao posto de diretor-geral. Até ir para a ANTT, Borges era tesoureiro do PTB no Distrito Federal e dava expediente no gabinete do então senador Gim Argello (PTB-DF). Segundo se comentava, a indicação havia partido do parlamentar. Há duas semanas, Argello foi condenado a 19 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e por obstruir investigações. Ele havia sido preso em abril, na 28.ª fase da Operação Lava Jato. O projeto de lei das agências reguladoras que tramita no Congresso não permite a repetição de situações como essa. Ele exige que os indicados para direção de agência reguladora tenham pelo menos dez anos de experiência na área, no setor público ou como profissional liberal na área a ser regulada. Ou que seja docente ou pesquisador no campo. E exige que o candidato tenha uma formação acadêmica compatível com o cargo. “Ele tem de ter, como requisito, essa experiência de dez anos”, frisou a senadora Simone Tebet (PMDB-MS), relatora da matéria. Além disso, o texto proíbe que sejam indicados para o cargo ministros, secretários estaduais ou municipais, dirigentes de partido político, políticos com mandato no Legislativo, dirigentes sindicais, pessoas com participação em empresas ou entidades do setor regulado e pessoas que estejam inelegíveis, entre outros. O texto uniformiza os mandatos de dirigentes das agências em cinco anos, sem direito a recondução. Um dos pontos mais importantes é o que dá às agências uma independência orçamentária. Elas negociarão seus recursos diretamente com o Ministério do Planejamento. Hoje, essa negociação passa também pelo ministro da área. As novas normas serão submetidas a audiências públicas e não poderão ser modificadas sem uma análise de custo e benefício dessa alteração. / L.A.O.

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Pouco aperto agora, muito depois? Leia a resposta da equipe econômica à pergunta de Felipe Salto, assessor econômico do Senado, sobre a PEC do Teto FONTE JORNAL O ESTADO de S. PAULO,22 Outubro 2016 às 18h30 Foto: Divulgação

Felipe Salto, especialista em contas públicas Felipe Salto, especialista em contas púlbicas e assessor econômico do Senado Federal: "A PEC determina que se aplique a inflação do ano anterior para reajustar os gastos do ano seguinte. Ao meu ver, há um desbalanceamento aí. Isso gera um esforço muito pequeno no curto prazo. A inflação do ano que vem tende a rodar em torno de 4,5%, mas vai se usar como indexador a inflação deste ano, 7,2%. Você está autorizando aumento real, acima da inflação. Lá na frente, porém, a aplicação dessa regra, sem nenhuma mudança, vai gerar enormes superávits (economia de recursos), perto de 6% do PIB (Produto Interno Bruto). Não seria melhor que, a partir de uma determinada taxa de crescimento, o indexador fosse alterado: a meta de inflação, mais o crescimento do PIB, por exemplo? Resposta da equipe econômica: A regra da PEC 241 é balanceada. A evidência está no Projeto de Lei Orçamentária de 2017, já formulado nos termos da PEC, no qual as despesas discricionárias estão bastante contidas em relação a 2016. Ao estipular uma elevação nominal das despesas primárias da ordem de 6,8% para uma inflação estimada para 2017 em torno de 5,04%, o crescimento real da despesa seria de 1,7% no próximo ano. Trata-se de significativa desaceleração da despesa em relação ao passado recente. Segundo dados do Resultado do Tesouro Nacional, a elevação nominal das despesas primárias do governo central nos últimos dez anos (2006 a 2015) foi, em média, de 12,6% ao ano. Nesse período, a despesa anual teve crescimento real médio de 6,4%.

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Adicionalmente, não há possibilidade de se produzir resultado primário excessivo no longo prazo. Esse tipo de previsão baseia-se na manutenção da regra de crescimento do gasto pela inflação por 20 anos, sem mudança no décimo ano. A regra de crescimento real da despesa primária pela inflação do ano anterior é para os primeiros dez anos. A partir desse prazo, o presidente da República pode definir uma nova regra a cada quatro anos pelo período dos próximos dez anos.

Empreiteiras dizem que prefeitura mandou paralisar diversas obras Aeerj conta ter recebido 26 notificações de companhias do setor, relatando a ordem do município, que nega FONTE JORNAL O GLOBO, CARINA BACELAR 23/10/2016 ÀS 04H30

Obra suspensa de uma das estações do BRT Transbrasil: prefeitura anunciou que trabalhos seriam retomados em setembro, mas nada foi feito até agora - Agência O Globo / Antonio Scorza RIO — No apagar das luzes do primeiro turno eleitoral, a prefeitura teria determinado, na maior parte das vezes informalmente por meio de seus fiscais, que dezenas de obras na cidade parassem, sem informar o motivo aos responsáveis pelos trabalhos. É o que afirma a Associação de Empresas de Engenharia do Rio de Janeiro (Aeerj), que conta ter recebido, depois do primeiro fim de semana deste mês, 26 notificações de companhias do setor, relatando a ordem do município. Essas construtoras, segundo a Aeerj, são responsáveis por pelo menos 26 obras, principalmente de urbanização. Alguns canteiros do programa Bairro Maravilha, por exemplo, estão na lista. Veja também: 

Obra do Transbrasil não tem data para ser retomada

'A cidade vai manter o ritmo de obras', garante Paes 69


Usuários de droga continuam sob viaduto da Avenida Brasil

Com parte das obras concluída, paisagem começa a mudar na Avenida Brasil O presidente da associação, Luiz Fernando dos Santos Reis, diz que o governo está sem dinheiro para honrar contratos. Segundo ele, depois da ordem da prefeitura, os empresários estão desmobilizando aos poucos os canteiros, e muitas obras devem parar em novembro. Esta semana, o prefeito Eduardo Paes decretou que valores só podem ser empenhados pelo município até o último dia deste mês. Só despesas com pessoal e benefícios sociais, precatórios, obrigações tributárias e as financiadas com operações de crédito podem ser liquidadas até 15 de dezembro. — Foi uma grande surpresa. A gente achava que os contratos iam ter continuidade. Sabíamos que, com a mudança de prefeito, haveria uma interrupção para auditoria. Mas a ordem verbal de suspensão das obras não era esperada. Isso vai criar o caos total no setor — diz Luiz Fernando. — A prefeitura está quebrada, parando. A situação é caótica. Procurado, o governo disse desconhecer as ordens para a paralisação de obras e negou ter qualquer dívida com construtoras. “Todas as obras em andamento estão empenhadas”, declarou, em nota. Apesar de o município ressaltar que todas as empresas são pagas em dia, a Aeerj estima em cerca de R$ 700 milhões as dívidas da prefeitura com as empreiteiras por serviços executados e não pagos. Em e-mails recebidos pela Aeerj e obtidos pelo GLOBO, empresários relatam ter sido surpreendidos pela decisão do município de desmobilizar os canteiros. Um deles conta que a prefeitura chegou a pedir que as obras fossem executadas com “força total” antes do primeiro turno das eleições e depois determinou o contrário.

Manilhas numa rua em Campo Grande, onde obras de saneamento e calçamento foram interrompidas: construtoras afirmam que fiscais determinaram suspensão - Agência O Globo / Antonio Scorza “Sei que já é do seu conhecimento a ordem de paralisação das obras da prefeitura, feita verbalmente pelos responsáveis pela fiscalização destas. Passaram o ano todo, principalmente durante a campanha do candidato do prefeito, solicitando, até mesmo exigindo, que se 70


aumentasse a equipe, que se abrissem mais frentes, que se trabalhasse nos fins de semana para terem eventos para levar o candidato do prefeito nas localidades ou comunidades beneficiadas por tais obras. Agora, tendo fracassado essa candidatura, recebemos esse tipo de comunicação. Essa ação vai gerar enorme despesa de desmobilização, serviços por concluir”, contou um dos empresários, que, a pedido da Aeerj, não vai ser identificado. “UM DESCASO TOTAL COM A OUTRA PARTE” Outra empresa de engenharia relatou ter sido avisada, pela Secretaria municipal de Obras (SMO) e pela Secretaria municipal de Conservação (Seconserva), de que deveria encerrar os trabalhos. “Fomos surpreendidos com a comunicação, feita de forma fria pelos fiscais das obras, de encerramento dos contratos (mesmo com empenhos) já! De forma unilateral! Não deveríamos ter que concordar? Sequer irão pagar desmobilizações! Por enquanto, já fomos comunicados pela SMO e Seconserva. (...) Um descaso total com a outra parte”, reclamou. O GLOBO apurou que a obra de urbanização do Bosque do Tingui, em Campo Grande, parte do programa Bairro Maravilha, teria sido alvo de um dos pedidos de suspensão. Na comunidade, havia cinco operários num canteiro da prefeitura, mas os trabalhos pararam há mais de dez dias, segundo moradores. Na entrada do lugar, o asfalto é liso, mas, no interior, as ruas ainda são de terra. — A gente fica só com a poeira. Tem mais ou menos duas semanas que não vemos os operários da prefeitura. Eles estavam fazendo tudo direitinho, não sei se foi por causa da eleição que parou ou por outro motivo — diz a dona de casa Zulaine Rangel, moradora da região. A partir dos relatos, a Aeerj enviou à Secretaria de Obras e à Secretaria de Conservação um ofício pedindo esclarecimentos. “Algumas de nossas associadas foram surpreendidas com a comunicação, feita pelos fiscais das obras, de que deveriam ser encerrados de imediato os contratos em andamento, mesmo aqueles com empenho. Tal decisão, tomada de forma unilateral, terá repercussões para nossas associadas, causando desequilíbrio financeiro dos contratos, além de insegurança jurídica”, diz o documento assinado pelo presidente da associação. O secretário de Obras, Alexandre Pinto, respondeu à associação negando os episódios. A prefeitura, por outro lado, reconhece que há dez obras paradas. E exclui da conta o BRT Transbrasil, orçado em R$ 1,4 bilhão. No entanto, apesar de o município ter anunciado a retomada dos trabalhos em setembro, nada foi feito até agora. As obras suspensas beneficiariam principalmente comunidades pobres, como Turano, Acari e Cidade de Deus, com intervenções de urbanização, e Vila Cruzeiro, com uma nova escola e projetos de drenagem e contenção de encostas. Em nove casos, segundo o governo, as próprias empresas pediram a rescisão dos contratos. Entre as cinco obras da Fundação GeoRio, todas beneficiárias do programa PAC 2, o atraso dos recursos levou as construtoras a pedirem rescisão de contrato, alegando “inadequado fluxo financeiro”. O município diz que as intervenções “aguardam a finalização das negociações com a Caixa Econômica para que os recursos do Ministério das Cidades sejam liberados” e as obras continuem. No caso do Transbrasil, a Secretaria municipal de Obras informa ter determinado a retomada dos trabalhos no dia 22 de setembro, mas que o consórcio responsável pelas intervenções — 71


formado por Odebrecht, Queiroz Galvão e OAS — não remobilizou os canteiros. Há a informação de que o município não vem honrando o pagamento das empresas. Por nota, o consórcio admite apenas esperar “a regularização do contrato vigente para que as obras sejam retomadas”. MORADORES SAEM PREJUDICADOS Enquanto isso, muitos moradores das zonas Norte e Oeste desistiram de contar com o BRT em seus trajetos, depois de meses tendo viagens diárias atrapalhadas pelas obras do corredor na Avenida Brasil. Cristina Rodrigues, de 33 anos, mora na Praça Seca e, se pudesse, pegaria o Transbrasil para chegar à farmácia onde trabalha, na Maré: — Economizaria meu tempo. Hoje, quando tem trânsito, levo duas horas para chegar ao trabalho. Para o próximo prefeito, fica o desafio de lidar com o desemprego crescente no setor de construção. O ano de 2016 foi o que teve os valores licitados para obras mais baixos desde 2009. Segundo a Aeerj, foram lançados R$ 588,6 milhões em construções. De 2009 a 2014, os totais cresceram de R$ 297,8 milhões a R$ 6,8 bilhões. Em 2015, a tendência já era de queda: R$ 1,1 bilhão. — Hoje temos três mil trabalhadores no setor. Chegamos a 30 mil em 2015. A prefeitura perdeu a eleição e saiu do esquema — reclama o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada, Nilson Duarte. PROJETOS AINDA PARA ESTE ANO Apesar de improvável, a prefeitura promete desafiar o relógio e terminar todas as obras em curso até o final deste ano. A segunda linha do veículo leve sobre trilhos (VLT) é uma delas. Apesar dos buracos na região próxima à Central do Brasil e de as obras ainda estarem em andamento, o município garante que os primeiros testes no trecho entre a Praça da República e a Praça Quinze começam já este mês. O início da operação está previsto para novembro. Outra obra que ainda não foi inaugurada é a da reforma da ciclovia que liga o Leblon a São Conrado. Por causa do acidente ocorrido em abril deste ano, quando um trecho da pista desabou ao ser atingido por ondas, matando duas pessoas, o circuito entre os dois bairros ainda deve passar por inspeção antes de ser aberto. Entretanto, a prefeitura já publicou no Diário Oficial, semana passada, que a licitação para a instalação de alertas visuais na ciclovia, uma forma de proteger os ciclistas em dias de ressaca, está adiada. De uma lista de 63 obras que estavam paradas em julho, o governo afirmou já ter retomado 53. Uma delas é a revitalização do conjunto arquitetônico do Museu da Cidade, na Gávea. A intervenção, a cargo da RioUrbe e orçada em R$ 3,9 milhões, se arrasta desde 2011. Na área da saúde, há duas clínicas da família sendo construídas, ainda em estágio inicial, em Irajá. No local onde será erguida uma delas, segundo moradores e operários, a obra só foi retomada há dois meses, depois de dois anos parada. Já a segunda fase do projeto Escolas do Amanhã, de acordo com a prefeitura, ficará para 2017. É parte dos reduzidos montantes de investimentos orçados para o ano que vem. Este ano, o 72


orçamento para investimentos é de R$ 5,2 bilhões, mas, até outubro, conforme levantamento do gabinete da vereadora Teresa Bergher (PSDB), foram executados apenas R$ 2,7 bilhões. Em 2017, a previsão é de R$ 2,1 bilhões, 60% menos que em 2016.

75% das empresas do País têm avaliação negativa, diz S&P Embora o índice seja alto, agência identificou uma redução no número de rebaixamentos em setembro Fonte Altamiro Silva Junior, correspondente, Jornal O Estado de S. Paulo 20 Outubro 2016 às 22h56 Foto: Brendan Mcdermid Reuters

Lava Jato ainda é risco para o Brasil O rebaixamento das notas de crédito de empresas brasileiras está diminuindo, após alcançar um pico entre setembro do ano passado e fevereiro deste ano, mas a grande maioria das companhias, ao redor de 75%, ainda tem a perspectiva da nota negativa ou está em observação (“creditwatch”) negativa. Isso significa, segundo o diretor da agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) para ratings corporativos, Eduardo Uribe, que elas podem ter piora da avaliação nos próximos meses. Em setembro, ocorreu o menor número de rebaixamentos de 2016, segundo gráfico da S&P. “Começamos a ver um período de estabilização em nosso portfólio”, disse ele, ressaltando que empresas com perfil de negócios mais forte podem voltar a ter melhora das notas de crédito. Quando se consideram apenas as empresas com perspectiva negativa, o Brasil é o país da América Latina com o maior número de companhias com esse perfil (65%), seguido pela Colômbia (63%), Peru (18%) e Chile (15%). No México e na Argentina, a maioria possui perspectiva estável. Quando se inclui no porcentual do Brasil as empresas com “creditwatch” negativo, o total sobe para 75%, também o maior da região. 73


Uribe ressaltou que, no Brasil, a S&P já observou uma melhora da confiança das companhias na economia, o que pode levá-las a investir de novo. Ao mesmo tempo, apesar da melhora da percepção de algumas empresas brasileiras, o diretor mencionou que o desemprego continua aumentando e as vendas no varejo mal conseguem crescer. O diretor-gerente da S&P, Roberto Sifon-Arevalo, ressaltou ainda que a Lava Jato é uma fonte de risco significativo para o cenário no Brasil. Para 2017, Uribe afirmou que riscos de volatilidade da moeda brasileira e crescimento mais fraco da economia do que o esperado podem oferecer desafios para a qualidade do perfil de crédito das companhias do Brasil. Incerteza política, governo segurando gastos e persistência de baixos preços das commodities foram outros riscos citados por ele para o cenário das empresas brasileiras. A S&P prevê que o PIB do Brasil volte a crescer em 2017, com expansão estimada de 1,5%. Se confirmado, o movimento deve ajudar a América Latina também a crescer, depois de dois anos de retração da economia.

Agência de risco Moody's eleva nota de crédito da Petrobrás Apesar da melhora, a estatal ainda permanece com grau especulativo na qualidade do crédito a longo prazo Fonte Fernanda Nunes e Mariana Sallowicz, Jornal O Estado de S. Paulo 21 Outubro 2016 às 23h35  

Notícias relacionadas Petrobrás ‘ganha’ despesa de R$ 7,5 bi Petrobrás aprova venda de refinaria no Japão por US$ 130 milhões Foto: Fabio Motta/Estadão

Para a Moody's, o risco de liquidez da companhia diminuiu nos últimos meses Após cinco anos, a Petrobrás teve nesta sexta-feira, 21, a primeira melhora na sua nota de crédito pela agência de classificação de risco Moody’s. Apesar da revisão para cima, o rating da 74


petroleira continua sendo classificado como especulativo, cinco degraus abaixo do grau de investimento, indicador que funciona como um selo de boa pagadora para as empresas. O rating da petroleira foi de B3 para B2. Ao mesmo tempo, a perspectiva foi alterada de negativa para estável. A notícia traz alívio para a companhia, que perdeu o selo de boa pagadora em fevereiro do ano passado, em meio às investigações de corrupção pela Operação Lava Jato e preocupações com sua liquidez. À época, a Moody’s foi a primeira agência a tirar o grau de investimento da Petrobrás, movimento seguido pela Standard & Poor’s e pela Fitch. A agência destacou ontem uma melhora no perfil de liquidez da Petrobrás e no ambiente regulatório no Brasil nos últimos meses, que reduziram o risco de crédito da empresa. A agência também cita um melhor sentimento do mercado em relação ao Brasil, após o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, com resultante apreciação do real, o que reduziu os custos da empresa, seus gastos de capital e a alavancagem de seu endividamento. A revisão também incorpora evidência da capacidade da gerência da Petrobrás de avançar com suas estratégias financeiras e operacionais e compromisso com políticas financeiras conservadoras. A Moodys cita o plano de negócios de 2017-2021. A Petrobrás anunciou em setembro um corte de 25% nos investimentos previstos para o período. O plano estatal também inclui a vendas de ativos. A empresa espera levantar US$ 19,5 bilhões com a venda de ativos e parcerias nos anos de 2017 e 2018. No entanto, o risco de liquidez continua “significativo”, a dívida elevada (R$ 330 bilhões) e a empresa ainda tem diversas tarefas para entregar, disse a analista sênior da Moody’s Nymia Almeida em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado. “O principal problema são os US$ 27,3 bilhões que estão para vencer nos próximos dois anos e meio. É muito dinheiro para uma empresa que, em determinados momentos, consegue acessar o mercado, mas em outros não, seja por razões intrínsecas dela ou do próprio setor de petróleo”, destacou. Metas. A Petrobrás viu a revisão como um reconhecimento importante de seus esforços. Além disso, diz que a mudança reforça que as metas principais do planejamento estratégico anunciado recentemente são “compromissos importantes no processo de recuperação da companhia”. Entre as ações, está a redução do endividamento por meio do programa de parcerias e desinvestimentos, além da melhoria operacional. “No entanto, a diferença entre o rating atual e aquele que a companhia já teve evidenciam a relevância da execução e cumprimento das metas previstas no plano”, diz em nota. O anúncio foi feito com o mercado financeiro ainda operando. A Petrobrás já estava em alta quando a agência de classificação de risco Moody’s anunciou a elevação do rating da estatal, mas, depois disso, a trajetória se intensificou. As ações preferenciais (sem direito de voto) subiram 1,18%, enquanto as ordinárias (com direito de voto) valorizaram 1,90%. COLABORARAM GABRIEL BUENO DA COSTA E RENATO CARVALHO

PEC do Teto enfrenta novo teste nesta semana Projeto tem nova votação prevista para terça-feira, mas ainda suscita dúvidas até mesmo entre seus apoiadores; governo aposta na aprovação Fonte Alexa Salomão, Jornal O Estado de S. Paulo 22 Outubro 2016 às 18h30 Notícias relacionadas:  Entenda os principais pontos da PEC do teto 75


Assista ao vídeo explicativo da TV Estadão Apesar de tratar de uma legislação recheada de sutilezas jurídicas e muito economês, a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional sobre o limite de gastos para governo federal, a chamada PEC do Teto de Gastos, tem de tudo, menos tédio. Nas redes sociais, a proposta é demonizada. Nos embates no Congresso, virou instrumento de polarização do ainda tenso cenário de divergências partidárias. Para muitos especialistas, deve ser aprovada como está, mas alguns põem em dúvida sua utilidade. Leia também: Infográfico explica a PEC do Teto O Estado ouviu economistas que passaram as últimas semanas destrinchando a mecânica da PEC e contrapôs as dúvidas aos argumentos do governo, que joga todas as suas fichas na aprovação do projeto. O texto já foi aprovado em primeira votação na Câmara, com uma larga vantagem: 366 votos a favor e 111 contra. Volta ao plenário para votação em segundo turno na terça. Inicialmente, seria amanhã, mas o governo teve medo de que não houvesse quórum. Há um acordo prévio presumindo a que a PEC será votada em primeiro turno no Senado em 29 de novembro e, em segundo turno, em 13 de dezembro. Fora do Congresso, o debate sobre as mudanças é intenso. Apesar de a dinâmica ser simples – limitar o gasto de um ano pela inflação do ano anterior –, muitas são as perguntas e dúvidas em relação ao seu impacto e eficiência. Nem entre os seus defensores a PEC é tema consensual. Cautela. Como a regra vai vigorar por 10 a 20 anos, há quem peça cautela e serenidade na discussão para que se possa aperfeiçoar o texto. Mas existem os que defendem a rápida aprovação do já posto em trâmite. “O texto é perfeito como está: é uma maneira engenhosa de obrigar o País a fazer as reformas que precisa”, diz Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas – Ibre/FGV. Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, segue na mesma linha. Argumenta que, em vez de perder tempo com a discussão de “sutilezas”, o importante é aprovar a PEC e partir para o próximo capítulo do ajuste fiscal. “Precisamos seguir logo a reforma da Previdência, cuja conta é explosiva”. Há quase duas décadas especialistas alertam, em vão, que a Previdência é uma bomba-relógio. Seu gasto vem crescendo 4% acima da inflação e comprometendo um volume sempre maior do Orçamento. Com o teto, se esse avanço não for controlado, vai consumir os recursos de outras áreas. Segundo avaliação feita pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização da Câmara, sem a reforma, nos próximos 10 anos, o gasto com a Previdência vai praticamente dobrar – serão mais de R$ 360 bilhões acima do teto. “Se não fizerem a reforma da Previdência, apenas saúde e educação serão preservados.

Brasil é o País mais perigoso do mundo para transporte de valor, dizem empresas Em nenhum outro lugar o crime organizado ataca bases nem usa armas de grosso calibre e explosivos nas ações Fonte Alexandre Hisayasu, Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 03h00

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Notícias relacionadas: Vítima de estupro coletivo volta a ser molestada por criminoso em viatura Jogadora de vôlei do Fluminense é agredida por taxista em Ipanema

Foto: Tiago Queiroz/ Estadão SÃO PAULO - O Brasil é o País mais perigoso do mundo para transportar dinheiro em carrosfortes e guardá-lo em empresas de segurança. A afirmação é da Associação Brasileira de Empresas de Transporte de Valores (ABTV). Ela é baseada nos últimos ataques de criminosos feitos com o uso de armas potentes, como fuzis e metralhadoras calibre .50 – capazes de derrubar helicópteros –, explosivos e estratégia de guerra, que levaram cerca de R$ 140 milhões em ao menos quatro ações. “É um fato. Você não ouve relato desse tipo de assalto no resto do mundo. Tanto a carro-forte quanto a bases das empresas”, disse Marcos Paiva, presidente da ABTV. Empresas de valores reforçam segurança; veja fotos Segundo ele, as empresas de transporte de valores estão investindo na própria segurança para reforçar os prédios onde funcionam as suas bases, que guardam grande quantidade de dinheiro para ser transportado para bancos e empresas. “A tendência é aumentar a segurança das estruturas. Temos limitações legais, mas estamos trabalhando dentro daquilo que é possível. Investimos R$ 400 milhões nos últimos cinco anos no País em relação a esse aspecto”, disse Paiva. O Estado visitou uma empresa de transporte de valores. Logo na entrada, a novidade é um portão capaz de aguentar, junto com a blindagem da guarita e das paredes, tiros de fuzil e de metralhadoras. Dentro, há um verdadeiro labirinto com detectores de metais e esquemas especiais de segurança, onde uma porta de aço não abre sem que a primeira esteja completamente fechada.

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Outro detalhe é que a espessura da porta dos cofres foi bastante reforçada, com muitas camadas de aço. E se os criminosos ainda conseguirem passar por todas essas barreiras, que incluem pontos estratégicos com escudos que suportam tiros de calibre .50, os locais onde fica o dinheiro ainda têm máquinas de neblina, além de módulos de uma espuma de poliuretano, que isola o cofre com uma camada muito grossa, que só é possível retirar três dia após o uso. “Esse investimento todo visa a não só a proteção do dinheiro, mas também a do nosso funcionário”, disse Paiva. Ele defende um investimento maior no setor de inteligência das polícias e mais compartilhamento de informações. “Não podemos esperar a onda de assaltos passar. Não basta apenas reagir quando o crime acontece. É preciso investir em inteligência para prender o bandido antes. A Polícia Civil fez isso há dois meses, antecipou-se e apreendeu uma grande quantidade de armas pesadas”. Crimes. A sequência de ataques às empresas de transporte de valores começou em março, na sede da Protege, em Campinas; depois, em abril, na Prosegur, em Santos; em julho, também na Prosegur, em Ribeirão Preto. A última ação aconteceu em Santo André, em agosto. Neste último caso, nada foi levado. Segundo a apuração do Departamento de Investigações Criminais (Deic), as ações foram coordenadas pelos mesmos mentores. Antes negada pela Secretaria da Segurança Pública, a polícia investiga a participação de integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) nos crimes, conforme o Estado revelou em julho. Para a polícia, os ataques cessaram após a ação em Santo André, graças às prisões de nove suspeitos pelo Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcóticos (Denarc) e a apreensão de várias armas, incluindo um fuzil .50. Em nota, a Secretaria da Segurança afirmou que as polícias tomaram todas as providências necessárias para reprimir os assaltos. “Causa estranheza a declaração do presidente da associação, que participou de diversas reuniões do grupo de trabalho composto por integrantes da SSP, polícias Civil e Militar e seis representantes da ABTV”. A pasta diz que um encontro com associação – já agendado – poderá ser revisto após as declarações de Paiva. Ações criminosas. Depois do ataque à Protege, em Santo André, outros Estados registraram megaroubos a empresas de valores como os praticados neste ano em São Paulo. A polícia suspeita que as ações podem ter sido coordenadas pelo mesmo grupo de criminosos. As semelhanças são muitas: os bandidos usaram caminhões para impedir a chegada da polícia, bloquearam as vias de acesso às empresas, portavam fuzis e armas de grosso calibre e tinham especialistas em explosivos entre o bando. Em setembro, a sede da Prosegur, em Marabá, no Pará, foi atacada. Cerca de 30 criminosos usaram dois caminhões roubados que serviam para transportar madeira para chegar à empresa, na madrugada de uma segunda-feira. Dez homens vieram nos caminhões, enquanto os outros ficaram do lado de fora para dar cobertura aos comparsas. Foram usados explosivos para abrir os cofres. Na fuga, os veículos foram incendiados para dificultar a chegada da polícia. O valor roubado não foi divulgado. Dias depois da ação, um suspeito foi preso com R$ 300 mil. Na semana passada, bandidos armados assaltaram um carro-forte na divisa das cidades de Salgueiro e Cabrobó, em Pernambuco. O carro da empresa Preserve foi cercado pelos criminosos, que deram tiros de fuzil e renderam os vigilantes. O valor roubado não foi divulgado. A Polícia Civil está à procura de suspeitos, mas ninguém foi preso até agora.

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Para Marcos Paiva, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Transporte de Valores (ABTV), os bandidos são do crime organizado. “Eles vão para os lugares onde há mais facilidade. Eles migram de um lugar para outro”.

A gerente ‘invisível’ que atua em Cumbica Suzana Yeh é responsável pelas operações de companhia aérea dos EUA no aeroporto Fonte Redação Jornal O Estado de S. Paulo, 23 Outubro 2016 às 07h10

Suzana Yeh controla as operações da American Airlines De uma pequena sala no terminal 3 do Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos com vista para o pátio de manobras e para as pistas de pouso e decolagem, Suzana Yeh controla as operações da American Airlines, distante dos olhos dos cerca de 1,4 mil passageiros que diariamente embarcam e desembarcam nas aeronaves da companhia. “Para mim respondem os setores de cargas, manutenção, Premium Services, segurança, passenger services, check in, embarque e desembarque”, diz Suzana. Sua função é coordenar e fazer com que todas as áreas envolvidas nas atividades e serviços necessários à segurança e conforto de clientes e aeronaves sejam plenamente cumpridos sem afetar a pontualidade dos 37 voos semanais para Dallas, Nova York, Los Angeles e Miami. Há dois meses no cargo, Suzana é a primeira mulher a assumir o posto na AA no principal aeroporto do Brasil, Guarulhos, liderando uma equipe de 300 funcionários nessa importante base internacional da companhia aérea. 79


“Sou formada em administração de empresas com habilitação em comércio exterior e meu sonho era trabalhar em aeroporto”, conta. “O ambiente de trabalho me parecia muito dinâmico e eu não sou uma pessoa que gosta de ficar 8 horas sentada na frente do computador. Acho que a aviação oferece oportunidades de trabalho muito dinâmicas”. Embora sua rotina diária comece, assim que levanta pela manhã, na frente de computador consultando seus e-mails, seu trabalho exige caminhadas pelo aeroporto para conferir o andamentos dos serviços e manter contato com as equipes. Nada de ficar o tempo inteiro em sua sala. “São pelo menos 9.000 passos por dia”, conta Suzana. Ela também precisa fazer constantemente contatos telefônicos com todos segmentos envolvidos nos serviços feitos pela empresa ou prestados para ela. E ainda há as viagens de trabalho para a sede da companhia, em Dallas, no Texas. Ponto zero. Suzana entrou na American Airlines em 2003. “Comecei do zero”, diz, referindo ao fato de ter iniciado seu percurso na empresa como agente de segurança. “Era a vaga que existia. E, querendo ou não, também se trata de atendimento ao cliente no aeroporto. Aviação é isso. O que ela oferece aos clientes é atendimento. Então, pode ser segurança, pode ser para atuar no check in ou pode ser no setor de bagagem, é atendimento ao cliente”, afirma. “Por eu saber falar chinês, eu fui escolhida para trabalhar na área de segurança”, acrescenta a jovem. Depois de quatro anos nesse setor, ela foi transferida para o departamento de bagagem. “Fiquei dois anos lá, entendo todo o processo que envolve uma mala extraviada, como lidar como uma situação dessas no dia a dia”, conta. Em seguida, recebeu uma promoção. “Voltei para a área de segurança como supervisora. Fiquei três anos no cargo”. Durante esse período, Suzana permaneceu quatro meses em Brasília, onde a AA tem uma base pequena. “A empresa precisa de alguém experiente em segurança para cuidar a estação, porque ela era nova”. Posteriormente, ela se tornou coordenadora de segurança em São Paulo. E dá pistas sobre esse trabalho. “A questão da segurança não está apenas relacionada e entrevistas com passageiros, mas também existem procedimentos que devemos efetuar dentro das aeronaves, durante o embarque. Também existem procedimentos em relação às bagagens e em relação a cargas. Nessa época, eu cuidava da segurança do Brasil inteiro”. A experiência seguinte foi se tornar responsável pelo setor Premium Services. “Trata-se do setor responsável pela área VIP, que dos passageiros da primeira classe e da executiva”, afirma. Depois de quase dois anos nessa função, Suzana assumiu o cargo de gerente geral. Ela diz que a nova função não a assustou. “A empresa sempre prepara o profissional. Eu passei por muitos departamentos, e eu sempre fui desenvolvida para assumir um departamento”, lembra. “Por exemplo, saí da segurança e fui para Premium Services, que é totalmente diferente da segurança, mas a empresa me preparou para isso. A empresa sempre pesa quais são seus objetivos e quais são as metas que você precisa atingir para chegar lá”, diz. Ela admite que há dificuldades. “Claro, estou em uma nova função, existem muitos desafios e todos os dias aprendo novas coisas. É interessante todos os dias passar por uma situação diferente, penso que nunca vou ficar entediada.” Local recebe mais de 200 mil por dia e tem 30 mil trabalhadores

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A gerente-geral de American Airlines, Suzana Yeh, e sua equipe fazem parte das cerca de 30 mil pessoas que trabalham diariamente no oficialmente batizado Aeroporto Internacional de São Paulo / Guarulhos André Franco Montoro. Elas prestam serviços para uma das 42 companhias aéreas que operam no local, para as 230 lojas lá estabelecidas ou para dezenas de prestadoras de serviço que contribuem para essa “cidade” funcionar dia e noite. Afinal, o aeroporto congrega uma população flutuante diária entre 200 mil a 250 mil pessoas. Além de funcionários, esse contingente é formado por passageiros, seus acompanhantes e visitantes. No ano passado, foram registradas 295 mil operações aéreas, fazendo com que 38,9 milhões de passageiros passassem por Cumbica, indo ou chegando das mais diversas partes do mundo. De acordo com a administradora, a GRU Airport, há voos para 55 destinos internacionais e 44 nacionais. No primeiro caso, segundo dados de setembro último, as cidades mais procuradas são Buenos Aires, Santiago, Miami, Madri e Nova York. Em terras brasileiras, os destinos mais procurados são Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre, Curitiba e Salvador. A American Airlines é uma das companhias aéreas com maior movimentação de passageiros, superada apenas por Latam, Gol e Azul. Não é à toa que Suzana logo após acordar já fica de olho no computador. “A primeira coisa que faço é olhar meu e-mail. É para ver como está a operação. Se por acaso eu tenho voo atrasado, se há alguma situação que fuja da rotina”. Uma dessas situações não usuais enfrentada por Suzana, já como gerente-geral, foram os transtornos causados pelo furacão Mathew, que no início deste mês provocou o cancelamento dos voos para Miami. “Em casos assim, sempre consultamos a matriz. Ela diz que os voos vão sair tal hora e tal hora (fora dos horários habituais, antes e depois da passagem do furacão). Aí eu tenho de me preocupar se há pessoal para atender os dois voos ao mesmo tempo, preciso saber se temos finger para embarque e pessoas suficientes, não apenas para trabalhar no embarque, para fazer carregamento. Também tenho decidir quais equipamentos são necessários. Então, essas são os tipos de decisão que tomo”. O caso ainda envolveu encontrar acomodação para quem não conseguiu voltar para casa, para as equipes de bordo, além da realocação de equipes de terra para os serviços necessários.

Portugal se torna o ‘queridinho’ dos brasileiros País atrai comprador de imóvel por oferecer bons preços, segurança e visto permanente; preço médio vai de R$ 2 milhões a R$ 4 milhões Fonte Redação Jornal O Estado de S. Paulo, 23 Outubro 2016 às 07h05

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Aroldo Schultz mudou para Portugal com a família há cinco anos Márcia Rodrigues ESPECIAL PARA O ESTADO Depois de Miami, cidade americana, atrair muitos brasileiros interessados em comprar um imóvel, agora é a vez de Portugal, país da Europa, despertar esse interesse. A procura começou há dois anos, mas intensificou-se em 2016, segundo Gilberto Jordan, CEO do Belas Clube de Campos. “Com a crise econômica enfrentada por Portugal, há cinco anos, os preços dos imóveis caíram. Mesmo agora, que eles voltaram a ter uma valorização, ainda continuam atraentes”, diz. Ele conta que o fato de em Portugal se falar a mesma língua que no Brasil, de o País ter uma economia estável e proporcionar mais segurança e qualidade de vida, vem levando muitos brasileiros a buscarem um imóvel em terras lusitanas. O preço médio dos empreendimentos comprados por brasileiros é de R$ 2 milhões a R$ 4 milhões. As cidades preferidas são Lisboa, capital do País, e Porto, ambos representam 80% das vendas. Mas há, também, procura em cidades do entorno. Jordan conta que em Lisboa e nas cidades vizinhas há muitas townhouse (sobrados conjugados) e imóveis compactos, mas amplos, requerem pouca manutenção e demandam baixo custo. Um apartamento de 100 metros quadrados reformado no centro de Lisboa, custa em torno de 800 mil euros (R$ 2.746.960, cotação do dia 21 de outubro). Sem burocracia. Para comprar um imóvel em Portugal, não há necessidade de ter visto nem cidadania europeia. Aliás, quem adquirir um empreendimento no valor de 500 mil euros (R$ 1.716.850, cotação do dia 21 de outubro) ganha o visto permanente para o comprador e sua família, caso todos resolvam morar no País. Jordan comenta que, do ano passado até agora, já foram emitidos 200 vistos permanentes para brasileiros donos de imóveis. Quem for fechar o negócio à vista, só precisa registrar a escritura em um cartório. Há, ainda, a opção de financiamento com juros de até 4% ao ano. Jordan afirma que este interesse por Portugal não é uma exclusividade do brasileiro. 82


Franceses, suíços, ingleses, chineses e moradores de países do Oriente Médio também estão atrás de empreendimentos portugueses. Bilateral. Outra vantagem, segundo o advogado tributarista Jorge Zaninetti, é que um acordo bilateral entre o Brasil e Portugal possibilita pagar imposto de renda em apenas um dos dois países, o que evita a dupla tributação (mais informações nesta página). Há quatro meses o médico e empresário Adriano Piani Ozores, 48 anos, mudou para Portugal com a sua mulher e os três filhos. Ele comprou uma casa em Cascais, cidade próxima de Lisboa, mas não revela o valor que pagou. Por ser dono de um hospital em Salvador (BA), ele viaja duas ou três vezes por mês para o Brasil.

Adriano Piai Ozores “Como tem voo direto de Salvador para Lisboa, em oito horas eu estou em um dos dois países”, afirma. Ozores conta que, apesar de ter um apartamento em Miami, no Estado da Flórida (EUA), resolveu se mudar para o país lusitano por causa da familiaridade com a língua, pela qualidade de vida e segurança que sente nas ruas. “Aqui é possível andar tranquilamente, sem se preocupar com assalto ou outro tipo de violência”. Agora que já estão instalados, o próximo passo, de acordo com ele, é procurar uma oportunidade para abrir um negócio lá, provavelmente no ramo hospitalar. 83


O empresário Aroldo Schultz, de 47 anos, abriu uma filial da sua companhia de turismo em Portugal, há cinco anos, e resolveu mudar com a família para o país há dois anos. Ele comprou um imóvel na cidade de Belas, também ao lado de Lisboa, também visando a tranquilidade e a estabilidade econômica do País. “Comparado a outros países da Europa, Portugal tem um preço ainda acessível”, diz Schultz, sem revelar o valor pago no imóvel. Segundo o empresário, com a estabilidade econômica que Portugal vive atualmente, depois da crise, os imóveis já começaram a ter uma valorização. O dele, por exemplo, já poderia ser vendido por um valor 15% maior. “Os valores devem começar a subir a partir do ano que vem. Acredito que entre 30% e 40% com este aquecimento do mercado imobiliário”. Em Miami, volume cai, mas valor total de venda é mantido Miami, no Estado da Flórida (EUA), continua atraindo brasileiros interessados em comprar um imóvel de veraneio ou para investir. Mas, segundo especialistas, diferentemente do período do boom imobiliário, entre 2010 e 2014, quando muitos adquiriram casas e apartamentos de até US$ 500 mil (R$ 1.577.700, cotação do dia 21 de outubro), os valores agora atingem um público de classe AA e vão de US$ 1 milhão a US$ 2 milhões (R$ 3.155.400 e R$ 6.310.800, respectivamente, cotação do dia 21 de outubro). Léo Ickowicz, sócio presidente da Elite International Realty, diz que, apesar de o volume de vendas cair, o faturamento vem se mantendo próximo por conta dos valores mais elevados dos imóveis comprados. Em 2014, foram vendidos 300 imóveis, número que caiu para 200, em 2015, e 100 até agora, em 2016. O faturamento atingido foi de US$ 200 milhões, US$ 150 milhões e US$ 140 milhões, respectivamente “Hoje em dia o imóvel mais vendido é de US$ 1 milhão para cima. Nós sentimos que o brasileiro que tem um poder aquisitivo maior quer ter 20% do seu patrimônio no exterior. Segundo ele, esse público que compra um imóvel residencial aproveita e fecha negócio com um comercial, também, que vem gerando um rendimento de 7% ao ano.

Léo Ickowicz, sócio presidente da Elite International Realty Se comprar à vista, Ickowicz diz que é possível fazer a escritura por e-mail. Se for financiar, é preciso comprovar renda e o novo proprietário tem de ir aos EUA para fechar o negócio. “Quando o investidor declara no Imposto de Renda que tem salário fixo ou rendimentos oriundos de aluguel, é mais fácil. Se ele tiver dinheiro aplicado em ações pode demorar mais 84


porque os bancos veem esse investimento com cautela porque as ações podem ser vendidas a qualquer momento”. Diferentemente de Portugal, os EUA não dão visto permanente atrelado à compra de um imóvel. “O interessado tem de investir US$ 500 mil em algum projeto e depois de cinco anos pode receber este valor de volta e conseguir o visto”. Fernando Bergallo, diretor de câmbio da FB Capital, diz que, desde 2011 a sua empresa vendeu 1.500 imóveis em Miami para brasileiros. A maioria deles foi vendida entre 2011 e 2014. Ele confirma o que Ickowicz disse sobre a queda das vendas, mas não no faturamento. “Com a alta do dólar, as vendas começaram a cair no ano passado. Além disso, o preço do metro quadrado em dólar também teve uma grande valorização, algo em torno de 70%, desde 2012, quando os EUA enfrentaram a crise econômica, até agora.” Para Bergallo, na época do boom imobiliário dos EUA, Miami tinha imóvel mais barato do que um apartamento no Guarujá. Hoje, a realidade é outra. “Com R$ 600 mil era possível comprar um imóvel financiado com juros de 3,5% ao ano. Era mais fácil.” Hoje, de acordo com ele, a maioria dos seus clientes tem dinheiro no exterior e está buscando um investimento com foco na proteção patrimonial. O empresário Marcio Kogut, 43, é um deles. Ele comprou o primeiro apartamento, em 2013, para alugar e mais dois lançamentos, com outros investidores, para investir. “No primeiro apartamento eu paguei 40%, financiei 60%. Hoje com o aluguel eu consigo pagar o financiamento e o condomínio que, nos EUA, é de responsabilidade do proprietário”, conta. Kogut é dono de um fundo de startups que tem filial em Miami. O próximo projeto do empresário é abrir uma unidade também em Portugal. Convenção entre Brasil e Portugal permite que brasileiros com rendimentos no país lusitano paguem Imposto de Renda em apenas um deles. O acordo consta no Decreto n° 4.012/2011. Segundo o advogado tributarista Jorge Zaninetti, o acordo é específico para a tributação de IR e não engloba outros impostos como o IMI, que seria o nosso Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) ou o Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), que seria o nosso Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). “Assim que a compra for efetivada, o novo dono pagará o IMT e, anualmente, o IMT, que tem alíquota progressiva que varia de 1% a 6%”. Em um imóvel de até 92.407 euros, é cobrada a alíquota de 1%, por exemplo. Já para imóveis com valor acima de 574,323, a alíquota é de 6%. Para comprar um imóvel com o pagamento à vista em Portugal, segundo o advogado, basta fechar o negócio e registrar a escritura em um cartório. Se for financiado, o interessado deve procurar um banco, comprovar renda e apresentar seus documentos pessoais. EUA – Diferentemente do que em Portugal, o Brasil não tem acordo para evitar a tributação dupla com os Estados Unidos. Com isso, o brasileiro que tiver rendimentos naquele país, poderá, apenas, abater o valor pago lá fora no que deve no Brasil. Se ele pagou 15% sobre o seu rendimento nos EUA, por exemplo, e aqui no Brasil ele pagaria 27%, ele paga apenas a diferença de 12%.

Negócio itinerante vai aonde o cliente está Franqueadoras investem na criação de lojas móveis para atingir público diversificado Fonte Redação Jornal O Estado de S. Paulo, 23 Outubro 2016 às 07h05

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João Baptista Sundfeld Junior, em sua unidade móvel Não são apenas os artistas que precisam ir aonde o povo está. Empreendedores também estão apostando nessa máxima e criando negócios itinerantes, montados em caminhões, carretas e contêineres. Executivo da área financeira, João Baptista Sundfeld Junior estudava o mercado de franquias desde 2009. Em 2015, ao sair de uma empresa, decidiu que o momento de empreender havia chegado. Sua primeira loja física do Mercadão dos Óculos foi inaugurada em dezembro de 2015. A segunda, em maio deste ano. No final de junho, apostou na mobilidade e adquiriu uma loja sobre rodas da mesma marca. “O negócio tem tido ótima aceitação. As pessoas acham muito interessante, principalmente porque não é uma coisa improvisada, temos realmente uma ótica móvel”, conta. Pesando 900 kg a carreta é deslocada por meio de engate em outro veículo. “O carro precisa ter estrutura forte para que não haja nenhum risco. A loja itinerante tem capacidade para expor 300 óculos, enquanto na loja física exponho 500 unidades no máximo”. Sundfeld Junior tem levado sua loja para eventos nos finais de semana, como feiras de arte e de pets. “Em julho, fiquei uma semana na Riviera de São Lourenço, em Bertioga, participando de uma festa ‘junina’. Lá, um terço do faturamento foi obtido com a venda de óculos de grau. Algumas pessoas já tinham receitas e outras fizeram a compra e posteriormente mandaram a receita por WhatsApp. A tecnologia facilita o trabalho, fazemos muitas vendas dessa forma”. Ele diz que, ao participar de feiras, não precisa se preocupar com autorização, porque o organizador do evento é o responsável por todas as autorizações. “Para parar na rua é preciso ter alvará da Prefeitura. Uma opção que tenho adotado é estacionar em posto de combustível ou em estacionamento. Muitas vezes, nem preciso pagar nada, porque a loja atrai um fluxo diferente de pessoas para o ponto, o que é interessante para o proprietário do local”.

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Com a proximidade do verão, o empresário já está providenciando autorização para parar nas ruas de duas cidades do litoral paulista. “Poder ir atrás do público é a grande vantagem desse tipo de negócio. Além dos eventos, posso fazer parcerias com empresas e supermercados. O leque de opções é muito maior do que o de uma loja física. A experiência que tive no inverno foi muito boa, por isso, acho que no verão será melhor”. A unidade móvel do Mercadão dos Óculos custa a partir de R$ 79 mil e o prazo de retorno do investimento é estimado entre 12 e 18 meses. O faturamento mensal é de R$ 25 mil, aproximadamente. Antes de virar franqueado da marca de produtos de limpeza Ecoville, Ricardo Mendes era representante comercial de uma empresa de cosméticos. “Com o tempo, o fato de vender entre R$ 50 mil e R$ 60 mil por mês e ganhar 1% de comissão começou a me incomodar e resolvi vender meu carro e minha moto para investir R$ 65 mil em uma unidade móvel da Ecoville. Agora, ganho muito mais e já dei entrada em um carro novo”.

Ricardo Mendes, Franqueado Ecoville O empreendedor diz que sua área de atuação é na região da Grande Florianópolis. “Cada dia passo por um bairro. Uso um jingle produzido pela marca para anunciar a venda de desinfetantes, amaciantes etc. É um ótimo chamariz porque as donas de casa adoram os produtos da Ecoville e já ficam no portão esperando para efetuarem as compras”, afirma. Mendes tem intenção de comprar mais uma unidade e contratar uma pessoa para conduzir a loja itinerante. “Acho que em fevereiro terei condições de investir em outra unidade”. Consultora da Uniko – Inteligência em Franchising e Varejo, Cristiane de Paula afirma que existem várias vantagens de possuir um negócio itinerante. “O empreendedor pode, por exemplo, atingir o público que participa de feiras, shows, atividades esportivas etc. Esse tipo de negócio costuma reduzir o custo da operação e do mix de produtos ou serviços, facilitando o dia a dia e aumentando a margem de lucro”. Ela afirma, no entanto, que não se deve deixar de considerar a influência da condição climática no faturamento. “Em dias de chuva as pessoas costumam dar preferência a estabelecimentos fechados”. 87


Segundo ela, alguns municípios já regulam o negócio itinerante e estabelecem previamente locais e horários de estacionamento. “É importante ressaltar que a lei pode variar de acordo com cada cidade. Antes de investir neste modelo pesquise com profundidade. Uma alternativa bastante viável é estacionar em áreas privadas como em shoppings, universidades, estacionamentos particulares ou na área externa de empresas, tendo sempre uma autorização prévia”, diz. Cristiane afirma que o candidato a uma franquia de loja móvel deve se questionar se tem perfil para ser franqueado porque terá de seguir regras e padrões estipulados pela franqueadora. “Também deve escolher um segmento com o qual tenha forte identificação, além de avaliar o território de atuação estipulado pelo franqueador, assim como o plano de negócio, os investimentos necessários, taxas, ponto de equilíbrio, rentabilidade e a reputação da franqueadora”.

Cristiane de Paula, consultora da Uniko Modelo sobre rodas amplia área de atuação das marcas Fundador da Container Segurança, franqueadora especializada em locação de contêineres usados como depósito de material de construção em canteiros de obras, Ivan Zafalon afirma que a ideia de lançar um novo negócio surgiu quando viu que havia grande demanda para a locação de equipamentos de pequeno porte para construção civil, jardinagem, manutenção e limpeza. “A partir desta constatação, criamos a marca Gênio da Locação e adotamos o modelo de loja itinerante”. Segundo ele, entre as vantagens da loja móvel está o fato de não haver custo de ocupação 88


como aluguel e IPTU. “Outro ponto positivo é a possibilidade de levar o produto até o consumidor. Pelo fato de não haver estrutura física, o investimento total é R$ 150 mil. O faturamento bruto é 8% sobre o valor investido em equipamentos e de 35% a 45 % de margem liquida. A previsão de retorno do investimento é de 24 a 36 meses”. O empresário afirma que a própria unidade funciona como uma ação de marketing itinerante. “O modelo resulta em agilidade e rapidez na entrega, oferecendo ao cliente um atendimento personalizado”. Segundo ele, o franqueado tem uma área pré determinada de atuação com raio potencial de 7 km, definido por estudos de geomarketing. “Recomendamos que os franqueados estacionem a unidade em canteiros de obras, loteamentos e condomínios. A carreta articulada é transportada por meio de um sistema de engate em carros comuns”, afirma. O diretor de operações da franqueadora Sóbrancelhas, Jonathan Bernardes, conta que a marca lançou o modelo truck por considerá-lo ideal para ser instalado em pontos que não comportam uma loja física e nem o quiosque. “Na praia de Copacabana, por exemplo, é possível obter alvará da prefeitura e colocar uma unidade móvel para ficar instalada durante toda a temporada de verão. Dependendo do ponto, esse tipo de operação tem capacidade operacional maior do que a de uma loja instalada em shopping”. Segundo ele a unidade móvel tem de ser transportada por um caminhão modelo básico. “Nossa loja é construída a partir de um contêiner e tem nas quatro laterais estruturas hidráulicas que são ativadas quando a unidade é removida do veículo. A loja possui fachada e é equipada com ar condicionado, televisão e área para o atendimento das clientes”, conta.

Jonathan Bernardes, diretor de operações da Sóbrancelhas

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Bernardes afirma que todos os serviços prestados pela marca como design de sobrancelhas e visagismo, alongamento de cílios, aplicação de henna, limpeza de pele, depilação egípcia, tintura de sobrancelhas etc, podem ser feitos na loja itinerante, exceto a micropigmentação. O diretor diz que o investimento total para adquirir uma unidade móvel é R$ 180 mil. Lançada em 2013, a marca possui 173 unidades em operação, sendo 107 lojas físicas e 71 quiosques. “Estamos em processo de negociação avançada com três interessados em comprar a unidade móvel. Eles irão atuar nas praias de Bertioga, Santos e Rio de Janeiro”, conta. 'A PEC do Teto vai forçar o País a fazer reformas', diz pesquisador Para Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, as punições previstas em caso de estouro dos gastos vão obrigar o País a discutir como usar seu dinheiro Fonte Alexa Salomão, Jornal O Estado de São Paulo 23 Outubro 2016 às 06h59 Foto: Werther Santana Estadão

Para Samuel Pessôa, pesquisador da FGV, não se deve modificar a PEC: "é perfeita do jeito que está" Para o pesquisador e doutor em Economia, Samuel Pessôa, é a falta de clareza sobre a gravidade da crise que angaria opositores à Proposta de Emenda Constitucional que cria limites para os gastos da União – a PEC do teto dos gastos. “As pessoas não sabem, mas os números que temos sugerem que o quinquênio que vai de 2014 a 2018 será o pior em 120 anos”, diz. Segundo o pesquisador, a única alternativa à PEC seria o País aceitar o fato de que precisa fazer reformas, o que não vai ocorrer. Assim, o teto de gastos é o remédio necessário e “engenhoso”: se for cumprido, será ótimo; se não for, também. “Se não for cumprida (a PEC), gera um monte de problemas. A ideia é que esses problemas vão construir na sociedade a defesa das reformas. Essa é a mecânica”, diz ele. A seguir, os principais trechos da entrevista que concedeu ao Estado: 90


Na primeira votação, a PEC passou fácil, mas, no resto do País, nas redes sociais, por exemplo, se vê enorme oposição à proposta. Por quê? O Brasil avançou muito nos últimos anos e temos um Estado de bem-estar social. As pessoas não sofrem tanto quanto antes. Assim, não têm a dimensão da crise. Os números que temos sugerem que o quinquênio de 2014 a 2018 vai ser o pior em 120 anos. Vamos ter uma perda de PIB per capita (Produto Interno Bruto dividido pela população) de 8,1%. Esta crise é a mais profunda e a que tem maior extensão. Nas outras, caiu e voltou rápido. Não será assim agora. Vai demorar muito para voltarmos ao crescimento de 2013. Mas a PEC é mesmo necessária? Não há alternativas? Se conseguíssemos aprovar todas as reformas – fazer a reforma da Previdência; eliminar o abono salarial, que ficou anacrônico; reformar a Previdência dos Estados, que já tem um déficit de R$ 60 bilhões e logo vai chegar a R$ 100 bilhões – não precisaríamos da PEC. O problema é que o Estado quebrou, mas, ainda assim, não conseguimos fazer isso. Tudo para no Congresso. Porque cada reforma mexe no interesse de alguém. E cada pessoa que é atingida tem todas as razões do mundo para defender o seu. O oficial da PM, que prestou concurso com 25 anos e está com a expectativa de se aposentar com 50 anos de idade, sente que tem o direito líquido e garantido de receber do Estado a aposentadoria integral até morrer. E como garantir que a PEC resolva esse conflito? A PEC do teto é uma maneira engenhosa de superar isso. A PEC foi feita para não ser cumprida. Quando ela não for cumprida, virão as punições – não pode contratar, não pode dar aumento real de salário mínimo, não pode dar nenhum subsídio, fazer qualquer desoneração ou renovar desonerações que estão vencendo. Gera um monte de problemas. A ideia é que esses problemas vão construir na sociedade a defesa das reformas. Essa é a mecânica. É uma forma de forçar as reformas? É uma forma de forçar reformas, sem que a inflação o faça. Eu nunca tinha pensado nisso até agora, mas nesse sentido ela tem uma semelhança com o Plano Real, ainda que numa dimensão totalmente diferente. No Plano Real, você teve duas moedas, e a ideia era deixar a hiperinflação na moeda velha e não ter inflação na moeda nova. A PEC tem a ideia de deixar o conflito distributivo mais agudo antes que o efeito colateral desse conflito, que é inflação, apareça. A ideia é que a sociedade se mobilize para alocar os recursos dela de forma mais saudável. O que vimos até agora foi o contrário: categorias se mobilizaram para antecipar reajustes, ficar de fora da PEC e até derrubá-la. Não vejo assim. Na largada, deu-se mais dinheiro para a saúde e para a educação. Adiantou-se a regra para dar mais dinheiro à saúde, e a educação tem várias isenções. Mas vamos ter uma competição na frente. Nesse nosso Estado de bem-estar social tem saúde, educação e Previdência. Vai ficar claro que, mantendo a aposentadoria como está, não vai dar para gastar com saúde e educação. Mas várias categorias ainda se mobilizam contra a PEC. A PEC é um avanço em relação a carreiras como Legislativo, Judiciário, Tribunal de Contas, porque impõe limites. Mesmo que no começo tenham uma folga, em algum momento esse limite vai bater neles. Eles não conseguiram fazer o mesmo que o Legislativo e o Judiciário estadual conseguiram. Esses, sim, foram os únicos que ganharam mesmo até agora. E qual a explicação para isso? A explicação para isso eu soube outro dia. Na negociação do projeto de lei complementar de negociação de dívidas estaduais, governos federal e estaduais colocaram no projeto um item 91


que exigia a definição, com toda clareza, do que era gasto com pessoal para efeito de enquadramento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas isso tudo caiu na Câmara, por pressão dos legislativos e judiciários estaduais. A razão: efeito colateral ruim da lei da ficha-limpa. Tem muito deputado que está para ir para segunda instância do Judiciário estadual. Esses caras estão na mão do Judiciário e morrem de medo. Juízes, promotores, defensoria pública das Justiças estaduais pressionaram os deputados, que foram às suas respectivas bancadas no Congresso e tiraram isso do projeto. O que chegou aos meus ouvidos é que a sensibilidade dos deputados ao judiciário estadual é que uma condenação em segunda instância os torna inelegíveis para concorrer. Isso é problema grave porque a gente tem a Câmara na mão do Judiciário estadual. Mas mais cedo ou mais tarde, não vai ter jeito: a discussão volta aos Estados. Há risco de algo parecido ocorra na esfera federal e embole a tramitação da PEC? Até seria possível, mas, pelo modo que a PEC passou até agora, acho que não. O jogo está ganho para PEC? Para mim, a PEC já passou no Congresso. Aquela segunda-feira (quando ocorreu a primeira votação na Câmara) foi muito marcante. A gente voltou a ter um presidencialismo normal. Eu e dois cientistas políticos, Carlos Pereira e Frederico Bertholini, avaliamos vários indicadores e o que se vê é que a gestão política com Michel Temer nos devolveu à normalidade que existiu no período de Fernando Henrique Cardoso. Na verdade, a má gestão do presidencialismo de coalizão ocorreu no período petista. Portanto, por esse canal, a gente pode ter uma perspectiva mais positiva. O que você mudaria no texto da PEC que está em tramitação? Nada. Para mim, é perfeita do jeito que está. Para Fazenda, PEC do Teto de 20 anos facilita decisões Um ajuste mais rápido exigiria medidas mais radicais, como demissão de servidores, cortes nominais de vencimentos, abrupta extinção de programas, diz governo Fonte Alexa Salomão, Jornal O Estado de São Paulo 23 Outubro 2016 às 06h51 Em resposta às dúvidas dos economistas em relação à Proposta de Emenda Constitucional sobre o limite de gastos para governo federal, o ministério da Fazenda defendeu que o prazo da PEC de 20 anos, com a possibilidade de revisões a partir de 10 anos, é o mais adequado porque vai permitir a tomada de decisões de investimento de longo prazo num contexto de estabilidade e previsibilidade. “Um ajuste mais rápido exigiria medidas mais radicais, como demissão de servidores, cortes nominais de vencimentos, abrupta extinção de programas. A opção do governo foi pôr um prazo maior para viabilizar um ajuste gradual”, diz o texto, enviado ao Estado por escrito. A equipe econômica também ressaltou que diversos países adotaram regras de controle de gastos semelhantes ao Brasil, como Suécia, Estados Unidos, Finlândia e Holanda. O ministério destacou ainda que um eventual resultado primário obtido acima da meta poderá ser usado para quitar os R$ 170 bilhões em restos a pagar hoje existentes, grande parte deles referente a investimentos, saúde e educação. Isso não apenas privilegia essas áreas, diz o ministério, como também saneia um passivo do governo “Restos a pagar são dívida e precisam ser pagos. Ao fazê-lo, reduziremos gradativamente o orçamento paralelo que existe hoje”.

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Como os próximos anos precisam ser de austeridade, não está previsto no texto da PEC do teto exceções para que os próximos governos possam adotar política pública que coloquem em risco a saúde financeira do Estado – nem em caso de piora da economia global. “Dado o elevado desequilíbrio fiscal atual, déficit primário de R$ 170 bilhões (2,7% do PIB), déficit nominal de R$ 587 bilhões (9,6% do PIB) e dívida pública bruta de 70% do PIB, não há espaço fiscal para uma política anticíclica”, destaca o texto. Baixa qualidade da conexão à internet barra adesão à nuvem SXC

Armazenamento de dados na rede reduz custos, mas esbarra em questões técnicas

FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, BRUNO LEE DE SÃO PAULO 23/10/2016 às 02h00 Os serviços na nuvem -ferramentas de armazenamento e gestão que podem ser acessadas pela internet- ainda não caíram nas graças das pequenas e médias empresas.

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Mais da metade das companhias desse porte (69%) não utiliza o serviço. É o que mostra levantamento da AMI Partners com 251 responsáveis por compras na área de tecnologia. A pesquisa foi feita a pedido da Intel, fabricante de microprocessadores. Para Fábio de Paula, diretor da Intel para o mercado corporativo, a baixa qualidade da conexão à internet no Brasil ajuda a explicar por que os empresários não aderiram ao serviço. Além disso, diz, há uma "curva de adoção", tempo que uma tecnologia leva para se difundir. "Não é do dia para a noite. É preciso fazer um novo investimento, estudar e saber qual é a melhor opção para cada caso." Segundo ele, no entanto, é uma "onda sem volta". Isso porque uma das vantagens é a redução de custos, pois não há gastos com manutenção. "O empresário não precisa montar um 'datacenter' próprio. Transforma o que seria um grande investimento em despesa de operação", diz Rodrigo Tafner, coordenador do curso de Sistemas de Informação em Comunicação e Gestão da ESPM. Outra vantagem é poder contar com um sistema de segurança mais robusto. "É uma questão de lógica. Se ocorre o vazamento de dados de um site, a companhia que oferece o serviço coloca sua imagem em risco", diz Tafner. Na LocalChef, plataforma que conecta consumidores a chefs caseiros e a pequenos restaurantes, a hospedagem do site e a ferramenta de chat com clientes e cozinheiros, por exemplo, rodam na nuvem desde o começo da operação, há seis meses. Celso Misaki, um dos sócios, estima que o custo mensal das licenças de uso varia de US$ 2.000 a US$ 2.500. Se a estrutura fosse construída "em casa", o gasto inicial poderia chegar a US$ 25 mil. "As pequenas e médias empresas podem ter acesso aos mesmos benefícios das grandes por um preço acessível", diz Priscila Siqueira, vice-presidente da Oracle Digital América Latina, divisão de serviços na nuvem. Eletrobras negocia com a Fazenda liberação de R$ 1 bi para reforçar caixa Vanderlei Almeida - 14.abr.2011/AFP

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Imagem aérea da usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro

FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, JULIO WIZIACK DE BRASÍLIA 23/10/2016 às 02h00 O Ministério de Minas e Energia negocia com a Fazenda a liberação de mais R$ 1 bilhão em recursos do Tesouro para reforçar o caixa da Eletrobras ainda neste ano. A estatal já tinha conseguido R$ 3,5 bilhões, mas precisa de cerca de R$ 8 bilhões. Para fechar a conta, a diferença virá da venda de distribuidoras de eletricidade controladas pela estatal, que pretende se retirar desse ramo de negócio. "Só destrói o valor da empresa", disse à Folha o secretário-executivo do ministério, Paulo Pedrosa. Para que a privatização seja bem sucedida, o ministério prepara mudanças nas regras que tornarão essas empresas "mais atraentes". Queremos virar a página", disse Pedrosa. "O edital [dos leilões] resolverá alguns pontos pendentes que causavam insegurança aos interessados." Como as empresas que ganharem as concessões precisarão fazer investimentos maiores logo no início, serão admitidos lances menores do que em outros leilões e elas poderão ter suas tarifas revistas duas vezes no primeiro ciclo dos seus contratos. As regras anteriores previam o contrário: os investimentos eram menores no início dos contratos, o que viabilizava lances maiores nos leilões para engordar os cofres da União. E só podia haver uma revisão tarifária por ciclo, uma a cada quatro anos. Além disso, no caso das distribuidoras em dificuldades financeiras, as multas que receberam por causa de problemas na prestação de serviços no passado poderão ser anistiadas, em troca 95


de compromissos com investimentos logo no início do contrato. Quem conseguir reduzir perdas de energia das distribuidoras com "gatos" e ineficiências poderá incorporar os ganhos ao resultado financeiro. Essa mudança vai melhorar o valor de mercado da distribuidora do Amazonas, onde as perdas são maiores do que as receitas geradas pelo consumo de baixa tensão, segundo bancos de investimento envolvidos na avaliação. RISCO A prova de fogo, disse Pedrosa, será a venda da Celg, distribuidora de Goiás que tem a Eletrobras como sócia. Desde o fracasso da primeira tentativa de venda, no governo Dilma Rousseff, a ideia passou a ser "diminuir a percepção de risco [do negócio]". Uma das mudanças será a extensão do prazo para realização dos investimentos exigidos pelo contrato de concessão vigente por dois anos. Seis grandes grupos já procuraram o governo interessados na Celg. O lance mínimo é de R$ 1,8 bilhão e quem vencer assumirá uma dívida de R$ 2,4 bilhões. O governo acredita que as ofertas ficarão próximas do valor mínimo definido para a empresa. Os chineses da State Grid, que acabaram de comprar o controle da CPFL, são os candidatos mais fortes a ficar com a Celg. Analistas do setor acreditam que os chineses se consolidariam no país com esse negócio. Para eles, quem comprar a estatal se tornará um candidato à compra da CEB, distribuidora do Distrito Federal, que deve ser colocada à venda em breve. Caso a privatização seja bem sucedida, o governo avalia que haverá redução tarifária. "Hoje, o governo é responsável pelas piores distribuidoras [do setor]", afirmou Pedrosa. "Como as tarifas são definidas pelo conjunto das distribuidoras, consumidores em Estados com boas distribuidoras pagam mais caro." ELETROBRAS / 2º tri 2016 Faturamento R$ 33 bilhões Ebitda R$ 23 bilhões Lucro líquido R$ 13 bilhões Dívida R$ 18 bilhões Subsidiárias Furnas, Chesf, Eletronuclear e outras 11 empresas

Petrobrás e Total fecham aliança estratégica para produção e exploração Estatal oferecerá parcerias em projetos no Brasil, enquanto a Total irá propor oportunidades no exterior Fonte Marcelle Gutierrez, Jornal O Estado de S. Paulo 24 Outubro 2016 às 10h12 96


Notícia relacionada: Com alta de 170% nas ações, Petrobrás começa a reverter efeitos da Lava Jato Foto: Agência Petrobrás

Petrobrás e a Total são parceiras em 15 consórcios de exploração e produção SÃO PAULO - O presidente da Petrobrás, Pedro Parente, e da Total, Patrick Pouyanné, assinam hoje memorando de entendimento para consolidação de aliança estratégica nos segmentos de Exploração e Produção (E&P) e Gás e Energia (G&E) no Brasil e oportunidades potenciais no exterior. "A partir desse memorando, as empresas se comprometem a avaliar conjuntamente oportunidades no Brasil e no exterior em áreas-chaves de interesse mútuo, beneficiando-se de suas reconhecidas experiências em todos os segmentos da cadeia de óleo e gás", informou a Petrobrás, em comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No segmento de E&P, Petrobrás oferecerá parcerias em projetos no Brasil, enquanto a Total irá propor oportunidades no exterior. "Essa nova aliança permitirá que as duas companhias potencializem suas experiências e competências técnicas no desenvolvimento de águas profundas, visando otimizar a produção e desenvolver essas atividades no Brasil e em outras províncias promissoras de óleo e gás, compartilhando custos e riscos em projetos de alta complexidade e elevados investimentos", comunica a estatal petroleira. No ramo de G&E, as companhias desenvolverão atividades conjuntas na área de gás natural e energia elétrica no Brasil. O memorando prevê ainda uma segunda fase da aliança para todos os segmentos de refino e gás natural. Segundo o comunicado, a Petrobrás e a Total são parceiras em 15 consórcios de exploração e produção, sendo nove no Brasil e seis no exterior. No Brasil, são parceiras na área de Libra pelo regime de partilha de produção. No exterior, são parceiras no campo de Chinook, no Golfo do México nos EUA, no campo de águas profundas Akpo, na Nigéria, e nos campos de gás de San Alberto e San Antonio/Itaú, na Bolívia, além de serem sócias no gasoduto Bolívia-Brasil. 97


Com alta de 170% nas ações, Petrobrás começa a reverter efeitos da Lava Jato Valorização dos papéis ao longo do ano fez a petroleira sair do 11º para o 8º lugar na lista das maiores companhias globais do setor, mas ainda está longe de recuperar selo de boa pagadora Fonte Fernanda Nunes, Mariana Sallowicz e Vinícius Neder do RIO, Jornal O Estado de S. Paulo 24 Outubro 2016 às 05h00    

Petrobrás: Moody's eleva nota de risco da Petrobrás Petrobrás 'ganha' despesa de R$ 7,5 bilhões Brookfield mais perto da Odebrecht Ambiental Empresa tem desafios à frente, diz Moody's Foto: PAULO WHITAKER | REUTERS

Apesar de ainda carregar o título de petroleira mais endividada do mundo, a Petrobrás começa a reconquistar a confiança dos investidores e a reverter os estragos deixados pelas denúncias de corrupção levantadas pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Com uma alta de 168% em suas ações acumulada no ano, a estatal já conseguiu subir neste ano três degraus em um ranking de valor de mercado que reúne as grandes companhias do setor. A estatal, que chegou a ocupar o terceiro lugar em maio de 2008, hoje é a 8.ª colocada. Em janeiro deste ano, seu pior momento, estava na 11.ª posição. Em entrevista exclusiva ao Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, o presidente da estatal, Pedro Parente, comemora a escalada, mas diz que “a parte mais difícil vem agora”. “Executar um plano que inclui redução de custos e de investimento, sem reduzir

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metas e com ganho de produtividade, além de um programa de desinvestimento relevante, requer muita disciplina.” O projeto da Petrobrás é correr com os ajustes para alcançar, em 2018, os mesmos indicadores das petroleiras que possuem grau de investimento, o selo de boa pagadora que perdeu em fevereiro de 2015. A principal meta é a redução do comprometimento do caixa com pagamento de dívida. A ideia é chegar a um indicador de alavancagem (relação entre dívida líquida e geração de caixa) de até 2,5 em dois anos. Hoje, o indicador está em torno de 5. “Desejo o grau de investimento o mais cedo possível. A gente tem de fazer a nossa parte e o ‘upgrade’ (elevação da nota de risco) vem como consequência”, acrescentou Parente.

Risco. Na última sexta-feira, a agência de classificação de riscos Moody’s elevou a nota da companhia, mas continuou indicando ao mercado que a petroleira ainda não faz parte do seleto grupo de empresas isentas de risco. A companhia continua com grau especulativo e precisa avançar cinco degraus para recuperar o selo de boa pagadora. Um dos pontos de alerta é a investigação criminal sobre a companhia nos Estados Unidos, relacionada a corrupção e suborno. A ação afetará negativamente o caixa da empresa em um montante que ainda não está claro, destacou a Moody’s. Também na sexta, a estatal anunciou que fechou acordo para encerrar quatro ações individuais contra a empresa, no valor de US$ 353 milhões. Essas ações tramitam em conjunto com outras 23, além de uma ação coletiva, em Nova York. A Petrobrás colhe hoje os benefícios da melhora do mercado internacional de petróleo. A empresa tem ganhos também com o resultado da alta do real frente ao dólar, por causa do alto endividamento em moeda americana. Para o mercado financeiro, também foram positivas as mudanças regulatórias feitas pelo presidente Michel Temer, que promete reduzir a interferência do governo em seus negócios. 99


A principal delas foi a que libera a operação do pré-sal a qualquer petroleira, e não só à Petrobrás. O mercado avalia que suas reivindicações para o setor estão sendo contempladas por Parente, pelo Executivo e pelo Congresso. O contentamento é indicado pela valorização das ações da empresa. O banco Credit Suisse, por exemplo, já não acredita que a União, sócia majoritária, deve capitalizar a estatal, como afirmou o presidente do banco, José Olympio Pereira, em entrevista ao Estado, em março. A avaliação do banco é que o cenário internacional ajudou a Petrobrás a superar o pior momento e que a administração passou bem pela turbulência, cortando custos, reduzindo investimentos e vendendo ativos. Diante desse cenário, a tendência dos financiadores é reduzir a taxa de juros cobrada em empréstimos, o que faz com que a empresa já não dependa do Tesouro para quitar dívidas com vencimento no curto prazo. Relatório do Bradesco BBI aponta que a mudança regulatória que liberou a operação do présal abriu espaço para que a estatal venda fatias em projetos na região e engorde seu caixa. Um analista de um grande banco lembra que a recuperação da empresa não pode ser medida só pelo preço da ação. Apenas depois da concretização de todos os projetos financeiros e operacionais é que será possível dizer que a crise na estatal ficou no passado. No entanto, o mesmo analista diz que ainda há espaço para valorização dos papéis. “No começo do ano, a Petrobrás fazia as contas de quando ia quebrar porque o mercado de dívidas estava fechado e a geração de caixa não cobria as dívidas de curto prazo. Agora, o momento é outro”.

Programa ‘CEO por um dia’ entra na reta final de seleção Nesta semana, serão conhecidos os 16 universitários que ‘seguirão’ um presidente Fonte Jornal O Estado de S. Paulo, Redação 24 Outubro 2016 às 07h24

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Marcello Spinelli, diretor presidente da VLI O programa CEO por um Dia entra na reta final de seleção nesta semana, quando serão conhecidos os 16 estudantes universitários que acompanharão a rotina de trabalho do principal dirigente de uma grande companhia. Na última quinta-feira, foram conhecidos os 25 jovens que agora estão sendo entrevistados. É deles que surgirão os 16 ‘sombras’ que seguirão todos os passos do CEO para o qual serão designados. Realizado pela consultoria de executive search Odgers Berndtson com apoio do Estado, PDA International e Machado Meyer o projeto oferece, aos escolhidos, uma visão privilegiada de administração, gestão de pessoas, estratégias a partir da posição de um presidente de empresa. Coordenador do programa e diretor da Odgers, Ademar Couto afirma que a entrevista com os diretores da empresa serão um tipo de coaching para os jovens. “Sempre acabamos comentando algo a respeito deles, do perfil, e da carreira deles”. O presidente da Odgers, Luiz Wever, diz que o todo o processo de seleção dos jovens “é muito interessante”. O motivo, esclarece, é que tratase de uma maneira de se atualizar em relação ao capital intelectual dos jovens. Um dos 16 dirigentes que participam do CEO por um Dia, Marcello Spinelli é diretor-presidente da VLI, a antiga Vale Logística, e diz que o fato de estar engajado no programa ajuda a aproximar a empresa dos jovens. “Aqui na VLI temos um propósito firme de transformar a logística do País. Isso não é chavão de empresa, é o que acreditamos mesmo”, afirma Spinelli. “E nós gostamos de formar a nossa própria liderança, gostamos de promover as pessoas dentro de casa. Então, o que fazemos é buscar jovens talentos e trazê-los para a VLI”. De acordo com o dirigente, o programa de trainee da empresa é uma forma de atrair essas pessoas e prepará-las para serem líderes da companhia. “Conheço essa escola de aprendizado que é um programa trainee. É uma ferramenta que particularmente gosto muito. E quem seleciona os talentos é a própria VLI, isso nós não delegamos. Eu faço questão de entrevistar todos os finalistas”. Segundo o executivo, ao longo do tempo ele aprendeu que a melhor forma de selecionar as pessoas é conhecendo suas histórias. “Saber se essas histórias têm a ver com a nossa história também, com os nossos valores. E como nós gostamos de conhecer as histórias da pessoas, participar do CEO por um dia é uma forma de mostrar a nossa história também para esses jovens, aproximar a VLI desse público”, diz Spinelli. “Eu quero que o jovem me acompanhe em um dia bastante usual da minha rotina. Acredito que será um dia bastante animado. Quero levá-lo para conhecer uma unidade operacional nossa que está em expansão em Santos. É um grande investimento, mais de R$ 2 bilhões, um porto da VLI que está sendo ampliado”, conta. “Também quero que ele acompanhe uma reunião com a minha diretoria para entender a dinâmica do nosso trabalho. Quem sabe também podemos encerrar o dia com uma reunião com um cliente da VLI”, diz Spinelli, que é engenheiro de produção formado pela USP, tem especializações no IMD Business School, Kellogg School of Management e MIT – Massachusetts Institute of Technology. Ele iniciou sua carreira na Ambev como trainee, passou pelo Submarino e em 2002, ingressou na Vale. Atuou em diversos departamentos como comercial, portos, ferrovias e logística de carga geral. A partir da criação da VLI, em 2010, torna-se diretor-presidente da empresa. OS 25 ESCOLHIDOS 101


Daqui, sairão os 16 finalistas: Abdallah Madi Aline Neves de Azevedo Beatriz Schnaidman Caio Swan de Freitas Denise de Lima Ferreira Felipe Scaquetti Fernando da Silva Trindade Janis Christoph René José Luiz Bosco Junior Júlia Figueiredo Pinto Larissa Tobar da Costa Leonardo Nardini Bock Leonardo Yun Ho Lee Lucas Almeida Tejada Marcelo Augusto Paiva dos Santos Pereira Marcelo Martins Patricia Harumi Suzuki Pedro Rodrigues Figueiredo Rafael Cardoso Ferreira Tymo Nakao Vagner de Araújo Jesus Verônica Pricoli Scheel Victoria Pinto da Silva Jardim Vinícius Costa Soares Willyan Hideki Watanabe EMPRESAS & CEOS Veja a lista completa dos dirigentes das 16 companhias que participam do programa CEO por um dia: Avianca Fernando Pedreira BD Esteban Rossi Bridgestone Fabio Fossen DHL Javier Bilbao Epson Fernando Stinchi Falconi Mateus Bandeira Laureate Brasil José Roberto Loureiro Makro Brasil Roger Laughlin Man/Volkswagen Roberto Cortes Natural One Ricardo Ermírio de Moraes

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PWC Fernando Alves Siemens Paulo Ricardo Stark UBS Sylvia Coutinho VLI Marcello Spinelli Volvo Cars Luis Rezende Votorantim Cimentos Walter Dissinger

Após BC cortar juros, mercado vê inflação menor este ano O Relatório Focus prevê a Selic no fim de 2016 em 13,50%, o que significa um corte maior na próxima reunião; expectativa para inflação este ano passou de 7,01% para 6,89% Fonte Fabrício de Castro, Jornal O Estado de S. Paulo 24 Outubro 2016 às 09h08    

Notícias relacionadas: Para o consumidor, efeito da queda da Selic no bolso vai demorar Com início do ciclo de baixa do juro, é hora de começar a rever apostas Temer diz que corte dos juros é sinal positivo para a economia brasileira Apesar da queda de juros, fundos ainda ganham da poupança BRASÍLIA - Após o Banco Central ter reduzido a Selic (a taxa básica de juros da economia) e atualizado suas projeções de inflação na última quarta-feira, os economistas do mercado financeiro também reduziram suas previsões para os índices de preços em 2016 e 2017. O Relatório de Mercado Focus mostra que a mediana das expectativas para o IPCA - o índice oficial de inflação - este ano passou de 7,01% para 6,89%. Há um mês, estava em 7,25%. Já a projeção para o índice no ano que vem foi de 5,04% para 5,00%. Há quatro semanas, apontava 5,07%. Em sua decisão de política monetária, o BC reduziu a Selic de 14,25% para 14,00% ao ano. Além disso, condicionou cortes maiores a uma inflação menor no setor de serviços e ao avanço do ajuste fiscal. Como a taxa Selic influencia sua vida? O Relatório de Mercado Focus trouxe que a mediana das previsões para a Selic no fim de 2016 permaneceu em 13,50% ao ano. Na prática, se confirmado, isso significará um corte maior - de meio ponto porcentual - que o promovido na semana passada pelo BC (de 0,25 ponto porcentual). Há um mês, os economistas esperavam que a Selic terminasse 2016 em 13,75%. Para o fim de 2017, a projeção do Focus permaneceu em 11,00% ao ano, mesmo nível de um mês atrás. Em sua decisão da semana passada, o BC condicionou cortes maiores da Selic a uma inflação menor no setor de serviços e ao avanço do ajuste fiscal. A instituição também atualizou suas projeções para a inflação nos próximos anos, pelo cenário de referência: 7,0% em 2016, 4,3% em 2017 e 3,9% em 2018. Já o IBGE informou na sexta-feira

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que o IPCA-15 de outubro subiu 0,19%, o que é a menor taxa para o mês desde 2009. No ano, a alta acumulada é de 6,11% e, em 12 meses, de 8,27%. No relatório Focus, entre as instituições que mais se aproximam do resultado efetivo do IPCA no médio prazo, denominadas Top 5, a mediana das projeções para este ano passou de 7,02% para 6,89%. Para 2017, foi de 5,13% para 5,03%. Quatro semanas atrás, as expectativas eram de, respectivamente, 7,30% e 5,50%. Já a inflação suavizada 12 meses à frente voltou a ceder, passando de 5,05% para 4,95% de uma semana para outra - há um mês, estava em 5,16%. Entre os índices mensais mais próximos, a estimativa para outubro passou de 0,35% para 0,30%. Um mês antes, estava em 0,40%. No caso de novembro, a previsão do Focus foi de 0,45% para 0,40%. Há quatro semanas, era de 0,46%. No Relatório Trimestral de Inflação (RTI), divulgado no fim de setembro, o BC havia apresentado suas estimativas mensais para o IPCA: 0,40% para outubro e 0,45% para novembro.

Com início do ciclo de baixa do juro, é hora de começar a rever apostas Renda fixa vai perder competitividade com mais cortes da Selic; fundos multimercados são indicados Fonte Hugo Passarelli, Jéssica Alves e Natália Cacioli, Jornal O Estadão Conteúdo 24 Outubro 2016 às 07h15    

Notícias relacionadas: Temer diz que corte dos juros é sinal positivo para a economia brasileira 'Prévia do PIB' indica que retomada será lenta e abre espaço para novo corte de juros Queda do juro terá pouco efeito para o consumidor Apesar da queda de juros, fundos ainda ganham da poupança O corte da taxa básica de juros pelo Banco Central na semana passada, para 14% ao ano, marca o início de um processo que deve se alongar pelos próximos dois anos. Algumas instituições do mercado financeiro já preveem que a Selic pode caminhar para a faixa de um dígito ao fim de 2018, a 9,75% ao ano, cenário que tira parte do conforto da renda fixa, que alia boa rentabilidade e baixo risco, e exige novas estratégias. "Se o investidor quiser assegurar a mesma rentabilidade de agora, vai precisar se arriscar mais", diz o sócio-gestor do home broker Modalmais, Rodrigo Puga. Isso não significa que a renda fixa vai deixar de ser vantajosa, mesmo porque o Brasil deve continuar no topo do ranking de juros reais do mundo - mas a rentabilidade será menor.""Todo ciclo de baixa da Selic abre espaço para uma gama maior de investimentos", afirma Jason Vieira, economista da gestora Infinity.

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Foto: Infográficos/Estadão

A consultora de investimentos da Órama, Sandra Blanco, indica uma calibragem gradual das aplicações. "Quem estiver com uma carteira conservadora, com tudo em renda fixa pós-fixada, deve rever as opções". Para assegurar taxas mais altas agora, os analistas recomendam títulos prefixados, ou seja, aqueles que já estão com a remuneração definida no momento da aplicação. Segundo Puga, ainda em 2016 deve ocorrer uma migração de investimentos pós-fixados para prefixados. O investidor deve ficar atento, no entanto, ao prazo de resgate. Ronaldo Patah, estrategista de investimento do UBS Wealth Management, alerta que o prefixado é indicado para quem não precisará do dinheiro no curto prazo. "Recomendamos prefixados com prazo superior a dois anos, como os com vencimento em 2019 ou 2021, ou até 2025 para quem tem um perfil mais arrojado", diz. Para quem pretende resgatar o dinheiro em um prazo mais curto, os analistas indicam fundos multimercados, que diversificam os investimentos em Bolsa, câmbio e renda fixa. Por ora, o brasileiro ainda está concentrado nas aplicações mais conservadoras. De janeiro a setembro, os fundos de renda fixa têm captação de R$ 31,2 bilhões, ante R$ 9,8 bilhões em 2015. No mesmo período, os fundos de ações estancaram parte da saída de recursos, de R$ 14,5 bilhões para R$ 3,9 bilhões. Já os multimercados, que estavam com captação negativa de R$ 19,9 bilhões, têm saldo positivo de R$ 10,4 bilhões. O problema em concentrar as fichas nos fundos de renda fixa é o alto custo. Felipe SottoMaior, CEO da startup de investimento Vérios, alerta que 73% dos fundos mais procurados pelas pessoas fazem aplicações em títulos públicos indexados à Selic e cobram taxas que podem chegar a 4%. "Se deixar 10 anos parado no Tesouro, o aplicador vai ter R$ 142 mil contra R$ 100 mil nos fundos." A necessidade de revisar as apostas não deve ser tomada com pressa, diz Puga, do Modalmais: "Assim como o BC está cauteloso e quer mais dados para poder reduzir a taxa de juros, o investidor também deve ter isso no radar antes de se posicionar em um prazo mais longo". 105


O Bank of America Merril Lynch afirma que a queda do juro é um novo gatilho de alta do Ibovespa, que já subiu quase 50% no ano. Relatório do banco mostra que, em períodos anteriores de redução da Selic, a Bolsa subiu 27% em média, ante um retorno de apenas 2% durante ciclos de alta do juro. Um dos motivos para isso, segundo a instituição, é que cerca de 20% da dívida das empresas que estão no Ibovespa está indexada à Selic. Por isso, com o corte dos juros, as ações tendem a subir. O estrategista do UBS recomenda ações de setores que foram mais prejudicados nos últimos cinco anos, como as estatais e serviços públicos (energia elétrica e concessionárias de rodovias).

Gasto com cigarro quase equivale ao do arroz com feijão Fumo consome 1,08% do orçamento mensal das famílias, enquanto o tradicional prato da cozinha brasileira fica com 1,12% Fonte Daniela Amorim e Clarissa Thomé do RIO, Jornal O Estado de S. Paulo 23 Outubro 2016 às 22h00 As campanhas de conscientização sobre os males causados pelo cigarro diminuíram o consumo, mas o peso dos gastos com o produto ainda é alto no bolso das famílias brasileiras. O cigarro leva uma fatia de 1,08% do orçamento mensal das famílias, participação mais de três vezes superior à da batata, por exemplo. Os dados são da metodologia de cálculo da inflação oficial no País, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foto: Divulgação

Carolina Ruhman, do site Finanças Femininas: economia de R$ 40 mil ao parar de fumar A fatia do orçamento mensal das famílias destinada ao fumo praticamente equivale à da despendida com o tradicional arroz com feijão carioca (1,12% do IPCA), ou a tudo o que se 106


gasta no mês com manicure, cinema e médico juntos (1,1% do IPCA). O gasto dos consumidores com cigarro é ainda 13,5 vezes superior ao do cafezinho, a bebida predileta do brasileiro. Por ter um peso relevante, qualquer movimento no preço do cigarro mexe com a inflação no País, mas Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de Índices de Preços do IBGE, lembra que a influência já foi maior. Há vinte anos, o peso do cigarro na cesta de produtos consumidos pelos brasileiros chegava a 1,4%. Como o item ficou 448,17% mais caro desde então, contra uma alta de 252,08% da inflação oficial, o movimento mostra que as famílias cortaram despesas com o item. “Isso é principalmente aumento de imposto. Não só para aumentar a arrecadação, mas, por ser considerado um item supérfluo e prejudicial à saúde, aumentou muito a tributação como uma política mesmo. Mais de 70% do preço do cigarro são impostos”, ressaltou Eulina. Tributação. Segundo Leonardo Senra, diretor financeiro da fabricante de cigarros Souza Cruz, os impostos variam entre 75% a 88% do preço do produto, dependendo do Estado e das alíquotas locais de tributação. “Ou seja, se um maço de cigarro custa R$ 10, o consumidor está pagando entre R$ 7,50 e R$ 8,80 só de imposto”, explicou Senra. O Instituto Nacional de Câncer (Inca) divulgou recentemente que o número de mortes por câncer de pulmão entre homens caiu pela primeira vez, saindo de 18,5 a cada 100 mil, em 2005, para 16,3 por 100 mil em 2014. O resultado seria decorrente de políticas para redução do tabagismo, como proibição de propaganda, aumento de impostos e Lei Antifumo, que proíbe o fumo em locais fechados. “A literatura mostra que o aumento dos impostos é o maior determinante para a redução do tabagismo. E no Brasil o preço do cigarro é ‘zilhões’ de vezes mais barato do que em outros lugares do mundo. Na Irlanda, o maço custa ¤ 12. Aqui, R$ 4 ou R$ 5. A indústria está desesperada porque seus lucros estão caindo. Infelizmente, a gente ainda não conseguiu convencer o mundo de que essa é uma indústria que deveria fechar”, defendeu a epidemiologista Liz Almeida, gerente da Divisão de Pesquisa Populacional do Inca. Contrabando. Embora faça parte de uma política para desestimular o consumo, a elevação da tributação acabou também por reduzir a competitividade do produto brasileiro ante os cigarros que entram no País por meio do contrabando. Segundo dados da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física, a indústria nacional de fumo acumula uma queda de 48,3% nos últimos 10 anos (até agosto de 2016, último dado disponível). Na indústria do fumo, o cigarro responde por aproximadamente 60% do volume produzido, enquanto o fumo processado detém os 40% restantes. A linha de produção do setor está operando atualmente 69,1% abaixo do pico da série histórica da pesquisa, registrado em agosto de 2006. O resultado ainda está apenas 6,3% acima do piso da série histórica, iniciada em janeiro de 2002 pelo IBGE. O diretor da Souza Cruz lembra que, nos últimos dez anos, o imposto que incide sobre o cigarro aumentou 450%. Em cinco anos, a alta foi de 140%, uma das principais razões para que a fatia do produto ilegal no mercado brasileiro avançasse de 21% em 2011 para 35% em 2016. Economia. O susto com a elevação de preços e a perspectiva de economizar um bom dinheiro acabaram por incentivar muitos fumantes a abandonar o vício. Só em 2016, os cigarros já estão 12,62% mais caros, segundo o IPCA. A especialista em finanças pessoais Carolina Ruhman, fundadora do site Finanças Femininas, conta que economizou R$ 40 mil após decidir deixar o vício. Ao completar dez anos sem fumar, ela calculou quanto teria gastado se tivesse mantido o hábito de consumir dois maços por dia. 107


“No curto prazo não faz muita diferença. Você vai deixar de gastar entre R$ 5 e R$ 10 por dia, não dá para perceber no bolso. Para um fumante parece um dinheiro bem gasto. Mas, quando você coloca esse custo no longo prazo, você consegue ver o tamanho do rombo”, diz Carolina. Ela só lamenta que não tenha se organizado para juntar o dinheiro economizado. “Quando parei de fumar estava com 22 anos, morava com meus pais, infelizmente não pensava em economizar. Continuei gastando tudo”, disse. Já a cozinheira Daniele Borges usa um aplicativo no telefone celular para ajudá-la a contar os dias livre do vício e o montante economizado. Em 491 dias sem fumar, ela evitou 19.654 cigarros e poupou R$ 5.896. Vítima de depressão e síndrome do pânico, ela encontrou forças nos resultados e num grupo de apoio para conseguir se libertar. “Comprei uma geladeira, um jogo de mesa, uma televisão e paguei a cirurgia da minha gata”, conta. “Nunca parei para ver quanto gastava, nenhum fumante quer fazer isso. Fumei por 20 anos”, acrescentou.

Servidor aposentado custa o triplo de empregado privado Rivaldo Gomes/Folhapress

Fila em agência do INSS na região central de São Paulo

FONTE JORNAL FOLHA de S. APULO, LAÍS ALEGRETTI DE BRASÍLIA 24/10/2016 às 02h00 Um funcionário público da União que se aposentar neste ano, aos 60 anos de idade e com expectativa de viver até os 80, custará R$ 3,34 milhões para os cofres do governo.

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Esse é o valor médio, por servidor, que será desembolsado pela União para garantir o pagamento das aposentadorias ao funcionalismo, segundo cálculo da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados. Se esse servidor for um militar, o montante é ainda maior: R$ 4,92 milhões. No caso dos empregados da iniciativa privada, que contribuem com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o valor por pessoa apresenta um desequilíbrio menor, mas ainda assim tem impacto considerável para os cofres públicos. Um trabalhador da área privada que se aposentar neste ano, com expectativa de mais 20 anos de vida, custará, em média, R$ 1,1 milhão aos cofres públicos. Esse custo existe devido a desequilíbrios históricos dos regimes de Previdência no Brasil, que têm distorções e beneficiaram grupos específicos. Esse valor extra não deveria existir em nenhum caso, porque representa um desembolso além daquilo que o governo já paga à Previdência na condição de empregador. "A sociedade já está pagando, por meio do empregador, a contribuição patronal. Então não era para ter de pagar mais nada depois", afirma o consultor de Orçamento da Câmara Leonardo Rolim. Esse desequilíbrio é chamado tecnicamente de deficit atuarial dos regimes de Previdência e significa que, se fosse necessário pagar hoje todos os benefícios –atuais e futuros–, não haveria recursos suficientes, e o Tesouro seria obrigado a desembolsar esse montante. O cálculo relativo ao regime geral foi feito pela Consultoria de Orçamento da Câmara a pedido da Folha. Rolim esclarece que, como o regime geral prevê entrada de novas pessoas e tem avaliação atuarial só até 2060, o cálculo é aproximado e considera um deficit estável a partir de 2061. ESTADOS Para Estados e municípios, o deficit atuarial per capita também é menor que o da União. Nos Estados e no Distrito Federal, é de R$ 1,03 milhão. Nas capitais, é de R$ 161 mil, e, nos demais municípios, de R$ 97 mil. Com a reforma da Previdência que o governo Michel Temer vai enviar ao Congresso, a ideia é criar uma regra única de aposentadoria –com idade mínima de 65 anos e tempo mínimo de contribuição de 25 anos– para funcionários públicos e privados. Embora afirme que os militares têm de ter regras diferentes, Rolim defende a necessidade de equiparar a contribuição deles, hoje em 7,5%, à dos civis, que é de 11%. Além disso, sugere a criação de idade mínima –atualmente, só é exigido tempo de contribuição, de 30 anos. "Primeiro, a contribuição dos militares é menor. Segundo, o gasto com pensão é muito maior. Terceiro, eles se aposentam muito mais jovens. Juntando essas três coisas, dá essa bomba." No caso dos civis, segundo Rolim, o problema são os privilégios concedidos no passado. "A Constituição criou um trem da alegria gigantesco. Ela trouxe para o Regime Jurídico Único [que 109


abrange o funcionalismo] os funcionários das fundações federais, principalmente os das universidades", afirma. Para a Consultoria de Orçamento da Câmara, a União tem o regime de Previdência "mais desestruturado", que não tem uma unidade gestora e tampouco um conselho gestor. Além disso, cada Poder tem o seu próprio sistema de pessoal e apenas envia informações uma vez por ano ao Ministério da Fazenda para elaboração da avaliação atuarial.Regime Geral de Previdência Social (RGPS) Quem são eles Trabalhadores do setor privado, empregados domésticos, autônomos, trabalhadores rurais e servidores públicos de 3.500 municípios Quantos eles são 28,3 milhões Quanto ganham (benefício médio mensal) R$ 1.356 Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) Quem são eles Servidores públicos da União, dos Estados e dos municípios, com exceção dos que estão no INSS Quantos eles são 4,2 milhões Quanto ganham (benefício médio mensal) R$ 5.108 COMO SE APOSENTAM Regime Geral de Previdência Social (RGPS) Idade mínima Homens Por idade: 65 Por tempo de contribuição: não há Mulheres Por idade: 60 Por tempo de contribuição: não há Tempo mínimo de contribuição Homens Por idade: 15 Por tempo de contribuição: 35 110


Mulheres Por idade: 15 Por tempo de contribuição: 30 Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) Idade mínima Homens: 60 Mulheres: 55 Tempo mínimo de contribuição Homens: 35 Mulheres: 30

Quatro de cada dez empréstimos são feitos no cartão de crédito sem juros

FONTE JORNAL FOLHA de S. APULO, MAELI PRADO DE BRASÍLIA 24/10/2016 às 02h00 Com medo do desemprego, o consumidor está fugindo de financiamentos e partindo para operações de crédito que não envolvem pagamento de juros. É esse o cenário mostrado por dados de agosto divulgados neste mês pelo Banco Central: juntas, as operações no cartão de crédito parceladas sem juros e à vista somaram R$ 62,9 bilhões, alta de 11,6% em relação ao mesmo mês do ano passado.

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Elas já representam 42,3% dos novos empréstimos pessoais totais, percentual que era de 39,4% em agosto de 2015. Os números do BC, que englobam essas duas operações em uma categoria (cartão de crédito à vista e cartão parcelado sem juros), ainda mostram ela foi a única a ter crescimento acima da inflação oficial quando a base de comparação é agosto do ano passado. A variação de preços no período foi de 8,7%. "Há uma reversão do que ocorreu há 15 anos, quando as pessoas estavam sedentas por crédito. Hoje, o pensamento é: aquilo que dá para comprar, pago à vista ou no parcelado sem juros", afirma Luiz Rabi, economista da Serasa Experian. Os novos empréstimos de cheque especial, por exemplo, subiram somente 2,8% em relação ao ano passado, segundo o BC. O cartão de crédito rotativo caiu 4,9% no período, e o montante gasto no cartão de crédito parcelado com juros recuou 18,6%. Os números da Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços) confirmam a tendência de aumento das modalidades sem juros. Além do crescimento no cartão à vista e parcelado sem incidência de juros, a entidade registrou aumento de 13% nas transações com cartão de débito no primeiro semestre. GASTOS "O brasileiro está usando o cartão de uma forma melhor, mais consciente", afirma Ricardo Vieira, diretor-executivo da Abecs. "Essa cautela fica clara no tíquete médio, que está menor por causa da crise econômica, mas também por causa de um comportamento mais cuidadoso." O valor médio gasto pelo consumidor no cartão de crédito à vista, segundo a associação, caiu de R$ 47,7 no primeiro semestre do ano passado para R$ 43,6 no mesmo período deste ano. Na mesma comparação, o tíquete médio do cartão parcelado sem juros, que era de R$ 217,2 no ano passado, recuou para R$ 203,1 neste ano. No caso do cartão de débito, a queda no valor foi de R$ 39,7, em média, para R$ 37,1. ENDIVIDAMENTO "Muita gente ainda está pagando o que tomou de empréstimo lá atrás", lembra Reinaldo Domingos, fundador da escola de educação financeira DSOP. "As pessoas estão com medo de se endividarem ainda mais." Ele lembra que, mesmo que o consumidor opte pelo parcelamento sem juros ou mesmo pelo cartão de crédito à vista para fazer suas compras, deve fazer um acompanhamento cuidadoso. "No caso do cartão de crédito à vista, o consumidor ganha alguns dias para pagar, o que é positivo, mas não pode esquecer de se programar. Quanto maior o prazo, maior o risco de se embananar", explica Domingos.

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O educador financeiro destaca ainda que muitas lojas acabam embutindo nas parcelas o custo do financiamento, mesmo que o parcelamento dos produtos seja anunciado como sendo sem a incidência de juros.

Republicanos que apoiaram Trump estão no mesmo barco que ele agora Jonathan Ernst - 22.out.2016/Reuters

Candidato republicano, Donald Trump, durante evento de campanha presidencial FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, PAUL KRUGMAN 24/10/2016 às 11h08 A campanha presidencial dos Estados Unidos está entrando em suas semanas finais, e a menos que as pesquisas estejam completamente equivocadas, Donald Trump tem muito pouca chance de vencer —apenas 7%, de acordo com o modelo Upshot desenvolvido pelo "New York Times". Enquanto isso, o candidato continua a dizer coisas repulsivas, e os analistas vêm questionando se os demais integrantes da chapa republicana vão por fim começar a repudiar o indicado por seu partido. A resposta deveria ser: que diferença faz? Todo mundo que um dia declarou apoio a Trump está no mesmo barco que ele, agora. É tarde demais para mudar de ideia e pedir o dinheiro de 113


volta. E os eleitores deveriam perceber que votar em qualquer pessoa que tenha aderido a Trump representa um voto no "trumpismo", para todos os efeitos, não importa o que aconteça na porção presidencial da eleição. Para começar, ninguém que esteja prestando atenção à campanha pode afirmar que descobriu alguma coisa nova sobre Trump nas últimas semanas. Era evidente desde o começo que ele é um "trapaceiro" —o termo empregado para defini-lo por Marco Rubio, que mesmo assim terminou por endossar sua candidatura. Seu racismo e sexismo eram aparentes desde o início da campanha; seu rancor vingativo e falta de autodisciplina já estavam aparentes em suas diatribes contra o juiz Gonzalo Curiel e Khizi Khan. Assim, qualquer político que tente, depois da eleição, se distanciar do fenômeno Trump —ou mesmo retirar seu apoio a ele nos poucos dias que nos separam do pleito— já terá sido reprovado em um teste de caráter. Todos sabiam quem ele era desde o começo. Sabiam que se tratava de um homem que jamais, em momento algum, deveria ser autorizado a ocupar qualquer posto de alta responsabilidade, quanto mais a presidência. Mas ainda assim recusaram se pronunciar contra a candidatura dele enquanto lhes parecia que Trump tinha chance de vencer —ou seja, expressaram apoio quando isso era importante e tentaram se distanciar só depois que deixou de sê-lo. Essa é uma imensa falha moral, e merece ser recordada exatamente assim. É claro que sabemos por que a grande maioria dos políticos republicanos apoiou Trump, a despeito de ele ser uma pessoa horrível. Temiam perder espaço junto à base do partido caso não o fizessem. Mas isso não é desculpa. Pelo contrário: é motivo para confiar ainda menos nessas pessoas. Já estamos cientes de que lhes falta rigidez moral, e de que farão o que quer que seja necessário para garantir sua sobrevivência política. E o que isso significa em termos práticos é que eles continuarão a ser "trumpistas" depois da eleição, mesmo que o Homem do Cabelo Laranja desapareça de cena. Afinal, o quer aprendemos com as primárias republicanas foi que a base do partido não parece se incomodar minimamente com aquilo que a elite do partido diz: Jeb Bush (lembram-se dele?), a escolha inicial dos poderosos, não chegou lugar algum apesar de seus vastos recursos de campanha, e Rubio, que o sucedeu como preferido da elite do partido, se saiu bem pouco melhor. E a base tampouco se preocupa com supostos princípios conservadores, tais como reduzir o tamanho do governo. O que os eleitores republicanos querem, em lugar disso, são candidatos que canalizem sua raiva e seu medo, que demonizem as pessoas não brancas e expressem simpatia por teorias sinistras de conspiração. (Mesmo os candidatos preferidos pela elite republicana agiram assim —não se esqueçam de que Rubio acusou o presidente Barack Obama de ferir os Estados Unidos.) Se você ainda tem alguma dúvida sobre essa realidade política, uma pesquisa de opinião pública da Bloomberg recentemente perguntou a republicanos que posição política representa melhor a visão pessoal deles sobre os valores do partido a de Trump ou a de Paul Ryan. E a resposta que venceu por imensa maioria foi "a posição de Trump". Essa lição não escapou à atenção dos políticos republicanos. Mesmo que Trump perca feio, eles saberão que seu sucesso pessoal dependerá de manterem uma linha essencialmente 114


similar à do candidato presidencial. De outra forma, enfrentarão sérios desafios nas primárias e/ou correrão o risco de derrota em futuras eleições caso a base de seu partido opte por não ir às urnas. Assim, pode ignorar todos os esforços para retratar Trump como um desvio no verdadeiro percurso do Partido Republicano. Os valores de Trump são aquilo em torno do qual o partido gira. Talvez no futuro a agremiação venha a encontrar representantes com melhor controle sobre seus impulsos e menos esqueletos no armário, mas a malevolência subjacente é agora parte do ADN do partido. E as consequências imediatas serão muito feias. Presumindo que Hillary Clinton vença, ela enfrentará um partido de oposição que a demoniza e nega sua legitimidade, não importa o quanto sua margem de vitória venha a ser grande. Pode ser difícil imaginar comportamentos mais obstrutivos e destrutivos do que os adotados pelo Partido Republicano em sua oposição a Obama, mas pode acreditar: eles descobrirão como fazê-lo. Na verdade, as coisas podem ficar tão ruins que a governabilidade dos Estados Unidos estará em jogo. A reconquista do Senado pelo Partido Democrata seria muito importante, mas é improvável que o partido consiga tomar também o controle da Câmara, graças à aglomeração geográfica de seu eleitorado. Assim, como é que atividades essenciais da política, a exemplo do processo orçamentário, poderão ser conduzidas? Alguns observadores já estão imaginando cenários nos quais a Câmara seria na prática comandada pelos democratas, em cooperação com uma pequena facção de republicanos racionais. Vamos esperar que isso aconteça - mas essa não é a maneira certa de administrar uma grande nação. No entanto, é difícil vislumbrar uma alternativa. Pois o Partido Republicano moderno é o partido de Trump, com ou sem o homem em questão no comando. Tradução de PAULO MIGLIACCI

Política: Arena do Corinthians foi presente para Lula, diz patriarca da Odebrecht Robson Ventura -3.set.2011/Folhapress

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Lula visita obras do Itaquerão com o ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez e Emílio Odebrecht (dir.)

FONTE JORNAL FOLHA de S. PAULO, MARIO CESAR CARVALHO DE SÃO PAULO 23/10/2016 às 02h00

A Lava Jato vai chegar ao Corinthians. Emílio Odebrecht, presidente do conselho de administração do grupo que leva o seu sobrenome, afirmou em acordo de delação, em fase de negociação, que o estádio construído pela empreiteira foi uma espécie de presente ao expresidente Lula, torcedor do time. O agrado, na versão de Emílio, foi uma retribuição à suposta ajuda de Lula ao grupo nos oito anos em que o petista comandou o país, de 2003 a 2010. Sob governos do PT, de 2003 a 2015, o faturamento do grupo Odebrecht multiplicou-se por sete, de R$ 17,3 bilhões para R$ 132 bilhões, em valores nominais (a inflação do período foi de 102%). Emílio é pai de Marcelo Odebrecht, preso desde junho de 2015 e condenado a 19 anos de prisão. Por pressão do patriarca, ele e cerca de 80 executivos do grupo decidiram buscar um acordo de delação premiada. Os relatos, que indicam suborno, ainda terão de ser homologados pela Justiça. Emílio passou a integrar o acordo porque era o principal interlocutor de Lula. 116


Foi o mais ardoroso defensor da delação, vista por ele como a única saída para salvar o grupo da falência. Após a prisão de Marcelo, a Odebrecht passou a ter problemas de crédito com bancos e acumula dívidas de R$ 110 bilhões. Conhecida como Itaquerão, a arena do Corinthians, na zona leste de São Paulo, foi construída pela empreiteira de 2011 a 2014, quando foi palco da abertura da Copa do Mundo. Custou R$ 1,2 bilhão, quase 50% acima da estimativa inicial do projeto, de R$ 820 milhões. A obra foi financiada por recursos do BNDES (R$ 400 milhões), títulos autorizados pela Prefeitura de São Paulo (de até R$ 420 milhões) e empréstimos em bancos privados. Na época, o prefeito era Gilberto Kassab (PSD). A ideia de construir o Itaquerão partiu do então presidente Lula, que atribuía os maus resultados do Corinthians à falta de um estádio, segundo relatos colhidos pela Folha. Em 2010, o último ano de Lula à frente da Presidência, o clube ficou em quinto lugar no Campeonato Paulista, terceiro no Brasileiro e nono na Libertadores. Em 2007, havia sido rebaixado. O presidente do clube à época, o atual deputado Andrés Sanchez (PT-SP), já havia dito em 2011 à revista "Época" que Emílio participara do projeto financeiro da arena: "Quem fez o estádio fomos eu e o Lula. Garanto que vai custar mais de R$ 1 bilhão. Ponto. A parte financeira ninguém mexeu. Só eu, o Lula e o Emílio Odebrecht". O resultado da equação financeira montada foi desastroso. Dos R$ 420 milhões de títulos com emissão autorizada pela prefeitura, que poderiam ser usados para quitar dívidas municipais, foram vendidos R$ 25 milhões. O Corinthians não tem pago as parcelas mensais de R$ 5,7 milhões ao BNDES, com o consentimento da Caixa, que intermediou o empréstimo, porque negocia uma carência maior. A arena deveria ter arrecadado R$ 112 milhões no ano passado, mas conseguiu R$ 90 milhões. Se o desempenho se repetir nos próximos anos, o Corinthians pode perder o estádio para a Odebrecht, segundo contrato do clube e um fundo que cuida do empreendimento. REUNIÕES Além do caso do estádio, Emílio relata na proposta de acordo de delação que tinha reuniões com Lula, muitas vezes com frequência mensal. Nesses encontros, Emílio pediu e obteve o aval de Lula para ajudar a empreiteira a se expandir por América Latina e África. O petista é réu numa ação que tramita em Brasília, sob acusação de ter ajudado a Odebrecht a conquistar contratos em Angola. Lula preferia tratar dessas questões com Emílio, segundo executivos ouvidos pela Folha sob condição de anonimato, porque não gosta do estilo seco de Marcelo. Tinha afinidade com o modo descontraído do baiano Emílio. 117


Nos encontros entre Lula e Emílio, não eram mencionados pagamentos de suborno, ainda na narrativa dele. As questões práticas de como o PT seria beneficiado pela ajuda à Odebrecht seriam tratadas entre Marcelo e o ex-ministro Antonio Palocci. O ex-ministro aparece com o codinome de "Italiano" em documentos apreendidos pela Polícia Federal no que seria o "departamento de propina" da Odebrecht, mantido em Salvador, segundo os procuradores da Operação Lava Jato e a ex-secretária da empresa Maria Lúcia Tavares, que fez um acordo de delação. OUTRO LADO O advogado Cristiano Zanin Martins, que cuida da defesa do ex-presidente Lula, desqualificou o conteúdo das delações negociadas na Operação Lava Jato, como a de Emílio Odebrecht, executivo do grupo que leva seu nome. "A Lava Jato não conseguiu apresentar qualquer prova sobre suas acusações contra Lula. Na ausência de provas, trabalha-se com especulações de delações. Se a delação já não serve para provar qualquer fato, a especulação de delação é um nada e não merece qualquer comentário", disse o advogado em nota enviada à Folha. A Odebrecht, o Corinthians e o deputado Andrés Sanchez não quiseram comentar o relato de que o estádio do time seria um presente para Lula pela suposta ajuda ao grupo. O advogado José Roberto Batochio, que defende o ex-ministro Antonio Palocci, diz que a afirmação de que o seu cliente tratava de suborno com Marcelo Odebrecht não tem fundamento. "Causa surpresa essa versão de que o Palocci tinha mais contato com o Marcelo do que com o Emílio Odebrecht. Porque há uma amizade muito antiga entre Palocci e Emílio. Ele consultava muito o Palocci sobre a economia nacional e global. Já a relação entre Palocci e Marcelo era quase zero." O defensor rebate a interpretação dos procuradores da Lava Jato e da Polícia Federal de que o ex-ministro seja o "Italiano" citado em planilhas da Odebrecht. Segundo ele, as próprias mensagens trocadas por executivos mostram que Palocci jamais poderia ser o beneficiário dos supostos subornos.

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