4ª SEPARATA CIENTÍIFICA
º
REVISTA DAS VMER DE FARO E ALBUFEIRA NÚMERO 15 / FEVEREIRO 2020 [TRIMESTRAL]
NESTA EDIÇÃO: Hipotermia acidental—(artigo de revisão) Maria Inês A. Ribeiro
Abordagem da Dor torácica no contexto de emergência pré-hospitalar Soraia Correia
Taquidisritmias supraventriculares - Abordagem em Contexto Pré e Intra-Hospitalar Hugo Costa, Pedro Azevedo, Daniela Carvalho, Rui Candeias, Ilídio de Jesus
LUCAS - Sistema de Compressão Torácica Isabel Rodrigues
Quem sabe nadar não se afoga? - Mito Urbano
Christian Chauvin
Indice
1
EDITORIAL
FICHA TÉCNICA Caríssimos leitores,
EDITOR-CHEFE Bruno Santos COMISSÃO CIENTÍFICA
Daniel Nunez – Presidente, Ana Rita Clara, Carlos Raposo, Cristina Granja, Eunice Capela, Gonçalo Castanho, José A. Neutel, Nuno Mourão, Sérgio Menezes Pina, Vera Santos CO-EDITORES André Abílio Rodrigues, Ana Agostinho, Ana Isabel Rodrigues, Ana Rita Clara, Guilherme Henriques, Isabel Rodrigues, João Paiva, Miguel Jacob, Pedro Lopes Silva, Pedro Miguel Silva, Pedro Rodrigues Silva, Sérgio Menezes Pina EDITORES ASSOCIADOS Alírio Gouveia, Ana Rodrigues, André Villarreal, Catarina Monteiro, Catarina Tavares, Christian Chauvin, Cláudia Calado, Eva Motero, Isa Orge, João Cláudio Guiomar, João Horta, Noélia Alfonso, Nuno Ribeiro, Rita Penisga, Rúben Santos, Rui Osório, Sílvia Labiza, Solange Amaro, Solange Mega, Teresa Castro, Teresa Salero COLABORADORES CONVIDADOS (LIFESAVING Nº 15) Ana Rita Parente, António Argel, Celso Mendes, Daniela Carvalho, Filipa Dias, Frederico Magalhães, Hugo Capote, Hugo Costa, Ilídio de Jesus, Inés Diaz Rodrigo, Liliana Ricardo, Márcia Portugal Costa, Maria Inês Ribeiro, Maria João Virtuoso, Nídia Calado, Pedro Azevedo, Rita Justo Pereira, Rosário Blanco, Rui Candeias, Sérgio Martins, Soraia Correia ILUSTRAÇÕES João Paiva FOTOGRAFIA Pedro Rodrigues Silva; Maria Luísa Melão; Freepik.com
No início deste Novo Ano de 2020, reiteramos o nosso gosto em partilhar conhecimento, e apresentamos mais uma vez o nosso Projecto LIFESAVING, uma produção editorial que contabiliza já 15 edições ininterruptas, com periodicidade trimestral. No arranque deste novo ano, marcaremos a diferença com a apresentação de um design editorial renovado, com um formato elegante e profissional, com novo ritmo nas palavras e imagens, mas mantendo a criatividade e originalidade habituais. A LIFESAVING pretende chegar mais longe em 2020, incrementando a qualidade da sua linha editorial e incentivando a colaboração de vários Centros de emergência a nível nacional. Graças à consolidação da parceria com o Algarve Biomedical Center (ABC) Centro Académico de Investigação e Formação Biomédica do Algarve, teremos garantido o apoio necessário para fazer crescer este Projecto editorial, nomeadamente: a melhoria do grafismo da publicação; o suporte de secretariado; e a ligação da LIFESAVING ao Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina da Universidade do Algarve (UALG), possibilitando o alargamento do projeto à formação médica pré-graduada. Nesta Edição nº 15 da LIFESAVING publicámos a nossa 4ª Separata Científica, recheada de artigos de elevada relevância, previamente submetidos à revisão pela Comissão Científica, e de leitura recomendada. Convidamos ainda os nossos leitores a mergulhar no interior da Revista, onde encontrarão outros artigos muito interessantes, fotografias e pinturas originais, inseridos nas já habituais Rubricas da LIFESAVING, explorando temáticas diversas como a hipotermia, o controlo da via aérea durante a reanimação cardio-respiratória, o equipamento de compressões torácicas mecânicas (LUCASr), entre outros. Merecem ainda especial destaque as entrevistas desta edição, a rever nas rubricas Emergência Internacional e Vozes da Emergência. Creio termos conseguido produzir mais um documento relevante para atualização de conhecimentos na área da emergência médica, que não seria possível sem a dedicação e empenho de uma fantástica Equipa de Editores e Colaboradores, os verdadeiros obreiros desta criação, e que esperamos que seja do agrado dos nossos leitores, a quem não poderemos deixar de agradecer todo o apoio e preferência.
AUDIOVISUAL Pedro Lopes Silva
A todos um bem-haja,
DESIGN Luis Gonçalves
Bruno Santos
EDITOR-CHEFE COORDENADOR MÉDICO das VMER de Faro e Albufeira bsantos@chalgarve.min-saude.pt
PARCERIAS
Momentos de inspiração
"A persistência é o caminho do êxito" Charles Chaplin
Comediante inglês | 1889 - 1977
Periodicidade: Trimestral Linguagem: Português
2
ISSN 2184-1411
Indice
Propriedade: CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO ALGARVE Morada da Sede: Rua Leão Penedo. 8000-386 Faro Telefone: 289 891 100 | NIPC 510 745 997
Indice
3
9 - HOT TOPIC: Hipotermia acidental
009 037 053
19 - ARTIGO DE REVISÃO: A Abordagem Diagnóstica da dor Torácica no contexto da Emergência Pré-Hospitalar 27 – TEMAS EM REVISÃO: TAQUIDISRITMIAS SUPRAVENTRICULARES, Abordagem em Contexto Pré e Intra-Hospitalar 37 – RUBRICA PEDIATRICA: CROUP – Estridor laríngeo 45 – CASO CLÍNICO 1: Resgate da via aérea difícil, um caso clínico de emergência pré-hospitalar 49 – CASO CLÍNICO 2: Via Aérea Não Permeável– Uma Emergência Médica Inesperada 53 – MINUTO VMER: LUCAS – sistema de compressão torácica 56 – JOURNAL CLUB: Airway and ventilation management during cardiopulmonary resuscitation and after successful resuscitation
061
61 – MITOS URBANOS: Quem sabe nadar não se afoga?
067
67 – EMERGÊNCIA INTERNACIONAL: Código de Infarto;
4
Indice
64 - O QUE FAZER EM CASO DE: Hipotermia; 65 – FÁRMACO REVISITADO: Fenilefrina;
73 – LEGISLAÇÃO: Acesso ao testamento vital no pré-hospitalar
CONTEÚDOS
76 – NÓS POR CÁ: Estatística das ocorrências em que não houve transporte; 78 - NÓS POR CÁ: Erasmus Mundus Master Course in Emergency and Critical Care Nursing; 79 - NÓS POR CÁ: Exercício LIVEX, Aeroporto Internacional de Faro; 81 – CUIDAR DE NÓS: Reflexão sobre o Risco Biológico no socorro pré-hospitalar; 83 - Um Pedacinho de nós; 85 – TERTÚLIA VMERISTA: "Introdução de novos fármacos versus gestão de espaço na mala?"; 87 – VOZES DA EMERGÊNCIA: ENTREVISTA; 93 – NOS POR LA: Evento de Apresentação da LIFESAVING nº14 na FNAC de Faro + SESSÃO À COMUNIDADE: “Obstrução da via aérea”; 95 – TESOURINHO VMERTISTA; 98 – BEST SITES; 99 – BEST APPS; 100 – ABC, Algarve Biomedical CEnter; 105 – FRASE MEMORÁVEL; 106 – NOVOS CRITÉRIOS DE PUBLICAÇÃO; 110 - Estatuto Editorial.
079 081 087 093 100 Indice
5
Nesta Edição n. 15 da LIFESAVING apresentamos a quarta SEPARATA CIENTÌFICA, composta por uma seleção de 6 artigos submetidos a Revisão de Pares. Aguardaremos pelo submissão de novos artigos, que poderão ser encaminhados ao email da Revista newsletterlifesaving@gmail.com 6
Indice
ยบ
Indice
7
8
Indice
HOT TOPIC | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
HOT TOPIC
HIPOTERMIA ACIDENTAL ACCIDENTAL HYPOTHERMIA Maria Inês A. Ribeiro1
1 Assistente Hospitalar de Medicina Interna - Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente do Hospital do Espírito Santo, Évora
RESUMO A hipotermia acidental define-se como uma temperatura corporal inferior a 35ºC que ocorre de forma não intencional. A sua importância relaciona-se com o facto de não ser exclusiva dos climas frios e poder estar presente em diversas situações da nossa prática clínica: nas vítimas de trauma, nos idosos com doenças neurológicas que vivem isolados, nas intoxicações com alteração do estado de consciência e no pós-operatório, são apenas alguns dos exemplos. A hipotermia acidental associa-se a elevada mortalidade pelo que o seu adequado reconhecimento e correcta abordagem, que frequentemente ocorrem no pré-hospitalar, são essenciais para melhorar a sobrevida destes doentes. Importa destacar que a abordagem desta entidade inclui alterações ao algoritmo de suporte avançado de vida e que, consoante a gravidade da situação, as vítimas deverão ser encaminhadas para diferentes instituições de saúde com terapêuticas mais ou menos invasivas e avançadas, nomeadamente com orientação dos casos mais graves para centros que realizem terapêutica de suporte extracorporal.
ABSTRACT Accidental hypothermia is defined as a body temperature below 35 ° C that occurs unintentionally. Its importance is related to the fact that it is not entirely exclusive to cold climates and is present in different situations of our clinical practice: in trauma victims, in elderly people with neurological diseases living in isolation, in intoxications with impaired conscience level, in post-operative situations are just some of the examples. It is associated with high mortality and their proper recognition and correct approach, which often occurs in prehospital care, is essential to improve the survival of these patients. It should be noted that this approach includes changes to the advanced life support algorithm and that, depending on the severity of the situation, the victims should be referred to different health institutions with more or less invasive and advanced therapies, including the orientation of the most severe cases for centers that perform extracorporeal support therapy.
Palavras-Chave: Hipotermia, reanimação cardiopulmonar, fibrilhação ventricular, oxigenação por membrana extracorporal
Keywords: Hypothermia, cardiopulmonary resuscitation, ventricular fibrillation, extracorporeal membrane oxygenation
INTRODUÇÃO A hipotermia acidental é uma situação frequente mas pouco reconhecida e subvalorizada na prática clinica. A sua incidência real não é conhecida. Nos Estados Unidos está associada a cerca de 1500 mortes por ano.(1) É sobejamente reconhecida como um dos três elementos da tríade fatal do trauma, conjuntamente com a coagulopatia e a acidémia.(2) Está mais presente no nosso quotidiano clínico do que aquilo que reconhecemos. Não é exclusiva dos países de climas frios e das catástrofes nas montanhas, mas uma realidade existente no pré-hospitalar (nos acidentes de viação, nos idosos doentes isolados em casa, nos alcoólicos encontrados na via pública) e no intra-hospitalar (nos doentes em sépsis, nos doentes que regressam do bloco operatório).(3) Assim, tendo em conta a sua transversalidade e impacto no prognóstico dos doentes, é importante estar atento para a reconhecer, avaliar e tratar adequadamente.(4) DEFINIÇÃO A hipotermia acidental define-se como uma descida na temperatura corporal abaixo dos 35ºC, que ocorre de forma involuntária e não intencional.(4)
Indice
9
Relativamente à sua etiologia, pode ser classificada em hipotermia primária quando surge numa pessoa previamente saudável mas em que a exposição ao frio excede a sua capacidade de compensação ou secundária quando ocorre em pessoas com patologias que predispõem à hipotermia mesmo quando expostas a temperaturas normais. (1) Como causas secundárias destacam-se: intoxicações (alcoolismo, abuso de opióides), toma de fármacos (barbitúricos, tricíclicos, benzodiazepinas), patologia endocrinológica (hipotiroidismo, hipopituitarismo, insuficiência supra-renal, diabetes), patologia metabólica (urémia, acidémia), sépsis, queimaduras e patologia dermatológica grave, patologia neurológica (acidente vascular cerebral, traumatismo craneoencefálico, doença de Parkinson, doença de Alzheimer, neuropatias). (1, 4, 5)
Classificação A hipotermia pode ser classificada quanto à sua gravidade de acordo com vários sistemas de classificação. Quando é possível fazer uma correcta medição da temperatura corporal, podemos classificar em hipotermia ligeira (35ºC a 32.2ºC), moderada (32.2ºC a 28ºC) e grave (<28º). A cada intervalo térmico corresponde um quadro típico de manifestações fisiológicas. (4)
Ocorre mais frequentemente nos extremos das idades pela menor capacidade de produzir e de conservar o calor produzido ou em doentes com alteração do estado de consciência por apresentarem mecanismos de defesa menos eficazes. (6)
O gold standart para avaliação da temperatura corporal central é o valor medido na artéria pulmonar. O método alternativo que melhor se correlaciona com este valor é a medição da temperatura esofágica, com colocação da sonda no terço distal do esófago. (6)
Fisiopatologia A temperatura corporal é regulada por receptores centrais e periféricos, presentes no hipotálamo e na pele, respectivamente. Para que o metabolismo se processe adequadamente, é necessário manter uma temperatura corporal óptima que é fruto do equilíbrio entre a termogénese e a termólise. O calor produzido resulta do calor libertado durante as reacções químicas associadas ao normal metabolismo. Quando
10
Indice
exposto ao frio, o organismo adapta-se com respostas fisiológicas que tentam diminuir a perda e aumentar a produção de calor com contracção muscular (que na clínica se traduz em tremor) e diminuição da perfusão periférica com vasoconstrição cutânea. Relativamente à perda de calor, pode acontecer por vários mecanismos: radiação, convecção, condução e evaporação. (2-4, 7)
No entanto, no meio pré-hospitalar, torna-se difícil e pouco confiável fazer essa avaliação de forma correcta dadas as limitações inerentes aos termómetros disponíveis que são inadequados em ambientes frios e em doentes hipotérmicos. (6) Nestas ocasiões deve ser usado o sistema de classificação da ICAR-MEDCOM (Tabela 1), também denominado sistema de classificação suíça, que permite classificar o grau
de gravidade baseando-se num conjunto de dados clínicos facilmente acessíveis e aos quais corresponderá, aproximadamente, uma determinada temperatura. (8) Clínica A hipotermia faz-se acompanhar por um amplo espectro de manifestações clínicas que se tendem a relacionar com a temperatura corporal, demonstradas na Tabela 1. (4,6,7)
Tabela 1 - Classificação ICAR-MEDCOM: Temperatura corporal e manifestações clínicas (adaptado)
Abordagem geral O tratamento da hipotermia depende de vários factores nomeadamente da gravidade da mesma, do meio onde é realizada a abordagem ao doente (meio pré ou intra-hospitalar) e dos recursos humanos e materiais disponíveis. Uma rápida e assertiva avaliação da gravidade da situação permitem uma correcta referenciação. A abordagem do doente hipotérmico deve começar com a sua estabilização seguindo a sequência ABCDE (airway, breathing, circulation, disability, exposure). É necessário retirar os doentes do ambiente frio, prevenir mais perda de calor corporal e rapidamente transferir para o hospital com a capacidade de resposta mais adequada. Se a hipotermia for moderada ou grave os primeiros cuidados a ter são: mobilizar o doente com cuidado, retirar as roupas molhadas, secar a
HOT TOPIC | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
Figura 1 - Orientação do doente hipotérmico
superfície corporal e instituir medidas de aquecimento activo. Nos doentes com hipotermia ligeira e conscientes, deve ser incentivada a sua mobilização activa e o reforço energético com bebida doces, quentes e não alcoólicas. (6, 9, 10) A instituição das várias medidas de aquecimento no local não devem atrasar o transporte para o hospital, onde a abordagem será mais eficaz.(1,3,9) Aquando a retirada da vítima do meio frio e iniciadas as manobras de aquecimento, pode ocorrer um fenómeno denominado afterdrop que corresponde a uma acentuação da diminuição da temperatura corporal. Ocorre na sequência da vasodilatação periférica provocada pelo aquecimento, com subsequente retorno de sangue mais frio das extremidades para os compartimen-
tos centrais do organismo, o que poderá desencadear instabilidade hemodinâmica com fibrilhação ventricular. (2) A escolha do local para onde se transporta a vítima é fulcral para o adequado e rápido tratamento e, assim, reduzir a morbimorbilidade associada à hipotermia. Deve ser feita de acordo com o grau de gravidade da hipotermia, após uma rápida avaliação e abordagem inicial. De forma a optimizar o transporte e o tratamento, é essencial contactar previamente a instituição de destino, particularmente se hipotermia superior ou igual a grau II, de forma a ter equipas e equipamento preparados para receber o doente. (6, 9) Segue-se a Figura 1 que melhor ilustra qual a orientação que deve ser dada às vítimas de hipotermia. (6,9,11)
As arritmias decorrem do efeito da hipotermia e geralmente resolvem com medidas de aquecimento, não sendo necessária administração de antiarrítmicos nem aconselhada a utilização de pacing (9) Na reanimação cardiopulmonar (RCP) em contexto de hipotermia acidental, o que se pretende é oferecer a melhor hipótese de sobrevida associada a um bom prognóstico neurológico. Neste sentido, vários estudos tem tentado encontrar ferramentas de triagem para orientação para técnicas mais avançadas, da qual se destaca o ECMO (ExtraCorporeal Membrane Oxygenation). O sexo feminino, a asfixia como causa de paragem cardiorrespiratória (PCR) e o nível sérico de potássio, são factores preditores de sucesso em doentes com PCR ou instabilidade hemodinâmica. (12) Outro factor Indice
11
12
Indice
HOT TOPIC | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
determinante de bom prognóstico neurológico é o facto de a hipotermia ter precedido a hipóxia. (6) De acordo com o conhecimento actual, um nível sérico de potássio superior a 12 mmol/L, está associado a mau prognóstico, podendo ser utilizado como apoio à decisão de suspender medidas de reanimação. (1, 3) Recentemente, foi desenvolvida uma escala que permite determinar a probabilidade de sobrevivência em doentes com hipotermia e em PCR submetidos a aquecimento através de técnica de suporte extracorporal – HOPE score. Através da conjugação de seis factores – idades, sexo, hipotermia com ou sem asfixia associada, duração das manobras de RCP, nível sérico de potássio e temperatura corporal – é possível predizer se o doente beneficia ou não de técnica de suporte extracorporal. Trata-se de uma ferramenta promissora com um valor preditivo elevado (se o HOPE for inferior a 10 a probabilidade de sobrevivência é de 97%). (13) Os métodos de aquecimento podem ser classificados em passivos (previnem a perda de calor corporal), activos externos (transferem calor para a superfície corporal) e activos internos (entrega de calor para o interior do organismo). Na Tabela 2 estão apresentados exemplos de cada tipo de método. (1,6) Relativamente aos métodos de aquecimento devem ser tidas em conta algumas considerações: - não aplicar calor directamente na pele pelo risco de queimaduras (6); - os fluídos endovenosos devem ser aquecidos a 38-42ºC com a especial atenção de que no pré-hospitalar podem arrefecer rapidamente e
Tabela 2 - Métodos de aquecimento na hipotermia acidental
agravar a situação clínica. Pode ser necessário administrar grande quantidade de volume para correcção das perdas provocadas pela diurese fria. Esta resulta da vasoconstrição induzida pelo frio seguida de vasodilatação na fase de aquecimento. O cristalóide de eleição é o soro fisiológico (apesar de que grandes quantidades deste podem estar associadas a acidose metabólica) tendo em conta as particularidades das outras opções, nomeadamente do lactato de ringer uma vez que em condições de hipotermia o fígado não consegue metabolizar o lactato. A administração de glicose está apenas preconizada em casos de hipoglicémia (1-3); - a lavagem gástrica geralmente não é utilizada pelo risco de aspiração e de distúrbios electrolíticos associados e, as lavagens pleurais e peritoneais são pouco utilizadas pelos riscos inerentes à sua colocação (hemorragia e trauma), mas, não obstante estes factos, são opções terapêuticas válidas (6). Exceptuando o electrocardiograma (ECG), os restantes exames complementares de diagnóstico são realizados já em ambiente intra-hospitalar. O ECG pode mostrar uma enorme variedade de alterações inespecíficas: fibrilhação auricular, fibrilhação ventricular, prolongamento dos segmentos PR e QT, alargamento do
complexo QRS e depressão do segmento ST. No entanto, existem alterações que apesar de não serem patognomónicas estão presentes na maioria dos doentes com hipotermia moderada a grave; denominam-se ondas de Osborn e consistem na elevação do ponto J ou numa elevação de 1mm no final do complexo QRS em dois batimentos consecutivos. Pode confundir-se com alterações do segmento ST e com a síndrome de Brugada. Há estudos que referem que a amplitude da onda de Osborn se correlaciona com a temperatura corporal. (5, 14) Outros exames importantes a pedir numa primeira abordagem são: hemograma, coagulação, função renal, ionograma (incluindo o cálcio ionizado), creatinina cinase, glucose, coagulação, função tiroideia e gasimetria arterial. (6,7) Nos casos de hipotermia secundária, não esquecer de direccionar o estudo e a terapêutica à causa subjacente. Reanimação cardiopulmonar – particularidades Uma das particularidades na abordagem das vítimas de hipotermia, é a relevância do efeito neuroprotector que a baixa temperatura confere. Desta forma, a decisão de ressuscitar e a duração das manobras instituídas, devem ser vistas à luz dessa evidência. Encontram-se descritos na literatura casos de reanimação cardiorrespiratória bem-sucedida Indice
13
14
Indice
HOT TOPIC | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
com recuperação neurológica em vítimas de hipotermia com temperatura corporal de 13.7ºC e com suporte avançado de vida (SAV) mantido durante seis horas e meia. (15, 16)
De acordo com as recomendações da European Resuscitation Council (ERC) de 2015, nos casos de hipotermia, existem algumas modificações e adaptações relativamente ao algoritmo de SAV que se descrevem de seguida e sumarizam na Tabela 3. (9). Uma conhecida máxima no contexto da hipotermia diz que “ninguém está morto até estar quente e morto”, o que demonstra a importância da reanimação nestes doentes. (9) O diagnóstico de PCR nos doentes hipotérmicos deve ser feito com extremo cuidado uma vez que os sinais de vida podem ser muito subtis. Para a correcta identificação de PCR, o período de pesquisa de sinais de vida deve ser prolongado durante 1 minuto e pesquisado numa artéria central e a monitorização de ECG deve ser realizada na expectativa de poder ser encontrada actividade eléctrica. Em caso de dúvida no diagnóstico, as manobras devem ser iniciadas imediatamente. Quando há indicação para entubação orotraqueal, a mesma deve ser realizada atempadamente, porque o risco do procedimento desencadear FV é mínimo. Tendo em conta que a hipotermia pode provocar rigidez torácica e que as manobras de reanimação podem ser prolongadas, deve ser considerada a utilização de compressores
Tabela 3 - Alterações do algoritmo de SAV no doente hipotérmico
mecânicos. Em determinados cenários pode ser difícil alcançar a vítima para iniciar manobras de reanimação, ou durante a sua evacuação pode haver momentos em que seja tecnicamente complicado manter compressões torácicas pela equipa de socorro. Neste contexto, e de acordo com as recomendações actuais, se não for possível iniciar manobras de reanimação no imediato ou de forma contínua, podem iniciar-se mais tardiamente e ser mantidas de forma intermitente. (3,17) Uma vez iniciadas as manobras de reanimação, a temperatura deve ser confirmada de forma fidedigna com um termómetro de baixa temperatura. Relativamente à utilização dos fármacos que fazem parte do algoritmo de SAV, deve-se ter em conta que, na hipotermia, o metabolismo está lentificado o que aumenta a sua toxicidade. Por outro lado, sabe-se que o coração em condições de hipotermia se torna menos responsivo a fármacos e à desfibrilhação. Assim, preconiza-se que não se administrem fármacos (incluindo
adrenalina) quando a temperatura corporal é inferior a 30ºC, entre os 30ºC e os 35ºC o intervalo entre cada administração deve ser o dobro do recomendado na normotermia, e acima dos 35ºC deve ser aplicado o algoritmo habitual. Relativamente à desfibrilhação não está estabelecido quando deve ser tentada; o recomendado no documento da ERC é, em caso de FV, aplicar os choques de acordo com o algoritmo normal, no entanto se o ritmo de FV se mantiver após 3 choques, não devem ser feitas novas tentativas até se atingir uma temperatura corporal de pelo menos 30ºC. Tendo em conta todos estes aspectos, as manobras de reanimação, mesmo que prolongadas, não devem ser suspensas até que o doente esteja devidamente aquecido. No entanto, pode considerar-se a suspensão das mesmas na presença de uma lesão fatal, asfixia prolongada ou se o tórax não for compressível. A medição da caliémia pode ser orientadora mas, na maioria das vezes, só é possível em meio intra-hospitalar. (6, 9)
Indice
15
Situações especiais Em todos os cenários, é prioritário garantir a segurança da equipa de socorro. (3) Intoxicações – Neste grupo inclui-se a intoxicação por álcool e outras drogas. Nestas situações, a alteração do estado de consciência resultante dos tóxicos leva a que haja menos mecanismos de protecção (maior e continuada exposição ao frio, malnutrição com défices nutricionais e hipoglicémia). No caso particular do álcool, este tem efeito directo no hipotálamo com disfunção da termorregulação. (18) Na suspeita de défice de tiamina, este deve ser prontamente corrigido. (7) Idosos – Grupo etário mais susceptível a hipotermia uma vez que a capacidade de termorregulação do organismo diminuiu com a idade. Contribuem para esta circunstância factores relacionados com a fisiologia do envelhecimento (menor produção de calor pela imobilidade, massa corporal reduzida e malnutrição), com a existência de patologias que predispõem a hipotermia secundária (acidente vascular cerebral, doença de Parkinson e demência, por exemplo) e com aspectos socio-económicos que predispõem para o isolamento e para a solidão. (18) Afogamento - Em caso de afogamento, na fase após retirada da água, uma vítima perfeitamente vígil e estável, poderá evoluir em choque e PCR. Tal fenómeno está relacionado com a súbita suspensão da pressão hidrostática que a água exerce no organismo submerso. Retirar a vítima na posição de decúbito poderá evitar este fenómeno. Ainda no que concerne ao afogamento sabe-se que
16
Indice
a duração do mesmo está directamente relacionado com a gravidade de lesão anóxica pelo que afogamentos com duração inferior a 5 minutos estão associados a bom prognóstico, com duração superior a 10 minutos a mau prognóstico e com duração superior a 25 minutos a muito baixa possibilidade de sobrevivência. (2, 3, 6) Trauma – As vítimas de trauma são particularmente susceptíveis à hipotermia devido a vários factores: exposição prolongada ao frio, existência de queimaduras, dificuldade na mobilização, e alteração da termorregulação hipotalâmica em casos de neurotrauma. Como importante consequência do trauma destacam-se as alterações da coagulação, agravadas pela hipotermia, que contribuem para a instabilidade hemodinâmica e perpetuam a hemorragia, num fenómeno conhecido como tríade fatal do trauma. (1) Controvérsias Apesar da classificação da ICAR-MEDCOM facilitar uma primeira avaliação e triagem, a avaliação final deve ser sempre baseada na medição adequada da temperatura corporal. (6) Na RCP, contrariamente às recomendações da ERC, as da American Heart Association (AHA) defendem que independentemente da temperatura corporal, na presença de ritmo desfibrilhável, há indicação para desfibrilhação e consideram razoável continuar com as tentativas de desfibrilhação mesmo que a primeira não seja bem-sucedida. Da mesma forma, considera plausível a administração de fármacos consoante o indicado nos algoritmos de RCP em doentes não hipotérmicos. (10, 19)
Apesar da caliémia (potássio sérico > 12mmol/L) ser um importante factor preditor de mau prognóstico, na maioria das situações o seu doseamento não é possível no pré-hospitalar, podendo este facto atrasar a tomada de decisões importantes na abordagem destes doentes. No que diz respeito à estratégia de aquecimento no pré-hospitalar, apesar de existirem várias alternativas no mercado, numa revisão realizada em 2017, nenhuma demonstrou ser superior relativamente às outras. Foi concluído que o mais importante é criar um ambiente de isolamento térmico em torno da vítima, idealmente com um dispositivo que forme uma barreira de vapor (manta térmica metálica) associando um cobertor de lã (caso o doente mantenha a capacidade de tremer), ou um saco de calor instantâneo colocado nas axilas ou no tórax. (3, 20) Realidade portuguesa Após pesquisa, não foram encontrados dados fidedignos quanto à realidade portuguesa. Tal como acima referido, a questão da hipotermia acidental é mais valorizada nos países de clima frio. Em Portugal, temos anualmente algumas notícias nos media acerca de mortes “relacionadas” com o frio, mas sem dados clínicos confiáveis a suportar esta informação. Podemos encontrar informação relativa às mortes por afogamento em 2018 no nosso país – 117 no total, sendo a maioria não presenciada e em homens com idade acima dos 40 anos. Contudo não existem dados relativos aos casos de afogamento com resgate, e eventualmente com RCP eficaz. (21) Em Portugal, a orientação destes doentes, agilização dos meios de
HOT TOPIC | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
transporte e comunicação entre as instituições envolvidas está ao cuidado do centro de orientação de doentes urgentes (CODU). Pela experiência pessoal adquirida até agora, também no contexto da prestação de cuidados de saúde a hipotermia é essencialmente pensada e valorizada em doentes politraumatizados e em situações de coagulopatia. Utilizamos frequentemente os antigos métodos de aquecimento mas, mesmo em doentes em PCR causada por hipotermia, muito raramente recorremos ao suporte extracorporal. Conclusões A hipotermia acidental está associada a elevada mortalidade e morbilidade.(1) O rápido reconhecimento e instituição de medidas adequadas evita a deterioração que pode levar à morte. Nos últimos anos assistiu-se a um avanço importante no tratamento de hipotermia acidental grave com a introdução do suporte extracorporal, que permitiu melhorar o prognóstico. (6, 1) E necessário pensar na relação custo-benefício associado a esta técnica, uma vez que o seu uso indiscriminado resulta em aumento dos custos e baixas taxas de sobrevivência. Por outro lado, o acesso demasiado restrito pode resultar em mortes potencialmente evitáveis. (12) A maioria dos estudos reflecte a experiência com hipotermia acidental associada a casos de afogamento e de soterramento por avalanche (19), sendo mais difícil encontrar estudos e protocolos ajustados à realidade no nosso país.
Apesar da hipotermia grave ser pouco frequente na nossa realidade clínica, seria importante criar protocolos uniformes com estratégias de abordagem e de referenciação bem definidas que permitissem uma melhor orientação e optimização dos recursos disponíveis. Bibliografia 1.
Brown, D. J. A. et al. (2012) ‘Accidental Hypothermia’, New England Journal of Medicine, 367, pp. 1930–1938.
2.
Avellanas, M. L. et al. (2012) ‘Management of severe accidental hypothermia’, Medicina Intensiva (English Edition). Elsevier BV, 36(3), pp. 200–212.
3.
Zafren, K. et al. (2014) ‘Wilderness Medical Society Practice Guidelines for the Out-of-Hospital Evaluation and Treatment of Accidental Hypothermia: 2014 Update’, Wilderness & Environmental Medicine, 25(4), pp. S66–S85.
4.
Danzl, D. F. and Pozos, R. S. (1994) ‘Accidental Hypothermia’, New England Journal of Medicine, 331(26), pp. 1756–1760.
5.
Mascato, A. V., Pato, G. C. and Sánchez, J. A. (2013) ‘Hipotermia en Urgencias Extrahospitalarias’, Cad Aten Primaria, 19, pp. 147–149.
6.
Paal, P. et al. (2016) ‘Accidental hypothermia-an update’, Scandinavian Journal of Trauma, Resuscitation and Emergency Medicine. BioMed Central Ltd., 24(1). doi: 10.1186/s13049-0160303-7.
7.
Epstein, E. and Ann, K. (2006) ‘Accidental hypothermia’, BMJ, 332, pp. 706–709.
8.
Durrer, B., Brugger, H. and Syme, D. (2003) ‘The medical on-site treatment of hypothermia ICAR-MEDCOM recommendation’, High Altitude Medicine and Biology. Mary Ann Liebert Inc., pp. 99–103.
9.
Truhlář, A. et al. (2015) ‘European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015 Section 4. Cardiac arrest in special circumstances’, Resuscitation, 95, pp. 148–201. doi: 10.1016/j.resuscitation.2015.07.017.
10. Vanden Hoek, T. L. et al. (2010) ‘Part 12: Cardiac Arrest in Special Situations: 2010 American Heart Association Guidelines for Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care’, Circulation, 122(18_suppl_3), pp. S829– S861.
11. Jarosz, A. et al. (2017) ‘Profound accidental hypothermia: systematic approach to active recognition and treatment’, ASAIO Journal, 63 (3), pp. e26-e30. 12. Saczkowski, R. S. et al. (2018) ‘Prediction and risk stratification of survival in accidental hypothermia requiring extracorporeal life support: An individual patient data meta-analysis’, Resuscitation. Elsevier Ireland Ltd, 127, pp. 51–57. 13. Pasquier, M. et al. (accepted 2018) ‘Hypothermia outcome prediction after extracorporeal life support for hypothermic cardiac arrest patients: The HOPE score’, Resuscitation. 14. Doshi, H. H. and Giudici, M. C. (2015) ‘The EKG in hypothermia and hyperthermia’, Journal of Electrocardiology. Churchill Livingstone Inc., pp. 203–209. 15. Gilbert, M. et al. (2000) ‘Resuscitation from accidental hypothermia of 13.7 degrees C with circulatory arrest’, Lancet, 355:375–6. 16. Lexow, K. (1991) ‘Severe accidental hypothermia: survival after 6 hours 30 minutes ofcardiopulmonary resuscitation’, Arctic Med Res, 50:112–4.44. 17. Gordon, L. et al. (2015)’Delayed and intermittent CPR for severe accidental hypothermia’, Resuscitation, 90:46–9.46. 18. Mallet, M. L. (2012) ‘Pathophysiology of accidental hypothermia’, QJM: An International Journal of Medicine, 95(12), pp. 775–785. 19. Brugger, H. et al. (2013) ‘Resuscitation of avalanche victims: Evidence-based guidelines of the international commission for mountain emergency medicine (ICAR MEDCOM). Intended for physicians and other advanced life support personnel’, Resuscitation, pp. 539–546. 20. Haverkamp, F.J.C., Giesbrecht, G.G. and Tan, E.C.T.H. (2018) ‘The prehospital management of hypothermia – an up-to-date overview’, Injury, 49 (2), pp. 149-164. 21. Federação Portuguesa de Nadadores Salvadores (2018), Relatório Anual de Afogamento 2018.
Indice
17
18
Indice
ARTIGO DE REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
ARTIGO DE REVISÃO
A ABORDAGEM DIAGNÓSTICA DA DOR TORÁCICA NO CONTEXTO DA EMERGÊNCIA PRÉ-HOSPITALAR THE DIAGNOSTIC APPROACH OF CHEST PAIN IN THE PREHOS� PITAL EMERGENCY SETTING Soraia Correia1
1 Aluna do 6º ano do Mestrado Integrado em Medicina, Faculdade de Medicina da Universidade do Algarve
RESUMO A dor torácica encontra-se entre as maiores causas de ativações dos meios de emergência pré-hospitalar em Portugal, segundo as estatísticas realizadas pelo INEM. Fisiopatologicamente atribui-se a responsabilidade da dor torácica às fibras nervosas que podem ser ativadas através de vários mecanismos como isquemia, infeção, inflamação, aumento de pressão ou estiramento dos órgãos torácicos. Estas fibras, como o feixe aferente do nervo vago, são partilhadas por várias estruturas e órgãos, sendo por isso difícil de distinguir qual a estrutura afetada. Na origem de uma dor torácica podem estar diversas etiologias, algumas das quais representam risco de vida, o que aciona uma emergência o mais célere possível. Através da história clínica, exame físico e dos métodos complementares de diagnóstico disponíveis é possível colher a informação essencial à realização do diagnóstico diferencial, permitindo assim uma necessária atuação rápida, direcionada à etiologia em causa, que permite salvar vidas.
ABSTRACT According to statistics from INEM, chest pain is among the leading causes of pre-hospital emergency activations in Portugal. Pathophysiologically, chest pain is attributed to nerve fibers that can be activated through various mechanisms such as ischemia, infection, inflammation, or increased pressure or stretching of the thoracic organs. These fibers, like the afferent bundle of the vagus nerve, are shared by various structures and organs, making it difficult to distinguish which structure is affected. Underlying chest pain may be several etiologies, some of which are life-threatening and in this case an emergency, so action should be as fast as possible. Through the clinical history, physical examination and available complementary diagnostic methods, it is possible to gather the essential information for the differential diagnosis, thus allowing a necessary fast action, directed to the etiology in question that saves lives.
Palavras-Chave: Dor torácica; Abordagem diagnóstica; emergência pré-hospitalar
Keywords: chest pain; diagnostic approach; prehospital emergency
INTRODUÇÃO Segundo estatísticas realizadas pelo Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) a dor torácica encontra-se entre as cinco principais causas de ativação dos meios de emergência pré-hospitalar em Portugal, logo após as ativações por trauma, alteração do estado de consciência, dispneia e dor abdominal/problemas urinários.1 Nos dados disponíveis da Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) de Faro e Albufeira, de Janeiro de 2016 a Junho de 2017, correspondeu a 15% de todas as ativações sendo, portanto, um motivo de atuação bastante presente e significativo no dia-a-dia de quem trabalha em emergência.2 Dados que se encontram em consonância com os resultados de estudos realizados noutros países Europeus (Holanda, Inglaterra, Islândia e Suécia) que demonstraram que cerca de 20 a 25% de todas as chamadas de ativação de emergência médica pré-hospitalar se devem a dor torácica.3,4 Nestes identificou-se o seguinte ratio de etiologias3,4: De origem cardiovascular: aproximadamente 45% Enfarte Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do segmento Indice
19
ST– 5 - 10% Enfarte Agudo do Miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST – 15 – 20% Tromboembolismo Pulmonar – 2% De origem não cardíaca: Musculoesquelética – 5% Gastrointestinal – 3% Psicogénica – 5% Pulmonar – 4% Outras causas/desconhecida – 18% Os pacientes apresentam um espectro de sinais e sintomas que refletem as muitas etiologias potenciais da dor retroesternal. O espectro de gravidade varia de etiologias pouco emergentes como a ansiedade, num extremo, até desfechos dramáticos como o caso da disseção aórtica ou o síndrome coronário agudo no extremo oposto, motivo pelo qual é determinante a rapidez e eficiência da abordagem.5,6 É fundamental reconhecer as características da dor para se chegar à causa subjacente. Não menos importante é a realização do exame físico assim como os exames complementares de diagnóstico disponíveis no contexto de emergência pré-hospitalar. O objetivo é reunir todas as variáveis possíveis e quantificar a probabilidade para uma ou mais causas, e ao excluir diagnósticos menos prováveis a atuação tende a ser a mais adequada e num intervalo de tempo mais curto, diminuindo assim a morbilidade e mortalidade associadas.3,7
20
Indice
FISIOPATOLOGIA Qualquer processo patológico que ocorra no interior ou exterior da cavidade torácica pode dar origem a desconforto no peito. As estruturas inerentes a essa dor podem ser o coração, pericárdio, aorta, pulmões e/ou pleuras, esófago, diafragma, costelas ou coluna vertebral e respetivos músculos acessórios, fáscia e a pele. Outras estruturas podem também contribuir para que ocorra dor torácica pela sua proximidade ou pela sua relação neurológica.5 As fibras nervosas da dor torácica podem ser ativadas através de vários mecanismos que podem ser isquémia, infeção, inflamação ou obstrução mecânica dos órgãos torácicos. Estes estímulos entram através da raiz nervosa da medula e são transportados até ao cérebro onde são lidos como uma perceção de dor. 5 A dor pode ser somática ou visceral. A primeira é aquela em que o doente sabe exatamente a sua localização pois o nervo que transporta o estímulo entra numa raiz nervosa. A segunda é a que o doente se queixa de um desconforto ou dor generalizada de uma área de onde os estímulos são levados por várias fibras nervosas sensoriais que entram em múltiplos segmentos da medula espinhal. Por vezes, vários órgãos partilham nervos sensoriais o que torna mais difícil, para o cérebro, discernir qual o local exato da dor podendo ainda haver um fenómeno denominado de dor referida, por exemplo dor no ombro resultante de irritação do diafragma ou dor na região das omoplatas secundária a inflamação da vesicula biliar. No tórax, o maior responsável
por este fenómeno é o nervo frénico, pois o seu trajeto é comum a várias estruturas e órgãos.5,8 ABORDAGEM À DOR TORÁCICA A prioridade inicial é determinar se o doente tem um distúrbio que ponha em risco a sua vida. Assim a estratégia de direcionar a atenção e pensar em primeiro lugar em distúrbios como o síndrome coronário agudo, principalmente o enfarte agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (EAMST), tromboembolismo pulmonar (TEP), dissecção da aorta (DA), pneumotórax hipertensivo, ou rutura do esófago, são as principais etiologias de dor torácica com risco de vida eminente de surgimento súbito.5 Na avaliação primária da vítima, pelo algoritmo ABCDE, a abordagem sustentada pelo INEM, procura as alterações explicitadas na Tabela 1. Assim que são encontradas alterações deve ser feita a correção imediata das mesmas5: Após concluir a avaliação primária com correção de todos os parâmetros e estabilização da vítima pode ser iniciada a avaliação secundária, através de uma história clínica já com o objetivo de chegar a um diagnóstico diferencial. Pode ser utilizado o algoritmo SAMPLE, como mostra a Tabela 25: A resposta a estas breves questões permite direcionar mais rapidamente o raciocínio clínico para diagnósticos suspeitos. Avaliar os fatores de risco inerentes a cada doente, assim como a caracterização minuciosa da dor, fornece dados que não são passíveis de obter passando apenas pelos tópicos referidos anteriormente e
ARTIGO DE REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
consumos de tabaco, álcool e drogas. EXAME FÍSICO DO DOENTE COM DOR TORÁCICA Habitualmente o exame físico per se não permite distinguir pacientes com síndromes coronárias agudas de pacientes com dor torácica de causa não cardíaca, no entanto o profissional que faz a avaliação deve ficar alerta para doentes que se apresentem ansiosos, dispneicos, diaforéticos e desconfortáveis. 5,10 Um doente que coloca a mão sobre o esterno, o chamado “sinal de Levine”, pode ter doença cardíaca, sendo que este sinal tem baixa sensibilidade e especificidade.5
Tabela 1 - Algoritmo para a avaliação primária do doente com dor torácica4,5,9
Tabela 2 - Algoritmo para a avaliação secundária do doente com dor toracic5
devem ser avaliados nas seguintes questões5: • Local da dor – Onde é a dor exatamente? • Início da dor – A dor surgiu de forma abrupta ou instalou-se gradualmente?
para lado nenhum? • Fatores de exacerbação e alívio – Há atividades ou posições que alterem a dor, por exemplo a respiração ou inclinação para a frente?
• Características – Como é que o doente a caracteriza? Tipo facada, peso, aperto?
• Tempo – A dor está sempre presente ou desaparece por vezes? Qual a duração dos episódios? • Severidade – Numa escala de 0 a 10 como avaliaria a dor?
• Radiação da dor – A dor vai para o ombro, mandibula, costas ou não vai
• Fatores de risco – Comorbilidades, eventos recentes, história familiar e
ESTUDOS ADICIONAIS Contrariamente à sequência habitual, na abordagem ao doente com dor torácica a realização de eletrocardiograma - ECG de 12 derivações deve ser realizada nos primeiros 10 minutos, como sugerem as guidelines da American College of Cardiology e da American Heart Association (ACC/ AHA).10 Após o primeiro ECG deve-se continuar a fazê-lo de forma seriada a cada 10 minutos se o doente apresentar história clínica e exame físico compatíveis com EAM, mas não tiver repercussão eletrocardiográfica, uma vez que a dinâmica da patologia pode mudar os sinais elétricos que são conduzidos pelos feixes cardíacos em qualquer momento. 10 Para cada patologia pode haver achados mais comuns da história clínica, exame físico e alterações eletrocardiográficas, estas serão apresentadas na Tabela 3, quando aplicável. As vítimas de dor torácica devem ser Indice
21
abordadas de forma sistemática, através das diferentes avaliações, para que seja possível fazer um diagnóstico. Para tal deve ser seguido o fluxograma apresentado na Figura 1: DAS DORES TORÁCICAS EMERGENTES ÀS MENOS URGENTES... A dor retroesternal é o sintoma de partida para inúmeras etiologias potencialmente fatais e de difícil identificação, quer pelos fatores de confundimento associados, quer pela transversabilidade e baixa especificidade dos sinais e sintomas.10 Algumas das etiologias que representam risco de vida são 10: • Síndrome Coronário Agudo: - EAMST - EAMSST • Disseção da aorta • Tromboembolismo pulmonar • Pneumotórax hipertensivo • Tamponamento cardíaco • Mediastinite: - Rutura esofágica Destas, a DA e o TEP estão entre as patologias mais desafiantes e difíceis de diagnosticar em ambiente pré-hospitalar, por esse motivo, além de se ter em conta todos os sinais e sintomas do momento presente, também a história clínica do doente pode ser de grande relevo e não deve ser negligenciada.14,15 A Dissecção da Aorta é uma patologia relativamente incomum com uma
Tabela 3 - Diagnósticos diferenciais de dor torácica e suas características6,9–14 BRD – Bloqueio de Ramo Direito; EAM – Enfarte Agudo do Miocárdio; EAMST – Enfarte Agudo do Miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST; ECG – Electrocardiograma; MV – Murmúrio Vesicular; PVJ – Pressão Venosa Jugular; TVP – Trombose Venosa Profunda; SCA – Síndrome Coronário Agudo
22
Indice
ARTIGO DE REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
pontuação cumulativa máxima de 3, o que indica alto risco de DA, segundo a IRAD.16
Figura 1 - Fluxograma de diagnóstico do tipo de dor torácica 5,7,10 DA – Dissecção da Aorta; EAM – Enfarte agudo do miocárdio; EAMST – Enfarte agudo do miocárdio com supradesnivelamento de ST; EAMSST – Enfarte agudo do miocárdio sem supradesnivelamento de ST; ECG – Eletrocardiograma; GE – gastroesofágico; ME – Musculo-esquelético; SCA – Síndrome Coronário Agudo; TEP – Tromboembolismo Pulmonar; PTX – Pneumotórax
incidência de 3 casos por 100.000 pacientes por ano, embora se pense que este valor esteja subestimado pelo facto de muitos pacientes morrerem antes de se fazer o diagnóstico.10 Segundo o International Registry of Aortic Dissection (IRAD), os pacientes que mais sofrem de DA são homens entre a 6ª e a 7ª década de vida, hipertensos e propensos a ter aterosclerose. A síndrome de Marfan está presente em 8,5% dos pacientes mais jovens assim como o consumo de cocaína, que pela libertação de catecolaminas induz uma hipertensão transitória.14,16 A estratificação do score de risco para DA (Aortic dissection detection risk score - ADD-RS) baseia-se em 3 pontos:
- Condição de alto risco como: síndrome de Marfan; história familiar de doença aórtica; doença valvular conhecida; aneurisma da aorta conhecido ou com manipulação prévia incluindo cirurgia cardíaca. - Dor no peito, costas ou abdómen descrita como súbita, de forte intensidade ou sensação de rasgão com lacrimejo. - Achados no exame físico de défice de perfusão, défice de pulsos, diferença de pressão arterial sistólica, défice neurológico focal ou sopro diastólico aórtico e hipotensão/ choque. Se estiver presente, pelo menos, 1 marcador de cada grupo recebe a
Ao contrário da DA, o embolismo pulmonar é bastante mais frequente com uma incidência estimada de 39 a 115 casos por 100.000 pacientes.10,15 No entanto, com o avançar da idade, a incidência aumenta drasticamente passando para >500 casos por 100.000 pacientes após os 75 anos.17 Existem fatores de risco fortes (OR>10), moderados (OR 2-9) e fracos (OR<2) que devem ser considerados aquando da colheita da história clínica do paciente. Os fatores de risco mais importantes são: fratura do membro inferior; hospitalização prévia (3 meses antecedentes) na sequência de insuficiência cardíaca/fibrilação auricular/flutter; colocação de prótese de joelho ou anca; trauma grave; enfarte do miocárdio nos 3 meses anteriores.15 Os sinais e sintomas encontrados são pouco específicos, mas a forte suspeita inicia-se quando a vítima se apresenta com dispneia em repouso (73% dos casos) de início súbito em segundos (46%) ou minutos (26%) e dor retroesternal pleurítica (66%). Pode apresentar pré-sincope ou sincope (<10%) e tosse (37%) com hemoptises (13%) embora estas sejam menos frequentes. Habitualmente os sinais e sintomas são mais exacerbados consoante o embolo é maior/proximal. 15,17 A hipoxemia é frequente mas cerca de 40% dos pacientes apresenta saturação periférica de oxigénio dentro dos valores normais.15 A sincope, quando ocorre, está associada a trombos maiores, aumento da instabilidade hemodIndice
23
inâmica e disfunção ventricular direita.15 Outras etiologias que podem cursar com dor/desconforto torácico, porém menos emergentes e sem risco de vida na maioria das vezes, são descritas a seguir 10: • Cardíacas - Insuficiência cardíaca aguda - Angina estável - Cardiopatias valvares: Prolapso da válvula mitral ou estenose aórtica - Pericardite - Miocardite - Endocardite - Arritmias cardíacas • Pulmonares/pleurais - Pneumonia - Traqueíte - Bronquite - Exacerbação de asma - Malignidade pulmonar - Derrame pleural • Gastrointestinais - Refluxo gastroesofágico - Espasmo esofágico - Rutura (síndrome de Boerhaave) - Hérnia do hiato deslizante - Pancreatite (dor referida no peito) • Musculosqueléticas - Contusão - Fratura de arcos costais - Distensão muscular intercostal - Costocondrite • Psicogénicas - Ataque de pânico - Ansiedade
24
Indice
ARTIGO DE REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
CONCLUSÃO A dor torácica é um sintoma bastante comum nas patologias mais atendidas por quem trabalha em emergência pré-hospitalar. Os doentes com dor torácica são, sem dúvida, um enorme desafio, quer pela alargada diversidade de etiologias possíveis, quer pela potencial gravidade da situação. Por esse motivo, devem ser abordados de forma sistemática, iniciando pela avaliação primária, abordagem ABCDE, passando depois para a avaliação secundária, abordagem SAMPLE, e por fim caracterização exaustiva da dor, para que o diagnóstico seja rápido e eficiente na identificação das etiologias potencialmente fatais agilizando o encaminhamento para o local de tratamento definitivo e sustentando o tratamento de suporte adequado durante este período. MENSAGEM FINAL 1 Em doentes que apresentam dor torácica, o indicado é realizar a abordagem sistemática que permite reunir o máximo de informação útil e interpretá-la de forma correta para que o tratamento se faça rapidamente, de forma eficiente e se evitem situações trágicas. MENSAGEM FINAL 2 Sempre que um doente ativar os meios de emergência pré-hospitalar por dor torácica deve-se pensar em condições ameaçadoras de vida em primeiro lugar. Apenas após descartar a existência destas condições deve ser dado início ao estudo de todas as outras opções menos urgentes.
TAKE HOME MESSAGE 1 In patients with chest pain, a systematic approach is recommended to gather as much useful information as possible and to interpret it correctly so that treatment can be done quickly, efficiently and avoid tragic situations. TAKE HOME MESSAGE 2 Whenever a patient activates the prehospital emergency for chest pain, must think about life threatening conditions first. Only after ruling out the existence of these conditions the study of all other less urgent options can be initiated.
BIBLIOGRAFIA 1. INEM - estatisticas. http://oldsite.inem. pt/stats/stats.asp?stat=16&REF=Todos. Published 2019. Accessed December 29, 2019. 2.
3.
4.
Rodrigues André Abilio; Mega S. Nós por cá - Estatística das “Vias verdes coronárias.” Lifesav - Rev das VMER Faro e Albufeira No6. 2017:24-25. https:// issuu.com/lifesaving/docs/lifesaving_n6_ final. Erhardt L, Herlitz J, Bossaert L, et al. Task force on the management of chest pain. Eur Heart J. 2002. doi:10.1053/ euhj.2002.3194 Roffi M, Patrono C, Collet JP, et al. 2015 ESC Guidelines for the management of acute coronary syndromes in patients presenting without persistent st-segment elevation: Task force for the management of acute coronary syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation of . Eur Heart J. 2016. doi:10.1093/eurheartj/ehv320
5.
Dalton, Alice L.; Limmer, Daniel; Mistovich, Joseph J.; Werman HA. Molestias o dolor torácico. In: Sosa MAT, ed. Empact. Urgencias Médicas: Evaluación, Atención y Transporte de Pacientes. Editorial. San Francisco: Manual Moderno; 2012:209-231.
6.
Barbosa A, Silva A, Cordeiro A, et al. Diagnóstico diferencial da dor torácica: ênfase em causas não coronarianas. Rev Med Minas Gerais. 2010:20(2 Supl 1): S24-S29.
7.
Bassan R, Pimenta L, Leães PE, et al. I Diretriz de Dor Torácica na Sala de
Emergência. Arq Bras Cardiol. 2002. doi:10.1590/s0066-782x2002001700001 8.
Netter FH. Phrenic nerve. In: Hansen, John T; Benninger, Brion; Brueckner-Collins, Jennifer; Hoagland, Todd M.; Tubbs RS, ed. Atlas of Human Anatomy. 6st ed. Philadelphia: Saunders - Elsevier; 2014:178-241.
9.
Wilkinson, Ian B.; Raine, Tim; Wiles, Kate; Goodhart, Anna; Hall, Catriona; O’Neill H. Oxford Handbook of Clinical Medicine. 10th Ed. (wilkinson, Ian B.; Raine, Tim; Wiles, Kate; Goodhart, Anna; Hall, Catriona; O’Neill H, ed.). New York: Oxford University Press Inc.; 2017.
10. Hollander J, Chase M. Evaluation of the adult with chest pain in the emergency department. UpToDate. 2018. 11. Dennis Kasper, Anthony Fauci, Stephen Hauser, Dan Longo, J. Larry Jameson JL. Harrison. Principios de Medicina Interna. 19 ed. (AMGH editora Lta., ed.). Porto Alegre e São Paulo: Artmed e McGraw Hill; 2017. 12. Castelo-Branco, Luis; Pereira, Nuno Guerra; Gago T. Competências Clinicas Práticas e Preparação Para OSCE. 1a ed. Lisboa: Lidel; 2016. 13. Konstantinides S V., Torbicki A, Agnelli G, et al. 2014 ESC Guidelines on the diagnosis and management of acute pulmonary embolism. Eur Heart J. 2014. doi:10.1093/eurheartj/ehu283 14. Erbel R, Aboyans V, Boileau C, et al. 2014 ESC guidelines on the diagnosis and treatment of aortic diseases. Eur Heart J. 2014. doi:10.1093/eurheartj/ehu281 15. Konstantinides S V., Meyer G. The 2019 ESC Guidelines on the Diagnosis and Management of Acute Pulmonary Embolism. Eur Heart J. 2019. doi:10.1093/eurheartj/ehz726 16. Black, James H; Manning WJ. Clinical features and diagnosis of acute aortic dissection. UpToDate. 2019. 17. Thompson, B Taylor; Kabrhel C. Overview of acute pulmonary embolism in adults. UpToDate. 2018.
Indice
25
26
Indice
TEMAS EM REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
TEMAS EM REVISÃO
TAQUIDISRITMIAS SUPRAVENTRICULARES Abordagem em Contexto Pré e Intra-Hospitalar SUPRAVENTRICULAR TACHYCARDIAS Approach in Pre and Intra-Hospital Context Hugo Costa, Pedro Azevedo, Daniela Carvalho, Rui Candeias, Ilídio de Jesus 1 1 Serviço de Cardiologia – Centro Hospitalar e Universitário do Algarve - Faro
RESUMO As taquidisritmias supraventriculares (TSV) são relativamente frequentes, constituem um grupo heterogéneo de arritmias e o seu diagnóstico diferencial é muitas vezes difícil na prática clínica. Apresentam clínica variável que depende da gravidade do evento arrítmico, das comorbilidades associadas bem como das características inerentes ao próprio doente. Embora a maioria das TSV se apresente com complexos QRS estreitos e as taquicardias ventriculares (TV) com complexos QRS largos, isto nem sempre acontece, sendo essencial uma cuidadosa avaliação para um diagnóstico correto. A utilização de manobras vagais e a administração de adenosina podem estar indicadas no tratamento inicial e auxiliam no diagnóstico diferencial das TSV. Assim, uma correta avaliação e rápida abordagem em ambiente pré-hospitalar ou hospitalar, possibilita a estabilização hemodinâmica (HD) do doente e posterior encaminhamento para estudo dirigido.
ABSTRACT Supraventricular tachycardia (TSV) is relatively common, constituting a heterogeneous group of arrhythmias and their differential diagnosis is often difficult in clinical practice. Clinical presentation is quite variable and depends on the severity of the arrhythmic event, the associated comorbidities as well as the characteristics inherent to the patient himself. Although most TSV presents with narrow QRS complexes and ventricular tachycardias (TV) with wide QRS complexes, this does not always happen, and a careful evaluation is essential for a correct diagnosis. The use of vagal maneuvers and the administration of adenosine may be indicated in the initial treatment and assist in the differential diagnosis of TSV. A correct evaluation and a rapid approach, both in pre-hospital or hospital context, are crucial for patient stabilization and allows the subsequent referral to a etiological study.
Palavras-Chave: Taquidisritmias supraventricu-
Keywords: Supraventricular tachycardias, QRS
lares, Complexo QRS, Diagnóstico diferencial,
complex, Differential diagnosis, Vagal
Manobras vagais, adenosina.
maneuvers, Adenosine.
INTRODUÇÃO As palavras taquidisritmia, taquiarritmia ou taquicardia são amplamente utilizadas de forma indiferenciada na prática clínica apesar das suas diferenças etimológicas. Neste texto de revisão as mesmas serão utilizadas como sinónimos. É importante realçar que será dado enfase sobretudo às TSV não fibrilhação auricular (FA), por esta merecer uma abordagem independente devido à sua frequência e complexidade. A taquicardia nasce como uma alteração ao ritmo sinusal (RS). RS define-se como ritmo proveniente do nódulo sinusal (NS), o que em termos eletrocardiográficos se traduz com pela presença de ondas P positivas nas derivações DI, DII, aVF e negativas em aVR. Estas devem estar relacionadas e seguidas de complexos QRS, complexos estes com intervalo R-R regular e com frequência cardíaca (FC) entre os 60-100 batimentos por minuto (bpm). (1) Assim, taquicardia define-se como uma frequência cardíaca (sob a forma de frequência ventricular) superior a 100 bpm num adulto em repouso. (1)
Indice
27
EPIDEMIOLOGIA As TSV são relativamente comuns mas os dados epidemiológicos não são consistentes. Os precipitantes relacionam-se com o género, idade e a presença de comorbilidades cardiovasculares, como as alterações cardíacas estruturais. São mais frequentes no sexo feminino numa proporção 2:1, maioritariamente idiopáticas nos mais jovens e associados a comorbilidades nos doentes mais velhos. Os doentes com episódios isolados de TSV paroxísticas (TPSV) tendem a ser mais jovens, com FC mais rápidas, sintomas mais precoces e por isso maior probabilidade de serem documentadas em contexto de serviço de urgência (SU).2,3) CLÍNICA A apresentação clínica das taquicardias é bastante variável (Tabela 1). As palpitações são o sintoma mais frequentemente descrito nas arritmias cardíacas, embora seja uma manifestação inespecífica. Outros sintomas podem estar presentes como a fadiga, tonturas, desconforto definido como dor torácica, dispneia, poliúria ou alterações do estado de consciência.(2,4) Episódios pontuais ou isolados de extrassistolia supraventricular ou ventricular raramente produzem sintomatologia quando comparados a episódios sustentados de TSV ou TV, pois o maior impacto em termos HD destas últimas resulta da diminuição do tempo de diástole com consequente menor volume sistólico e diminuição da pressão arterial.(4) As TSV raramente são ameaçadoras de vida durante o evento agudo embora se apresentem frequentemente de forma sintomática.(5)
28
Indice
Tabela 1 – Sinais e sintomas mais frequentes nas TSV.(2)
Tabela 2 – Classificação das TSV. AV – auriculoventricular.(2)
CLASSIFICAÇÃO As taquidisritmias podem ser classificadas de acordo com a sua origem, em TSV (Tabela 2) se o mecanismo envolver o feixe de His ou o tecido cardíaco acima deste (aurículas e nódulo auriculoventricular - NAV) e TV se o processo se desencadear a nível ventricular (cardiomiócitos ventriculares e sistema de condução intraventricular). Podem ainda ser definidas de acordo com a duração do complexo QRS no electrocardiograma (ECG) de 12 derivações, QRS inferior ou igual (≤) a 120 milissegundos (ms) denominam-se de complexos estreitos e QRS superior (>) 120 ms complexos largos. Embora a maioria das TSV se apresente com complexos estreitos e as TV com complexos largos existem exceções a esta regra, como por exemplo as TSV com condução aberrante ou as TV com origem nas porções proximais dos fascículos de condução intraventricular. (1,2,6) A taquicardia sinusal (TS) é definida como um aumento da FC > 100 bpm com origem no NS, com ondas P
positivas em DI, DII e aVF e bifásicas em V1. Esta pode ser fisiológica como resposta a um desencadeante fisiopatológico (exercício físico, dor, febre, anemia, desidratação, hipertiroidismo) ou a fármacos e outras drogas (dobutamina, anfetaminas). Por outro lado a TS inapropriada é uma resposta desproporcional aos fatores anteriormente descritos, afetando mais frequentemente mulheres em idade jovem e habitualmente com bom prognóstico. A síndrome de taquicardia postural ortostática (POTS) é caracterizada por um aumento na FC ≥ 30 bpm mantida durante mais de 30 segundos em ortostatismo e na ausência de hipotensão ortostática. É mais comum em mulheres jovens e aproximadamente 50% dos doentes recupera ao fim de 1 a 3 anos. (2,5) A taquicardia auricular focal (TA) apresenta-se com ritmo auricular organizado entre os 100-250 bpm com frequências ventriculares que dependem da condução pelo NAV. Origina-se por focos de automatismo ou atividade deflagrada (“triggered”)
TEMAS EM REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
com disseminação para ambas as aurículas de forma centrifuga. Podem apresentar um aumento progressivo da FC (fase de warm-up) e sua consequente diminuição de forma paulatina (fase de cool-down) antes da resolução. A distinção entre TA e taquicardias de macroreentrada no ECG por vezes não é clara. A identificação da onda P é crucial embora possa estar integrada com o complexo QRS ou onda T. A TA multifocal é definida como um ritmo rápido e irregular com pelo menos 3 morfologias diferentes da onda P, habitualmente associado a doenças pulmonares crónicas. (2,7) As taquicardias por macroreentrada podem ser dependentes ou não do istmo cavo-tricúspide (ICT). O flutter auricular (FLA) possui um mecanismo de macroreentrada classificado de típico quando depende do ICT ou atípico quando não depende deste último. O FLA típico pode apresentar-se com rotação anti-horária ou horária (FLA reverso). Habitualmente a despolarização desce pela parede livre da aurícula direita, passa pelo ICT e sobe pela parede septal direita. No FLA existe um ritmo auricular organizado com uma frequência auricular de 250-300 bpm que pode ser acompanhada de bloqueio auriculoventricular (BAV) (2:1 o mais habitual) com frequências ventriculares próximas de 150 bpm (NOTA: o BAV pode ser 2:1, 3:1, 4:1 ou variável, entre outras apresentações). As típicas ondas F de FLA são as chamadas “ondas em dentes de serra”, positivas em V1 e negativas nas derivações inferiores, ou com morfologia inversa se o FLA for típico reverso. O risco de tromboembolismo é semelhante ao risco dos doentes com FA, sendo frequente a
alternância entre estes dois tipos de arritmia. Assim, a anticoagulação profiláctica reveste-se de extrema importância, tendo sempre em conta o score de risco trombo-embólico CHA2DS2-VAS�. (2,5,7)
o que explica alguns dos sintomas como a diurese pós-taquicardia (contracção auricular com válvula AV encerrada e consequente libertação de péptidos natriuréticos). Habitualmente o início e fim da taquicardia
Figura 1 - Flutter Auricular com BAV variável (períodos de condução pelo NAV variável 2:1 e 3:1)
Figura 2 – TRNAV – QRS < 120ms, onda P retrógrada com pseudo r´em V1, pseudo s inferior e RP ≤ 90ms.
A taquicardia de reentrada nodal auriculoventricular (TRNAV) prossupõe uma reentrada e a existência de duas vias de condução do estímulo elétrico pelo NAV, com diferentes velocidades de propagação e diferentes períodos refratários. Uma extrassistole auricular pode ser bloqueada pela via rápida (via β – com período refratário mais longo) sendo conduzida de forma anterógrada para o ventrículo pela via lenta (via α) e, posteriormente, de forma retrógrada para a aurícula pela via rápida condicionando um circuito de reentrada pelo NAV. Deste modo, existe uma activação quase simultânea das aurículas e ventrículos,
são súbitos. No ECG a inscrição da onda P é quase simultânea ao QRS, podendo preceder, ser coincidente ou apresentar-se imediatamente após o complexo. A onda P é frequentemente retrógrada com apresentação negativa nas derivações inferiores (DII, DIII e aVF). (2,5,7) Na taquicardia de reentrada AV (TRAV) estão descritas duas vias de condução, uma pelo NAV e outra por via acessória. Podem ser classificadas de antidrómicas ou ortodrómicas. A TRAV ortodrómica é a mais frequente (90-95%), e o ECG em repouso destes doentes pode apresentar-se sem evidência de Indice
29
pré-excitação ou pré-excitado durante o RS. É uma taquicardia regular que se apresenta com complexos QRS estreitos e onda P retrógrada, pois o impulso desce pelo NAV e sobe pela via acessória em taquicardia. A TRAV antidrómica também se apresenta de forma regular, com complexos QRS largos semelhantes ao padrão de pré-excitação no ECG em repouso, o que torna difícil a distinção de TV. Existem várias síndromes de pré-excitação, de onde se destaca a mais clássica: Wolff-Parkinson-White (WPW). De salientar que pode existir FA com pré-excitação, situação que merece atenção redobrada pois a condução rápida dos estímulos da FA por via acessória podem degenerar em fibrilhação ventricular (FV). (2,5,7)
Abordagem em Contexto Pré e Intra-Hospitalar AVALIAÇÃO INICIAL A abordagem ABCDE é transversal ao doente com critérios de gravidade, quer em ambiente pré-hospitalar quer à chegada ao SU. De uma forma geral e numa fase inicial deve ser assegurada a via aérea, verificação dos parâmetros vitais e identificação de sinais de instabilidade HD. Entre estes últimos destacam-se alterações do estado de consciência, hipotensão, má perfusão periférica (extremidades frias, tempo de preenchimento capilar prolongado, baixo débito urinário) ou até mesmo edema agudo do pulmão ou choque cardiogénico. A obtenção de um ECG de 12 derivações é essencial para uma abordagem inicial correta, assim como a canalização de 2 acessos periféricos e a realização de análises clínicas num curto espaço de tempo. (8,9) Independentemente do tipo ou das características da taquicardia, um doente que se apresente com taquiarritmia e instabilidade HD deve ser sujeito a cardioversão eléctrica (CVE) sincronizada a RS. Esta abordagem tem indicação classe I nível de evidencia B nas linhas orientadoras. O choque deve ser sincronizado com o complexo QRS, evitando assim o fenómeno R on T que pode precipitar uma FV. Está preconizado que a largura e regularidade do QRS é
Tabela 3 – Cardioversão eléctrica e intensidades recomendadas (2)
30
Indice
importante para a decisão e intensidade do choque, como descrito na tabela 3. (2,5) Diagnóstico Diferencial A duração do complexo QRS e a sua avaliação é fundamental para realizar um diagnóstico diferencial correto. Taquicardias com complexo QRS estreito (≤ 120ms) A presença de QRS estreito indica-nos que existe uma rápida ativação ventricular através do sistema de condução – via His-Purkinje, sugerindo que a arritmia tem origem acima do feixe de His (supraventricular), salvo raras exceções já referidas anteriormente. (1) •
Regularidade do intervalo R-R A regularidade do intervalo R-R é útil e auxilia no diagnóstico diferencial das taquicardias com complexo QRS estreito. A existência de regularidade R-R pode ser indicativa da presença de TS, TA, FLA, TRNAV ou TRAV. Por outro lado, uma TSV irregular é mais a favor de FA, FLA com condução variável ou TA multifocal. (2,5)
•
Avaliação da onda P A presença de ondas P semelhantes ao RS sugere TS apropriada, inapropriada ou TA focal com origem junto ao NS. Ondas P com morfologia diferente do RS, conduzidas com um intervalo PR igual ou superior ao RS e condução ventricular de 1:1, são mais indicativos de TA focal. Um
TEMAS EM REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
ritmo auricular superior ao ventricular é a favor de TA ou FLA, embora o FLA possua as chamadas ondas F com morfologia típica em “dentes de serra” e a TA uma onda P discreta seguida de uma linha isoeléctrica. No FLA é frequente ocorrer condução ventricular com BAV 2:1 com ritmo auricular perto dos 300 bpm e ventricular a rondar os 150 bpm. Um ritmo auricular semelhante ao ventricular será mais a favor de uma taquicardia de reentrada. A presença de ondas P retrógradas, nomeadamente um pseudo r em V1 e pseudo s nas derivações inferiores (ver Figura 2) são a favor de TRNAV ou TRAV ortodrómica, sendo um critério muito especifico (91-100%) mas pouco sensível. (2,7) •
Relação P/QRS Quando é possível identificar ondas P, as TSV podem ser classificadas com intervalo RP curto ou longo. Um intervalo RP curto (RP < PR) define-se como inferior a metade do intervalo R-R. Um intervalo RP < PR com RP < 90ms é mais sugestivo de TRNAV enquanto um RP > 90ms mais a favor de uma TRAV. (2,5)
1. TSV com bloqueio de ramo - O bloqueio de ramo pode já existir ou surgir apenas em taquicardia, chamado de bloqueio em fase 3 (período refratário relativo) que habitualmente surge com morfologia típica de bloqueio de ramo direito (BRD). Pode ocorrer em doentes com TA, FLA, FA, TRNAV ou TRAV. 2. TSV com condução AV por via acessória (pré-excitada) - Ocorre
sobretudo nas TRAV antidrómicas mas também pode estar presente numa TA, FA ou FLA pré-excitado. 3. TV Existem vários critérios eletrocardiográficos importantes para o diagnóstico diferencial da taquicardia com complexos largos (ver Tabela 4 e Figura 3). (1,10–13)
Tabela 4 – Critérios eletrocardiográficos no diagnóstico diferencial das taquicardias de complexos largos. Os critérios descritos são a favor de taquicardia ventricular. É importante realçar que muitos critérios são habitualmente interpretados sob a forma de algoritmos, como os de Brugada ou Vereckei. BRD – bloqueio completo de ramo direito; BRE – bloqueio completo de ramo esquerdo. Vi/Vt – Relação entre a velocidade de ativação inicial e a velocidade de ativação terminal ventricular, medida pela excursão vertical em milivolt. (1,10–13)
Taquicardias com complexo QRS largo (> 120ms) Na presença de uma taquicardia de complexos largos deve ser assumida uma TV até prova em contrário, pois uma abordagem como TSV pode ser prejudicial num doente com TV. No diagnóstico diferencial e na ausência de um ritmo de pacemaker temos que considerar 3 possibilidades: (2,6,10) Figura 3 – Diagnóstico diferencial entre TSV e TV perante uma taquicardia de complexos QRS largos. (10)
Indice
31
A irregularidade numa taquicardia de complexos QRS largos deve fazer pensar em: (2,6,13) 1. TV polimórfica 2. FA pré-excitada 3. FA com bloqueio de ramo
Abordagem na ausência de diagnóstico estabelecido Taquicardias com complexo QRS estreito (≤ 120ms) regulares Em doentes estáveis do ponto de vista HD, a abordagem deve passar por: 1. Manobras vagais (MV) ou massagem do seio carotídeo (MSC) (Recomendação I-B e I-C) A eficácia das MV em terminar uma TSV ronda os 19-54%. O objetivo é estimular os recetores nos seios carotídeos localizados no bulbo (a nível da bifurcação da artéria carótida comum) causando uma estimulação reflexa do nervo vago com consequente libertação de acetilcolina. A manobra de Valsava está indicada como primeira linha em contexto de urgência, realizada de preferência em decúbito e com elevação dos membros inferiores (a manobra poderá ser adaptada com o soprar para uma seringa de 10ml tentando mover o êmbolo). A MSC pode também ser utilizada, feita a nível do limite superior da cartilagem tiroideia com a cervical em extensão e em rotação contralateral, durante 10 segundos. Deve ser feita unilateralmente e evitada em doentes com sopros cervicais, história de acidente vascular cerebral ou doentes idosos com provável patologia aterosclerótica. (2,5,14)
32
Indice
2. Adenosina (Recomendação I-B) A adenosina endovenosa (EV) é o fármaco de primeira escolha no caso das MV não serem eficazes, e sua administração deve ser feita em meio controlado com fácil acesso a fármacos e material de suporte avançado de vida. Atua nos receptores A1 existentes em maior quantidade a nível do NAV e a sua estimulação promove um atraso de condução até ao BAV (diminuição do efeito dromotrópico), com consequente término da taquicardia quando o mecanismo fundamental é a reentrada envolvendo o NAV. Devido ao seu tempo de semi-vida curto (20-30 segundos), a sua utilização deve ser feita em veia proximal e de calibre razoável (fossa antecubital) com posterior elevação do membro. Doses repetitivas e incrementadas com intervalos de 1 minuto devem ser utilizadas, com recomendação inicial de 6mg, seguida de 12mg se não eficaz com dose anterior (6mg - 12mg - 12mg (ou 18mg)). Possui uma taxa de sucesso superior a 90% no término das TSV, nomeadamente na TRNAV, mas com menor eficácia na TA focal e nas taquicardias por macroreentrada. A utilidade da adenosina vai para além do uso terapêutico, sendo também um auxílio no diagnóstico diferencial das TSV (ver Figura 4). De salientar que o uso de adenosina pode precipitar FA por estimulação
das veias pulmonares, além de poder acelerar arritmias pré-excitadas. Dos efeitos secundários mais frequentes destacam-se a dispneia, rubor facial e desconforto torácico, devendo ser usada com cautela nos doentes asmáticos. (2,5,14) 3. Bloqueadores dos canais de Cálcio (BCC) e Beta-Bloqueantes (β-Bloq) (Recomendação IIa-B e IIa-C) Os BCC têm uma taxa de sucesso no término das TSV de 64-98%. Os fármacos mais utilizados são o verapamilo (5-10mg EV em infusão de 2 minutos) e o diltiazem EV (20mg EV em infusão de 2 minutos). Além do risco hipotensivo, devem ser evitados em doentes com insuficiência cardíaca e função ventricular esquerda (VE) reduzida (<40%) ou desconhecida, na suspeita de TV ou FA pré-excitada. Os β-Bloq são mais eficazes na redução da FC que no término da taquicardia. Destacam-se os de curta acção como o esmolol (0,5mg/Kg EV em bólus) ou o metoprolol (2,5mg EV em bólus, máximo de 2,5-15mg). (2,5,7) Taquicardias com complexo QRS estreito (≤ 120ms) irregulares Na grande maioria dos casos o diagnóstico será FA, o que implica uma abordagem diagnóstica e terapêutica dirigida e segundo as linhas orientadoras definidas para
TEMAS EM REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
anticoagulação deve ser sempre ponderada tendo em conta o score de risco trombo-embólico CHA2DS2VASC e a decisão quanto a eventual realização de cardioversão eléctrica ou química. (2,11,15)
Taquicardias com complexo QRS largo (> 120ms) regulares Como dito anteriormente, na presença de uma taquicardia de complexos largos temos que considerar 3 situações: TV, TSV com aberrância ou TSV por via acessória. Nesta situação é essencial solicitar colaboração da cardiologia pois o risco de TV é de 80%, aproximando-se dos 100% em doentes com cardiopatia estrutural. De realçar que a administração de adenosina nestes casos deve ser evitada se existir evidência de pré-excitação no ECG basal, indicando uma possível condução anterógrada por via acessória e risco aumentado de FV. (2,13)
Figura 4 – Resposta à adenosina nas TSV. (2)
Na presença de TV monomórfica mantida e doença estrutural, a CVE eléctrica tem indicação classe I nível de evidência B mesmo em doentes HD estáveis. A utilização de procainamida (50-100mg EV a cada 5min), amiodarona (150mg EV em 10min) ou lidocaína (1,0-1,5mg/Kg EV em bólus) também estão indicados. Devido ao menor potencial pro-arrítmico e inotrópico negativo, a utilização de amiodarona ou lidocaína nos doentes com função VE comprometida será mais indicada.(2,16–18) Figura 5 – Algoritmo de atuação nas taquicardias de complexos QRS estreitos.(2)
este tipo de arritmia. É importante referir que quer a estratégia de controlo de ritmo ou de frequência são válidas, tendo sempre em
consideração a duração da arritmia, a idade, os desencadeantes, as comorbilidades associadas e a estabilidade HD do doente. A Indice
33
TAKE HOME MESSAGES 1. Documentar com ECG de 12 derivações sempre que possível 2. As TSV são habitualmente sintomáticas mas raramente “Life Threatening” 3. Doente com TSV e HD instável – CVE sincronizada 4. Doente com TSV e HD estável MV e Adenosina
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
Rodrigues JCM. Electrocardiografia Clínica. 2a Edição. LIDEL, editor. LIDEL; 2010.
2.
Aepc CC, Diller G, Grace A, Germany KK, David P, United L, et al. 2019 ESC Guidelines for the management of patients with supraventricular tachycardia The Task Force for the management of patients with supraventricu- lar tachycardia of the European Society of Cardiology ( ESC ). Eur. Heart J. 2019;00:1–66.
3.
Linde C, Grazia M, Hrs UB, Ehra ABC, States U, Germany ID, et al. Sex differences in cardiac arrhythmia : a consensus document of the European Heart Rhythm Association , endorsed by the Heart Rhythm Society and Asia Pacific Heart Rhythm Society. Europace. 2018;20.
4.
Chin A, Africa S, Coats A, Kingdom U, France JD. Management of asymptomatic arrhythmias : a European Heart Rhythm Association ( EHRA ) consensus document , endorsed by the Heart Failure Association ( HFA ), Heart Rhythm Society ( HRS ), Asia Pacific Heart Rhythm Society ( APHRS ), Cardiac Arrhythmia Soc. Europace. 2019;0:1–32.
5.
Katritsis DG, Boriani G, Cosio FG, Josephson ME, Keegan R, Hindricks G, et al. European Heart Rhythm Association ( EHRA ) consensus document on the management of supraventricular arrhythmias , endorsed by Heart Rhythm Society ( HRS ), Asia-Pacific Heart Rhythm Society ( APHRS ), and Sociedad ´ n Cardiaca y Latinoamericana de Estimul. Europace. 2017;19:465–511.
6.
Aepc C, Blomstro C, Blom N, Germany MB, Uk JC, Mark P, et al. 2015 ESC
Figura 6 – Algoritmo de atuação nas taquicardias de complexos QRS largos. (2,18)
Taquicardias com complexo QRS largo (> 120ms) irregulares Na maioria dos casos estamos em presença de FA com condução aberrante (bloqueio de ramo prévio ou desencadeado pela taquicardia – bloqueio em fase 3) e nestas situações devemos seguir as linhas orientadoras da abordagem da FA. Numa FA pré-excitada, devemos evitar os bloqueadores do NAV e optarmos pelos antiarrítmicos das classes IA (procainamida), IC (propafenona, flecainida) ou o ibutilide. Na presença de TV polimórfica a utilização de sulfato de magnésio (2g EV em 1-2 minutos) está indicada. Nos últimos 2 casos devemos ponderar CVE numa fase inicial ainda com o doente estável, tendo em conta o risco de evolução para FV. (2,5,13)
34
Indice
CONCLUSÃO A abordagem de um doente com taquicardia passa pela estabilização HD e documentação da arritmia através da obtenção de um ECG de 12 derivações. A avaliação da duração e das características dos complexos QRS são úteis no diagnóstico diferencial de TSV ou TV, com posterior tratamento de acordo com o diagnóstico definido. A utilização das MV e da adenosina nas taquicardias de complexos estreitos são úteis, no sentido em que resolvem o evento arrítmico numa grande percentagem de doentes e ainda auxiliam no diagnóstico diferencial. Quando em presença de taquicardia de complexos largos devemos assumir TV ate que se prove o contrário. Sempre que o doente se apresente HD instável ou se a abordagem inicial num doente estável não for eficaz, devemos optar pela CVE sincronizada.
TEMAS EM REVISÃO | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4 Guidelines for the management of patients with ventricular arrhythmias and the prevention of sudden cardiac death The Task Force for the Management of Patients with Ventricular Arrhythmias and the Prevention of Sudden Cardiac Death of the Europea. Eur. Heart J. 2015;36:2793–867. 7.
Blomström-lundqvist C, Scheinman MM, Aliot EM, Alpert JS, Calkins H, Camm AJ, et al. ACC / AHA / ESC PRACTICE GUIDELINES — FULL TEXT ACC / AHA / ESC Guidelines for the Management of Patients With Supraventricular Arrhythmias * and the European Society of Cardiology Committee for Practice Guidelines ( Writing. Eur. Heart J. 2003;(October).
8.
Donnino M, Navarro K. Suporte Avançado de Vida Cardiovascular. AHA, editor. AHA; 2018.
9.
Baran DA, Co-chair F, Grines CL, Bailey S, Burkhoff FD, Hall SA, et al. SCAI clinical expert consensus statement on the classification of cardiogenic shock This document was endorsed by the American College of Cardiology ( ACC ), the American Heart Association ( AHA ), the Society of Critical Care Medicine ( SCCM ), and the S. Catheter Cardiovasc Interv. 2019;(April):1–9.
10. Sousa PA, Candeias R, Pereira S, Jesus Ì. Taquicardia de QRS largos - a importância eletrocardiográfica no diagnóstico diferencial. Rev. Port. Cardiol. 2014;33(3). 11. Altemose GT, Miller JM. Application of a new algorithm in the differential diagnosis of wide QRS complex tachycardia. Eur. Heart J. 2007;28:589– 600. Dendi R, Josephson ME. A new algorithm in the differential diagnosis of wide complex tachycardia. Eur. Heart J. 2007;453:525–6. 12. Torp C, Ehra P, Hrs GNK, Kalman J, Chairperson A, Germany MB, et al. EHRA / HRS / APHRS expert consensus on ventricular arrhythmias. Europace. 2014;16(May):1257–83. Calkins H. ESC Congress 2019 The 2019 ESC Guidelines for the Management of Patients with Supraventricular Tachycardia ESC Congress 2019 The Great Cardiovascular Quiz. Eur. Heart J. 2019;40:3812–3. 13. Goette A, Auricchio A, Boriani G, Braunschweig F, Terradellas JB, Burri H, et al. EHRA POSITION PAPER EHRA White Paper : knowledge gaps in arrhythmia management — status 2019. Europace. 2019;00:1–28. 14. Kaey G, Lemery R. Cardiac Arrhythmias. 3o Edition. Karger, editor. Karger; 2018. 15. Dan G, Co-chair AM, Agewall S, Boriani G, Borggrefe M, Gaita F, et al. Antiarrhyth-
mic drugs – clinical use and clinical decision making : a consensus document from the European Heart Rhythm Association ( EHRA ) and European Society of Cardiology ( ESC ) Working Group on Cardiovascular Pharmacology , endorsed by the Heart Rhy. Europace. 2018;20:731–2.
16. Stevenson WG, Ackerman MJ, Bryant WJ, Callans DJ, Curtis AB, Deal BJ, et al. AHA / ACC / HRS GUIDELINE 2017 AHA / ACC / HRS Guideline for Management of Patients With Ventricular Arrhythmias and the Prevention of Sudden Cardiac Death. 2018.
Indice
35
36
Indice
RUBRICA PEDIÁTRICA | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
RUBRICA PEDIÁTRICA
CROUP: Estridor laríngeo. Rita Justo Pereira1, Filipa Dias1, Maria João Virtuoso¹
1 Serviço de Pediatria – Centro Hospitalar e Universitário do Algarve - Faro
RESUMO Croup é a designação de laringotraqueíte aguda e consiste na obstrução da via aérea superior, secundária a infecção viral e caracterizada pela presença de estridor inspiratório, tosse rouca e dificuldade respiratória. É uma das principais causas de obstrução das vias aéreas superiores na idade pediátrica, mais frequente entre os 6 meses e os 3 anos de idade, consequência da inflamação e edema da laringe e traqueia. O início abrupto dos sintomas, com agravamento nocturno e a exacerbação por agitação e choro, fazem com que o croup seja motivo frequente de apresentação no Serviço de Urgência Pediátrica. Apesar da adrenalina nebulizada ser eficaz no alívio sintomático imediato, os corticóides são o tratamento base para todos os graus de gravidade da doença. O croup apresenta evolução e prognóstico favoráveis.
ABSTRACT Croup, also known as laryngotracheitis, consists of upper airway obstruction characterized by varying degrees of inspiratory stridor, barking cough and respiratory distress secondary to a viral infection. The airway obstruction is due to inflammation and edema of the larynx and trachea, it is one of the major causes of upper airway obstruction in children between 6 months and 3 years of age. The abrupt onset of symptoms that worsen at night time and the exacerbation by emotional distress make croup a common disease in children who present to the emergency department. Although nebulised epinephrine is effective for immediate relief of symptoms of airway obstruction, corticosteroids are the mainstay treatment for all children with croup symptoms. Most children with croup have a favorable evolution and a good prognosis.
Palavras-Chave: estridor, obstrução via aérea,
Key words: Stridor, airway obstruction, barking
tosse rouca, dificuldade respiratória.
cough, respiratory distress.
INTRODUÇÃO A designação croup vem do verbo em croup em inglês que significa “chorar com voz rouca”, termo usado inicialmente na Escócia e popularizado desde então. Actualmente o termo croup é a designação dada à laringotraqueíte e consiste na inflamação da porção subglótica da laringe que ocorre secundária a infecção viral. É uma doença das vias aéreas superiores, muito frequente na idade pediátrica¹. Caracteriza-se por estridor inspiratório, tosse rouca “tipo latido de cão” e dificuldade respiratória de diferentes graus de gravidade. Nos lactentes e idades mais precoces é mais frequente a apresentação com tosse rouca “tipo latido de cão” enquanto que a rouquidão predomina nas idades mais avançadas. EPIDEMIOLOGIA É das principais causas de obstrução das vias aéreas superiores na idade pediátrica com predomínio nos lactentes com mais de 6 meses até aos 3 anos de idade1-3, com pico de incidência aos 2 anos de idade⁶. No entanto pode ocorrer com menor frequência em lactentes menores de 6 meses, crianças em idade pré-escolar ou adolescentes4-5. A incidência pode atingir 5% ao ano². Habitualmente é autolimitada em crianças imunocompetentes, sendo mais frequentemente observada no sexo masculino (com relação género Indice
37
masculino:feminino de 1,4-1,5:1)1,5. Tem apresentação sazonal, ocorrendo frequentemente no Outono e no Inverno 1,3-5. A maioria dos casos de croup têm apresentação ligeira a moderada, sendo que <1% apresentam sintomas graves de obstrução da via aérea1,3. Até 5% das crianças com manifestações de podem necessitar internamento hospitalar, sendo que a necessidade de entubação é rara, ocorrendo em 1-3% destas1,7,8. O prognóstico é favorável, a maioria das crianças recupera sem intercorrências e a taxa de mortalidade é inferior a 1%, mesmo nos doentes que necessitaram de entubação7,8. ETIOLOGIA Os vírus são a principal etiologia do croup, sendo que a infecção bacteriana pode ocorrer secundariamente. Os vírus parainfluenza são os principais agentes causais, sendo o tipo 1 o mais comum e a maior incidência de casos nos meses de Outono e Inverno coincide com o maior pico de incidência deste vírus9,10. O vírus parainfluenza tipo 2 é responsável por alguns surtos de croup, apresentando regra geral casos mais ligeiros, enquanto que o tipo 3 causa casos esporádicos, de maior gravidade por comparação aos tipos 1 e 2⁹. Outros vírus estão igualmente associados ao croup, como o sincicial respiratório, o influenza A e B, o adenovírus, o rinovírus, o enterovírus e o vírus do sarampo 1,4,5,7,9,10. A etiologia bacteriana é menos frequente e pode ser devida a Mycoplasma pneumoniae, Corynebacterium diphteriae, Staphylococcus aureus, Streptococcus pyogenes e Streptococcus pneumoniae 1,5,11,12, 13.
38
Indice
FISIOPATOLOGIA Os vírus responsáveis pelo croup alojam-se inicialmente no epitélio da mucosa nasal e faríngea, com posterior disseminação e atingimento da laringe e traqueia. A infecção viral leva ao desenvolvimento de inflamação e edema local, com infiltração celular na lâmina própria, submucosa e adventícia11. O ponto crítico ocorre a nível da cartilagem cricóide, pela sua forma de anel cartilagíneo completo, que não possibilita movimentos de expansão, com consequente estreitamento significativo das vias aéreas sempre que a mucosa subglótica fica inflamada. A nível da traqueia, onde os anéis cartilagíneos são incompletos, em forma de ferradura, a obstrução nunca é tão marcada como na laringe⁹. A evolução do processo inflamatório na região subglótica condiciona assim o estreitamento da via aérea, com grau crescente de estridor inspiratório, tosse rouca, agravamento da dificuldade respiratória, com consequente aumento da frequência respiratória e tiragem. Quando o edema atinge as pregas laríngeas ocorre disfunção das cordas vocais e rouquidão9,15. Em casos graves, o diâmetro da via aérea subglótica pode ficar reduzida a 1-2 mm9. Por vezes, para além do edema da mucosa, pode haver deposição de pseudomembranas nas superfícies da traqueia, contribuindo para o agravamento do grau de estenose da via aérea9. APRESENTAÇÃO Geralmente o croup é precedido de um quadro catarral de evolução lenta, com coriza, tosse e picos febris nas primeiras 12 a 72h. De seguida, ocorre a clássica apresentação do
croup com tosse “tipo latido de cão”, rouquidão e estridor inspiratório . O estridor inspiratório torna-se evidente com a progressiva acentuação da obstrução da região subglótica, acompanhado de polipneia, aumento do tempo inspiratório e tiragem. À medida que o quadro obstrutivo evolui a criança fica ansiosa e agitada, o que é acompanhado por aumento do esforço inspiratório, exacerbando ainda mais o processo obstrutivo e a dificuldade respiratória. O estridor bifásico audível em repouso é sinal de obstrução importante da via aérea superior9. A doença é habitualmente autolimitada, com evolução flutuante, com períodos de melhoria durante o dia e agravamento nocturno, com exacerbação com a agitação, com o choro da criança assim como com a posição de decúbito1,6,7,13. A maioria das crianças apresenta melhoria da sintomatologia nas primeiras 48h do quadro mas em 2% das crianças os sintomas podem persistir durante uma semana4,14. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de croup é essencialmente clínico, devendo ser baseado na história clínica e no exame objectivo e raramente é necessária a realização de exames complementares de diagnóstico9. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Quando a apresentação é atípica, prolongada ou em idades fora da faixa etária habitual, é necessário ponderar outros diagnósticos diferenciais assim como investigação adicional. A persistência da sintomatologia associada a febre pode indicar infecção bacteriana secundária4,7.
¹Para melhor caracterização pode aceder aos links: shorturl.at/EFJ68 e shorturl.at/owxJ5
RUBRICA PEDIÁTRICA | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
O diagnóstico diferencial de croup inclui outras causas de estridor laríngeo e dificuldade respiratória, como a laringotraqueíte bacteriana, a epiglotite aguda, a aspiração de corpo estranho, o laringoedema alérgico ou a difteria laríngea (tabela 1)16. De realçar a importância da distinção e identificação de epiglotite pois o tratamento e prognóstico desta doença são substancialmente diferentes, apesar da incidência da doença ter diminuído bastante após a introdução da vacina contra o Haemophilus influenza tipo B. AVALIAÇÃO E EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO Perante a suspeita de croup é imperativo a minimização do desconforto e agitação da criança, reduzindo assim potenciais factores
de exacerbação do quadro. A criança deve permanecer sempre acompahada pelo cuidador, e se necessário ao seu colo. O principal objectivo da abordagem de uma criança com suspeita de croup é a avaliação da permeabilidade da via aérea, com identificação do grau de gravidade de obstrução e potencial risco de rápida progressão para obstrução completa, nomeadamente durante o transporte pré-hospitalar.1,4,7 A avaliação inicial consiste na apreciação do estado geral, presença de estridor em repouso, sinais de dificuldade respiratória, avaliação de sinais vitais, saturação periférica de oxigénio e estado de consciência. O tratamento deve ser iniciado de imediato, de acordo com a gravidade da doença1,6,7, devendo a restante
Tabela 1 - Diagnóstico Diferencial de Croup. Modificado de Bjornson e Johnson16.
Tabela 2 - Gravidade do Croup . Adaptado de Cherry et al 11, Woods 9 e Johnson24.
avaliação clínica ser completada posteriormente quando a criança estiver mais calma e estável. A história clínica deve incluir a descrição do início, duração e características do quadro, sinais e sintomas associados, factores desencadeantes e de agravamento, evolução, antecedentes pessoais e patológicos respiratórios prévios, assim como o estado actual de imunização da criança. No exame físico não devem ser utilizadas espátulas depressoras da língua para avaliar a via aérea, assim como não devem ser realizados procedimentos que possam desencadear agitação na criança7,17. Achados físicos como tiragem intercostal supra-esternal, adejo nasal, estridor em repouso, mau estado geral e cianose/hipóxia são indicadores de gravidade1. Ocasionalmente podem auscultar-se sibilos ligeiros e roncos apesar de não serem habituais1. A presença de fervores, a ausência de tosse rouca “tipo latido de cão”, a idade atípica de apresentação e a baixa resposta a adrenalina nebulizada devem levantar suspeita para outros diagnósticos diferenciais7,18. O Westley Score, de Westley et al19, é um sistema de pontuação amplamente estudado e validado para a avaliação da gravidade da doença20,21, através do uso de cinco factores: estado de consciência, estridor, grau de obstrução da via aérea, cianose e tiragem. No entanto, na prática clínica a gravidade da croup é classificada por um sistema de observação clínica, em grau ligeiro, moderado e grave1,4,5,9,11,22-24 com correspondente correlação com a escala de Westley9,22-24 (Tabela 2). A realização de exames laboratoriais ou de imagem eventualmente
²Exemplo de sinal radiológico no link: shorturl.at/bfCJV
Indice
39
Figura 1 - Algoritmo de tratamento do Croup. Retirado de Protocolos de Urgência em Pediatria12.
necessários devem ser adiados enquanto a criança estiver em esforço respiratório7,18. Geralmente o croup não necessita de confirmação radiológica, mas por vezes estudos de imagem são realizados quando o diagnóstico é incerto ou a apresentação é atípica. A radiografia antero-posterior do pescoço em crianças com croup pode evidenciar um estreitamento subglótico, designado de sinal de torre de campanário (Steeple sign9).² TRATAMENTO O tratamento do croup consiste no uso de corticoterapia e adrenalina, administrados consoante a gravidade da obstrução da via aérea. Os corticóides devem ser utilizados em crianças com croup, independentemente da gravidade. O seu efeito anti-inflamatório contribui para redução do edema das vias aéreas, tem início de acção lenta e semi-vida longa, com melhoria sintomática evidente 6h após a adminis-
40
Indice
tração1,7,25,26. Mostram benefício na redução do número de idas à Urgência, assim como no tempo de permanência e internamento hospitalar1,2,7,25,27. Um estudo de revisão da Cochrane mostrou que o tratamento com corticóide permitiu uma redução nos sistemas de pontuação às 2h, 6h e 12h após a administração26. Os corticóides têm demonstrado serem seguros em crianças com problemas respiratórios agudos28. A dexametasona é o corticóide de eleição, administrada em dose única, preferencialmente via oral, com baixo custo, maior duração de acção, sendo a via intramuscular ou endovenosa alternativas possíveis25. Os estudos não são conclusivos quanto à dose mais adequada no tratamento do croup, não havendo diferenças significativas no uso de doses variáveis de dexametasona (de 0,15 a 0,6mg/kg)2,24. A dose mais frequentemente utilizada é de 0,6mg/kg24,26, com dose máxima de 10 mg. A eficácia da dexametasona
mostrou-se semelhante ou superior quando comparada com outros corticóides27,29. A prednisolona oral é uma alternativa em crianças com croup ligeiro e moderado29, na dose 1mg/kg/dose, máximo de 50mg/ dose12. O budesonido nebulizado demonstrou ter eficácia na redução da gravidade do croup2 e é uma alternativa a considerar, nos casos de vómitos com intolerância oral à dexametasona ou nos casos em que é difícil a canalização de acesso venoso, no entanto não é rotineiramente usado na prática clínica devido ao seu elevado custo. A adrenalina nebulizada é eficaz na redução sintomática nas crianças com croup9,30,31 pela sua acção vasoconstritora arteriolar a nível da mucosa das vias aéreas superiores, reduzindo o edema e a obstrução aérea. É administrada sob a forma de ampola de 1mg/mL a 1:1000, na dose 0,5mL/kg/dose (máximo de 5mL), diluída em 3 mL de soro fisiológico, durante 15 min25. Tem
RUBRICA PEDIÁTRICA | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
início de acção mais precoce e semi-vida mais curta1 que os corticóides; os efeitos secundárias são raros. A adrenalina mostrou ser eficaz na redução da sintomatologia aos 30 min após início de tratamento, com efeito mantido durante 1 hora, no entanto com perda de eficácia às 2 e 6h1,2,25,31. Por este motivo, recomenda-se a vigilância durante pelo menos 2 horas, antes da alta hospitalar. A adrenalina mostrou também ser importante na redução do número de internamentos com entubação ou traqueotomia30. No nosso Serviço de Pediatria utilizamos o Algoritmo de decisão e tratamento, ilustrado na Figura 1. A maioria das crianças que procuram cuidados médicos apresentam doença ligeira, autolimitada e podem ser eficazmente tratados em ambulatório. O uso de adrenalina nebulizada não é imperativo no tratamento do croup ligeiro7,25 e não há evidência científica para o uso de ar humidificado no tratamento de croup 2,32. O tratamento com antipiréticos tem benefício no alívio da febre e do desconforto7,12. O tratamento da doença moderada a grave consiste inicialmente na administração de corticoterapia, que pode ser auxiliada pela administração de adrenalina nebulizada, caso não haja melhoria apenas com corticoterapia. No casos moderados a graves mantem-se a preferência pela dexametasona oral25. Geralmente é objectivada melhoria sintomática nas primeiras 2 a 3 horas após dose única de dexametasona oral7, pelo que frequentemente se recomenda um período de observação de 3 a 4 horas após início de tratamento7,25. Crianças com sintomas mais graves devem ficar internadas, com probabi-
lidade de necessidade de doses adicionais de adrenalina nebulizada (a cada 15-20min)25,12 e oxigenoterapia suplementar se houver hipoxemia. São indicações para internamento hospitalar os casos graves de croup com obstrução marcada da via aérea, com alteração do estado consciência ou estado de insuficiência respiratória iminente; os casos moderados a graves com persistência ou baixa resposta ao tratamento inicial; criança com mau estado geral; necessidade de oxigenoterapia suplementar e crianças com desidratação severa ou doença sugestiva de infecção bacteriana secundária. Outros tratamentos como antibioterapia, broncodilatadores, antitússicos ou descongestionantes não estão indicados no tratamento de croup. O tratamento pré-hospitalar do croup quando a criança é assistida por pessoal treinado, consiste na administração preferencial de corticóide oral33,34, conjuntamente
precoce com possível diminuição da gravidade de doença34. É também importante a educação parental, reforçando a natureza autolimitada da doença, de agravamento nocturno, bem como o benefício de expor a criança sintomática ao ar frio por breves minutos para alívio sintomático temporário, apesar de não haverem estudos que validem esta medida25.
com adrenalina nebulizada nos casos moderados/graves sem resposta aos corticóides33. A administração pré-hospitalar de dexametasona apresenta benefício na melhoria de sintomatologia, na diminuição da necessidade de adrenalina nebulizada no Serviço de Urgência e na redução do número de idas à Urgência33,34. No entanto, segundo estudos, o tempo de permanência no Serviço de Urgência não foi influenciado pela administração pré-hospitalar de corticóides34. Apesar dos benefícios da corticoterapia e das directrizes actuais de tratamento do croup, ainda são poucos os casos tratados com corticóide oral no âmbito pré-hospitalar, o que representa uma oportunidade perdida para tratamento Indice
41
MENSAGENS FINAIS A RETER: ● O croup é uma doença obstrutiva das vias aéreas superiores muito frequente na idade pediátrica, consequente à obstrução inflamatória aguda da laringe e traqueia. ● Caracteriza-se por início súbito de tosse rouca “tipo latido cão”, estridor inspiratório e dificuldade respiratória de diferentes graus de gravidade. ● Na abordagem inicial de uma criança com suspeita de croup é primordial a avaliação da permeabilidade da via aérea e do grau de gravidade da obstrução. Devem ser evitadas medidas que aumentem a ansiedade da criança como a separação dos pais, a observação da orofaringe, o decúbito ou a canalização venosa a não ser que estritamente necessário. ● O tratamento é baseado na gravidade de apresentação da doença. ● A maioria dos casos têm apresentação ligeira e podem ser eficazmente tratados em ambulatório. É fundamental a clarificação e educação dos cuidadores, quanto à natureza autolimitada da doença e à adopção de algumas medidas de alívio sintomático. ● Os casos moderados e graves devem ser tratados sob vigilância médica, com corticoterapia conjuntamente com adrenalina. ● A maioria das crianças pode ter alta hospitalar para o domicílio, depois de um período de observação de cerca de 3-4 horas. ● O prognóstico após o episódio de croup é favorável e a maioria das crianças recuperam sem intercorrências.
42
Indice
TAKE HOME MESSAGES •Croup is an obstructive upper airway disease very common in children, due to acute inflammatory obstruction of the larynx and trachea. • It is characterized by a sudden onset of barking cough, inspiratory stridor and varying degrees of difficulty breathing. • During the initial approach of a child with suspected croup, the evaluation of airway patency and the degree of airway obstruction is paramount. Attitudes that increase child anxiety such as separation from parents, oropharynx observation, supine position, or venous catheterization should be avoided if not strictly necessary. • Treatment is based on the severity of the disease. • Most cases have mild presentation and can be effectively treated out of hospital. Instructing and educating caregivers about the self-limiting nature of the disease and adopting some symptomatic relief measures is critical. • Moderate and severe cases should be treated under medical supervision, with corticotherapy and epinephrin. • Most children can be safely discharged home after an observation period of about 3-4 hours. • The prognosis after a croup episode is favorable and most children recover uneventfully.
BIBLIOGRAFIA 1. Smith KD, McDermott AJ, Sulliven JF. Croupe: diagnostico e tratamento. Postgraduated Medicine.2018.48 (1) 30-35. 2.
Ferreira-Magalhães M, Fernandes M. Cochrane corner: Overview of reviews on the treatment of croup. Acta Pediatr Port 2014;45:168-171
3.
Bjornson CL, Johnson DW. Croup. Lancet 2008;371:329-339. Bjornson CL, Johnson DW. Croup in children. CMAJ 2013;185(15):1317–23. Denny FW, Murphy TF, Clyde WA, et al. Croup: an 11-year study in a pediatric practice. Pediatrics 1983(71):871–6.
4. 5.
6.
7.
Pitrez PM, Pitrez JL. Acute upper respiratory tract infections: outpatient diagnosis and treatment. Jornal Ped. 2003.79:S77-86.
Ortiz-Alvarez O. Acute management of croup in the emergency department. Canadian Paediatric Society, Acute Care Committee. Paediatr Child Health 2017. 22(3):166-169. 8. 8. Hwong K, Hoa M, Coticchia JM. Recorrent croup presentation, diagnosis and management. Am J Otolaryngol.2007; 28 (6):401-407. 9. 9. Woods, CR. Croup: Clinical features, evaluation, and diagnosis. [Online]: 2019 [Available from: https://www.uptodate. com/contents/croup-clinical-features-evaluation-and-diagnosis?search=croup&source=search_result&selectedTitle=2~74&usage_type=default&display_rank=2] 10. 10. Rihkanen H, Rönkkö E, Nieminen T,
RUBRICA PEDIÁTRICA | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
11. 12.
13. 14.
15. 16. 17.
18.
et al. Respiratory viruses in laryngeal croup of young children. J Pediatr 2008;152(5):661–5. 11. Cherry JD. Clinical practice. Croup. N Engl J Med 2008; 358:384. 12. Departamento de Pediatria do Hospital de Santa Maria. Protocolos de Urgência em Pediatria. 4th ed. Lisboa: ACSM ; 2019. 13. Guerrero-Fdez J, Sánchez AC, Manual de Diagnóstico y Terapêutica en Pediatría. 6ª ed. 14. Johnson D, Williamson J. Croup: duration of symptoms and impact on family functioning. PediatrRes 2001;49:83A. 15. Davison FW. Acute obstructive laryngitis in children. Penn Med J 1950; 53:250. 16. Bjornson CL, Johnson DW. Croup in the paediatric emergency department. Paediatr Child Health 2007;12(6):473–7. 17. Toward Optimized Practice (TOP) Working Group for Croup. 2008 January. Diagnosis and management of croup. Edmonton, AB: Toward Optimized Practice. Available from: http://www. topalbertadoctors.org. 18. Provincial Clinical Knowledge Topic. Croup, Pediatric – Emergency and Inpatient V 1.0. Alberta Health Services. 2018.
19. Westley CR, Cotton EK, Brooks JG. Nebulized racemic epinephrine by IPPB for the treatment of croup: a double-blind study. Am J Dis Child 1978;132:484-7. 20. 2Klassen TP, Feldman ME, Watters LK, et al. Nebulized budesonide for children with mild-to-moderate croup. N Engl J Med 1994;331:285–289.
21. Klassen TP, Rowe RC. The croup score as an evaluative instrument in clinical trials. Arch Pediatr Adolesc Med 1995;149:60. 22. Alberta Clinical Practice Guidelines Guideline Working Group. Guidelines for the diagnosis and management of croup. [Available from: https://fliphtml5.com/ efyj/ngfc/basic] 23. Clarke M, Allaire J. An evidence-based approach to the evaluation and treatment of croup in children. Pediatr Emerg Med Pract. 2012;9(9):1. 24. Johnson D. Croup. Clinical Evidence.2014;09:321
29. Parker CM, Cooper MN. Prednisolone Versus Dexamethasone for Croup: a Randomized Controlled Trial. Pediatrics. 2019;144(3) Epub 2019 Aug 15. 30. Bjornson C, Russell KF, Vandermeer B, Durec T, Klassen TP, Johnson DW. Nebulized epinephrine for croup in children. Cochrane Database Syst Rev 2013;10:CD006619. 31. Lee JH, Jung JY, Efficacy of low-dose nebulized epinephrine as treatment for croup: A randomized, placebo-controlled, double-blind trial. Am J Emerg Med. 2019;
25. Woods, CR. Croup: Management of croup. [Online]: 2019 [Available from: https://www.uptodate.com/contents/ management-of-croup?search=croup&source=search_result&selectedTitle=1~74&usage_type=default&display_ rank=1#WhatsNew0]
32. Moore M, Little P. Humidified air inhalation for treating croup. Cochrane Database Syst Rev 2006;(3):CD002870.
26. Russell KF, Liang Y, O’Gorman K, Johnson DW, Klassen TP. Glucocorticoids for croup. Cochrane Database Syst Rev 2011;(1):CD001955. 27. Gates A, Gates M, Vandermeer B, Johnson C, Hartling L, Johnson DW, Klassen TP. Glucocorticoids for croup in children. Cochrane Database Syst Rev. 2018;8:CD001955. Epub 2018 Aug 22.
34. Ali, S., Moodley, A., Bhattacharjee, A., Chang, E., Kabaroff, A., Lobay, K., & Allain, D. (2018). Prehospital dexamethasone administration in children with croup: a medical record review. Open access emergency medicine: OAEM, 10, 141–147.
33. Manual Emergências Pediátricas e Obstétricas. 1ª Edição, 2012, Instituto Nacional de Emergência Médica, INEM.
28. Fernandes RM, Oleszczuk M, Woods CR, Rowe BH, Cates CJ, Hartling L. The Cochrane Library and safety of systemic corticosteroids for acute respiratory conditions in children: an overview of reviews. Evid Based Child Health. 2014;9(3):733-747.
Indice
43
44
Indice
CASO CLÍNICO 1
RESGATE DA VIA AÉREA DIFÍCIL, UM CASO CLÍNICO DE EMERGÊNCIA PRÉ-HOSPITALAR Sérgio Pina1,2, Teresa Salero1,2, Rui Osório1,2
VMER de Faro e Albufeira, Centro Hospitalar Universitário do Algarve - Faro 2 Serviço de Medicina Interna, Hospital de Faro, Centro Hospitalar Universitário do Algarve - Faro
1
RESUMO Apresentamos o caso clínico de uma doente de 45 anos, obesa (IMC 35kg/ m2), hipertensa e diabética que sofreu paragem cardiorrespiratória, provavelmente secundária a episódio de enfarte agudo do miocárdio, com necessidade de manobras de suporte avançado de vida. Apresentava via aérea difícil, pelo pescoço curto, grosso e com baixa mobilidade, distância entre incisivos de cerca de 3
cm e distância tiro-mentoniana inferior a 6 cm. Durante as manobras de ressucitação foi tentada intubação orotraqueal, sem sucesso. Após 1 tentativa falhada foi rapidamente colocada máscara laríngea com adequada ventilação e oxigenação da doente e recuperação da circulação espontânea e posterior transporte para o hospital para intervenção coronária bem-sucedida. A máscara laríngea pode ser utilizada
na emergência pré-hospitalar nos doentes com via aérea difícil após tentativa de intubação orotraqueal de forma a garantir adequada ventilação e oxigenação do doente crítico.
Palavras-Chave: ressuscitação cardio-pulmonar, máscara laríngea, paragem cardio-respiratória, via aérea difícil
Indice
45
CASO CLÍNICO Activação da Viatura Médica de Emergência e Reanimação de Faro e Albufeira (VMER) e da equipa de Suporte Imediato de Vida de Loulé (SIV) para uma mulher de 45 anos, localizada no domicílio, por alteração súbita do estado de consciência testemunhada por familiar com subsequente contacto para o número de emergência médica, pelas 12:15h. À chegada da SIV, pelas 12:25h, a doente estava em paragem cardio-respiratória (PCR) num corredor exíguo que limitava a acção dos operacionais. Foram de imediato e em simultâneo tomadas as medidas de protecção individual, garantidos acessos venoso e iniciadas manobras de suporte avançado de vida (SAV) com adjuvante da vida aérea - tubo orofaríngeo (TOF). Informações relativas às circunstâncias, antecedentes pessoais, alergias, medicação e hora da última refeição foram colhidas com os familiares presentes. A doente tinha viajado de França para Portugal no dia anterior, sendo que a alteração do estado de consciência ocorreu após episódio mal-estar geral e desconforto retroesternal. Tratava-se de uma doente obesa (IMC 35kg/m2), diabética e hipertensa, sem alergias alimentares ou medicamentosas conhecidas, estava medicada com metformina e inibidor da enzima conversora da angiotensina e a última refeição tinha sido ligeira e há 3 horas. À chegada da VMER, pelas 12:30h, a doente estava em decúbito dorsal no chão sob manobras de SAV há cerca de 5 minutos, com dois choques recomendados pelo DAE, aplicados com sucesso. A avaliação primária pela equipa médica objectivou via aérea não segura, permeabilizada
46
Indice
com TOF, sem corpos estranho na cavidade oral, traqueia centrada em posição mediana com ingurgitamento jugular. Sem padrão respiratório autónomo, mas com murmúrio vesicular presente simétrica e bilateralmente na auscultação pulmonar durante as insuflações. Sem sinais de trauma ou evidência de hemorragia externa. Scale Coma Glasgow 3/15, pupilas mióticas, não reactivas, glicémia 98mg/dL. Foram mantidas as manobras de ressuscitação, feita a mudança do DAE para monitor-desfibrilhador com manutenção das pás multifunções já aplicadas. No terceiro ciclo de reanimação foi objectivado ritmo desfibrilhável por fibrilação ventricular com aplicação de novo choque com 360J, administração de 1 mg de adrenalina, 300mg de amiodarona e preparação do material para intubação orotraqueal (IOT) com lâmina curva tipo Macintosh nº4 e tubo orotraqueal de 7 mm (TOT). A doente apresentava distância entre incisivos de cerca de 3 cm, distância tiro-mentoniana inferior a 6 cm e pescoço curto, fixo e dificilmente posicionavel. Foi comunicado à equipa que seria uma via aérea previsivelmente difícil. Foi seguida sequência rápida de intubação. Visualização laringoscópica da abertura glótica grau III pela escala de Cormack e Lehane e posicionamento do tubo orotraqueal com visualização directa sub-óptima. Após procedimento foi rapidamente confirmada má colocação do TOT com exteriorização e recolocação do TOF para manutenção de insuflações durante manobras de ressuscitação. Foi decidido, dado as condições do espaço onde a equipa estava a operar, a gravidade da vítima e as características da via aérea da
doente, por não realizar nova tentativa de IOT. Procedeu-se à colocação de máscara laríngea i-gel (ML) pela técnica habitual depois da aplicação do quarto choque com 360J por persistência do ritmo anterior. Após posicionamento da ML foi mantido suporte avançado de vida com compressões e ventilações ininterruptas. Foi necessário a aplicação de mais dois choques a 360J, 1 mg de adrenalina e 150 mg de amiodarona para retorno da circulação espontânea. Avaliação secundária com via aérea permeabilizada com ML sem resistência ou fuga durante insuflações, auscultação cardíaca arrítmica e hipofonética, auscultação pulmonar com discretos fervores em ambas bases, saturação periférica 98%. Pulso arrítmico, 100 bpm, fino, simétrico. Extremidades frias, marmoreação ao nível do joelhos, tempo de perfusão capilar de cerca de 2 sg. Foi feito electrocardiograma que mostrou supra-desnivelamento de ST nas derivações anteriores V1-V4. Foi contactado o Centro de Orientação de Doentes Urgentes que avisou o Serviço de Urgência do Hospital de Faro do estado pós PCR e enfarte agudo do miocárdio com supra-desnivelamento do segmento ST. O transporte decorreu sem intercorrências com ventilação mecânica controlada e com persistência de SCG 3/15. À chegada à Sala de Reanimação do Hospital de Faro foi posicionado TOT e a doente foi transferida imediatamente para a Sala de Hemodinâmica para intervenção na artéria descendente anterior e ulterior transferência para a Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente onde foi extubada em 24h e transferida para a
CASO CLÍNICO 1 | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
Unidade de Cuidados Intensivos Coronários com SCG 14/15 para continuação de cuidados. DISCUSSÃO A ML é um dispositivo respiratório supra-glótico que pode ser inserido na faringe para permitir ventilação, oxigenação e administração de gases anestésicos, sem a necessidade de intubação orotraqueal. Apesar de inicialmente desenvolvida para a cirurgia electiva foi rapidamente adaptada para a urgência e emergência.1 Independentemente de não permitir cabal protecção contra aspiração e laringoespasmo é uma alternativa preconizada pela Sociedade Americana de Anestesiologia em situações de via aérea difícil de forma a garantir a adequada ventilação e oxigenação do doente crítico2. De facto, após tentativa de intubação
falhada, a ML pode ser utilizada como dispositivo de resgate,2,3 com indicação mesmo no contexto do enfarte agudo do miocárdio.4 A ML pode também ser utilizada como condutor para colocação de TOT, em particular quando laringoscopia directa é impossível.5 CONCLUSÃO Este caso clínico tem como objectivo relevar a importância da ML na emergência pré-hospitalar, sem o acesso aos recursos humanos e técnicos de uma urgência hospitalar, como um dispositivo útil a ser utilizado na via aérea difícil após tentativa falhada de IOT, garantindo adequada ventilação e oxigenação do doente crítico. EDITORA:
BIBLIOGRAFIA 1.
Pollack CV Jr. The laryngeal mask airway: a comprehensive review for the Emergency Physician. J Emerg Med. 2001 Jan. 20(1):53-66
2.
Apfelbaum JL, Hagberg CA, Caplan RA, et al. Practice guidelines for management of the difficult airway: an updated report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Management of the Difficult Airway. Anesthesiology 2013; 118:251.
3.
Shavit I. Laryngeal mask airway as a rescue device for failed endotracheal intubation during scene-to-hospital air transport of combat casualties. Eur J Emerg Med. 2019 Feb. 26 (1):73-74.
4.
ECC Committee; Subcommittees and Task Forces of the American Heart Association. 2005 American Heart Association Guidelines for Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care. Circulation. 2005 Dec 13. 112(24 Suppl):IV1-203.
5.
Modir H, Moshiri E, Malekianzadeh B, Noori G, Mohammadbeigi A. Endotracheal intubation in patients with difficult airway: using laryngeal mask airway with bougie versus video laryngoscopy. Med Gas Res. 2017 Jul-Sep. 7 (3):150-155.
Noélia Alfonso
Médica das VMER de Faro e Albufeira
Indice
47
48
Indice
CASO CLÍNICO 2 | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
CASO CLÍNICO 2
VIA AÉREA NÃO PERMEÁVEL – Uma Emergência Médica Inesperada Ana Rita Parente 1,5, Liliana Ricardo 2,5, Nídia Calado 3,5, Hugo Capote 4,5 1 Médica Interna de Formação Específica em Medicina Interna 2 Enfermeira Especialista em Médico-Cirúrgica – Doente Crítico 3 Médica Assistente Hospitalar em Medicina Interna 4 Médico Assistente Hospitalar Graduado em Cirurgia Geral, Coordenador da VMER Portalegre 5 VMER Portalegre. Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano.
RESUMO: Introdução: O controle imediato da via aérea e sua permeabilidade, em situações de emergência, é crucial para reduzir potenciais danos. O cenário clínico determina a via e o método a serem priorizados para atuar sobre a via aérea. Caso clínico: Os autores reportam o caso de uma mulher com depressão reativa, sob Estazolam, que apresentou alteração súbita do estado de consciência, com ausência total de resposta a estímulos, associada a espasticidade e trismo. Após curarização com Rocurónio, identificou-se angioedema exuberante da língua, revertido com protocolo de reação anafilática. Apesar de edema da glote visível, foi possível entubar a doente sem intercorrências. Conclusão: A curarização e protocolo de analifaxia foram cruciais na abordagem deste caso, com a raridade de sinais apresentados e sem associação aparente entre eles. Cada ativação tem caraterísticas muito particulares, sendo essencial adaptar a conduta de acordo com a situação clínica inicial e eventuais intercorrências que possam ocorrer.
CASO CLÍNICO Mulher de 52 anos com antecedentes pessoais de anemia ferropénica sob suplementação oral e depressão reativa com início recente de Estazolam, inicia quadro de mal-estar e cansaço súbitos com posterior alteração grave do estado de consciência. Filha contata 112, é transferida para linha de Emergência Médica e, após triagem, ocorre ativação de Viatura Médica de Emergência e Reanimação de Portalegre. À chegada da equipa médica, menos de 30 minutos após ativação, a doente encontrava-se já dentro da ambulância. A equipa de técnicos de emergência pré-hospitalar relata doente sem resposta a estímulos (Score S na escala AVDS de alteração do estado de consciência) e com via aérea impossível de permeabilizar por trismo, sem possibilidade de colocação de tubo orofaríngeo. A equipa médica procede à avaliação clínica: doente espástica e com trismo. Enquanto se punciona acesso venoso periférico a abordagem da doente continua, a realçar: cianose central com respiração ruidosa, e score 3 na escala de coma de
Glasgow (ECG), SatO2 87% sob máscara de alto débito, TA 128/72mmHg, FC 80 bpm e electrocardiograma de 12 derivações com ritmo sinusal. Após punção venosa, doente sedoanalgesiada com Fentanil 250mcg e Midazolam 22.5mg sem efeito a nível do trismo ou espasticidade. Tendo em conta a impossibilidade de permeabilizar via aérea, decide-se por curarização da doente com Rocurónio 50mg. Após abertura da boca, ocorre tentativa falhada de introdução de tubo orofaríngeo por angioedema da língua exuberante, que compromete a colocação do primeiro por conflito de espaço. Doente ventilada manualmente com AMBU alcançado SpO2> 90% com 15L/min, apesar de resistência da via aérea, e administrado Adrenalina 0,5 mg IM, Hidrocortisona 200 mg EV e Clemastina 2 mg EV. Após resolução do angioedema, realizada laringoscopia com visualização de edema da glote, e entubação orotraqueal com TOT Nº 7, recorrendo a manobra de Sellick. Colocada posteriormente sonda naso-gástrica, sem drenagem após a
Indice
49
dade de realização de trombectomia mecânica, a qual foi descartada por presença de enfarte extenso instalado. Apesar de gasimetria sem indícios de Tromboembolismo Pulmonar, realizada análise de D-Dímeros com resultado >20ug/mL (referência 0-0,5 ug/mL), que motivou realização de AngioTC Torácica. A mesma documentou tromboembolismo pulmonar (TEP) agudo no tronco principal da artéria pulmonar direita, e em artérias lobares de médio e pequeno calibre bilateralmente. Nas horas posteriores à admissão na Unidade de Cuidados Intensivos, ocorreu degradação clínica da doente, com instabilidade hemodinâmica, e necessidade de instituição de suporte vasopressor.
Figura 1 - Tromboembolismo pulmonar visível pelo defeito de replecção na artéria interlobar direita.
sua colocação. Ambos procedimentos realizados sem trauma da mucosa.
esquerda com pobreza vascular no restante território da ACM ipsilateral.
À admissão na Sala de Emergência (SE) na Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, cerca de 01:30h após a ativação, a doente mantinha-se sedoanalgesiada e curarizada, bem adaptada à ventilação mecânica invasiva (No Air Mix, 11l/ min, FR 16cpm, Pmax 30mbar), e hemodinamicamente estável.
Durante a permanência da doente no Serviço de Radiologia, ocorreu intercorrência de hematemese de 400cc, avaliada por presença de sangue vivo na sonda naso-gástrica, que impediu eventual realização de terapêutica trombolítica. Não foi possível a avaliação da doente pelas especialidades de Gastroenterologia nem Otorrinolaringologia por inexistência das referidas valências neste Hospital. Contatada Neurorradiologia de Intervenção da Urgência Metropolitana de Lisboa para avaliar possibili-
Realizada Angio-TC cranioencefálica 30 minutos após a admissão na SE que relatou: presença de trombo endoluminal no segmento M1 da artéria cerebral média (ACM)
50
Indice
Apesar de todas as medidas implementadas desde o pré-hospitalar, a doente apresentou evolução clínica desfavorável, com ECG 3 sem sedoanalgesia, pupilas arreativas e sem estímulo respiratório nem reflexos centrais. Declarada morte cerebral após negativação de benzodiazepinas séricas, e instauradas medidas de conforto por recusa dos familiares em doação de órgãos. Faleceu 5 dias depois da admissão hospitalar DISCUSSÃO Após a admissão Hospitalar realizou-se a tentativa de apurar a história clínica com os familiares presentes, tendo em conta a raridade dos sinais encontrados na emergência pré-hospitalar, como trismo e angioedema da via aérea. Assim, foi possível descartar a existência de alergias alimentares ou medicamentosas, picada de animais e noção de
CASO CLÍNICO 2 | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
infeção da cavidade oral, além de confirmar-se o plano nacional de vacinação atualizado e a ausência de alterações no ionograma. A introdução recente de Estazolam na terapêutica poderia estar implicada na espasticidade observada, estando descrito este efeito lateral em 1% dos casos. No entanto, não explica os restantes sinais. Excluída também hipótese de Crise Tónica pela não reversão do quadro após administração de Midazolam. A escolha de acesso à via aérea por acesso cervical poderia ter sido considerada, realizando um bypass ao trismo e angioedema da via aérea. No entanto, não foi escolhida pela distância ao hospital superior a 30 minutos, e não oferecer segurança em caso de aspiração de vómito num doente instável com depressão do estado de consciência. A presença de hipercoagulabilidade evidenciada por acidente vascular cerebral isquémico e TEP bilateral foi também alvo de discussão, numa doente sem história conhecida de neoplasia, doença autoimune ou trombofilia. A sua associação com hematemese motivou a necessidade de considerar outros diagnósticos como Coagulação Intravascular Disseminada, a qual foi descartada pela ausência de causa e dados laboratoriais compatíveis. Apesar da rápida e eficaz atuação desde a ativação pré-hospitalar até à execução dos exames de imagem, não foi possível a realização de tratamento dirigido pela instalação de dano cerebral extenso de forma precoce.
Figura 2 - Acidente Vascular Cerebral evidenciado pelo defeito de replecção na artéria cerebral média esquerda.
Assim, tendo em conta a evolução desfavorável da doente, não se progrediu na investigação diagnóstica, o que não permitiu descartar outras causas, como Angioedema adquirido e doenças associadas. CONCLUSÃO A curarização da doente foi um momento crucial e alterou a abordagem do caso, apesar dos achados clínicos encontrados posteriormente. Cada ativação tem caraterísticas muito particulares e o objetivo da equipa médica pré-hospitalar é adaptar a sua conduta mediante a situação clínica inicial e as intercorrências que se possam encontrar. Em muitas situações não é possível obter um diagnóstico no pré-hospitalar, sendo o nosso objetivo manter o doente na melhor condição clínica
possível até à chegada ao Hospital, onde poderá receber cuidados mais diferenciados.
BIBLIOGRÁFIA 1.
Cicardi, M., Suffritti, C., Perego, F., & Caccia, S. (2016). Novelties in the Diagnosis and Treatment of Angioedema. Journal Of Investigational Allergology And Clinical Immunology, (Volume 16), 212-221. Disponível em: http://www. jiaci.org/summary/vol26-issue4num1380
2.
Cook D, Simons DJ. Neuromuscular Blockade. [Updated 2019 Feb 4]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2019 Jan-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm. nih.gov/books/NBK538301/
EDITORA: Noélia Alfonso
Médica das VMER de Faro e Albufeira
Indice
51
52
Indice
MINUTO VMER
MINUTO VMER
LUCAS – Sistema de Compressão Torácica Isabel Rodrigues1
1 Médica da VMER de Faro e Albufeira
INTRODUÇÃO O Sistema de Compressão Torácica, LUCAS, é um dispositivo portátil que, ao realizar compressões torácicas eficazes e contínuas, tem como objetivo, ultrapassar alguns dos problemas/limitações relativamente às compressões torácicas manuais. É uma tecnologia que se tem vindo a desenvolver desde há 15 anos e, que atualmente, culmina num dispositivo de 3ª geração, o LUCAS 3 (figura 1), utilizado por vários meios de emergência pré-hospitalar, como as VMER de Faro e de Albufeira por exemplo. DESENVOLVIMENTO A utilização do LUCAS está prevista em vítimas adultas que se encontrem em paragem cardiorrespiratória (PCR), ou seja, vítimas inconscientes sem pulso e que não respiram espontaneamente. Deve ser utilizado sempre que as compressões torácicas mecânicas sejam benéficas para o doente respeitando as normas locais e internacionais de ressuscitação cardio-pulmonar (RCP).
Figura 1 - LUCAS 3 (Lucas 3 Web training center. Disponível na internet: https://www.lucas-cpr.com/pt/web_training/lucas3/device_orientation/)
Pode ser utilizado em vários cenários, por exemplo, em situações de emergência pré-hospitalar no local da ocorrência ou até durante o transporte das vítimas por meio terrestre e/ou aéreo, nos hospitais como ponte para outro métodos de suporte ventilatório, por exemplo o extracorporeal membrane oxygenation (ECMO), ou, nos laboratórios de hemodinâmica. Nestes, o LUCAS permite a realização de angiografia e de angioplastia em doentes em PCR, uma vez que mantém a circulação destes doentes durante o tratamento emergente. Para além de realizar compressões torácicas contínuas de alta qualidade, a utilização do LUCAS permite, assim,
que mais mãos estejam livres, ou seja, que num cenário de reanimação, os elementos da equipa responsáveis pelas compressões torácicas possam integrar outras actividades essenciais para o sucesso da reanimação. Numa ambulância em movimento as compressões cardíacas mecânicas permitem um suporte hemodinâmico superior, assim como uma perfusão sistémica mais eficiente quando comparadas com as compressões manuais (Figura 2). A utilização do LUCAS torna também mais seguros, para os tripulantes, os transportes de ambulância em que são necessárias compressões torácicas contínuas.
Indice
53
54
Indice
MINUTO VMER
BIBLIOGRAFIA 1.
LUCAS® 3 Sistema de Compressão Torácica – INSTRUÇÕES DE UTILIZAÇÃO 101034-12 Rev A, validação de CO J3118 © 2017 Jolife AB
2.
Site do LUCAS Chest Compression System. Disponível na internet: https:// www.lucas-cpr.com/pt/
3.
Ralph J. Frascone, M.D., F.A.C.E.P..The Risk versus Benefit of LUCAS: Is It Worth It? Editorial Views | April 2014
4.
Aurora Magliocca , Davide Olivari , Daria De Giorgio , Davide Zani , Martina Manfredi , Antonio Boccardo , Alberto Cucino , Giulia Sala , Giovanni Babini , Laura Ruggeri , Deborah Novelli , Markus B Skrifvars , Bjarne Madsen Hardig , Davide Pravettoni , Lidia Staszewsky , Roberto Latini , Angelo Belloli , and Giuseppe Ristagno. LUCAS Versus Manual Chest Compression During Ambulance Transport: A Hemodynamic Study in a Porcine Model of Cardiac Arrest 28 Dec 2018. Disponível na internet: https://doi. org/10.1161/JAHA.118.011189Journal of the American Heart Association. 2019;8:e011189
5.
G Biondi-Zoccai, 1 G Landoni,2 A Zangrillo,2 P Agostoni,3 G Sangiorgi,4 and M G Modena. Use of the LUCAS mechanical chest compression device for percutaneous coronary intervention during cardiac arrest: is it really a game changer?
6.
American Heart Association Guidelines Update for Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care, Circulation 2015; 132; S313-S573
7.
European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015, Resuscitation 2015;95:1-311
8.
International Consensus on Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science with Treatment Recommendations, Resuscitation 2005;67:195
9.
Lucas 3 Web training center. Disponível na internet: https://www.lucas-cpr.com/ pt/web_training/lucas3/device_orientation/
Figura 2 - Compressões mecânicas numa ambulância (Stryker. Disponível na internet: https://www.stryker.com/jo/en/emergency-care.html)
O LUCAS é reconhecido pelas diretrizes American Heart Associatioon (AHA) e European Resuscitation Council (ERC). Os seus principais componentes são: • Uma placa posterior que, posicionada por baixo do paciente, serve de suporte e superfície rígidas para as compressões cardíacas externas. • Uma parte superior que contém a bateria recarregável registada do LUCAS e o mecanismo de compressão/descompressão com a ventosa descartável. • Uma correia de estabilização que ajuda a fixar a posição do dispositivo em relação ao paciente. • Uma mala de transporte. A sua utilização está contraindicada em: • Se não for possível colocar o dispositivo LUCAS de forma segura ou correta sobre o peito do paciente.
com 3 sinais rápidos ao baixar a ventosa e se não for possível entrar no modo PAUSA ou no modo ATIVAR. • Paciente demasiado grande: se não for possível bloquear a parte superior do dispositivo LUCAS na placa posterior sem comprimir o peito do paciente. A utilização do dispositivo LUCAS não está isenta de efeitos secundários, sendo o seu principal efeito secundário a fractura de costelas, um risco que se torna aceitável em relação ao benefício da utilização do dispositivo. Outros possíveis efeitos secundários são escoriações na pele, hematomas e dor no peito. CONCLUSÃO Uma RCP eficaz e ininterrupta melhora a probabilidade de o paciente obter um bom resultado. As compressões cardíacas mecânicas têm qualidade superior quando comparadas às compressões manuais, com um esforço físico inferior das equipas e de segurança superior.
10. Stryker. Disponível na internet: https:// www.stryker.com/jo/en/emergency-care. html
• Paciente demasiado pequeno: se o dispositivo LUCAS emitir um alarme Indice
55
JOURNAL CLUB
Rosário Blanco1
1 Interna de Medicina Interna do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E., Unidade de Faro
INTRODUÇÃO As intervenções sob a via aérea (VA) e a ventilação durante a paragem cardiorrespiratória (PCR) e nos cuidados pós-reanimação seguem uma abordagem progressiva, tendo em conta que as intervenções subsequentes são específicas e dependem de múltiplos fatores, tais como: 1. as características do doente; 2. a fase de reanimação; 3. o treino da equipa. Com o presente artigo os autores propõem-se a rever e comparar as várias opções para assegurar a VA e ventilação durante a PCR extra e intra-hospitalar assim como a sua complexidade. Precisamos de abordar a via aérea, aporte de oxigénio e ventilação durante a reanimação cardiopulmonar? As guidelines são imperativas relativamente ao início de compressões torácicas, de forma a
56
Indice
restabelecer a circulação, e, se apropriado, desfribrilhação precoce, com o intuíto de re-iniciar o batimento cardíaco. Estas medidas são prioritárias em relação à abordagem da VA e ventilação. Esta premissa deve-se ao facto de, em contexto de PCR, existir reserva estimada de oxigénio de cerca de 4 minutos, após os quais se recomenda a sua administração suplementar (excepto se patologias da VA ou respiratória, em que a oxigenação neste caso é recomendada). As compressões torácicas são de fácil aprendizagem e sem necessidade de recursos extra, aumentam a sobrevida em caso de PCR e evita as pausas prolongadas na tentativa duma possível ventilação ineficaz. No entanto, desconhece-se se as compressões torácicas sejam capazes de gerar um volume corrente suficiente durante o tempo da PCR. Passos de abordagem à VA e ventilação durante a PCR e após recuperação de circulação espontânea
Durante a PCR, as intervenções na via aérea variam entre apenas compressões torácicas, com ou sem ventilação boca-a-boca, até à abordagem mais avançada com ventilação orotraqueal. Abordagem básica da via aérea: a) Compressões torácicas e respiração boca-a-boca. b) Ventilação com insuflador manual: trata-se da técnica mais comum. A ventilação deve ser num rácio de 2 insuflações por cada 30 compressões. Recomenda-se a realização de pausas entre as compressões e a ventilação, dado que tem mostrado uma taxa de sobrevida mais alta que com compressões contínuas. Abordagem avançada da via aérea: a) Dispositivos supraglóticos (SGA): o uso destes tem aumentado recentemente pela facilidade da técnica de colocação, e, comparando com a intubação traqueal, menor número
JOURNAL CLUB | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
Figura 1 - Métodos de abordagem da via aérea durante a PCR
de interrupções nas compressões torácicas; está também associada a uma menor incidência de regurgitação gástrica quando comparada com o insuflador manual. b) Intubação traqueal (IT): É considerada a técnica mais complexa e permite compressões contínuas, evita a insuflação gástrica e protege a via aérea da aspirações de conteúdo gástrico, embora não elimine o risco destas complicações ocorrerem antes do procedimento. São recomendadas pausas inferiores a 5 segundos entre as tentativas de intubação orotraqueal. Comparação entre as váris técnicas de abordagem da via aérea durante a PCR São várias as razões que levam a uma difícil comparação entre as diferentes técnicas: utilização de diferentes técnicas na mesma PCR, as condições de abordagem dependem das condições do evento e do próprio doente, não sendo habitualmente reportadas, e a habilidade da técnica determina o sucesso da intervenção. Após a metanálise dos autores, os
dados revelam que uma VA avançada nem sempre apresenta os melhores resultados. Em comparação com a ventilação por máscara não houve aumento da sobrevida aos 28 dias nem redução das complicações neurológicas nos doentes com VA definitva. Na comparação entre SGA e IT os resultados ainda são inconclusivos, visto que alguns estudos revelam superioridade da IT em relação à recuperação neurológica e à taxa de sucesso na primeira tentativa, embora o tempo de interrupção entre compressões continue a ser muito elevado. Os autores do estudo PART (Pragmatic Airway Resuscitation Trial), publicado em Setembro de 2019, que envolveu 3004 doentes com PCR pré-hospitalar, revelaram que a sobrevida às 72h foi superior nos doentes abordados com máscara laríngea comparando com a estratégia inicial de IT. No entanto, os autores referem que necessitam de uma pesquisa mais alargada para confirmar os dados encontrados.
O papel da capnografia A capnografia está recomendada sempre que seja atingida uma VA avançada e permite: 1. confirmação da colocação do tubo endotraqueal; 2. auxilia a optimização da ventilação; 3. auxilia a determinar a qualidade das compressões torácicas; 4. permite identificar a recuperação da circulação espontânea durante a PCR com o aumento do ETCO2; 5. ajuda a determinar quando parar a reanimação (ETCO2 < 10 mmHg após 20 minutos de PCR). Qual a quantidade de O2 suplementar durante a PCR e após recuperação da circulação espontânea? A quantidade ideal é desconhecida, tal como o valor alvo e forma de o determinar. Durante a PCR as guidelines recomendam a adminis-
Indice
57
tração da maior quantidade de O2 suplementar de forma a corrigir a hipoxia celular melhorando, assim, a sobrevida. Após ressuscitação o objectivo deve ser avaliado através da medição da saturação periférica de O2 com objectivos entre 94-98%. Qual a quantidade de ventilação durante a PCR e após recuperação da circulação espontânea? Em contexto de PCR, e, na ausência
58
Indice
de via aérea avançada, as recomendações são de 2 insuflações para 30 compressões, com um tempo inspiratório de 1 segundo com expansão torácica visível. Após estabelecida a VA avançada as compressões devem ser contínuas com uma frequência ventilatória de 10 ciclos/min; o aumento da frequência ventilatória não aumenta o benefício visto que reduz o retorno venoso e a perfusão coronária, aumentando a resistência pulmonar.
Após reanimação as recomendações de ventilação pulmonar são de uma ventilação protectora com volume corrente entre 6-8mL/Kg. As intervenções de ventilação e oxigenação fazem parte de um conjunto de outras medidas, tais como, controlo da temperatura e pressão arterial, controlo da glicémia e crises convulsivas, etc que têm como objectivo melhorar o outcome do doente.
JOURNAL CLUB | SEPARATA CIENTÍFICA n.º 4
CONCLUSÃO A combinação ideal entre as técnicas de oxigenação e ventilação durante a PCR e após recuperação da circulação espontânea ainda não são conhecidas. Na ausência de evidência que sugira uma técnica específica, as equipas deverão usar aquelas em que se tornaram mais proficientes com administração da maior concentração de oxigénio inspirado possível. Deverão manter um racio de 30 compressões para 2 insuflações até à
VA avançada estar estabelecida, aplicando com uma frequência ventilatória de 10 ciclos/min sem interrupção das compressões torácicas. Após ecuperação da circulação a oxigenação e ventilação devem ser optimizadas para atingir valores dentro da normalidade.
2.
European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015
3.
Wang HE, Schmicker RH, Daya MR, et al. Effect of a Strategy of Initial Laryngeal Tube Insertion vs Endotracheal Intubation on 72-Hour Survival in Adults With Out-of-Hospital Cardiac Arrest: A Randomized Clinical Trial. JAMA. 2018;320(8):769–778. doi:10.1001/ jama.2018.7044
Referências bibliográficas: 1.
Christopher Newell, Scott Grier and Jasmeet Soar, Airway and ventilation management during cardiopulmonary resuscitation and after successful resuscitation. Critical Care (2018) 22:190
EDITORA: Ana Rita Clara Médica das VMER de Faro e Albufeira
Indice
59
60
Indice
MITOS URBANOS
MITOS URBANOS
MITOS URBANOS Christian Chauvin1
1 Médico da VMER de Faro e Albufeira
Uma edição dos Mitos Urbanos no meio do inverno que vai falar de água, mar e nadar…? Brrr…que frio só de pensar nesta sensação! Mas, prometo que para quem queira continuar a ler temos algo interessante e surpreendente.
OS MITOS: - Quem sabe nadar não se afoga? Ou seria o contrário, como refere um ditado antigo português?: - Só se afoga quem sabe nadar! Para esta edição dos Mitos urbanos estamos perante o confronto de dois mitos…dois em um! Quem diria… Vamos então tentar perceber um pouco mais sobre este assunto para saber se um destes mitos sairá vitorioso. Faro e Albufeira, as casas das nossas VMER…mas quem ouve os nomes destas duas fantásticas cidades algarvias não quer pensar em emergências, porque para a maioria da população portuguesa são sinónimos de praia, mar, sol e férias de verão. No entanto, aqueles que aqui passam mais do que uns dias, ou vá, uma
quinzena no verão, quer dizer os habitantes permanentes, enfrentam também as outras estações, inclusive o inverno nesta terra antiga dos mouros. Apesar de não ser uma situação muito frequente para as equipas de socorro pré-hospitalar, os acidentes em meios aquáticos provocaram 94 vítimas mortais num período de 10 meses em 2019 , dos quais 34,5% ocorreram em águas fluviais, 25,3% em mar aberto, e 20,7% em poços. (1) E é nesta estação de inverno que estamos confrontados com um sintoma importante e potencialmente perigoso: A HIPOTERMIA Uma das causas mais frequentes deste sintoma é a submersão em águas de temperaturas significativamente mais baixas que a temperatura corporal. Actividades praticadas nos meses de inverno como a pesca comercial e
recreativa, os passeios turísticos de barco, os desportos aquáticos como surf, parapente, motas de água, vela etc., têm uma elevada probabilidade de provocar acidentes com imersão/ submersão acidental prolongada. Apesar da proximidade com o mediterrâneo e um clima habitualmente temperado, as temperaturas da água nos meses de Dezembro até Fevereiro são surpreendentemente baixas. Mas, será que é a hipotermia que provoca situações críticas ou até fatais em acidentes aquáticos? Para o efeito precisamos de saber e compreender melhor, o que acontece quando o corpo humano é exposto a água fria. A reacção fisiológica e psicológica de uma pessoa que cai dentro de água fria, pode ser dividida em quatro fases principais com duração muito diferente de cada uma delas. E, como o caro leitor poderá constatar, tem Indice
61
Fase 3 - Hipotermia (Hypothermia) E agora sim, começa a fase de hipotermia. No entanto, o tempo necessário para o corpo humano entrar em hipotermia é muito superior ao que se possa pensar: dependente da temperatura da água, demora pelo menos uma hora até ao aparecimento de sintomas graves.
(2)
alguns aspectos surpreendentes, cujo conhecimento e compreensão pode ajudar significativamente na gestão e tratamento deste tipo de situação e salvar a própria vida ou de outros. Segundo a literatura atual existem quatro fases críticas da exposição a água fria (3), (4) 1. A resposta ao choque de frio (Cold shock response) 2. Incapacitação ao frio (Cold incapacitation) 3. Hipotermia (Hypothermia) 4. O colapso antes, durante ou depois do processo de salvamento (Circum-rescue collapse). Enquanto os três primeiros pontos estão relacionados com a fisiopatologia, o quarto irá transmitir informação útil e prática para aplicação real. Fase 1 - resposta ao choque de frio (Cold shock response) Ao ficar exposto à água fria, o corpo
62
Indice
humano responde com uma reacção inicial à descida repentina da temperatura na superfície da pele: a inspiração profunda (gasping) seguido por um período de hiperventilação que dura cerca de 60 segundos. Se a cabeça nesta fase fica submergida, o resultado é a aspiração de água com consequências fatais. A utilização de coletes salva-vidas evita com elevada eficácia este tipo de complicação na fase inicial. Fase 2 - Incapacitação ao frio (Cold incapacitation) A fase seguinte está marcada pela vasoconstrição periférica na tentativa do corpo de preservar calor e manter os órgãos nobres a funcionar, e com a consequência do arrefecimento significativo dos membros. Num espaço de 5 a 15 minutos (dependente da temperatura da água) estes deixam de poder fazer movimentos coordenados como nadar ou manter-se acima da água. Mais uma vez, a presença de dispositivos de flutuação é indispensável.
Fase 4 - O colapso antes, durante ou depois do processo de salvamento (Circum-rescue collapse). No momento em que uma vítima de submersão ou pré-afogamento é encontrada e se iniciam as preparações de salvamento existem vários pontos muito importantes para serem considerados para evitar consequências graves associadas as alterações especificas fisiopatológicas de um corpo em hipotermia. Imediatamente antes, durante e depois do salvamento de uma vítima em hipotermia há possibilidade de ocorrer agravamento do estado geral, desde a perda de consciência até paragem cardiorrespiratória, sem causa aparente, em situações que a expectativa seria uma melhoria considerável. Durante o tempo que uma vítima se encontra dentro de água, devido à luta pela sobrevivência e ao stress associado a este processo, há uma libertação importante de hormonas (como a adrenalina, por exemplo) que provocam vasoconstrição periférica e centralização da circulação sanguínea. Os membros assim podem atingir temperaturas significativamente mais baixas. Na iminência do salvamento e com a sensação de já estar seguro sucede um relaxamento generalizado fisiológico e psicológico, e diminuição dos níveis séricos de hormonas de stress. Segue-se vasodilatação
MITOS URBANOS
(3), (traduzido do original em inglês)
periférica repentina que provoca uma descida da tensão arterial acentuada e diminuição da temperatura dos órgãos centrais devido a passagem do sangue pelos membros frios. Este arrefecimento adicional pode provocar a nível neurológico, a diminuição de estado de consciência, e no sistema cardiovascular disritmias malignas e hipovolémia, sendo esta uma fase crucial para atuar com muita atenção e evitar consequências inesperadas. Em conclusão seguem algumas sugestões para optimizar o bem-estar da nossa vítima e assim garantir o sucesso do nosso trabalho. • Manipular e transferir o corpo com cuidado, evitando movimentos rápidos. • Manter a vítima o mais horizontal possível e evitar que ela se levante ou ainda pior, comece a deambular pelos próprios pés. • Iniciar o aquecimento com muito cuidado e subir a temperatura corporal gradualmente. • Efectuar o transporte em marcha lenta para evitar movimentações de massas de sangue com temperaturas diferentes que poderiam causar disritmias e flutuações de tensão
(3)
arterial. Obviamente, estas temáticas relacionadas com o salvamento em meios aquáticos, submersão, e hipotermia, são demasiado complexas para serem tratadas de forma abrangente neste artigo. O objectivo deste artigo foi oferecer alguma informação prática e sucinta que possa ser aplicada no dia-a-dia. Finalmente, teremos que decidir qual dos mitos seria o mais acertado. No contexto de uma submersão em água fria, apesar de ser uma vantagem de saber nadar, há outros factores muito mais importantes que irão decidir a sobrevivência, nomeadamente a presença de um colete de salva-vidas, o conhecimento das reacções fisiológicas do corpo, e evidentemente uma atitude cautelosa e preventiva que evite o acidente em primeira mão. Assim poderia dizer-se que existe um empate entre as duas afirmações: Uma pessoa que não sabe nadar teria mais cuidado na aproximação ao meio aquático e demonstraria um comportamento menos arriscado. Já o nadador proficiente, ainda que
tenha algumas vantagens iniciais, sem colete ou dispositivo flutuante, rapidamente ficaria numa condição precária, devido a incapacitação pelo frio. Bem, chegamos ao fim. Ao querido leitor que chegou até aqui, um sentido agradecimento e o desejo que estas linhas possam contribuir para o bem-estar de quem precisa da nossa ajuda. Referências: 1.
https://www.publico.pt/2019/11/04/ sociedade/noticia/noventa-quatro-pessoas-morreram-afogadas-anopais-1892489
2.
Dados divulgados pela Federação Portuguesa de Nadadores Salvadores (Fepons). https://pt.surf-forecast.com/ breaks/Praia-de-Faro/seatemp
3.
http://www.beyondcoldwaterbootcamp. com/
4.
https://www.experts.com/articles/ immersion-into-cold-water-by-dr-alansteinman
Links úteis: https://www.youtube.com/watch?v=fXqQLZ6wPdk http://www.seagrant.umn.edu/coastal_communities/hypothermia#time
EDITOR: Christian Chauvin
Médico VMER de Faro e Albufeira
Indice
63
O QUE FAZER EM CASO DE...
HIPOTERMIA
Na presente edição da LIFESAVING vamos abordar como deverá agir perante uma pessoa em hipotermia. Quando uma pessoa é exposta a temperaturas baixas o seu corpo começa a perder calor mais rapidamente do que é capaz de o produzir, esta condição pode levar à hipotermia e se não for corrigida pode levar a risco de vida.
André Abílio Rodrigues 1 1 Enfermeiro VMER, SIV
As vítimas podem apresentar tremores, exaustão, confusão, diminuição da sensibilidade nas mãos, perda de memória, desorientação, discurso arrastado, sonolência e nos bebés e crianças apatia, pele vermelha e fria.
INCONSCIENTE
ALGORITMO SBV (Ligar 112)
ASSEGURAR CONDIÇÕES DE SEGURANÇA (Local, Reanimador, Vítima)
CONSCIENTE
AQUEÇA A VÍTIMA... nte frio em que se encontra; 1. Remova a vítima do ambie igo ou sítio quente; 2. Leve a vítima para um abr ou molhadas; 3. Remova roupas húmidas 4. Dê bebidas quentes; 5. Mantenha a vítima seca; o pescoço e a cabeça 6. Cubra a vítima incluindo aco. — utilize cobertor, manta, cas
ATENÇÃO a NUNCA dar bebidas s; vítimas inconsciente
•
NUNCA dê bebidas co cafeína ou álcool.
Ligue 112
•
•
Informe a su pontos de re a localização com ferência; • Respo nda solicitadas; a todas as questões • Siga as instruções d o operador.
m
Referências: 1.
2.
64
Indice
https://www.dgs.pt/saude-ambiental/areas-de-intervencao/frio/ hipotermia.aspx (acedido em 06/01/2020) https://www.sns.gov.pt/ noticias/2019/01/07/proteja-sedo-frio-3/ (acedido em 06/01/2020)
3.
https://www.cdc.gov/disasters/ winter/staysafe/hypothermia.html (acedido em 06/01/2020)
4.
Programa de edição de fotos: Painnt®
FÁRMACO REVISITADO
FÁRMACO REVISITADO
FENILEFRINA
Noelia Carrillo-Alfonso 1
1 Médica Interna de Formação Específica de Anestesiologia, Centro Hospitalar Universitário do Algarve – Unidade de Faro; VMER Faro e Albufeira.
INTRODUÇÃO A Fenilefrina é uma amina sintética que atua predominantemente por efeito direto nos recetores alfa-1-adrenérgicos. Foi patenteada em 1927, tendo sido utilizada desde então pelo seu efeito vasoconstritor e descongestionante nasal. FORMAS DE APRESENTAÇÃO ● Seringa pré-cheia (10 mL): 50 ug/ mL; ● Ampola (1 mL): 10 mg/mL; ● Frasco conta-gotas: 5 mg/mL; ● Spray. FARMACOLOGIA Mecanismo de Ação A Fenilefrina, ou 3-hidroxifeniletilamina, é uma amina não catecolamina sintética por efeito direto. Atua com seletividade nos recetores alfa-1-adrenérgicos. Farmacocinética ● Vias de administração o Endovenosa o Tópica intra-nasal ● Absorção: o Tópica: errática e incompleta ● Início de Ação: o Vasoconstrição por via endovenosa: Imediato o Descongestionante nasal por via tópica: 15 a 30 minutos.
● Duração de Ação: o Vasoconstrição por via endovenosa: 15 a 20 minutos o Descongestionante nasal por via tópica: <= 4 horas. ● Metabolismo hepático pela monoamina oxídase ● Excreção urinária (maioritariamente metabolitos inativos) Farmacodinâmica O seu potente efeito vasoconstritor provoca um aumento da resistência vascular sistémica dose-dependente, causando mais vasoconstrição venosa do que arterial. Assim, aumenta a pressão arterial, por aumento do retorno venoso e volume sistólico. O débito cardíaco mantém-se inalterado por diminuição reflexa da frequência cardíaca, ou pode até diminuir pelo aumento da pós-carga. INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS ● Hipotensão arterial ● Taquicardia supraventricular com repercussão hemodinâmica ● Descongestão nasal Hipotensão arterial: Pode ser utilizada por via endovenosa para tratamento da hipotensão arterial após fluidoterapia adequada. Torna-se especialmente útil em
doentes com fibrilhação auricular com resposta ventricular rápida e estenose aórtica, por não possuir efeitos cronotrópicos positivos. Administrada por via endovenosa pode ser utilizada para tratamento da hipotensão arterial iatrogénica. É o fármaco de escolha para o tratamento da hipotensão materna. Estudos recentes concluíram que a fenilefrina endovenosa é tão eficiente como a efedrina no controlo da pressão arterial sistémica, no entanto, a primeira está associada a uma menor incidência de acidose fetal na artéria umbilical. Taquicardia supraventricular com repercussão hemodinâmica: Os efeitos vagais reflexos podem ser utilizados para diminuir a frequência cardíaca em casos de taquicardias supraventriculares com repercussão hemodinâmica. Descongestão nasal: Por via tópica, a fenilefrina atua como um descongestionante nasal. A vasoconstrição nasal intensa diminui os sintomas de coriza e rinorreia.
Indice
65
POSOLOGIA Tratamento da Hipotensão: ● Dose de bólus por via endovenosa: 50 a 100 microgramas, titulada de acordo com resposta hemodinâmica. Uma dose de bólus não deve ultrapassar os 100 microgramas. ● Perfusão contínua por via endovenosa: Dose inicial de 25 a 50 microgramas/min, e titular de acordo com as resposta hemodinâmica do doente. Tratamento da Taquicardia supraventricular ● A dose máxima a usar deve ser determinada pelo aumento máximo da pressão arterial considerado seguro para o doente. A dose inicial não deve exceder os 500 microgramas por via endovenosa. A dose máxima a utilizar deve ser de 1 mg. Tratamento para descongestão nasal ● Por via tópica, frasco de 5 mg/ml: 3 a 4 gotas em cada narina, em intervalos de 3 a 4 horas PRECAUÇÕES ● A fenilefrina pode induzir redução do débito cardíaco. Assim, deverá ser administrada com precaução nos doentes com ateroesclerose, idosos ou doentes com comprometimento da circulação cerebral. ● Pode precipitar ou exacerbar episódios de angina em doentes com história de doença coronária. ● Está desaconselhada em quadros de insuficiência cardíaca ou choque cardiogénico por induzir aumento da pós-carga. ● Em doentes com função renal comprometida deve ser reduzida a dose.
TRATAMENTO DE OVERDOSE ● A hipertensão provocada por fármacos alfa-agonistas pode não requerer tratamento, já que a sua duração é auto-limitada. Em caso de hipertensão severa, os fármacos de escolha não devem limitar o aumento da contractilidade ou da frequência cardíaca. Nestas circunstâncias, e na ausência de fentolamina, deverão ser considerados fármacos vasodilatadores como o nitroprussiato e a nitroglicerina. ● Uma administração excessiva de fenilefrina tanto por via tópica como endovenosa está associada a manifestações sistémicas de hiperactividade simpática (hipertensão arterial, taquicardia ou bradicardia reflexa). Esta deve ser tratada utilizando bloqueadores dos receptores alfa-adrenérgicos, como a fentolamina, ou, como alternativa agonistas beta não selectivos como o labetalol. Está contra-indicado o uso de antagonistas beta-seletivos pois a sua associação levará a um aumento sinérgico da resistência vascular periférica (pela activação dos receptores beta-2-adrenérgicos) e a uma diminuição abrupta do débito cardíaco (mediada por receptores beta-1-adrenérgicos). CONTRAINDICAÇÕES: ● Hipertensão arterial ou doença arterial periférica devido ao risco de gangrena isquémica; ● Em combinação com inibidores da monoamina oxidase não selectiva (IMAOs), ou até 2 semanas após a sua suspensão, devido ao risco de hipertensão paroxística e hipertermia fatal; ● Hipertiroidismo grave.
TAKE HOME MESSAGES ● Útil no tratamento de hipotensão arterial, por aumentar a resistência vascular periférica sem possuir efeitos cronotópicos positivos. ● Fármaco de escolha na hipotensão materna, por estar associado a uma menor acidose fetal.
BIBLIOGRAFIA 1.
Miller RD, Eriksson LI, Fleisher LA, Wiener-Kronish JP, Cohen NH, Young WL. Miller’s Anesthesia. Elsevier Health Sciences; 2014. https://books.google.pt/ books?id=L2ckBQAAQBAJ&hl=pt-PT&redir_esc=y. Accessed February 12, 2019.
2.
Flood P, Rathmell JP, Shafer S. Stoelting’s Pharmacology & Physiology in Anesthetic Practice. 5th ed. Wolters Kluwer; 2014.
3.
Resumo das características do medicamento, Infarmed, 27/10/2015. http:// app7.infarmed.pt/infomed/download_ ficheiro.php?med_id=587721&tipo_ doc=rcm
Nesta Rubrica, OS EDITORES são: Alírio Gouveia
Médico Anestesiologista do Centro Hospitalar Universario do Algarve.
Catarina Monteiro Médica VMER de Faro e Albufeira
Solange Amaro
Médica VMER do Hospitall Fernando da Fonseca.
66
Indice
EMERGÊNCIA INTERNACIONAL
EMERGÊNCIA INTERNACIONAL
CÓDIGO DE INFARTO Inés Diaz Rodrigo1
1Médica especialista em Medicina Familiar e Comunitária espanhola, 1Mestre em Medicina Pré-Hospitalar Samu 1Médica Especialista em Emergência Médica - Empresa Pública de Emergências Sanitárias 061, do Sistema de Saúde Pública da Andaluzia
Caros leitores, sejam muito bem-vindos à rubrica “Emergência Global”, no artigo desta edição vamos analisar a Via Verde Coronária na região de Andaluzia, mais conhecida localmente por “código de infarto”. Esta área tem evoluído imenso ao longo dos anos para ser o que é hoje, uma ferramenta para salvar vidas. Apaixonámo-nos pela ideia de falar sobre a criação e o desenvolvimento da via verde coronária porque pensámos em Huelva, a terra da Eva Motero, que infelizmente não tem todos os recursos de outras cidades, e, portanto, cada passo a ultrapassar,
cada conquista, por muito pequena que seja implica muito esforço. O “código de infarto” é um exemplo de uma grande conquista e falar sobre isso é falar da história da saúde em Huelva, garantimos uma história digna de cinema onde a protagonista é alguém que pertence à família da emergência pré-hospitalar e na criação desta via verde desde que era ainda um pensamento.
dos são prova disso, é reivindicativa, defensora dos direitos de uma saúde digna e justa para todos, mas acima de tudo uma mulher muito corajosa que fez o seu caminho para que outras tivessem em igualdade com os homens. Sem complexos e sem medo denuncia injustiças dando opções e soluções, um exemplo de proatividade e honestidade que tanta falta nos faz.
A Dra. Inés representa uma ferramenta para salvar vidas por si só, é uma referência na formação e o seu profissionalismo e seus anos dedica-
Inés Diaz Rodrigo é médica especialista em Medicina Familiar e Comunitária espanhola, Mestre em Medicina Pré-Hospitalar Samu, foi Indice
67
professora associada na Universidade de Sevilha e atualmente é Médica Especialista em Emergência Médica na Empresa Pública de Emergências Sanitárias 061, do Sistema de Saúde Pública da Andaluzia, bem como professora no Programa de Rotação de Médicos Internos/Residentes de Medicina Familiar e Comunitária, instrutora de Suporte Avançado de Vida e formadora de formadores, o seu currículo não tem fim e é uma inveja saudável, por isso vamos contar uma história de uma fada madrinha chamada Inés que ajudou a dar a Huelva a ilusão de lutar para que os seus cidadãos tivessem as mesmas oportunidades que os outros. Dra. Eva Motero Na história do “código de infarto” há um antes e depois. Existe um ponto de viragem que foi um verdadeiro avanço, até 2018 em Huelva o serviço de hemodinâmica de Juan Ramón Jiménez só tinha PCI (Angioplastia Primária) de segunda a sexta-feira das 8:00H-15:00H , não estava disponível 24 horas. Este foi o motivo de várias reclamações e denúncias por parte dos profissionais de saúde. Um doente de Huelva não tinha as mesmas oportunidades que um de Sevilha ou Málaga ou outra cidade, porque não podia aceder à terapêutica em tempo útil. Infelizmente, este é um bom exemplo de que os recursos são limitados, e que uma gestão exemplar é essencial para existir justiça, dignidade, equidade e universalidade. Ter acesso a uma PCI até aos 120 minutos após o primeiro contacto médico (PCM) é o principal objetivo. Quando um doente não consegue aceder ao tratamento em tempo útil
68
Indice
é tratado com uma segunda opção: a fibrinólise: administração de um medicamento fibrinolítico no pré-hospitalar pode salvar uma vida num enfarte, mas, embora seja uma comparação odiosa e bruta, é como tratar um tubo entupido com uma vara ou aplicar um líquido desentupidor, pois é óbvio que preferimos o primeiro porque aquele "líquido", que é o fármaco, tem complicações que quando administradas, são muito graves (hemorragia, acidente vascular cerebral hemorrágico, entre outros) 40% de mortalidade e 30% de incapacidade severa. Por tudo isto, lutar para ter uma unidade hemodinâmica de 24 horas foi uma prioridade absoluta dos profissionais de saúde de Huelva, porque isso inevitavelmente tem um preço e chama-se vida. A evidência científica é clara e consensual acerca da atuação no enfarte agudo do miocárdio, a PCI em menos de 120 minuto após o PCM é o tratamento de eleição, sendo que possui uma evidência de classe IB. Perante as evidências científicas, os profissionais de saúde de Huelva não pararam de denunciar e reivindicar para terem uma ferramenta que salvaria muitas vidas e que significava tratar todos os cidadãos de forma equitativa. Em junho de 2018 tivemos, finalmente, a notícia de que a unidade de hemodinâmica de Juan Ramón Jiménez de Huelva disponha de angioplastia primária, 24 horas por dia, 365 dias por ano, o que aumentaria o número de 80 para poder tratar 250 doentes por ano. Foi uma melhoria significativa no "código de infarto", sendo este código uma ferramenta que determina qual é a
melhor estratégia de acordo com as diretrizes clínicas e o estado do doente. Neste contexto, o trabalho de coordenação é essencial entre as equipas pré-hospitalares que irão detetar, alertar e estabilizar o doente; a unidade de hemodinâmica que irá realizar a técnica e unidades de cuidados intensivos na fase aguda e os serviços de cardiologia numa fase posterior. O Plano de Saúde da Junta de Andaluzia publicou este código de enfarte no seu site, que pode ser descarregado gratuitamente, e desenvolve a estratégia a ser seguida perante um doente com enfarte agudo do miocárdio: http://www. sspa.juntadeandalucia.es/servicioandaluzdesalud/publicaciones/listadodeterminado.asp?idp=700 Vejamos quais seriam os passos dados seguindo os princípios gerais do mesmo: a diminuição da morbilidade por enfarte agudo do miocárdio com elevação ST (SCACEST) é condicionada por uma ação coordenada de todos os recursos de saúde. Deve assegurar dois aspetos básicos: o acesso rápido a medidas que diminuam a mortalidade inicial e o acesso rápido a um tratamento adequado de reperfusão (angioplastia), de preferência através da intervenção coronária percutânea primária (ICPp). Ambas as condições são a base das redes de cuidados para o tratamento do enfarte. Estas redes definem o âmbito geográfico, a responsabilidade das entidades participantes, o protocolo de ação e os critérios de qualidade que acompanham os seus resultados.
EMERGÊNCIA INTERNACIONAL
da origem do doente e determinar o acesso telefónico individual de cada centro para a ativação da sala hemodinâmica; III. Divulgação/informação aos cidadãos da implementação de um plano específico. Embora as campanhas de sensibilização em massa não tenham demonstrado uma utilidade sustentável ao longo do tempo, devem ser consideradas ações específicas. De facto, existem programas para a educação da população através de: •Associações de doentes; O tratamento ideal do SCACEST (síndrome coronária aguda com elevação ST) baseia-se num sistema de emergência pré-hospitalar eficiente e numa boa rede de hospitais de diferentes níveis interligados uns aos outros. O planeamento deve destinar-se a garantir a acessibilidade, um tratamento inicial de acordo com as orientações da prática clínica e a melhor opção de reperfusão possível para cada doente, evitando atrasos e etapas intermédias. Em doentes com suspeita de isquemia do miocárdio e elevação do segmento ST ou bloqueio do ramo esquerdo de novo, a terapia de reperfusão deve ser iniciada o mais rapidamente possível, de modo a: I. Devem dar prioridade à derivação direta à sala de hemodinâmica, sem parar nos hospitais sem possibilidade de ICPp ou serviços intra-hospitalares intermédios. II. Face à impossibilidade de derivação direta para o ICPp, a realização de fibrinólise in situ com transferência posterior para um
hospital com disponibilidade de ICP (estratégia fármaco-invasiva). Por esta razão, a acessibilidade e a utilização final da rede de cuidados de saúde são condicionadas por três ações-chave: I. Divulgação do protocolo, incluindo as várias opções que correspondem a cada área geográfica, a todos os níveis de profissionais: emergência pré-hospitalar (DCCU, EE 061 e cuidados de saúde primários) e serviços de urgência hospitalar de centros com e sem ICP. Cada profissional e serviço deve conhecer a sua área de influência, as possibilidades reais de ICPp e/ou a estratégia fármaco-invasiva e como aceder à rede sem demora. Uma única chamada para o 061 deve ativar a rede; II. Divulgação do protocolo a profissionais que compõem os cuidados hospitalares especializados: unidades de hemodinâmica e unidades coronárias e intensivas. Devem saber como funciona a rede dependendo
•Cuidados Primários: Especialmente em doentes com elevado risco cardiovascular; •Programa Coração, disponível no site Salud Responde; •Programas de divulgação do 061; •Colaborações com as Fundações Espanholas (FEC) e Andaluzia (FAC) do Coração, Programa MIMOCARDIO da Sociedade Espanhola de Cardiologia (SEC); •Prestar especial atenção ao SCACEST na mulher através da colaboração com o Instituto da Mulher e associações femininas. Estratégia Nacional de Cardiopatia Isquémica e Projeto Europeu GENCAD (Género no Distúrbio da Artéria Coronária); •Informar os doentes cardíacos de que devem obter o Cartão Cardíaco, disponível no site da Salud Responde. Desta forma, o 061 terá conhecimento do seu histórico médico automaticamente quando eles e elas solicitarem os seus serviços. Indice
69
A decisão relativa à atitude terapêutica ICPp, Fibrinólise (FL) ou não reperfusão, tem em conta: •Se o paciente está dentro da janela terapêutica para a reperfusão: - Menos de 12 horas desde o início dos sintomas; - Mesmo que tenham ultrapassado as 12 horas, existe suspeita clínica de possível ineficiência de reperfusão, tais como persistência da dor, persistência da elevação do segmento ST, dúvidas sobre o momento em que os sintomas começaram, arritmias ou insuficiência cardíaca, entre outros; • Se o doente com SCACEST está dentro da janela terapêutica, os profissionais de saúde que o estão a socorrer ativarão o “Código de Infarto” através de uma única chamada para o Centro de Coordenação 061 (CCU). Posteriormente, a partir do CCU o hospital com disponibilidade de ICPp atribuído será contactado de acordo com a localização do doente. Nesta única chamada, o centro será alertado e a disponibilidade será confirmada para poder realizar um ICPp nos tempos definidos (120 minutos após o PCM). Poderá ser equacionado um atraso da ICPp vs Fibrinólise em alguns casos, em função da gravidade do paciente; • Se o paciente está em choque cardiogénico ou insuficiência cardíaca grave ou se a fibrinólise for contraindicada, a ICPp tem indicação absoluta mesmo que isso resulte num atraso mais longo no tratamento do doente;
70
Indice
A chamada do 061 para a unidade de hemodinâmica, será feita para um número pré-definido em cada hospital, que coordenará todas as ações no hospital (Sala hemodinâmica, Unidade Coronária, UCI, Emergência, etc). Nesta chamada, devem ser fornecidos os seguintes dados: • Idade e sexo. • Derivação eletrocardiográfica que possui elevação do segmento ST; • Situação clínica de instabilidade hemodinâmica, choque ou arritmias; • Contraindicação ou não para fibrinólise; • O tempo decorrido desde o início dos sintomas. • Hora prevista de chegada ao hospital recetor. De acordo com o mapa de Huelva analisamos várias zonas, embora o mesmo ocorre noutras províncias da Andaluzia: 1. Transferir < 60 minutos (Áreas verdes). Envolve considerar uma
transferência direta; 2. Transferir entre 60 e 90 minutos (áreas amarelas). Podem ser transferências mais distantes ou outros centros de emergência pré-hospitalares e, dependendo dos recursos de transporte, encaminhamento de outros hospitais relativamente próximos. É muito difícil a transferência de outros centros de urgência básica e outros hospitais, onde os horários de chegada-saída do doente para centro com ICP são geralmente prolongados (tempo desde que o doente entra na urgência, é diagnosticado, primeiras medidas e pedido de transferência, saída do doente. É um tempo conhecido na literatura como "door in-door out”). Estratégia preferencial da ICPp, considerando pontualmente a fibrinólise devido a limitações de transferência ou atraso adicional na disponibilidade de sala; 3. Transferência > 90 minutos
EMERGÊNCIA INTERNACIONAL
(áreas laranjas). Impossibilidade de derivação real para ICPp, a menos que expressamente indicado (contraindicação à fibrinólise, choque cardiogénico, entre outros). Estratégia fármaco-invasiva. Como podemos ver no mapa ainda há muito a melhorar! Do ponto de vista do tratamento pré-hospitalar, de acordo com a via verde coronária da Andaluzia, baseia-se na seguinte estratégia: 1. Se a opção for ICPp: • Heparina de sódio: 100U/Kg, máximo 5000 UI. • Clopidogrel 600 mg se Prasugrel ou Ticagrelor não estiverem disponíveis. Tanto Prasugrel como Ticagrelor estão contraindicados nas seguintes situações: • Alto risco hemorrágico; • A pessoa já está hipocoagulada; • A utilização de Prasugrel é contraindicada se AVC, incluindo hemorrágico, anterior, ou AIT. Insuficiência hepática grave. Pode ser administrado, embora com precaução em doentes de idade superior a 75 anos ou que pesem menos de 60 quilos; • A utilização do TICAGRELOR é contraindicada se existe hemorragia intracraniana ou deficiência hepática moderada-grave e deve ser utilizado com cuidado em doentes com DPOC e asma grave, bloqueio aurículo-ventricular e disfunção sinusal. • A alteração para Prasugrel ou Ticagrelor após o ICPp, será avaliada em pessoas previamente tratadas com Clopidogrel sem risco elevado de hemorragia e evitar-se-á uma ligação cruzada subsequente entre
Prasugrel e Ticagrelor; 2. Se a opção for Fibrinólise: • Enoxaparina 30 mg IV (não em maiores de75 anos). Continuar com 1 mg/quilo subcutâneo a cada 12 horas até um máximo de 100 mg por dose. Na pessoa que já está hipocoagulada, terá de se individualizar avaliando riscos e possíveis benefícios. • Clopidogrel 300 mg. Se for maior de 75 anos, 75 mg 3. Se a opção for a não reperfusão: a. TICAGRELOR 180 MG. b. No caso de contraindicação a Ticagrelor, ou se a pessoa já estiver a ser tratada com anticoagulantes orais, clopidogrel 300 mg será a alternativa; c. Como anticoagulante, podemos escolher entre Enoxaparina e Fondaparinux com base na disponibilidade. O “código de infarto” é, portanto, uma excelente ferramenta, mas ainda há doentes que não têm acesso e temos de continuar a lutar por eles... Aqui ninguém desiste! Agradecemos imenso à Dra. Inés pela sua colaboração e pela sua dedicação, os doentes deveriam saber que às vezes os anjos se vestem de laranja (ou aqui em Portugal de amarelo e branco!).
Nesta Rubrica, OS EDITORES são: Eva Diaz Motero
Médica das VMER de Faro e Albufeira
Ruben Santos
Enfermeiro das VMER de Faro e Albufeira
Indice
71
72
Indice
LEGISLAÇÃO
LEGISLAÇÃO
ACESSO AO TESTAMENTO VITAL NO PRÉ-HOSPITALAR Ana Agostinho1, Isa Orge2
1 Enfermeira das VMER de Faro e Albufeira, 2Advogada
Em 2012, a Assembleia da República, através da Lei nº 25/2012 de 16 de julho, estabelece o regime das diretivas antecipadas de vontade (DAV) em matéria de cuidados de saúde, designadamente sob a forma de testamento vital, regula a nomeação de procurador de cuidados de saúde e cria o Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV)1. Tendo o RENTEV “como finalidade recepcionar, registar, organizar e manter atualizada, quanto aos cidadãos nacionais, estrangeiros e apátridas residentes em Portugal, a informação e documentação relativas ao documento de diretivas antecipadas de vontade e à procuração de cuidados de saúde”, importava regulamentar a sua organização e funcionamento, o que foi feito pela Portaria n.º 96/2014, de 05 de Maio2. “As diretivas antecipadas de vontade são formalizadas através de documento escrito, assinado presencialmente perante funcionário devidamente habilitado do Registo Nacional do Testamento Vital ou notário” – artigo 3º da referida Lei 1, e embora não tenham que obedecer a um modelo obrigatório e foi aprovado um modelo de utilização facultativa pelo outorgante – Portaria n.º
104/2014 de 15 de maio3. Estas diretivas, “sob a forma de testamento vital, são o documento, unilateral e livremente revogável a qualquer momento pelo próprio, no qual uma pessoa maior de idade e capaz, que não se encontre interdita ou inabilitada por anomalia psíquica, manifesta antecipadamente a sua vontade consciente, livre e esclarecida, no que concerne aos cuidados de saúde que deseja receber, ou não deseja receber, no caso de, por qualquer razão, se encontrar incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente” – artigo 2º da referida Lei. 1 A nossa Lei 1 (artigo 7º) firma um prazo de eficácia para as DAV de cinco anos a contar da data da sua assinatura, sendo sucessivamente renovável mediante declaração de confirmação, mantendo-se contudo em vigor quando se verifique, dentro do prazo dos cinco anos, a incapacidade do outorgante. Mais firma, no seu artigo 6º, que “Se constar do RENTEV um documento de diretivas antecipadas de vontade, ou se este for entregue à equipa responsável pela prestação de cuidados de saúde pelo outorgante
ou pelo procurador de cuidados de saúde, esta deve respeitar o seu conteúdo”, excepcionando-se contudo as situações em que “se comprove que o outorgante não desejaria mantê-las”, em que “se verifique evidente desatualização da vontade do outorgante face ao progresso dos meios terapêuticos, entretanto verificado” e em que “não correspondam às circunstâncias de facto que o outorgante previu no momento da sua assinatura ”. 1 Bem como “ Em caso de urgência ou de perigo imediato para a vida do paciente, a equipa responsável pela prestação de cuidados de saúde não tem o dever de ter em consideração as diretivas antecipadas de vontade, no caso de o acesso às mesmas poder implicar uma demora que agrave, previsivelmente, os riscos para a vida ou a saúde do outorgante.” – n.º 4 do referido artigo 6º” . 1 É neste ponto (caso de urgência ou perigo imediato de vida) que podem surgir algumas questões para as equipas do pré-hospitalar, contudo, dado que as mesmas, pelo actual sistema em uso, não têm acesso imediato à plataforma das DAV, não pode impender sobre estes profis-
Indice
73
sionais de saúde a obrigatoriedade do cumprimento do estabelecido no RENTEV. Importante será também referir que, tendo acesso ao documento não deixa de ser “assegurado aos profissionais de saúde que prestam cuidados de saúde ao outorgante o direito à objeção de consciência quando solicitados para o cumprimento do disposto no documento de diretivas antecipadas de vontade” – artigo 9º da referida Lei 1.
Referências 1.
Lei n.º 25/2012, de 16 de julho (versão actualizada pela Lei n.º 49/2018, de 14/08) - REGIME DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE (DAV) - TESTAMENTO VITAL www.pgdlisboa.pt/leis/ lei_mostra_articulado.php?artigo_ id=1765A0016&nid=1765&tabela=
2.
Portaria n.º 96/2014, de 05 de Maio (versão actualizada pela Portaria n.º 141/2018, de 18/05) - REGULAMENTA A ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DO REGISTO NACIONAL DO TESTAMENTO VITAL (RENTEV) - www.pgdlisboa.pt/leis/ lei_mostra_articulado.php?nid=2094&tabela=leis
3.
Portaria n.º 104/2014 de 15 de maio - MODELO DE DIRETIVA ANTECIPADA DE VONTADE - www.pgdlisboa.pt/leis/lei_ mostra_articulado.php?nid=2475&tabela=leis&ficha=1
Nesta Rubrica, OS EDITORES são: Ana Agostinho
Enfermeira VMER Faro e Albufeira
Isa Orge Advogada
74
Indice
Indice
75
NÓS POR CÁ
ESTATÍSTICA DAS OCORRÊNCIAS EM QUE NÃO HOUVE TRANSPORTE André Abílio Rodrigues 1, Solange Mega2 1 Enfermeiro VMER, SIV ; 2 Enfermeira VMER, SIV
Nesta rúbrica “Nós por cá...", efetuámos a revisão estatística das ocorrências em que não foi realizado o transporte da(s) vítima(s) para a Unidade de saúde, nas Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação (VMER`s) de Faro e Albufeira. Com o objetivo de conhecer melhor a nossa realidade, utilizámos o período compreendido entre 1 de Novembro de 2015 e 30 de Novembro de 2019, para efetuarmos a revisão estatística de modo a responder às seguintes questões: Questão 1: Qual a percentagem das ocorrências de Trauma e Doença Súbita?
Questão 2: Nas ocorrências de trauma, qual a percentagem em que não houve transporte?
Questão 3: Nas ocorrências de doença súbita, qual a percentagem em que não houve transporte?
76
Indice
Neste período de tempo, a VMER de Faro teve 6978 ativações e a VMER de Albufeira 4089 ativações. Podemos verificar que o tipo de ocorrência mais comum para ambas as VMER`s foi a “Doença Súbita”, representando 91% das ocorrências na VMER de Faro e 84% das ocorrências na VMER de Albufeira. Segundo os gráficos expostos, podemos verificar que na VMER de Faro 21% das ocorrências de trauma não foram transportadas para uma Unidade de saúde, e na VMER de Albufeira essa realidade representou 5%. A percentagem das ocorrências de Doença Súbita que não foram transportadas para uma Unidade de saúde, correspondeu a 26% das ocorrências da VMER de Faro e a 22% das ocorrências da VMER de Albufeira.
NÓS POR CÁ
O motivo mais comum para o não transporte para uma Unidade de saúde, nas ocorrências de Trauma, foi a “Morte” para ambas as VMER`S, correspondendo a 74% para a VMER de Faro e 81% para a VMER de Albufeira. O segundo motivo mais comum de não transporte, para a VMER de Faro foram as “Desativações” em 14%, e para a VMER de Albufeira encontraram-se 3 motivos, em igual percentagem (6%): “Chama Falsa”, “Recusa” e “Desativações”.
Questão 4: Qual é o motivo mais comum para o não transporte nas ocorrências de Trauma?
Questão 5: Qual é o motivo mais comum para o não transporte nas ocorrências de Doença Súbita? Por outro lado, no que concerne ao motivo mais comum para o não transporte em contexto de Doença Súbita, a causa principal foi “Morte” em 76% das ocorrências na VMER de Faro, e a “Decisão Médica” em 50% das ocorrências na VMER de Albufeira. Seguiram-se como motivos seguintes, a “Desativação” e “recusa”, em 7% e 6 % respectivamente, para a VMER de Faro, e “Morte” em 40% das ocorrências para a VMER de Albufeira.
“ASSIM, NÓS POR CÁ…!” •
Podemos então concluir que, no período de estudo considerado, o tipo de ocorrência mais comum para ambas as VMER`s foi a Doença Súbita, com 91% para a VMER de Faro e 84% para a VMER de Albufeira.
•
No que respeita à percentagem de ocorrências de Trauma em que não ocorreu transporte para uma Unidade de saúde, verificámos que correspondeu a 21% na VMER de Faro, e a Morte foi o motivo mais comum (em 74%). Por outro lado, a percentagem de não transporte em contexto de trauma para a VMER de Albufeira foi de 5%, e também a “Morte” foi o principal motivo, em 81% das ocorrências .
•
Quanto à percentagem de ocorrências não transportadas para uma Unidade de saúde em contexto de Doença Súbita, representou 26% para a VMER de Faro, sendo a “Morte” o motivo mais comum, com 76% destas ocorrências. No que concerne à VMER de Albufeira, não ocorreu transporte em 22% das ocorrências de Doença Súbita, e o principal motivo do não transporte foi a “Decisão Médica”, em 50% das ocorrências. EDITORA: Alírio Gouveia
Enfermeira VMER, HELI
Indice
77
NÓS POR CÁ
ERASMUS MUNDUS MASTER COURSE IN EMERGENCY AND CRITICAL CARE NURSING Ana Agostinho1
1 Enfermeira VMER de Faro e Albufeira
Nos meses de Outubro e Novembro de 2019 teve a equipa da VMER de Faro a oportunidade de colaborar com a Universidade do Algarve, Escola Superior de Saúde no Erasmus Mundus Master Course. O Erasmus Mundus Joint Master Degree in Emergency and Critical Care Nursing é oferecido através de um consórcio entre a Universidade de Oviedo (Espanha), a Universidade do Algarve e o Instituto Politécnico de Santarém (Portugal) e a Universidade de Napier (Reino Unido)1 .
No decurso deste Mestrado foi solicitada a colaboração da VMER de Faro, no sentido de proporcionar estágios de observação a 3 alunos do Curso. Assim, cada um dos 3 estudantes efetuou 8 turnos de 8 horas cada um, onde tiveram oportunidade de acompanhar os diversos tipos de ativações que ocorreram. No período de 14 a 25 de Outubro esteve connosco um estudante do Gana, de 28 de Outubro a 8 de Novembro esteve o estudante Tolasa Takele, da Etiópia e para finalizar, de
11 a 22 de Novembro estagiou a estudante Catherine Kiyu, do Gana. Foi uma experiência que se mostrou enriquecedora para todos, equipa de VMER e alunos em causa, pela partilha que foi possível efetuar. Da avaliação informal efetuada no final do estágio resultou a disponibilidade da equipa da VMER para colaborar no futuro e a demonstração de interesse por parte da Professora Orientadora em manter este campo de estágio.
Grata pela oportunidade Professora Filomena Matos!!!
1
78
Indice
https://www.ualg.pt/pt/curso/1705
NÓS POR CÁ
NÓS POR CÁ
EXERCÍCIO LIVEX – Aeroporto Internacional de Faro Noelia Carrillo-Alfonso1
1 Interna de Formação Específica de Anestesiologia, Centro Hospitalar Universitário do Algarve – Faro; VMER Faro e Albufeira. Médica Reguladora CODU.
No passado dia 26 de Novembro de 2019 decorreu no Aeroporto Internacional de Faro o Exercício LIVEX. Este possibilitou o treino das Equipas de Emergência Pré-Hospitalar na abordagem em situações multivítimas, integrado num dispositivo de resposta a situações de exceção. O exercício teve por base o sequestro de um avião comercial durante voo internacional, aterrando de emergência na pista do Aeroporto Internacional de Faro. Após negociação com o possível sequestrador, seria accionada uma bomba dentro da aeronave com explosão e incêndio da mesma. Antes do início do exercício foi realizado um briefing com as equipas na Delegação Regional do Sul do INEM – Algarve, com planificação e distribuição das mesmas no terreno. Integrei como médica a equipa da VMER Albufeira juntamente com o Enfermeiro Álvaro Junior. Após activação desta VMER pelo CODU, dirigimo-nos ao local do incidente, onde aguardamos inicialmente na Zona de Concentração e Reserva com as outras equipas de emergência pré-hospitalar. Aqui, tal como numa situação real, aguardamos autorização para acesso ao Aeroporto, tendo sido encaminhados posteriormente para o incidente. Chegando ao teatro de operações integramos uma
das equipas do Posto de Emergência Avançado (PMA). Após triagem primária realizada por Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar, ficamos encarregues da observação, triagem secundária e avaliação das vítimas de maior gravidade (Triadas como P1). Ao contrário de uma situação normal de emergência, os doentes eram discutidos posteriormente com o Médico Líder do PMA. Este decidia a prioridade e evacuação dos mesmos de acordo com as vagas disponíveis nas unidades hospitalares e disponibilidade de equipas para o transporte. As situações multivítimas na vida real são incomuns. Assim, raramente as equipas de emergência pré-hospitalar estão em contacto com situações nos quais existem mais vítimas do que meios. Os exercícios de simulacro em ambiente controlado tornam-se uma ferramenta valiosa para o treino e actualização das equipas. Assim, consegue-se garantir que em
situação real existe segurança e eficácia das equipas na prestação de cuidados aos doentes. Pessoalmente, a participação neste evento superou as minhas expectativas. Senti-me parte de um puzzle composto por equipas com formações diferentes, com o mesmo objectivo em comum. Senti na primeira pessoa várias das dificuldades presentes neste tipo de situações de exceção (falta de espaço para avaliar doentes, necessidade da articulação para evacuação dos mesmos), mas também o impacto que uma boa liderança possui nas equipas. Foi sem dúvida uma experiência a repetir e que considero excelente para todos os profissionais da área da emergência pré-hospitalar.
Indice
79
80
Fotografia_Pedro Rodrigues Silva
Indice
“CUIDAR DE NÓS”
“CUIDAR DE NÓS”
REFLEXÃO SOBRE O RISCO BIOLÓGICO NO SOCORRO PRÉ-HOSPITALAR Frederico Magalhães1, Celso Mendes2
1Enfermeiro VMER de Albufeira, 2Técnico Superior de Segurança no Trabalho
A saúde ocupacional pelo seu cariz multiprofissional enceta três áreas de atuação: a saúde centrada no trabalhador; a higiene do trabalho que tem como foco de ação o ambiente de trabalho, e a segurança no trabalho, minimizando os riscos e promovendo a qualidade de vida do profissional. No âmbito da saúde ocupacional, os riscos biológicos integram um grupo tradicional de fatores de risco, em conjunto com os riscos de natureza física e química, e estão associados aos componentes materiais do trabalho, às tarefas desenvolvidas e dependem do ambiente de trabalho (Viana, 2010). No entanto, os operacionais de proteção e socorro estão expostos a doenças transmissíveis durante o tratamento e transporte de doentes emergentes e/ ou vítimas de acidentes ou doença súbita em tarefas de urgência pré-hospitalar (Amaro, 2012), resultantes de aspetos relacionados com a biossegurança. Os riscos biológicos associados às tarefas de emergência médica e pré-hospitalar, encontram-se entre os fatores de risco profissional, mais recorrentemente referenciados neste âmbito (Santos & Almeida, 2016;
NIOSH, 2018). De um modo geral, não existem estudos efetivos sobre a dimensão da problemática associada aos riscos biológicos ou à exposição ocupacional a estes agentes por parte das equipas de emergência pré-hospitalar, que tenha sido possível evidenciar no nosso País. A preocupação com a segurança neste domínio refere-se maioritariamente aos ambientes intra-hospitalares, conforme evidenciado em artigos relacionados com pesquisas qualitativas, do tipo revisão integrativa da literatura (Cyrino et al., 2019; Gomes et al., 2018; Santos & Almeida, 2016). No entanto, (Cyrino et al., 2019) refere que os riscos ocupacionais em ambiente extra-hospitalar, envolvem acidentes resultantes do contato com secreção gástrica, sangue e líquido pleural, sendo que a negligência da própria equipa na realização de algumas intervenções durante a marcha de emergência e o não uso dos equipamentos de proteção individual foram apontados como os principais motivos dessas ocorrências. Vários estudos confirmam que as principais formas de exposição ao material biológico são a parentérica ou percutânea, provocada por
objetos perfurantes e/ou cortantes, como as que ocorrem com agulhas, tesouras, e outros instrumentos (Cyrino et al., 2019; Gomes et al., 2018; Silva, 2008; Silva et al., s.d.). Relativamente ao serviço que prestamos diariamente numa Viatura Médica de Emergência e Reanimação o risco biológico/infecioso é uma constante diária, tendo em conta que muitas vezes socorremos vítimas que poderão estar infetadas com diferentes estirpes de microrganismos, assim como a execução dos diversos procedimentos invasivos a que as vítimas são submetidas. Neste sentido, os operacionais devem cumprir com as condições básicas de segurança e adotar um comportamento que tenha como precaução fundamental a sua saúde e segurança individual, através de medidas de prevenção na assistência a toda e qualquer vítima, independentemente da suspeita do risco de infeções (Silva et al., s.d.). Estes profissionais devem proceder a uma adequada gestão do risco, considerando a sua segurança em primeiro lugar, no decurso do trabalho de assistência à vítima, tendo sempre presente quais são os principais riscos profissionais a que Indice
81
se expõem. A exposição ao risco presente pode ser igualmente minimizada, cumprindo com pelo menos três das condições básicas do chamado triângulo de segurança: Boa condição física e psíquica, conhecimento e treino (formação atualizada sobre as recentes medidas e protocolos de atuação em segurança), vestuário e equipamento de proteção individual (Amaro, 2012). A utilização de barreiras de proteção através de equipamentos como luvas, óculos e máscaras de proteção consideram-se obrigatórios, face ao risco existente, e a disponibilidade destes equipamentos deve ser verificada diariamente, tal como se faz com as condições de funcionamento dos materiais de trabalho. Os profissionais de saúde (e trabalhadores associados ao socorro), em termos genéricos, não se apercebem da importância ou intensidade de alguns riscos e menosprezam o cumprimento de algumas da medidas de proteção coletiva e/ou individual (Santos & Almeida, 2016), verificando-se mesmo uma adesão insatisfatória aos EPI (Silva et al, s.d.).
Por outro lado, a ocorrência de acidentes ou incidentes, potencialmente relevantes são subvalorizados, não se procedendo à comunicação e registos dos mesmos. A adoção de comportamentos seguros, em emergência pré-hospitalar, quanto à exposição a agentes biológicos, à semelhança de outros riscos, merece a necessária atenção e implica uma atitude por parte do operacional, que conduza a uma cultura de segurança e que não o coloque em risco desnecessariamente. As causas dos acidentes de serviço são sempre de tipo natural, não misteriosas ou sobrenaturais, e ainda que por vezes seja difícil encontrá-las, não devemos deitar a culpa “à pouca sorte” ou resignarmo-nos, pois dessa maneira não é possível prevenir o seu reaparecimento nem que se dê lugar a novos acidentes.
Sílvia Labiza
Enfermeira da VMER Albufeira
Indice
1.
Amaro, A., 2012, O Socorro em Portugal. Instituto de Direito Público, Lisboa. 483 pp.
2.
Cyrino CMS, Almeida PMV de, Dell’Acqua MCQ, Deodato S, Michelin NS, Castro MCN e. (2019) Pré-hospitalar móvel em Portugal e Brasil: revisão integrativa. Cogitare enferm. [Internet]. 2019 [Obtido a 22/01/2020]; 24. Disponível em: http:// dx.doi.org/10.5380/ce.v24i0.61194
3.
Gomes, V., Faria, M., da Silva, D., Gallasch, C., Junior, E., Daher, D. (2018). Panorama das Publicações Nacionais Sobre Acidentes com Perfurocortantes Associado a Exposição a Material Biológico, Revista Enfermagem atual, 2018, 86, edição especial.
4.
National Institute for Occupational Safety and Health – NIOSH (2018) – web page - Emergency Responders. Disponível em https://www.cdc.gov/niosh/topics/ emres/responders.html [obtido a 22/01/2020]
5.
Santos, M, Almeida, A., 2016, Profissionais de Saúde: principais Riscos e Fatores de Risco, eventuais Doenças Profissionais e Medidas de Proteção recomendadas. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line.2016, volume 2, s28-s52. DOI:10.31252/RPSO.26.10.2016. Disponível em: http://www.rpso.pt/ profissionais-de-saude-principais-riscos-e-factores-de-risco-eventuais-doencas-profissionais-e-medidas-de-protecao-recomendadas/ [obtido a 22/01/2020]
6.
Silva, L., 2008, Riscos Ocupacionais e Qualidade de Vida no Trabalho em Profissionais de Saúde, Dissertação de Mestrado em Comunicação em Saúde, Universidade Aberta, Lisboa;
7.
Silva, E., Bezerra, M., Cruz, R. (?). Segurança no trabalho: uso dos equipamentos de proteção individual pela equipe de enfermagem. Disponível em: http://www.estudosdotrabalho.org/ texto/gt6/seguranca.pdf [obtido a 22/01/2020]
8.
Viana, R. (2010). Manual de Segurança e Boas Práticas para os profissionais da emergência Pré-hospitalar. Disponível em: https://www.calameo.com/ books/001457331f60ca478957f [obtido a 22/01/2020]
OS ACIDENTES TÊM CAUSAS NATURAIS E SÃO EXPLICÁVEIS, E VOLTARÃO A ACONTECER SE NÃO DESCOBRIRMOS OU CONTROLARMOS AS SUAS CAUSAS.
EDITORA:
82
REFERÊNCIAS:
“UM PEDACINHO DE NÓS”
“UM PEDACINHO DE NÓS”
UM PEDACINHO DE NÓS Ana Rodrigues1, Teresa Castro 2
1Enfermeira das VMER de Faro e Albufeira, 2Enfermeira da VMER de Albufeira
Sendo esta uma viatura tripulada por pessoas dos vários continentes, como já todos sabem, é por vezes difícil encontrar um nativo das terras Algarvia, mas com esforço e dedicação lá conseguimos. Natural de Ol hão, cidade cubista . Nasceu em casa, em frente ao mercado por cima do café “sete estrelas”, que ainda existe, porque como diz, na altura não havia dessas modernices de nascer no Hospital . Filho de pai guarda fiscal e mãe doméstica. Tem uma irmã mais nova. Iniciou o seu percurso académico em
Olhão , onde ficou até ao sétimo ano, passando depois para Faro , onde fez o liceu, o Bacharelato e a Licenciatura em enfermagem. Nunca saiu do Algarve e não o pretende fazer, adora a sua terra e é aqui que se sente bem. Terminado o Bacharelato em janeiro de 1991, e iniciou funções no Hospital Distrital de Faro, no Serviço de Medicina, onde ficou até final de agosto do mesmo ano. Com a namorada dos bancos da escola no mesmo Serviço , rapidamente lhes foi proposta a transferên-
cia, visto não ser permitido na altura trabalhar em os dois no mesmo local. Mudou ele para o Serviço de Urgência, onde se mantém até a data. Casado desde setembro de 1991, tem dois filhos já adultos, que após uma breve incursão pela capital para estudar, regressaram também à terra natal. Durante o período de tropa esteve colocado no Posto de Socorros e o trabalho desenvolvido fê-lo decidir-se pela profissão. A VMER surge um pouco por arrasto, foi fazer o curso porque o incentivaram. Quem o fez Indice
83
tinha razão pois mantem-se até hoje.
Partilha uma que nunca esquecerá
Como bom Algarvio, a sua comida preferida é peixe, adora uma boa grelhada de peixe. Todos os anos em julho faz uma sardinhada na sua casa para todos os funcionários da Urgência.
”…manhã de 25 de dezembro, 12.30h, toca o radio, saída… Toca o telemóvel, descrevem motivo de chamada… uma família não abre a porta, temos de arrombar, precisamos da VMER, está lá a polícia e os bombeiros. Chegamos ao local, os bombeiros arrombaram a porta e á entrada verificamos que no meio de uma sala grande estava um braseiro com mais ou menos um metro de diâmetro e à sua volta encontravam-se o pai, a mãe, o avô e uma criança de 16 anos inconscientes . Sala fechada sem saída de fumo. Verificámos depois que estavam todos mortos. Continuámos a busca e ouvimos um gemido vindo de um dos quartos ao fundo da casa, com a porta semiaberta e uma pequena janela. Nela estavam duas meninas com 5 e 7 anos, com alteração do estado de consciência. Rapidamente avaliámos e estabilizámos as crianças, que recuperaram a
Gere o stress próprio da profissão com passeios de bicicleta e cultivo de suculentas. A entrada da sua casa é um mar de vasos dessas flores, lindíssimas. Com a bicicleta já percorreu vários trilhos da Europa e Portugal. Entre eles a Estrada Nacional 2 de Faro a Chaves , três trilhos dos caminhos de Santiago, as ilhas Menorca e Maiorca, Tenerife e Sardenha. Estes passeios começaram com uma ida à Escócia, em grupo, e tornaram-se anuais, sempre no mês de outubro. Tem muitas histórias para partilhar, muitos quilómetros percorridos, muitas situações a recordar.
84
Indice
consciência e foram transportadas para o Serviço de Pediatria do CHUA.” Histórias divertidas são muitas, recorda uma em particular. ”Regressando de uma ocorrência em que não fizeram acompanhamento da vítima, uma senhora muita aflita na berma da estrada pede para pararem, e qual o motivo? Perguntar à equipa se no meio do equipamento não têm uma bomba para encher o pneu do carro que tem um furo. Responderam que não tinham esse material e que se pretendia esse serviço teria de pedir outro tipo de apoio.” No futuro pretende viajar, mas sempre muito perto, para poder voltar quando estiver farto. E andar de bicicleta enquanto tiver forças para isso. O nosso operacional é: António Argel
Enfermeiro das VMER de Faro e Albufeira
TERTÚLIA VMERISTA
TERTÚLIA VMERISTA
"INTRODUÇÃO DE NOVOS FÁRMACOS VERSUS GESTÃO DE ESPAÇO NA MALA?"
ria mais “Acho que se uma revisão te interessan , com dos fármacos alguns de o çã ui substit por os ad menos utiliz e, gerindo os ac rm fá s novo ços da assim, os espa carga.” ues
Isabel Rodrig
novos fármac os e, gerindo assim, os espa ços da carga.” Isabel Rodrig
ues
“Para termos novos! Deveríamos retirar alguns. Há cl aramente fármacos qu e ainda estã o na mala que já não deveríamos ter….”
nteiro
o Vasco M
novos ução de “A Introd uma necessidade é da fármacos alização la a actu idelines. u que reve g s va o as n equi-pa n to na rua merece en O tratam pre algum anje sem que se arr ara levar as op a es-pacinh ue possam fazer q , va ti a novidades n er . Em alt diferença acos desactualrm s alguns fá removido dem ser izados po ovos espaços.“ n r para cria
Vasco Monte
iro
a Pedro Silv
“A gestã o da mala do espaço/p es é algo nos de que tod o ba o que os temos, mas a s novos fá cho tem de r forçosa macos m entrar na mala ente . Em sentido c calhar ontrário, se alg dade d uma quanties seringa oros/agulha s/ s/comp r de ser criterio essas têm sa enume radas.” mente Pedro M
iguel S
ilva
as.”
erad
enum
iguel
oM Pedr
Silva
EDITOR:
mpre ste se acos i x e e fárm so qu “Pen a novos que com o r ç o a esp la, até p o alguns p a m m e t a e n o sar d bsoletos s a p o o e e s m ed torna ecessidad á h n com a! Assim .” m ! r o o ç f re pa re es semp Clara Rita Ana
Nuno Ribeiro
Enfermeiro VMER
Indice
85
86
Indice
VOZES DA EMERGÊNCIA
Vozes da emergência
ENTREVISTA “A rubrica “vozes da emergência” surgiu com o fundamento de dar voz aos diversos profissionais da emergência, dando a conhecer aos leitores os bastidores do seu trabalho, e também as realidades que contadas na primeira pessoa, também nos são transversais, e de um modo ou de outro nos tocam. O nosso objetivo principal é dar a conhecer equipas, profissionais, realidades, situações, emoções, sentimentos… toda uma panóplia de coisas que estão inerentes a tudo o que fazemos diariamente… Sendo que , no final, o objetivo comum é o cuidar da pessoa doente, dotados dos melhores conhecimentos, equipamentos e sentimentos. Nesta rubrica pretendemos chegar aos vossos corações através da partilha de experiências, aprendizagens, projetos, e historias que marcam gente como nós, gente que fala a mesma linguagem, gente que sente correr pelo corpo a mesma adrenalina, e a magia do mundo da emergência. Pretendemos dar a conhecer um pouco dos outros, um pouco de nós…” As Editoras, Solange Mega e Rita Penisga
Márcia Daniela Portugal Costa, TEPH Sérgio Abílio Cabelo Martins, TEPH
Técnicos de Emergência Pré-hospitalar do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) O mês de Fevereiro é considerado o mês do amor, celebrado no dia 14 de Fevereiro, designado pelo famoso dia de São Valentim. Como tal, a Equipa da revista Lifesaving trouxe para esta rúbrica Vozes da Emergência uma história “de amor”, e para isso não poderia deixar de presentear neste mês dois jovens profissionais que graças à ingressão na carreira de Técnicos de Emergência pré-hospitalar (TEPH) do Instituto Nacional de Emergência Medica (INEM) se conheceram, …casaram e esperam um lindo menino.
base do INEM em Quarteira, que alberga 2 Ambulâncias de Emergência Médica (AEM), desde 2016. Estas têm como missão a deslocação rápida de uma equipa de emergência médica, a estabilização clínica das vítimas de acidente ou de doença súbita, e o transporte assistido para o serviço de urgência mais adequado ao seu estado clínico1.
Atualmente a exercem serviço na
Estas ambulâncias estão inseridas no
As AEM de Quarteira tiveram início a 1 de Junho de 2004 com apenas uma ambulância, tendo iniciado funções a AEM 2 a 1 de Fevereiro de 2016.
Indice
87
conselho de Loulé, servem 70 622 habitantes, numa área de 763.67 Km2, que engloba 11 freguesias: Almancil, Alte, Ameixial, Benafim, Boliqueime, Loulé (São Clemente), Loulé (São Sebastião), Quarteira, Querença, Salir e Tôr. Estes meios têm uma média de 5755 saídas/ ativações anuais, o que corresponde a uma média mensal para a AEM Quarteira 1 de 248 ativações e a AEM Quarteira 2 de 173 ativações.
[LS] - LIFESAVING [MP] - Márcia Daniela Portugal Costa, TEPH [SM] - Sérgio Abílio Cabelo Martins, TEPH
LS: Como surgiu o gosto pela emergência? MP: O gosto pelo pela emergência, é um bichinho que foi crescendo desde cedo, porque vivia junto a um quartel de bombeiros e vibrava com o toque da sirene e a saída das viaturas em emergência. Mas só me aventurei em 2007, quando decidi ingressar na escola de estagiários nos Bombeiros. SM: O gosto pela emergência, surgiu ao longo dos anos que estive ligado aos Bombeiros Voluntários de Sabugal. Ingressei no ano de 1993 como cadete, e foi durante esses 20 anos que o “bichinho” da Emergência surgiu.
LS: O que os levou a enveredar por esta profissão? MP: Precisamente o gosto pela emergência, especialmente pela emergência pré-hospitalar.
SM: Essa é uma boa pergunta, 88
Indice
VOZES DA EMERGÊNCIA
licenciei-me em Educação Física e foram 14 anos de incertezas, sempre sem estabilidade. Costumava dizer que era, e desculpem a expressão, “um Cigano do Estado” foram 14 anos de “casa às costas” sempre sem saber qual seria o meu destino. E pronto, em 2015 surgiu a hipótese de concorrer no concurso TAE – INEM, e aqui estou eu, consegui a estabilidade que procurava desde o início de 2016.
LS: Quais foram as recordações/experiências mais marcantes como Profissional do Pré-hospitalar? MP: No ano e 2016, na altura a trabalhar em Lisboa, fomos acionados para um parto. O parto aconteceu connosco no local e ainda sem apoio de suporte avançado de vida (SAV). Este será, sem duvida, um serviço que me colocará sempre um
sorriso nos lábios de cada vez que pensar nele.
SM: Uma das recordações mais marcantes, foi há dois anos, onde apoiamos um parto junto à EN-125, quando a SIV Loulé chegou ao local, já o recém-nascido estava limpo, e ao nosso colo.
LS: Na vossa atividade profissional o que pensam ser mais difícil de lidar/suportar? MP: A incapacidade de aliviar o sofrimento das nossas vitimas e muitas vezes dos familiares. SM: O mais difícil para mim é lidar com situações de emergências onde envolvem crianças, ver como os pais ou cuidadores ficam quando é uma situação mais grave.
LS: O que mais os motiva? MP: Nada mais do que o gosto por aquilo que faço e a perceção de que conseguimos, por muitas vezes, marcar a diferença pela positiva, na vida de quem precisa de nós. SM: A incerteza do dia de amanhã e tentar ajudar o próximo de acordo com as nossas competências.
LS: Como atuam quando os meios de SAV não estão disponíveis? MP: Dentro das nossas competências, sabendo que infelizmente são muito limitadas, temos a noção de que em muitos dos casos tempo é sinónimo de vida. Por isso, e sabendo que vitimas criticas se tratam em meio intra-hospitalar, fazemos o que está ao nosso alcance para estabilizar
Indice
89
a vítima e procuramos perder o menor tempo possível até à unidade de saúde, seguindo sempre as indicações do médico regulador.
SM: Bem, numa situação em que necessitemos de apoio SAV e eles não estão disponíveis, estamos mais limitados nas nossas competências. Tudo vai depender de cada situação, mas certamente teremos de chegar à Unidade Hospitalar o mais rápido possível, sempre sob as indicações do CODU.
LS: Quais as dificuldades sentidas no dia-a-dia? MP: Como referia anteriormente, a limitação das nossas competências.
SM: Existem algumas dificuldades ao nível de localizações, na Zona de Quarteira e Vilamoura, zonas de intervenção da nossa AEM. Por exemplo nessas zonas, o nº dos prédios são muitas vezes substituídos por nomes, o que nos dificulta imenso, atrasando o socorro.
LS: Tem um familiar direto/ conjuje como colega de trabalho? Se sim, como gere as suas emoções perante um cenário grave ou de perigo para ele? MP: Tenho, o meu marido. Felizmente, nunca ocorreu nenhum cenário em que o colocasse em perigo. Mas julgo que o facto de estar na área, faz-nos ter melhor perceção de toda a sua envolvente. Isto permite-nos gerir as emoções de forma equilibrada.
SM: Sim tenho, a minha esposa, conhecemo-nos durante o concurso
90
Indice
de ingresso no INEM. Gerir as emoções perante um cenário grave, acho que se torna difícil. Lembro-me de uma situação, em que teve uma cólica renal, eu parecia uma “barata tonta” desculpem a expressão. Acho que foi ela que me acalmou.
LS: O que gostariam de partilhar com todos os leitores? MP: Pegando na questão anterior e
LS: Existe diferença entre o profissional homem e mulher? Sente algum tipo de limitação devido ao género? Como vê a emergência no feminino?
dirigindo apenas para o pré-hospitalar, seria bom que ganhássemos consciência que os recursos e meios são limitados. E que fossemos capazes de ter a perceção, de quando é que verdadeiramente existe a necessidade de ser transportado por um meio de emergência até à unidade de saúde.
MP: Não. Acho que esta questão, na
SM: Gostaria de partilhar alguns
nossa profissão, se prende mais com a força e talvez o respeito que a sociedade atribui ao sexo masculino. E, na verdade, por vezes chegamos aos locais, e somos recebidas com comentários do género “…duas senhoras, como vão conseguir tira-lo de casa?!”. Mas até ao dia de hoje, nunca nenhuma vitima ficou em casa por incapacidade das socorristas.
LS: Mudariam alguma coisa relativamente à vossa atividade profissional? MP: Como em tudo, há sempre
pensamentos, mas deixo estas duas recomendações à população em geral. Liguem 112 quando existe realmente uma emergência médica, não ocupem os meios que são limitados, uma vez que poderão fazer falta noutras situações realmente emergentes. A outra recomendação, prende-se com a necessidade da população procurar adquirir conhecimentos/ formação em primeiros socorros. Porque aprenderiam pequenos passos que podem salvar a vida de alguém, e por outro lado, lhes daria uma melhor perceção sobre o que realmente é emergente ou não.
coisas que poderiam ser modificadas. Mas, o maior dos nossos problemas, prende-se com a falta de sensibilização por parte da população, que leva a um uso excessivo, diria mesmo, abusivo, dos meios de emergência.
LS: Gostariam de deixar alguma sugestão aos elementos que integram as equipas de emergência pré-hospitalar?
SM: Sim. Mas creio que as mu-
MP: Não será uma sugestão, mas
danças estão no caminho certo, uma vez que já estão a trabalhar para adquirirmos novas competências, o que se refletirá numa prestação e socorro mais eficaz.
um elogio, à forma de trabalhar em equipa. Sabemos que cada um tem o seu lugar, ligado às diferentes competências. Mas o importante é que continuemos a trabalhar em equipa, como o temos feito até agora. Pois na verdade trabalhamos todos com o
VOZES DA EMERGÊNCIA
mesmo objetivo.
LP: O que diz o vosso coração?
SM: Que continue a ser assim, que
MP: Direta ou indiretamente, foi
nos apoiemos sempre, cada um tem o seu lugar, mas todos juntos somos mais fortes, TEAM WORK.
LS: Como visualizam o pré-hospitalar daqui a 10 anos? MP: Eu sou otimista, e gostaria que daqui a 10 anos já estivesse estruturado um sistema mais autónomo no pré-hospitalar, com formação adequada para o efeito.
através do INEM que nos conhecemos, e hoje, esperamos ansiosamente o nascimento do nosso primeiro filho. Por isso, a emergência fará sempre parte das nossas vidas.
O nosso agradecimento pela colaboração e disponibilidade… Muito Obrigada As Editoras Solange Mega e Rita Penisga
SM: Há quatro anos que iniciei esta nova etapa, que mudou a minha vida não só a nível profissional. Foi durante o concurso que conheci a minha cara-metade, casamos e a vida continua a sorrir, daqui a umas semaninhas a família vai aumentar.
Bibliografia 1.
https://www.inem.pt/category/cidadaos/ meios-de-emergencia/
Indice
91
92
Indice
NÓS POR LÁ
NÓS POR LÁ
EVENTO DE APRESENTAÇÃO DA LIFESAVING Nº14 NA FNAC DE FARO SESSÃO À COMUNIDADE: “OBSTRUÇÃO DA VIA AÉREA” Bruno Santos1
1 Coordenador Médicos das VMER de Faro e Albufeira, Editor-Chefe da Revista LIFESAVING
No passado dia 8 de Novembro, realizou-se no Forum FNAC de Faro mais um evento de apresentação oficial da revista LIFESAVING, complementada com a realização da já habitual Sessão à Comunidade. A 14ª Edição da Revista foi dedicada predominantemente à temática respiratória, e no seu lançamento oficial, a Dra. Teresa Salero fez uma breve súmula dos vários artigos publicados nas várias rubricas da LIFESAVING. Foi apresentada à Comunidade mais uma Sessão informal intitulada “Obstrução da via aérea no Adulto e na Criança". Depois de ter decorrido a ação de sensibilização e esclarecimento neste âmbito, procedeu-se à simulação de casos no adulto e na criança. Os participantes no Evento forma convidados a efetuar algum treino, com a intenção de possibilitar a difusão destes pequenos gestos que verdadeiramente salvam vidas. O Corpo Editorial da LIFESAVING agradece toda a colaboração, hospitalidade e simpatia demonstradas pela FNAC de Faro.
Indice
93
94
Indice
TESOURINHO VMERTISTA
TESOURINHO VMERTISTA
Pedro Oliveira Silva 1 1 Médico VMER
Este divertido tesourinho tem diferentes intervenientes, começando sempre pelo nosso telemóvel com o aviso escrito da saída, sendo que esta era uma “paragem cardiorrespiratória”. Como habitual saímos em marcha apressada, mas ordenada e em
Congressos Médicos
segurança, e neste dia em particular tivemos a colaboração de todos na estrada, criando um corredor de segurança, quase só televisionado, porém quase a chegar à meta, traduzindo, destino da emergência, atravessamos um burro a trote com o seu dono a correr atrás, originando
duas coisas: - Travagem brusca, mas controlada - Gargalhada geral pela situação E conseguimos salvar a pessoa
Jornadas de Urgência/Emergência em Pediatria – Cuidar de Excelência 18 e 19 de março, 2020 Fórum Municipal Luísa Todi, Setúbal
Portugal eHealth Summit 2020 18 a 21 de março, 2020 Sala Tejo, Altice Arena, Lisboa
Indice
95
96
Indice
PARCERIA
8:00 | ABERTURA DO SECRETARIADO 9:00 | Emergências Pediátricas e Obstétricas Moderador: Francisco Abecasis · CHU Lisboa Norte (Hospital Santa Maria) Complicações do Parto | Pedro Lopes · Hospital Vila Franca de Xira Toolbox de pediatria para o não pediatra | Carlos Escobar · Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca 10:00 | Out of the box: Critically ill or paliative, who cares... Moderador: Isabel Galriça Neto · Hospital da Luz ... in Portugal ? | Duarte da Silva Soares · Presidente da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos ... in Spain | James Astray · PAL 24, Madrid
COMISSÃO ORGANIZADORA BRUNO SANTOS CATARINA TAVARES HELENA GUIMARÃES LUIS GONÇALVES JOSÉ GOMES MÁRIO BRANCO PEDRO ROUXINOL SANDRO MELO
COMISSÃO CIENTÍFICA JOÃO JOÃO MENDES NELSON COIMBRA TIAGO AMARAL TIAGO CARVALHO
11:00 | COFFEE-BREAK 11:30 | Emergências Traumatológicas Moderador: Tiago Amaral · CHU Lisboa Central (Hospital São José) E se soubesse o resultado da autópsia ? | Tiago Carvalho e Carlos Durão · Hospital Vila Franca Xira 12:30 | ALMOÇO 14:30 | Medicina de Catástrofe Moderador: Luis Gonçalves · Força Aérea Portuguesa Keynote Speaker: Gila Hyams · Rambam Health Campus, Israel
PATROCÍNIO CIENTÍFICO
15:30| Emergências Médicas Moderador: Helena Guimarães · CH Vila Nova de Gaia Precordialgia... Should I stay or should I go ? | Daniel Faria · Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca ABC em emergências médicas| João João Mendes · Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca 16:30 | Melhor Trabalho Científico de 2019: Apresentação e Entrega de Prémio 16:45 COFFEE-BREAK 17:15 | Out-of-Hospital ECPR Moderador: Roberto Roncon · CHU São João (Hospital São João) Keynote Speaker: Alice Hutin · SAMU Paris & Member of the ECMO Team in Paris 18:15 | Encerramento Tiago Carvalho, Presidente da APEMERG | Principais conclusões e desafios
PATROCÍNIO COMERCIAL
Indice
97
BEST SITES
emDocs
WikEM
EDITOR: Bruno Santos
Coordenador Médico VMER Faro e Albufeira
98
Indice
Trata-se de uma iniciativa de partilha de literatura médica de acesso aberto e gratuíto, que inclui “revisões da literatura mais recente”, “apresentações incomuns de doenças comuns
e apresentações usuais de doenças incomuns” e mesmo “posturas bem argumentadas que podem estar em desacordo com a prática atual”.
WikEM é um recurso de referência na partilha de informação, na área da medicina de emergência, livremente disponível pela internet. Existe
também na forma de aplicação de telemóvel, com conteúdo muito amplo, conciso e particulamente útil.
BEST APPS
BEST APPS
BEST APP - How to Prevent Hypothermia Pedro Tiago Silva1
Importante para quem vai numa expedição ao ar livre ou se expõe aos riscos da hipotermia.
EDITOR:
https://play.google.com/store/apps/details?id=com.andromo.dev717872.app792468
1 ENFERMEIRO VMER
Esta aplicação ensina sobre a prevenção e reconhecimento de sintomas iniciais de hipotermia.
Pedro Tiago Silva Enfermeiro VMER
Indice
99
O Centro Académico de Investigação e Formação Biomédica do Algarve – Algarve Biomedical Center (ABC) é uma instituição que nasce com a missão de criar, transmitir e divulgar a investigação e avanços científicos da região. Tem como base a formação de profissionais altamente qualificados e diferenciados que se estabeleçam na região do Algarve, contribuindo assim para o desenvolvimento de um centro de excelência com o foco na educação para a saúde. A equipa que constitui o centro de excelência ABC é multidisciplinar, permitindo uma maior amplitude de conhecimentos e troca de ideias e contribuindo para o crescimento da atividade científica realizada no Algarve. A ambição é de nos tornarmos um líder na investigação a nível nacional e internacional, com base na eficiência, qualidade, competitividade e inovação, fixando diversos profissionais na região de forma a que haja um desenvolvimento regional.
100
Indice
O ABC trabalha em simbiose com o Centro Hospitalar Universitário do Algarve e a Universidade do Algarve, através do Centro de Investigação em Biomedicina (CBMR) e Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina (DCBM), para que haja partilha de conhecimento, mantendo os profissionais informados de todas a oportunidades e assim contribuindo para o seu desenvolvimento profissional e curricular. Um dos focos é a divulgação da atividade desenvolvida, também como forma de promover a Região Algarvia e elevá-la a patamares científicos e profissionais de excelência internacional. Provar que no Algarve faz-se boa ciência e bom trabalho! Neste momento o ABC encontra-se em expansão, sendo que o Laboratório de Investigação e Formação em Emergência (LIFE) já realiza formação em Suporte Básico de Vida e Suporte Avançado de Vida com planos de aumentar a sua oferta formativa ainda este ano. A Unidade de Farmacovigilância do Algarve e Baixo Alentejo (UFALBA), sob coordenação do INFARMED efetua a monitorização contínua da segurança
dos medicamentos, contribuindo para a avaliação dos riscos e benefícios da sua utilização. A iniciativa Literacia para a Saúde, que promove junto da população a informação e utilização de plataformas do Ministério da Saúde que facilitam o acesso ada população aos cuidados de saúde. Esta desenvolve ainda outros projetos de educação e formação para a saúde junto da população, tendo já ocorrido inúmeras ações de formação durante o ano de 2019 e já com variadas ações planeadas para o ano de 2020. Ao longo de edições futuras, o ABC irá continuar a divulgar o extenso leque de novidades científicas para a região.
PARCERIA
ALGARVE CORAÇÃO SEGURO BY ABC Este projeto tem como primeiro objetivo tornar o Algarve mais seguro para todos os que cá residem e os que passam por cá, possibilitando ainda o reforço da imagem do Algarve como destino turístico na área da saúde.
Externa (DAE).
O ABC através do projeto Algarve Coração Seguro permite a formação de operacionais em Suporte Básico de Vida e Desfibrilhação Automática Externa (ODAE), bem como a criação da rede de Desfibrilhação Automática
Esta cadeia de formação engloba várias Entidades Públicas, Forças de Segurança, Municípios e Entidades Privadas e já conta em 2019 com mais de 1000 pessoas formadas em SBV-DAE.
Rede de vigilância de DAEs:> 300 DAEs até 2021 Formação de Operacionais de DAE:> 5000 ODAE até 2021
Esta estrutura sólida assenta numa base científica que só uma entidade académica como o ABC associada a uma Faculdade de Medicina pode garantir. Ganha um destaque adicional por estar a implementar o maior Programa de Desfibrilhação Automática externa do país e com grande visibilidade à escala Europeia. O ABC garante formação em Suporte Básico de Vida com a utilização do DAE para profissionais de saúde e para leigos, e suportada por uma equipa de formação de excelência com Médicos, Enfermeiros com vasta experiencia na área da EMERGÊNCIA.
Supervisão de Programas de DAEs, após estudo no território e levantamento de necessidades, desenho do programa, implementação e acompanhamento dos Desfibrilhadores e dos ODAE.
Indice
101
LIFE Laboratório de Investigação e Formação em Emergência Já com 9 anos de experiência na formação em Emergência médica o LIFE tem consolidado o seu papel junto da comunidade de forma muito positiva com um impacto importante ao dirigir as suas diversas ações formativas para os mais variados públicos-alvo.
PLANO FORMATIVO Plano de formação do LIFE apresenta características de qualidade e rigor elevadíssimas sob a liderança dos docentes da Faculdade de Medicina em colaboração com médicos e enfermeiros com prática clínica diária no Centro Hospitalar Universitário do Algarve em ambiente de URGÊNCIA, EMERGÊNCIA, CUIDADOS INTENSIVOS e Instituto Nacional de Emergência Médica – INEM.
pelo Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina (DCBM) da Universidade do Algarve e pelo Centro Académico – Algarve Biomedical Center.
O corpo docente é completado por profissionais das várias entidades de socorro, emergência e apoio às populações já com experiência e conhecimento valiosíssimos na abordagem à comunidade. Assim se constituem equipas de formação fortes, coesas e com experiência e aporte variado. Esta experiência permite conhecer detalhadamente as características e o ambiente do doente crítico intra-hospitalar e extra-hospitalar bem como abordagem às vítimas sujeita às particularidades da região.
OFERTA FORMATIVA PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE: SBV e SBV DAE | SAV – Suporte Avançado de Vida | SBV e Primeiros Socorros Pediátricos |Trauma ETC | Via Aérea Difícil | Simulação de Emergias Médicas | Transporte doente crítico | Ecografia de urgência | Curso de urgência
A elevada qualidade da formação é submetida à revisão e certificação pela Universidade do Algarve (UAlg),
102
Indice
Através de uma formação personalizada esta equipa planeia e desenha formações adaptadas a cada grupo de formandos em concreto, ajustado a cada nível de conhecimentos e formação prévia.
OFERTA FORMATIVA PARA A COMUNIDADE: SBV e SBV DAE | SBV e Primeiros Socorros Pediátricos Cursos SBV | SBV DAE | SAV
BEST SITES
Indice
103
FotograďŹ a: Pedro Rodrigues Silva
Nova conta de INSTAGRAM
LIFESAVING 4all
104
Indice
FRASE MEMORÁVEL
FRASE MEMORÁVEL
"OMS declara coronavírus emergência de saúde pública internacional" "A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou nesta quinta-feira (30-01-2020), em Genebra, na Suíça, que o surto do novo coronavírus (2019-nCoV) constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII)".
In https://nacoesunidas.org/oms-declara-coronavirus-emergencia-de-saude-publica-internacional/amp/
Na próxima edição da Revista LIFESAVING mais temas serão refletidos, surgirão novos desafios para os Editores... e contaremos com o imprescindível contributo dos nossos Colaboradores. Estamos disponíveis para avaliar a possibilidade de publicação de trabalhos e artigos de opinião, desde que concordante com as regras de publicação e os desígnios da LIFESAVING.
Lançamos um desafio aos nossos leitores, para que nos enviem todos os comentários e sugestões sobre os conteúdos apresentados nesta Edição, bem como de outras temáticas que julguem relevantes para discussão em edições futuras. Valorizaremos todo o espírito crítico e criativo, que sabemos estar muitas vezes latente e aguardando oportunidade de expressão.
Toda a Equipa de Editores fica também disponível para dúvidas e esclarecimentos adicionais, que deverão ser remetidos para os respectivos endereços email disponibilizados. * As cartas ao Editor poderão mesmo vir a ser seleccionadas para publicação, caso se considere pertinente a sua difusão.
"Saudações VMERistas"
Indice
105
106
Indice
Indice
107
108
Indice
Indice
109
o compromisso de apresentar em cada número publicado, conteúdos e rubricas de elevada relevância científica e técnica no domínio da emergência médica. Por outro lado, este valioso instrumento de comunicação promoverá a partilha das ideias e conhecimentos, de forma completa, rigorosa e assertiva.
Estatuto Editorial A Revista LIFESAVING é uma publicação científica e técnica, na área da emergência médica, difundida em formato digital, com periodicidade trimestral. Trata-se de um projeto inovador empreendido pela Equipa de Médicos e Enfermeiros das Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação (VMER) de Faro e de Albufeira, pertencentes ao Centro Hospitalar Universitário do Algarve, e que resultou da intenção estratégica de complementar o Plano de formação contínua da Equipa. A designação “Lifesaving”, que identifica a publicação, é bem conhecida por todos os profissionais que trabalham na área da emergência médica, e literalmente traduz o desígnio da nobre missão que todos desempenham junto de quem precisa de socorro – “salvar vidas”. Esta Publicação inovadora, compromete-se a abraçar um domínio editorial pouco explorado no nosso país, com conteúdos amplamente dirigidos a todos os profissionais que manifestam interesse na área da emergência médica. Através de um verdadeiro trabalho de Equipa dos vários Editores da LIFESAVING, e aproveitando a sua larga experiência em Emergência Médica, foi estabelecido
110
Indice
Proprietário: Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E. NIPC: 510 745 997 Morada: Rua Leão Penedo, 8000-386 Faro N.º de registo na ERC: 127037 Diretor: Dr. Bruno Santos Editor-Chefe: Dr. Bruno Santos Morada: Rua Leão Penedo, 8000-386 Faro Sede da redação: Rua Leão Penedo, 8000-386 Faro Periodicidade: trimestral TIPO DE CONTEÚDOS Esta publicação periódica pretende ser uma compilação completa de uma seleção de matérias científicas e técnicas atualizadas, incluídas em grande diversidade de Rubricas, incluindo: – “Temas em Revisão” – Âmbito: Revisão extensa sobre tema pertinente para actuação das equipas em contexto de emergência pré-hospitalar. – Dimensão: 1500 palavras; – “Hot Topic” – Âmbito: Intrepretação de estudos clínicos, divulgação de inovações na área pré- hospitalar recentes ou contraditórias. -Dimensão: 1000 palavras; – “Nós Por Cá” – Âmbito: Dar a conhecer a realidade de actuação das várias equipas de acção pré-hospita-
lar através de revisões estatísticas da sua casuística. Poderá incluir também a descrição sumária de atividades, práticas ou procedimentos desenvolvidos localmente, na área da emergência médica – Dimensão: 500 palavras; – “Tertúlia VMERISTA” – Âmbito: Pequenos artigos de opinião sobre um tema fraturante – Dimensão: 250 palavras; – “Rúbrica Pediátrica” – Âmbito: Revisão extensa sobre tema pertinente para atuação das equipas em contexto de emergência pré-hospitalar no contexto pediátrico. – Dimensão: 1500 palavras; – “Minuto VMER” – Âmbito: Sintetização para consulta rápida de procedimentos relevantes para a abordagem de doentes críticos, ou de aspetos práticos relacionados com Equipamentos utilizados no dia-à-dia. – Dimensão: 500 palavras; – “Fármaco Revisitado” – Âmbito: Revisão breve de um fármaco usado em emergência pré-hospitalar. – Dimensão: 500 palavras; – “Journal Club” – Âmbito: Apresentação de artigos científicos pertinentes relacionados com a área da urgência e emergência médica pré-hospitalar e hospitalar. -Dimensão: 500 palavras; – “Nós e os Outros” – Âmbito: Apresentação de artigos científicos ou artigos de opinião sobre a atuação de equipas de emergência pré-hospitalar não médicas. -Dimensão: 1000 palavras; – “Ética e Deontologia” – Âmbito:
ESTATUTO EDITORIAL
Apresentação de artigos científicos ou artigos de opinião sobre questões éticas desafiantes no ambiente pré-hospitalar. -Dimensão: 500 palavras; – “Legislação” – Âmbito: Enquadramento jurídico das diversas situações com que se deparam os profissionais de emergência médica. – Dimensão: 500 palavras; – “O que fazer em caso de…” – Âmbito: Informação resumida, mas de elevada qualidade, para leitores não ligados à área da saúde, ou da emergência médica -Dimensão: 500 palavras; – “Mitos Urbanos” – Âmbito: Investigar, questionar e esclarecer questões pertinentes, dúvidas e controvérsias na prática diária da emergência médica. -Dimensão: 1000 palavras; – “Cuidar de Nós” – Âmbito: Discussão de diferentes temáticas, de caráter psicológico, emocional, metabólico, físico, recreativo, centradas no auto-cuidado e bem estar do profissional da emergência. -Dimensão: 500 palavras; – “Caso Clínico” – Âmbito: Apresentação de casos clínicos de interesse científico na área da emergência médica. -Dimensão: 500 palavras; – “Pedacinho de Nós” – Âmbito: Dar a conhecer, em modo de entrevista, os profissionais da Equipa das VMER de Faro e Albufeira ou outros Elementos colaboradores editoriais da LIFESAVING. – Dimensão: 500 palavras; – “Vozes da Emergência” – Âmbito: Apresentar as Equipas Nacionais que
desenvolvem trabalho na Emergência Médica, dando relevância a especificidade locais e revelando diferentes realidades. – Dimensão 500 palavras; – “Emergência Global” – Âmbito: publicação de artigos de autores internacionais, que poderão ser artigos científicos originais, artigos de opinião, casos clínicos ou entrevistas, pretendendo-se divulgar experiências enriquecedoras, além fronteiras; – “Tesourinhos VMERISTAS” – Âmbito: Divulgação de situações caricatas, no sentido positivo e negativo, da experiência dos Profissionais da VMER. – Dimensão: 250 palavras; – “Congressos Nacionais e Internacionais” – Âmbito: Divulgação de eventos na área da Emergência Médica – Dimensão: 250 palavras; – “Eventos de Emergência no Algarve” – Âmbito: Divulgação de eventos na área da Emergência Médica no Algarve. – Dimensão: 250 palavras; – “Best Links/ Best Apps de Emergência Pré-hospitalar” – Âmbito: Divulgação de aplicações e sítios na internet de emergência médica préhospitalar -Dimensão: 250 palavras PREVISÃO DO NÚMERO DE PÁGINAS: 50; TIRAGEM: – não aplicável para a publicação eletrónica, não impressa em papel. ONDE PODERÁ SER CONSULTADA:
chualgarve.min-saude.pt/lifesaving/, e adquirida gratuitamente por subscrição nesse mesmo site. Não dispomos ainda de um site oficial para organização dos nossos conteúdos, de modo que atualmente todas as Edições estão a ser arquivadas no Repositório Internacional ISSUU, onde poderão ser consultadas gratuitamente (https://issuu. com/lifesaving). Marcamos presença ainda noutras plataformas de divulgação (Facebook, Instagram, Twitter e Youtube). DIVULGAÇÃO DA LIFESAVING: A LIFESAVING será difundida no site do Centro Hospitalar do Algarve (no setor média e imagem), e sua Intranet, com possibilidade da sua subscrição para receção trimestral via e-mail. Inserida on-line no repositório de publicações ISSUU, adquirindo um aspeto gráfico otimizado para tornar a leitura ainda mais agradável. Será também difundida na página de Facebook da VMER de Faro, página própria com o nome LIFESAVING. n.º 1 do art.º 17.º da Lei de Imprensa: Garantia de liberdade de imprensa: 1 - É garantida a liberdade de imprensa, nos termos da Constituição e da lei. 2 - A liberdade de imprensa abrange o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações. 3 - O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
Pode ser consultada no site do CHUAlgarve, no setor “Comunicação”, no domínio http://www. Indice
111
112
Indice