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Índice Agradecimentos............................................................................................................ IX Prefácios......................................................................................................................... XI Maria Irene de Carvalho e Isabel de Freitas Vieira
Introdução..................................................................................................................... XVII Estrutura da obra............................................................................................................ XX PARTE I
1
Enquadramento Teórico Capítulo 1
3
Fundamentos Históricos e Conceptuais da Supervisão em Serviço Social Introdução...................................................................................................................... 3 Evolução histórica e conceptual da supervisão em Serviço Social............................... 3 Evolução histórica.................................................................................................... 3 A evolução da prática da supervisão profissional em Serviço Social no contexto europeu..................................................................................................................... 5 Agências europeias de supervisão........................................................................... 7 Supervisão profissional em Serviço Social em Portugal.......................................... 8 Evolução conceptual................................................................................................ 9 Abordagem normativa........................................................................................ 13 Abordagem empírica........................................................................................... 14 Abordagem pragmática...................................................................................... 14 Supervisão em Serviço Social: ao encontro do conceito atual...................................... 15 Modelos e influências teórico-metodológicas da supervisão em Serviço Social.......... 20 Considerações finais...................................................................................................... 26 Capítulo 2
27
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Tipos, Funções e Modalidades de Supervisão Introdução...................................................................................................................... 27 Tipos de supervisão....................................................................................................... 27 Supervisão pedagógica............................................................................................ 27 Supervisão profissional............................................................................................ 30 Funções da supervisão profissional................................................................... 30 Papel do supervisor na supervisão administrativa........................................ 31 Papel do supervisor na supervisão educativa.............................................. 31 Papel do supervisor na supervisão de apoio/suporte................................... 34 O core da supervisão de apoio/suporte: a prevenção do burnout.......................... 39 V
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
Aprender a cuidar de si mesmo................................................................................ 42 Modalidades e formas de supervisão............................................................................ 44 Em função da vinculação do supervisor.................................................................. 44 Supervisão profissional interna........................................................................... 45 Supervisão profissional externa.......................................................................... 45 Em função dos destinatários da supervisão profissional......................................... 46 Supervisão individual.......................................................................................... 46 Supervisão coletiva............................................................................................. 47 Supervisão em grupo.................................................................................... 47 Supervisão de equipas.................................................................................. 49 Desvantagens da supervisão em grupo e da supervisão de equipas.......... 50 Supervisão interpares (peer group)............................................................... 51 Considerações finais...................................................................................................... 53 Capítulo 3
55
A Supervisão Profissional Externa em Serviço Social Introdução...................................................................................................................... 55 A supervisão profissional externa em função dos objetivos.......................................... 55 A supervisão profissional externa enquanto espaço e tempo… ............................. 57 … de formação .................................................................................................. 57 … de socialização e reforço da identidade profissional..................................... 59 … de desenvolvimento organizacional............................................................... 60 Contextos e enquadramento temporal da supervisão profissional............................... 62 Sobre o contexto físico da supervisão..................................................................... 62 Enquadramento temporal da supervisão................................................................. 64 Princípios éticos em supervisão..................................................................................... 64 Supervisão profissional externa como relação.............................................................. 67 Fatores que interferem na relação supervisor/supervisando................................... 69 Humor................................................................................................................. 69 Diversidade/interculturalidade............................................................................ 69 Perfil e competências do supervisor profissional externo............................................. 70 Inteligência emocional.............................................................................................. 72 Necessidade de supervisão para os supervisores................................................... 74 Competências do supervisor.................................................................................... 76 Perfil do supervisor................................................................................................... 77 Supervisão profissional externa como processo........................................................... 80 Etapas do processo de supervisão.......................................................................... 81 Avaliação da supervisão........................................................................................... 85 Requisitos para o desenvolvimento do processo de supervisão profissional......... 86 Conteúdos, temas e dimensões de análise na supervisão profissional........................ 88 Críticas e constrangimentos à supervisão profissional externa em Serviço Social....... 92 Constrangimentos internos...................................................................................... 93 Constrangimentos externos..................................................................................... 94 Considerações finais...................................................................................................... 97
VI
Índice
Capítulo 4
99
Supervisão, Reflexividade e Prática Reflexiva em Serviço Social Introdução...................................................................................................................... 99 Os contributos de Dewey, Schön e Kolb....................................................................... 100 O contributo de John Dewey.................................................................................... 100 O contributo de Donald Schön................................................................................. 102 O contributo de David Kolb...................................................................................... 105 Síntese das propostas de Dewey, Schön e Kolb..................................................... 107 Reflexividade e prática reflexiva no Serviço Social........................................................ 108 Constrangimentos à prática reflexiva no Serviço Social................................................ 114 Considerações finais...................................................................................................... 116 PARTE II
119
Estudo de Caso Capítulo 5
121
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Uma Experiência de Supervisão com Coordenadores de Serviços de Apoio Domiciliário (SAD) Introdução...................................................................................................................... 121 Breve contextualização metodológica..................................................................... 121 Universo e amostra............................................................................................. 122 Recolha de dados............................................................................................... 122 Questões éticas.................................................................................................. 123 Descrição do contexto institucional onde foi realizada a supervisão................. 123 Método global de atuação.................................................................................. 124 Caracterização das assistentes sociais participantes no processo de supervisão. 125 Informações gerais............................................................................................. 125 Funções exercidas no SAD da instituição.......................................................... 126 Funções de coordenação.............................................................................. 126 Funções de gestão de caso.......................................................................... 126 O processo de supervisão no desenvolvimento pessoal e profissional dos assistentes sociais: impactos e locus para uma (re)construção da intervenção........... 127 Benefícios/impactos do processo de supervisão.................................................... 128 Definição dos perfis das supervisandas................................................................... 129 Perfil 1) Técnico-burocrático............................................................................... 131 Perfil 2) Prático-imediatista................................................................................. 131 Perfil 3) Reflexivo................................................................................................ 132 Supervisão como estímulo ao empowerment e à autonomia.................................. 134 Supervisão como processo de desenvolvimento pessoal e profissional................. 136 Supervisão como processo de reciclagem profissional........................................... 137 A (re)construção das práticas a partir da supervisão: um processo permanente e desafiante.............................................................................................................. 137 Considerações finais...................................................................................................... 142 Supervisão profissional externa em Serviço Social: que desafios?......................... 142 VII
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
Conclusão...................................................................................................................... 143 Supervisão em Serviço Social: um objeto de estudo complexo................................... 143
Referências Bibliográficas............................................................................................. 147 Índice Remissivo........................................................................................................... 153
VIII
Prefácios Maria Irene de Carvalho Professora Associada do ISCSP – Universidade de Lisboa Fazer o prefácio deste livro é uma tarefa desafiante e exigente, dada a proximidade pessoal e profissional com a autora. Por isso, gostaria de destacar, em primeiro lugar, o seu entusiasmo pela vida, pelo Serviço Social e pela supervisão, bem como a capacidade de comunicar e de se envolver na comunidade. Também o rigor científico e técnico, e a capacidade de pesquisar, estudar, analisar, refletir, compreender e revelar os resultados destes processos publicamente. Porque nós somos o resultado daquilo que fazemos, evidencio, em segundo lugar, o tema desta obra – a supervisão profissional –, pela sua originalidade no panorama do Serviço Social em Portugal. É uma obra inédita e pioneira, com contributos relevantes para a ciência do Serviço Social. O Serviço Social é uma profissão muito exigente e complexa. Exerce-se na sociedade, com uma relativa autonomia de critérios, com um saber técnico e científico e com uma responsabilidade social. Contudo, estas características não são exclusivas do Serviço Social. Então, qual é a especificidade da profissão do Serviço Social? É uma profissão da mudança social em dois planos entrecruzados. No plano individual, centra-se na pessoa e na dignidade humana (autonomia, liberdade e autodeterminação) e, no plano social, na sociedade, na promoção da justiça social, nas oportunidades e na justa distribuição de recursos. Sendo uma profissão das relações humanas, os profissionais são desafiados a desenvolverem-se constantemente como pessoas e a transformarem-se enquanto profissionais para responderem às mudanças sociais e aos seus impactos. Para exercer a profissão é necessário um conhecimento científico rigoroso, uma proficiência técnica, experiência diversificada e aprofundada e sensibilidade ética, isto é, ser perspicaz e criativo. A supervisão é o catalisador que faz com que a profissão, enquanto algo inacabado, tenha a capacidade de se desenvolver constantemente.
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O Serviço Social tem uma relação intrínseca com a mudança social e com os conteúdos programáticas das políticas públicas e sociais, intervindo junto dos cidadãos tendo presente a dimensão estrutural dos problemas sociais, permanecendo nesse âmbito comprometido com os direitos humanos e com a justiça social, sobretudo com o combate às injustiças e às indiferenças. Os profissionais de Serviço Social desempenham funções nesses contextos, em organizações do Estado central e local, em organizações privadas (lucrativas e não lucrativas) com dimensão internacional, nacional, regional e local. O bom desempenho destes profissionais e a qualidade da sua intervenção requerem processos de supervisão inovadores, colaborativos e reflexivos. A supervisão é fundamental para que a profissão responda aos desafios das novas e das velhas questões sociais, quer as visíveis ou as invisíveis, decorrentes da globalização do risco, das políticas neoliberais e das constantes crises económicas. É aqui que a supervisão profissional externa ganha sentido, não só para melhorar os processos de XI
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
intervenção junto das populações, mas também capacitar os profissionais para agirem crítica e reflexivamente nestes contextos. Esta obra, apresentada pela autora Carla Ribeirinho, destaca a supervisão como uma disciplina, com conteúdos e metodologias próprios, como um processo e como uma prática profissional. A supervisão está relacionada com o ensino do Serviço Social, com a intervenção, com a profissionalização e com o desenvolvimento profissional – supervisão pedagógica, de apoio à intervenção e de desenvolvimento dos profissionais. Este saber disciplinar, pedagógico e reflexivo constituiu-se como uma prática através da qual profissionais com a responsabilidade de cumprir objetivos organizacionais, profissionais e pessoais procuram proporcionar as melhores soluções e os melhores recursos para as pessoas, utentes do Serviço Social. Mas a supervisão é mais do que uma prática em que profissionais com mais experiência supervisionam outros menos experientes – é um processo colaborativo, autorreflexivo e autoformativo. A supervisão é um espaço onde se negociam relações complexas além daquelas que se estabelecem entre o supervisor e os supervisandos. Esta negociação tem finalidades e funções, ao promover: um desempenho profissional de qualidade (função de gestão ou normativa); um desenvolvimento profissional contínuo (funções formativas); apoio pessoal (funções de suporte e restaurativas); e o envolvimento e a participação das pessoas com e nas organizações (funções de mediação). Assim entendida, a supervisão valoriza a capacidade de o profissional fazer ouvir a sua voz, não só alguém que domina a prática, mas também alguém com aptidão para produzir conhecimento e potenciar novas formas de atuação perante a realidade em constante mutação, de forma a poder responder às necessidades das pessoas, utilizadoras dos serviços. A supervisão assume-se, então, como um processo de coconstrução, porque participada, entre os supervisores e os supervisionados e entre a organização e as pessoas, utilizadoras dos serviços. É também um processo de cocriação, requerendo criatividade, inovação e aperfeiçoamento dos processos de intervenção, enquanto produto que responde às necessidades das populações. É ainda um processo de cotransformação e de desenvolvimento pessoal e profissional efetuado através da reflexão na ação e sobre a ação. Estas questões são debatidas nesta obra, com mestria pela autora. Na Parte I, são analisados os fundamentos da supervisão, os tipos, as funções e as metodologias para a promoção de práticas profissionais reflexivas e críticas e, na Parte II, é analisada uma prática de supervisão externa exercida com profissionais de Serviço Social, com funções de coordenação de serviços de apoio domiciliário (SAD) para pessoas idosas. Os resultados demonstram que a supervisão profissional externa contribui diretamente para reforçar as competências profissionais a nível do saber teórico, metodológico, ético e decisional do Serviço Social, para fortalecer as competências pessoais e interpessoais, sobretudo na relação consigo mesmo e com os outros, e para aperfeiçoar os processos de intervenção social. Indiretamente, a supervisão profissional externa melhora os processos organizacionais da intervenção, com impactos positivos no produto final obtido, que consiste na promoção da pessoa, no desenvolvimento e justiça social. Esta obra será, decerto, uma referência no panorama do Serviço Social em Portugal, constituindo-se como uma mais-valia para a profissão e para os profissionais. XII
Prefácios
Isabel de Freitas Vieira Assistente Social e Docente na Universidade Católica Portuguesa A supervisão é uma atividade imprescindível à capacitação profissional permanente, tendo a potencialidade de orientar o aperfeiçoamento da intervenção social. A supervisão tem a finalidade de refletir sobre teorias e práticas, desconstruindo a generalidade/particularidade dos fenómenos com os quais os assistentes sociais trabalham e ajudando a encontrar formas mais qualificadas de operacionalizar a intervenção profissional. Robinson, em Supervision in Social Casework (1936, p. 53), define a supervisão como “um processo educacional no qual uma pessoa habilitada com conhecimentos e capacidades assume a responsabilidade de treinar outra pessoa com menos competências”. O supervisor tem a responsabilidade de manter o moral dos supervisionados, ajudar a ultrapassar os desânimos e os descontentamentos relacionadas com o trabalho, restituindo-lhes os sentimentos de identidade, pertença e segurança, valorizando-os como profissionais e incentivando-os a adquirirem novas competências, para assim fortalecer a sua criatividade e reforçar a sua capacidade de resiliência. Para Cruells (2009), a supervisão potencia a passagem do pensamento e da reflexão comuns à reflexividade autónoma, tornando-se um espaço de reflexão sistemática sobre a ação profissional. A supervisão constitui-se, assim, como uma oportunidade de descoberta de forças e fraquezas, pessoais e coletivas, permitindo ultrapassar barreiras e desenhar novas estratégias de crescimento e aperfeiçoamento, pessoal e profissional. O grupo de supervisão transforma-se num coletivo de aprendizagens, possibilitando a troca de saberes e a partilha de sucessos e insucessos, incentivando a realização de novas estratégias de ação, ensinando a refletir sobre a experiência acumulada e tendo a finalidade de melhorar o exercício profissional e de aumentar o nível de satisfação com o trabalho. Em Portugal, a supervisão tem tido bastante importância na formação em Serviço Social, quer na formação curricular (orientação de estágios), quer no exercício da profissão (supervisão interna e externa), mas tem-lhe sido atribuída pouca relevância por parte dos responsáveis dos serviços e dos poderes instituídos.
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O livro de Carla Ribeirinho traz-nos um valioso contributo para pensarmos as teorias do e para o Serviço Social, colocando a supervisão num lugar de destaque e de crucial urgência para refletirmos sobre o exercício profissional dos assistentes sociais. O texto aborda os fundamentos históricos da supervisão em Serviço Social, no contexto europeu e em Portugal, identificando fontes e reunindo informação, até aqui dispersa, para lhes conferir qualidade científica e relevância temática. A autora apresenta a evolução do conceito de supervisão e descreve a forma como a sua racionalidade semântica e instrumental conduzem, num fio do tempo e numa multiplicidade de lugares de práticas, a diferentes tipologias e modelos de supervisão, que derivam de variados suportes teóricos e metodológicos e conduzem a diversas finalidades. XIII
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
No início do século XX, a supervisão em Serviço Social começa por ser uma forma de aconselhamento e uma ação filantrópica entre colegas, em que os profissionais mais velhos prestavam aconselhamento prático aos mais jovens. O trabalho do supervisor era orientar, informar, instruir e fornecer apoio/suporte emocional. Esta orientação e este treino de competências começam por ser feitos a nível individual e só mais tarde em grupo. Na contemporaneidade, a atividade profissional do supervisor requer uma formação credenciada e especializada, utilizando métodos e modelos próprios. Cada vez mais a supervisão é entendida como um processo formativo que proporciona momentos de atualização teórica e um treino de competências técnicas, gerando uma reflexão sobre situações complexas e ajudando a resolver alguns dos dilemas éticos originados no exercício da profissão. As modalidades e as finalidades de supervisão variam de acordo com a natureza e a cultura das organizações e dependem tanto das estratégias dos seus gestores e administradores, como dos modelos implementados pelos supervisores. A prática da supervisão realiza-se em diferentes áreas, como os serviços de saúde, as escolas, os serviços de justiça e prisionais, os serviços de apoio a pessoas idosas, os serviços de proteção de infância e juventude, o apoio a famílias e o trabalho comunitário, os serviços de apoio a vítimas de violência, entre outros, tornando-se, hoje em dia, uma prática implementada pelas próprias organizações e pelos serviços de ação social. Alguns serviços utilizam a função administrativa da supervisão como um processo de organização e sistematização do trabalho, que permite aumentar a responsabilização profissional e melhorar o desempenho organizacional. Numa perspetiva clínica, a supervisão tem uma vertente psicoterapêutica, pois ajuda a desconstruir os problemas e fornece apoio/suporte emocional, mas podendo ter, também, uma função fiscalizadora, que pretende controlar os atos profissionais e melhorar as suas eficácia e eficiência através do aconselhamento. Numa perspetiva educacional, a supervisão tem um carácter pedagógico e a finalidade de renovar os referenciais teóricos e metodológicos, de treinar competências técnicas e de refletir sobre as atitudes e a postura profissional. Numa perspetiva política, a supervisão pode facilitar o conhecimento de procedimentos, regulamentos e quadros legislativos, favorecendo uma correta e apropriada implementação das medidas de política social por parte dos profissionais; de igual modo, os relatos de experiências, os estudos de caso e a desconstrução/reconstrução dos modos de fazer podem levar a um melhor conhecimento do real impacto dessas mesmas medidas junto dos seus destinatários. Numa perspetiva ética e deontológica, a supervisão cumpre o papel de sensibilizar os profissionais para a concretização dos princípios orientadores do Serviço Social, como a defesa da dignidade humana, dos direitos humanos e da justiça social, colocando-os nas suas atitudes profissionais e nas suas práticas quotidianas. A supervisão pode articular e entrelaçar estas diferentes visões e perspetivas. Compete ao supervisor adequar as dinâmicas das sessões e os materiais utilizados às expetativas dos supervisionados e dos seus superiores hierárquicos, bem como adaptar os objetivos à natureza dos problemas sociais que se pretendem resolver, de acordo com a missão e a visão da organização. XIV
Prefácios
As práticas profissionais dos assistentes sociais têm vindo cada vez mais a ser submetidas à informatização, à automatização e à formatação dos processos de trabalho, focados na rentabilização dos esforços face à redução de recursos. Estes automatismos resultam num “conjunto de respostas profissionais rápidas, ligeiras, irrefletidas, instrumentais, baseadas em analogias, repetição de experiências, de senso comum, (…), em estrita obediência a leis e orientações superiores” (Guerra, 2012, p. 46), sem qualquer capacidade crítica e reflexiva que dê suporte à especificidade e à qualidade dos atos profissionais. Carla Ribeirinho faculta-nos um texto onde transparecem o rigor e a independência de pensamento. O quadro conceptual que nos é fornecido enriquece e ganha sentido quando é aplicado numa experiência de supervisão que a autora realiza com profissionais de Serviço Social, numa instituição que efetua serviços de apoio domiciliário (SAD) junto de pessoas idosas. A segunda parte do livro descreve esta prática e identifica três perfis profissionais: o técnico-burocrático, o prático-imediatista e o reflexivo. Percebemos, então, que na opinião destes profissionais, além de uma função formativa, a supervisão tem uma função de apoio/suporte emocional (e.g., gerir o stress e os conflitos internos, dar apoio moral, propiciar satisfação no trabalho), sendo um espaço de partilha, que permite quebrar as rotinas, e um tempo de reflexão, que permite “parar para pensar” em conjunto. Face a uma crescente descaracterização das práticas profissionais dos assistentes sociais, Carla Ribeirinho desafia-nos a repensar o espaço e o tempo da supervisão em Serviço Social. Na sua perspetiva, a supervisão surge como um espaço coletivo para repensar e renovar as práticas, facultando ferramentas teóricas, éticas e metodológicas que permitem desconstruir a complexidade dos problemas emergentes e refletir sobre a agência e os valores orientadores do Serviço Social. A sua experiência mostra-nos como a supervisão, enquanto espaço de troca de vivências e de experiências, pode facultar uma aprendizagem partilhada, reforçar o espírito de grupo, favorecer a colaboração e a cooperação profissional, treinando a reflexividade e a análise críticas, ao religar pensamento, sentimento e ação numa ótica tanto individual, como coletiva.
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Por todas estas razões, desejo que o maior número possível de estudantes e profissionais de Serviço Social possa ler esta obra e, a partir daí, criar novos momentos de diálogo e reflexão sobre a oportunidade aqui gerada para, através da supervisão, sermos capazes de renovar as práticas profissionais e reafirmar o lugar do Serviço Social na academia e na sociedade como construtor da dignidade humana, defensor dos direitos humanos e tutor da justiça social.
XV
Introdução Este livro, com o título Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva, trata sobre o tema da supervisão profissional externa em Serviço Social enquanto espaço de desenvolvimento pessoal e profissional e sobre o seu contributo para a reconstrução da intervenção dos assistentes sociais. Pretende também apresentar um exemplo de desenvolvimento de um processo de supervisão num contexto de intervenção de assistentes sociais coordenadores de serviços de apoio domiciliário (SAD). A supervisão profissional externa em Serviço Social tem sido desenvolvida sobretudo na área da intervenção com famílias e crianças em risco e em contextos de terapia familiar. A complexidade destas realidades requer que supervisores externos desenvolvam processos de apoio aos profissionais, no sentido de lidarem com aspetos emocionais (pessoais) e de tomada de decisões técnico-científicas (profissionais). No caso da intervenção com pessoas idosas, esta realidade é relativamente recente e pontual, dependendo em grande parte da política institucional. A atualidade tem sido marcada pelo aumento e pela complexidade dos problemas sociais, pela escassez de recursos na resposta às necessidades dos cidadãos, pela regulação do Estado sobre as organizações e, por sua vez, por um Estado também regulado por políticas e burocracias supranacionais advindas, nomeadamente, da União Europeia. As organizações tuteladas pelo Estado com utilizadores de serviços cada vez mais exigentes são, neste contexto, confrontadas com vários dilemas a que têm de acorrer continuamente, por exemplo: responder às necessidades emergentes com recursos escassos; promover a melhoria dos processos de trabalho e a qualidade das respostas; incentivar a participação dos utilizadores nas decisões e garantir a qualificação dos profissionais. Neste contexto, a intervenção profissional é cada vez mais orientada para uma gestão por objetivos e para o controlo das atividades desenvolvidas sob o lema da eficiência e da eficácia. É neste cenário que o livro se inscreve, situando a supervisão profissional externa em Serviço Social na matriz da identidade do Serviço Social e das organizações onde exerce a sua atividade. Pode ser desenvolvida em várias modalidades, nomeadamente em contextos pedagógicos e administrativos, em processos de apoio, no acompanhamento de casos e na supervisão de práticas profissionais (como é o caso do Capítulo 5) (Carvalho, 2012b; Kadushin & Harkness, 2014).
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A supervisão em Serviço Social: “(...) é um processo em permanente construção, através da consciência das necessidades, auto-formação e mudança de posicionamento teórico e prático. É também intemporal, pois tem a influência de saberes já adquiridos, revistos nas disciplinas da formação em Serviço Social e as suas actualizações, e perspectiva o exercício profissional no futuro.” Carvalho (2012b, p. 79)
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Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
Concretamente, a supervisão profissional externa é efetuada por profissionais que não pertencem à instituição e pode ser entendida enquanto espaço de reflexão na ação e de reflexão sobre a ação, constituindo-se como um instrumento fundamental que capacita o assistente social e promove o reequacionamento das suas práticas. Pode ainda ajudar a sedimentar teórico e metodologicamente e ético e politicamente a sua intervenção. Este reequacionamento implica o desenvolvimento da reflexividade, que contraria a mecanização das práticas e a dificuldade de discernimento nas situações críticas e de apreensão da complexidade do real. A supervisão profissional, concretamente na área do envelhecimento e das pessoas idosas (Gerontologia), decorre da crescente complexidade das situações apresentadas aos assistentes sociais neste âmbito, a par da escassez de recursos disponíveis e da redução do espectro de abrangência das políticas sociais. As dinâmicas desenvolvidas nestes contextos podem fragilizar os níveis de reflexividade dos profissionais. Esta situação pode também conduzi-los para uma disposição normativa em relação à prática, baseada em lógicas de focalização nos resultados, de quantificação da intervenção, de burocratização e de aceleração dos processos de intervenção, desumanizando-os, o que se traduz num conjunto de circunstâncias ideais ao desenvolvimento de práticas estéreis e descentradas dos sujeitos destinatários da intervenção (Amaro, 2012; Ribeirinho, 2013). Apesar de a supervisão se ter iniciado no seio do Serviço Social quase desde a sua fundação (Kadushin & Harkness, 2014; Ranquet, 1996; Richmond, 1917), sobretudo ligada ao acompanhamento e à avaliação da relação de ajuda desenvolvida junto dos utentes1, e, mais tarde, no acompanhamento dos processos pedagógicos na formação académica (estágios) em instituições sociais e de saúde (Buriolla, 1999; Vieira, 1981), ela não tem sido devidamente valorizada no que à construção de conhecimento diz respeito (Carvalho, 2012b). É, contudo, inquestionável a necessidade de promover o desenvolvimento profissional contínuo dos assistentes sociais ao longo de toda a sua carreira profissional, para que possam acompanhar as mudanças sociais e organizacionais, bem como rever e renovar os seus conhecimentos, competências e perspetivas. Neste sentido, o presente livro partilha da convicção de que a supervisão profissional assume um papel importante na concretização desse objetivo, na medida em que pretende, fundamentalmente, contribuir para o desenvolvimento humano e profissional do assistente social, sobretudo se numa perspetiva de supervisão não hierárquica, mas antes reflexiva e centrada na melhoria da atuação profissional. A investigação sobre a supervisão profissional externa de assistentes sociais é de real interesse para o Serviço Social, como um potencial contributo para que este se projete como uma profissão com capacidade de enfrentar os desafios que ocorrem a nível social. Esta convicção radica também na ideia de que “a recriação do Serviço Social resulta do realinhamento do exercício da intervenção profissional face às transformações dos modos de vida e dos quotidianos sociais” (Mouro, 2009, p. 11), até como forma de afirmação do seu espaço no campo das ciências sociais e humanas. Kadushin e Harkness (2014), autores de referência nesta área, consideram a supervisão uma atividade imprescindível à formação, não só académica, mas também direcionada para a capacitação permanente do profissional, tendo a potencialidade de orientar o 1
Ao longo deste livro, utilizaremos a designação “utente” sempre que nos quisermos referir a qualquer cidadão/ /utilizador de um serviço público ou privado no qual o Serviço Social exerce a sua intervenção.
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Introdução
aperfeiçoamento da sua intervenção. Pode realizar-se de forma individual ou em grupo e dirigir-se a estudantes, profissionais ou equipas que trabalhem numa instituição. O denominador comum a todos os tipos de supervisão é o de que se trata de uma prática em que um supervisor2, profissional com conhecimento e experiência adquiridos, presta apoio a um supervisando, que lhe solicita orientação e/ou formação. É importante ter em consideração que, fora do âmbito da intervenção social, a supervisão tem diferentes aceções, sendo normalmente conotada como um instrumento de controlo por parte das hierarquias e também como elemento de controlo da qualidade, tanto dos serviços, como de produtos. A supervisão não é, assim, uma prática exclusiva do Serviço Social, desenvolvendo-se em diferentes contextos e em diferentes ciências sociais, humanas e psicológicas, nos campos da Saúde e da Educação e em meio empresarial. Embora não haja um setor específico para o desenvolvimento da supervisão, sabemos que os profissionais que desenvolvem a sua prática na área dos cuidados ou ajuda a pessoas, em que a relação é relevante, são os que mais a defendem e praticam (Cruells, 2009). A supervisão em Serviço Social tem sido identificada como um dos fatores mais importantes na determinação dos níveis de satisfação laboral dos assistentes sociais e de qualidade do serviço prestado aos utentes3. Sendo um processo constitutivo, de forma indireta, do Serviço Social, é surpreendente que a supervisão não tenha recebido tanta atenção como outras suas componentes, como a investigação ou a administração social. Há uma notável lacuna na discussão crítica e profunda do estado da arte e da prática da supervisão em Serviço Social, baseada na evidência, na literatura de investigação empírica existente (Howe & Gray, 2013; Kadushin & Harkness, 2014; Tsui, 2005). Idañez (1994, p. 19) questiona mesmo: “(…) como é que é possível este défice e fraco desenvolvimento (…) sobretudo no âmbito profissional (…) se em todo o lado se fala de supervisão?”. Assim, é necessária uma investigação sobre supervisão em Serviço Social para fazer a ponte entre as exigências do campo e a ausência de literatura. Neste livro, consideramos a conceção, o desenvolvimento e as estratégias de ação para a promoção de práticas reflexivas que potenciam o desenvolvimento pessoal e profissional. Procuraremos, através do estudo de caso apresentado no Capítulo 5 (Parte II), ilustrar em que medida a supervisão profissional pode melhorar a reflexão e a intervenção e potenciar o conhecimento (teorias, modelos, metodologias e ética) em Serviço Social num projeto concreto de supervisão profissional em Serviço Social, desenvolvido junto de assistentes sociais que coordenam SAD de uma instituição social. Pretende-se, portanto, contribuir para a construção de conhecimento científico acerca da supervisão profissional externa em Serviço Social em Portugal, dada a sua escassez, caracterizando o processo de construção do conhecimento profissional do assistente social potenciado pela participação num processo de supervisão.
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Apesar de a linguagem não ser neutra, utilizaremos neste livro o termo “supervisor” para nos referirmos ao profissional que realiza supervisão, quer seja masculino ou feminino; o mesmo faremos em relação ao “supervisando” nos Capítulos 1 a 4 (Parte I). Apenas no estudo de caso apresentado no Capítulo 5 (Parte II), iremos recorrer ao género feminino para nos referirmos às “supervisandas”, por corresponder à realidade efetiva, usando quer a designação “assistente social”, quer os termos “profissional” ou “entrevistada”. 3 Assume-se esta ideia no livro, mas ainda são escassos os estudos que revelam que a supervisão pode melhorar o serviço prestado aos utentes. XIX
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
Estrutura da obra O livro encontra-se dividido em duas partes interrelacionadas, as quais se concretizam em cinco capítulos. Na primeira parte, composta pelos Capítulos 1 a 4, apresentaremos o enquadramento teórico – fundamentos históricos e conceptuais da supervisão em Serviço Social (Capítulo 1); tipos, funções e modalidades de supervisão (Capítulo 2) – e analisaremos, aprofundadamente, a supervisão profissional externa, os seus objetivos, o processo, o perfil e as competências do supervisor (Capítulo 3), bem como o seu potencial no desenvolvimento da reflexividade e da prática reflexiva (Capítulo 4). Na segunda parte do livro, abordaremos o estudo de caso já aludido, analisando em que medida a supervisão profissional externa em Serviço Social se consubstancia como processo de desenvolvimento pessoal e profissional e como locus da (re)construção da intervenção (Capítulo 5). Apresentaremos, por fim, a conclusão e as referências bibliográficas.
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Uma Experiência de Supervisão com Coordenadores de Serviços de Apoio Domiciliário (SAD)
Introdução No sentido de uma melhor compreensão dos contornos metodológicos do processo de recolha de informação, com vista à sistematização deste capítulo, começamos por apresentar uma breve contextualização metodológica e a caracterização das assistentes sociais participantes neste estudo de caso.
Breve contextualização metodológica O nosso objeto de pesquisa foi a supervisão profissional externa em Serviço Social enquanto espaço de desenvolvimento pessoal e profissional que contribui para a reconstrução da intervenção social dos assistentes sociais em SAD, que prestam cuidados maioritariamente a pessoas idosas, mas também a outras pessoas em situação de dependência. A fim de prosseguir esse objeto, foram definidas como finalidades gerais: analisar a forma como o processo de supervisão profissional externa em Serviço Social desenvolvido com assistentes sociais coordenadores de SAD influencia as suas práticas; perceber como o processo de supervisão profissional externa e a promoção do desenvolvimento pessoal e profissional dos assistentes sociais contribuem para o desenvolvimento de competências reflexivas críticas para, na e sobre a ação; identificar os contributos da supervisão profissional externa na (re)construção dos saberes e das competências teóricas, metodológicas, éticas e políticas específicas do Serviço Social. Foram ainda estabelecidos os seguintes objetivos específicos: definir o perfil dos assistentes sociais que participaram no processo de supervisão profissional, contextualizando as suas funções e responsabilidades; situar os padrões teóricos, metodológicos e éticos desenvolvidos pelos assistentes sociais em SAD; identificar as dimensões reflexivas integradas na prática profissional decorrente do processo de supervisão externa.
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Em função dos objetivos que foram definidos para este trabalho, pareceu-nos fundamental a adoção de uma postura interpretativa. Foi nesse sentido que realizámos um estudo de caso de tipo compreensivo, através da análise intensiva e aprofundada de uma situação em particular, ou seja, uma experiência de supervisão profissional externa em Serviço Social desenvolvida numa instituição social portuguesa. O critério de escolha deste caso prendeu-se não só com a acessibilidade ao campo por parte da autora enquanto supervisora, mas também pela potencial exemplaridade do caso, dado que a experiência se realizou numa instituição de grande prestígio na área 121
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social, com muitos assistentes sociais, na qual a preocupação com a formação e o desenvolvimento profissional e com uma intervenção de qualidade junto dos destinatários da intervenção é uma premissa fundamental.
Universo e amostra A nossa amostra correspondeu ao universo das1 assistentes sociais coordenadoras de SAD à data da pesquisa de campo, isto é, 33 profissionais. Neste trabalho, não procurámos uma representatividade estatística nem o estabelecimento de regularidades, mas sim uma representatividade social e a diversidade dos fenómenos. Na verdade, como sublinha Yin (1989), o estudo de caso não visa uma generalização estatística dos resultados, uma vez que o “caso” não é uma amostra a partir da qual se possam inferir as características do universo em estudo. De forma distinta, segundo o mesmo autor, o estudo de caso permite, quando muito, uma generalização “analítica”, na qual as questões de investigação e os pressupostos teóricos são utilizados como guias para comparar os resultados empíricos. A análise e a compreensão do contributo da supervisão em Serviço Social na (re)construção dos saberes e das competências teóricas, metodológicas, éticas e políticas da intervenção dos assistentes sociais só poderão ser alcançadas com a participação dos seus agentes e através do contacto com os seus contextos de trabalho. Neste sentido, e tal como advoga Martinelli (1999), na pesquisa qualitativa em Serviço Social o que interessa não é o número de pessoas que prestam informação, mas o significado que esses indivíduos têm, de acordo com o que procuramos com a investigação.
Recolha de dados Optámos por realizar entrevistas em profundidade como técnica qualitativa de relevância na apreensão das perceções e das vivências pessoais das experiências, da totalidade das assistentes sociais das equipas supervisionadas, com o objetivo de aceder às representações e aos significados que são atribuídos ao processo de supervisão. Destaca-se o valor heurístico das narrativas das entrevistadas, que permitiu a sua utilização como fonte de conhecimento. Enquanto fontes secundárias, destacamos as documentais, designadamente documentos da instituição de acolhimento da supervisão, que serviram, sobretudo, para a caracterização do campo empírico. Foi, assim, elaborado um guião de entrevista que procurasse estimular a produção de discursos e respeitar uma baixa diretividade na condução da conversa, para que as entrevistadas expressassem livremente as suas conceções e práticas e retratassem as suas vivências, indagações e pontos de vista. O guião foi construído a partir de um conjunto de dimensões e respetivos indicadores enunciados na Tabela 5.1.
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Uma vez que a totalidade das pessoas entrevistadas é do género feminino, optámos por utilizar sempre a designação “entrevistadas” ou referirmo-nos a “assistentes sociais” ou “supervisandas” no feminino.
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Uma Experiência de Supervisão com Coordenadores de Serviços de Apoio Domiciliário (SAD)
Tabela 5.1 – Dimensões e indicadores analisados Dimensões
Indicadores ■■
Dados sociodemográficos; Formação académica inicial e contínua.
II) Experiência profissional
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Percurso profissional.
III) Contexto de intervenção
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Serviço Social em SAD.
IV) Conhecimentos teóricos e metodológicos do Serviço Social
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Posicionamento teórico; Processo metodológico.
V) Questões éticas
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Princípios e valores.
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Emoções profissionais (autorreflexão); Aprendizagem com os outros.
I) Caracterização/Perfil das assistentes sociais
VI) Autorreflexividade VII) Supervisão profissional externa
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Experiência atual de supervisão; Experiência prévia de supervisão.
Questões éticas As narrativas das assistentes sociais permitiram aceder não só ao seu projeto ideológico e às suas expetativas, mas também às tensões em que estão imersas em contextos institucionais. Estas narrativas fundamentam a compreensão de como é vivenciado, neste contexto profissional específico, o processo de supervisão profissional contado na primeira pessoa. O interesse e as motivações que estiveram na base desta investigação e que a acompanharam manter-se-ão para além dela, tendo-se considerado não existir conflito de interesses neste processo. Privilegiou-se o ponto de vista dos atores nele envolvidos e a nossa análise sobre a interpretação dos atores da investigação, que são criadores de significados, tal como nós. Esta circunstância implica a assunção do risco acrescido de investigar um tema/objeto no qual a própria investigadora esteve inserida. Tal posição significa que, por um lado, possa não existir um real distanciamento que facilite a objetividade dos atores, ao fazerem parte da investigação enquanto sujeito e enquanto objeto, mas, por outro, possam abrir-se novas perspetivas que, possivelmente, de outro modo, não teriam sido tidas em consideração ou mesmo descobertas.
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Descrição do contexto institucional onde foi realizada a supervisão A supervisão é desenvolvida, geralmente, em contexto institucional. Desta forma, estudar o processo de supervisão numa determinada instituição implica conhecer o contexto no qual o mesmo decorreu. Vários autores são consensuais ao defenderem que o desenvolvimento da supervisão numa instituição pressupõe um amplo conhecimento desta (Cruells, 2009; Guerra & Braga, 2009; Kadushin & Harkness, 2014; Tsui, 2005). Neste sentido, este ponto visa dar conta do contexto organizacional e das circunstâncias em que se situa o SAD, serviço onde se integra e configura a experiência de supervisão aqui considerada. O contexto institucional onde o assistente social desenvolve a sua ação tem alguma influência nos processos de estruturação e perceção das suas práticas, particularmente 123
Supervisão Profissional em Serviço Social – Ao encontro de uma prática reflexiva
quando estamos perante contextos institucionais nos quais a autonomia técnica e profissional do assistente social é relativa. Esta situação pode, de acordo com Nunes (1995), levar a uma certa cristalização de saberes e práticas profissionais. O sistema institucional determina a estrutura da supervisão, os direitos e os deveres do trabalho de supervisão dentro da instituição e o papel de cada um dos atores. A cultura da instituição, a sua missão e os seus procedimentos são, neste sentido, determinantes para a interação supervisor-supervisando. Desta forma, diferentes instituições requerem diferentes adaptações da supervisão (Kadushin & Harkness, 2014). Nesta linha de pensamento, a supervisão não pode ser vista apenas como experiência individual ou de grupo, uma vez que os profissionais não existem desligados de um determinado contexto coletivo. A supervisão é uma experiência social, porque ser pessoa também o é, e estudá-la significa compreender os aspetos institucionais que a influenciam. Tal como afirma Ponticelli (1994, p. 30): “(…) os aspetos institucionais (ou seja, inerentes à organização na qual o Serviço Social se insere como modalidade de intervenção) não são elementos marginais no processo de ajuda. A organização não é um aspeto secundário, ou um cenário onde se desenvolve uma ação centrada em dois atores: o utente (individual ou coletivo) e o assistente social. É (antes) um fator que perpassa todo o processo de intervenção, influenciando-o e moderando-o (...).”
A instituição onde decorreu a supervisão é uma pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública administrativa, nos termos dos respetivos estatutos. A sua história está intimamente ligada à ação social, desenvolvendo a sua intervenção também noutras áreas. A resposta do SAD da instituição em estudo destina-se a indivíduos que se encontram em situação de dependência física e/ou psíquica e que não podem assegurar temporária ou permanentemente a satisfação das suas necessidade básicas e/ou a realização das atividades instrumentais da vida diária. À data do estudo, tinha uma capacidade total de resposta de 2870 utentes.
Método global de atuação A supervisão assentou nos seguintes princípios de atuação:
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Preparação do plano de supervisão das sessões, mediante a realização do diagnóstico das necessidades, aspirações e expetativas das supervisandas, junto das mesmas;
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Apresentação e discussão de casos, pelas profissionais, e análise prospetiva da intervenção, a partir da ponderação de questões. Utilização de várias técnicas adequadas à exploração dos temas e objetivos propostos, tais como role-playing, brainstorming, análise documental de alguns relatórios e informações sociais e exposição oral pelas supervisandas, entre outras;
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Realização de autorreflexões sobre atitudes e valores dos profissionais face à intervenção, considerando a proximidade, o distanciamento e o envolvimento do profissional na relação com os utentes;
Uma Experiência de Supervisão com Coordenadores de Serviços de Apoio Domiciliário (SAD) ■■
Avaliação do programa de supervisão que integrou momentos e instrumentos de avaliação intercalar e global. Foram considerados indicadores de avaliação, entre outros, o processo de supervisão, a interação supervisor supervisando, os temas abordados e os conteúdos apreendidos e refletidos, a organização do plano de supervisão, a metodologia utilizada e o espaço físico.
As sessões, com a duração de três horas por equipa, realizaram-se nas instalações da instituição, mensalmente, durante nove meses. Cada equipa teve, assim, nove sessões, num total de 27 horas de supervisão2. Em síntese, podemos utilizar a proposta de categorização de Cruells (2009, p. 84), ilustrada na Tabela 5.2. Tabela 5.2 – S íntese de caracterização do protocolo de supervisão (adaptada de Cruells, 2009) Cruells (2009)
Experiência em estudo
Quarenta e sete profissionais, 33 dos quais asNúmero de pessoas supervisionadas: individual sistentes sociais; ou coletiva ■■ Coletiva (de grupo). ■■
Procedência dos supervisandos: da mesma instituição ou de diferentes instituições
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Da mesma instituição; De diferentes SAD.
Área disciplinar e qualificação profissional: de igual ou diferente qualificação profissional, da mesma disciplina ou pluridisciplinar
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Predominantemente disciplinar (Serviço Social).
Procedência do supervisor: interno, do mesmo local de trabalho ou externo à própria instituição
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Externo à instituição.
Origem da decisão de supervisão: da direção ou dos trabalhadores
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Da direção da instituição.
Qualificação do supervisor: disciplina afeta à dos supervisandos ou distinta
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Afeta à das supervisandas (Serviço Social).
Objetivos propostos
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Descritos no protocolo.
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Caracterização das assistentes sociais participantes no processo de supervisão
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Informações gerais Todas as assistentes sociais participantes neste estudo de caso são mulheres, com idades compreendidas entre os 32 e os 59 anos. São todas licenciadas em Serviço Social (à exceção de uma, que é licenciada em Política Social). A assistente social licenciada há mais tempo terminou a licenciatura em 1980 e a mais recente terminou-a em 2006. Em termos de formação pós-graduada, verificamos que praticamente metade das supervisandas possui pós-graduação. A sua experiência profissional como assistentes sociais varia entre os 5 e os 35 anos, sendo que em SAD varia entre os 2 e os 16 anos de trabalho. 2
É importante referir que embora a experiência concreta aqui em análise se refira apenas a estes nove meses, este protocolo de supervisão profissional externa tinha tido várias edições anteriormente, sendo a supervisora e a maior parte das supervisandas as mesmas. 125
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16,7cm x 24cm
9,5mm
Fruto do cruzamento dinâmico das trajetórias de intervenção e investigação da sua Autora, surge esta obra inédita e pioneira em Portugal, que coloca a supervisão em lugar de destaque no exercício profissional dos assistentes sociais. Dividida em duas partes inter-relacionadas, na primeira apresentam-se os fundamentos, os tipos e as modalidades da supervisão em Serviço Social, bem como o perfil e as competências do supervisor e a supervisão enquanto espaço e tempo de desenvolvimento de uma prática reflexiva; na segunda, é demonstrado um estudo de caso, levado a cabo no serviço de apoio domiciliário (SAD) de uma instituição social, cujos resultados evidenciam que uma análise crítica sistemática das práticas quotidianas dos assistentes sociais, possibilitada pela supervisão, permite aumentar o conhecimento e potenciar uma prática crítica, reflexiva e mais qualificada.
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Por consistir num contributo muito relevante para o Serviço Social enquanto profissão e disciplina académica, este livro é destinado a estudantes, docentes e profissionais desta área, bem como a outros técnicos de ação e intervenção social que se interessem pelo processo de supervisão pedagógica e profissional.
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Prefácios de: Maria Irene de Carvalho Professora Associada do ISCSP – Universidade de Lisboa Esta obra será, decerto, uma referência no panorama do Serviço Social em Portugal, constituindo-se como uma mais-valia para a profissão e para os profissionais.
www.pactor.pt
9 789896 930875
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ISBN 978-989-693-087-5
CARLA RIBEIRINHO
Isabel de Freitas Vieira Assistente Social e Docente na Universidade Católica Portuguesa (…) desejo que o maior número possível de estudantes e profissionais de Serviço Social possa ler esta obra e, a partir daí, criar novos momentos de diálogo e reflexão sobre a oportunidade aqui gerada para, através da supervisão, sermos capazes de renovar as práticas profissionais e reafirmar o lugar do Serviço Social na academia e na sociedade como construtor da dignidade humana, defensor dos direitos humanos e tutor da justiça social.
SUPERVISÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL
A supervisão profissional em Serviço Social é um processo em que o assistente social, geralmente mais experiente e informado, orienta outro assistente social tendo como objetivo aumentar os conhecimentos e a competência dos profissionais, melhorando a sua prática e o seu desenvolvimento profissional e pessoal.
16,7cm x 24cm
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CARLA RIBEIRINHO
SUPERVISÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL AO ENCONTRO DE UMA PRÁTICA REFLEXIVA
CARLA RIBEIRINHO
Assistente social há quase duas décadas. Licenciada e mestre em Serviço Social pelo Instituto Superior de Serviço Social e doutorada em Serviço Social pela Universidade Católica Portuguesa. Docente na licenciatura em Serviço Social no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Foi docente na licenciatura de Serviço Social e no mestrado de Gerontologia Social na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, com responsabilidades de coordenação executiva da pós-graduação e do mestrado em Gerontologia Social e de subdireção da licenciatura em Serviço Social. Formadora e supervisora profissional nas áreas do Serviço Social e da Gerontologia Social em diversas organizações. Consultora da área Seniores da Fundação Aga Khan Portugal. Foi supervisora profissional externa nos serviços de apoio domiciliário (SAD) da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa. Coautora de capítulos de livros nas áreas do Serviço Social e da Gerontologia Social, entre os quais Serviço Social no Envelhecimento e Maus Tratos a Pessoas Idosas, ambos publicados pela Pactor.