17cm x 24cm
As doenças reumáticas são um dos principais motivos de consulta de Medicina Geral e Familiar. A sua abordagem diagnóstica e terapêutica tem evoluído muito, sendo, por isso, relevante fazer uma 2.ª edição do livro Reumatologia Fundamental. Esta 2.ª edição expandiu os temas explorados na 1.ª edição e implicou a completa restruturação de todos os capítulos. Este livro, constituído por 21 capítulos escritos por especialistas nacionais, desenvolve temas centrais da área, como a semiologia, a imagiologia, a epidemiologia e os exames laboratoriais, com atenção às manifestações clínicas e ao diagnóstico das principais doenças reumáticas: artrite reumatoide, espondilartrites, osteoartrose, osteoporose, lúpus eritematoso sistémico, fibromialgia, entre outras. O Reumatologia Fundamental tem por objetivo informar o leitor sobre os principais aspetos diagnósticos e terapêuticos das doenças reumáticas de uma forma rápida e acessível, e é dirigido a alunos de Medicina, internos da especialidade de Reumatologia, internos e especialistas de Medicina Geral e Familiar e outros profissionais de saúde que tenham de abordar doentes com patologia reumática.
Reumatologia fundamental
Reumatologia fundamental
17cm x 24cm
12,5 mm
C
M
Reumatologia fundamental
Y
MY
CY
CMY
K
João Eurico Cabral da Fonseca Professor Catedrático e Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Diretor do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Group Leader do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
2.ª
edição
ª 2. edição Coordenação:
Maria José Santos Diretora do Serviço de Reumatologia do Hospital Garcia de Orta, EPE; Professora Associada de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
ISBN 978-989-752-833-0
9 789897 528330
João Eurico Cabral da Fonseca Maria José Santos Elsa Vieira-Sousa João Eurico Cabral da Fonseca Maria José Santos Elsa Vieira-Sousa
Elsa Vieira-Sousa Professora Auxiliar Convidada de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Assistente Graduada de Reumatologia do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Investigadora do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
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CM
Índice Autores.........................................................................................................................................................
VII
Prefácio.........................................................................................................................................................
XI
Pedro M. Machado
Introdução....................................................................................................................................................
XIII
João Eurico Cabral da Fonseca, Maria José Santos, Elsa Vieira-Sousa
Siglas, acrónimos e abreviaturas...................................................................................................................
XV
Extratexto a cores.........................................................................................................................................
XIX
Capítulo 1 • Semiologia em Reumatologia..................................................................................................
1
Manuel Silvério-António, Rui Lourenço Teixeira
Capítulo 2 • Exames laboratoriais em Reumatologia...................................................................................
17
Ana Maria Rodrigues, Maria Filipa Paramés, Pedro Ávila Ribeiro
Capítulo 3 • Imagiologia das doenças reumáticas........................................................................................
27
Joaquim Polido Pereira, João Janeiro
Capítulo 4 • Diagnóstico diferencial de monoartrite, oligoartrite e poliartrite.............................................
49
Raquel Campanilho-Marques, Maria João Saavedra
Capítulo 5 • Artrite reumatoide...................................................................................................................
57
Maria João Saavedra, Vasco C. Romão
Capítulo 6 • Espondilartrites........................................................................................................................
67
Elsa Vieira-Sousa
Capítulo 7 • Lúpus eritematoso sistémico....................................................................................................
77
Maria José Santos
Capítulo 8 • Síndrome de Sjögren................................................................................................................
87
Ana Catarina Duarte, Vasco C. Romão
Capítulo 9 • Miopatias inflamatórias............................................................................................................
95
Raquel Campanilho-Marques
Capítulo 10 • Esclerose sistémica...................................................................................................................
103
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Inês Cordeiro, Ana Cristina Cordeiro
Capítulo 11 • Doença indiferenciada do tecido conjuntivo, doença mista do tecido conjuntivo e outras síndromes de sobreposição......................................................................................................
111
Eduardo Dourado, Inês Cordeiro
Capítulo 12 • Síndrome antifosfolipídica....................................................................................................... Maria José Santos
115
Pedro Ávila Ribeiro Interno de Formação Especializada em Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Assistente Livre de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa. Raquel Campanilho-Marques Assistente Hospitalar de Reumatologia e Reumatologista Pediátrica da Unidade de Reumatologia Pediátrica do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Docente Convidada da Clínica Universitária de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa. Raquel Roque Assistente Hospitalar Graduada de Reumatologia do Hospital Garcia de Orta, EPE. Rita Barros Assistente Hospitalar Graduada de Reumatologia no Serviço de Reumatologia e Doenças Ósseas Metabólicas do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; tem competência em Ecografia Musculoesquelética em Reumatologia Nível 1 e 2 pela European Alliance of Associations for Rheumatology (EULAR). Rui Lourenço Teixeira Interno de Formação Especializada em Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Assistente de Introdução à Clínica e de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Investigador Doutorando da Unidade de Investigação em Reumatologia do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes e do Instituto de Histologia e Biologia do Desenvolvimento da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Membro do Departamento de Educação Médica e Embaixador do Programa Observar&Aprender da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
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Vasco C. Romão Assistente Hospitalar de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Coordenador da Consulta de Síndrome de Sjögren do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Professor Auxiliar Convidado de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Investigador da Unidade de Investigação em Reumatologia do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
IX Reumatologia Fundamental
Assistente Graduada de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Coordenadora da Consulta de Osteoartrose e Artrites Microcristalinas e da Consulta de Doenças Reumáticas na Gravidez do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Assistente Convidada de Reumatologia da Clínica Universitária de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Investigadora da Unidade de Investigação em Reumatologia do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
Autores
Susana Capela
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Prefácio Reumatologia Fundamental (2.ª edição) assenta no sucesso da 1.ª edição, publicada em 2013. O livro, destinado a médicos de clínica geral, médicos reumatologistas e médicos internos, tornou-se também numa base para o ensino da Reumatologia na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL). Quaisquer profissionais de saúde ligados ao tratamento de doentes reumáticos ou cientistas trabalhando nesta área beneficiariam da sua leitura. Trata-se de uma obra simultaneamente prática e abrangente, que aborda as principais doenças reumáticas, nomeadamente a sua epidemiologia, manifestações clínicas, diagnóstico e terapêutica, duma forma simples, concisa e baseada na ciência médica moderna. Em países desenvolvidos, as doenças reumáticas representam um problema médico, social e económico significativo. De acordo com o Programa Nacional Contra as Doenças Reumáticas (PNCDR), publicado em 2004 pela Direção Geral de Saúde (DGS), as doenças reumáticas são o motivo mais frequente de consulta nos serviços de saúde primários e são também o principal motivo de incapacidade temporária para o trabalho e de reformas antecipadas por doença ou invalidez. O EpiReumaPt, primeiro estudo epidemiológico nacional de larga escala, sobre as doenças reumáticas, cujos resultados foram apresentados em 2014, demonstrou que cerca de metade da população portuguesa sofre de, pelo menos, uma doença reumática, que as doenças reumáticas estão subdiagnosticadas, principalmente nas regiões que têm uma deficitária rede de referenciação da especialidade, e que as doenças reumáticas são as doenças crónicas que mais limitam o estado de saúde dos portugueses. A utilização das terapêuticas biológicas em doentes com doenças reumáticas inflamatórias trouxe grandes benefícios, permitindo um melhor controlo da atividade da doença e uma mais eficaz manutenção da capacidade funcional, laboral e qualidade de vida destes doentes. A remissão da doença, que há alguns anos parecia ser uma utopia, é agora um objetivo primordial no tratamento das doenças reumáticas inflamatórias, alicerçado num diagnóstico e tratamento precoces. Todo este progresso farmacológico só foi possível através dos esforços desenvolvidos ao nível da investigação dos mecanismos patogénicos das doenças reumáticas inflamatórias, que permitiram a identificação de algumas das moléculas responsáveis pelo processo inflamatório e o subsequente desenvolvimento de tratamentos específicos tendo como alvo essas mesmas moléculas pró-inflamatórias. Para além dos inequívocos benefícios no controlo das atividades da doença e na prevenção da incapacidade funcional, a introdução de terapêuticas biológicas veio revolucionar a prática reumatológica, introduzindo maior rigor na avaliação clínica e na persecução dos objetivos terapêuticos. Contudo, a introdução destas terapêuticas, levanta também questões de segurança e económicas que até aqui os reumatologistas raramente consideravam na avaliação dos seus doentes. Estas terapêuticas não são isentas de efeitos adversos e têm custos diretos elevados. Porém, é fundamental reconhecer que a utilização adequada destes fármacos, nos doentes com critérios para a sua introdução e posterior manutenção, está associada a significativos ganhos globais em saúde, clínicos, mas também sociais e económicos, através da redução de outros custos diretos e de uma importante fatia dos custos indiretos associados a incapacidade temporária e definitiva. O livro Reumatologia Fundamental não é, nem pretende ser, um tratado de Reumatologia. Delineado por uma equipa editorial de excelência, e com a contribuição de 23 reumatologistas nacionais, é um manual de Reumatologia prático, claro e sintético. É uma ferramenta de ensino e formação baseada no rigor científico, e um contributo para uma prática clínica de qualidade em Reumatologia, uma especialidade médica que exige uma visão global e integrada do doente e uma
Introdução As doenças reumáticas (DR) são o grupo de doenças crónicas mais frequentes e a principal causa de consulta médica nos cuidados de saúde primários na Europa, com repercussão muito importante no indivíduo e na sociedade. Constituem cerca de uma centena de entidades distintas que resultam de alterações funcionais do sistema musculoesquelético de etiologia não traumática que afetam adultos, adolescentes e crianças. Englobam doenças imunomediadas e inflamatórias do sistema musculoesquelético, tecido conjuntivo e vasos, doenças degenerativas das articulações periféricas e da coluna vertebral, doenças metabólicas ósseas e articulares, bem como alterações dos tecidos moles periarticulares e doenças de outros órgãos e/ou sistemas relacionados com as anteriores. Em Portugal, a sua prevalência global autodeclarada no estudo epidemiológico de base populacional EpiReumaPt é de 21%. De entre as DR, a lombalgia crónica (26,4%), as doenças periarticulares (15,8%), a osteoartrose do joelho (12,4%) e a osteoporose (10,2%) são as mais prevalentes (Tabela). Tabela • Prevalência de doenças reumáticas em Portugal.
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Doenças reumáticas
Prevalência
Lombalgia crónica
26,4%
Doenças periarticulares
15.8%
Osteoartrose do joelho
12,4%
Osteoporose
10,2%
Osteoartrose das mãos
8,7%
Osteoartrose da anca
2,9%
Fibromialgia
1,7%
Espondilartrites
1,6%
Gota úrica
1,3%
Artrite reumatoide
0,7%
Lúpus eritematoso sistémico
0,1%
Polimialgia reumática
0,1%
Estes dados encontram-se em linha com os publicados em 2004 no relatório promovido pela Comissão Europeia no contexto da Década do Osso e da Articulação 2000-2010, que revelou que a região lombar era a localização mais frequente de dor em adultos jovens e de meia-idade, e o joelho em pessoas idosas. A lombalgia e as dores osteoarticulares generalizadas são causa frequente de baixas e de reformas por incapacidade, e têm por isso um marcado impacto económico nas sociedades. Apesar de menos prevalentes, as doenças reumáticas inflamatórias são as que condicionam maior incapacidade funcional e morbimortalidade. O conhecimento atualizado da sua etiologia, manifestações clínicas, comorbilidades, prognóstico incluindo consequências sobre a função e a qualidade de vida, e opções de tratamento farmacológico e não farmacológico são fundamentais para reduzir o impacto das DR.
Extratexto a cores
Figura 3.12 – Sinovite exuberante de uma articulação IFP em doente com AR (corte longitudinal). À esquerda, salienta-se a tracejado a área de proliferação da sinovial e à direita a existência de sinal de Doppler nessa mesma localização.
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Figura 5.1 – AR inicial. Artrite da 2.ª e 3.ª MCF e das IFP bilateralmente. Dedos em “fuso”.
Figura 5.5 – Ecografia articular documentando sinovite grave (grau 3/3) de uma articulação MCF em doente com AR. Marcada proliferação da sinovial (esquerda) com a presença de sinal de Doppler (direita), traduzindo sinovite ativa.
Figura 14.1 – Crise de podagra.
Extratexto a cores
Figura 21.2 – Exantema eritematoso evanescente no tronco de uma criança com AIJ sistémica.
Figura 21.6 – Exantema malar em “asa de borboleta” numa adolescente de 13 anos com LES juvenil.
Reumatologia Fundamental
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XXIII
Semiologia em Reumatologia Manuel Silvério-António, Rui Lourenço Teixeira
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ANAMNESE DO DOENTE REUMÁTICO Na elaboração da história clínica, a anamnese diz respeito à colheita detalhada dos sintomas, cuja valorização e integração com os achados do exame objetivo são essenciais para a elaboração de um raciocínio diagnóstico. Este passo fundamental da interação com o doente deve ser conduzido com bom senso, máxima educação, empatia e adaptado ao grau de literacia da pessoa que se nos apresenta. Os principais sintomas que motivam a observação do doente em Reumatologia são a dor e a incapacidade funcional. Em situações inflamatórias, a rigidez e a tumefação são também referidas frequentemente. A revisão de sistemas ocupa um lugar-chave na colheita da história clínica em Reumatologia, permitindo, por exemplo, a identificação de envolvimento sistémico das doenças imunomediadas ou a deteção de sinais de alarme para doença neoplásica ou infeciosa. Cada um dos sintomas deve ser cuidadosamente caracterizado quanto à duração, forma de início, padrão circadiano, intensidade, fatores desencadeantes, de alívio e de agravamento, resposta a terapêuticas instituídas e impacto nas atividades de vida diária. Alguns termos semiológicos fundamentais estão resumidos no Quadro 1.1. O horizonte temporal de 6 semanas é utilizado para distinguir uma artrite aguda (< 6 semanas) de uma artrite crónica (> 6 semanas), enquanto para a dor lombar os períodos correspondentes estão definidos em < 12 semanas e > 12 semanas. Os sintomas, como a dor, podem surgir de forma súbita, ou insidiosa e arrastada, o que pode ser informativo quanto à sua origem e mecanismo da doença subjacente. A dor, em particular, deve ser ainda caracterizada relativamente ao tipo de dor (nociceptiva, neuropática, mista), localização, ritmo e irradiação. A dor localizada a uma articulação pode ter origem articular, periarticular ou ser referida, por exemplo, de um órgão/tecido não musculoesquelético,
1 sendo necessário o exame físico para ajudar a estabelecer o diagnostico diferencial. A dor de ritmo inflamatório tem predomínio matinal, por vezes noturno (segunda metade da noite), alivia com o movimento e agrava com o repouso, acompanhando-se frequentemente de rigidez prolongada (> 30 minutos). Por outro lado, a dor de ritmo mecânico caracteriza-se por aliviar com o repouso, ter agravamento com o esforço e predomínio vespertino. Pode haver alguma rigidez associada a dor de ritmo mecânico, mas tende a ser de curta duração (< 30 minutos). Interessa salientar ainda alguns aspetos que exigem particular atenção na anamnese, a saber: X A idade, o sexo e a profissão associam-se a
diferentes riscos de doença. Enquanto as espondilartrites (SpA) axiais são mais comuns no jovem adulto do sexo masculino, o lúpus eritematoso sistémico (LES) e a artrite reumatoide (AR) ocorrem mais frequentemente na mulher. Da mesma forma, alguns hábitos laborais e de lazer condicionam risco de microtraumatismos do aparelho musculoesquelético ou exposição a patógenos associados a manifestações/doenças reumáticas (DR); X Nas terapêuticas previamente instituídas, importa ter noção que manifestações inflamatórias respondem aos anti-inflamatórios não esteroides (AINE), enquanto as manifestações associadas a doenças não primariamente inflamatórias [como a osteoartrose (OA) ou a fibromialgia] tendem a beneficiar menos destes fármacos. A colchicina é eficaz em doenças musculoesqueléticas associadas a depósitos de cristais e algumas autoinflamatórias; X Os hábitos alimentares podem predispor para a ocorrência de determinadas doenças como a gota úrica, enquanto o tabagismo tem sido relacionado com o risco de desenvolvimento e a maior gravidade da AR e dano nas SpA.
Tabela 2.1 • Principais causas de perturbações séricas do cálcio e fósforo. Perturbação
Etiologia
Hipercalcemia
X X X X X X X X
Hipocalcemia
Neoplasias (mieloma múltiplo ou metástases ósseas) Hiperparatiroidismo Hipertiroidismo Doença de Addison Doenças granulomatosas (sarcoidose ou tuberculose) Transplantação renal Imobilização prolongada Iatrogénica (excesso de vitamina D, tiazidas ou lítio)
Hipoalbuminemia Insuficiência renal X Osteomalacia X X
Hiperfosforemia
X X
Hipofosforemia
Insuficiência renal Rabdomiólise e outras causas de lise celular maciça
Raquitismo Osteomalacia X Hiperparatiroidismo X
X X X X X X
Metástases ósseas Mieloma múltiplo DOP Raquitismo Osteomalacia Hiperparatiroidismo
Tabela 2.2 • Metabolismo fosfocálcico nas principais doenças ósseas. Doença
Calcemia
Fosforemia
FA
OP
N
N
N
Osteomalacia
Hiperparatiroidismo
Osteodistrofia renal
Metástases ósseas
N
N
DOP
N
N
N – normal, – hiper, – hipo.
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AUTOANTICORPOS O número de autoanticorpos disponível para estudo das DR tem vindo a crescer exponencialmente a par e passo com a evolução do conhecimento científico. A melhoria das técnicas laboratoriais permite detetar, dosear e especificar cada vez melhor os autoanticorpos que representam muitos dos critérios de diagnóstico laboratoriais para as mais variadas DR. Neste contexto, é essencial para a correta requisição de autoanticorpos a compreensão da sua sensibilidade e especificidade, o valor preditivo positivo (VPP) e o valor preditivo negativo
21 para as DR às quais se associam mais frequentemente. A sensibilidade indica a probabilidade de o teste ser positivo nos indivíduos doentes (taxa de verdadeiros positivos, relacionada com a capacidade do teste detetar pequenas quantidades desse autoanticorpo no soro do doente). A especificidade reflete a probabilidade de ser negativo nos não doentes (taxa de verdadeiros negativos, revelando a capacidade de um teste detetar apenas o autoanticorpo pretendido). Tanto a sensibilidade como a especificidade são características intrínsecas dos testes. No entanto, a utilidade dos mesmos depende largamente da prevalência da DR e do
Reumatologia Fundamental
Elevação da FA sérica
Capítulo 2 – Exames laboratoriais em Reumatologia
X
punhos, pés [metatarsofalângicas (MTF)] e coluna cervical (C1C2), podendo também afetar cotovelos, joelhos, ombros e ancas. O envolvimento da coluna cervical é facilmente objetivado na radiografia de perfil da coluna cervical, com estudo dinâmico em flexão e extensão, na qual se identificam luxações ântero-posteriores ou superiores; ou através da radiografia transbucal póstero-anterior, mais útil para visualizar luxações laterais da odontoide (Figura 3.2).
Capítulo 3 – Imagiologia das doenças reumáticas
Figura 3.1 – Radiografia ântero-posterior da segunda MCF (esquerda) e do antepé (direita) de uma doente com AR. Salienta-se a presença de várias erosões típicas, marginais, particularmente ao nível da base da falange proximal do segundo dedo da mão (seta), e das terceira, quarta e quinta MTF.
Espondilartrites O estudo radiográfico das espondilartrites (SpA) depende do tipo de envolvimento (axial e periférico). Para as formas com envolvimento axial são solicitadas radiografias da bacia em
carga, ântero-posterior; e da coluna cervical, dorsal e lombar em ântero-posterior e perfil. Para os casos de SpA periférica podem ser pedidas radiografias de acordo com as articulações afetadas. Na SpA axial, o envolvimento radiológico caracteriza-se pelo surgimento de sacroileíte, que habitualmente tem achados mais específicos a nível do seu componente sinovial que se localiza nos seus 2/3 inferiores. Os achados radiológicos de sacroileíte incluem diminuição da entrelinha, erosões, pseudoalargamento (por erosões coalescentes) e completa anquilose nos estádios mais avançados, sendo classificada em graus de gravidade de 0 a IV. Na espondilite anquilosante (EA), a sacroileíte está sempre presente por definição desta entidade nosológica, sendo frequentemente bilateral. Nas formas crónicas de artrite reativa (ARe), a sacroileíte é frequentemente unilateral, ao contrário do que acontece com a SpA associada à doença inflamatória intestinal (DII) (Figura 3.3). Aspetos erosivos da interfalângica (IF) do primeiro dedo do pé, são também característicos das formas crónicas de ARe. Na coluna vertebral, observam-se habitualmente achados típicos: a perda da concavidade anterior dos corpos vertebrais e consequente squaring das vértebras nas fases mais iniciais e a formação de sindesmófitos que são finos e verticais. Os sindesmófitos são frequentemente precedidos por erosões discovertebrais (lesões de Romanus) e esclerose dos ângulos vertebrais anteriores ou posteriores (shiny corners). O segmento mais afetado é o toracolombar
28 Reumatologia Fundamental Figura 3.2 – Radiografia de perfil em posição neutra e em flexão de uma doente com AR de longa evolução. Salienta-se que a distância entre odontoide e arco anterior do atlas, se superior a 7 mm, poderá significar necessidade de abordagem cirúrgica pelo risco de compressão medular alta. Esta distância é geralmente maior na posição de flexão.
5
Artrite reumatoide Maria João Saavedra, Vasco C. Romão
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INTRODUÇÃO A artrite reumatoide (AR) é uma doença inflamatória crónica que atinge preferencialmente as pequenas articulações e estruturas periarticulares. No entanto, trata-se de uma patologia verdadeiramente multissistémica que pode afetar o tecido conjuntivo em qualquer parte do organismo e originar as mais variadas manifestações extra-articulares. Além disso, a inflamação crónica sistémica subjacente à AR pode levar a complicações como a aterogénese acelerada ou a perda generalizada de massa óssea. A AR afeta 0,5% a 1% da população mundial. As mulheres são duas a três vezes mais afetadas, sendo o pico de incidência dos 40 aos 60 anos. Em Portugal, o estudo Epireuma. pt1 estimou a prevalência nacional em 0,7% da população adulta, com uma proporção de quatro mulheres (1,2%) para um homem (0,3%). A AR tem um elevado impacto a nível pessoal, social e económico. Apesar de ser uma doença pouco frequente, é uma das principais causas de incapacidade a nível global, contribuindo de forma substancial para uma redução da qualidade de vida, incapacidade laboral e elevados custos em saúde. Embora a sua etiologia seja desconhecida, a AR é atualmente entendida como uma doença multifatorial, na qual interações complexas entre o indivíduo e o ambiente determinam o risco de desenvolvimento da doença, cronicidade e gravidade da mesma. Os fatores genéticos são responsáveis por cerca de 50% a 65% do risco de desenvolvimento de doença. A região human leukocyte antigen (HLA) é a mais fortemente associada à AR, em linha com o envolvimento do sistema imunitário adaptativo na fisiopatologia da doença. Em particular, os genes que codificam uma sequência específica de cinco aminoácidos na região hipervariável do HLA-DRβ1, conhecida como epitopo compartilhado, 1
constituem a associação genética mais importante. A presença do epitopo compartilhado está associada à presença de anticorpos antiproteínas citrulinadas (ACPA) circulantes, os quais, juntamente com anticorpos da classe imunoglobulina M (IgM) contra a imunoglobulina G (IgG) – denominados de fator reumatoide (FR) – podem ser identificados muitos anos antes do início da AR. Outros fatores como o tabagismo, a periodontite ou a disbiose intestinal parecem ter igualmente um papel muito relevante no risco de desenvolvimento da doença.
CLÍNICA A AR apresenta-se habitualmente sob a forma de uma poliartrite simétrica e aditiva, envolvendo muito frequentemente as articulações metacarpofalângicas (MCF), metatarsofalângicas (MTF) e interfalângicas proximais (IFP) das mãos, e os punhos. O início é geralmente insidioso, com instalação lenta de artralgias inflamatórias, frequentemente acompanhadas por tumefação articular e rigidez matinal prolongada (superior a 30 minutos). Progressivamente, outras articulações vão sendo envolvidas de forma aditiva e tipicamente bilateral, isto é, com envolvimento dos mesmos grupos de articulações em cada lado (por exemplo, 2.ª e 3.ª MCF à direita e 1.ª e 4.ª MCF à esquerda). Na AR inicial, não existem grandes deformidades articulares, podendo observar-se tumefação articular (por exemplo, punhos, MCF) e dedos em “fuso” (devido a tumefação das IFP) (Figura 5.1). Qualquer articulação diartrodial (sinovial) pode ser afetada, incluindo, menos frequentemente, as articulações temporomandibulares e a articulação atlanto-odontoideia (C1-C2, em fases mais avançadas da doença). Existem, contudo, outras formas de apresentação menos frequentes como a monoartrite
Para mais informações sobre este estudo, consultar Branco (2016).
Tabela 5.1 • Critérios de classificação da AR, de acordo com ACR/EULAR 2010. Adaptado de Aletaha, et al. (2010). População-alvo (quem deve ser avaliado?) Doentes com: X Pelo menos uma articulação com sinovite clínica (isto é, tumefação articular) X Sinovite não atribuível a outra patologia
Classificação de AR AR classificada se: X Soma da pontuação total A-D ≥ 6/10 X Doença erosiva típica e/ou de longa duração com história compatível com preenchimento critérios ACR/EULAR 2010 Critério de classificação para AR (adicionar a pontuação das categorias A a D)
Pontuação
A − Envolvimento articular1 1 grande articulação2
0
2 a 10 grandes articulações2
1
1 a 3 pequenas articulações
2
3
4 a 10 pequenas articulações
3
> 10 articulações4
5
3
B – Serologia
5
FR negativo e ACPA negativo
0
FR título baixo ou ACPA título baixo
2
FR título alto ou ACPA título alto
3
C – Reagentes de fase aguda
0
PCR elevada ou VS elevada
1
D – Duração dos sintomas < 6 semanas
0
≥ 6 semanas
1
Articulação tumefacta ou dolorosa ao exame objetivo; sinovite pode ser confirmada por exame de imagem 2 Ombros, cotovelos, ancas, joelhos, tornozelos 3 Com ou sem envolvimento das grandes articulações 4 Pelo menos uma pequena articulação 5 Necessário o resultado de, pelo menos, um teste para classificação 1
Podemos dividi-lo em tratamento não farmacológico (incluindo de Medicina Física e de Reabilitação), tratamento farmacológico e tratamento cirúrgico.
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Tratamento não farmacológico No tratamento não farmacológico, incluímos as medidas gerais, tais como a educação do doente e familiares, manutenção do peso adequado, dieta equilibrada, exercício físico, cessação tabágica e o apoio psicológico. A Medicina Física e de Reabilitação e, mais especificamente, a Fisioterapia e Terapia
Ocupacional continuam a ter lugar no tratamento dos doentes com AR, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida.
Tratamento farmacológico É a base do tratamento na AR e deve ser instituído o mais precocemente possível, ou seja, logo que o diagnóstico esteja estabelecido. No tratamento farmacológico, podemos considerar: X Fármacos
antirreumáticos modificadores da doença (do inglês disease modifying antirheumatic drug, DMARD) sintéticos;
61 Reumatologia Fundamental
PCR normal e VS normal
Capítulo 5 – Artrite reumatoide
5
e as SpA periféricas (Figuras 6.2 e 6.3). Adicionalmente, as SpA axiais são classificadas em formas radiográficas quando é documentada evidência de sacroileíte na radiografia da bacia (pelo menos de grau 2 bilateralmente ou de grau 3 unilateral) e não radiográfica na ausência destes achados, mas com identificação em ressonância magnética (RM) de inflamação ativa sugestiva de sacroileíte associada às SpA. A evolução natural das SpA, quando não adequadamente tratadas, está associada a marcada redução na qualidade de vida, condicionada pela dor, rigidez, limitação funcional,
perda de participação social e de produtividade laboral. A instituição de um diagnóstico precoce e a implementação de terapêuticas com eficácia documentada é, por isso, determinante para induzir a remissão da atividade da doença (ausência de inflamação), prevenir o dano estrutural e garantir o melhor estado de saúde possível para os doentes com esta patologia.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO As manifestações musculoesqueléticas comuns às SpA incluem o envolvimento das articulações e enteses do esqueleto axial (sacroilíacas
Doentes com raquialgia crónica com duração ≥ 3 meses (com ou sem manifestações periféricas e idade de início < 45 anos) e
Sacroileíte imagiológica (RM ou radiografia) e ≥ 1 características de SpA
ou
HLA-B27 e ≥ 2 outras características de SpA
Capítulo 6 – Espondilartrites
Características de SpA: Raquialgia inflamatória Artrite Entesite (calcanhar) Uveíte Dactilite Psoríase Doença de Crohn/colite ulcerosa
68 Figura 6.2 – Critérios de classificação ASAS para SpA axiais (2009). Reumatologia Fundamental
Artrite ou entesite ou dactilite
e
≥ 1 características de SpA: Uveíte Psoríase
≥ 2 características de SpA: ou
Doença de Crohn/colite ulcerosa Infeção precedente
Figura 6.3 – Critérios de classificação ASAS para SpA periféricas (2009).
Artrite Entesite Dactilite
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Vasculites primárias Cristina Ponte, João Eurico Cabral da Fonseca
INTRODUÇÃO
(continuação)
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As vasculites são um grupo heterogéneo de doenças imunomediadas caracterizado por inflamação dos vasos sanguíneos. Podem ser consideradas primárias, quando a etiologia é desconhecida, ou secundárias, quando se encontram associadas a outras patologias, drogas ilícitas ou fármacos. São geralmente doenças raras que podem afetar todas as faixas etárias. Qualquer tipo de vaso pode ser acometido, nomeadamente veias, artérias e capilares. O processo inflamatório vasculítico condiciona frequentemente estenose do lúmen vascular, com consequente diminuição do fluxo sanguíneo, podendo progredir para obstrução total e/ou formação de aneurismas que aumentam o risco de rutura do vaso. Pode também condicionar a ocorrência de trombose secundária do vaso com obliteração completa da circulação a jusante. As suas manifestações clínicas, e respetivo tratamento e monitorização, variam consoante a etiologia, os órgãos envolvidos e o tamanho dos vasos maioritariamente afetados. As vasculites são atualmente divididas de acordo com a nomenclatura de Chapel Hill, 2012 (Quadro 13.1). Para efeitos deste capítulo, vamos abordar apenas os aspetos clínicos mais relevantes, métodos de diagnóstico, tratamento específico e monitorização das principais vasculites primárias sistémicas, de acordo com o calibre dos vasos envolvidos (grandes, médios e pequenos vasos, e vasos de calibre variável). Iremos também abordar resumidamente algumas vasculites de órgão único. Quadro 13.1 • Nomenclatura das vasculites segundo Chapel Hill, 2012. Adaptado de Jennette, et al. (2013). Vasculites de grandes vasos: X ACG X Arterite de Takayasu (continua)
Vasculites de médios vasos: X PAN X KD Vasculites de pequenos vasos: X Vasculites de pequenos vasos associadas aos ANCA: — GPA (antiga granulomatose de Wegener) — EGPA (antiga síndrome de Churg-Strauss) — PAM X Vasculites de pequenos vasos associadas a imunocomplexos — Doença anti-GBM (síndrome de Goodpasture) — Vasculite crioglobulinémica — Vasculite IgA (HSP) — Vasculite urticariforme hipocomplementémica (vasculite anti-C1q) Vasculites de vasos de calibre variável: X Doença de Behçet X Síndrome de Cogan Vasculites de órgão único: X Angeíte cutânea leucocitoclástica X Arterite cutânea X Vasculite primária do SNC X Aortite isolada X Outras vasculites de órgão único Vasculites associadas a doenças sistémicas: X Vasculite associada a lúpus X Vasculite associada a AR X Vasculite associada a sarcoidose X Outras vasculites associadas a doenças sistémicas Vasculites associadas a causa provável: X Vasculite crioglobulinémica associada ao VHC X Vasculite associada ao vírus da hepatite B X Aortite associada à sífilis X Vasculite por imunocomplexos associada a fármacos ou drogas X Vasculite associada aos ANCA associada a fármacos ou drogas X Vasculite associada a neoplasias X Outras vasculites associadas a causa provável ACG – arterite de células gigantes; ANCA – anticorpos anticitoplasma dos neutrófilos; anti-GBM – antimembrana basal glomerular; AR – artrite reumatoide; EGPA – granulomatose eosinofílica com poliangeíte (do inglês eosinophilic granulomatosis with polyangiitis); GBM – antimembrana basal glomerular; GPA – granulomatose com poliangeíte; HSP – púrpura de Henoch-Schönlein; IgA – imunoglobulina A; KD – doença de Kawasaki; PAM – poliangeíte microscópica; PAN – poliarterite nodosa; SNC – sistema nervoso central; VHC – vírus da hepatite C.
paredes dos vasos, que englobam essencialmente três subtipos: GPA, EGPA e PAM.
Manifestações clínicas e diagnóstico A GPA é uma vasculite necrotizante com formação de granulomas, relativamente rara, com uma incidência de 2 a 12/1 000 000 habitantes/ano. Pode ocorrer em qualquer idade (média 40 anos) e com uma incidência igual entre sexos. Caracteriza-se principalmente por envolvimento otorrinolaringológico (ORL) com presença de sinusite e epistaxe, episódios frequentes de otite média, e surdez neurossensorial e/ou condutiva. Numa fase mais tardia, pode ocorrer
perfuração do septo nasal e marcada destruição tecidular da cartilagem do septo com formação do clássico “nariz em sela”. O envolvimento ocular é também comum na GPA, principalmente sob a forma de esclerite e episclerite (Figura 13.8). Em cerca 15% dos casos com atingimento ocular, pode ocorrer a formação de granuloma ou pseudotumor orbital. Alguns doentes podem evoluir para formas mais sistémicas/ /generalizadas da doença, habitualmente envolvendo os pulmões, com a presença de nódulos múltiplos característicos (Figura 13.9), e/ou rins (40% a 100% dos casos), sob a forma clássica de GNF crescente pauci-imune. A GPA pode ainda envolver as articulações, pele, SNP e SNC,
Capítulo 13 – Vasculites primárias
Figura 13.8 – Sequela de esclerite anterior com escleromalácia em doente com GPA. Figura gentilmente cedida pela Dr.ª Inês Leal do Serviço de Oftalmologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE. A
B
126 Reumatologia Fundamental Figura 13.9 – Nodulose pulmonar em doente com GPA. A. Nodulose dispersa em radiografia póstero-anterior do tórax, simulando metástases pulmonares. Fonte: Viana de Queiroz (2009). B. Nódulo cavitado em tomografia computorizada (TC) do tórax de alta resolução.
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Síndromes dolorosas musculoesqueléticas locorregionais Joaquim Polido Pereira, Rita Barros
INTRODUÇÃO E CLASSIFICAÇÃO A patologia dos tecidos moles do aparelho locomotor (também designada por patologia das partes moles) pode ser dividida em localizada e difusa, estando a última subdividida em generalizada e regional (Figura 17.1). Estas patologias constituem o grupo nosológico que mais frequentemente origina sintomatologia relacionada com doença do aparelho locomotor. Neste capítulo abordam-se as patologias periarticulares mais comuns, as síndromes dolorosas regionais complexas e as síndromes de dor miofascial (SDM). A patologia periarticular resulta predominantemente de alterações estruturais localizadas nos tecidos moles que originam dor ou impotência funcional, em oposição às patologias mais difusas ou sem alterações estruturais objetiváveis, como sejam as síndromes dolorosas regionais complexas ou a fibromialgia. Relativamente à duração deste grupo de patologias, pode considerar-se aguda se tiver menos de duas semanas de duração, subaguda se tiver entre duas e 12 semanas e crónica se tiver mais de 12 semanas de duração. A esmagadora maioria destas patologias tem como etiologia processos de microtraumatismo
de repetição, crónicos, muitas vezes relacionados com a atividade profissional ou atividades de lazer (desporto não competitivo), embora também possam ocorrer em associação a doença reumática (DR) inflamatória. Os fatores de risco para a patologia periarticular podem ser intrínsecos ou extrínsecos. Nos fatores intrínsecos inclui-se: idade, alterações biomecânicas, desequilíbrio de forças musculares, má preparação física, hipermobilidade, hipomobilidade, má condição vascular ou determinadas patologias como a diabetes mellitus. Quanto aos fatores extrínsecos mais importantes, incluem-se: padrões de treino inadequados, ambiente (temperaturas extremas), ergonomia do local de trabalho, mau equipamento de treino ou de trabalho ou determinados fármacos [corticosteroides (CS) sistémicos ou locais, fluoroquinolonas, estatinas e esteroides anabolisantes].
HISTÓRIA CLÍNICA E EXAME FÍSICO A história clínica e exame físico corretamente executados conduzem ao diagnóstico da maior parte deste grupo de patologias. Os detalhes inerentes a estes aspetos estão descritos no Capítulo 1, “Semiologia em Reumatologia” deste livro, contudo, destacando-se aqui
Generalizada
Síndromes dolorosas regionais complexas
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Difusa
Patologia das partes moles
Localizada
Figura 17.1 – Classificação da patologia das partes moles.
Fibromialgia
Regional
SDM
Patologia periarticular
Cervicalgia, lombalgia
Quadro 18.1 • Principais manifestações clínicas da fibromialgia. Dor musculoesquelética difusa Fadiga X Perturbação do sono X Alterações cognitivas funcionais X Alodinia e outras alterações da sensibilidade
Quadro 18.2 • Quadros clínicos comumente associados a fibromialgia.
X
X
X
X X X X X
Capítulo 18 – Fibromialgia
Outros sintomas podem surgir com frequência como disestesias cutâneas, parestesias, mioclonias, contracturas musculares, rigidez, sensação de edema, dermografismo, fenómeno de Raynaud e sensibilidade dolorosa ao frio e a outros estímulos. Com frequência, verifica-se uma discrepância entre as queixas subjetivas do doente e as alterações objetivadas no exame clínico. Estas manifestações transformam-se, na maioria das vezes, num círculo vicioso difícil de quebrar. Por exemplo, a dor leva a dificuldade em dormir que, por sua vez, condiciona cansaço durante o dia. Este, por sua vez, conduz de novo a um aumento da dor. A escassa atividade física destes doentes é frequente, contribuindo para o descondicionamento muscular e perpetuação deste círculo vicioso. Estas manifestações clínicas no global, e não apenas a dor, podem interferir gravemente com a atividade laboral e ter repercussões marcadas a nível das atividades da vida diária, familiar e social. A frustração consequente pode resultar em quadros de depressão reativa ou ansiedade, mesmo nos doentes sem doença psiquiátrica prévia (Figura 18.1). Dor
178 Reumatologia Fundamental
Humor depressivo
Sono não reparador
Inatividade física
Fadiga
Figura 18.1 – Círculo vicioso da fibromialgia.
A fibromialgia pode coexistir com outras situações clínicas, que lhe estão frequentemente associadas (Quadro 18.2).
X X
Síndrome do cólon irritável Síndrome de fadiga crónica Enxaqueca e outros tipos de cefaleia Síndrome de taquicardia postural Cistite intersticial ou síndrome da bexiga dolorosa Disfunção temporomandibular Ansiedade Depressão
Os sintomas podem surgir após um evento traumático físico ou psicológico ou situações de stress mantido, como traumatismos graves, cirurgias, infeções, morte ou doença grave de uma pessoa próxima. Noutros casos, os sintomas instalam-se de forma insidiosa e vão-se acumulando gradualmente ao longo do tempo, não existindo um acontecimento específico que esteja na sua origem ou, pelo menos, um que se consiga identificar.
DIAGNÓSTICO A anamnese é essencial para realizar o diagnóstico, sendo fundamental a identificação de dor crónica musculoesquelética difusa e de outras manifestações a esta associadas, como fadiga, sono não reparador e perceção subjetiva de disfunção cognitiva. Muitos doentes apresentam ao exame objetivo uma elevada sensibilidade ao toque, com dor ou desconforto, o que nalguns casos pode sugerir erradamente entesite ou miosite. Em alguns doentes documenta-se dor particularmente intensa em áreas do corpo específicas, conhecidas como pontos fibromiálgicos. Em 1990, o American College of Rheumatology (ACR) publicou os primeiros critérios de classificação de fibromialgia que se baseavam na sensação de dor generalizada e dor à palpação destes pontos específicos. Em 2010, o ACR propôs novos critérios, com remoção dos pontos fibromiálgicos e substituição por um sistema de pontuação que se baseia no índice de dor difusa e escala de gravidade de sintomas (inclui avaliação de fadiga, disfunção cognitiva e outros sintomas). Outras classificações têm sido propostas para diagnóstico/classificação, sendo sempre necessária a presença de dor difusa durante pelo menos três meses, acima e abaixo da cintura, e em ambos os hemicorpos.
Manifestações musculosqueléticas de doenças não reumáticas Maria João Saavedra
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INTRODUÇÃO Neste capítulo, são abordadas patologias não classificadas como doenças reumáticas (DR), mas que podem originar manifestações do aparelho locomotor. Serão descritas manifestações musculosqueléticas de doenças hematológicas, endócrinas e metabólicas, hepáticas, gastrointestinais, neurológicas, infiltrativas, imunodeficiências primárias e neoplásicas.
DOENÇAS HEMATOLÓGICAS
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Drepanocitose A drepanocitose é uma doença que resulta de uma alteração estrutural da hemoglobina que favorece a falciformização dos eritrócitos. Esta doença caracteriza-se por episódios vaso-oclusivos que se manifestam como crises dolorosas resultantes da isquemia tecidular. Os doentes podem ter dor localizada ou generalizada, aditiva ou migratória. As crises duram de 10 minutos até duas ou três semanas. Quando as crises se prolongam, deve ser colocada a hipótese de osteonecrose e/ou osteomielite. A osteonecrose ocorre em cerca de 20% dos doentes, podendo ser multifocal e complicar-se com fraturas (Figura 20.1). Os ossos mais frequentemente envolvidos são a epífise femoral proximal, epífise umeral, porção distal do fémur, costelas e diáfise de ossos longos. As crises vaso-oclusivas nas crianças podem causar microenfartes a nível das falanges e manifestar-se por dactilite (síndrome mão-pé). A artrite sética é rara, mas pode constituir uma complicação local de uma osteomielite ou ocorrer por via hematogénea. A presença de febre, leucocitose e elevação dos parâmetros inflamatórios deve aumentar a suspeita desta hipótese diagnóstica. A prevalência de gota úrica é também mais elevada nos doentes com drepanocitose.
Figura 20.1 – Radiografia da bacia de jovem de 16 anos com drepanocitose e sequelas de osteonecrose da epífise femoral direita. Fonte: Viana de Queiroz (2009).
Muitos doentes apresentam também osteopenia vertebral com depressões medianas dos pratos vertebrais características da doença (vértebra em H) e que podem evoluir para colapsos vertebrais (Figura 20.2).
Figura 20.2 – Radiografia da coluna lombar (perfil) que mostra osteopenia vertebral com depressões medianas cup-like dos pratos vertebrais. Fonte: Viana de Queiroz (2009).
X
Na exclusão de: — Quadro de artrite num rapaz HLA-B27 positivo com ≥ 6 anos — História pessoal ou num familiar em primeiro grau de EA, artrite relacionada com entesite, DII com sacroileíte associada ou UAA — Presença de FR positivo em ≥ 2 determinações espaçadas em ≥ 3 meses — Presença de AIJ sistémica — Artrite que preencha critérios para 2 categorias de AIJ
A artrite é assimétrica e envolve grandes e pequenas articulações. A dactilite está presente em 20% a 40% dos doentes (Figura 21.5). A psoríase pode surgir antes ou depois da artrite, sendo identificada em 40% a 60% dos doentes.
Figura 21.5 – Dactilite do segundo dedo do pé de um adolescente de 15 anos com AP.
Artrite idiopática juvenil indiferenciada
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É definida por um quadro de AIJ que não se enquadra em nenhuma das outras categorias ou que preenche critérios para duas ou mais categorias diferentes.
Tratamento e monitorização das artrites idiopáticas juvenis No caso de suspeita de AIJ, a referenciação precoce a um especialista em Reumatologia Pediátrica é determinante. Numa primeira fase,
Capítulo 21 – Doenças reumáticas juvenis
Artrite e psoríase ou X Artrite e, pelo menos, dois de: — Dactilite — Pitting ungueal ou onicólise — História de psoríase em familiares em primeiro grau X
pode ser iniciada terapêutica com anti-inflamatórios não esteroides (AINE), contudo, estes geralmente não são suficientes para atingir a remissão, que é o objetivo do tratamento. Nos casos de oligoartrite, independentemente da forma de AIJ, deve ser tentada a terapêutica com AINE e infiltração articular com corticosteroides (CS). Estas medidas são frequentemente suficientes para controlar a doença. Em caso de refratariedade, ou nas formas com envolvimento poliarticular, devem ser introduzidos fármacos antirreumáticos modificadores da doença (do inglês disease modifying antirheumatic drug, DMARD) como o metotrexato (MTX) (sulfassalazina ou leflonumida se existir contraindicação ou intolerância para o uso de MTX) até uma dose otimizada, de acordo com a atividade da doença. Se não houver resposta, deve ser iniciada terapêutica com fármacos biotecnológicos como os inibidores do fator de necrose tumoral (anti-TNF) (etanercept, adalimumab ou golimumab) e da anti-interleucina 6 (anti-IL6) (tocilizumab) ou da coestimulação via cytotoxic t-lymphocyte associated protein 4 (CTLA4) (abatacept). Os inibidores da janus cinase (JAK) são também uma possibilidade de tratamento (tofacitinib). Os CS orais estão reservados para uso muito pontual quando a incapacidade funcional é significativa, até ao início do efeito dos DMARD e/ou fármacos biotecnológicos. Como a AIJ sistémica apresenta uma fisiopatologia distinta dos restantes subtipos, o tratamento é diferente. Muitas vezes é necessário recorrer à corticoterapia para tratar as manifestações sistémicas. Na ausência de resposta à corticoterapia ou corticodependência devem ser usados fármacos bloqueadores da interleucina 1 (IL1) (anacinra ou canacinumab) ou da interleucina 6 (IL6) (tocilizumab) que são muito eficazes nesta forma de AIJ. Ao contrário do que se pensava anteriormente, as AIJ não são doenças benignas. Na maioria dos casos, por se tratarem de doenças crónicas, vão evoluir ao longo da idade adulta. Estima-se que apenas cerca de 40% dos doentes consigam estar sem medicação e sem sintomas 8 a 10 anos após o aparecimento da doença. A remissão clínica é mais frequente nas formas oligoarticulares do que nas restantes formas. O início de tratamento precoce na fase inicial da doença é a melhor garantia de remissão sustentada no futuro.
203 Reumatologia Fundamental
Quadro 21.5 • Critérios de classificação ILAR para a AP juvenil.
17cm x 24cm
As doenças reumáticas são um dos principais motivos de consulta de Medicina Geral e Familiar. A sua abordagem diagnóstica e terapêutica tem evoluído muito, sendo, por isso, relevante fazer uma 2.ª edição do livro Reumatologia Fundamental. Esta 2.ª edição expandiu os temas explorados na 1.ª edição e implicou a completa restruturação de todos os capítulos. Este livro, constituído por 21 capítulos escritos por especialistas nacionais, desenvolve temas centrais da área, como a semiologia, a imagiologia, a epidemiologia e os exames laboratoriais, com atenção às manifestações clínicas e ao diagnóstico das principais doenças reumáticas: artrite reumatoide, espondilartrites, osteoartrose, osteoporose, lúpus eritematoso sistémico, fibromialgia, entre outras. O Reumatologia Fundamental tem por objetivo informar o leitor sobre os principais aspetos diagnósticos e terapêuticos das doenças reumáticas de uma forma rápida e acessível, e é dirigido a alunos de Medicina, internos da especialidade de Reumatologia, internos e especialistas de Medicina Geral e Familiar e outros profissionais de saúde que tenham de abordar doentes com patologia reumática.
Reumatologia fundamental
Reumatologia fundamental
17cm x 24cm
12,5 mm
C
M
Reumatologia fundamental
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MY
CY
CMY
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João Eurico Cabral da Fonseca Professor Catedrático e Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Diretor do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Group Leader do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
2.ª
edição
ª 2. edição Coordenação:
Maria José Santos Diretora do Serviço de Reumatologia do Hospital Garcia de Orta, EPE; Professora Associada de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
ISBN 978-989-752-833-0
9 789897 528330
João Eurico Cabral da Fonseca Maria José Santos Elsa Vieira-Sousa João Eurico Cabral da Fonseca Maria José Santos Elsa Vieira-Sousa
Elsa Vieira-Sousa Professora Auxiliar Convidada de Reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Assistente Graduada de Reumatologia do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE – Centro Académico de Medicina de Lisboa; Investigadora do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Centro Académico de Medicina de Lisboa.
www.lidel.pt
CM