CIDADANIA PARA O DESENVOLVIMENTO (2 º volume)

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CIDADANIA PARA O DESENVOLVIMENTO Discursos – 2.º Volume

Taur Matan Ruak


TAUR MATAN RUAK

Cidadania para o Desenvolvimento

Discursos julho 2014-maio 2017


ÍNDICE O AUTOR............................................................................................................... 11 CIDADANIA, DESENVOLVIMENTO E BOA GOVERNAÇÃO.................. 19 2014........................................................................................................................... 25 NA CERIMÓNIA DE INAUGURAÇÃO DA PONTE DA CPLP.................. 27 Comoro, Díli, 22 de julho de 2014


Cidadania para o Desenvolvimento: Discursos julho 2014-maio 2017

NA SESSÃO SOLENE DE ABERTURA DA X CONFERÊNCIA DE

CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA CPLP...................................... 31 Díli, 23 de julho de 2014

NA ABERTURA DO DEBATE “A CPLP E A GLOBALIZAÇÃO”................ 37 Díli, 23 de julho de 2014

FOTOS..................................................................................................................... 49 MENSAGEM AO 37.º FESTIVAL DE DOUARNENEZ................................. 69 Julho de 2014

NA OCASIÃO DA TOMADA DE POSSE DO PRESIDENTE DA

AUTORIDADE DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE

OE-CUSSE AMBENO.......................................................................................... 73 Díli, 30 de julho de 2014

NA 5.ª CONFERÊNCIA NACIONAL SOBRE LÍNGUAS AUTÓCTONES

DO CENTRO CULTURAL TIMOR LOROSA’E JAPÃO................................ 81 Palácio de Lahane, Díli, 2 de agosto de 2014

NA OCASIÃO DA CONDECORAÇÃO COM A ORDEM DE

TIMOR-LESTE DE APOIANTES DA LUTA DE LIBERTAÇÃO

NACIONAL DOS TIMORENSES...................................................................... 87 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 30 de agosto de 2014

SOBRE O ESTADO DA NAÇÃO........................................................................ 91 Parlamento Nacional, 15 de setembro de 2014

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Índice

“O SIGNIFICADO DE DÍLI CIDADE CAPITAL COMO SÍMBOLO DA INDEPENDÊNCIA E DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL”................ 115 Díli, 10 de outubro de 2014 NO 39.º ANIVERSÁRIO DA PROCLAMAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA............................................................................................... 125 Aissirimou, Ailéu, 28 de novembro de 2014 2015........................................................................................................................... 133 NA CERIMÓNIA DE POSSE DO VI GOVERNO CONSTITUCIONAL... 135 Palácio de Lahane, Díli, 13 de fevereiro de 2015 NA RECEÇÃO AO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO EM DÍLI... 145 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 17 de fevereiro de 2015 NA CONFERÊNCIA DO ASIAN ELECTORAL STAKEHOLDER FORUM SOBRE “PROCESSOS ELEITORAIS DEMOCRÁTICOS – REALIDADES E DESAFIOS”......................................................................................................... 151 Díli, 18 de março de 2015 POR OCASIÃO DAS EXÉQUIAS DE DOM ALBERTO RICARDO DA SILVA, BISPO EMÉRITO DE DÍLI............................................................. 161 Díli, 6 de abril de 2015 NO 60.º ANIVERSÁRIO DA CONFERÊNCIA ÁSIA-ÁFRICA DE 1955 E 10.º ANIVERSÁRIO DA NOVA PARCERIA ESTRATÉGICA ÁSIA-ÁFRICA........................................................................................................ 167 Jacarta e Bandung, 23 de abril de 2015

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NO 13.º ANIVERSÁRIO DA RESTAURAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA..... 175 Maliana, 20 de maio de 2015 SOBRE AS ORIENTAÇÕES DA POLÍTICA EXTERNA DE TIMOR-LESTE..................................................................................................... 189 Díli, 8 de junho de 2015 NO II FÓRUM DA SOCIEDADE CIVIL DA COMUNIDADE DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA............................................................... 209 Díli, 13 de julho de 2015 NA COMEMORAÇÃO OFICIAL DOS 500 ANOS DA EVANGELIZAÇÃO DE TIMOR E DA ASSINATURA DA CONCORDATA ENTRE TIMOR-LESTE E A SANTA SÉ........................... 223 Tasi Tolu, 15 de agosto de 2015 NA COMEMORAÇÃO DO 40.º ANIVERSÁRIO DA CRIAÇÃO DAS FALINTIL............................................................................................................... 231 Tasi Tolu, 20 de agosto de 2015 BREVES PALAVRAS NA FESTA DA LUA CHEIA......................................... 243 Palácio de Lahane, Díli, 26 de setembro de 2015 NA OCASIÃO DA TOMADA DE POSSE DA PROCURADORA-ADJUNTA DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA.................................................................................................... 247 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 28 de setembro de 2015

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Índice

NA INAUGURAÇÃO DO MONUMENTO COMEMORATIVO

DOS 500 ANOS DE AFIRMAÇÃO DA IDENTIDADE NACIONAL

TIMORENSE......................................................................................................... 253 Lifau, Oe-cusse, 27 de novembro de 2015

NO 40.º ANIVERSÁRIO DA PROCLAMAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA

E DOS 500 ANOS DE AFIRMAÇÃO DA IDENTIDADE TIMORENSE.... 259 Oe-cusse, 28 de novembro de 2015

NA CERIMÓNIA DE ATRIBUIÇÃO DO PRÉMIO DOS DIREITOS

HUMANOS SÉRGIO VIEIRA DE MELLO 2015............................................. 269 Baucau, 10 de dezembro de 2015

2016........................................................................................................................... 275 NO BANQUETE OFERECIDO EM HONRA DE SUA EXCELÊNCIA

JOKO WIDODO, PRESIDENTE DA REPÚBLICA INDONÉSIA................ 277 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 26 de janeiro de 2016

PERANTE O PARLAMENTO NACIONAL SOBRE A QUESTÃO DA

EXONERAÇÃO DO MAJOR-GENERAL LERE ANAN TIMUR................. 285 Díli, 25 de fevereiro de 2016

NO ENCERRAMENTO DA PRIMEIRA CONFERÊNCIA NACIONAL

DOS VETERANOS DE TIMOR-LESTE.......................................................... 297 Díli, 3 de março de 2016

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NO ALMOÇO EM HONRA DE S. E. O HONORÁVEL GENERAL SIR PETER COSGROVE, GOVERNADOR­‑GERAL DA COMUNIDADE

DA AUSTRÁLIA.................................................................................................... 305 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 3 de março de 2016

NO FINAL DO ENCONTRO BILATERAL COM S. E. O HONORÁVEL

SHINZŌ ABE, PRIMEIRO-MINISTRO DO JAPÃO...................................... 313 Tóquio, 15 de março de 2016

NO JANTAR OFERECIDO EM SUA HONRA POR S. E. O HONORÁVEL SHINZŌ ABE, PRIMEIRO-MINISTRO DO JAPÃO...................................... 317 Tóquio, 15 de março de 2016 NA COMEMORAÇÃO DO 14.º ANIVERSÁRIO DA RESTAURAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA........................................................................................ 321 Gleno, 20 de maio de 2016 NA COMEMORAÇÃO DO 16.º ANIVERSÁRIO DA CRIAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO...................................................................................... 337 Díli, 6 de junho de 2016 SOBRE O ESTADO DA NAÇÃO........................................................................ 345 Parlamento Nacional, 20 de setembro de 2016 NA SESSÃO SOLENE DA COMEMORAÇÃO DOS 20 ANOS DA ATRIBUIÇÃO DO PRÉMIO NOBEL DA PAZ AOS LAUREADOS DE TIMOR-LESTE DOM CARLOS FILIPE XIMENES BELO E DR. JOSÉ RAMOS-HORTA................................................................................ 367 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 7 de outubro de 2016

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Índice

POR OCASIÃO DA CONDECORAÇÃO DE S. E. JOAQUIM CHISSANO, EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, COM O GRANDE COLAR DA ORDEM DE TIMOR-LESTE.................................... 375 Díli, 10 de outubro de 2016 NA CERIMÓNIA DE CONDECORAÇÃO DOS EX-PRESIDENTES MÁRIO SOARES E JORGE SAMPAIO E OUTRAS PERSONALIDADES QUE SE DISTINGUIRAM NO APOIO À LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL DOS TIMORENSES ..................................................................... 381 Lisboa, 28 de outubro de 2016 NA XI CONFERÊNCIA DE CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA CPLP................................................................................................................. 389 Brasília, 31 de outubro de 2016 NA COMEMORAÇÃO DO 25.º ANIVERSÁRIO DO MASSACRE DE SANTA CRUZ................................................................................................. 399 Díli, 12 de novembro de 2016 NA COMEMORAÇÃO DO 41.º ANIVERSÁRIO DA PROCLAMAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA........................................................................................ 405 Los Palos, 28 de novembro de 2016 NA CERIMÓNIA DE ENTREGA DOS PRÉMIOS DOS DIREITOS HUMANOS SÉRGIO VIEIRA DE MELLO 2016............................................. 417 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 10 de dezembro de 2016 NA APRESENTAÇÃO DO LIVRO A PRESIDÊNCIA DE PROXIMIDADE DE TAUR MATAN RUAK....................................................................................... 423 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 10 de dezembro de 2016

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2017........................................................................................................................... 429 NA COMEMORAÇÃO DO 16.º ANIVERSÁRIO DAS FALINTIL-FORÇAS DE DEFESA DE TIMOR-LESTE................................ 431 Díli, Fatuhada, 2 de fevereiro de 2017 NA RECEÇÃO AO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO EM DÍLI.................................................................................................................. 441 Palácio Presidencial Nicolau Lobato, 17 de fevereiro de 2017 NA OCASIÃO DA CONDECORAÇÃO DE S. E. O HONORÁVEL GENERAL (NA RESERVA) SIR JERRY MATEPARAE, EX-GOVERNADOR-GERAL DA NOVA ZELÂNDIA.................................. 449 Díli, 17 de março de 2017 NA ABERTURA DA CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO 2017.................................................................................................. 453 Díli, 22 de março de 2017 NA COMEMORAÇÃO DO 17.º ANIVERSÁRIO DA POLÍCIA NACIONAL DE TIMOR-LESTE....................................................................... 465 Díli, Caicoli, 27 de março de 2017 INTERVENÇÃO DE DESPEDIDA NA OCASIÃO DA POSSE DO PRESIDENTE FRANCISCO GUTERRES LU-O’LO..................................... 475 Tasi Tolu, 19 de Maio de 2017

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TAUR MATAN RUAK


O AUTOR


O Autor

O

Presidente de Timor-Leste, Taur Matan Ruak, nasceu a 10 de outubro de 1956, no distrito de Baucau, em Osso Huna, Baguia, uma

região montanhosa do leste da ilha de Timor. É casado com a Dra. Isabel

da Costa Ferreira, jurista e ativista na área dos Direitos Humanos. O casal tem duas filhas, Lola e Tamarisa, e um filho, Quesadhip.

Filho de António de Vasconcelos e Albertina Amaral, Taur Matan Ruak

é o mais velho de oito irmãos, cinco raparigas e três rapazes. Ainda criança, acompanhou o tio em mudança para Díli, onde iniciou a escola primária em 1963.

A 7 de dezembro de 1975, quando a Indonésia invadiu Timor-Leste,

Taur Matan Ruak, com 19 anos de idade, juntou-se às FALINTIL, o recém­‑formado braço armado da Fretilin, nas montanhas.

Nos três anos seguintes, a guerra movida pelo exército indonésio no

Timor ocupado dizimou cerca de 100 mil timorenses de todos os estratos

sociais. Taur Matan Ruak participou em batalhas contra os militares indo-

nésios em Díli, Aileu, Maubisse, Ossu, Venilale, Uatulari e Laga, na costa nordeste, onde permaneceu.

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No final de 1976, recebeu a sua primeira nomeação para posições de comando nas FALINTIL. Na época, a Fretilin afirmava controlar um pouco mais de 80% do território. Nos três anos seguintes, Taur Matan Ruak foi assumindo responsabilidades militares crescentes nos chamados Setor Centro-Leste e Setor da Ponta-Leste, tornando-se Comandante de Companhia. No final de 1977, os militares indonésios desencadearam a Operação de Cerco e Aniquilamento, que dizimou as forças da Resistência. Durante o ano de 1978, foram destruídas 80% das forças da Resistência e as respetivas bases de apoio. A última base de apoio da Resistência caiu em 22 de novembro de 1978, na montanha de Matebian. No dia seguinte, Xanana Gusmão, Taur Matan Ruak e outros membros da Resistência reagruparam-se no sopé do Monte Legumau, retomando operações de guerrilha, apesar de esta estar então muito enfraquecida. Nicolau Lobato, Comandante-em-Chefe das FALINTIL, foi morto em 31 de dezembro de 1978, com um grupo de companheiros, sendo que estas perdas representaram o fim da liderança fundadora das FALINTIL. Em 1979 e 1980, a maioria das forças da Resistência Timorense deslocou-se gradualmente para o centro do país, num movimento de reorganização e consolidação, sob a liderança de Xanana Gusmão. Taur Matan Ruak recebeu ordens para levar a cabo ações de guerrilha na região Leste, tendo sido capturado pelos militares da ABRI1 a 31 de março de 1979, na área de Viqueque, durante uma missão destinada a capturar sobreviventes da Operação de Cerco e Aniquilamento. Com a audácia que o tornou conhecido, 1

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Sigla por que eram então designadas as Forças Armadas da Indonésia.

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O Autor

Taur Matan Ruak conseguiu escapar aos captores, após 23 dias, reunindo-se

de novo às FALINTIL, nas montanhas. Em março de 1981, foi nomeado Colaborador do Chefe do Estado-Maior das FALINTIL, passando a ser responsável pelo comando operacional do Setor Leste e, mais tarde, do Setor Oeste. Em março de 1983, a Resistência e representantes dos militares indonésios acordaram um cessar-fogo, a que o massacre perpetrado pelos militares do exército indonésio em Craras, cinco meses mais tarde, pôs termo. Em setembro desse ano, a Indonésia declarou o estado de emergência e iniciou uma nova ofensiva militar – a Operação Varrimento. Ainda em 1983, Taur Matan Ruak foi transferido para o Comando Operacional Oeste (a vasta região a oeste do eixo Baucau/Viqueque), sendo nomeado conselheiro militar e Subchefe do Estado-Maior das FALINTIL. A partir de 1986, assumiu o comando de todas as operações militares em Timor-Leste. Em novembro de 1992, o Comandante-em-Chefe Xanana Gusmão foi capturado em Díli. Taur Matan Ruak foi promovido a Chefe do Estado-Maior, enquanto Xanana Gusmão permaneceu preso em Jacarta, mantendo a função de Comandante-em-Chefe das FALINTIL. A 11 de março de 1998, Taur Matan Ruak foi promovido a Vice­ ‑Comandante-em-Chefe das FALINTIL, após o falecimento de Nino Konis Santana. Em julho de 1999, quando decorriam contactos com a Indonésia para o exercício pelos timorenses do direito à autodeterminação, as FALINTIL foram unilateralmente confinadas a quatro acantonamentos. Recaiu sobre Taur Matan Ruak a responsabilidade de evitar que os guerrilheiros armados

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das FALINTIL se envolvessem em ações contra forças indonésias e pró­ ‑indonésias.

A 30 de agosto de 1999, o povo de Timor-Leste votou esmagadora-

mente pela Independência, em Referendo organizado pelas Nações Unidas. À realização do Referendo seguiu-se um período de violência intensa e

brutal, que foi finalmente travado pela intervenção da Força Internacional INTERFET, com mandado das Nações Unidas. Esse período constituiu

um teste decisivo à disciplina das FALINTIL, quando estas, como fora acordado, tiveram de permanecer acantonadas, apesar da violência inaudita cometida pelas forças indonésias e pró-indonésias contra a população civil.

A 10 de dezembro de 1999, Taur Matan Ruak é agraciado com o

Prémio de Direitos Humanos da Assembleia da República, em Lisboa, Portugal.

A 20 de agosto de 2000, Kay Rala Xanana Gusmão demitiu-se das

FALINTIL, tendo Taur Matan Ruak sido nomeado Comandante-em-Chefe das FALINTIL. A 1 de fevereiro de 2001, Taur Matan Ruak assu-

me o comando da recém-rebatizada Força de Defesa de Timor-Leste (FDTL), com a patente de Brigadeiro-General. A cerimónia foi presidida

pelo diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, Administrador Transi­

tório da ONU, em Timor, mais tarde vitimado num atentado contra o Quartel­‑General da ONU em Bagdade, no Iraque, em 2003.

No dia da Restauração da Independência de Timor-Leste, em 20 de

maio de 2002, Taur Matan Ruak tornou-se Chefe do Estado-Maior General das FALINTIL-Forças de Defesa de Timor-Leste, ou FALINTIL­ ‑FDTL, designação das Foarças Armadas timorenses.

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O Autor

Em 7 de dezembro 2006, Taur Matan Ruak foi condecorado pelo então Presidente da República Democrática de Timor-Leste, Xanana Gusmão, com a Ordem da Guerrilha. Em 2007, foi de novo condecorado pelo Presidente da República, DR. José Ramos-Horta, por serviços prestados durante a Operação Halibur das FALINTIL-FDTL com a Polícia Nacional de Timor-Leste, que restabeleceu a segurança no país, abalada durante a crise política de 2006. A 28 de novembro de 2009, Taur Matan Ruak é promovido a Major-General, pelo Presidente DR. José Ramos-Horta. Em 2011, numa Cerimónia de Homenagem Nacional de Agradecimento e Reconhecimento dos Ex-Combatentes da Luta de Libertação, Taur Matan Ruak foi oficialmente desmobilizado das FALINTIL, sendo condecorado com outros 235 ex-combatentes. A 6 de outubro de 2011, Taur Matan Ruak proferiu o seu último discurso como Chefe do Estado-Maior General das FALINTIL-FDTL, numa cerimónia de passagem de testemunho do comando das Forças de Defesa, após o seu pedido de exoneração do cargo ser aceite pelo Presidente da República. A 16 de abril de 2012, Taur Matan Ruak foi eleito Presidente da República Democrática de Timor-Leste, tendo tomado posse a 20 de maio de 2012. Taur Matan Ruak fala português, inglês, além de tétum, noéti e makassae, três línguas de Timor-Leste.

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CIDADANIA, DESENVOLVIMENTO E BOA GOVERNAÇÃO


Cidadania, Desenvolvimento e Boa Governação

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imor-Leste tem 15 anos de independência. Nesta década e meia, alcançámos realizações notáveis, em primeiro lugar, a paz e a reconciliação. Depois da paz, conquistámos a estabilidade. A sociedade timorense vive a primeira década de paz, segurança e confiança, de cidadãos e agentes económicos, desde os anos 70 do século XX. Temos uma democracia muito participada, que, em 2017, entrou no quarto ciclo eleitoral, sem falhas ou incidentes significativos. A parceria que estabelecemos com as Nações Unidas, em especial até 2012, tem sido descrita pela comunidade internacional como um êxito, que deve ser um caso de estudo. Estabelecemos parcerias para o desenvolvimento com potências mundiais e regionais, incluindo a Austrália e a Indonésia. A assistência dos nossos parceiros – da Ásia, América, Europa e Pacífico – tem sido importante para começarmos a concretizar as prioridades de desenvolvimento que estabelecemos, incluindo iniciativas de diversificação da economia e desenvolvimento do setor produtivo nacional, que dão, ainda, os primeiros passos.

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Apesar destes e outros resultados, de que o país se orgulha e me enchem de satisfação, continuamos a enfrentar enormes desafios: – O primeiro dos desafios é a alta prevalência da pobreza, que priva dezenas de milhares de famílias da felicidade que outras sentem pelos êxitos alcançados e é um travão ao desenvolvimento, no futuro; – O utro desafio é a desigualdade, que o desenvolvimento agravou, na última década; – A qualidade dos serviços públicos prestados à população é má, o que tem consequências duradouras, designadamente pelo impacto negativo no sistema de educação, saúde, nas infraestruturas e noutras áreas. A persistência destes desafios coloca riscos à coesão do país, além de ser profundamente injusta para os cidadãos em situação especialmente vulnerável. O país e a liderança nacional serão avaliados pela resposta a estes desafios e pela capacidade de alterarmos estas situações. Não temos muito tempo. Ainda antes da minha eleição para a chefia do Estado, estabeleci como prioridade ouvir os cidadãos, em todo o país, e incentivá-los à participação ativa no desenvolvimento social e económico. A participação eleitoral é muito importante para reforçar a democracia e a estabilidade política, mas, num país como o nosso, os cidadãos não devem limitar-se à renovação periódica da legitimidade democrática. A participação de cidadania é essencial em muitas situações, para o Estado decidir bem e melhorar o desempenho, a todos os níveis. Sem o empenhamento dos cidadãos, sem a participação ativa no desenvolvimento local, sem a participação e o escrutínio de projetos mais alargados, através de or-

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Cidadania, Desenvolvimento e Boa Governação

ganizações da sociedade civil, por exemplo, não conseguiremos elevar a qualidade das decisões do Estado, reduzir o desperdício ou melhorar os serviços prestados. A participação dos cidadãos é indispensável à boa governação. Nos cinco anos do meu mandato, visitei os 442 sucos de Timor-Leste, muitos deles mais de uma vez. Levei o Estado a todo o país, incluindo a aldeias remotas, onde a sua presença não é, habitualmente, sentida. Convidei os timorenses a exercer uma cidadania ativa e responsável em todas as circunstâncias. As visitas que fiz incluíram, sem exceção, sessões de debate e informação, quase sempre com a participação massiva da população. Este exercício deixou raízes. Lentamente, nestes cinco anos, tem havido mudanças. Localmente, as populações sentem-se, frequentemente, mais afoitas em dar opinião e os departamentos do Estado estão conformados com o princípio de que é legítimo os cidadãos serem ouvidos. Ao terminar as minhas funções de Chefe de Estado, não terminam as minhas responsabilidades de cidadão interessado e empenhado no desenvolvimento do país. Continuarei a participar e a contribuir para criar novas avenidas de participação dos cidadãos. Todos nós, timorenses, temos um caminho a fazer, respondendo mais assiduamente ao chamamento do dever de cidadania e do país, em direção a uma governação melhor, um Estado mais eficiente e um país com mais bem-estar. Taur Matan Ruak

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NA SESSÃO SOLENE DE ABERTURA DA X CONFERÊNCIA DE CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA CPLP Díli 23 de julho de 20141 1

A X Conferência, reunida em Díli, inaugurou a primeira presidência pro tempore da CPLP por Timor-Leste.

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Na Sessão Solene de Abertura da X Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP

Senhores Presidentes,

Senhores Primeiros-Ministros,

Senhores Ministros e membros das delegações, Excelências,

A

presença de Vossas Excelências em Díli e a realização da X Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP no nosso país

são uma honra para nós e uma satisfação especial para mim. Bem-vindos a Timor-Leste.

A realização de uma Conferência da CPLP em Díli é possível pelo

apoio incansável, sem reservas, que os vossos países deram à luta de libertação nacional e à autodeterminação de Timor-Leste. Deram-nos tudo o que puderam.

Os Governos e o povo de São Tomé e Príncipe acolheram os nossos

representantes de braços abertos sempre que lhes “batemos à porta”. Não raramente, isso aconteceu em reuniões dos PALOP, antes da constituição da própria CPLP.

Amílcar Cabral foi um pai inspirador da nossa luta. A Guiné-Bissau foi

muito fraterna, no seu apoio. A história das nossas relações terá de ser escrita um dia.

Os irmãos cabo-verdianos são uma inspiração também – e solidários. O

seu exemplo encoraja-nos. Os cabo-verdianos provaram que investir na

dignidade de um povo, nos seus níveis educacionais, pode transformar um território quase sem recursos, numa nação com altos índices de desenvolvimento humano.

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Os portugueses viram-nos nascer: em Lifau, faz para o ano 500 anos, e em Díli, há 15 anos. Os Governos e o povo do Portugal democrático abraçaram-nos. Apoiaram a Resistência. A diplomacia e a solidariedade de Portugal e a coordenação político-diplomática da CPLP fizeram a diferença, em 1998-1999 e noutros momentos da história recente. Os brasileiros demonstraram o seu calor humano e solidariedade aos timorenses de muitas formas. E os Governos do Brasil apoiaram todas as resoluções da ONU favoráveis à autodeterminação de Timor. Nos anos do exílio e da mata, Angola e Moçambique foram a nossa casa, longe de casa. Apesar da agressão e guerra impostas a Angola desde o primeiro dia da Independência, os angolanos acolheram-nos sempre de braços abertos e apoiaram-nos. A mestria estratégica da liderança Angolana, em conjunto com outros Governos irmãos, ajudou a Resistência a averbar triunfos. Peço ao senhor Vice-Presidente Manuel Vicente que transmita ao senhor Presidente José Eduardo dos Santos o meu reconhecimento e o meu abraço. Suceder a Moçambique na presidência da CPLP pareceu, talvez, um sonho impossível para Timor-Leste. Mas os moçambicanos nunca alimentaram dúvidas. Moçambique apostou na formação de quadros timorenses desde a primeira hora, nos anos 70. O Governo e o povo de Moçambique acreditaram. Os moçambicanos fizeram tudo para apetrechar a Resistência com quadros, experiência e conhecimento. O senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste, José Luís Guterres, aqui sentado, ao meu lado, estudou lá. Formou-se lá. Centenas de outros quadros também. O senhor Presidente Guebuza é testemu-

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Na Sessão Solene de Abertura da X Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP

nha. Acompanhou pessoalmente, por vezes, a situação dos quadros timorenses em Moçambique. Senhor Presidente, kanimanbo! Senhores Presidentes, muito obrigado.

Permitam-me saudar especialmente, e dar as boas-vindas, ao senhor

Presidente Teodore Obiang, e à sua delegação, e dirigir uma saudação de amizade ao povo da Guiné-Equatorial.

Saúdo também o senhor Primeiro-Ministro da Guiné-Bissau, Domin-

gos Simões Pereira. O regresso ativo da Guiné-Bissau aos trabalhos da CPLP enche-nos, a todos, de satisfação. A reafirmação da determinação democrática dos guineenses foi um momento emocional para mim.

É um prazer reencontrar Vossa Excelência – agora como líder de um

Governo escolhido pelos guineenses – numa reunião da Comunidade, que Vossa Excelência tão bem conhece e serviu.

Saúdo e dou ainda as boas-vindas calorosas aos representantes dos Go-

vernos da Indonésia, Singapura, Malásia, Japão, Nova Zelândia, Namíbia, Turquia e Geórgia, que se associam a esta Conferência e irão conhecer, de mais perto, a nossa Comunidade. Excelências, Os nossos países são, hoje, parceiros com uma cooperação intensa. Mui-

tos quadros de quase todos os países da CPLP contribuíram para a criação

das nossas instituições, a todos os níveis. Um grande número dos técnicos das Nações Unidas que ao longo dos anos têm trabalhado connosco é quadro da CPLP.

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Assumir a presidência pro tempore da Comunidade no biénio 2014­‑2016 é, para Timor-Leste e para mim próprio, uma oportunidade de retribuir à CPLP um pouco da atenção e do apoio que recebemos. Termino destacando a inovação trazida pela a organização desta X Conferência, com a constituição da Comissão Prepatória provisória com a participação dos Estados-Membros. Agradeço ao irmão Lu-O'lo, presidente da Comissão Preparatória da Cimeira da CPLP e aos membros desta o trabalho realizado e ao nosso secretário executivo, Isaac Murargy, e a todos os que colaboraram e contribuíram para os nossos trabalhos se iniciarem em boa ordem e de acordo com o planeamento feito. Quando completa 18 anos, a CPLP está consolidada e apta a enfrentar novos desafios. Esta é uma reflexão que propomos e que é possível, apenas, devido às realizações notáveis da Comunidade nos primeiros 18 anos e à credibilidade dos Estados-Membros. É uma honra suceder à presidência moçambicana e ter oportunidade de dar continuidade ao seu trabalho de afirmação da CPLP e explorar as possibilidades do seu aprofundamento. Muito obrigado pela vossa atenção.

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Taur CIDADANIA Matan PARA O Ruak DESENVOLVIMENTO Discursos – 2.º Volume

Para atingirmos as metas de desenvolvimento social e económico que estabelecemos, é indispensável mobilizar os cidadãos e organizações da sociedade civil para participarem na definição das políticas e na implementação dos projetos de desenvolvimento, especialmente quando os afetam diretamente. Sem uma cidadania ativa, com a participação de homens e mulheres, não conseguiremos assegurar a boa governação. Taur Matan Ruak

ISBN 978-989-752-284-0

9 789897 522840


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