Manual de Nefrologia

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20,5mm

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Coleção

MANUAL de NEFROLOGIA

É neste nível de excelência que este manual se enquadra, tratando dos aspetos essenciais da Nefrologia e contendo as orientações necessárias para a resolução da maioria das situações encontradas na prática clínica diária, faz a ponte para a interação crucial entre o especialista de Nefrologia e as restantes especialidades que ajudam a tratar os doentes e a quem este manual se destina.

C

Com efeito, reunindo-se uma equipa de coautores de enorme prestígio e qualidade, é dada, nesta obra, uma visão muito prática da intervenção nefrológica, sem perda da sofisticação exigível e sempre tão baseada em evidência quanto possível.

M

Y

CM

NEFROLOGIA

A Nefrologia portuguesa tem dado sinais de uma evolução muito positiva em termos de formação, de cobertura muito bem estruturada de todo o território nacional, permitindo um acesso fácil a todo e qualquer cidadão no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, nos recursos técnicos de que dispomos, bem como nos resultados que obtemos no tratamento dos doentes nas diferentes valências nefrológicas.

Manual de

MANUAL DE

NEFROLOGIA

MANUAL LIDEL

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K

Chefe de Serviço Hospitalar de Nefrologia; Coordenador da Nefrologia e Diretor da Unidade de de Cuidados Intensivos do Hospital CUF Tejo; Diretor Médico Nacional da Nephocare Portugal.

Líder em edições de medicina

www.lidel.pt

ISBN 978-989-752-572-8

9 789897 525728

www.lidel.pt

Pedro Ponce

Meio século de saber

NEFROLOGIA Coordenação:

Guia prático de consulta indispensável em Nefrologia Textos claros, objetivos e de fácil consulta Fundamental para uma melhor atuação clínica

Pedro Ponce:

Grupo LIDEL

de

Pedro Ponce

Espera-se, assim, que este Manual de Nefrologia, destinado a Estudantes do ciclo clínico do curso de Medicina, a Médicos Especialistas nas várias áreas que se cruzam com a prática nefrológica e a Enfermeiros a trabalharem ou a prepararem-se para trabalhar com doentes renais, seja de grande utilidade para o leitor e lhe dê tanto gosto lê-lo como deu aos autores escrevê-lo.

MY

MANUAL

. Avaliação Básica da Doença Renal . Alterações do Equilíbrio Hidroeletrolítico . Alterações do Equilíbrio Ácido-Base . Alterações do Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio . Edemas Generalizados e Terapêutica Diurética . Doença Glomerular. Conceitos Gerais . Doenças Glomerulares Primárias . Vasculites Renais e Sistémicas . Nefrite Lúpica e Nefrites Associadas a Doenças Reumatismais . Amiloidoses: Diagnóstico e Orientação Clínica . Nefropatias Associadas à Deposição de Imunoglobulinas Monoclonais . Microangiopatias Trombóticas e Síndrome Antifosfolipídica . Glomerulopatia e Infeção . Rim e Diabetes . Rim e Hipertensão . Doença Renal e Gravidez . Rim Poliquístico do Adulto e Outras Doenças Hereditárias do Rim . Infeção Urinária . Obstrução do Aparelho Urinário . Litíase Renal . Nefrites Túbulo-Intersticiais Crónicas . Onconefrologia . Lesão Renal Aguda: Avaliação e Terapêutica Conservadora . Complicações Renais em Síndromes Sistémicas: Prevenção e Tratamento . Técnicas de Substituição da Função Renal na Lesão Renal Aguda . Doença Renal Crónica . Anemia na Doença Renal Crónica . Doença Óssea e Metabólica na Doença Renal Crónica . Tratamento Conservador da Doença Renal Crónica . Hemodiálise no Tratamento da Doença Renal Crónica . O Acesso Vascular para Hemodiálise . Diálise Peritoneal . Tratamento de Intoxicações com Técnicas Depurativas: Quando e Como Referenciar . Transplantação Renal, Imunobiologia e Terapêutica Imunossupressora . Abordagem Clínica no Pós-Transplante Renal . Guia Prático para a Prescrição Terapêutica na Doença Renal


Manual de Nefrologia

Coordenação:

Pedro Ponce

Lidel – Edições Técnicas, Lda www.lidel.pt


Edição e Distribuição Lidel – Edições Técnicas, Lda. Rua D. Estefânia, 183, r/c Dto. – 1049-057 Lisboa Tel: +351 213 511 448 lidel@lidel.pt Projetos de edição: editoriais@lidel.pt www.lidel.pt Livraria Av. Praia da Vitória, 14A – 1000-247 Lisboa Tel.: +351 213 511 488 livraria@lidel.pt Copyright © 2020, Lidel - Edições Técnicas, Lda. ISBN edição impressa: 978-989-752-572-8 1.ª edição impressa: novembro de 2020 Paginação: Mónica Gonçalves Impressão e acabamento: RealBase – Sistemas Informáticos, Lda. – Albergaria-a-Velha Dep. Legal n.º 475690/20 Capa: José Manuel Reis Todos os nossos livros passam por um rigoroso controlo de qualidade, no entanto aconselhamos a consulta periódica do nosso site (www.lidel.pt) para fazer o download de eventuais correções. Não nos responsabilizamos por desatualizações das hiperligações presentes nesta obra, que foram verificadas à data de publicação da mesma. Os nomes comerciais referenciados neste livro têm patente registada. Reservados todos os direitos. Esta publicação não pode ser reproduzida, nem transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo eletrónico, mecânico, fotocópia, digitalização, gravação, sistema de armazenamento e disponibilização de informação, sítio Web, blogue ou outros, sem prévia autorização escrita da Editora, exceto o permitido pelo CDADC, em termos de cópia privada pela AGECOP – Associação para a Gestão, através do pagamento das respetivas taxas.


Índice Lista de Autores.................................................................................................... V Prefácio.................................................................................................................. IX Fernando Nolasco

Lista de Siglas e Abreviaturas.............................................................................. XI 1.

Avaliação Básica da Doença Renal............................................................. 1

Pedro Ponce

2.

Alterações do Equilíbrio Hidroeletrolítico.................................................... 11 Pedro Ponce

3.

Alterações do Equilíbrio Ácido-Base........................................................... 27

Pedro Ponce

4.

Alterações do Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio..................... 39

Teresa Adragão

5.

Edemas Generalizados e Terapêutica Diurética........................................ 47

Pedro Ponce

6.

Doença Glomerular. Conceitos Gerais........................................................ 55

Pedro Ponce

7.

Doenças Glomerulares Primárias............................................................... 61

Ana Carina Ferreira, Fernanda Carvalho

8.

Vasculites Renais e Sistémicas................................................................... 75

Mário Góis

9.

Nefrite Lúpica e Nefrites Associadas a Doenças Reumatismais................ 83

Mário Góis

10. Amiloidoses: Diagnóstico e Orientação Clínica.......................................... 91

Luisa Lobato

11. Nefropatias Associadas à Deposição de Imunoglobulinas Monoclonais...... 105

José Maximino Costa

12. Microangiopatias Trombóticas e Síndrome Antifosfolipídica.................... 117 ©  Lidel – edições técnicas

Josefina Santos

13. Glomerulopatia e Infeção............................................................................ 133

Afonso Sepúlveda Santos, Karina Soto

14. Rim e Diabetes............................................................................................. 149

Patrícia Branco

15. Rim e Hipertensão....................................................................................... 159

Ana Farinha, José Vinhas

16. Doença Renal e Gravidez............................................................................ 173

Andreia Borges


IV Manual de Nefrologia

17. Rim Poliquístico do Adulto e outras Doenças Hereditárias do Rim.......... 185

Edgar Almeida

18. Infeção Urinária............................................................................................ 193

Pedro Ponce

19. Obstrução do Aparelho Urinário.................................................................. 201

Estevão Lima

20. Litíase Renal................................................................................................. 207

Pedro Ponce

21. Nefrites Túbulo-Intersticiais Crónicas......................................................... 215

Pedro Ponce

22. Onconefrologia............................................................................................. 221

Ana Paiva

23. Lesão Renal Aguda: Avaliação e Terapêutica Conservadora.................... 233

Pedro Ponce

24. Complicações Renais em Síndromes Sistémicas: Prevenção e Tratamento................................................................................................... 245

João Cruz

25. Técnicas de Substituição da Função Renal na Lesão Renal Aguda......... 259

João João Mendes

26. Doença Renal Crónica................................................................................. 273

Luísa Helena Pereira, Pedro Leão Neves

27. Anemia na Doença Renal Crónica.............................................................. 281

Rui Alves

28. Doença Óssea e Metabólica na Doença Renal Crónica............................ 289

Aníbal Ferreira

29. Tratamento Conservador da Doença Renal Crónica................................. 297

Ana Farinha

30. Hemodiálise no Tratamento da Doença Renal Crónica............................. 305

Jorge Pratas

31. O Acesso Vascular para Hemodiálise......................................................... 317

Pedro Ponce

32. Diálise Peritoneal......................................................................................... 327

Anabela Rodrigues

33. Tratamento de Intoxicações com Técnicas Depurativas: Quando e Como Referenciar..................................................................................... 337

Rita Valério Alves, Ana Vila Lobos

34. Transplantação Renal, Imunobiologia e Terapêutica Imunossupressora... 345

Jorge Malheiro

35. Abordagem Clínica no Pós-Transplante Renal............................................ 357

Ana Mateus

36. Guia Prático para a Prescrição Terapêutica na Doença Renal................. 371

Rita Calça, André Weigert


Lista de Autores AUTOR/COORDENADOR Pedro Ponce

Chefe de Serviço Hospitalar de Nefrologia; Coordenador da Nefrologia e Diretor da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital CUF Tejo; Diretor Médico Nacional da Nephrocare Portugal.

AUTORES Afonso Sepúlveda Santos

Interno de Nefrologia no Serviço de Nefrologia do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca.

Ana Carina Ferreira

Nefrologista com Grau de Consultor do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Hospital Curry Cabral; Assistente Convidada da Nova Medical School.

Ana Farinha

Assistente Hospitalar do Centro Hospitalar de Setúbal.

Ana Mateus

Assistente Graduada de Nefrologia na Unidade de Transplante Renal do Hospital da Cruz Vermelha, Lisboa.

Ana Paiva

Assistente Hospitalar Graduada de Nefrologia do IPO, Porto.

Ana Vila Lobos

Assistente Graduada Sénior de Nefrologia; Diretora Clínica do Centro Hospitalar do Médio Tejo.

Anabela Rodrigues

Consultora de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto; Professora Associada com Agregação do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto.

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André Weigert

Assistente Graduado Sénior de Nefrologia do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, Hospital de Santa Cruz; Professor Auxiliar Convidado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa; Membro dos Colégios de Medicina Interna, Nefrologia e Farmacologia Clínica da Ordem dos Médicos.

Andreia Borges

Assistente Graduada de Nefrologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra.

Aníbal Ferreira

Assistente Graduado Sénior de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Hospital Curry Cabral; Diretor Clínico da Nephrocare Vila Franca de Xira; Professor Associado da Nova Medical School; Presidente da Sociedade Portuguesa de Nefrologia.


VI Manual de Nefrologia

Edgar Almeida

Diretor do Serviço de Nefrologia e Diretor Clínico do Hospital Beatriz Ângelo; Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

Estevão Lima

Coordenador da Urologia do Hospital CUF; Professor da Escola de Medicina da Universidade do Minho.

Fernanda Carvalho

Nefrologista na Nefrolab-Laboratório de Nefropatologia, Pinhal Novo.

João Cruz

Intensivista na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalentes do Hospital CUF Infante Santo; Nefrologista; Diretor da Nephrocare Amadora.

João João Mendes

Especialidade em Medicina Interna e Medicina Intensiva; Serviço de Medicina Intensiva do Hospital Professor Doutor Fernando da Fonseca; Unidade de Cuidados Intensivos Polivalentes do Hospital CUF Infante Santo; Professor Auxiliar Convidado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

Jorge Pratas

Assistente Graduado Sénior no Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra; Diretor Clínico da Unidade de Diálise da Nephrocare Oliveira do Bairro.

Jorge Malheiro

Assistente Hospitalar Graduado no Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto; Professor Auxiliar Convidado do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto.

José Maximino Costa

Diretor do Serviço de Nefrologia do Instituto Português de Oncologia, Porto.

José Vinhas

Diretor do Serviço de Nefrologia e Diretor do Departamento de Medicina do Centro Hospitalar de Setúbal; Presidente da Comissão Executiva da Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde, Infarmed IP.

Josefina Santos

Nefrologista no Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto; Membro da Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB) do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto

Karina Soto

Assistente Graduada no Serviço de Nefrologia do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca; Professora da Nova Medical School.

Luísa Helena Pereira

Interna da Formação Específica de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Hospital de Faro.

Luísa Lobato

Assistente Graduada Sénior de Nefrologia; Diretora do Departamento de Ensino, Formação e Investigação do Centro Hospitalar Universitário do Porto; Vice-coordenadora da Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB) e Professora Catedrática Convidada do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto.


Lista de Autores VII

Mário Góis

Nefrologista do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central; Assistente Convidado da Nova Medical School.

Patrícia Branco

Nefrologista do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental; Diretora da Nephrocare APDP; Assistente Convidada da Nova Medical School.

Pedro Leão Neves

Diretor do Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve; Professor Catedrático de Medicina da Universidade do Algarve.

Rita Calça

Interna da Formação Específica de Nefrologia do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, Hospital de Santa Cruz.

Rita Valério Alves

Interna da Formação Específica de Nefrologia do Centro Hospitalar do Médio Tejo.

Rui Alves

Diretor do Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra; Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Teresa Adragão

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Diretora da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital CUF Infante Santo; Professora Catedrática da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.


capítulo

1

Avaliação Básica da Doença Renal

Pedro Ponce

INTRODUÇÃO A função do rim cumpre objetivos absolutamente essenciais à nossa existência, tais como a depuração de produtos mais ou menos tóxicos resultantes do nosso meta­bo­lis­mo, a manutenção da homeostase da volemia, de eletrólitos e do equilíbrio ácido­‑base, bem como a regulação hormonal da produção de glóbulos vermelhos e de meta­bolitos ativos da vitamina D. Na 1.ª edição do seu compêndio sobre Nefrologia, Barry Brenner organizava a fisiopatologia renal e a clínica nefrológica em 10 grandes síndromes, a que acrescentamos uma 11.ª, a da doença renal crónica terminal. Usaremos­esta mesma taxonomia neste capítulo introdutório, para ajudar o leitor a perspetivar as diferentes formas de apresentação das doenças do rim e as interações entre elas. Ao longo deste Manual de Nefrologia desenvolveremos cada uma destas síndromes nos capítulos respetivos: Anomalias urinárias assintomáticas (AUA); Síndrome nefrítica (SNi); Síndrome nefrótica (SNo); Doença renal crónica (DRC); Lesão renal aguda (LRA); Uropatia obstrutiva (UO); Litíase renal (LIT); Hipertensão (HTA); Infeções do trato urinário (ITU); Nefropatia túbulo­‑intersticial (NTI); Doença renal crónica terminal (DRCT).

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ANOMALIAS URINÁRIAS ASSINTOMÁTICAS As AUA, predominantemente a hematúria microscópica e/ou a proteinúria não nefrótica, isoladas ou associadas, podem ser provocadas por todo o tipo de patologia nefrológica, glomerular ou não. O grande desafio nesta síndrome é identificar os doentes cuja patologia subjacente tem potencial para progredir para DRC, distinguindo­‑os daqueles em que este achado não terá qualquer impacto prognóstico. A deteção de AUA é feita, em geral, através de análises de urina, muitas vezes em exames de rotina, que posteriormente motivam outras tantas consultas para avaliação e explicação da relevância clínica deste achado fortuito ao doente, ao médico de família, à seguradora ou ao seu professor de ginástica. O sedimento urinário é efetuado numa amostra colhida já após a primeira micção da manhã, que deve ser centrifugada pouco tempo após a colheita (<3 horas), e examinado a fresco, de preferência por um observador experiente, capaz de estabelecer correlações com o quadro clínico. O sedimento pode dar­‑nos informação preciosa ao detetar hematúria microscópica, provavelmente glomerular se >40% dos


Avaliação Básica da Doença Renal

5

que doen­tes no estádio 3a/A1 não tendem a ter doença progressiva, principalmente se idosos (>65 anos) e/ou não diabéticos. Estes números impressionantes ganham especial relevância clínica por sabermos que mesmo reduções modestas do DFG, <80 ml/minuto, funcionam como um fator de risco poderoso de morbilidade e mortalidade cardio e cerebrovasculares.

Categorias do DFG (ml/minuto/1,73 m2) Descrição e progressão

Descrição e extensão das categorias de albuminúria persistente A1

A2

A3

Normal a ligeiramente aumentada

Moderadamente aumentada

Severamente aumentada

<30 mg/g <3 mg/mmol

30–300 mg/g 3–300 mg/mmol

>300 mg/g >30 mg/mmol

G1

Normal ou elevado

≥90

1 se DRC

1

2

G2

Ligeiramente diminuído

60–89

1 se DRC

1

2

G3a

Ligeiro a moderadamente diminuído

45–59

1

2

3

G3b

Moderado a severamente diminuído

30–44

2

3

3

G4

Severamente diminuído

15–29

3

3

4+

G5

Falência renal

<15

4+

4+

4+

Figura 1.1   Grelha estadiamento da gravidade e do risco de progressão da DRC de

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acordo com o DFG (G1 a G5) e a albuminúria (ratio albumina/creatinina na urina – A1 a A3).

No que diz respeito à referenciação para a consulta de Nefrologia, 27%, 34% e 38% dos doentes com DRC 3, 4 e 5, respetivamente, são non­‑progressors, isto é, a função renal foi estabilizada com a terapêutica instituída e a progressão é muito lenta. Assim, é mais prudente e conservador só classificarmos como DRC que justifica a referência para uma consulta de Nefrologia os doentes com proteinúria >1 g/dia e/ /ou os doentes com DFG <60 ml/minuto, ou <45 ml/minuto nos doentes >70 anos. Esta classificação deve ser qualificada em dois grupos: DRC de alto e baixo risco, conforme a velocidade de perda de DFG e a proteinúria. Para fins práticos, devem ser referenciados para consulta de Nefrologia: Todos os doentes com DRC em estádio 4 e 5; Doentes com diagnóstico etiológico difícil; Doentes com proteinúria >1 g/dia; Doentes com declínio do DFG >30% em 4­‑6 meses; HTA difícil de controlar; Hipercaliemia inesperada.


6

Manual de Nefrologia

LESÃO RENAL AGUDA O número de doentes com LRA necessitando de alguma forma de diálise aumenta 10% por ano. Usando a classificação da KDIGO, 21% de todas as admissões hospitalares (33­‑60% numa Unidade de Cuidados Intensivos [UCI]) sofreram uma LRA, requerendo diálise 2,3% de todos os doentes (5­‑10% numa UCI). A LRA manifesta­‑se por um espectro contínuo que vai desde a lesão incipiente, rapidamente reversível, mas só por si já capaz de influenciar negativamente o prognós­ tico do doente hospitalizado, até à lesão estrutural mais grave e estabelecida, com necessidade de técnicas depurativas de substituição da função renal. O que se chamava insuficiência renal aguda é modernamente denominado LRA, utilizando­‑se na sua definição e classificação prognóstica apenas o valor de creatinina sérica e da diurese. Define­‑se como redução abrupta (em 48 horas) da função renal, correspondendo a uma elevação da creatinina no soro ≥0,3 mg/dl, ou o seu aumento percentual em 50% (aumento de 1,5 vezes), ou uma redução da diurese para <0,5 ml/kg/hora por >6 horas. Tudo isto num contexto clínico plausível e após adequada ressuscitação de volume (Tabela 1.1).

Tabela 1.1

Estratificação em estádios da LRA.

Estádio

Creatinina no soro

Diurese

1

Aumento ≥0,3 mg/dl ou 1,5­‑2 vezes o valor basal

<0,5 ml/kg/hora, >6 horas

2

Aumento >2­‑3 vezes o valor basal

<0,5 ml/kg/hora, >12 horas

3

Aumento >3 vezes o valor basal ou Cr >4 mg/dl

<0,3 ml/kg/hora, >24 horas

Cr: creatinina sérica

Estes critérios, porventura excessivamente sensíveis, têm como objetivo assegurar que a alteração da função renal é, de facto, aguda e enfatizar que até uma ele­va­ção de 0,3 mg/dl na creatinina pode ter uma repercussão substantiva no prognóstico. Quer em termos de conceito, quer em termos de utilidade operacional, a antiga classificação da LRA em pré­‑renal (efeito da hipovolemia sem lesão parenquimatosa, rapidamente reversível) e renal ou NTA é atualmente obsoleta. A LRA é caracterizada por uma acentuação da heterogeneidade funcional dos nefrónios, no âmbito da qual a apresentação fenotípica dos nossos doentes em pré­ ‑renal versus renal, ou oligúrica versus não oligúrica, resulta do seu posicionamento, num determinado momento, num espectro contínuo e extremamente dinâmico, que se altera­em função de comorbilidades, função renal basal, intensidade e duração dos insultos à função renal e das terapêuticas a que já foram sujeitos, como diuréticos ou dopamina. Em resumo, a LRA é diagnosticada pela medição da creatinina. Infelizmente, trata­ ‑se de um marcador imperfeito que, quando começa a elevar­‑se, em geral já se perdeu 50% da função renal basal e que oscila com o metabolismo muscular e as variações do volume extracelular – parâmetros muito instáveis nestes doentes. A ecografia renal e vesical continua a ter um papel fundamental, devendo ser efetua­da precocemente em todos os doentes suspeitos dos estádios iniciais de LRA. Ao olhar para os rins, permite excluir obstrução, presença de massas neoplásicas


50 Manual de Nefrologia

proteinúria patológica; se >3,5, proteinúria nefrótica), ou dosear a microalbuminú‑ ria em amostra única de urina (um resultado >2,5 g/L indicia, em geral, uma SNo). A confirmação da suspeita de SNo aconselha a referenciação do doente para a consulta externa de Nefrologia ou o internamento, conforme a gravidade e a rapi‑ dez de instalação do edema.

Terapêutica O tratamento passa pela restrição de sal a 2­‑3 g/dia de sódio e pela administração de diuréticos, como veremos adiante. Os IECA ou os ARA permitem controlar a HTA quando ela existe, não agravam a re‑ tenção hidrossalina e são os mais eficazes na redução da proteinúria. A administração de albumina deve reservar­‑se para situações de hipovolemia, hi‑ potensão, oligúria ou insuficiência renal (atenção: pode precipitar edema pulmo‑ nar), com albuminemias <2 g/dl. A dose a administrar deve ser ajustada à gravi‑ dade clínica, não ultrapassando os 3 frascos/dia de 50 cc a 20%. Se o doente fica internado, deve fazer profilaxia com heparina de baixo peso mole‑ cular, pois a SNo tem um risco aumentado de eventos trombóticos, tanto mais fre‑ quentes quando a albumina sérica é <2,0 g/dl. A imobilidade, como consequência do edema, ou doença intercorrente aumentam ainda mais esse risco.

ADMINISTRAÇÃO DE DIURÉTICOS

Características

gerais

A utilização de diuréticos é uma arma terapêutica preciosa, de utilidade comum a estas três grandes síndromes. Os diuréticos estão entre os fármacos mais receita‑ dos, muitas vezes para tratar doentes que, pela sua doença de base, têm risco elevado de complicações severas devido ao seu uso, pelo que é importante conhe‑ cer a sua farmacocinética e farmacodinamia. Os chamados diuréticos de ansa, a furosemida, a bumetanida e a torasemida, ini‑ bem o transportador Na­‑K­‑2Cl (NKCC2) ao longo da ansa de Henle e mácula densa a partir do lúmen tubular. Os diuréticos do túbulo distal, tiazidas e similares (inda‑ pamida, metolazona, clorotalidona, etc.), atuam também no lúmen tubular, ligando­ ‑se ao NCC ao longo do túbulo contornado distal (no proximal, no caso da metola‑ zona). Quanto aos diuréticos poupadores de potássio, uns inibem canais de sódio apicais intratubulares (amilorida e triamtereno), outros antagonizam os recetores dos mineralocorticoides (espironolactona e eplerenona) e atuam dentro da célula, não requerendo secreção para dentro do lúmen tubular. Os diuréticos de ansa, se administrados por via endovenosa, têm ação quase imediata; por via oral, a absorção e consequente biodisponibilidade da torase‑ mida é >80% e da furosemida só 50%, pelo que, tradicionalmente, se duplica a dose endovenosa na transição para a via oral. Para haver ação de um diurético de ansa, temos de ultrapassar um determinado limiar de nível circulante, que não é mensurável no dia a dia e é variável entre diuréticos e para cada situação clínica, o mesmo acontecendo com as suas biodisponibilidades. Em situações de grande edema, a absorção intestinal diminui substancialmente e o limiar para a ação aumenta, mais para a furosemida, pelo que, ainda que não estando pro‑ vado em definitivo, a torasemida, tendo melhor biodisponibilidade e maior vida


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Edemas Generalizados e Terapêutica Diurética 51

média, poderá ter vantagens em algumas situações de resistência à ação da fu‑ rosemida. Os diuréticos de ansa circulam com uma ligação a proteínas >95%; na hipoalbumi‑ nemia, o seu volume de distribuição fica aumentado e a chegada ao rim diminuída. A coadministração de diuréticos com albumina poderá melhorar a resposta nestes casos, ainda que, em estudos recentes, essa vantagem seja controversa. Na DRC, só a vida média da furosemida aumenta, o mesmo não acontecendo com a dos outros diuréticos de ansa, que têm predominantemente excreção hepática. Este facto parece constituir uma vantagem para a furosemida, mas aumenta igual‑ mente o seu risco de efeitos adversos (hipocaliemia, hipomagnesemia, ototoxici‑ dade). Para atuarem, os diuréticos de ansa têm de chegar ao lúmen tubular; devido à ligação a proteínas, não podem ser filtrados no glomérulo e dependem de meca‑ nismos de secreção de aniões orgânicos ao nível do túbulo proximal. Esta secreção está inibida na DRC, na acidose metabólica e no uso de AINE. Pela sua ação, os diuréticos de ansa provocam vasodilatação aferente, protegendo a filtração glome‑ rular mesmo na hipovolemia – um mecanismo contrariado por AINE, o que explica o risco aumentado de internamento na ICC com o uso de AINE. Ao nível do polo apical da mácula densa, os diuréticos de ansa inibem o transpor‑ tador NKCC2 e estimulam a renina, mas inibem o feedback túbulo­‑glomerular, o que impede a vasoconstrição da arteríola aferente e a correspondente diminuição da filtração glomerular. Os diuréticos de ansa têm uma vida média de cerca de 3­‑6 horas, após o que se entra numa fase de “retenção de cloreto de sódio pós­‑diurética” que se, por um lado, reduz os efeitos adversos destes fármacos, por outro, contribui para a limita‑ ção da sua ação terapêutica. Em doentes com edemas refratários, principalmente se a ingesta de sódio é elevada, devemos administrar sempre duas doses diárias ou até, em meio hospitalar, infundir continuamente diuréticos de ansa. A vantagem relativa da infusão contínua de furosemida versus altas doses intermitentes é ainda especulativa, mas confere, em geral, bons resultados práticos. Quando se inicia terapêutica diurética, é fundamental fazer chegar ao lúmen tubu‑ lar da ansa de Henle uma dose de diurético superior ao seu limiar de ação. Se o limiar foi atingido, o doente nota um aumento de diurese nas 2­‑4 horas após a toma. A resposta diurética a uma determinada dose vai diminuindo à medida que o vo‑ lume do espaço extracelular se reduz (braking phenomenon), atingindo um novo patamar de equilíbrio. Com a continuação da administração do diurético de ansa, reforça­‑se a estimulação simpática e a ativação do SRAA que contribuem para o braking phenomenon, mas assiste­‑se igualmente a um remodelling das células tubulares distais, com hiperplasia e hipertrofia das mesmas e maior retenção de cloreto de sódio. A adição de uma tiazida, ou similar, não só reduz a reabsorção distal do cloreto de sódio, como, por ter uma vida média mais longa, atenua o efeito de retenção pós­‑diurético à custa de maior risco de hipocaliemia e hiponatremia. Infelizmente, sabemos hoje que a hipocaliemia estimula o ICC, atenuando o bene‑ fício diurético. A única verdadeira urgência no tratamento do edema é o edema agudo do pulmão. Nas outras situações, há que decidir com que velocidade e agressividade quere‑ mos tratar o edema, o que depende da apreciação da volemia, da função renal e do estado hemodinâmico.


52 Manual de Nefrologia

Aplicações

especiais

O diurético mais utilizado e adequado na insuficiência cardíaca é a furosemida, pela sua eficácia, rapidez de atuação e escassos efeitos acessórios. Tem uma se‑ mivida relativamente curta: ±2 horas. Usa­‑se preferencialmente a via endovenosa, uma vez que há, com frequência, edema da parede intestinal que condiciona uma diminuição da absorção. A administração pode fazer­‑se de forma intermitente, ou seja, em bólus, ou em per‑ fusão contínua. Após a primeira dose é indispensável saber se não houve resposta: neste caso, devemos duplicar a dose em futuras administrações. Se tiver havido resposta, mas de curta duração, será mais útil repetir a mesma dose 2­‑3 vezes/dia. A administração de um diurético induz, como já vimos, uma ação compensadora de estimulação neuro­‑humoral, com aumento da produção de catecolaminas e ADH e estimulação do SRAA, o que, por sua vez, induz um rebound de retenção de sódio ao nível de outros segmentos do túbulo renal não inibidos. Daí a especial eficácia de atuar em vários níveis do túbulo com diuréticos de ansa (a furosemida), associados a tiazidas (ação no túbulo distal) ou metolazona (ação no túbulo proxi‑ mal), ambos induzindo hipocaliemia severa, ou ainda com a espironolactona (pou‑ padora de potássio, mas indutora de hiponatremia, tal como as tiazidas). Antes de se iniciar uma perfusão contínua de furosemida, é necessário administrar uma dose de carga (40­‑80 mg), com o intuito de diminuir o tempo necessário para alcançar a concen­tração terapêutica da droga. Geralmente usamos furosemida pura numa seringa de 50 cc, o que corresponde a ±10 mg/cc. Começamos com um débito de 20­‑40 mg/hora (2­‑4 cc/hora) e ajustamos o ritmo à função renal e à resposta diurética do doente. Os efeitos adversos mais frequentes são a hipocaliemia, a hiponatremia, principal‑ mente em mulheres de baixa estatura, a alcalose metabólica, com consequências mais graves na cirrose hepática, e a ototoxicidade, que é dosidependente. A hipo‑ volemia provocada agrava a função renal, nomeadamente em presença de uma síndrome cardiorrenal. As tiazidas podem administrar­‑se 1 ou 2 vezes/dia em doses variáveis de acordo com a função renal (hidroclorotiazida, 25­‑500 mg/dia; metolazona, 2,5­‑10 mg/ /dia). Na insuficiência renal, a tiazida de primeira escolha é a metolazona. A espironolactona tem especial interesse na insuficiência cardíaca; o antagonismo da ação da aldosterona reduz a mortalidade, melhora a resposta diurética e reduz o risco de hipocaliemia. A terapêutica com espironolactona num insuficiente cardí‑ aco, com função renal algo diminuída e a fazer concomitantemente IECA, tem um risco acrescido de hipercaliemia e hiponatremia, que deve ser vigiado. O apareci‑ mento no mercado de novos captadores gastrointestinais de potássio, como o pa‑ tirómero, veio possibilitar a manutenção do benefício do uso de IECA/antagonista do recetor da angiotensina II (ARAII)/espironolactona no tratamento da ICC ou da síndrome cardiorrenal, sem risco de hipercaliemias perigosas. Realça­‑se que a ad‑ ministração de espi­ronolactona está contraindicada aquando da existência de in‑ suficiência renal moderada a grave (creatinina >2,5 mg/dl). Na comparação entre doses elevadas de diuréticos versus ultrafiltração extracor‑ poral, esta última revelou uma espoliação de volume idêntica, mas maior disfun‑ ção renal e efeitos adversos, pelo que apenas é recomendada para doentes renais dependentes de diálise.


58 Manual de Nefrologia

Arteríola aferente Células epiteliais parietais Podócito Cápsula de Bowman

Arteríola eferente Célula mesangial Capilar glomerular Matriz mesangial

Espaço urinário

Célula endotelial Membrana basal glomerular (MBG)

Lúmen capilar Glicocálice Células endoteliais MBG Podócitos Espaço urinário Figura 6.1   Desenho esquemático do novelo capilar que constitui o glomérulo, para

facilitar a compreensão dos achados de uma biópsia renal.

Mais recentemente, procura­‑se fugir de uma classificação de glomerulopatias es‑ sencialmente morfológica, baseada na biópsia renal, evoluindo para uma classifica­ ção baseada na causa/patogénese. Liderado pela equipa da clínica Mayo, um grupo de peritos (Sethi et al.) propôs dividir as glomerulonefrites em cinco grupos: glome‑ rulonefrites por imunocomplexos (nefropatia de IgA, vasculite por IgA, glomerulone‑ frites pós­‑infeciosas, nefrite lúpica, glomerulonefrite fibrilhar); glomerulonefrites pauci­‑imunes (glomerulonefrite rapidamente progressiva ou crescêntica, vascu­lites sistémicas); glomerulonefrites por anticorpos contra a membrana basal; glomerulo‑ nefrites por deposição de imunoglobulinas monoclonais (mieloma, amiloi­dose, glo‑ merulonefrite imunotactoide, etc.); glomerulonefrites por depósitos de C3.

MEDIDAS TERAPÊUTICAS GERAIS O tratamento da SNi e da SNo tem como principal objetivo (nem sempre alcançá‑ vel) controlar o mecanismo patogénico indutor de lesão renal – tarefa do âmbito do especialista, só após conhecer o resultado da biópsia renal. Paralelamente, im‑ porta instituir medidas gerais, a fim de tentar a redução da proteinúria, suspender a progressão da insuficiência renal e, secundariamente, controlar o edema e a PA – missão ao alcance do médico generalista.

Edema Deve­‑se essencialmente à retenção de sal, e não à hipoalbuminemia, com con‑ sequente diminuição de pressão oncótica plasmática. Assim, o tratamento con‑ siste fundamentalmente na restrição de sal na dieta (<2­‑3 g/dia de sódio) e na


62 Manual de Nefrologia

Figura 7.1   Glomérulo normal. Microsco-

pia ótica (Pratax200).

Nefropatia

Figura 7.2   Pedicelos normais em microscopia eletrónica.

de IgA

Esta é a glomerulonefrite primária mais frequente no Ocidente e nos países asiáti‑ cos. Foi descrita pela primeira vez em 1968 por Berger e caracteriza­‑se por depósi‑ tos difusos de IgA. É mais comum em homens (sobretudo nos países ocidentais), podendo ocorrer em qualquer idade, mas com pico de incidência na segunda e terceira décadas de vida, sendo rara em melanodérmicos. Associada a esta do‑ ença está a púrpura de Henoch­‑Schönlein, uma vasculite de pequenos vasos, tam‑ bém caracterizada por depósitos de IgA (nos microvasos na derme), mas que se distingue da nefropatia de IgA pelas suas manifestações extrarrenais. O mecanismo patogénico da doença é a deposição mesangial de imunoglobulina A1 (IgA1) polimérica, por modificação da síntese/metabolismo desta imunoglobu‑ lina, tanto por alterações da galactosilação, como por alterações da sialilação. A IgA1 polimérica deficientemente galactosilada revela um aumento de afinidade com a fibronectina e o colagénio tipo IV, bem como um aumento da tendência para se agregar e formar complexos de antigénio­‑anticorpo (Ag­‑Ac) IgA­‑IgG (imunoglobu‑ lina G), promovendo a sua deposição no mesângio glomerular. Há evidência re‑ cente de alteração na sialilação da IgA1, o que reduz a clearance sistémica destes imunocomplexos contendo IgA. Assim, há acumulação de IgA no mesângio porque a taxa de deposição excede a capacidade de clearance mesangial ou a deposição é resistente à clearance mesangial. Apesar de ser considerada uma doença espo‑ rádica, há predisposição genética para o seu aparecimento em determinados indiví­duos. Outra associação observada é a possibilidade de a doença ser uma complicação de uma infeção, uma vez que há estudos que demonstram o surgi‑ mento da doença após infeções, sendo as mais reportadas a Staphylococcus au‑ reus e a Haemophilus parainfluenzae. As manifestações clínicas da doença são bastante variáveis: Em 40­‑50% dos casos, episódios recorrentes de hematúria macroscópica, 24 horas após infeções respiratórias superiores (a grande diferença temporal permite distin‑ guir de uma glomerulonefrite pós­‑estreptocócica), que pode ser acompanhada por outra sintomatologia que mimetiza uma pielonefrite aguda ou mesmo cólica renal; Em 30­‑40% dos casos, hematúria microscópica, com ou sem proteinúria (sub‑ nefrótica); Em 5% dos casos, SNo;


Doenças Glomerulares Primárias 63 Em

<5%, lesão renal aguda (LRA), que pode ser crescêntica ou causada por obstrução tubular pela hematúria.

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Até metade dos doentes pode evoluir para insuficiência renal de estádio 5. Apesar de, na maior parte dos casos, se apresentar com doença renal isolada, a nefropatia de IgA pode associar­‑se a outras doenças sistémicas, nomeadamente DHC (mais frequentemente de etiologia alcoólica), doença celíaca ou mesmo do‑ ença inflamatória intestinal, infeção pelo VIH, artrites seronegativas, carcinoma de pequenas células do pulmão, linfomas e tuberculose disseminada, ou mesmo a outras doenças glomerulares, tais como a nefropatia membranosa, a doença de lesão mínima (DLM) ou a poliangeíte granulomatosa. A evolução e o prognóstico da doença estão dependentes de fatores de risco de progressão da doença renal, nomeadamente HTA e proteinúria >1 g/dia. Como foi referido, em cerca de metade dos doentes assiste­‑se à progressão da disfunção renal, sendo que os restantes apresentam um curso clínico benigno. O diagnóstico da doença só pode ser confirmado por biópsia renal. No entanto, a presença de hematúria microscópica isolada não carece de biópsia renal imediata, podendo fazer­‑se um diagnóstico presuntivo, baseado na história clínica e em aná‑ lises. Na presença de disfunção renal, proteinúria, HTA de novo ou não controlada, a biópsia renal é recomendada. Os achados da biópsia renal incluem, com grande frequência, proliferação mesan‑ gial (Figura 7.3), mas podem variar, indo de alterações mínimas glomerulares até à presença de grandes crescentes (mais raramente). A imunofluorescência é imprescindível para confirmar o diagnóstico, ao revelar os depósitos mesangiais de IgA, que podem ser acompanhados de IgG, IgM, C3 e de cadeias leves lambda (Figura 7.4). Recentemente foi desenvolvida uma nova clas‑ sificação para a doença, a Classificação de Oxford, que criou um score MEST, cujas variáveis histológicas parecem ter predição prognóstica – hipercelularidade me‑ sangial (M), hipercelularidade endocapilar (E), glomeruloesclerose segmentar (S) e atrofia/fibrose túbulo­‑intersticial (T). Nos últimos dois anos foi dada mais atenção à presença ou ausência de crescentes (C) na biópsia, levando à introdução de mais uma variável no score MESTC. O valor deste score como guia terapêutico não está validado. A microscopia eletrónica mostra os depósitos densos no mesângio que correspondem ao depósito de IgA revelado na fluorescência.

Figura 7.3   Proliferação mesangial e

endocapilar. Microscopia ótica (PAS, do inglês periodic acid-Schiff x200).

Figura 7.4   Depósitos de IgA nos glo-

mérulos. (Imunofluorescência [IMF] x200).


Nefrite Lúpica e Nefrites Associadas a Doenças Reumatismais 89 NL classes III, IV e V Fase de indução

Metilprednisolona 500 mg–1000 mg em 3 dias consecutivos, seguidos de prednisolona oral (1 mg/kg/dia – máximo 80 mg/dia), a reduzir nas semanas seguintes + (uma das seguintes)

Micofenolato de mofetil oral 2-3 g/dia por 6 meses

Ciclofosfamida •  Endovenosa (0,5-1 mg/m2), mensal por 6 meses ou •  Endovenosa em baixa dose (500 mg a cada 2 semanas por 3 meses) ou •  Oral (1-1,5 mg/kg/dia – máximo 150 mg/dia) por 2-4 meses

Fase de indução Prednisolona 5-10 mg/dia •  Micofenolato de mofetil 1-2 g/dia (1.ª escolha) ou •  Azatriopina 1-2,5 mg/kg/dia ou •  Ciclosporina 2-4 mg/kg/dia ou •  Tacrolímus vale de 4-6 ng/ml

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Figura 9.3   Esquema terapêutico da NL classes III, IV e V.

No transplante renal há alguns fatores a ter em consideração. Um deles diz respeito à atividade da doença no período do transplante. Para se avançar para o transplante renal, é importante que o LES esteja quiescente há, pelo menos, 6 meses. Nos casos que apresentam alguma evidência de atividade serológica da doença, está recomendado o início de imunossupressão antes do transplante de dador vivo. Os doentes com LES e síndrome dos anticorpos antifosfolípidos devem estar anticoagulados, pelo risco de trombose do enxerto renal. Apesar destes aspetos, a recorrência da NL no transplante renal é baixa (cerca de 10% dos casos) e o prognóstico do enxerto renal é semelhante ao dos doentes com outras glomerulopatias.


Glomerulopatia e Infeção 137

incluídos no teste de estreptozima, que pode ser útil em doentes com infeção de pele e para estirpes que não produzem estreptolisina.

-2

-1

0 Hipertensão

1

2

Hematúria

3 Proteinúria

4

5 ASLO

6

7

C3

Figura 13.1   Curso clínico da GNPE.

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Padrão

anátomo­‑patológico

Na idade pediátrica, o diagnóstico é, geralmente, feito pela clínica, estando a biópsia­renal reservada para casos duvidosos, com um curso temporal atípico, ou para casos em que a infeção anterior não tenha sido identificada. No entanto, a realização de biópsia renal é mais comum em adultos. O padrão de lesão mais frequente é a glomerulonefrite proliferativa exsudativa endo­capilar. No entanto, dependendo do tempo e da gravidade, podem surgir pa­ drões morfológicos diversos, nomeadamentemembranoproliferativos, focais e seg­ mentares ou extracapilares. Na fase aguda, a microscopia ótica mostra uma glomerulonefrite proliferativa exsuda­tiva: hipercelularidade mesangial e endotelial e infiltração do glomérulo por neutrófilos. O envolvimento glomerular é global e difuso, podendo existir crescen­ tes extracapilares – embora estes sejam, geralmente, escassos. Com a coloração de Tricrómio de Masson, podem observar­‑se depósitos subepiteliais na forma de humps (ou “em bossa”). Habitualmente, existem também edema e infiltração in­ tersticial de leucócitos de predomínio polimorfonuclear, que pode ser intensa, e os vasos extraglomerulares não apresentam alterações. A partir da segunda semana, os infiltrados de neutrófilos e a hipercelularidade en­ dotelial vão desaparecendo, sendo a proliferação mesangial mais duradoura. A resolução é, geralmente, completa, mas, nos casos mais graves, as cicatrizes podem permanecer sob a forma de esclerose focal e segmentar. A principal diferença histológica, nos casos em adultos, é o facto de a GNPE ser geralmente acompanhada de outros padrões de lesão renal devido a patologia concomitante anterior, principalmente arteriosclerose e diabetes. A imunofluorescência demonstra depósitos granulares difusos de imunocomple­ xos nos capilares e no mesângio, muito positivos para C3 e variáveis ​​para IgG. Se houver positividade para C1q ou IgM, esta não é, usualmente, muito intensa e a IgA é excecional. Vários padrões foram descritos, mas não demonstraram valor prognósti­co: o padrão “em grinalda” refere­‑se à existência de numerosos depósitos


138 Manual de Nefrologia

granulares ao longo da parede capilar e, geralmente, está associado a proteinúria nefrótica. O padrão em “céu estrelado” mostra depósitos granulares mais disper­ sos e corresponde a um envolvimento clínico mais leve. O padrão mesangial, com predomínio de C3, é normalmente observado na fase de resolução. Na microscopia eletrónica, evidenciam­‑se os depósitos densos subepiteliais carac­ terísticos, em forma de humps, que não são patognomónicos, podendo ser obser­ vados noutras glomerulonefrites. Podem também identificar­‑se outros pequenos depósitos densos, dispersos a nível subendotelial e mesangial. Na fase de resolu­ ção, os depósitos subepiteliais desaparecem primeiramente, seguindo­‑se os depó­ sitos subendoteliais e mesangiais.

Abordagem

terapêutica

O tratamento da GNPE é, fundamentalmente, de suporte, incluindo o uso de anti­ ‑hipertensores e diuréticos para controlo da retenção hidrossalina. Em doentes re­ fratários à terapêutica diurética, com alterações eletrolíticas e/ou ácido­‑base per­ sistentes, pode ser necessária TSFR. Não existe evidência atual para o uso de terapêutica imunossupressora, embora existam publicações sobre casos tratados, sobretudo com apresentação histoló­ gica de proliferação extracapilar ou má evolução clínica. Por outro lado, também não há evidências que favoreçam o tratamento com antibióticos, uma vez que o quadro de nefrite se estabelece quando o foco infecioso está resolvido (período de latência), mas, em casos de dúvida, este é, geralmente, prescrito. Nas epidemias de infeção estreptocócica, a administração de antibióticos parece prevenir o envol­ vimento renal.

Prognóstico A insuficiência renal e a HTA resolvem­‑se espontânea e progressivamente ao fim de 1 ou 2 semanas, mas a hematúria e a proteinúria podem persistir durante vários meses. Ocasionalmente, a micro­‑hematúria pode manter­‑se durante vários anos. Nas crianças, ocorre remissão completa na maioria dos casos. A mortalidade é estimada em 1%, com 97% dos casos fatais a ocorrerem nos países em desenvol­ vimento, sendo que a presença de LRA não se associa a pior prognóstico. A longo prazo, o prognóstico não é completamente benigno, principalmente se houver pro­ liferação extracapilar difusa. A sequela mais frequente é a persistência de HTA. Nos adultos, a mortalidade pode atingir os 30%, não existindo dados robustos com longo período de follow­‑up. No entanto, estima­‑se que até um terço dos sobreviven­ tes possa desenvolver doença renal crónica (DRC).

GLOMERULONEFRITE AGUDA ASSOCIADA A INFEÇÃO A GNAI é caracterizada por uma grande heterogeneidade etiológica, clínica e histo­ lógica e, sobretudo, pelo facto de a infeção estar geralmente ativa quando ocorre o processo agudo glomerular.

Fisiopatologia A patogénese da GNAI é menos clara do que a da GNPE, mas as evidências apon­ tam para mecanismos imunológicos semelhantes, em resposta a diversas infeções bacterianas (Quadro 13.2).


158 Manual de Nefrologia

QUAIS OS CRITÉRIOS QUE DETERMINAM A REFERENCIAÇÃO PARA NEFROLOGIA? Agravamento

de (DRD, definido por uma redução sustentada de ≥5 ml/mi‑ nuto/1,73 m2 num período inferior a 1 ano da eDFG, calculada pela fórmula CKD­‑EPI; Suspeita de outra etiologia para a doença renal, designadamente hematúria, UO e história familiar de doença renal; eDFG ≤30 ml/minuto (G4 e G5) (ver Figura 14.4); Ratio albumina/creatinina ≥2200 mg/g; eDFG entre 30­‑44 ml/minuto/1,73 m2 (G3b) e ratio albumina/creatinina >300 mg/g (A3) (ver Figura 14.4); HTA resistente; Gravidez.

POLÍTICAS DE SAÚDE O combate à DRD tem de começar pela prevenção da DM. Deve incluir a comuni‑ dade, associações de doentes, cientistas e a indústria, com o objetivo de se defini‑ rem estratégias políticas e linhas orientadoras de saúde pública que consigam melhorar os resultados em saúde para pessoas com diabetes e DRD. LEITURAS SELECIONADAS Alicic RZ, Johnson EJ, Tuttle KR. SGLT2 inhibition for the prevention and treatment of diabetic kidney disease: A review. Am J Kidney Dis. 2018;72(2):267­‑77. American Diabetes Association. 4. Comprehensive medical evaluation and assessment of co‑ morbidities: Standards of medical care in diabetes 2019. Diabetes Care. 2019;42:S34­‑45. American Diabetes Association. 11. Microvascular complications and foot care: Standards of medical care in diabetes 2020. Diabetes Care. 2020;43:S135­‑51. Górriz JL, Cos Claramunt FX, Duque N, et al. Review of the renal endpoints used in cardiovas‑ cular safety clinical trials in type 2 diabetes mellitus patients and their importance in pri‑ mary care. Prim Care Diabetes. 2020;3:485­‑94. Perkovic V, Jardine MJ, Neal B, et al. Canagliflozin and renal outcomes in type 2 diabetes and nephropathy. N Engl J Med. 2019;380(24):2295­‑306. Pugliese G, Penno G, Natali A, et al. Diabetic kidney disease: new clinical and therapeutic is‑ sues. Joint position statement of the Italian Diabetes Society and the Italian Society of Ne‑ phrology on “The natural history of diabetic kidney disease and treatment of hyperglycemia in patients with type 2 diabetes and impaired renal function”. J Nephrol. 2020;33(1):9­‑35. Rocco MV, Berns JS. KDOQI clinical practice guideline for diabetes and CKD: 2012 update. Am J Kidney Dis [Internet]. 2012;60(5):850­‑86. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1053/j. ajkd.2012.07.005. Tervaert TWC, Mooyaart AL, Amann K, et al. Pathologic classification of diabetic nephropathy. J Am Soc Nephrol. 2010;21(4):556­‑63. Tuttle KR. Back to the future: Glomerular hyperfiltration and the diabetic kidney. Diabetes. 2017;66(1):14­‑6. Yamanouchi M, Furuichi K, Hoshino J, et al. Nonproteinuric versus proteinuric phenotypes in diabetic kidney disease: A propensity score­‑matched analysis of a nationwide, biopsy­‑based cohort study. Diabetes Care. 2019;42(5):891­‑902.


capítulo

22

Onconefrologia

Ana Paiva

INTRODUÇÃO A Onconefrologia é uma área em rápida expansão, que estuda e trata as doenças renais nos doentes com cancro. A neoplasia ou os seus tratamentos podem causar diretamente doença renal e, nestas pessoas, os tratamentos oncológicos podem ter de ser ajustados. Cerca de 60% dos doentes com cancro têm algum tipo de doença renal, apresentando pior prognóstico do que aqueles que não a têm. Os doentes com neoplasias que anteriormente se considerava estarem em falência terapêutica podem agora beneficiar dos novos tratamentos que atrasam a progres‑ são do cancro e aumentam a sobrevida. No entanto, apesar de serem globalmente mais bem tolerados, muitos dos novos fármacos causam nefrotoxicidade. Há vários fatores de risco para o desenvolvimento de nefrotoxicidade, além das características do fármaco. Existem, em primeiro lugar, os fatores relacionados com o doente (idade, doença renal pré­‑existente ou alterações hidroeletrolíticas, outras comorbilidades, estado de hidratação, infeção). Cada vez mais se tratam doentes mais idosos e, portanto, mais suscetíveis a toxicidade. Os rins recebem 20% do débito cardíaco e os fármacos são filtrados/concentrados/excretados na urina. As células tubulares têm uma elevada taxa metabólica, encontram­‑se em hipoxia (na medula) e os fármacos ou os seus metabolitos atravessam­‑nas, po‑ dendo ser por elas metabolizados. No interstício e nas células da medula, os fár‑ macos atingem concentrações muito elevadas, propiciando a toxicidade. Por outro lado, temos de considerar os fatores de risco relacionados com o próprio fármaco: efeito nefrotóxico, dose, duração e via de administração e presença de interações medicamentosas. A neoplasia pode lesar diretamente o rim (como na nefropatia de cilindros/rim de mieloma, infiltração por células leucémicas, linfoma ou ainda obs‑ trução urinária) ou indiretamente, causando náuseas/vómitos/diarreia, ascite/ derrame pleural, sépsis, etc. A coexistência de alterações metabólicas como hipe‑ ruricemia ou hipercalcemia aumenta o risco de nefrotoxicidade.

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AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RENAL/IMPORTÂNCIA DA TAXA DE FILTRAÇÃO GLOMERULAR NO DOENTE ONCOLÓGICO A creatinina sérica é o principal marcador da função renal e deve ser usada para estimar a TFG. Em muitos adultos, especialmente idosos ou sarcopénicos, a creati‑ nina sérica encontra­‑se dentro dos valores de referência, mas a TFG está reduzida. Nesta população, o ideal é dosear a cistatina C e calcular a TFG média da creati‑ nina e da cistatina C, ajustada à superfície corporal (calculador disponível em www. mdrd.com e muitos outros online). A fórmula mais indicada é a CKD­‑EPI. Em todos os doentes que vão ser tratados com quimioterapia ou fármacos nefrotóxicos, como os bifosfonatos, deve ser calculada a TFG. Além disso, todos os doentes devem realizar um exame sumário de urina antes de qualquer tratamento oncoló‑ gico. Se tiverem proteinúria, esta deve ser doseada. Em caso de dúvida, o nefrolo‑ gista deve ser contactado.


306 Manual de Nefrologia

depurativa dos rins, manifestada pela redução da TFG (< 60 ml/minuto/1,73 m2) por 3 ou mais meses, qualquer que seja a sua etiologia. 253,33 230 227 231 232

235,2

234,86 233,73 230,56 227,07 224,4 225,08 218,14

pmp

215 195

190

198 200

204

204

176

98

99

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

13

14

15

16

17

18

Figura 30.1   Incidência anual de doentes em TSFR. Dados do Gabinete de Registo da Sociedade Portuguesa de Nefrologia apresentados no Encontro Renal de 28 a 30 de março de 2019.

1300 1200 1100 1000 900 800 700

626

675

701 716

744 760

804

834

870

902 924

961

1264 12121236 1182 1159 1116 10521068 1016

600 500 98 99

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10 11 12 13 14 15 16 17 18

Figura 30.2   Incidência e prevalência de doentes em diálise por milhão de habitantes. Dados do Gabinete de Registo da Sociedade Portuguesa de Nefrologia apresentados no Encontro Renal de 28 a 30 de março de 2019.

O DOENTE COM DOENÇA RENAL CRÓNICA E O INÍCIO DE DIÁLISE O acompanhamento de um doente com DRC envolve os seguintes aspetos: Tratamento de causas reversíveis de insuficiência renal; Prevenção ou retardamento da progressão da doença renal; Tratamento das complicações da insuficiência renal; Ajuste da dose do medicamento, quando apropriado, para o nível de TFGe; Identificação e preparação adequada do doente para o início da TSFR. É este último ponto que nos cabe aqui abordar, nomeadamente respondendo à difícil questão: quando iniciar diálise? A decisão de iniciar diálise deve ser muito bem ponderada e partilhada com o doen­te. O início do tratamento traz importantes alterações à sua qualidade de vida e é uma técnica que não é isenta de riscos e complicações.


308 Manual de Nefrologia

SISTEMA EXTRACORPORAL PARA HEMODIÁLISE O objetivo do sistema de hemodiálise é transportar o sangue, de forma segura, do paciente para o dialisador, permitir a remoção eficiente de toxinas urémicas e lí‑ quido em excesso e devolver o sangue, depois de depurado, ao paciente. Os principais componentes do sistema de diálise são: o circuito de sangue (Figura 30.3), o circuito do dialisado, o dialisador (Figura 30.4), o monitor de diálise e a solução de diálise (resultado da mistura de concentrado com água devida‑ mente tratada).

Heparina

Filtro de hemodiálise

Coletor de ar

Bomba

Sangue cheio de toxinas

Sangue filtrado

Figura 30.3   Hemodiálise – o que é, para que serve e como se faz (adaptado de https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Hemo01.gif).

O sangue impuro entra Eliminação das toxinas com a solução dialisante Purificação do sangue nas fibras ocas A solução dialisante pura entra O sangue é devolvido ao doente Figura 30.4   Estrutura do filtro dialisador.

ÁGUA PARA HEMODIÁLISE E SOLUÇÃO DE DIÁLISE Durante uma sessão de hemodiálise, com duração de 4 horas, o sangue do doente é exposto a >120 L de solução de diálise. A qualidade da água que a compõe é da maior importância para a saúde e para o bem­‑estar do doente. Esta água tem de passar por um complexo processo de purificação (designado como “tratamento de água para diálise”) que elimine os seus componentes químicos e microbiológicos. O equipamento necessário ao tratamento da água deve incluir: bombas hidropres‑ soras, sistema de cloragem, filtros de sedimento, descalcificador, filtro de carvão, filtro de partículas e osmose inversa. Posteriormente, a água purificada é sujeita a


324 Manual de Nefrologia A

B

C

Figura 31.2   Stop total do tronco braquiocefálico direito (A); angioplastia de lesão com balão de 12 mm (B), com repermeabilização do vaso e desaparecimento da circulação colateral (C).

Tabela 31.3  Sucesso primário obtido com CAV aos 30, 90 e 180 dias. Procedimentos

30 dias

90 dias

180 dias

Angiografia diagnóstica

83%

55%

45%

Angioplastia percutânea

92%

60%

45%

Trombólise+Angioplastia (prótese)

86%

51%

40%

Os resultados a longo prazo após uma trombólise/trombectomia são inferiores aos do tratamento, por angioplastia, de uma estenose sem trombose, daí o esforço para detetar precocemente uma estenose significativa do acesso vascular e inter‑ vir preventivamente. A trombose do acesso é uma urgência no contexto do acesso vascular, deve ser tratada tempestivamente para evitar a necessidade de CVC, em ambulatório, sendo necessário verificar, na diálise seguinte, se os parâmetros hemodinâmicos e de adequação da diálise regressaram ao nível basal. A infeção do acesso vascular é uma das complicações mais temíveis. Os agentes mais frequentes são: Staphylococcus epidermidis em 40,1% dos casos, Staphylococcus aureus em 30,1%, Pseudomonas em 13,3% e Escherichia coli em 3,3%. É muito importante manter um registo permanente de infeções do acesso vas‑ cular, dos agentes isolados e do seu espectro de sensibilidades. A metodologia


Guia Prático para a Prescrição Terapêutica na Doença Renal Crónica 379

Tabela 36.2

Principais

interações com terapêutica imunossupressora (tacrolímus, ciclosporina, everolímus e sirolímus).

Classe farmacológica

Fármaco

Potencial de interação

Inibidores do citocromo 3A4 e glicoproteína­‑P Macrólidos

Antifúngicos

Bloqueadores dos canais de cálcio

Alimentos, ervas

Azitromicina

-

Claritromicina

+++

Eritromicina

+++

Fluconazol

+/­‑

Itraconazol

++

Voriconazol

+++

Amlodipina

+

Nifedipina

+/­‑

Diltiazem

++

Verapamil

+++

Sumo de toranja

++

Indutores do citocromo 3A4 e glicoproteína­‑P Antiepiléticos

Carbamazepina

++

Fenitoína

+++

Antibióticos

Rifampicina

+++

Alimentos, ervas

Hipericão (erva­‑de­‑são­‑joão)

+++

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LESÃO RENAL AGUDA E TÉCNICA DIALÍTICA CONTÍNUA Na LRA, o ajuste das doses dos fármacos é mais complexo, devidoàs alterações dinâmicas tanto da função renal e de outros órgãos, como da volemia. Consequen‑ temente, as concentrações séricas dos fármacos aumentam ou diminuem se a dose não for ajustada apropriadamente. Por exemplo, a LRA é uma consequência frequente de sépsis bacteriana e existe uma percentagem importante de doentes que recebe doses de antibióticos desapropriadas nas primeiras 48 horas de trata‑ mento. Embora, em casos de LRA, a maioria da terapêutica crónica seja retirada, muitos medicamentos são continuados, nomeadamente anticoagulantes, imunos‑ supressores, antidiabéticos e analgésicos. Em cada um destes casos, a dose deve ser ajustada, de modo a reduzir os efeitos adversos sem comprometer o efeito te‑ rapêutico. O volume de distribuição habitualmente aumenta em casos de LRA: por exemplo, num doente crítico com sépsis e LRA, o volume de distribuição do antibiótico pode variar 10 vezes, pois os fluidos repostos durante a ressuscitação vão causar edema, derrame pleural ou ascite, assim como alterações na ligação às proteínas plasmáticas. A LRA altera também a eliminação do fármaco, pelo que está indicada uma redução da dose de manutenção. Uma vez que, nos casos de LRA, a distribuição e a excreção do fármaco variam em pouco tempo (horas a dias), o cálculo do DFG através das equações já menciona‑ das torna­‑se menos preciso. Nestes casos, a monitorização sérica do fármaco deve


380 Manual de Nefrologia

ser realizada sempre que possível. Nos casos de LRA com deterioração rápida da função renal, o mais indicado é a prescrição das doses recomendadas para um DFG <10 ml/minuto/1,73 m2.

CONCLUSÃO A terapêutica farmacológica em doentes com diferentes estádios de DRC pode ser desafiante, quer pela escassez de informação baseada em ensaios clínicos, quer pela labilidade da função renal. Esta pode variar dinamicamente, por vezes condi‑ cionada pela própria medicação instituída. Deve simplificar­‑se a terapêutica e ter por base a melhor informação farmacocinética e farmacodinâmica disponível, quando possível complementada por doseamentos de concentrações de fárma‑ cos. LEITURAS SELECIONADAS Aronoff GR, Bennett WM, Berns JS, et al. Drug prescribing in renal failure: Dosing guidelines for adults and children. 5thedition.American College of Physicians, 2007. Lea­‑Henry TN, Carland JE, Stocker SL, et al. Clinical pharmacokinetics in kidney disease: Fun‑ damental principles. Clinical Journal of the American Society of Nephrology. 2018;13(7): 1085­‑95. Matzke GR, Aronoff GR, Atkinson AJ, et al. Drug dosing consideration in patients with acute and chronic kidney diseasea clinical update from Kidney Disease: Improving Global Outco‑ mes (KDIGO). Kidney International [Internet]. 2011;80(11):1122­‑37. Disponível em: http:// dx.doi.org/10.1038/ki.2011.322. Roberts DM, Sevastos J, Carland JE, et al. Clinical pharmacokinetics in kidney disease appli‑ cation to rational design of dosing regimens. Clinical Journal of the American Society of Nephrology. 2018;13(8):1254­‑63. Weigert A, Herzog C. Paracelsos prediction and todays dilemma: How to treat atrial fibrillation in patients on haemodialysis?. Portuguese Journal of Nephrology & Hypertension. 2015;29(3): 187­‑91. Whittaker CF, Miklich MA, Patel RS, et al. Medication safety principles and practice in CKD. Clinical Journal of the American Society of Nephrology. 2018;13(11):1738­‑46.


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Espera-se, assim, que este Manual de Nefrologia, destinado a Estudantes do ciclo clínico do curso de Medicina, a Médicos Especialistas nas várias áreas que se cruzam com a prática nefrológica e a Enfermeiros a trabalharem ou a prepararem-se para trabalhar com doentes renais, seja de grande utilidade para o leitor e lhe dê tanto gosto lê-lo como deu aos autores escrevê-lo.

MY

MANUAL

. Avaliação Básica da Doença Renal . Alterações do Equilíbrio Hidroeletrolítico . Alterações do Equilíbrio Ácido-Base . Alterações do Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio . Edemas Generalizados e Terapêutica Diurética . Doença Glomerular. Conceitos Gerais . Doenças Glomerulares Primárias . Vasculites Renais e Sistémicas . Nefrite Lúpica e Nefrites Associadas a Doenças Reumatismais . Amiloidoses: Diagnóstico e Orientação Clínica . Nefropatias Associadas à Deposição de Imunoglobulinas Monoclonais . Microangiopatias Trombóticas e Síndrome Antifosfolipídica . Glomerulopatia e Infeção . Rim e Diabetes . Rim e Hipertensão . Doença Renal e Gravidez . Rim Poliquístico do Adulto e Outras Doenças Hereditárias do Rim . Infeção Urinária . Obstrução do Aparelho Urinário . Litíase Renal . Nefrites Túbulo-Intersticiais Crónicas . Onconefrologia . Lesão Renal Aguda: Avaliação e Terapêutica Conservadora . Complicações Renais em Síndromes Sistémicas: Prevenção e Tratamento . Técnicas de Substituição da Função Renal na Lesão Renal Aguda . Doença Renal Crónica . Anemia na Doença Renal Crónica . Doença Óssea e Metabólica na Doença Renal Crónica . Tratamento Conservador da Doença Renal Crónica . Hemodiálise no Tratamento da Doença Renal Crónica . O Acesso Vascular para Hemodiálise . Diálise Peritoneal . Tratamento de Intoxicações com Técnicas Depurativas: Quando e Como Referenciar . Transplantação Renal, Imunobiologia e Terapêutica Imunossupressora . Abordagem Clínica no Pós-Transplante Renal . Guia Prático para a Prescrição Terapêutica na Doença Renal


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