Separata 4º Aniversário

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Fotos e imagens: Pedro Rodrigues Silva e Maria Luisa Melão Ilustrações: João Paiva Design e edição: João Oliveira Separata especial 4º aniversário da revista LIFESAVING Publicada em simultâneo com a 17ª edição a 5 de Agosto de 2020

2020


LIFE SAVING

REVISTA DAS VMER DE FARO E ALBUFEIRA

ÍNDICE

Nota Introdutória

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Trauma Torácico Edição nº 2

9

Técnica na sequência rápida na Intubação Orotraqueal Edição nº 4

14

A Iatroética na medicina de catástrofe Edição nº 5

18

ECMO—Uma Revisão da Literatura Edição nº 6

24

O Grande Queimado: abordagem e assistência emergentes Edição nº 8

28

Traumatismo craneo-encefálico no pré-hospitalar: Fazemos o correcto? Edição nº 9

34

Paragem cardiorrespiratória na grávida Edição nº 11

46

Cuidados pós-reanimação Edição nº 12

52

Abordagem ao doente traumatizado vertebro-medular Edição nº 13

62

Abordagem da paragem cardiorrespiratória no doente com suspeita ou confirmação de COVID-19 Edição nº 16

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LIFE SAVING

REVISTA DAS VMER DE FARO E ALBUFEIRA

NOTA INTRODUTÓRIA

A

5 de Agosto de 2016 nascia a revista LIFESAVING, fundada pela equipa da Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) de Faro e Albufeira. Um projeto pioneiro e ambicioso, focado na emergência médica, em especial na emergência pré-hospitalar. Desde a primeira edição, a LIFESAVING assume um tom prático e atual, procurando demonstrar a aplicação real dos temas que difunde. Assinala-se agora o quarto ano de publicações trimestrais ininterruptas. Para alem de envolver toda a equipa num projeto comum, a LIFESAVING torna ainda possível a manutenção da sua formação continua, estimulando os seus profissionais a permanecerem atualizados e geradores de novo conhecimento. Por outro lado, ao longo do tempo, o projeto da revista LIFESAVING foi-se tornando também um projeto social, com iniciativas de promoção de literacia em saúde junto da população servida pelas VMER de Faro e Albufeira com ações promovidas junto da Comunidade, nomeadamente: demonstrações práticas, mesas redondas, debates e exposições científicas e artísticas Volvidos quatro anos muito mudou na revista e no mundo. A revista tornou-se mais completa, somando novas rubricas e contando com participação crescente de autores de outros centros, sempre mantendo o seu caracter prático e de pertinência atual. O mundo ultrapassou catástrofes naturais e emergências de saúde publica. A catástrofe causada pela passagem do ciclone Idae na Beira, em Moçambique (2019), não foi indiferente a vários elementos da equipa, tendo integrado as forças humanitárias de auxílio às suas vitimas. As suas experiências acumuladas foram partilhadas numa separata especial do 3º aniversário LIFESAVING na sua 13ª edição. Em 2020 o mundo atravessou a maior ameaça de saúde publica dos últimos 100 anos, a pandemia COVID-19. Esta transformou a nossa for-

ma de trabalhar, de comunicar, de estar e de viver. A LIFESAVING assumiu-se neste contexto como uma ferramenta de comunicação e instrução privilegiada e segura, numa altura em que outras formas de comunicação, como a presencial, não são possíveis. A Edição nº16 foi dedicada a temas relacionados com a pandemia e as mudanças a que a mesma obrigou. Simultaneamente, houve também uma elevada quantidade de conhecimento produzido a uma velocidade avassaladora, tornando impossível à maior parte dos profissionais manter-se atualizados; a equipa editorial da LIFESAVING rapidamente se mobilizou e criou um novo projeto – Highlights COVID-19 – uma publicação online em que são expostas as ideias-chave dos artigos sobre o vírus SARS-CoV-2 considerados mais relevantes pelos autores, de forma a assegurar-se a qualidade da informação veiculada, foi mantida a revisão por pares em todas as suas edições. Apesar deste crescimento exponencial, todos os projetos estão dependentes do trabalho e dedicação dos elementos da equipa, somando nos últimos anos o apoio do Algarve Biomedical Center (ABC) para o design gráfico e finalização da revista, e do Centro Hospitalar Universitário do Algarve com a disponibilização na sua página da web das publicações. No ano em que se assinalam os quatro anos da primeira edição da LIFESAVING, e os 20 anos da fundação da VMER de Faro, muitos foram os projetos traçados para assinalar a efeméride, contudo a pandemia COVID-19 obrigou à sua reinvenção. Surge então esta publicação, em que cada profissional da VMER foi desafiado a escolher os artigos que mais o marcaram desde a primeira edição da LIFESAVING. Pretendemos desta forma refletir não só o que é a LIFESAVING até hoje, mas também o que somos, os profissionais que a ela nos dedicamos.

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TEMA EM REVISÃO Trauma torácico

NEWSLETTER DAS VMER DE FARO E ALBUFEIRA

Introdução Os traumatismos com lesão torácica associada continuam a apresentar uma elevada gravidade, com o consequente dispêndio de meios e recursos no seu tratamento e recuperação. Esta lesões representam uma percentagem muito significativa em termos de morbilidade e mortalidade. De acordo com estatísticas americanas do inicio da década de 1990, ocorriam anualmente cerca de 180 000 mortes por traumatismos variados. De acordo com os dados europeus disponíveis, este tipo de lesão predomina no sexo masculino (80% das vítimas), com a média de idade de 32 anos. Na Europa, os acidentes de viação representam 55% dos casos de trauma, seguidos das quedas com 17%, acidentes diversos (incluindo desportivos) 22% e agressões 6%. Relativamente a Portugal, dados de 2004 do Instituto Nacional de Estatística mostram uma incidência de 109 vitimas mortais por trauma por cada 100 000 habitantes, o que nos colocava no topo da lista de mortalidade por trauma na Europa.

Mecanismo de lesão torácica e cinemática Trauma fechado A causa mais frequente de trauma fechado é o A laceração/estiramento surge como resultado acidente rodoviário envolvendo veículos automó- da mudança abrupta de velocidade por parte de veis. um órgão ou estrutura. Esta diferença na aceleração ou desaceleração faz com que partes de órExistem vários padrões do tipo de impacto que gãos/estruturas se separem conduzindo ao rasocorre nestas circunstâncias (Figura 1). gar de tecidos. Apesar de cada um destes padrões ter variações, A compressão resulta da opressão direta de um a identificação precisa do tipo de impacto forneórgão ou estrutura por outras. As lesões podem ce informação essencial para podermos diagnosresultar de qualquer um dos tipos de impacto. ticar lesões resultantes do evento traumático. Ambas estas forças podem produzir lesões de No trauma fechado existem duas forças envolvicavitação nos tecidos e órgãos internos atingidos das no impacto: compressão e laceração/ estirapela energia resultante da desaceleração. mento.

TIPOS DE IMPACTO 1. Impacto frontal; 2. Impacto traseiro; 3. Impacto lateral; 4. Impacto rotacional; 5. Capotamento.

Imagem 1. Tipos de impacto em situação de acidente rodoviário.

Trauma aberto Por norma, o trauma torácico aberto é causado por armas brancas, armas de fogo ou pela penetração de objetos no corpo. Na Europa representa 4% do total de eventos traumáticos. As suas consequências clínicas dependem da energia transferida no momento do impacto e do ponto de aplicação.

* As lesões resultantes de uma explosão podem ocorrer por três tipos de mecanismos: primária, secundária e terciária, sendo distintos os tipos de lesão que ocorrem nas diferentes fases. Lesões Primárias

No trauma por arma de fogo há́ transferência de alta energia, os tecidos circundantes são afastados do trajeto do projéctil, dando origem a lesões de cavitação (temporária e/ou permanente) com três consequências: 1— Destruição mecânica e funcional dos tecidos circundantes. Possibilidade de fragmentação do projéctil, com criação de projécteis secundários com trajectórias acessórias e danos mais graves. O impacto sobre estruturas ósseas leva à projecção de fragmentos, também eles causadores de lesão dos tecidos; 2 — Projecta pedaços de roupa ou outros materiais do local de impacto e deposita-os na profundidade da ferida; 3— Quanto maiores a velocidade e o calibre do projéctil, maior será́ a cavitação temporária e logo maior a região afetada.

É a fase mais grave da explosão e pode ser aquela que está menos visível. A explosão provoca uma onda de choque que afeta principalmente órgãos com ar como os pulmões, intestinos e ouvidos. Pode provocar embolia gasosa com obstrução das artérias coronárias ou cerebrais e morte súbita.

Lesões Nas explosões civis, a maioria das lesões são feriSecundárias das múltiplas, extensas, de profundidade variável e contaminadas, causadas por fragmentos da explosão. Lesões Terciárias

A deslocação de ar pode ser tão intensa que projeta a vítima à distância, provocando lesões de impacto.

Imagem 2. Tipos de lesões resultantes de uma explosão.

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TEMA EM REVISÃO Trauma torácico Tipos de lesões pulmonares Classicamente, dividem-se as lesões torácicas em dois grupos: lesões com risco de vida imediato, e lesões potencialmente fatais:

6 Lesões Fatais

6 Lesões Ocultas

Obstrução da Via Aérea;

Rotura Traumática da Aorta;

Hemotórax Maciço;

Rotura Traqueo-brônquica;

Pneumotórax Hipertensivo;

Rotura Esofágica;

Pneumotórax Aberto;

Contusão Miocárdica;

Tamponamento Cardíaco;

Contusão Pulmonar;

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Não é de somenos importância referir que lesões que constituem risco de vida podem ser tratadas de modo rápido e simples, após correcto diagnóstico, com uma drenagem por agulha ou colocação de dreno torácico. Como exemplo, referimos o pneumotórax aberto e o pneumotórax hipertensivo. São procedimentos simples, de rápida execução, eficazes, estão ao alcance de qualquer médico, e permitem salvar vidas. Ainda mais premente se torna a sua execução no contexto real da nossa atuação, devido a distancias a percorrer e tempo de transporte elevado que por vezes se verifica. Em vitimas com traumatismo torácico e sinais de pneumotórax, a colocação de drenos torácicos é mandatória em caso de helitransporte.

Imagem 4. Tipos de lesões pulmonares.

Outro efeito do traumatismo da parede torácica e das vísceras torácicas é o compromisso do transporte de oxigénio.

Causas e mecanismos de morte Frequentemente estas vitimas apresentam múltiplos traumatismos, seja pelo mecanismo do acidente (impacto frontal com rotação, por exemplo) ou pelo tipo de acidente (explosão com projeção, nomeadamente). É importante reconhecer a presença de traumatismo facial associado. Nesta situação pode ocorrer concomitantemente compromisso da via aérea: -aspiração de corpos estranhos, nomeadamente aspiração de vomito; -obstrução posterior por fratura com impactação da mandíbula; -perda de controlo da mobilidade da língua por fratura da mandíbula; -obstrução de via aérea por hemorragia; -edema de partes moles da cavidade oral; * Vários estudos demonstraram que metade das mortes ocorridas em contexto de trauma resultavam de lesões cerebrais primárias, 25% das mortes eram causadas por lesões torácicas diretas, e em outros 25% de casos fatais, incluindo lesões cerebrais, os traumatismos torácicos estavam presentes, e contribuíram para a mortalidade. Cabe referir aqui alguns conceitos importantes para o entendimento e correcto manuseio das lesões traumáticas torácicas. Existe uma percentagem significativa destas lesões que causam morte quase de imediato, nomeadamente lesões da aorta por traumatismo directo ou esmagamento, ou outras lesões vasculares de grande calibre por traumatismo penetrante, sobretudo por projécteis de alta velocidade. Os acidentados que conseguem sobreviver tempo suficiente para chegar ao Serviço de Emergência acabam muitas vezes por apresentar evolução desfavorável, por atraso no diagnostico e tratamento das lesões. Existe aqui uma diferenciação entre mortalidade prematura, frequentemente por choque hipovolémico, ou tardiamente, por sépsis, síndrome de dificuldade respiratória do adulto (ARDS), ou em consequência de disfunções multi-organicas (MOF). BIBLIOGRAFIA:

A hipóxia e a hipovolémia agravam as lesões cerebrais, podendo mesmo causar diretamente edema cerebral. Por outro lado, as lesões cerebrais, causando alteração dos padrões normais de ventilação e diminuindo os reflexos protetores de via aérea, contribuem para o agravamento das lesões torácicas e hipoxemia. Estamos assim em presença de um mecanismo que se autoalimenta, contribuindo para o agravamento progressivo do quadro clinico e resultando em morte. O parênquima pulmonar é um órgão-alvo de lesão secundária após choque, e da lesão tecidular remota. As alterações na micro -circulação periférica causam microembolos, que migram e causam alterações na ventilação/perfusão, e compromisso do lado direito do coração. O choque e a lesão tecidular activam a cascata de inflamação, contribuindo para as lesões pulmonares de reperfusão.

Conclusão: O traumatismo torácico é uma lesão muito frequente, que contribui para o agravamento de outras lesões, e é potencialmente fatal. Os mecanismos que produzem lesões torácicas devem ser identificados, e reconhecidos os seus potenciais efeitos. É fundamental a detecção precoce da lesão. A drenagem torácica, por agulha ou colocação de dreno, é uma medida rápida, eficaz e segura, com indicações precisas. Não necessita de realização previa de imagem radiológica. Os drenos devem manter-se permeáveis. As medidas universais de proteção da equipa de socorro são mandatórias. Os elementos das equipas de socorro devem estar familiarizados com esta patologia, conhecer as causas, formas de apresentação e sintomas, e possuir competências para a sua correta abordagem e tratamento.

Emergencias de Trauma- Manual do Curso de VMER- versão 2.0- 1ª edição. Definitive Surgical Trauma Care Manual- Kenneth D. Boffard. 2ª edição. Advanced Trauma Life Support ATLS Student Course Manual 9th Edition- 2015. Manual do Curso de Evidencia na Emergência- 4ª edição- 2011.

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TEMA EM REVISÃO Trauma torácico

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Procedimento de descompressão rápida de um pneumotórax O procedimento a ser realizado de imediato na presença de um pneumotorax hipertensivo é a drenagem percutanea com agulha. Esta técnica tem indicação para uma descompressão rápida de pneumotorax a causar deterioração rápida do estado clinico, usualmente pneumotorax hipertensivo. Introduz-se um abocath de calibre 14 (laranja), após desinfecção cutânea, no segundo espaço inter-costal, linha medio-clavicular, rasando o bordo superior da costela inferior.

Imagem 5 - Drenagem torácica com agulha (abocath 14)- Arquivo pessoal (Dr. Carlos Raposo)

Este procedimento, sendo rápido e eficaz, não substitui a colocação de um dreno torácico.

Este dreno pode ficar aberto para o ar, ou ser colocado um mecanismo de válvula que impeça a aspiração de ar, nomeadamente um dedo de luva.

Procedimento de colocação de um dreno torácico Os drenos torácicos devem ser colocados na linha axilar anterior, no quinto espaço inter-costal. É necessário evitar a colocação através do músculo grande peitoral ou de tecido mamário. Pessoalmente, prefiro o método aberto, de acordo com as recomendações da maioria dos manuais sobre trauma. * Deste modo, aumenta a segurança do procedimento, e diminui o posicionamento intraparenquimatoso do dreno, uma das intercorrências mais frequentes. Imagem 6- Local de introdução de dreno torácico. Pequena hemorragia na zona da infiltração com anestesia local. Arquivo pessoal (Dr. Carlos Raposo).

A drenagem torácica, em contexto clinico adequado e com reconhecimento das suas indicações, deve ser realizada de imediato, em ambiente pré-hospitalar, não necessitando de aguardar pela confirmação imagiológica no hospital! Existem situações, bem definidas, com indicação formal para introdução de dispositivos de drenagem torácica em ambiente pré-hospitalar. Em doentes críticos com traumatismo torácico grave e deterioração rápida do estado clinico, a introdução de drenos torácicos bilaterais, no local, deve ser ponderada. Os dispositivos de drenagem torácica, seja por abocath ou dreno torácico, não devem ser nunca clampados, nem para transporte nem para mudanças de maca ou outras situações. Só após confirmação de expansão completa e resolução da lesão é que podem ser clampados, o que por norma só ocorre após vários dias de internamento.

Medidas individuais de protecção ..As medidas individuais de protecção devem ser mantidas ao longo de todos os procedimentos. Embora os casos de contaminação dos profissionais de saúde sejam em número reduzido, existem vários casos documentados. É necessário não esquecer o aumento da incidência de doenças transmissíveis por contacto com sangue ou outros fluidos na população geral.

Carlos Raposo MÉDICO VMER jcarlosraposo@gmail.com

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TEMA da EM REVISÃO Abordagem agitação psicomotora no Pré-hospitalar Técnica na sequência rápida na Intubação Orotraqueal

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Perguntas e respostas Intubação de Sequência Rápida (ISR) é uma técnica de intubação traqueal em situação de emergência que visa o rápido controle da via aérea enquanto minimiza os riscos de regurgitação e aspiração de conteúdo gástrico; e reduzir ao máximo os efeitos adversos do procedimento. A intubação sob anestesia e bloqueio neuromuscular torna o procedimento mais fácil, rápido e menos traumático.

Indicações: - Estômago cheio ou jejum desconhecido, trauma, emergência cirúrgica, ressuscitação e alterações do nível de consciência (ECG<8); - Refluxo gastro-esofágico conhecido, tal como devido a hérnia do hiato; - Condições que levam ao atraso do esvaziamento gástrico, como por exemplo: gastroparesia autonómica (diabetes mellitus, doença de Parkinson), história de cirurgia com "banda" gástrica, pacientes com dor severa ou uso recente de opióide; - Gravidez (a partir do segundo trimestre).

Foi originalmente descrita por Sellick[1] em 1961 como: esvaziamento do estômago com sonda gástrica prontamente removida; pré-oxigenação; paciente em posição próclive; indução anestésica com barbitúrico (tiopental) ou anestésicos voláteis, e um relaxante muscular de ação rápida (suxametônio); aplicação da pressão cricóide; laringoscopia e intubação traqueal imediatamente após as fasciculações.

Contra-indicações: Caso na avaliação seja prevista uma via aérea difícil a conduta passa a ser o controlo da via aérea com o paciente acordado, com a devida preparação prévia.

houver perda da consciência 30N [4] (equivalente a 3 kg) . A manobra pode ser realizada com o dedo médio e o polegar colocado em cada lado da cartilagem cricoide com o indicador acima para evitar o deslocamento lateral da cartilagem. Uma alternativa, é um auxiliar apoiar a face posterior do pescoço com a mão para contrapor a força aplicada na cartilagem cricoide e para tentar evitar uma possível flexão da cabeça durante a manobra, dificultando a visualização da glote; Não ventilar enquanto aguarda condições de intubação (30 a 60 segundos); Visualização directa da passagem do tubo na glote; Manter compressão da cricóide até confirmação da intubação; Confirmação da intubação traqueal; Detecção de CO2 expirado (capnografia); Auscultação do tórax e epigastro.

Modificações comuns:

Preparação:

- Omitir a passagem de uma sonda esofágica; Monitorização da pressão arterial, ECG e da Posição supina ou em rampa; oximetria; Titular a dose do agente anestésico na induO doente é posicionado em decúbito dorsal e ção para a inconsciência; coloca-se rolo transversal debaixo dos om- Uso de ketamina, midazolam ou etomidato bros para hiperextensão do pescoço (sniffing para induzir anestesia; Uso de rocurónio em dose alta como bloqueposition); ador neuromuscular; Pré-medicação: visa reduzir os efeitos provoOmitir a pressão cricóide. cados pela laringoscopia e pela passagem do tubo endotraqueal, tais como: resposta vagal Complicações potenciais: (bradicardia), taquicardia, hipertensão arteri- Laringoespasmo, broncoespasmo e instabilial, hipóxia tecidular, aumento da pressão dade hemodinâmica; intracraniana e intraocular; Náuseas, vómitos, dor ou alterações hemodiRegisto de parâmetros vitais e medicação nâmicas durante a aplicação da manobra Sellick[5]; administrada. Aplicação incorrecta da manobra de Sellick: deformidade dessa cartilagem, ruptura esofágica, caso haja vómitos[5]; Técnica: Potencial VAD não prevista: ventilação inadeIndutor anestésico endovenoso + Succinilcoquada e dificuldade ou mesmo até a impossilina ou Rocurónio[2]; bilidade de intubação; Manobra de Sellick (aplicar pressão na criParagem cardiorrespiratória e morte. cóide)[3]: durante a indução da anestesia, enquanto o paciente estiver consciente, a Alírio Gouveia força deve ser de cerca de 10 a 20N e quando MÉDICO VMER

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TEMA da EM REVISÃO Abordagem agitação psicomotora no Pré-hospitalar Técnica na sequência rápida na Intubação Orotraqueal

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Perguntas e respostas

Fármacos Utilizados na Intubação de Sequência Rápida Dose / Kg EV

Efeitos CV

Efeitos Respiratórios

Efeitos SNC

Agente

Midazolam

Diazepam

Adulto

Criança

FC

TA

FR

Broncodilatação

FSC

Consumo O2

PIC

Contra-indicações

0,02-0,1 mg/Kg

0,05-0,1 mg/Kg

0

-

-

0

-

-

-/0

Reduzir doses no idoso Irritação do local de injeção (tromboflebite). Não misturar ou diluir com outras soluções ou fármacos

0,05-0,2 mg/Kg

0,05-0,3 mg/Kg

-

-

-

0

-

-

-/0

-

-

-

0

0/-

0/-

0/-

Alfentanil

10-20 ug/kg

10-150 ug/ kg

Fentanil

2-10 ug/kg

1-5 ug/kg

Bólus lento até 1 ug/kg

Bólus lento até 1 a 4 ug/kg

Remifentanil

Propofol

Tiopental

Etomidato

Precauções e

Perfusão: 0,1-0,5 ug/ kg/min 1-2,5 mg/kg

-

-

0

0/-

0/-

0/-

--

--

--

0

0/-

0/-

0/-

Rigidez muscular

0

---

--

0

---

---

---

Dor à injeção. Alergia ao ovo.

--

--

---

Edema doloroso se extravasamento subcutâneo, possibilidade de necrose tecidular extensa. Porfirias.

---

Dor à injeção. Movimentos mioclónicos. Supressão adrenocortical, CI uso de perfusões

Perfusão: 0,1-0,5 ug/ 2-3 mg/kg Criança 5 - 6 mg /Kg

3-5 mg/kg Lactente 7 – 8mg/Kg

0,3 mg/kg

-

Reduzir doses no idoso. Doses altas podem provocar rigidez muscular.

0,3 mg/kg

++

0

-

-

-

0

---

---

---

---

Delírio reduzido pelas benzodiazepinas. CI: LOE / HIC,

Ketamina

1-3 mg/kg 0,5-5 mg/kg

++

++

-

+++

+++

+

+

Perfuração ocular, Cardiopatia isquémica,

Succinilcolina

1-1,5 mg/kg

1-2 mg/kg

--

0

+

0

+

Prolongado bloqueio perante deficiência de colinesterases,hipocalemia, hipocalcemia. Hipertermia maligna,miopatias. Aumento da PIO. Aumento do k+ plasmático (superior em queimados, trauma, doença do 1º neurónio mo-

Rocurónio

0,6-1,2 mg/ kg

0,6- 1 mg/ kg

+

0

0

0

0

Reações no local de injeção, anafiláticas/anafilactóides (raras)

Tabela 1: Resumo fármacos usados na ISR e características. O: sem alterações; - : diminuição ligeira; -- diminuição moderada; ---: diminuição acentuada; +: aumento ligeiro; ++: aumento moderado; +++: aumento acentuado; FSC: Fluxo sanguíneo cerebral; PIC: Pressão Intra-craniana.

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TEMA da EM REVISÃO Abordagem agitação psicomotora no Pré-hospitalar Técnica na sequência rápida na Intubação Orotraqueal

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Perguntas e respostas

PROTOCOLO DE INTUBAÇÃO DE SEQUÊNCIA RÁPIDA Avaliação hemodinâmica do doente

Preparação

Peenchimento vascular

Material e equipamento necessários,

Uso de aminas.

Monitorização , acesso venoso. FiO2 100%

Pré-oxigenação

VNI vom O2 a 100%

INTUBAÇÃO DE SEQUÊNCIA RÁPIDA Início da pressão cricóide

3 min antes

Hipnose e Paralisia Pré-medicação

Indução anestésica e relaxamento muscular.

Posicionamento Laringoscopia e intubação endotraqueal

Término da pressão cricóide

Intubação

Falha de Intubação

Pós-intubação

Ventilação com Ambú + Máscara

Confirmar posição de tubo Ventilação

Posicionamento Laringoscopia direta e intubação Cuidados com o paciente intubado

endotraqueal

Monitorização Ventilação Sedação/relaxamento muscular. Falha de Intubação

Intubação

VIA AÉREA DIFÍCIL Alírio Gouveia

Referências: 1- Sellick BA. Cricoid pressure to control regurgitation of stomach contents during induction of anaesthesia. Lancet 1961; 2:404-406. 2- Lavazais S, Debaene B - Choice of the hypnotic and the opioid for rapid-sequence induction. Eur J Anaesthesiol, 2001;23: 66-70. 3- Sellick BA - Crycoid pressure to control regurgitation of stomach contents during induction of anaesthesia. Lancet, 1961;19: 404-406. 4- Wilson ME, Spiegelhalter D, Robertson JA, et al. Predicting difficult intubation. Br J Anaesth 1988;61(2):211-6. 5- Landsman I. Cricoid pressure: indications and complications. Paediatric Anaesth 2004;14(1):43-7. 6- ATOTW 331 – Rapid Sequence Induction (24th May 2016). 7- Miller RD. Miller’s Anesthesia. 6th ed. Philadelphia, PA, USA: Else- vier Churchill Livingstone; 2005

MÉDICO VMER

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ARTIGO EM DESTAQUE

LIFE SAVING REVISTA DAS VMER DE FARO E ALBUFEIRA

“A IATROÉTICA NA MEDICINA DE CATÁSTROFE”

Palavras-chave: Medicina, Catástrofe, Iatroética “As situações de excepção, como os acontecimentos tácticos inusitados, o terrorismo, as catástrofes naturais, são notícias cada vez mais frequentes no quotidiano, e são situações para as quais os meios de protecção e socorro têm de estar preparados. Foi neste sentido que recentemente realizámos um seminário técnico sobre o tema. Em altura de edição comemorativa do primeiro aniversário da LIFESAVING, preparámos uma revista quase inteiramente direccionada ao assunto. Convidámos o Professor Romero Bandeira, que nos presenteou com um artigo conceptual sobre a temática. É, sem dúvida, quem mais se dedicou ao ensino da disciplina da Medicina de Catástrofe a profissionais de saúde em Portugal, continuando a empenhar-se no desenvolvimento da preparação da acção neste domínio de intervenção.” Catarina Tavares

Introdução A noção de Medicina de Catástrofe surge-nos como uma prioridade numa emanação dos tempos que correm. A este tipo de intervenção médica pluridisciplinar e polivalente junta-se uma preocupação constante que vem a ser a existência duma desadequação entre o número de vítimas e a capacidade de socorro; concomitantemente há uma fase inicial com um período de improvisação puro. Estas circunstâncias fazem com que a Medicina de Catástrofe se paute por métodos e processos específicos e diferentes da Medicina de Urgência habitual (Bandeira 2008). Assim, devemos precisar o que ela não é: não é uma Medicina que cuida de órgãos ou funções (ex. Pneumologia), não é uma actividade de separação anatómica (ex. Cirurgia), não é uma Medicina de agressão química ou física (ex. Cancerologia), não é uma Medicina de Diagnóstico (ex. Radiologia), não é uma Medicina do espírito (ex. Psiquiatria) (Noto 2010 b). É praticada desde quando: inicialmente foi organizada nas acções de massa em cuidados de Urgência extra-hospitalares mas que teve a exemplo da Medicina de Guerra, de que é herdeira, de equacionar os procedimentos logísticos inabituais na prática médica corrente mesmo no que concerne às situações de urgência.

ENFERMEIRA VMER

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ARTIGO EM DESTAQUE ———————————————Conceptualização Quanto ao arranjo espacial da situação de catástrofe a partir do seu epicentro para a periferia ela pode ser discriminada em zona de choque, zona intermediária e zona exterior à catástrofe. No momento presente, em termos operacionais, de âmbito Médico-Sanitário as Catástrofes podem ser caracterizadas basicamente em: •ACEL até 100 vítimas •ACEM até 1000 vítimas, com elevado número de Implicados •Catástrofe até 3000 vítimas •Megacatástrofes nº superior a 3000 vítimas Se não existem vítimas as situações de excepção poderão ser considerados como simples acidentes geológicos, meteorológicos, sociais, etc (Gunn 1992).

Intervenção no Teatro de Operações (TO) Posto Médico Avançado (PMA) Hoje mais propriamente designado Posto Sanitário Móvel; trata-se de uma estrutura que pratica e conceptualmente tem vindo a sofrer modificações ao longo do tempo, já que hoje podemos concebê-lo de uma forma virtual, ou seja, de poder apresentar uma plasticidade e heterogeneidade tais, não confinadas a estruturas padronizadas, mas sim adaptadas às disponibilidades de espaço e tempo, sem nunca perder a sua especificidade de “amortecedor de choque” das estruturas sanitárias mais pesadas: CME (Centro Médico de Evacuação), ou mesmo HR (Hospital de Retaguarda), de acordo com Hertgen e Fuilla (2012).

Triagem Este é um conceito fundamental que tem vindo a emergir com toda a acuidade, uma vez que sem a caracterização das vítimas na situação de urgência não se torna possível realizar um socorro eficaz. Assim sendo, torna-se necessário equacionar e hierarquizar as prioridades, num contexto excepcional de multivítimas e saber exactamente quais as atitudes terapêuticas adequadas e que prioridade de evacuação apresentam, conforme Soler et al. (2008) e Marques (2009).

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Professor Romero Bandeira Nota Biográfica O Professor Romero Bandeira nasceu em São Pedro da Cova em 1947, Médico Especialista em Medicina Geral e Familiar, Doutorado em Ciências Médicas pela Universidade do Porto, é Professor Associado com Agregação do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (jubilado), onde criou e coordenou a primeira formação pós graduada em Portugal de Medicina de Catástrofe dirigida a médicos e enfermeiros, inicialmente uma Pós Graduação que posteriormente se tornou no primeiro Mestrado de Medicina de Catástrofe do país. Foi também Regente da cadeira de História da Medicina, sendo conjuntamente com a Medicina de Catástrofe as suas principais áreas de interesse e investigação. Foi Professor convidado de múltiplos cursos pós graduados em várias Universidades e Escolas de Enfermagem ligados à sua especialidade. Integra vários Conselhos Científicos ou Editoriais de Revistas e Sociedades Científicas Nacionais e Estrangeiras, algumas com cargos nos seus corpos sociais. A estreita ligação à medicina extra hospitalar, à protecção e civil e socorro está presente no seu percurso profissional desde 1977. Foi Comandante e Adjunto de Comando da Associação Humanitária e Cultural de Bombeiros Voluntários de São Pedro da Cova durante mais de 30 anos, é actualmente Presidente da Direcção desta Associação e Director da sua Unidade Experimental de Intervenção e Formação para Intervenção e Socorro. Foi Presidente do Conselho Científico e Pedagógico da Escola Nacional de Bombeiros entre 2002 e 2010. Representante Português da Société Française de Médecine de Catastrophe e responsável pela dinamização da sua Secção Internacional, desde 2003. Representante Português e Vice-Presidente do Comité Científico da Société Européenne de Médecine de Sapeurs Pompiers, desde 2009. Membro do Advisory Board do European Council of Disaster Medicine, desde 2014. Entre as várias publicações científicas como autor e coautor, editor e co-editor em Portugal e no estrangeiro, destaca-se em 2008 o livro, Medicina de Catástrofe – da Exemplificação Histórica à Iatroética, e o capítulo Medecine de Catastrophe et Feu Forêts do Manuel de Medicine de Catastrophe, editado em Paris em Janeiro de 2017, pelas Edições Lavoisier, sob a égide da Société Francaise de Medecine de Catastrophe.

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ARTIGO EM DESTAQUE Evacuações Sanitárias (EVASAN) As Evacuações sanitárias têm que ser devidamente reguladas, não podendo em circunstância alguma a vítima ser evacuada ao acaso sem se saber com exactidão para que estrutura de rectaguarda, e sem ter sido previamente observada e medicalizada, ou seja, deverá existir prioridade nos gestos terapêuticos. (Noto 2010a) Comunicações As comunicações constituem ontem como hoje um verdadeiro nó górdio no processo de socorro às vítimas (Ogrizek e Guillery 1997).

ceptibles de survivre, à la condition que les maisons soient construites en pierre ou en brique et non en bois, qui, évidemment, prend feu facilement. Les gens qui restent à la maison peuvent facilement contrôler les petits feux qui sont détectés. La meilleure mesure de protection est de rester dans la maison, en essayant de garder les portes et les fenêtres fermées en raison de la fumée et se en plaçant une chambre aussi loin que possible la direction d’où le feu se rapproche. Si la maison commence à brûler, on devrait pouvoir en sortir parce qu’en principe, le pire est passé. Cette consigne de sécurité est connue aux Etats-Unis, mise en œuvre régulièrement lors des feux de forêt.

Sistema Evolutivo Uma vez colocado no terreno o dispositivo de socorro sanitário, temos que ter sempre presente que o mesmo é evolutivo, ou seja, deve estar preparado para que, com o agravamento da situação, ele possa ser reforçado e, com uma melhoria da situação, ele possa ser desmobilizado proporcionalmente (Tavares 2010). Exemplo paradigmático é o fogo florestal, de que tivemos um exemplo gritante, ainda há bem pouco tempo. De acordo Bandeira et al.(2017): Le feu de forêt est mobile, le passage de l’incendie est rapide, il dure en moyenne de 3 à 5 minutes. De notre expérience personnelle, le PMA, doit être repositionné plusieurs fois comme c’ est arrivé dans l'incendie qui a eu lieu les jours 22.08.2005 à 26.08.2005, à environ 30Km ville de Porto, où 302 pompiers ont été impliqués, ayant brûlée 234.42 Hectares avec un grand nombre de victimes non graves. Les personnes qui se mettent en situation de supporter ce passage sont très sus-

A Iatroética face à Urgência Colectiva Assim, a Ética não é somente um código mas o trabalho de crítica a esse mesmo código; é a reflexão fundamental sobre o que existe no humano, confrontado com a questão do seu próprio agir e consequentemente a elucidação do homem enquanto responsável por aquilo que ele próprio e os seus semelhantes poderão executar. Nuno Grande definiu exemplarmente a Ética, como: "termo grego cujo significado se aproxima da moral, é, hoje, mais usado como código de comportamentos e das atitudes, como se tratasse da aplicação dos valores morais, em função de parâmetros culturais… Considero cultura a resultante dos saberes, hábitos e costumes que definem a identidade de um grupo populacional, de um povo ou de um conjunto de povos".

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E quanto nós, portugueses, "somos, de facto, um grande heterozigoto, onde se reconhecem factores das culturas judaico-cristã, romana e céltica". Presentemente a noção de Ética ou seja, a ciência da ordem, que o homem introduz nos seus atos voluntários ou morais, tem particular relevância na Medicina. Surge-nos assim em toda a sua dimensão a Iatroética, termo que perfiro ao de ética Médica, não só porque neste os elementos da sua formação são um de raiz grega e outro de raiz latina, mas também porque dadas as raízes helénicas da Medicina Ocidental, assume aquele uma maior clareza e propriedade de expressão. A medicina de catástrofe usa as técnicas da medicina de urgência e apela ao mesmo método de trabalho. Mas do ponto de vista ético, há uma situação conflitual e difícil por vezes de admitir, visto que em lugar da obstinação em salvar um caso sobre si, há que proceder a uma triagem criteriosa; em função dos meios disponíveis e do número de vítimas, permitir-se salvar no tempo mais curto com o mínimo de meios, os que apresentam condições clínicas para tal (Huguenard e Desfemmes 1989). Em síntese, alguns aspectos éticos da Medicina de Catástrofe, podem consignar-se como se refere (para revisão conceptual ver: Noto et al.1987; Baskett 1988; Silverstain e Jessie -Hackes 1988; Louville e Thevenet 1990; Manni 1990; Nicolay 1992): •

Impossibilidade da denegação da descrição. Informação criteriosa dos sinistrados e do público em geral, não podendo os médicos comprometer o direito do paciente à sua intimidade.

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ARTIGO EM DESTAQUE ———————————————•

Deve preparar-se pessoal e meios para a assistência às catástrofes em concomitância com a existência de planos prévios atempada e eficientemente. Dada a complexidade de que se reveste a Medicina de Catástrofe, pressupõe uma planificação aproximada da ideal e exige uma disciplina intelectual rigorosa por parte dos interventores.

Em situação de guerra ou de paz os imperativos éticos que se impõem ao médico são basicamente os mesmos, porque subjacente a um militar ou a um civil está sempre um Ser Humano.

Um médico deve abster-se de atuar em situações clínicas que ultrapassam as suas capacidades e competência. Porém, em momentos de urgência real e quando necessário, colocar-se numa posição defensiva, passa imperativamente a atuar com défice ético grave.

O amor-próprio e a auto-estima profissional devem ser ultrapassa-

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dos pela responsabilidade perante os pacientes que solicitam coletivamente os seus cuidados.

tratégia de cuidados. Nesta ordem de ideias à equipa deve exigir-se uma disciplina intelectual rigorosa.

Só devem ser evacuados os doentes com possibilidades de sobrevivência.

A pluralidade dos meios de intervenção pode levar a uma dispersão da noção de responsabilidade. Assim, esta deve estar devidamente codificada.

A análise objectiva dos factos em ordem à resolução de todos os problemas exige a competência global de todos os interventores, não se devendo privilegiar quem chegou primeiro "anterioridade de presença", mas sim os mais eficientes "anterioridade de competência".

A Iatroética em situações de catástrofe tem obrigatoriamente que se radicar em critérios clínicos rigorosos versus a capacidade de resposta terapêutica em função do número de pessoas sinistradas. Não pode ser encarada num plano pontual, mas global. Há, porém, que salvaguardar com prioridade, vítimas que real e efectivamente se salientem, como por exemplo, progenitores dignos de uma prole menor. A posição assumida pelo médico, será: para além da análise de cada caso clínico sobre si, encarar a totalidade das vítimas, como se de uma só vítima se tratasse, e, se tiver que "amputar" parte, fazê-lo para procurar salvar o todo.

A medicina de urgência colectiva implica homogeneidade nas atitudes terapêuticas. Deve ser, pois, normativa para ser eficaz e fiável.

As vítimas não têm livre escolha.

Os médicos têm uma capacidade de escolha limitada de meios e de es-

Aquilo que Albert Schweitzer chamou "a reverência perante a vida", tem uma grande expressão nos locais de acidente com inúmeros feridos. O nosso papel deverá ser o de maximizar o potencial de vida, com a limitação possível do sofrimento, mesmo quando a morte é inevitável (Königová 1993).

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ARTIGO EM DESTAQUE

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Uma Revisão da Literatura Paulo Oliveira Grupo de ECMO do Serviço de Medicina Intensiva (SMI) - Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) Diretor de Serviço: Prof. Jorge Pimentel Enfermeira Chefe: Eulália Ribeiro

A Extracorporeal Membrane Oxygenation (ECMO) constitui uma técnica de suporte de vida extracorporal, internacionalmente consagrada pela Extracorporeal Life Support (ECLS), tendo emergido da tecnologia inerente ao bypass cardiopulmonar. Esta técnica significa suporte cardiopulmonar temporário permitindo que o coração e/ou o pulmão recuperem de uma situação reversível perante o insucesso dos tratamentos convencionais (ELSO, 2010). Consiste na circulação artificial externa do sangue venoso, através de uma membrana permutadora de gases (oxigenador) extracorporal, na qual é fornecido oxigénio ao sangue e removido o dióxido de carbono (Zwischenberger & Bartlett, 2005). Difundiu-se em Portugal, aquando da pandemia resultante da infeção pelo vírus Influenzae A (H1N1) no ano de 2009, da qual resultaram inúmeros casos de ARDS (Acute Respiratory Distress Syndrome) grave. Atualmente, esta técnica de suporte é utilizada em doentes com falência respiratória aguda de diversas etiologias (ECMO VV), assim como, na falência cardíaca aguda (ECMO VA). Assim, além da ECMO a ECLS também apresenta outras terapias, como: ECPR: Extracorporeal Cardiopulmonary Resuscitation. ….” tem vindo a mostrar-se como uma boa técnica nas paragens cardiorrespiratórias refratárias às manobras de reanimação” (Branco, 2015). ECCO2R: Extracorporeal Carbon Dioxide Removal. Exclusivamente para remoção de CO2.

A

ECMO pode ser life saving para alguns doentes, acarretando um elevado risco de complicações (Farias, 2015). Complementarmente Buttery (2010) refere que apenas está indicado numa estreita faixa de doentes críticos, pelo que não é um tratamento muito frequente nas unidades de cuidados intensivos. MODALIDADES DE TERAPIA DE ECMO

.

O suporte de vida extracorporal está indicado quando a insuficiência pulmonar e/ou cardíaca não é passível de apoio convencional. O modo de apoio extracorporal é em grande parte impulsionado pela falência de órgãos específicos como os pulmões e/ou coração. Assim, existem dois tipos de modalidade ECMO, que são: 1.

ECMO - VenoVenoso (VV): Insuficiência respiratória (tipo I ou tipo II) com função cárdiocirculatória estável;

2.

ECMO – VenoArterial (VA): Falência cardíaca aguda, acompanhada ou não por falência respiratória Existe ainda uma técnica mista [ECMO – VenoArterialVenoso (VAV) ou VenoVenosoArterial (VVA)] que se aplica aos casos em que persista a hipoxemia ou o choque cardiogénico, respetivamente, após início de uma das técnicas anteriores .

Na modalidade ECMO VV, todo o circuito funciona em série com o sistema cardiopulmonar nativo, ou seja, o sangue é drenado, oxigenado, ventilado e devolvido à circulação venosa central, antes de atingir o ventrículo direito (Rees & Waldvogel, 2010). Geralmente esta modalidade envolve a canulação de duas veias, uma para drenar o sangue para o circuito (veia femoral) e outra para devolvê-lo ao doente (veia jugular), podendo por vezes ser utilizada apenas uma cânula de duplo lúmen, colocada através da veia jugular. Apesar de proporcionar um aumento da oxigenação da circulação coronária pela mistura de sangue oxigenado no sangue venoso, esta modalidade não apresenta suporte hemodinâmico direto, sendo necessário que a função cardíaca do doente esteja preservada para bombear a quantidade de sangue necessária para o circuito extracorporal (Rees & Waldvogel in Farias, 2015). Na modalidade ECMO VA a circulação venosa central também serve de pré-carga da bomba do circuito (tal como acontece na modalidade VV); no entanto, a cânula de retorno é colocada numa artéria (geralmente a femoral), criando assim um circuito de bypass, que funciona em paralelo com o sistema cardiopulmonar nativo (Rees & Waldvogel, 2010). Assim, a modalidade de suporte extracorporal utilizada depende, do órgão que se encontra em falência. A falência respiratória grave com estabilidade hemodinâmica pode ser suportada pelo modo VV, enquanto que no colapso hemodinâmico secundário o suporte mais indicado é o modo VA. PÁGINA

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Extracorporeal Membrane Oxygenation

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Atualmente, sabe-se que um dos maiores segredos no sucesso de uma terapia de ECMO está no timing da sua indicação (Merluzzi, Celullare e Poffo, 2012).

EQUIPAMENTO PARA TERAPIA DE ECMO O sistema ECMO consiste num circuito fechado, constituído por vários tubos, uma membrana de oxigenação artificial e uma bomba propulsora em que o sangue desoxigenado e com concentrações altas de dióxido de carbono é extraído do sistema venoso do doente e impulsionado por uma bomba centrífuga através de uma membrana de oxigenação artificial, retornando ao organismo com altas concentrações de oxigénio com um determinado fluxo (Vilma, 2013). .

Algumas das consolas mais utilizadas em ECMO são o ROTAFLOW® e o CARDIOHELP®, sendo esta última a mais indicada para transporte de doentes em ECMO, cujas dimensões e peso são reduzidas, aumentando a portabilidade e minimizam o espaço dentro da ambulância.

INDICAÇÕES E CONTRA INDICAÇÕES PARA ECMO

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As indicações para ECMO-VV ou ECCO2R de acordo com a ELSO (2017a) são: 1.

Insuficiência respiratória hipoxémica (qualquer causa) A.Risco mortalidade > 50% (considerar) ou PaO2/FIO2 < 150 com FiO2 > 90% /ou Score Murray 2-3 B. Risco mortalidade > 80% (indicado) ou PaO2/FiO2 <100 com FiO2 > Score Murray3-4 apesar de tratamento otimizado durante > 6h

90%

e

2. Insuficiência respiratória hipercápnica A. Hipercapnia permissiva (PaCO2 > 80 com PH<7,2) B. Incapacidade de ventilar com segurança (Pplat > 30 cmH2O) 3. Fístulas bronco-pleurais graves 4. Ponte para transplante pulmonar Figura 1 – ROTAFLOW® Fonte: https://www.maquet.com/ br/produtos/rotaflow-console/

5. Colapso cardíaco ou respiratório imediato As indicações para a ECMO-VA são:

Figura 2 – CARDIOHELP® Fonte: https://www.maquet.com/int/ products/cardiohelp-system/

1. Perfusão tecidual inadequada com hipotensão e baixo débito cardíaco apesar do volume intravascular adequado. 2. Choque cardiogénico refractário (EAM, miocardite, miocardiopatia pós-parto, insuficiência cardíaca descompensada, choque pós-miocardiotomia), apesar da administração de volume, inotrópios e vasoconstritores. 3. Choque séptico considerado indicação em alguns centros. Segundo as recomendações da ELSO (2017a) a maioria das contra indicações para a ECMO VV são relativas. Deve-se ponderar o risco do procedimento versus potencial benefício. .

Assim, as contra indicações Absolutas para a ECMO VV são: A. Imunossupressão farmacológica principal (ex: neutropenia < <400 / mm3) B. Hemorragia do SNC que é recente ou em expansão C. Co morbilidade com limitação da qualidade de vida (SNC) e mau prognóstico. D. VM “agressiva” (FiO2 > 90%; Pplat > 30 cmH2O) durante 7 dias ou mais. • A Idade não é uma contra-indicação, embora aumenta o risco com a idade.

Outro equipamento necessário para o inico da ECMO: .

• Misturador de Gases Shecrist® • Unidade de aquecimento HU 35 Maquet (mecanismo tipo contracorrente) • Oxigenador Quadrox PLS • Set de tubos PLS revestidos com Bioline Coating • Cânulas percutâneas HLS e respetivos kits de inserção • Unidade de emergência Rotaflow manual • Suporte para oxigenador de adulto e infantil • Creme de contacto ultrassónico • Botija de O2 para transporte do doente • Máquina e tubos de ACT • Ventilador do doente, • Bombas e Seringas de infusão de fluidos • Material de Monitorização.

• Todas as restantes situações deverão ser discutidas pela equipa ECMO. .

As contra indicações absolutas para a ECMO VA são: A. Coração irreparável e não candidato para transplante ou VAD B. Idade avançada C. Disfunção orgânica crônica (enfisema, cirrose, insuficiência renal) D. Compliance (limitações cognitivas, psicológicas ou sociais) E. RCP prolongada sem perfusão tecidual adequada. .

As contra indicações relativas para a ECMO VA A. Anticoagulação

são:

B. Idade avançada C. Obesidade

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COMPLICAÇÕES CLINICAS E MECÂNICAS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Complicações envolvendo o circuito de ECLS, podem ser dramáticas pelo risco de vida para o doente e exigem respostas imediatas. Embora sejam raras e geralmente evitáveis. Segundo Nicoletti e Ferrari (2014), as complicações mais frequentes poderão ser Clinicas e Mecânicas.

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Clinicas A. Hematológicas (36,89%) B. Neurológicas (8,85%) C. Vasculares (16,2%) D. Renais (40,31%) E. Infeção (13,98%) F. Outras: a. Cardiopulmonares

Mecânicas (20,16%) A. Falência da bomba B. Descanulação C. Rotura do circuito D. Embolia gasosa (presença de ar no circuito) E. Coagulopatia de consumo (presença de coágulos no circuito) F. Paragem cardíaca G. Falência do oxigenador

MORTALIDADE E MORBILIDADE

Dos 27.273 casos de ECMO em adultos registados na ELSO (2017b), 13.712 dependeram da modalidade ECMO VV (sobrevida de 66%); 12.566 da modalidade ECMO VA (sobrevida de 57%); e 995 casos em ECPR (sobrevida de 39%). No SMI – CHUC a taxa de sobrevida ronda os 60 % na modalidade ECMO VV. Relativamente à morbilidade dos doentes que sobreviveram ao ECMO, Vilma (2013) refere o transtorno de deficit de atenção, dificuldades académicas em doentes em idade escolar e a maior parte, deficits neuromotores (hipotonia). Para Buttery (2010) é importante que se tenha consciência de que: … a ECMO em si não é curativa, permitindo apenas que os pulmões e/ou o coração possam repousar e recuperar de um processo patológico reversível.

ALVES et al. (2016) – Manual Elaborado para o Curso de ECMO. Associação de Apoio ao Serviço de Cuidados Intensivos (ASCI) do Centro Hospitalar do Porto. Com apoio da MAQUET – Getinge Group. BRANCO, Mário (2015) - Potencial da ressuscitação cardiopulmonar assistida por ECMO na emergência pré-hospitalar. II Mestrado em enfermagem de médico-cirúrgica: a pessoa em situação crítica. Trabalho efetuado sob a orientação do Professor Doutor Luís Graça. Escola Superior de Saúde. Viana do Castelo, Abril de 2015. BUTTERY, J. (2010). ECMO - Nursing Care and Responsibilities. South Australia: Royal Adelaide Hospital. ELSO (Extracorporeal Life Support Organization).. (2010). Guidelines for Training and Continuing Education of ECMO Specialists version 1.5. Obtido de https://www.elso.org/Portals/0/IGD/Archive/FileManager/ 97000963d6cusersshyerdocumentselsoguidelinesfortrainingandcontinuingeducationofecmospecialists.pdf ELSO (Extracorporeal Life Support Organization).(2017a). Guidelines for Adult Respiratory Failure August, 2017. Obtido de: https:// www.elso.org/Portals/0/ELSO%20Guidelines%20For%20Adult% 20Respiratory%20Failure%201_4.pd ELSO (Extracorporeal Life Support Organization).(2017b). ECLS Registry Report. International Summary Extracorporeal Life Support Organization. Obtido de: https://www.elso.org/Registry/Statistics.aspx FARIAS, A. C. A. (2015) - Cuidado de enfermagem especializado à pessoa dependente de oxigenação por membrana extracorporal (ECMO). Curso de Mestrado em Enfermagem Área de Especialização Pessoa em Situação Crítica. ESEL – Escola Superior de Enfermagem de Lisboa. https://www.maquet.com/br/produtos/rotaflow-console/ https://www.maquet.com/int/products/cardiohelp-system/ MERLUZZI, T. G. S., CELULLARE, A. L.; POFFO, R. (2012) - Oxigenação extracorpórea por membranas (ECMO): uma terapia subutilizada? Educ Contin Saúde einstein. 2012;10(4):186-8 (PDF Download Available). Available from: https://www.researchgate.net/Publication/256094106 _Oxigenacao_extracorporea_por_membranas_ECMO_uma_terapia_sub utilizada [accessed Sep 22, 2017]. NICOLETTI, A. M.; FERRARI, D. (2014). Extracorporeal Membrane Oxigenation (ECMO): Principais Complicações e Implantação de Checklist para Segurança do Paciente. REES, N. J., & WALDVOGEL, J. (2010). Extracorporeal Life Support (ECLS) Physiology. Em B. L.Short, & L. Williams (Edits.), ECMO Specialist Training Manual Third Edition (pp. 37-48). Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal Life Support Organization. VILMA, DOMINGUES DA SILVA (2013) – ECMO – Aspectos Clínicos e Técnicos. Sociedade Brasileira de Terapia Intensiva – SOBRATI. São Paulo, Novembro ZWISCHENBERGER, J. B., & BARTLETT, R. H. (2005). Extracorporeal Life Support: An Overview. Em K. V. Meurs, K. P. Lally, G. Peek, & J. Zwischenberger (Edits.), ECMO: Extracorporeal Cardiopulmonary Support in Critical Care 3rd Edition (pp. 1-4). Ann Arbor, Michigan: Extracorporeal Life Support Organization.

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O grande Queimado: Abordagem e assistência emergentes

Tiago Amaral Enfermeiro Especialista | Mestre Urgência Geral Polivalente e VMER do Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE (Hospital São José) Criador do curso SAVQueimados

pessoa grande queimada continua a ser o parente pobre do trauma tanto a ní-

vel pré-hospitalar como intra-hospitalar.

No ano de 2011 foram admitidas 52 pessoas grandes queimadas na sala de trauma da Urgência Geral Polivalente do Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE (Hospital São José), sendo que se apurou, entre outros, que em apenas 31% dos casos existia registo da totalidade da fluidoterapia instituída desde o pré-hospitalar até entrada na Unidade de Queimados3. Tendo em conta que a definição de grande queimado se caracteriza por uma área de superfície corporal queimada (ASCQ) > 20% em adultos e > 10% em crianças, a partir da qual se despoleta a resposta inflamatória sistémica e consequente necessidade de ressuscitação volémica adequada para evitar a lesão de órgão, torna-se premente melhorar a assistênciiaa por forma a diminuir a mortalidade e a morbilidade 2,3,4,6.

Fotografia: Pedro Rodrigues Silva

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O Grande Queimado

Por ser uma área muito específica do trauma surgiu a necessidade de se desenvolverem produtos pedagógicos dirigidos, complementares a programas como o ITLS, ATLS/ATCN, ETC ou TNCC, como são o caso do EMSB, do ABLS e SAVQ nas realidades neozelandesa, americana e portuguesa, respetivamente4,6. Enquanto o tratamento definitivo de uma vítima de trauma penetrante ou contuso passa pelo bloco operatório e todos os minutos contam, relativamente ao grande queimado não existe o conceito de “golden hour”. Isto porque as alterações fisiopatológicas acontecem com algum atraso embora se defenda que, uma vez instituídas, são complexas e de longa duração, afetando todo o organismo. Torna-se portanto mais importante uma correta avaliação, instituição e gestão do tratamento do que o transporte imediato para um centro de trauma e/ou centro de queimados10.

A European Burn Association (EBA) refere que o cuidado ao queimado é um processo complexo e contínuo. Segundo esta associação, o principal objetivo do cuidado é assegurar uma ótima ressuscitação no período de emergência e, numa segunda fase, alcançar a reepitelização da pele lesada ou destruída. Cingindo-nos ao período de emergência, e tendo em consideração as recomendações da EBA, a abordagem, neste período, assenta em 5 princípios: a) Primeiros socorros; b) Cuidados préhospitalares; c) Transporte para a unidade hospitalar adequada; d) Gestão do período de emergência; e) Prevenção de complicações4,7.

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Com o intuito de melhorar o prognóstico das pessoas vítimas de trauma em geral, e em específico o trauma por queimadura, a Direção Geral de Saúde emanou várias circulares (disponíveis para consulta e download em www.savqueimados.pt). Sabemos que cerca de 5% das pessoas com grandes queimaduras sofre trauma severo associado, muitas vezes com risco de vida, como por exemplo trauma torácico fechado, lesões abdominais ou fraturas causados por uma corrente elétrica elevada. A assistência deste tipo de trauma associado tem prioridade sobre a ferida por queimaduras, não devendo o profissional deixar-se distrair pelo efeito visual causado por estas3. A pessoa grande queimada, assim como qualquer outra pessoa vítima de trauma, é abordada segundo o protocolo ABCDE preconizado pelo ATLS5. No entanto, é de salientar a particularidade da pessoa com grandes queimaduras que se expressa na adição do F a este protocolo ABCDE.

Não se pretende uma abordagem exaustiva ao nível da avaliação inicial e da avaliação secundária. Pretende-se salientar apenas algumas particularidades da assistência à pessoa vítima de queimadura4,6 para além do já definido na abordagem universal do ATLS. Assim:

AVALIAÇÃO INICIAL Airway / Via Aérea com controlo cervical

Breathe / Ventilação

No caso de não ser possível manter a via aérea (VA) permeável ou em que está presente estridor, proceder de imediato à entubação endotraqueal (EET) e colocar capnógrafo; b) antecipar a necessidade de cricotirotomia, se indicado; c) ponderar colocar colar cervical.

a) Verificar se a expansão torácica é a adequada e simétrica, despistando queimaduras circunferenciais do tórax (escarotomia emergente se restringirem ventilação); b) Despistar queimadura da VA, tendo em conta o Índice de Clark (Tabela 1), que nos indica uma presumível lesão da VA, caso o score total seja igual ou superior a 2; c) Caso anteriormente ainda não se tenha procedido à entubação endotraqueal (realizada de imediato na presença de estridor), e se o score for igual ou superior a 2, ponderar agora a entubação traqueal; d) Inserção de sonda gástrica após EET e na pessoa com grandes queimaduras ou se existirem outras lesões associadas que o justifiquem; a gastroparésia é comum; e) Caso não se justifique a entubação endotraqueal, deverá administrarse oxigénio a 15 L/min por máscara de alto débito (relembrar que a intoxicação por monóxido de carbono poderá dar um aspeto rosado à pele); f) despistar eventual intoxicação por cianeto e assegurar kits de hidroxocobalamina tanto a nível hospitalar como pré-hospitalar.

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Exposure / Exposição c/ controlo da temperatura a) Retirar toda a roupa da vítima, jóias, piercings e relógio; b) Manter temperatura: aquecer ambiente e vítima; c) Efetuar rolamento para examinar o dorso; d) Verificar se o arrefecimento foi efetuado aquando dos primeiros socorros (este arrefecimento deverá ser efetuado com água fria corrente, com uma temperatura cujo intervalo de referência vai dos 8°C aos 25°C, durante 20 minutos, a não ser que outros fatores o impeçam, como por exemplo, a hipotermia, várias feridas ou não ter pessoas disponíveis para o fazer por um período tão longo. Nesse caso, o arrefecimento deverá ser efetuado, numa primeira fase, por um período de 3-5 minutos. Este é efetivo até 3 horas após a queimadura. O correto arrefecimento das queimaduras faz a diferença no outcome tecidular resgatando a zona de estase; e) colocar barreira estéril; f) Calcular ASCQ pela Regra dos Nove (Walace) Tabela 1:

Índice de Clark

Fonte: Almeida & Trindade (2017): 36

Fluid resuscitation proportional to burn size / Ressuscitação por fluidos proporcional à área queimada

Circulation / Circulação a) Frequências cardíacas de 100-120 b.p.min. são consideradas dentro dos limites normais, dado o aumento de catecolaminas em resposta à queimadura térmica. Uma frequência cardíaca superior a 120 b.p.m. deverá levantar suspeitas, nomeadamente de hipovolémia, outro trauma ou inadequada gestão da dor (recorrentemente subtratada); b) O aparecimento precoce de sinais de choque é, muitas vezes, associado a outras causas que não a queimadura. Identifique-as e trate-as; c) Avaliar o tempo de preenchimento capilar. Se for superior a 2’’ poderá indicar hipovolémia ou necessidade de escarotomia no membro onde se está a proceder à avaliação; d) Reavaliar noutro membro ou centralmente. Atenção que, em casos de hipotermia, este valor também poderá estar aumentado; e) Realizar ECG, se pertinente (Ex: lesões elétricas); f) Inserir dois acessos venosos periféricos de grande calibre. Na impossibilidade, obter acesso intra-ósseo ou acesso venoso central. Deverão ser colocados, preferencialmente, sobre a área não queimada. Contudo, e se necessário, podem ser colocados com segurança através da pele queimada; g) Para além das habituais análises sanguíneas em caso de trauma (realça-se a Beta HCG muitas vezes negligenciada) obter valores de carboxihemoglobinémia através de uma gasimetria; h) Despistar queimaduras circunferenciais dos membros.

Os fluidos são calculados usando a Fórmula de Parkland modificada (Tabela 2) sendo que metade do fluido calculado é administrado nas primeiras 8 horas; o remanescente é administrado nas 16 horas seguintes; b) a hora da queimadura marca o início da ressuscitação por fluidos; c) Monitorizar a adequação da ressuscitação através de medicação do débito urinário horário com a ajuda de catéter urinário tendo como objetivo 0,5-1 ml/kg/h (a algaliação deve ser efetuada sem demoras nas queimaduras do períneo). Ter em atenção que um excesso de fluidoterapia pode levar ao fluid creep que se caracteriza por um edema exagerado e mais precoce, incluindo edema VA e obrigando a EET, hipertensão intra-abdominal, edema pulmonar, hipoperfusão grave dos membros queimados, entre outros.

Disability / Disfunção neurológica a) Estar ciente que a hipoxémia e o choque podem causar ansiedade e agitação ou diminuição do nível consciência, assim como uma lesão ocupante de espaço intra-craneano ou uma intoxicação por abuso de drogas ou álcool.

Tabela 2: Fórmula

de Parkland modificada.

Fonte: Amaral (2017): 28

Fotog

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rafia:

O Grande Queimado

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AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA Quanto à avaliação secundária considera-se o CHAMU: C – circunstâncias do acidente; H – história clínica anterior; A – alergias; M – medicação; U - Última refeição. C – Circunstâncias do Acidente: a) Deverão ser considerados inúmeros aspetos, destacando: 1) Tipo de material da roupa vestida; 2) Temperatura e o tipo de fluido, se escaldadura; 3) Duração da exposição; 4) Averiguar se o evento foi em ambiente fechado; 5) Adequação dos primeiros socorros; 6) Averiguar a existência de explosão, se houve projeção (distância) e consequente descrição da forma do embate do corpo sobre a superfície.

Exame Objetivo cabeça-pés Cabeça • Avaliar acuidade visual. • Avaliar a presença de fuligem, flictenas, queimadura de faneras, edema da língua ou glote. • Remover lentes de contacto.

Pescoço O tratamento definitivo à pessoa com grandes queimaduras deverá ser efetuado em local apropriado. Por forma a termos o doente certo, no tempo certo, no local certo, é imprescindível ter em conta as indicações e procedimentos de referenciação a nível nacional (Tabela 3 ).

Despistar rouquidão ou mudança na voz.

Tórax • Queimaduras circunferenciais poderão necessitar de escarotomia, se restringirem ventilação. • Despistar tosse com fuligem.

Membros • Avaliar pulsos das extremidades regularmente. No caso de haver queimaduras circunferenciais, ter em consideração que se desenvolverá edema, consequente obstrução do retorno venoso e arterial, conduzindo à isquémia. Esta situação apresenta os sinais de alerta clássicos de diminuição de perfusão do membro: dor profunda em repouso, dor em movimento passivo das articulações distais, perda de circulação distal, palidez, perda de retorno capilar (especialmente nas unhas), pele fria, diminuição na pressão de pulso, perda de pulsos palpáveis distalmente à lesão, parestesias e diminuição da saturação periférica de oxigénio. Na presença destes sinais, está indicada escarotomia. Importante salientar que por cada cm de elevação do(s) membro(s) afetado(s) durante o transporte ou qualquer fase do continuum até à UQ, diminui em 0,8 mmHg a pressão de compartimento podendo, por este facto, fazer a diferença no que diz respeito à viabilidade do(s) mesmo(s). No exame secundário considerar ainda:

Em resumo, a adesão a este tipo de protocolo garante que todas as vítimas, independentemente da gravidade ou do tipo de lesão, estão tão estáveis quanto possível, antes do transporte (primário ou secundário). Por outro lado, são evitadas lacunas na transição de informação entre serviços. São recomendadas algumas medidas preventivas de complicações que passam por: a) passagem formal à equipa de transporte dos dados clínicos do doente; b) entrega de toda a documentação e registos no hospital de destino; c) realização de registos, com intervalos adequados, da situação clínica do doente, nomeadamente todas as alterações ou terapêuticas administradas. Após a decisão de se efetivar o transporte, quer seja primário ou secundário, existe a necessidade de um planeamento e efetivação, que contemple todos os aspetos de modo a assegurar a continuidade de cuidados11. A continuidade de cuidados constitui-se como um elemento fundamental para garantir a qualidade. Até porque, a sua ausência, pode colocar em causa a eficácia e eficiência desses mesmos cuidados podendo levar a um aumento das taxas de mortalidade e morbilidade e, consequentemente, em perdas em saúde1.

• Administração da profilaxia do tétano . 2. Algoritmo de Suporte Avançado de Vida Pediátrico (Guidelines ERC 2015) Tabela PÁGINA

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vanced Trauma Life Support. Suporte Avançado de Vida no Trauma para Médicos. EUA: ACS Committee on Trauma. ISBN 13: 978-1-880696-02-6 6. ANZBA - Australian and New Zealand Burn Association (15ª Ed.) (2012) Emergency Management of Severe Burns (EMSB) Course Manual, UK version for the British Burn Association. Albany Creek, Australia: ANZBA. 7. European Burn Association (2015) European Practice Guidelines for Burn Care. Minimum level of Burn Care provision in Europe. Version 3. Hannover: EBA Congress. Disponível em: http://euroburn.org/wp-content/ uploads/2016/04/EBA-Guidelines-Version-3-2015.pdf 8. Martins & Amaral (2017). Organização e assistência à pesTabela 3: Resumo das indicações de referenciação Fonte: Martins & Amaral (2017): 9

soa vítima de queimadura. In Amaral T. (Eds), SAVQ – Suporte Avançado de Vida em Queimados: Manual do Curso (2ª Ed.) (pp. 9). Portugal: Tiago Manuel Ferreira do Amaral. ISBN: 978-989-20-7669-0

BIBLIOGRAFIA

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11. Ordem dos Médicos e SPCI (2008) Transportes de Doentes Críticos: Recomendações 2008. Disponível em http://www.spci.pt/Docs/GuiaTransporte/9764_miolo.pdf

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4. Amaral (2017). Abordagem e assistência emergentes. In Amaral T. (Eds), SAVQ – Suporte Avançado de Vida em Queimados: Manual do Curso (2ª Ed.) (pp. 28). Portugal: Tiago

Enfermeiro Especialista | Mestre Urgência Geral Polivalente e VMER do Centro Hospitalar de Lisboa Central,

Manuel Ferreira do Amaral. ISBN: 978-989-20-7669-0

EPE (Hospital São José) Criador do curso SAVQueimados

5. American College of Surgeons (9ª Ed.) (2012) ATLS – AdPÁGINA

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Traumatismo craneo-encefálico no pré-hospitalar: Fazemos o correcto? Daniel N1, Sílvia F2 1

Serviço Medicina Intensiva 1 CHUA Faro, VMER Faro e Albufeira

2 Serviço Medicina Intensiva 1 CHUA Faro

Introdução e Objectivos O Traumatismo Crânio Encefálico (TCE) constitui um problema de saúde e socio-económico a nível mundial, tornando-se essencial conhecer a epidemiologia, incidência e outcome do mesmo.1 A incidência do TCE por 100,000 habitantes oscila entre (1299 casos, 95% CI 650-1947) na América do Norte, (1012 casos, 95% CI 911-1113) em Europa, (801 casos, 95% CI 732-871) em África 2 As previsões da World Health Organization para 2020 apontam o TCE como uma das causas mais importante de morte e disfunção cerebral grave. Na Europa este problema tem um custo na saúde anual superior a 33 biliões de euros.

da ao TCE grave é alta, pelo que devemos diferenciar a mortalidade resultante das lesões primarias (acontece no momento do traumatismo) e a mortalidade resultante das lesões secundárias (devidas à diminuição da pressão arterial que provoca hipotensão arterial, diminuição da perfusão cerebral e diminuição da oxigenação). O pré-hospitalar terá um papel primordial, nomeadamente: a identificação de situações que possam colocar de forma imediata, em risco de vida ao doente (sinais clínicos de hipertensão intracraniana, herniação cerebral); o tratamento e prevenção das lesões secundárias por hipoperfusão cerebral e ou por hipotensão arterial; a estabilização do doente durante o transporte e a escolha do centro "útil" para onde transportar o doente.3,4

Por outro lado, sabemos que a mortalidade associaFotografia: Pedro Rodrigues Silva

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Traumatismo craneo-encefálico no pré-hospitalar

MATERIAL E METODOS Com este trabalho pretendemos dar resposta a varias questões: 

Como devemos tratar um doente com TCE no préhospitalar ?

Podemos mudar a nossa forma de trabalhar ?

Para poder responder a estas questões suportámos-nos, na evidência científica atual, entre outros, no estudo realizado por Olivier Hoogmartens MSc et al.5. Estes autores analisaram 1753 trabalhos (dos quais 12 eram guidelines clínicas) para o tratamento do doente com TCE grave e desta análise, emanaram 21 recomendações para a abordagem préhospitalar dos doentes com TCE grave.

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2 a 5. Evitar hipoxemia no TCE grave. Via aérea avançada no TCE grave. Oximetria de pulso e monitorização contínua da capnografia (CO2 end tidal). Estas recomendações enquadram-se dentro da observação, correção e estabilização da via aérea e oxigenação (A - Airway e B - Breathing).

Evitar a hipoxemia Alguns estudos casos-control concluem que a hipoxemia e a hipotensão no TCE conduzem a um pior outcome neurológico e aumento da mortalidade 6,7,8 Stocchetti N et al. já em 1996, relacionaram mortalidade e disfunção cerebral grave com nível de SatO2 mantido depois dum TCE grave 9.

Tabela 1. Recomendações para o prehospitalar em doentes com TCE grave

Tabela 2. Relação nível SatO2 - Mortalidade - Disfunção Cerebral

5

(Adaptado de Olivier Hoogmartens )

(Adaptado e traduzido de Stocchetti N et al.9)

1

Controlo da hemorragia exanguinante

2

Evitar hipoxemia

3

Via aérea avançada

4

Oximetria de pulso

5

Monitorização por capnografia (CO2end tidal)

6

Controlo e estabilização da coluna cervical

7

Controlo da Pressão Arterial (PA)

8

Fluidoterapia

9

Reflexo pupilar

Então que fazemos ?

10

Escala de Coma Glasgow (ECG)

11

Tratamento da Hipertensão Intracraniana (HIC)

12

Hiperventilação

13

Tratamento com antiepilépticos

No pré-hospitalar devemos manter aporte de O2 suficiente na fase de estabilização e durante o transporte para garantir SatO2 > 90 %

14

Controlo da dor

15

Controlo da Temperatura

Via aérea avançada

16

Controlo da glicemia

17

Uso de corticoides

Outra questão pertinente. Entubação orotraqueal nos doentes com TCE grave no pre-hospitalar ?

18

Uso de bloqueadores neuromusculares

19

Transporte prehospitalar

20

Comunicação

21

Treinos do pessoal de emergência

SatO2

Mortalidade

Disfunção Cerebral Graves

> 90%

14.3 %

4.8 %

60 - 90 %

27.3 %

27.3 %

< 60 %

50 %

50 %

Segundo as orientações da American Congress of Rehabilitation Medicine, define-se o TCE ligeiro como aquele que apresenta um valor na Escala Coma de Glasgow (ECG) superior a 13 pontos; TCE moderado aquele com um valor na ECG entre 9 e 12 pontos e TCE grave quando o valor na ECG é inferior a 9 pontos.

1. Controlo da hemorragia exanguinante O nosso bom senso, leva-nos ao facto de ter que controlar qualquer hemorragia exanguinante, depois de confirmar que as condições de segurança estão garantidas.

Winchel RJ et al.10,13 num estudo retrospetivo realizado com 1000 doentes com TCE e o valor na ECG < 9 observou que 75% destes doentes que foram entubados no préhospitalar sobreviveram. Fotografia: Pedro Rodrigues Silva

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Então que fazemos ?

7 e 8. Controlo da PA e fluidoterapia

Nos doentes com um valor na ECG < 9, que depois de exame primário e secundário não se consegue obter proteção da via aérea de forma segura nem obtemos SatO2 > 90% a pesar de oxigenoterapia adequada, deveriam ser entubados13. Uma vez entubados estes doentes não devem ser hiperventilados, devem estar com monitorização continua da capnografia (EndTidal CO2) mantendo valores entre 35 - 40 mm Hg)13. 6. Controlo e estabilização da coluna cervical A associação de TCE e lesão raquimedular oscila entre 5 - 15%14 Existem fatores que podem aumentar o risco de lesão raquimedular cervical no TCE, assim Tomoko Fujii et al. 15 encontraram maior risco de lesão cervical nos doentes com TCE grave mais idosos, com fratura do crânio ou facial, com fratura ou luxação de outras partes da coluna vertebral, traumatismo torácico, traumatismo membros superiores e hipotensão. Então que fazemos ?

Deveríamos manter controlo e estabilização da coluna cervical no TCE grave até avaliação clínica e imagiológica no Hospital de referência.

Estas recomendações relacionam-se com a observação, correção e estabilização da circulação (C - Circulation). Já foi referido que hipotensão no doente com TCE grave pode aumentar a mortalidade. Questionamo-nos qual seria o valor ideal de Pressão Arterial Sistólica (PAS) nestes doentes? Gordon F et al.16 realizaram um estudo cohorte multicéntrico que englobava mais de 5000 doentes. Demostraram que a mortalidade era uma vez e meia maior nos doentes com valores PAS < 120 mm Hg, duas vezes maior se PAS < 100 mm Hg, o triplo se PAS < 90 mm Hg e seis vezes maior se PAS < 70 mm Hg a entrada do hospital. Nancy Carney et al. realizaram para a Brain Trauma Fundation as "Guidelines for the management of severe traumatic brain injury", fourth edition (2017)17. Estas sugerem, com nível de evidência baixo, que os doentes entre 50 - 69 anos deveriam manter PAS > 100 mm Hg assim como os doentes entre 15 - 49 anos e os > 70 anos deveriam manter PAS > 110 mm Hg para reduzir a mortalidade e obter melhor outcome neurológico. A fluidoterapia no doente neurocrítico é fundamental, na fase inicial de ressuscitação, na fase de manutenção e no controlo das intercorrências como acontece na situação de hipertensão intracraniana (HIC). Mauro O. et al.18 realizaram em 2018 um consensus sobre fluidoterapia nos doentes neurocríticos. Assim na fase de ressuscitação os autores sugerem, (recomendação fraca), a utilização de cristaloides. Na fase de manutenção recomendam, (recomendação forte), o uso de cristaloides e não recomendam a utilização de albumina, soluções hipotónicas e coloides. Contudo algumas questões permanecem sem resposta. Qual o volume de ressuscitação a ser efetuado no préhospitalar?. Que acontece com o edema cerebral ?. Todos os indivíduos reagem de igual modo à fluidoterapia? Estas respostas são difíceis de obter e a literatura não é consensual. Sabemos que nos doentes com choque séptico, a literatura indica-nos a existência de bons respondedores e maus respondedores aos fluidos. Também vemos como a quantidade de fluidos que precisam para estabilizar pode ser dife-

Fotografia: Pedro Pedro Rodrigues Rodrigues Silva Silva Fotografia:

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Está consciente ? Qual é o tamanho das pupilar e fotoreatividade ? Qual é o valor na ECG ? Existem sinais de HIC ou herniação cerebral ? Como tratamos no pré-hospitalar a HIC ?

A primeira pergunta bastará só com uma estimulação verbal e tátil "controlada" (atenção se se suspeitar de lesão vertebro medular), para verificar se a vítima está consciente. O tamanho das pupilas é normal entre 2 e 5 mm. Uma diferença maior de 1 mm no tamanho das duas pupilas será definida como anisocoria. Uma pupila de forma dilatada poderá indicar compressão do III par craniano e esta ser devida à HIC19. Por outra parte, devemos avaliar a fotoreatividade pupilar. Uma resposta "brisk" (viva) é considerada normal uma resposta "sluggish" (lenta) ou não resposta poderá indicar incremento da pressão intracraniana 19. Uma pupila midriática e sem resposta à luz com a outra pupila normal em forma e resposta, poderá-nos fazer pensar no TCE com herniação uncal. Pupilas mióticas bilateralmente sem fotoreatividade poderão ser indicadoras de uma hemorragia pontina. Pupilas bilateralmente midriáticas e sem resposta à luz poderá indicar herniação transtentorial.

@Luisa Melão

Neurological Pupil index (NPi) é uma medida sensível de reatividade pupilar utilizado por Jeff W Chen et al.20 Parece existir uma relação inversa entre a diminuição deste valor e o aumento da PIC.

rente de um indivíduo para outro. Será que no TCE grave pode acontecer uma situação similar?

Qual é o valor na ECG ?

O que sim é obvio é que deve-se evitar as lesões secundárias a hipotensão.

Teasdale e Jennett desenvolveram em 1974 a ECG com o objetivo de avaliar o nível de consciência 21

Então que fazemos ?

Devemos administrar soros cristaloides para evitar valores de PAS < 100 mm Hg até a chegada ao Hospital de referência. Vigiar o aparecimento das sinais de HIC e edema cerebral, e tratar se estas aparecem. 9 a 12. Pesquisa do reflexo pupilar. Avaliação da ECG. Sinais de HIC, Hiperventilar no TCE grave ? Estas ações estão relacionadas com a observação, correção e estabilização neurológica (D - Disability) Pretendemos responder no pré-hospitalar as seguintes questões:

S Sobuwa et al.22 realizaram um estudo onde utilizando a reatividade pupilar bilateral, ECG (6-8) e SpO2 > 90% mostraram como estes parâmetros podem ser preditores de outcome positivo nos doentes com TCE grave. Neste estudo conclui-se que o valor do Glasgow no local do TCE seria a variável mais sensível. Outros estudos mostraram que a avaliação motora da determinação da ECG (mECG) nas primeiras 24 horas pós trauma, será o melhor preditor de morte nos doentes com TCE grave. 23 No entanto, poderão existir outros fatores que possam alterar o valor real do mECG (consumo de álcool, drogas, choque etc). Surge então o conceito "highest mECG" este conceito será mais puro e sem vieses. Kimura A et al.24 utilizou o reverse shock index (rSI) (calculado dividindo a PAS pela frequência cardíaca), multiplicado pelo valor da ECG obtemos o (rSIG).

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Dividindo rSIG pela idade do doente (A) obtemos (rSIG/A).

mm Hg nos doentes com sinais de HIC.

Estes dois scores poderiam ser os melhores preditores de mortalidade intra-hospitalar.

Devemos ter especial atenção às situações que envolvem doentes < 40 anos, alterações motoras posturais uni ou bilateral e PAS < 90 mm Hg.

Será que no pré-hospitalar este score pode ser útil ?

Tratamento com antiepilépticos. Controlo da dor, da temperatura e da glicemia.

Existem sinais de HIC ou herniação cerebral ? Situações que levem ao aumento do volume sanguíneo cerebral ou aumento da produção de líquido cefalorraquidiano (LCR) ou a diminuição do clearance do LCR podem provocar HIC.25,26 Um aumento da PIC pode levar a redução do fluxo sangüíneo do territorio cerebral provocando isquemia e consequentemente lesões secundárias. No pré-hospitalar devido a ausencia de aparelhos que nos possam ajudar a medir a PIC obriga-nos a basearmo-nos na clínica, assim a queda de dois ou mais pontos no valor de ECG nos tem que fazer suspeitar a existência de HIC 27 O aparecimento de sinais da tríade de Cushing (bradicardia, HTA e padrão respiratório irregular) também nos deve fazer pensar na hipótese de existir HIC. Tetsuya Yumoto et al.28 realizou um estudo observacional utilizando os dados do Japan Trauma Data Bank entre 2010 e 2014. Estes autores concluiram que aqueles doentes que apresentavam sinais de Cushing no pré-hospitalar assim como alteração do nivel de consciência (parte ocular do ECG de 1) poderia ser considerado como um fraco, mas importante preditor, da necessidade emergente de intervenção neurocirúrgica. Outras sinais que nos devem alertar já foram comentadas previamente: alteração na forma pupilar ou alterações na resposta da pupila aos estímulos luminosos.

Hiperventilar ? Muito controverso apenas em situações temporarias quando existe HIC sem resposta a outras terapêuticas instituidas e sempre evitando SatO2 < 90% e/ou PAS < 90 mm Hg13 Então que fazemos ?

As recomendações atuais17, "guidelines for the management of severe traumatic brain injury, fourth edition", em relação ao tratamento da HIC ainda não estão suportadas pela evidência científica de forma forte. Devemos estabilizar o doente a nível respiratório e hemodinámico. Devemos sedar e analgesiar ao doente de forma correta.

13. Devemos tratar os doentes com TCE grave no préhospitalar com antiepilépticos ? Cerca de 12% dos doentes que sofreram TCE grave podem convulsivar na primeira semana após o trauma. Existem situações de manifestações subclínicas detetadas por eletroencefalograma (EEG) 17. Sabemos que existem fatores que podem ser considerados como de risco para sofrer convulsão pós TCE: (ECG menor de 10, amnesia pós-trauma com uma duração maior de 30 minutos, fratura de crânio lineal ou com afundamento, existência de hematomas epi ou subdural, existência de ferida penetrante no crânio, vítima com mais de 65 anos ou historia previa de alcoolismo crónico 30 A literatura atualmente não recomendam a utilização profilática de fenitoína ou valproato para prevenir as convulsões pós traumáticas tardias17 Inaba K et al. 31 realizaram um estudo prospetivo com 813 doentes demostrando que não existia diferença na frequência do aparecimento das convulsões precoces ou mortalidade quando usado fenitoína ou levetiracetam.

14. Controlo da dor num doente com TCE ? A utilização de anestésicos e analgésicos no doente com TCE está indicado no controlo da HIC e convulsões. 32-34 Estes fármacos podem deprimir o metabolismo do cérebro e o consumo de O233-35. Mas atenção, podem existir efeitos adversos tais como hipotensão, diminuição do débito cardíaco, aumento do shunt pulmonar e posteriormente hipoxia que leva a lesões secundárias cerebrais 33.

15. Controlar a Temperatura no TCE. Muitas publicações que mostravam o beneficio da hipotermia nas situações pós paragem cardiorrespiratória (PCR), pela sua neuroprotecção,6,37atualmente com novos estudos colocam em dúvida o beneficio da hipotermina pós PCR e estimulam a manutenção de normotermia nestes doentes. Por outro lado, a hipotermia pode provocar alterações na coagulação, disritmia e imunossupressão38

Utilizar terapêutica hiperosmolar com manitol ou solução salina hipertónica e evitar PAS < 90

Atualmente sabemos que a indução precoce de hipoFotografia: Pedro Pedro Rodrigues Rodrigues Silva Silva Fotografia:

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termia ou após 48 h pós TCE não está recomendada porque não parece existir beneficio nos outcomes17

16. Controlo da Glicemia no TCE O TCE grave como situação de stress aumentará os níveis de glicose 39 Noutras patologias, em doentes críticos, parece que o controlo desta resposta inicial com insulina melhorará o outcome destes doentes 40 Saber quando começar a alimentação, quantas calorias, a via de alimentação, são questões pertinentes mas que para nós no pré-hospitalar tem pouco interesse. As recomendações atuais apontam para manter eunatremia, euglicemia e normotermia nos doentes com TCE grave 13. Então que fazemos ?

Depois da estabilização respiratória e hemodinámica do doente, deveriamos avaliar a parte neurológica (pupilas, tipo de respiração, valor da ECG, existência de sinais de HIC …), posteriormente devemos analgesiar e eventualmente sedar o doente, controlar a temperatura evitando a hipertermia, e tratar as convulsões, se estas aparecem.

@Luisa Melão

18. Bloqueadores neuromusculares no TCE grave no préhospitalar. Existem poucos estudos no uso de bloqueadores neuromusculares no pré-hospitalar. Chin KH et al. realizaram um estudo com crianças com TCE grave nas quais utilizavam bloqueadores neuromusculares, cujos resultados obtidos não se associaram complicações 44. Então que fazemos ?

17. Corticoides no TCE grave no prehospitalar ? Estudos com mais de 40 anos demostraram que o uso de glicocorticoides no tratamento perioperatório dos tumores cerebrais era benéfico 42,43. Recentemente o CRASH trial estudou os doentes com TCE grave comparando doentes com metilprednisolona 48 h versus placebo. Este estudo teve que ser suspenso por apreciar a existência de maior risco de morte às 2 semanas e pior outocome neurológico aos 6 meses 41 A Brain Trauma Fundation (BTF) refere a utilização de corticoides como neuroprotetor no doente com TCE grave está contraindicado 13. Então que fazemos ?

Não administramos corticóides no TCE grave no pré-hospitalar.

No pré-hospitalar os bloqueadores neuromusculares tem indicação neste contexto de TCE grave, apenas nas entubações orotraqueais, manutenção da ventilação mecânica quando a sedação e analgesia não são eficazes.

19. Qual é o centro para onde transferir ? Por último quando temos o doente monitorizado e estabilizado, para onde transferir ? A resposta é fácil, para um centro "útil": Centro onde possa ser realizada a monitorização intensiva dos parâmetros de fluxo e perfusão cerebral. Sabemos que esta monitorização, quando feita de forma eficaz, pode diminuir a mortalidade no hospital às 2 semanas pós TCE. Monitorização da diferença de O2 arteriovenosas bulbo jugular poderá melhorar o outcome aos 3 e 6 meses pós TCE17.

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Le Roux et al.29 refere que uma neuromonitorização multimodal será benéfica para os doentes com TCE. Centro onde seja possível a realização de exames complementares imagiológicos 24h por dia. Centro onde exista neurocirurgia 24 h por dia para eventual realização de forma emergente da terapêutica cirúrgica tal como uma craniectomia descompresiva frontoparietal que poderá ajudar a diminuir a mortalidade e aumentar o outcome neurológico 17. Então que fazemos ?

Informamos o Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) da tipologia do doente com TCE. Aguardamos indicação de para onde transportar a vítima. Monitorizamos parâmetros vitais durante o transporte evitando hipoxémia e hipotensão. Vigiamos o aparecimento de sinais de HIC. Informamos ao centro hospitalar de receção da situação clínica do doente e do tempo de chegada.

21. Treinos do pessoal de emergência Cada vez mais é exigida qualidade na prestação de cuidados. O pré-hospitalar e o trauma não são uma exceção. Por outra parte, existem sistemas nacionais de trauma na maioria dos países desenvolvidos. Existem também instrumentos para medir a qualidade do atendimento ao trauma embora ainda estão a ser testados e validados. 48-53 Fevang et al. 54 elaboraram um consenso em relação a importância das equipas de trauma no ambiente préhospitalar. Estes investigadores salientaram 5 áreas importantes: treinos em cuidados intensivos pré-hospitalar, otimização no tratamento da via aérea avançada no préhospitalar, ecografia no pré-hospitalar, definir as janelas de tempo para a realização de procedimentos invasivos no préhospitalar, critérios de diferenciação e transporte para os serviços de medicina intensiva. Então que fazemos ?

Seguir as recomendações de Fevang et al. Breafing após cada misão com equipas envolvidas.

DISCUSSÃO

20. Comunicação no pré-hospitalar Nos últimos cinco anos têm aparecido múltiplos estudos relacionados com a comunicação com os familiares dos doentes críticos e doentes com patologia oncológica. Existem estudo qualitativos em doentes internados nas Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) que demostram como os familiares tem a necessidade de conhecer que acontece com os familiares. Querem conhecer o prognóstico dos familiares que estão em coma. 45-47 A Neurocritical Care Society publicou em 2015 guias para os familiares dos doentes com TCE grave internados na UCI, com a finalidade de explicar o que acontece e o prognóstico a curto e longo prazo deste tipo de doentes 47. Então que fazemos ?

Devemos ser sinceros, claros e credíveis. Devemos informar o centro para onde vamos transportar o doente.

Com este trabalho, o autor pretende fazer uma revisão da abordagem, tratamento inicial, estabilização e transporte dos doentes com TCE grave a nível pré-hospitalar. Para isso, utilizou como esqueleto as 21 recomendações emanadas no estudo de Olivier Hoogmartens et al.5 Assim, suportado pelos trabalhos de outros autores, foi feita uma análise crítica e uma tentativa de adaptação à nossa realidade diária no pré-hospitalar para cada uma destas recomendações. Neste trabalho apreciamos como muitas das recomendações emanadas pelos autores, estão baseadas em evidencias de moderada ou baixa qualidade (IIA, IIB e III do sistema GRADE) e em opiniões de especialistas. Isto faz-nos concordar com Olivier Hoogmartens, mais uma vez, em relação a como as guidelines atuais no TCE grave por vezes, não ajudam na tomada das melhores decisões para quem realiza pré-hospitalar.

Deveremos ter o contato dos familiares para que depois, no ambiente hospitalar, a equipa recetora do doente possa falar com os mesmos.

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Traumatismo craneo-encefálico no pré-hospitalar

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A modo de conclusão o autor resume num esquema as ações de atuação no TCE grave no pré-hospitalar SEGURANÇA VISÃO GLOBAL DO CENÁRIO

Controlo Hemorragia exanguinante Oxigenar manter SatO2 > 90 % EOT se ECG < 9 e SatO2 < 90% Manter Endtidal CO2 35 – 40 mm Hg Colocação colar cervical e imobilização plano duro

C Ac B C D E T T C Controlo Hemorragia Exanguinante Ac Via aérea e controlo cervical B Ventilação C Circulação D Disability E Exposição T Transporte e Terapêutica adjuvante

Controlar hemorragias externas não exanguinantes Fluidoterapia com cristaloides Evitar PAS < 100 mm Hg Depois de estabilização do A e B Avaliar ECG Controlo da DOR (Analgesia e Sedação) Vigiar sinais de HIC (Pupilas/Tríade de Cushing) Tratar HIC (Manitol /Cloreto Sódico hipertónico) Se HIC persistir HIPERVENTILAR temporariamente Se Convulsão (Diazepam/Valproato) Controlo da Glicemia Controlo da Temperatura

Informar CODU Informar familiares do destino do doente Iniciar TRANSPORTE para CENTRO ÚTIL (Hospital Recetor) Monitorizar Parâmetros Vitais Evitar Hipoxemia e Hipotensão Vigiar aparecimento de HIC Informar ao Hospital Recetor do tempo de chegada

BBREAFING DAS EQUIPAS !

Fotografia: Pedro Pedro Rodrigues Rodrigues Silva Silva Fotografia:

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André Villareal Médico VMER

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sambandre@otmail.com

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HOT TOPIC

Paragem cardiorrespiratória na gravida João Teles Carvalho1, Bernardo Matias2, Guilherme Possolo3, Fabíola Amado4 1

Assistente hospitalar de Medicina Interna - Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS), Hospital de São Bernardo; 2Interno de formação específica em Anestesiologia do CHS; 3Assistente hospitalar de Anestesiologia – UCI do CHS; 4 Interna de formação específica em Cirurgia Geral do CHS.

ment from the American College of Surgeons Committee on Trauma (ACS COT) and the American College of Emergency Physicians (ACEP) regarding

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paragem cardiorrespiratória (PCR) na grávida 3-Brenner M, Bulger EM, Perina D.G, Christopher S.H, Kang S, Rotondo M.F, é um evento clínico raro mas de gravidade parChang M.C, Weireter L.J, Coburn M, Winchell R.J, Stewart R.M. Joint stateticular, envolvendo simultaneamente a mãe e o bebé, e com necessidades de abordagem por uma equipa multidisciplinar (Obstetrícia, Anestesiologia, Cuidados Intensivos, Neonatologia e eventualmente Cirurgia Cardiotorácica).(6)

Estudos randomizados relativos à sua abordagem são 5-Moore L.J, Martin C.D, Harvin J.A, Wade C.E, Holcomb J.B. Resuscitative inexistentes, centrando-se apenas em pequenas séries endovascular balloon occlusion of the aorta for control of noncompressible de casos, alguns estudos coorte e opinião de peritos.(1) Estima-se, no entanto, que a prevalência da PCR na grávida varie de 1/20.000 a 1/50.000 dos casos de gravidez.(7-9)A sua etiologia é variada sendo as mais descri-

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tas (EUA/Reino Unido) o tromboembolismo pulmonar, hemorragia, sépsis, cardiomiopatia periparto, doença cerebrovascular, eclampsia/pré-eclampsia e complicações relativas ao acto anestésico. Outras causas descritas, mas mais raras, relacionam-se com a embolia de líquido amniótico, síndrome coronário agudo (assim como descompensação de patologia cardíaca prévia) e trauma.(11) As alterações do sistema cardiovascular relacionadas com a gravidez observam-se desde o final do 1º trimestre e incluem o aumento do volume plasmático, do débito cardíaco (de 20 a 40%) e da frequência cardíaca (10 a 20 bpm). O nível elevado de estrogénios pode levar ao remodelling de vasos tornando-os mais propensos a eventos de disseção ou rotura. Todas estas alterações fisiológicas podem desmascarar doença cardíaca subjacente.

A PCR na grávida está associada a elevada mortalidade materno-fetal (em alguns estudos descrita mortalidade materna de 30 a 80% e neonatal de 60%), (8-11; 15) devendo ser iniciadas prontamente manobras de SAV, considerando sempre as possíveis causas de paragem e seu tratamento específico, se tal for indicado.

Cardiovascular: Devem ser realizadas compressões torácicas eficazes assim como desfibrilhação precoce quando indicada (sem alterações específicas da voltagem habitual); A partir das 20 semanas de gestação a compressão da veia cava reduz o retorno venoso e consequente débito cardíaco pelo que as compressões serão dificultadas quer em decúbito dorsal quer em decúbito lateral esquerdo, pelo que está indicado a deslocação manual uterina para a esquerda ou ligeira angulação (15-30º); o local das compressões deve ser ligeiramente acima no esterno em gravidez avançada (3º trimestre); Os acessos intravenosos devem ser idealmente colocados acima do diafragma afastando possíveis atrasos na circulação de fármacos devido a compressão da veia cava inferior; Cesariana de emergência: Deve ser considerada a sua realização a partir das 20-23 semanas de gestação para permitir sobrevida da mãe (sem viabilidade de sobrevida fetal); e 24-25 semanas, permitindo a maior sobrevida da mãe e feto; quanto mais rápida for a sua realização (idealmente nos primeiros 5 min após PCR), maior é a sobrevida fetal.

Na abordagem à paciente grávida em PCR são importantes alguns dos aspectos particulares que são descritos em seguida: (1) Via aérea: É antecipatada uma via aérea difícil devido às alterações fisiológicas da grávida (retenção hídrica e edema/ estreitamento da via aérea), devendo ser utilizado um tubo orotraqueal 0.5 a 1.0 mm abaixo do tamanho da mulher não grávida; devido à baixa reserva de capacidade funcional respiratória e aumento das necessidades de oxigenação, existe maior dificuldade na ventilação e risco rápido de hipoxémia, assim como elevado risco de aspiração devido à capacidade gástrica e atraso do esvaziamento diminuídos; Deverão ser pensados antecipadamente planos alternativos para entubação falhada, nomeadamente o uso de dispositivos supraglóticos ou kit de cricotiro- Fig. 1 – Ecocardiograma transesofágico com trombos intracavitários (cavidades direitas) tomia; PÁGINA

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Os autores relatam o caso clínico de uma mulher de 28 anos, fumadora, sem outros antecedentes nem medicação habituais excepto a pílula. Encontrava-se grávida de 40 semanas, e recorreu ao SU por mal-estar inespecífico e diminuição dos movimentos fetais. Por gravidez de termo foi decidida indução e rutura de bolsa. Enquanto estava em vigilância no Bloco de Partos, foi referida sensação de mal-estar, seguida de PCR. Foi submetida a cesariana emergente, com manobras de SAV no peri-operatório, com RCE após 3 ciclos. Com Apgar baixo no pós parto imediato, verificando-se subida progressiva e normalização. O Pós-operatório imediato foi complicado de atonia uterina, choque hemorrágico e coagulopatia de consumo sendo necessário proceder a histerectomia emergente. Foi admitida na UCI, tendo sido realizado EcoTT que revelou trombo intra-auricular direito com extensão à VCI e Angio-TAC Tórax identificando TEP extenso, tendo sido iniciada HNF. Evolui com agravamento das perdas hemáticas abdominais, com necessidade de administração de protamina, retomar posteriormente anticoagulação com HBPM. Realizados exames de imagem seriados [EcoTT, EcoTE (fig 1) e Angio-TC)] com redução progressiva da dimensão dos trombos. Detectada muito precocemente actividade paroxística/ estado de mal comprovado por EEGs seriados com necessidade de associação de vários anticonvulsivantes e múltiplos ajustes (incluindo coma barbitúrico).

Após 1º TC-CE sem alterações significativas foi repetida TC-CE de reavaliação com sinais de edema cerebral difuso (fig 2). RM-CE compatível com encefalopatia anóxica com necrose cortical e lesões de anoxia profunda. Os Potenciais Evocados: PESS dos membros superiores de muito reduzida amplitude, bilateralmente concordantes com encefalopatia anóxica. Após descontinuada sedação e controlada a actividade epiléptica (mantendo, no entanto, actividade paroxística residual em EEG), foi possível iniciar programa de reabilitação motora e respiratória. Houve melhoria do GCS (registo máximo de 10), tendo sido ainda submetida a traqueotomia e colocação de PEG durante a permanência na UCI. Após 93 dias de internamento hospitalar (42 dias de Cuidados Intensivos, 30 dias de Cuidados Intermédios e 21 dias de Enfermaria de Medicina Interna) teve alta, com estado neurológico sobreponível, para Unidade de Cuidados Continuados. Analiticamente verificada ligeira diminuição da proteína S. O bebé teve alta hospitalar sem intercorrências major. As alterações fisiológicas da grávida, a abordagem multidisciplinar em situação de PCR com alguns aspectos particulares (como a realização de cesariana de emergência), a identificação e tratamento das suas causas, são aspectos essenciais a ter em conta na prática clínica e que podem melhorar a sobrevida do feto e da mãe. No entanto são necessários mais estudos para melhor aferir, caracterizar e melhorar a abordagem e consequências desta rara entidade. O prognóstico depende primariamente da rapidez e qualidade dos Serviços de emergência, assim como o local da ocorrência (intra ou extrahospitalar). À parte disso é recomendado o treino e simulação regular nos Serviços de Urgência Obstétrica envolvendo várias especialidades e competências para uma melhor preparação técnica e teórica, criando condições (plano e equipamento) para a ressuscitação cardiopulmonar materno-fetal de qualidade.1

Fig. 2 – TC craneoencefálica com evidência de edema cerebral difuso. PÁGINA

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The CAPS Study: incidence, management and outcomes of cardiac arrest in pregnancy in the UK: a prospective, descriptive study; 4

Cardiac Arrest in Pregnancy. A Scientific Statement From the

Angio TC- Angio tomografia computorizada EcoTT - Ecocardiograma Transtorácica EcoTE - Ecocardiograma Transesofágico EEG - Electroencefalograma GCS - Glasgow Coma Scale HBPM - Heparina de Baixo Peso Molecular HNF - Heparina Não Fracionada

American Heart Association

PESS - Potenciais evocados somato-sensitivos

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RCE – Retorno da circulação espontânea

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Editor: Dénis Pizhin MÉDICO da Especialidade de Medicina Interna Competência em Emergência Médica

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Separata Científica

TEMA DE ABERTURA

Cuidados Pós-reanimação Guilherme Henriques Médico de Formação Geral - Ano Comum. Centro Hospitalar Universitário do Algarve—Unidade de Faro

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Artigo de Revisão

A recuperação da circulação espontânea (RCE) é o primeiro passo em direção ao objetivo da recuperação completa da paragem cardiorrespiratória (PCR). No entanto, o objetivo seguinte é a recuperação da função cerebral normal assim como estabelecer e manter um ritmo cardíaco estável e uma função hemodinâmica normal. A qualidade do tratamento disponibilizado na fase pósreanimação – o último elo da Cadeia de Sobrevivência – influência significativamente o prognóstico final do doen-

te. Os complexos processos fisiopatológicos que ocorrem após isquémia durante a PCR e a subsequente resposta de reperfusão durante e após reanimação bem sucedida foram denominados síndrome pós-PCR. Esta fase começa no local onde se verifica RCE mas, depois de estabilizado, o doente tem de ser transferido para a unidade de cuidados mais adequada para continuar a sua monitorização e tratamento. Na fase pós-reanimação, por forma a otimizar a sua avaliação clínica, o dente deve ser tratado seguindo a abordagem ABCDE. Dependendo da causa da PCR e da gravidade da síndrome pós-PCR, muitos doentes necessitarão de suporte multiorgânico e o tratamento que recebem durante este período influencia significativamente o prognóstico e, particularmente, a qualidade da recuperação neurológica. O algoritmo de cuidados pós-reanimação (Figura 1) descreve algumas das principais intervenções necessárias para otimizar o prognóstico desses doentes.

SÍNDROME PÓS-PCR O síndrome pós-PCR, que engloba a consequente lesão cerebral, a disfunção miocárdica e a resposta sistémica de isquémia/reperfusão e persistência da patologia precipitante, complica frequentemente a fase pós-PCR. A gravidade deste estado varia em função da duração e da causa de PCR podendo, todavia, nem se verificar se a esta for breve. A lesão cerebral pós-PCR manifesta-se por coma, convulsões, mioclonias, diferentes graus de disfunção neurológica e morte cerebral. A lesão cerebral pós-PCR pode ser exacerbada por falha da microcirculação, auto-regulação deficiente, hipotensão, hipercapnia, hipoxemia, pirexia, hipo/ hiperglicemia e convulsões. A disfunção miocárdica é comum após a PCR mas, geralmente, a recuperação começa em 2 a 3 dias, embora a recuperação total possa levar um tempo significativamente maior.

A isquémia/reperfusão generalizada que se verifica depois da PCR ativa as vias imunológicas e de coagulação, contribuindo para a falência multiorgânica e para o aumento do risco de infecção. Assim, a síndrome pós-PCR apresenta muitas características comuns ao quadro de sepsis, incluindo depleção do volume intravascular, vasodilatação, lesão endotelial e anormalidades da microcirculação.

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IFESS AVING LL IFE AVING

Separata Científica

Figura 1: Algoritmo de cuidados pós-reanimação. SBP: systolic blood pressure; PCI: percutaneous coronary intervention; CTPA: computed tomography pulmonary angiogram; ICU: intensive care unit; MAP: mean arterial pressure; ScvO2: central venous oxygenation; CO/CI: cardiac output/cardiac index; EEG: electroencephalography; ICD: implanted cardioverter defibrillator

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Artigo de Revisão

extubação imediata. O facto de tossir para o tubo traqueal vai aumentar significativamente as concentrações plasmáticas de VIA AÉREA E VEN TILAÇÃO catecolaminas o que, por si, potencia arritmias e/ou hipertensão. Caso não estejam reunidas as condições para a extubação imediata ou precoce pode ser necessário considerar-se o uso de bloqueadores neuromusculares. Estudos mostram que a CONTROLO DA OXIGENAÇÃO infusão de curta duração (≤48H) para reduzir a dissincronia Os doentes que sofreram PCR por um período curto de tempo doente-ventilador não está associada a um risco aumentado e que respondem ao tratamento apropriado, podem recuper- de comorbilidades e pode, inclusivamente, melhorar o outcoar a função cerebral. Esses não necessitam de ventilação me nesses doente. mecânica, mas deve ser considerada a administração de oxiExistem alguns estudos que sugerem que o bloqueio neurogénio suplementar, via máscara facial, se a saturação de muscular contínuo está associado à diminuição da oxigénio no sangue arterial (SO2) for inferior a 94%. mortalidade em doentes pós-PCR. No entanto, o uso deste A hipoxemia e a hipercapnia aumentam a probabilidade de tipo de fármacos condiciona a observação clínica e pode uma nova PCR e podem contribuir para a lesão cerebral mascarar quadros convulsivos. A eletroencefalografia secundária. Um estudo mostrou que a hiperoxemia póscontínua (EEG) é recomendada para detectar convulsões reanimação está associada a pior prognóstico quando nesses doentes. comparado à normoxemia ou hipoxemia. Não obstante, a Paralelamente, é relevante obter uma radiografia de tórax hipoxemia deve, naturalmente, ser evitada, sob risco de ser para verificar a posição do tubo traqueal, do tubo gástrico e prejudicial para o outcome do doente. dos acessos venosos centrais, avaliar o edema pulmonar e Assim, a SO2 deve titular-se (por gasimetria arterial ou oxime- detectar eventuais complicações da reanimação tria de pulso) no decorrer do tratamento de suporte do doen- cardiopulmonar (RCP). te mas também, e não menos importante, antes de reduzir a fração inspirada de oxigénio (FiO2) ao doente.

CIRCULAÇÃO CONTROLO DA VENTILAÇÃO A intubação traqueal, sedação e ventilação controlada deve ser considerada em todos os doentes com comprometimento da função cerebral. A hipocapnia causa vasoconstrição cerebral e diminuição do fluxo sanguíneo cerebral. Após a PCR, a hipocapnia induzida por hiperventilação causa isquémia cerebral. A ventilação deve, por isso, ser ajustada para normocapnia (35-45 mmHg) e monitorizada através dos valores de dióxido de carbono no final da expiração (ETCO2), da onda de capnografia e dos valores da gasimetria arterial. É sabido que os doentes pós-PCR desenvolvem uma resposta inflamatória acentuada e, por isso, parece racional aplicar uma ventilação protetora: volume corrente 6 a 8 ml kg-1 de peso corporal ideal e pressão positiva expiratória final de 4-8 cmH2O. Deve inspecionar-se o tórax do doente e procurar movimentos torácicos simétricos. Auscultar-se para certificar a presença e simetria dos sons respiratórios. Percutir o tórax para excluir áreas de hiperressonância. Um tubo traqueal que tenha sido demasiado inserido tenderá a desviar-se para o brônquio principal direito não conseguindo ventilar o pulmão esquerdo. Caso tenham sido, acidentalmente, fratura

ESTABILIDADE HEMODINÂMICA A disfunção miocárdica pós-reanimação causa instabilidade hemodinâmica, que se manifesta como hipotensão e arritmias. Torna-se, assim, essencial manter uma monitorização contínua destes doentes. Avaliar e registar a frequência cardíaca, a pressão arterial e a reperfusão periférica. A turgência jugular pode ser indicativa de insuficiência cardíaca direita e, em casos raros, de tamponamento cardíaco. Por sua vez, crepitações inspiratórias à auscultação pulmonar, assim como expectoração espumosa rosada podem ser indicativas de insuficiência ventricular esquerda. Deve realizar-se ecocardiografia precoce em todos os pacientes, a fim de detectar e quantificar o grau de disfunção miocárdica.

A disfunção miocárdica pós-RCP requer, muitas vezes, suporte inotrópico, pelo menos transitoriamente. A noradrenalina e os fluidos costumam ser o tratamento mais eficaz. A infusão de volumes relativamente grandes de fluidos é normalmente bem tolerada por doentes com síndrome pós-PCR. Se o das costelas no decorrer das manobras de reanimação poderá tratamento com fluidos, inotrópicos e fármacos vasoativos for insuficiente para manter a circulação deve ponderar-se a haver pneumotórax ou retalho costal. colocação de um balão aórtico de contrapulsação. A eventual distensão gástrica causada pelo manuseamento O tratamento com fluidos, inotrópicos e vasopressores pode básico da via aérea durante as manobras de reanimação poser orientado pela pressão arterial, frequência cardíaca, derá ser uma condicionante relevante para ventilação, pelo que é prudente considerar-se a colocação de uma sonda gás- débito urinário, taxa de depuração de lactato plasmático e saturação de oxigénio venoso central (SvO2). trica. Se o doente recuperar a consciência imediatamente após RCE, ventilar normalmente e cooperar é legítimo ponderar-se a PÁGINA

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Separata Científica

Apesar da influência dos valores de pressão arterial média e/ ou sistólica e o prognóstico do doente não estar completamente estabelecida foi identificada uma associação entre a pressão arterial média acima de 70 mmHg e o bom resultado neurológico. Na ausência de dados definitivos que sustentem um objetivo específico para a pressão arterial, deve apontar-se para uma pressão arterial média que otimize a SvO2 e um débito urinário adequado (1 ml kg-1 h-1) e valores de lactato plasmático normais ou em tendência decrescente, tendo em consideração a pressão sanguínea normal do doente, a causa da PCR e a gravidade da disfunção miocárdica. É importante ressalvar que a hipotermia pode aumentar a produção de urina e prejudicar a depuração de lactato. Durante a hipotermia ligeira, a resposta fisiológica normal é bradicardia. Vários estudos retrospectivos mostraram que a bradicardia está associada a um bom resultado. Desde que a pressão arterial, o lactato, a SvO2 e o débito urinário sejam suficientes, uma bradicardia de ≤ 40 min-1 pode não carecer de tratamento. Por seu turno, a taquicardia foi associada a mau prognóstico. Após RCE geralmente há um período de hipercaliemia. A libertação subsequente de catecolaminas endógenas e a a correção da acidose metabólica e respiratória promovem o transporte intracelular de potássio causando, tendencialmente, hipocaliemia. A hipocaliemia pode predispor a arritmias ventriculares malignas. A concentração sérica de potássio deve manter-se entre 4,0 e 4,5 mmol/L.

INDICAÇÃO PARA REPERFUSÃO CORONÁRIA A síndrome coronária aguda (SCA) é uma causa frequente de PCR extra-hospitalar (59-71%). A identificação de supra-desnivelamento do segmento ST (SST) ou bloqueio de ramo esquerdo “de novo” (BRE) no eletrocardiograma (ECG) num doente com história clinica sugestiva de enfarte agudo do miocárdio (EAM) constitui indicação para terapêutica de reperfusão com intervenção coronária percutânea (ICP) ou fibrinolíticos. A ICP primária é o tratamento de eleição para o EAM com SST, sempre que possa ser efetuada em tempo oportuno (2H). Não sendo possível deve administrar-se um fibrinolítico. A RCP, mesmo se prolongada, não é contra-indicação para terapêutica fibrinolítica. Em doentes pós-PCR, a sensibilidade e especificidade da avaliação clínica, ECG e biomarcadores para prever uma oclusão arterial coronária aguda são pouco fiáveis, pelo que deve considerar-se a ICP em todos os doentes pós-PCR com suspeita de causa coronária, mesmo que estejam sob sedação e ventilação mecânica.

INDICAÇÕES PARA TOMOGRAFIA COMPUTORIZADA

A identificação precoce de uma causa respiratória ou neurológica possibilita a transferência do doente para uma unidade especializada, otimizando o seu tratamento. Para isso a tomografia computadorizada (TC) mostra-se um instrumento fundamental. Na ausência de sinais ou sintomas sugestivos de uma causa neurológica ou respiratória ou se houver evidência clínica ou eletrocardiográfica de isquémia miocárdica, deve dar-se prioridade à angiografia coronária, sendo a TC realizada de seguida. Esta estratégia permite o diagnóstico de causas não cardíacas de PCR numa proporção substancial de doentes. Em casos de PCR associada a trauma ou hemorragia, uma TC de corpo inteiro pode ser indicada.

INDICAÇÃO PARA CARDIOVERSOR-DISFIBRILHADOR IMPLANTÁVEL Deve considerar-se a necessidade de um cardioversordesfibrilhador implantável (CDI) em qualquer doente com isquémia miocárdica e com disfunção ventricular esquerda que tenha sido reanimado com ritmo desfibrilhável depois de 24-48H após um evento coronário primário. Todos estes doentes, antes da alta médica, devem ser referenciados a um especialista para avaliação.

DISFUNÇÃO NEUROLÓGICA E EXPOSIÇÃO Apesar de, no adulto, a PCR ser frequentemente de causa cardíaca, devem ser excluídas outras causas precipitantes, com particular relevância em doentes internados. Devem ser avaliados, prontamente, outros sistemas para que a reanimação possa ser dirigida às necessidades do doente. Paralelamente, mesmo que não tenha implicações imediatas para o tratamento, deve avaliar-se rapidamente o seu estado neurológico, através da escala de coma de Glasgow (GCS) (Tabela 1). PERFUSÃO CEREBRAL Imediatamente após RCE verifica-se um período de hiperemia cerebral que pode durar cerca de 15-30 minutos podendo, nas 24 horas seguintes, seguir-se hipoperfusão cerebral. Depois da anóxia provocada pela PCR pode ocorrer edema cerebral transitório após RCE mas este só raramente está associado a aumentos clinicamente relevantes da pressão intracraniana. Algum tempo depois da PCR os mecanismos de auto-regulação cerebrais falham, o que significa que a perfusão cerebral varia com a sua pressão de perfusão em vez de em função da atividade neuronal. Após a RCE, deve manter-se a pressão arterial média próxima do nível que é normal para o doente.

As causas cardíacas das PCR em ambiente extra-hospitalar fora extensivamente estudadas nas últimas décadas. Por outro lado, pouco se sabe sobre as causas não cardíacas.

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Artigo de Revisão SEDAÇÃO

Escala de Coma de Glasgow

Embora seja uma prática comum sedar e ventilar os doentes durante, pelo menos, 24 horas após o RCE, não há dados que suportem um período definido de ventilação, sedação e bloqueio neuromuscular após PCR. Os doentes têm de estar bem sedados durante o tratamento com hipotermia terapêutica e, portanto, será este o determinante para a duração da sedação e ventilação. Não há dados que indiquem se a escolha do tipo de sedação influencia o resultado mas, geralmente, usa-se uma combinação de opióides e hipnóticos. Os fármacos de ação curta (p.e. propofol, alfentanil, remifentanil) permitem uma avaliação neurológica precoce. A sedação adequada vai reduzir o consumo de oxigénio (O2). Durante a hipotermia, a sedação adequada pode reduzir ou evitar os tremores, o que permite que a temperatura alvo seja alcançada mais rapidamente.

As convulsões podem aumentar o metabolismo cerebral, podendo exacerbar a lesão cerebral provocada pela PCR. Devem ser tratadas rápida e eficazmente com benzodiazepinas, fenitoína, valproato de sódio, propofol ou barbitúricos. As mioclonias podem ser especialmente difíceis de tratar. O clonazepan é o anticonvulsivante mais eficaz, porém, o valproato de sódio, o levetiracetam e o propofol também podem ser eficazes. Deve iniciar-se terapêutica de manutenção logo depois do primeiro evento, uma vez excluídas possíveis causas precipitantes (p.e. hemorragia intracraniana, desequilíbrio eletrolítico). Embora os estudos sejam pouco conclusivos, acredita-se que a profilaxia, por rotina, de convulsões em doentes pós-PCR não é recomendada, devido ao risco de efeitos adversos e à fraca resposta dos agentes antiepiléticos entre os doentes com convulsões. A presença de mioclonias/convulsões estão relacionadas a um mau prognóstico, pese embora haja casos descritos de recuperação com prognóstico favorável. Pode ser necessária uma observação continuada após o tratamento de convulsões com sedativos uma vez que estes condicionam o exame clínico.

CONTROLO DA GLICÉMIA Há uma forte associação entre hiperglicemia pós-PCR e mau prognóstico neurológico. Todavia, a hipoglicemia está associada ao aumento da mortalidade em doentes críticos, particularmente em doentes em coma, pelo risco acrescido de hipoglicémia não detetada.

4

Ao estímulo verbal

3

Ao estímulo doloroso

2

Sem resposta

1

Orientada

5

Confusa

4

Palavras inadequadas

3

Sons incompreensíveis

2

Sem resposta

1

Obedece a ordens

6

Localiza estímulos

5

Fuga à dor

4

Flexão anormal

3

Extensão anormal

2

Sem resposta

1

Abertura ocular

Resposta verbal

CONVULSÕES As convulsões e/ou mioclonias são comuns após a PCR e ocorrem em aproximadamente um terço dos doentes que permanecem em coma após o RCE. A EEG pode ser considerada para sua avaliação/monitorização.

Espontânea

Resposta motora

Tabela 1: Escala de coma de Glasgow

A variabilidade aumentada da glicémia está associada ao aumento da mortalidade e desfecho neurológico desfavorável após paragem cardíaca. Com base nos dados disponíveis, após RCE deve manter-se a glicémia em valores ≤ 180 mg dL-1 (10 mmol L-1) e evitar hipoglicemia. Deve evitar-se o controle rigoroso da glicémia em doentes adultos com RCE devido ao risco aumentado de hipoglicemia.

CONTROLE DA TEMPERATURA Tratamento da hiperpirexia É comum verificar-se um período de hipertermia (hiperpirexia) nas primeiras 48 horas após PCR. Diversos estudos mostram existir uma associação entre pirexia pósPCR e mau prognóstico. Na mesma linha, o desenvolvimento de hipertermia após um período de hipotermia ligeira está associado a maior mortalidade e pior prognóstico neurológico. Apesar do efeito do aumento da temperatura no resultado final não estar demonstrado, deve tratar-se qualquer episódio de hipertermia que ocorra após PCR com antipiréticos e/ ou arrefecimento ativo.

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Separata Científica

Figura 2: Algoritmo de prognóstico. EEG: electroencephalography; NSE: neuron-specific enolase; SSEP: somatosensory evoked potentials; ROSC: return of spontaneous circulation; FPR: false positive rate; CI: confidence interval.

Gestão/controlo de temperatura Os dados indicam que a hipotermia ligeira é neuroprotetora e melhora o prognóstico após um período de hipóxiaisquémia cerebral. O arrefecimento suprime muitas das vias que levam à morte celular tardia, incluindo a apoptose (morte celular programada). A hipotermia diminui a taxa metabólica cerebral em cerca de 6% por cada 1ºC de redução de temperatura, o que pode reduzir a libertação de aminoácidos excitatórios e radicais livres, reduzindo a resposta inflamatória associada à síndrome pós-PCR. Os estudos sobre hipotermia terapêutica pós-PCR incluíram, exclusivamente, doentes em coma. Há boa evidência a suportar a indução de hipotermia em coma de PCR extrahospitalar por fibrilhação ventricular (FV). Estudos demonstraram, neste tipo de doente, uma melhoria do estado neurológico à data da alta hospitalar e aos 6 meses. O arrefecimento foi iniciado no período de minutos a horas após a RCE e a variação da temperatura foi mantida entre os 32-34ºC durante 12 a 24 horas. A extrapolação destes dados para outra tipologia PCR (p.e. outros ritmos cardíacos iniciais, PCR intra-hospitalares, crianças) parece ser razoável.

Com base na evidência disponível e em consensos de peritos, deve ponderar-se a hipotermia terapêutica em todos os doentes admitidos em unidades de cuidados intensivos (UCI) para suporte de órgãos após uma reanimação e sujeitos a ventilação mecânica. A duração ótima para hipotermia ligeira é desconhecida, embora atualmente seja mais comummente usada por 24 horas. Qualquer que seja a temperatura alvo, o controle de temperatura ativo é necessário para atingir e manter a temperatura nessa faixa. Recomendações prévias sugerem que o arrefecimento deve ser iniciado o mais rápido possível após RCE. Existe uma associação entre doentes que arrefecem espontaneamente mais rápido e pior prognóstico neurológico. Acredita-se que aqueles com lesão neurológica mais grave sejam mais propensos a perder a auto-regulação da temperatura corporal. Estratégias de arrefecimento precoce, além da infusão rápida de grandes volumes de fluidos intravenosos frios e ar-

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Artigo de Revisão

refecimento durante a reanimação, no contexto préhospitalar, não estão adequadamente estudadas.

Os efeitos fisiológicos da hipotermia devem ser avaliados cuidadosamente, concretamente:

Com base nas evidência atual, o arrefecimento préhospitalar usando uma infusão rápida de grandes volumes de fluidos intravenosos frios imediatamente após o RCE não é recomendado.

Os tremores aumentam a produção metabólica e de calor, diminuindo assim a velocidade de arrefecimento.

A aplicação prática do tratamento por controlo de temperatura divide-se em três fases: indução, manutenção e reaquecimento. Para isso podem ser utilizadas técnicas de arrefecimento externas e/ou internas. Formas de induzir e/ou manter o controle de temperatura: Gelo simples e/ou toalhas molhadas. São métodos baratos, no entanto, esses podem consumir demasiado tempo à equipa de enfermagem, podendo resultar em maiores flutuações de temperatura e não permitem o reaquecimento de forma controlada. Fluidos gelados, por si só, não devem ser usados para manter a hipotermia mas sim em simultâneo com bolsas de gelo simples. Cobertores ou almofadas de arrefecimento.

A hipotermia ligeira aumenta a resistência vascular e pode potenciar arritmias (geralmente bradicardia). É importante ressalvar que a bradicardia causada por hipotermia ligeira pode ser benéfica. A hipotermia causa anormalidades na diurese e eletrólitos, como hipofosfatemia, hipocaliemia, hipomagnesemia e hipocalcemia. A hipotermia diminui a sensibilidade à insulina e também a sua secreção, provocando hiperglicemia, que deverá ser tratada com insulina. A hipotermia prejudica a coagulação e pode aumentar a hemorragia, embora esse efeito pareça insignificante e não tenha sido confirmado em estudos clínicos. A hipotermia pode comprometer o sistema imunitário e aumentar as taxas de infecção. A hipotermia está associada ao aumento da incidência de pneumonia, no entanto, isso parece não ter impacto no resultado.

Cobertores de água ou ar circulante. Almofadas revestidas de gel com água circulante. Arrefecimento transnasal - essa técnica permite o arrefecimento antes do RCE e está a ser estudada. Permutador de calor intravascular, geralmente colocado nas veias femural ou subclávia. Circulação extra-corpórea.

Na hipotermia a concentração de amilase sérica está geralmente aumentada, embora o significado deste achado não esteja completamente estudado. A depuração dos fármacos sedativos e bloqueadores neuromusculares diminui até 30% a uma temperatura central de 34ºC.

Na maioria dos casos, numa fase inicial, é fácil arrefecer os doentes após RCE porque, geralmente, a temperatura diminui espontaneamente na primeira hora. O arrefecimento inicial é facilitado pela sedação e pelo bloqueio neuromuscular, que irão evitar tremores. O sulfato de magnésio pode ser considerado, no sentido de reduzir o limiar de tremor.

As contra-indicações genéricas para a instituição deste tipo de tratamento, embora não aplicadas universalmente, incluem a infeção sistémica grave e coagulopatia médica préexistente (a terapêutica com fibrinolíticos não é contraindicação para tratar com hipotermia).

Na fase de manutenção, deve optar-se por um método de arrefecimento com monitorização eficaz da temperatura, que evite flutuações. A temperatura é, geralmente, monitorizada através de um sensor colocado na bexiga e/ou esófago do doente. Até o momento, não há dados que indiquem que qualquer técnica específica de arrefecimento aumente a sobrevivência quando comparada com qualquer outra. No entanto, os dispositivos internos permitem um controle de temperatura mais preciso em comparação com as técnicas externas.

Dois terços das mortes em doentes admitidos em UCI por PCR extra-hospitalar ocorrem na sequência de lesão neurológica. Dessas, a maioria deve-se à retirada de suporte de orgãos com base no mau prognóstico neurológico.

A hipertermia está associada a pior prognóstico neurológico. O reaquecimento deve, por isso, ser feito lentamente. Desconhece-se a taxa ótima mas, atualmente, os consensos apontam para cerca de 0,25 a 0,5ºC por hora. Assim como no arrefecimento, também durante o aquecimento as concentrações plasmáticas de eletrólitos, o volume intravascular efetivo e a taxa metabólica podem alterar-se rapidamente.

PROGNÓSTICO

É necessária uma forma de prever o prognóstico neurológico que possa ser aplicada individualmente a todos os doentes, imediatamente após RCE (Figura 2). Muitos estudos focaram-se em prever mau prognóstico a longo prazo (incapacidade cerebral grave ou morte), com base em achados clínicos indicativos de lesão cerebral irreversível, para permitir aos clínicos determinar a limitação dos tratamentos ou retirar o suporte de orgãos. As implicações destes testes são de tal ordem que deveriam ter 100% de especificidade ou taxa zero de falsos positivos.

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Separata Científica

EXAME CLÍNICO

laboratório de cateterismo cardíaco, com resposta 24 por dia e também com capacidade para a instituição de medidas de gestão de temperatura.

Não existem manifestações clínicas neurológicas que prevejam de forma fiável um mau prognóstico nas primeiras 24 horas após PCR. A ausência bilateral de reflexo pupilar às 72 horas após RCE prediz mau prognóstico (próximo de 0% de falsos positivos), assim como a ausência bilateral de reflexo corneano. No mesmo sentido, doentes com uma pontuação na resposta motora da GCS ≤ 2, às 72 horas após RCE também têm um prognóstico desfavorável. Quer o reflexo corneano, quer a resposta motora pode ser condicionada pelo uso de sedativos ou bloqueadores neuromusculares pelo que, quando houver suspeita de interferência destes, recomenda-se que a observação desses sinais clínicos para além das 72 horas após RCE. Outras manifestações clínicas, incluído as mioclonias, não são recomendadas para prever mau prognóstico. Há um estudo dirigido que associa, de forma consistente, mioclonias iniciadas nas primeiras 48 horas após RCE e mau prognóstico. Todavia, há casos relatados de boa recuperação neurológica apesar de episódios precoces de mioclonias. Em alguns desses casos, houve persistência do quadro após o despertar e evoluindo para a cronicidade (síndrome de Lance-Adams). Em outros, desapareceu após a recuperação da consciência.

Durante a transferência, deve dar-se continuidade a toda a monitorização estabelecida e protegidos todos os acessos invasivos ao doente. Deve garantir-se todo o equipamento necessário (p.e. oxigénio, equipamento portátil de aspiração, monitor/desfibrilhador) A equipa responsável pela transferência deve ser composta por elementos capazes de monitorizar o doente e de responder adequadamente a qualquer alteração do estado do doente que possa surgir, inclusivamente nova PCR.

DOAÇÃO DE ORGÃOS Os doentes que não sobrevivem após PCR devem ser considerados potenciais dadores de órgãos, quer como dadores em morte cerebral quer como dadores de coração parado. Todas as decisões relativas à doação de órgãos devem seguir os respetivos requisitos legais.

Referências Bibliográficas Arnaout M., et al. (2015). Out-of-hospital cardiac arrest from brain cause: epidemiology, clinical features, and outcome in a multicenter cohort. Crit Care Med; 43:453–60.

MARCADORES BIOQUÍMICOS A enolase neuronal específica e a proteína S-100B são biomarcadores libertados após lesão de neuronais e células gliais, respectivamente. Os seus valores pós-PCR correlacionam-se com a extensão da lesão cerebral anóxicaisquémica, contudo, as suas concentrações séricas não são variáveis suficientes, per si, para prever um mau prognóstico em doentes em coma pós-PCR. ESTUDOS IMAGIOLÓGICOS Muitas técnicas imagiológicas foram avaliadas para determinar a sua utilidade na avaliação de prognóstico em adultos que sobrevivem a paragem cardíaca. Com base na evidência disponível, nenhuma delas pode prever, de forma fiável, o prognóstico de doentes em estado coma pós-paragem cardíaca.

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TRANSFERÊNCIA DO DOEN TE Após a reanimação, depois de estabilizado, o dente deverá ser transferido para um ambiente diferenciado de cuidados adequado (p.e. UCI). Existe uma grande variabilidade entre os hospitais na sobrevivência de doentes após a reanimação de uma PCR. Os consensos definem que o centro adequado deve ter um

Editor: André Villareal MÉDICO VMER sambandre@hotmail.com

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Poeta Espanhol.

Fotografia: Pedro Rodrigues Silva

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Separata Científica

TEMA DE ABERTURA

Abordagem ao doente traumatizado vertebro -medular Lia Branco Pappamikail Assistente Hospitalar de Neurocirurgia, Centro Hospitalar Universitário do Algarve —Unidade de Faro

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Artigo de Revisão

A lesão medular define-se como uma lesão da medula espinal que resulta numa alteração, temporária ou permanente, das suas normais funções motora, sensitiva e/ou autonómica. Todos os anos surgem em Portugal aproximadamente 350 novos casos de traumatizados vértebro-medulares (TVM), sendo predominantemente afectados adultos jovens do sexo masculino, mais frequentemente em contexto de acidentes de viação e atropelamentos, mas também em quedas acidentais, desportos radicais, acidentes de mergulho, actos de violência, etc.

(evidência de integridade funcional da medula abaixo do nível da lesão, avaliada pela presença de controlo ou sensibilidade esfincteriana). A escala ASIA permite-nos depois caracterizar em graus: de A a E (sendo o grau A uma lesão completa e de B a E caracterizando as diferentes gravidades de lesões incompletas). Esta escala tem a extraordinária importância de permitir inferir o prognóstico funcional da lesão com base no status neurológico definido pela classificação, mas não altera o tipo de tratamento proposto ou o timing ideal para a sua realização.

A lesão vertebro-medular (LVM) traumática é potencialmente devastadora, com potencial de disfunção motora, sensitiva, respiratória, esfincteriana, neurovegetativa, com importante repercussão emocional e psíquica para os doentes e seus familiares. Sabe-se hoje que a lesão medular tem potencial de recuperação, e existe consenso na literatura internacional quanto ao determinismo das primeiras horas que se seguem à lesão no que diz respeito à recuperação, sendo escassas as Figura 1: Progressão de lesão secundária no tempo. In Becker D, Sadowsky CL, McDonald melhorias registadas após o primeiro ano. É também conJW; Restoring function after spinal cord injury; Neurologist. 2003 Jan;9(1):1-15. sensual que a recuperação neurológica é influenciada pela gravidade da lesão, sendo a recuperação funcional mais dependente da idade do doente, nível de lesão medular e Após um insulto inicial, desencadeiam-se fenómenos de abordagem terapêutica na fase aguda. edema citotóxico e isquémia, com acumulação de radicais livres de oxigénio que por sua vez levam a adicional morte celular. A alteração da microcirculação decorrente deste ambiente celular tóxico promove maior congestão venosa Time is spine que agrava o edema celular e tissular, num ciclo vicioso de Após o estabelecimento de uma lesão primária dos tecidos agravamento da lesão inicial. Becker e colaboradores em neurais na sequência do TVM (por contusão, compressão, 2003 quantificaram esta progressão em termos de extensecção ou laceração) segue-se uma cascata fisiopatológica são de medula lesada, dando a real noção da importância que caracteriza a lesão secundária. Se a lesão primária só de uma actuação célere. pode ser abordada através de estratégias de prevenção e Apesar de este ser um tema que reúne ainda alguma conimplementação de medidas de segurança (rodoviária, criminal etc), já a lesão secundária pode ser minimizada com trovérsia no que diz respeito a tratamento nas lesões inintervenção médica e tem sido este o foco da evolução do completas, parece haver consenso na meta das 24h como definição de tratamento precoce, sendo o ideal o ultratratamento das lesões vertebro-medulares. precoce (até às 8h), com repercussão directa no prognóstico funcional.

LESÃO COMPLETA VS LESÃO INCOMPLETA Após um TVM, é importante a caracterização da lesão em termos neurológicos e funcionais. Recorre-se frequentemente à escala ASIA (American Spinal Injury Association) para uniformizar essa caracterização, sendo o aspecto mais importante para estabelecimento de um plano de tratamento, a caracterização da lesão em completa (sem função neurológica abaixo do nível de lesão) ou incompleta

ABORDAGEM E AVALIAÇÃO INICIAL A abordagem inicial destes doentes é de vital importância em termos prognósticos, sendo a estabilização de um doente com suspeita de lesão vertebro-medular concordante com as directrizes do Advanced Trauma and Life Support (ATLS): Airway – via aérea com estabilização cervical; Breathing – Compromisso ventilatório TVM acima C4;

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C – Circulação – PAM > 90mmHg (reduz risco de lesão isquémica secundária), Choque neurogénico; Disability – avaliação neurológica (GCS); E – Exposição do doente e avaliar como um todo. A avaliação sistematizada preconizada pelo ATLS permite a identificação de lesões potencialmente fatais e a salvaguarda de um agravamento de uma LVM existente, ainda por documentar. A presunção de LVM é condicionada pelo mecanismo de acidente (acidentes de viação de alta cinemática com movimento de chicote cervical e lombar contra o segmento horizontal do cinto de segurança, queda com aplicação de forças de compressão cranio-caudal ou caudo-cranial), pela evidência de trauma localizado ao ráquis, anamnese sugerindo risco acrescido de LVM (idade, história prévia de TVM ou por semiologia sugestiva), em casos de doente não vigil/orientado (sem possibilidade de colaboração fidedigna no exame fisico ou anamnese), em situação de presença de lesão dolorosa concomitante que possa confundir o doente ou a sua avaliação. Todos estes aspectos elicitam suspeita de LVM, impondo estabilização específica no local do acidente (imobilização cervical com colar de Philadelphia e estabilizadores laterais, imobilização em plano duro idealmente com colchão insuflável rígido e aranha) para permitir o transporte do doente até ao meio hospitalar sempre com o intuito de fugir à assombrosa estatística dos 25% de doentes que poderão agravar no decurso do transporte e admissão hospitalar diferenciada, para seu estudo e confirmação ou exclusão de LVM. A importância dos cuidados pré-hospitalares está plasmada no aumento da sobrevida dos doentes com TVM e na sobrevida de doentes com lesões cervicais altas que anterior-

mente morriam no local do acidente, com o surgimento de dispositivos de emergência médica na década de 70, aumento equiparável ao decorrente do aparecimento de fármacos antibióticos (e consequente redução daquela que é ainda a maior causa de morbi-mortalidade nestes doentes: infecções do tracto urinário, respiratório e de úlceras de pressão).

CHOQUE NEUROGÉNICO Constitui uma condição potencialmente fatal, causada pela disrupção do Sistema Nervoso Simpático com preservação da actividade Parassimpática. Isto ocorre tipicamente em doentes vitimas de TVM severo acima de D6. A disrupção da divisão simpática (coluna celular intermediolateral) do Sistema Nervoso Autónomo afecta o fluxo sanguíneo coronário, resistência vascular periférica, contractilidade (inotropismo) e frequência (cronotropismo) cardíacas. Com actividade parassimpática mantida, isto traduz-se clinicamente em bradicardia, possíveis arritmias cardiacas e hipotensão profunda. É importante a existência de um estado de alerta para o reconhecimento deste processo, que num contexto de politrauma pode ser concomitante a outras etiologias de choque (mais frequentemente hipovolémico ou cardiogénico). O seu tratamento é assim muito dificil, pelo que está recomendada a exclusão de outras etiologias de choque antes de assumir um diagnóstico de choque neurogénico. Na prática o tratamento consiste em reconstituir o volume intravascular, e se persistirem sinais e sintomas de choque, administrar vasopressores como a dopamina. O objectivo do tratamento na primeira semana após TVM é a manutenção de uma pressão arterial média de 85-90 mmHg.

Figura 2: Conjunto Tango Flash de limitação de movimento in www.firsthelp.pt

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METILPREDNISOLONA: SIM OU NÃO? Sendo prática corrente a administração de metilprednisolona em altas doses (bolus 30mg/ kg à admissão + 5,4mg/kg/h nas próximas 23h se iniciado antes das 8h após contusão medular) desde a década de 80 como medida de redução da peroxidação lipídica característica da lesão secundária, a prática acabou por ser abandonada por se concluir uma melhoria discreta sensitiva e motora (Bracken 1990, 2012), a par de efeitos adversos muito significativos e estes sim com determinação prognóstica (infecções respiratórias, infecções e deiscência de ferida operatória, insuficiência supra-renal, úlcera péptica, fenómenos trombóticos), já não constando das recomendações da AANS/CNS de TVM agudo desde 2013. Estudos experimentais subsequentes documentaram que o TVM aumenta a expressão de aquaporina 4 (a proteína de canal de água mais abundante no SNC) e que a metilprednisolona reduz essa expressão ao nível basal (consequentemente reduzindo o edema citotóxico). No entanto essa redução de expressão não se provou benéfica, uma vez que era acompanhada de um aumento de extravaso de componentes plasmáticos e subsequente edema tissular (fruto da disrupção da barreira hemato-encefálica agravada pela metilprednisolona e desregulação do VEGF, com aumento do edema vasogénico). Sabendo-se que o edema promove um agravaFigura 3: Abordagem pré-hospitalar do doente politraumatizado de acordo com o ATLS mento da microcirculação bem como pode condicionar compressão raquidiana progressiva , Um doente vigil, neurologicamente íntegro, sem dor no moparece ser consensual que a abordagem terapêutica sobre a vimento activo e vítima de trauma minor dispensa estudos fisiopatologia da lesão secundária da LVM deverá focar a adicionais. Inversamente, a necessidade de estudo é óbvia redução do edema e tal foi documentado em estudos experiem doentes com défices neurológicos e tendencialmente mentais, através do benefício do uso de soros hipertónicos à também assim se tornará em doentes neurologicamente semelhança do utilizado em situações de hipertensão intraíntegros mas com dor localizada ao ráquis, dor à mobilização craniana. activa ou com perfil de alto risco de TVM.

IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DE LVM Sabemos então que a LVM é potencialmente catastrófica e que temos que actuar de forma coordenada e eficiente enquanto equipa pré e intra-hospitalar de modo a agilizar a estabilização, transporte, estudo e tratamento destes doentes de forma a influenciar positivamente o seu prognóstico. E como?

Num doente de alto risco de TVM, procedem-se a exames radiológicos para estudo, tipicamente TC do ráquis. Sabemos que a radiografia simples é um exame de rastreio barato e acessível, mas sabemos também que as 3 incidências cervicais mandatórias (odontoide, AP a 20◦ e perfil de C2-C7/D1) bem como o perfil dorsal com incidência de mergulhador para correcta visualização da coluna médio-dorsal muito dificilmente são adquiridas em doentes imobilizados em con

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Figura 4— Incidências cervicais para estudo em trauma. A – em esquema in med-ed.virginia.edu; B – Caso clínico de doente politraumatizado

admitido no CHLC, EPE.

texto de trauma, o que resulta em falsos negativos de até 6%. Sabemos também que a dúvida não pode permanecer, pelo que surge difundida a recomendação de estudo inicial com TC. Sabemos também que identificada uma fractura num segmento raquidiano, o risco de fractura concomitante (e não necessariamente contígua) ascende a 7%, pelo que o estudo deverá ser completo. E reservamos a RM para os doentes que apresentam semiologia não explicada pelo resultado da TC, necessitando assim de uma avaliação do componente medular, discal e ligamentar que a TC não faculta, quer para estudo, quer para planeamento terapêutico.

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Becker D, Sadowsky CL, McDonald JW; Restoring function after spinal cord injury; Neurologist. 2003 Jan;9(1):1-15. DOI: 10.1097/01.nrl.0000038587.58012.05

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3.

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Nout YS, Mihai G, Tovar CA et al “Hypertonic saline attenuates cord swelling and edema in experimental spinal cord injury: a study utilizing magnetic resonance imaging,” Critical Care Medicine, vol. 37, no. 7, pp. 2160–2166, 2009

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Ryken TC, Hadley MN, Walters BC, et al. Radiographic assessment. Neurosurgery. 2013;72(suppl 2):54-72

Bracken MB, “Steroids for acute spinal cord injury,” Cochrane Database of Systematic Reviews, vol. 1, p. CD001046, 2012.

Editor da Rubrica:

André Villareal MÉDICO VMER Faro e Albufeira sambandre@hotmail.com

Editor gráfica:

Sérgio Menezes Pina MÉDICO VMER Faro e Albufeira S.menezespina@gmail.com

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Fotografia: Pedro Rodrigues Silva

“Porque a emergência também acontece em férias”.









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