Revista agora 1 2014 np

Page 1

ágora revista

aNo vii 1o seMestRe 2014

Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

o mar De água Doce secou o nível da represa de três marias é um dos mais baixos da história, provocando mudanças profundas na vida das pessoas que moram na região


Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014


editorial Do conceito à prática: o aprendizado do Jornalismo para revista”

Por Dayane Cristina e Filipe Diniz

O que é aprender jornalismo de revista? Basicamente, o processo passa primeiro por entender como funciona os textos dos magazines: a linguagem, os gêneros textuais e a tipologia. Depois, é interessante compreender as diferenças em relação ao jornal impresso, marcado pela periodicidade diária, o modelo factual de abordagem da notícia e o modo menos subjetivo da narrativa jornalística. No artigo “Revistas: desafio pedagógico no ensino de Jornalismo”, de Marli dos Santos e Mônica Caprino, publicado na Revista Brasileira de Ensino de Jornalismo (Rebej), pode-se elencar características próprias que diferenciam a linguagem das revistas em relação aos diários. Por exemplo: “títulos nominais (em contraposição ao esquema sujeito-verbo-predicado do jornal diário); possibilidade de uso de adjetivos e coloquialismos; presença de elementos narrativos e descritivos; ênfase aos personagens e falas com possibilidade de apresentação em forma de diálogos e travessões”. No entanto, dependendo da linha editorial, a norma culta poderá entrar em cena. Além disso, o texto de revista privilegia o conceito de tonalidade que, conforme Sérgio Vilas Boas, no livro “O Estilo Magazine”, é caracterizado pela dramaticidade, o humor, a ironia, o espetacular entre outros elementos composicionais empregados. Contudo, todos esses conceitos abordados não funcionariam, para nós, estudantes, sem uma base de aplicação; nesse caso, a produção de uma revista experimental, produzida em laboratório. O ponto de partida para isso foi a escolha da linha editorial. No debate realizado com o professor, ficou decidida a produção de uma revista de variedades, para termos, entre outras possibilidades, a liberdade na definição dos temas a serem abordados. Corroborando então com os argumentos de Santos e Caprino, a etapa seguinte foi a orientação individual dos grupos de repórteres pelo professor, para a observação do fato e a captação de informação, por meio de entrevistas, a fim de se produzir a peça final, respeitando as editorias escolhidas: economia, cultura, internacional, sociedade, tecnologia, comportamento, saúde entre outras. Os detalhes abordados acima são alguns caminhos básicos para o fazer jornalístico, no que se refere às revistas. Portanto, aprender “Jornalismo de revista” é ter os elementos conceituais necessários para aprofundar a notícia de uma maneira diferente das outras mídias. É dar outras percepções ao fato. É submeter o ponto de vista da revista ao crivo do leitor, com maior liberdade. Enfim, é praticar... Boa leitura!

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014


sumário

ágora revista

Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

34 a 35

Presidente do Grupo Splice

fotografia

Antônio Roberto Beldi Reitor João Paulo Beldi Vice-Reitora Juliana Salvador Ferreira Diretor Administrativo e Financeiro Marcelo Vinicius Santos Chaves Secretária Geral Jacqueline Guimarães Ribeiro Coordenadora da Escola de Comunicação Juliana Dias EDITOR DA REVISTA Prof. Edwaldo Cordeiro

24 a 26

sociedade entrevista

5a9

Apoio Técnico: Núcleo de Publicações Acadêmicas do Centro Universitário Newton Paiva http://npa.newtonpaiva.br/npa Cinthia Mara da Fonseca Pacheco Editora de Arte e Projeto Gráfico Helô Costa - RP 127/MG DIAGRAMAÇÃO Kênia Cristina Márcio Júnio Estagiários do Curso de Jornalismo

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014


ENTREVISTA

A persistência de um medalhista olímpico Pugilista brasileiro, 25 anos, natural de Vitória. Um boxeador técnico, ágil, medalhista em campeonatos nacionais e internacionais. Esquiva Falcão, como é mundialmente conhecido, coleciona conquistas importantes na carreira. As principais delas são as medalhas de prata no Pan-americano de Boxe, no Campeonato Sul-americano, e, claro, a mais importantes de todas: a prata olímpica dos jogos de Londres. Feito que o consagrou como o segundo boxeador brasileiro a ganhar uma medalha na história da participação do país em Olimpíadas. Em entrevista à Ágora, entre outros assuntos, ele conta um pouco como foi a trajetória para obter reconhecimento e o momento por que passa o esporte no Brasil.

Fotos arquivo pessoal

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O O SEMESTRE 2014 Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1 SEMESTRE 2014 PÁGINA 5 PÁGINA 5



parte de uma Olimpíada e lá eu dei o meu melhor, trazendo no peito uma medalha de prata para o Brasil e para todos os que fazem parte da nobre arte. A remuneração de um boxeador é boa? Depende da situação em que você se encontra. Depende da categoria ou do que o atleta possa agregar. Na verdade, não é muito boa pelo menos no boxe amador. Para mim, é uma situação que poderia melhorar.

E a transição do boxe olímpico para o profissional, há alguma mudança nítida? Sim. Foi uma mudança difícil de ser feita, mas foi a melhor escolha. Minha vontade era grande de fazer parte das olimpíadas em 2016 no Brasil, mas acredito que a minha parte como atleta e boxeador amador eu já fiz nas Olimpíadas de 2012, em Londres. Fui em busca de um sonho e conquistei. Agora é hora de seguir um novo caminho, dando esse novo passo que o boxe colocou na

minha frente. Só tenho a agradecer a Deus por estar no boxe profissional hoje e por estar trazendo as vitórias, mostrando cada vez mais o boxe brasileiro. Costumo dizer no final da minha luta: ‘o boxe brasileiro voltou’. E a bronca no irmão, Yamaguchi? Conheço muito bem o jeito do meu irmão, do profissional que ele é, mas como irmão e amigo comentei com ele que não é hora das brincadeiras.

Só tenho a agradecer a Deus por estar no boxe profissional hoje e por estar trazendo as vitórias, mostrando cada vez mais o boxe brasileiro. Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1OO SEMESTRE 2014 Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1 SEMESTRE 2014 PÁGINA 7 PÁGINA 7


ESPORTE

“Beijando a lona” O que aconteceu com o boxe? Esporte desapareceu das transmissões de Tvs abertas e a produção de fenômenos como Tyson e Holyfield parece ter sido extinta Por Frederico Vieira, Rafael Martins e Márcio Junio

Nos anos 1970, 80 e 90 eram comuns as noites em que o sofá de casa virava uma espécie de arquibancada, a pipoca era o prato principal e os amigos se reuniam para acompanhar um esporte considerado febre: o boxe. Todos os preparativos eram para assistir a um peso-pesado que hoje está “beijando a lona”. Será? Quando Mike Tyson, Holyfield e outros grande pugilistas subiam ao ringue, as lutas eram imperdíveis, era espetáculo garantido na tela da TV. No Brasil, Maguila, Popó e outros enchiam os brasileiros de orgulho, carregando o nome do país pelo mundo. O boxe figurava entre os principais esportes do planeta. A existência de grandes ídolos e as referências como Tyson impulsionaram o nome da luta. As luvas vermelhas ganharam valor de mercado, e a marca boxe cresceu. A bolsa de aposta tornou-se milionária, e isso se mantém até hoje, apesar do

sumiço. Como afirma o prof. Rangel Medeiros, praticante do esporte há sete anos: “Apesar de não ter tanto espaço como antigamente, os maiores salários do mundo ainda são dos pugilistas”. Além do mais, outras modalidades de luta nasceram paralelamente à evolução do boxe. No final do anos 90, surgia o vale-tudo por meio dos irmãos Gracie, caracterizado pela junção de vários estilos de lutas. Inicialmente, a ideia era apenas colocar à prova a eficácia de cada arte marcial, mas a ascensão foi meteórica. Surgia assim um tal de MMA. Chegou forte, desferiu duros golpes, principalmente na visibilidade do boxe, mas não o bastante para o nocautear de vez. O crescimento do MMA é considerado, por muitos, uma das causas da baixa no boxe. A efetivação da modalidade com a criação do UFC (Ultimate Fighting Championship) chamou bastante atenção, muito em função do show, das lutas performáticas que proporciona.

Enquanto isso, os grandes pugilistas se aposentaram, e a renovação de ídolos parece não ter acontecido. Além disso, o boxe perdeu espaço na grande mídia, principalmente na TV aberta. Mesmo assim, os lutadores atuais contam com altíssimo salários e patrocínios. Por outro lado, vários atletas batalham em condições desfavoráveis, submetendo-se a uma rotina de treinamentos árduos e quase sempre sem remuneração, fazendo com que boxeadores com potencial para o esporte abandone a categoria e busque outras modalidades mais rentáveis. Medeiros acredita que o esporte ainda tem o seu valor. “Todo atleta de MMA aprende diversos golpes de boxe, faz parte da sua preparação”. O professor volta a lembrar sobre os valores e divulgação no mundo da luta. “Os eventos de UFC são mais frequentes, a divulgação é maior. Mas se comparar o salário com um pugilista, ainda estão muito abaixo”. Arquivo pessoal

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 8


à moDa antiga Em Belo Horizonte encontramos uma lenda viva do pugilismo mineiro. trata-se de Fued Mattar, primeiro campeão brasileiro no esporte. Hoje, com 71 anos, o mineiro guarda com carinho as lembranças do tempo que subia ao ringue. Na década de 60 e 70, era quase impossível segurar as mãos ágeis de Fued. Segundo ele, foram mais de 200 lutas e menos de 20 derrotas. Desde 1956, lutando no antigo ginásio do Paissandu, local onde se construiu a rodoviária de Belo Horizonte anos mais tarde, Mattar relembra o passado: “No meu tempo o boxe era uma febre, todo mundo assistia. Já fui parado muitas vezes na rua para dar autógrafos, parecia celebridade“, relembra a gargalhadas. Segundo ele, desde a década de 60 os pugilistas sofrem com a falta de apoio no esporte, que nunca foi o pilar de sustento. E essa realidade dura acontece até hoje. “um boxeador tem que lutar primeiro é no seu dia-a-dia, depois contra os adversários. Eu trabalhava para me susten-

mulher e BoXe

tar. Anos depois, comecei a lutar em outros estados, para ganhar notoriedade e patrocínio”, desabafa Fued. Na categoria peso-pena, foi campeão brasileiro. Por pouco não se classificou para os jogos Panamericanos de Chicago; treinou na academia da Polícia Militar de Minas Gerais e, em 1972, encerrou a carreira com vitória, é claro. Após deixar os ringues, não abandonou o esporte, foi treinador e presidente da Federação Mineira de Boxe, até 1996. Por lá chegou a emprestar até o telefone da própria casa, por falta de apoio. “Fui várias vezes até a Secretaria de Esporte, mas não éramos atendidos. Promovia eventos para não deixar o boxe acabar, mas sem investimento e apoio é difícil”. Mattar é um dos grandes ícones do esporte. Já viveu os dois lados da moeda. Ainda assim ele avalia a situação do boxe como preocupante, pois a falta de apoio e incentivo são uma das principais dificuldades, segundo o ex-pugilista. “O boxe não é mais como era antes”, desabafa.

enquete Atualmente, todos sabem que o boxe não é mais o principal esporte de luta no mundo. O MMA ganhou espaço e, a cada dia que passa, aumenta a legião de fãs. Fizemos uma pequena pesquisa para saber se as pessoas acompanham o boxe. No total, 50 foram entrevistadas, em diferentes faixas etárias. Com base nos dados, chegamos à conclusão que realmente o esporte tão tradicional vem perdendo espaço.

Algo inimaginável anos atrás, a cada dia as mulheres buscam mais espaço no mundo da luta. A procura pelo boxe, na maioria dos casos, é para dar um nocaute nos quilinhos a mais. A luta feminina não é só socos e esquivas. Ou melhor, é totalmente voltada para melhorar o condicionamento físico. De acordo com o prof. igor Simões Santos, a mulher que procura o boxe é aquela que não tem paciência para caminhar em uma esteira. “Elas preferem o boxe, que o aeróbico comum. Pois além de ter o mesmo resultado, as alunas ainda aprendem uma luta”. Ele ainda explica os benefícios: “Aumenta a flexibilidade e agilidade, tonifica a musculatura e melhora o preparo físico. E isso é saúde”. Camila Coutinho, aluna de boxe há seis meses, confirma. Ela disse que já nas primeiras semanas viu a diferença e sentiu o corpo melhor. E a perda de peso veio com o tempo. A explicação para isso é simples, conforme o professor: “A nossa aula aqui é mais solta, 20% dela é ligada diretamente ao boxe. Os outros 80% são voltados para a parte aeróbica”. Mas isso não quer dizer que a aula é light. De acordo com a praticante Gláucia Bicalho, não há moleza: “A gente não para. E isso é bom, faz muita diferença no dia-a-dia. temos muito mais ânimo para fazer as coisas”.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 9


$

ECONOMIA

O que são as agências de classificação de risco?

Elas são responsáveis por categorizar países e empresas como bons ou maus pagadores, interferindo diretamente na vida das pessoas

Por Carolina Roque, Homero Dumont, João Gabriel Sousa

Agosto de 2012. A nota de crédito dos Estados Unidos é rebaixada. O país, pela primeira vez em sua história, deixa de ser um tripo A e passa a ser AA+. Em junho do ano passado, o Brasil teve sua nota revisada. Não era mais “estável”, e, sim, “negativa”. E a União Europeia? No olho da crise de 2008, também viu sua nota despencar. Mas por quem? Pelas chamadas agências de classificação de risco. Poucos conhecem qual é o verdadeiro papel das agências. Mas elas influenciam diretamente a vida de pessoas, empresas e países. As mais famosas desse segmento são a Standarts and Poor’s, Fitch e Moodys. O economista Eduardo Campos explica que os dados recebidos por elas vêm de diversas fontes, e, por isso, tornam as informações mais confiáveis. “Essas agências se baseiam em informações enviadas pelo ‘emis-

sor’, país ou empresa que vai receber a nota, e por fontes de mercado consideradas confiáveis. Os técnicos das agências avaliam toda a situação financeira do emissor”. Conforme o economista, o que vem depois disso é a combinação dos dados recebidos com aqueles obtidos por análises da economia mundial e de especialistas da iniciativa privada. A mistura desses dados resulta no chamado rating: a opinião da agência quanto à capacidade do emissor em cumprir com as dívidas. Dependendo da nota recebida, a economia de um país pode fluir melhor ou afundar de vez. A certeza de que um Estado é um bom pagador o coloca em destaque quando o assunto é angariar investimentos, já o que o mundo capitalista sempre visa ao lucro. Por outro lado, a constatação de que um país tem grandes chances de dar um calote faz não só com que novos investidores desistam de financiá-lo, mas também faz com que os velhos abandonem o barco.

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 10



$

o que acontece depois das temidas classificações?

Como nada é para sempre, as agências revisam as notas periodicamente. Caso uma nova análise dos títulos indique que a qualidade de seu crédito diminuiu, ou que está mais suscetível a não honrar seus compromissos futuros, a agência pode rebaixar ou até mesmo suspender notas. “Quando empresas ou países estão em situação pior, necessitam de um acompanhamento dinâmico. Nessas horas, a simples perspectiva de melhora ou piora conta muito”, explica o economista. Da mesma maneira, se as dívidas forem pagas e a eco-

nomia do país voltar a fluir melhor, a nota é aumentada. Canadá, França, Alemanha, Estados unidos, irlanda, Reino unido, Noruega, Suíça e Suécia são países que possuem as maiores notas de rating nas três principais agências de classificação de risco, Standard & Poor’s, Fitch e Moody’s. Não por acaso, estão entre os países que possuem os maiores PiB’s, que sempre estão no topo de rankings de educação e do iDH. Ainda acha que as notas das agências de classificação de risco não têm relação nenhuma com sua vida?

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 12


eCoNomia

Da informaliDaDe ao empreenDeDorismo Em Belo Horizonte, o ano de 2014 iniciou com queda de cerca de 18 mil trabalhadores informais, um decréscimo de 12,9% de 2012 para 2013 Por Filipe Diniz e bruna Motti

‘Há sete anos, Pedro luis Marques desembarcou no Brasil. Oriundo da cidade de Oaxaca de Juárez, região sudeste do México, veio a Belo Horizonte para conhecer pessoalmente a mineira letícia Guimarães, por quem se apaixonou pela internet. Depois de constituir família, o jovem decidiu não retornar ao seu país. Pedro então iniciou a batalha pela busca de renda. Por gostar bastante de cozinhar, começou a servir tacos, típico prato mexicano, primeiro para a família de letícia e amigos. Depois, com o aval de todos pelo sabor da comida, ele pensou em abrir um negócio: adquiriu um trailer e passou a vender a iguaria em feiras de alimentação em bairros da região noroeste da capital. A iniciativa deu certo, e o casal passou a ser mais um a optar pelo trabalho informal, do qual sobrevive expressiva parte da população brasileira. Segundo pesquisas realizadas sobre a informalidade, 2014 começou com cerca de 18 mil trabalhadores informais a menos em Belo Horizonte, representando uma queda de 12,9% em relação a 2012 para 2013. Em 2012, o panorama era de 139 mil informais e, em 2013, tal número passou para 121 mil. Os dados foram divulgados em março pela Fundação João Pinheiro e pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED),

desenvolvida em parceria com a Secretaria de Estado de trabalho e Desenvolvimento Social (Sedese) e o Departamento intersindical e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Para o coordenador técnico da FJP, Plínio de Campos Souza, a expectativa é que haja uma queda ainda maior nos próximos meses. “A carteira assinada é uma das razões da redução dos informais, já que o número de trabalhadores com registro aumentou 2,4%, alcançando 1.183 milhões de pessoas somente em setembro de 2013. Fora isso, o salário médio desses trabalhadores também aumentou, passando de R$ 1,375 para R$1,478, um acréscimo significante de 7,5%”, explica. Souza também esclarece que a migração para o emprego formal

se dá, principalmente, entre os trabalhadores de menor receita. “Quem tem rendimento mais alto permanece sem assinar carteira, por receio de não conseguir ganhos compatíveis no mercado formal. É uma escolha difícil para muitos, mas tem que ser feita, já que traz mais segurança, como a contribuição previdenciária, fundo de garantia por tempo de serviço e seguro desemprego”, observa. O economista l eonardo Rodrigues ressalta vantagens para quem opta por sair da informalidade, para empreender: “O registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) facilita a abertura de conta bancária, pedidos de empréstimos e emissões de notas fiscais, além de prestar auxílio jurídico junto aos credores”.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 13


Pequena empresa De acordo com os especialistas, para quem decide montar o próprio negócio, a opção pode ser o Programa Microempreendedor Individual (MEI), do governo Federal. Conforme informações do MEI, para ser um microempresário é necessário faturar no máximo até R$ 60 mil por ano e não ter participação em outra empresa como sócio ou titular. Também é possível ter um empregado contratado que receba o salário mínimo ou o piso da categoria. “O MEI será enquadrado no Simples Nacional e ficará isento de alguns tributos federais, como o imposto de renda, PIS, Cofins, IPI e Csll. Com essas contribuições, o microempreendedor terá acesso a benefícios como aposentadoria, auxílio maternidade e doença”, explica Rodrigues. Pensando nas garantias trabalhistas e na produção limitada por conta do espaço do trailer, a família Guimarães Marques viveu novas expectativas. Empreendeu

e, em outubro de 2013, a taqueria “Tá com Tudo” foi inaugurada no bairro Alípio de Melo. “Tínhamos o sonho de ter nosso próprio restaurante e aumentar a capacidade produtiva, para que pudéssemos receber melhor nossos clientes. O espaço também permite divulgar outros elementos da cultura mexicana, como, por exemplo: a música”, ressalta Guimarães. Em relação aos desafios enfrentados, foram taxativos: “Com certeza, para nós, o mais desafiador foram as questões burocráticas e legais, principalmente por eu não ser brasileiro. Mesmo com a ajuda de profissionais da área financeira, gostamos de saber quais as obrigações legais e fiscais que teríamos, já que queremos estar em dia com tudo”, frisa o empresário. Para isso, Letícia procurou se qualificar. Fez o curso de “Gestão para Mulheres” na Fundação Dom Cabral, e “Plano de Negócios” no Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais (Sebrae), com o intuito de ficar sempre atenta

às mudanças e melhorias. Sobre a visão futura do empreendimento, querem sempre crescer e se qualificarem. Mas ao serem questionados se o trailer sempre fará parte dos planos, dizem: “Ele é muito bom de se trabalhar e muito divertido também. É comum no caminho para os locais onde vamos as pessoas gritarem “arriba” ou, “andale, andale”. Gostamos dessa alegria e ela tem tudo a ver com nossa forma de viver o negócio”, destaca. Apesar do cenário da economia informal estar em queda, ainda é perceptível atividades do mercado varejista de alimentação, roupas e eletrônicos sendo comercializadas em shoppings populares e feiras de Belo Horizonte. A carga tributária e a burocracia administrativa por parte do governo são os grandes vilões no processo de formalização, o que, na maioria das vezes, chega a inviabilizar possíveis negócios, embora a formalidade ofereça maior segurança ao trabalhador.

Boca a boca Montar o próprio negócio, mesmo que informalmente, continua sendo o sonho da maioria dos brasileiros. Muitas vezes, pela falta de dinheiro para começar uma empresa de maneira formal, os novos empresários conseguem, aos poucos, dar forma ao próprio negócio. Raphaela Noé, de 28 anos, estava cansada de trabalhar para outras pessoas e resolveu ser a própria chefe. Com um investimento de quase R$ 3 mil, fez um curso técnico de capacitação, adquiriu o material necessário e se tornou

especialista em unhas de gel. Ela conta que escolheu o produto porque faz sucesso entre as mulheres, e é algo que ela mesma já usava há alguns anos: “Sempre tive o sonho de ter meu próprio negócio, e a unha de gel foi a oportunidade que eu vi para poder começar”. A divulgação do empreendimento é feita boca a boca, pelo Instagram e, em breve, pelo Facebook: “as redes sociais são formas gratuitas de divulgação que repercutem de maneira positiva no meu trabalho, não preciso

gastar muito para mostrar que as unhas ficam maravilhosas”. Para atrair a clientela, os preços iniciais são bem abaixo dos encontrados no mercado, cerca de 40%, impossibilitando, por causa disso, manter um salão próprio. A jovem atende na própria casa. Com o lucro que consegue, a empresária começa a recuperar o investimento inicial e faz planos: “Ano que vem quero ter minha própria esmalteria”, sonha a jovem empresária, que parece não querer mesmo voltar a trabalhar para outras pessoas.

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 14


iNterNaCioNal

crimeia — referenDo para quê, se o resultaDo era pré-anunciaDo? A península conta com cerca de 60% da população, dos cerca de 2 milhões de habitantes, formada por russos. Apenas 24% dela é formada por ucranianos Por Jéssica Ribeiro e José Oswaldo Costa

O mundo assiste, alarmado, ao desenrolar da crise na Crimeia, região do extremo sul da ucrânia. Alarmado porque a Rússia ameaçou invadir o país caso o referendo realizado em março não fosse respeitado, já que a maioria da população da península, banhada pelo Mar Negro, decidiu pela anexação ao país do presidente Vladimir Putin. A ucrânia, contrária à separação, não concordou com a decisão e o imbróglio foi parar na Organização das Nações unidas (ONu). Mas por que realizar um referendo se o resultado dele era pré-anunciado? A história da anexação da Crimeia ao império Russo data do ano de 1783. Após trocar de mãos algumas vezes, em outubro de 1921 foi criada a República Soviética Socialista Autônoma da Crimeia (RSSAC), tornando-se parte da extinta união Soviética. Em 1944, Stalin ordenou punir a região por um suposto envolvimento com os nazistas e pela criação de legiões antissoviéticas.Com isso, toda a população de tártaros da Crimeia foi enviada para exílio na ásia Central. Estima-se que 46% dos deportados morreram de fome e doenças. Em junho daquele ano, as populações armênia, búlgara e grega da Crimeia também foram deportadas para a ásia Central. Ao fim do verão de 1944, a “purifica-

ção étnica” havia sido completada. tal contexto ajuda a explicar o porquê de, hoje, a península contar com cerca de 60% da população, dos cerca de 2 milhões de habitantes, formada por russos. Apenas 24% dela é formada por ucranianos. Os tártaros remanescentes não ultrapassam muito os 15% da população total e são, por questões óbvias, fortemente contrários à anexação. Estes últimos retornaram para a Crimeia após a independência da ucrânia, com o fim da união Soviética. levando-se em conta ainda a questão da formação atual da população da Crimeia, majoritariamente russa, o jornalista português Henrique Monteiro, em artigo publicado no dia 7 de março no site Expresso com o título de Criméia – a história não justifica nada, descreveu a situação ao dizer que “a liberdade da região não pode ser reclamada como se a história tivesse começado com Stalin ou com uma falsificação sobre a população histórica da zona. A liberdade da Crimeia terá de ser o resultado de negociações que levem em conta a situação atual, o desejo dos seus habitantes e os interesses ucranianos e russos. Mas não pode resultar da simples vontade de uma maioria que foi imposta à força no território e que finge ali estar desde tempos imemoriais”, observa. Ou seja, o referendo realizado

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 15


em março tinha um desfecho – a aprovação da anexação à Rússia – mais do que esperado. Não é difícil concluir que sequer deveria ter sido feito. Qual o resultado prático da realização de um referendo direcionado à anexação de uma península a determinado país, quando se sabe que a grande maioria da população da península é originária daquele que pretende anexá-la? Algo um tanto quanto redundante, desnecessário. Além disso, o resultado “oficial” informou que houve aprovação de 95% dos eleitores quando, em uma pesquisa realizada antes do referendo, revelou que apenas 42% dos habitantes eram favoráveis à anexação. Este fato levantou suspeitas, e tanto os Estados unidos, como a união Europeia, informaram que a votação não seria reconhecida pela comunidade internacional. Afinal, parece evidente a fraude do resultado. Fato é que, no final de março, a ONu levou à votação uma resolução com o intuito de declarar inválido o referendo. No fim, a resolução ucraniana foi aprovada com 100 votos a favor, 11 contra e 58 abstenções. Outros 24 Estados membros não votaram. Diplomatas ocidentais definiram o resultado como um sucesso diplomático para a ucrânia, sendo que Estados unidos e delegações europeias disseram que ela revelou o isolamento da Rússia nessa questão. Pelos números apresentados pela pesquisa realizada antes da consulta, fica claro que até mesmo alguns russos residentes na Crimeia não desejavam a anexação. Sem este processo, a península, bem como a ucrânia, passaria a fazer parte da união Europeia, situação economicamente mais interessante. Porém, se é interessante permanecer com a ucrânia e entrar para a união Europeia, porque alguns habitantes são favoráveis à anexação? Conforme o prof. José luiz Niemeyer, “aqueles que são favoráveis à anexação esperam receber benefícios econômicos e sociais da Rússia. Para a Crimeia, a anexação

pode representar ganhos logísticos e econômicos, com o forte capitalismo de Estado praticado pela “mãe” Rússia”, explica. Certo é que a Rússia se valeu de dois importantes subterfúgios: o grande número de russos morando na península e a enorme influência econômica e militar para provocar pressão. De qualquer forma, ela sairia vencedora no “embate”, o que torna o referendo algo totalmente inócuo e desnecessário. Foi um “teatro” montado pelos russos, dizem vários analistas internacionais. A Crimeia possui regime de República Autônoma (divisão administrativa semelhante a uma província) e faz parte da ucrânia desde 1954. Naquele ano, o então líder soviético Nikita Kruschev transferiu o território em um gesto simbólico de amizade. No entanto, o interesse russo, agora, é proveniente, principalmente, da localização da península, que fica às margens do Mar Negro. É o único porto de águas quentes da Rússia que permite acesso ao Mediterrâneo, ligação marítima para toda a Europa, áfrica e saída para o Atlântico. Há também ligação com o Oceano Índico, por meio do canal de Suez. Além disso, seus portos servem para escoar a produção agrícola da ucrânia e de pontos de exportação, para a Europa, do gás natural russo. A Crimeia é uma grande produtora de grãos e vinhos. Possui terras ricas para a agricultura, com forte atuação na produção alimentícia. Ainda há a questão militar, uma vez que a marinha russa possui uma base na cidade de Sebastopol há 230 anos. Os navios e submarinos baseados neste porto podem alcançar o Mediterrâneo com facilidade para chegar ao Oriente Médio e aos Bálcãs. Com o colapso da união Soviética, em 1991, havia certo desejo local de que a Crimeia deixasse a ucrânia e se tornasse parte da Rússia. Porém, legisladores decidiram não autorizar o movimento, criando tensões com os russos.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 16


o cerne da questão! No fim de 2013, o então presidente da ucrânia, Viktor Yanukovych, decidiu recusar um acordo que estreitaria os laços do seu país com a união Europeia – acordo que era costurado há três anos. Ao invés disso, resolveu sinalizar com uma aproximação com a Rússia. Na época, os ucranianos chegaram a admitir que a decisão fora baseada nas pressões que os russos exerciam, como a ameaça de cortar o fornecimento de gás natural e a tomada de medidas protecionistas contra produtos ucranianos. Após o anúncio desta aproximação, oposição e parte da população (pró-união Europeia) tomaram as ruas em manifestações que acabaram em violência e mortes. No início do ano, os protestos ficaram mais violentos, com a presença de armas de fogo em ambos os lados do conflito. Cerca de 100 pessoas morreram e outras centenas ficaram feridas, incluindo policiais. Em fevereiro, Yanukovych foi destituído do poder e as eleições presidenciais que acontecem no fim do ano foram antecipadas para maio. Neste período de hiato, quem governa a ucrânia é o opositor Oleksander turchynov, presidente do Parlamento. Ele informou que dialogaria com a Rússia, para melhorar as relações entre os países, mas a integração com a união Europeia viria em primeiro lugar. Dessa forma, tanto a Rússia como os ucranianos pró-russos entenderam que havia acontecido, na verdade, um golpe de Estado. E

os conflitos continuaram. Após o referendo na Crimeia e a suposta “vitória” da vontade da maioria, Putin assinou um tratado de adesão e enviou tropas à região, além de invadir postos militares na ucrânia. Este país, por sua vez, considerou a ação como uma declaração de guerra e preparou todo o seu território para uma possível invasão. No leste, onde a maioria também é russa, o movimento pró-Rússia ganhou força e militantes invadiram prédios governamentais. A guerra civil esteve bem próxima, colocando frente a frente militantes pró-união Europeia e militantes pró-Rússia, todos irmãos, todos ucranianos. Segundo a ONu, quase 130 pessoas, entre soldados, separatistas e civis morreram em atos de violência desde o início da operação “antiterrorista”, lançada pela capital, Kiev, em abril para retomar o controle das cidades do leste. Antes da eleição em maio do novo presidente ucraniano Petro Poroshenko, Putin ordenou a retirada das tropas que realizavam manobras na fronteira com a ucrânia, que mobilizou até 40 mil homens, segundo fontes ocidentais, sob o pretexto de manobras e testes militares. Porém, até o momento, tanto Estados unidos como a OtAN (Organização do tratado do Atlântico Norte) afirmam que não há qualquer prova de que o Exército russo tenha iniciado a retirada. A tensão no local, portanto, continua.

TáRTaROS O tártaro pertence à família das línguas turcomanas, que inclui azerbaijano, basquir, cazaque, iacuto, nodai, quirguiz, turco, turcomeno, tuvínio e uzbeque. Algumas dessas línguas são tão parecidas que, até certo ponto, as pessoas conseguem se entender. Por muitos séculos, havia uma relação entre tártaros, mongóis e turcos. Os falantes das línguas turcomanas são encontrados aos milhões no mundo inteiro. Hoje cerca de 4 milhões de pessoas vivem na multirracial República da tartária, localizada no extremo leste da Rússia europeia. Nas ruas das cidades da tartária, falam-se tanto o tártaro como o russo, e os jornais, livros, rádio e televisão fazem o mesmo. Os teatros exibem peças em tártaro sobre a história, o folclore e o cotidiano da etnia. Os tártaros eram caçadores e criadores de gado. Ainda hoje, a culinária tradicional deles inclui vários pratos com carne. Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 17


MEIO AMBIENTE

“O medo que algum dia o mar também vire sertão...” Com a falta de chuvas e o nível da água baixíssimo, a represa de Três Marias preocupa moradores e empresários da região Por Armando Mariano, Paula Rabelo e Rafael Phillipe

“Eu não vi o mar, eu vi a lagoa”. Com esse trecho do poema de Carlos Drummond de Andrade, pode-se descrever a situação preocupante do lago de Três Marias. Onde antes se via um oceano de água doce, hoje apenas sobraram pequenos córregos, terra e pouquíssima água. O famoso “Mar de Minas” está praticamente seco, afetando seriamente a vida das pessoas que vivem na região. Com o objetivo de fornecer energia para 80% do norte de Minas Gerais, a represa foi inaugurada em 1969. Formado o lago, a bela paisagem atraiu novos moradores, turistas e empreendedores para o local, que tem como atividade econômica as atividades de pescas e de hotelaria, com diferentes pousadas e hotéis. No entanto, com o nível da água mais baixo da última década, o

lago está tornando difícil a vida de muita gente. Lanchas e embarcações, por exemplo, sofrem para navegar, isso sem falar nos riscos de acidentes que aumentam drasticamente. Lúcio Vieira, guia de pesca local, conta que tem sido complicado conseguir clientes nos últimos meses. Segundo ele, algumas pessoas ficam com receio de fazer um passeio de barco ou lancha, já que os troncos e tocos estão substituindo a água. “Realmente está difícil para navegar com segurança. Por mais que a gente preste atenção, sempre acertamos alguma galhada. É muito perigoso pilotar com o nível da água tão baixo, e isso acaba afastando os clientes”, relata Vieira. Às margens da represa, visitantes e moradores se reuniam para admirar o belo cartão-postal mineiro. Em época de cheia, a água invadia as varandas e terreiros das casas. Porém, nos últimos meses, em vez

de água, são pedras, barrancos e galhos secos que compõem a cena. O tão falado Mar Doce está se transformando em sertão. Com as últimas notícias, muitos pescadores amadores que procuram a região deixaram de visitar o local. Rosilene Mariano, gerente de uma pousada, localizada na cidade de São José do Buriti, disse que está passando por dificuldades, pois a procura de clientes tem sido cada vez menor. “Sentimos a diferença. Com a represa cheia ficamos sempre lotados, mas com esta seca, poucas pessoas estão vindo”, afirma. Mas, nesta situação preocupante, ninguém é mais prejudicado do que os ribeirinhos. Eles necessitam da represa para sobreviverem, retirando seu sustento, na maioria das vezes, dos pescados e da criação de peixes em gaiolas. Com as águas baixas e a pesca afetada, como eles estão vivendo?

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 18


O pirata do mar sem água Um “pescador de ilusões”. Esse é Rogério Boldrini, ribeirinho conhecido da região de Três Marias. Nascido no Espírito Santo, precisamente na cidade de Vitória, decidiu morar em Minas Gerais a partir do ano 2000, depois de se encantar com a região. Segundo ele, na época, a represa era um verdadeiro Jardim do Éden. “Já fiz de tudo um pouco nesta vida. Viajei para vários lugares e morei em diferentes estados, mas quando conheci o famoso Mar de Minas, me apaixonei. Não pude resistir a tanta beleza reunida em um só lugar”, relembra o pescador. Mais conhecido como capitão Jack Sparrow, famoso personagem de Johnny Depp no filme Piratas do Caribe, Boldrini brinca ao falar do apelido, dizendo que o personagem não chega aos seus pés: “Se ele soubesse metade do que eu passei, teria se

aposentado de vergonha. Já naufraguei, fui picado por cobras peçonhentas, lutei com onças nas matas e tive um dedo da mão arrancado por uma piranha”, conta mostrando as cicatrizes das batalhas. Mas, para ele, quem dera a vida fosse apenas de contos fabulosos e de brincadeiras. Segundo o capitão, Três Marias já foi o céu; porém, hoje, é um verdadeiro inferno para o pescador. Boldrini diz que a represa já não é mais a mesma. Ele teme pelo pior: o desaparecimento. De acordo com o pirata, os tempos mudaram, e o mar não está mais para peixe. “Quando me mudei pra cá, pescava todos os dias. Minha renda mensal era bem estável, e, na segunda semana do mês, já estava com o salário na mão. Hoje, com esta seca, passo dificuldades. Já não pego tantos peixes como antes e, muitas vezes, não tenho nem o que comer”, lamen-

ta. O pescador praticamente aposentou as varas e as redes de pesca, tirando o sustento agora do artesanato. Linhas, iscas e acessórios que antes capturavam peixes, hoje fazem parte do acervo de colares, brincos e pulseiras do ribeirinho. “Não tenho opção. Ou vendo artesanato ou continuo passando fome. É claro que ainda passo dificuldades, pois o dinheiro que ganho com isso não é muito. Serve apenas para me manter vivo”, relata em lágrimas. Boldrini, o Sparrow brasileiro, afirma que, apesar do cenário triste em que a represa se encontra, ainda acredita que ela suba o nível novamente um dia. “Só me resta confiar em Deus e pedir que nos ajude. Espero que no ano que vem chova muito e o lago se recupere, fazendo tudo voltar ao normal”

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 19


Fotos Armando Mariano

especialistas Afinal, por que o baixo nível da represa causa tantos problemas? Ítalo de Carvalho, biólogo, diz que os desequilíbrios devido à falta de água são muitos e afetam a fauna local. “Primeiramente, há um problema de temperatura. Com a carência de chuvas, a tendência do lago é esquentar. Esse fator influencia no comportamento dos peixes, pois pode afetar sua reprodução e fazer com que eles procurem locais mais fundos, onde a temperatura é mais baixa. isso se torna um obstáculo para os pescadores, pois dificulta as capturas diárias”, explica.

O biólogo disse ainda que, além do aumento da temperatura, o baixo nível acaba causando uma aglomeração de peixes em locais pequenos. Dessa forma, a disputa por alimentos e a predação entre as espécies são maiores. “Com pouca água há menos vegetação. Sem vegetação, há pouco alimento, e isso acaba prejudicando toda a cadeia alimentar do ecossistema”, observa. Carvalho ressalta que a culpa não é da natureza, e, sim, dos seres humanos. Segundo ele, o Brasil inteiro está passando pela mesma situação de três Marias, pois o Aquecimento Global está

cobrando o preço. ”Não temos mais estações bem definidas. Está tudo desregulado. Esse problema é mundial, e cabe a nós tentarmos reverter esta situação”, defende. Além disso, o biólogo é contra a construção de represas, isso porque existem outras formas menos impactantes de se gerar energia. “As barragens impedem os peixes de subirem as corredeiras para se reproduzirem. isso leva à diminuição da quantidade. Parece que ninguém está nem aí para a natureza. O dinheiro gasto em futebol dava para se investir em fontes mais ecológicas de energia. um exemplo é a eólica”, explica revoltado.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 20


antes Decidimos entrevistar uma moradora antiga da região para saber se o argumento de Ítalo de Carvalho está correto. Maria do Carmo, 76, mora na cidade de São José do Buriti desde que nasceu. Segundo ela, quando criança, costumava ir pescar para passar o tempo e trazer comida para casa. Porém, o cenário era bem diferente de hoje. “Antigamente não havia a represa. tinha apenas um córrego que desaguava no Rio São Francisco. Mas, a quantidade e variedade de peixes era bem maior do que nos dias de hoje”, conta. Segundo ela, o número de animais existentes no local era surpreendente. Além disso, o tamanho dos peixes impressionava.

“Certa vez em uma pescaria amarrei a linha em um galho grosso, isquei um peixe pequeno no anzol e joguei na água. Não deu outra, quase fui parar dentro do córrego. Demorei mais de uma hora para vencer o peixe, e quando eu o vi, me impressionei. Era um Surubim de mais de 20 quilos”, conta sorridente. Apesar de saber dos benefícios que a represa gerou, como, por exemplo, o aumento do número de empregos, na opinião da antiga moradora, a vida era melhor antes de sua construção. De acordo com ela, a natureza estava em pleno equilíbrio e ninguém passava por dificuldades. “Vivíamos de forma bem simples, mas éramos

felizes. O Velho Chico era um paraíso, com seus peixes enormes e em grande quantidade. Sempre satisfazia a todos. Hoje em dia tudo mudou. A represa foi construída e trouxe seus benefícios, mas também trouxe o desequilíbrio”, lamenta. De fato, sendo benéfica ou não, a represa de três Marias está em situação crítica. As comportas da barragem foram fechadas para impedir que o nível da água caia ainda mais. Mas, sem fluxo, a energia deixa de ser gerada e as cidades da região são prejudicadas. O quintal dos mineiros está deixando uma dúvida na cabeça de todos. Será que esse mar vai virar sertão?

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 21


teCNoloGia

me Digas o que queres e te Direi qual aplicativo BaiXar...

A facilidade da compra de smartphones faz com que as pessoas possam explorar as facilidades que os aplicativos podem oferecer

Por laura Senra, Manuel Carvalho, Rayza Kamke

Você está em um bairro da zona sul e precisa ir para um na região norte, mas não sabe qual o melhor caminho. Você abre um aplicativo (app) e coloca a localização atual e onde quer ir. Em instantes ele traça a rota mais simples para você chegar ao destino. Fácil, não? Atualmente não é preciso medir esforços para nada, ou quase nada. Você tem no celular maneiras simples de resolver alguns problemas. A lista de apps, para isso, vem se tornando cada vez maior. É comum ver aparelhos celulares nas mãos das pessoas e perceber a inúmera variedade de ferramentas incluídas nele. Os programas caíram no gosto dos brasileiros e, hoje, correspondem a 1,4% da produção tecnológica no país. Com o aumento da venda de aparelhos celulares e com a tecnologia

avançando a cada dia, os aplicativos são essenciais no cotidiano do consumidor. Por causa disso, nota-se que os aparelhos antigos estão sendo substituídos pelos mais modernos. usufruir das funcionalidades de milhares de apps tem se tornado essencial na hora de comprar um novo aparelho. Felipe Meirelles, desenvolvedor de aplicativos, explica: “uma variedade grande de serviços surgiram ou migraram para atender a esta demanda, impulsionando ainda mais a indústria de apps no Brasil”. ler um livro, assistir filmes, escutar música, acessar uma rede social ou jogar um game são algumas das inúmeras variedades de aplicativos presentes nos mais novos aparelhos celulares, essenciais hoje no cotidiano do consumidor. Para quase tudo existe um tipo de app para se utilizar. E a explicação é somente uma: é mais fácil e rápido usar um aplicativo do que abrir um site no celular.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 22


usuários a web comendo poeira O uso de aplicativos vem se tornando frequente, mais até do que os maiores sites de serviço encontrados. O que antes faziam os consumidores ligarem um computador, hoje é feito na palma da mão, e de maneira simplificada. Os apps não costumam ultrapassar base de dados para não ficarem pesados no celular. O sucesso é tamanho que até as maiores marcas e lojas estão se rendendo a esta funcionalidade. Não é novidade que as mulheres adoram ir às compras. Se sair de casa e ir ao shopping era um problema,

hoje não é mais. Aplicativos trazem a praticidade de se fazer consultas online se algum produto que você precisa está em promoção, ou quantas quantidades há no estoque. Para Cinthia Xavier, 20, além do lazer, os aplicativos de compra trazem praticidade, já que não é preciso utilizar um computador para fazer pesquisas diárias. “Eu ganhei muito mais tempo e com uma economia que cabe no meu bolso!”, analisou. Os aplicativos mostram para ela, diariamente, ofertas em shoppings de Belo Horizonte

a mão que desenvolve Se de um lado o número de usuários de aplicativos cresce, do outro, desenvolvedores quebram a cabeça para criar programas que facilitem e satisfaçam os consumidores. Erick Alves, desenvolvedor web, comprou seu primeiro iPhone em 2009 e achou fantástica a ideia de poder criar aplicativos que possam servir para entreter e facilitar a vida das pessoas. No mesmo ano, iniciou os estudos na faculdade, no curso Sistema de informações e desenvolveu seu primeiro aplicativo. Com apenas 24 anos, está terminando a pós-graduação em Aplicativos Móveis e já lançou o “Xavecador”, recurso para cantadas e o “Minha Série”, para as pessoas que frequentam academia poderem colocar as informações de sua ficha de treino e consultar. “Além de ficar mais organizado e com algumas funcionalidades legais, ainda ajuda o ambiente,

diminuindo o uso de papel”, observa Alves. Ambos os aplicativos estão disponíveis na Play Store e contabilizam mais de 100 mil downloads cada. Mas nem tudo são flores. Para ser disponibilizado na Apple Store (loja de aplicativos da Apple), é preciso ter CNPJ e patente alta para que o aplicativo fique no ar. Já na Play Store (loja de aplicativos do sistema Android), o envio dos aplicativos é extremamente fácil. “Em questão de 30 minutos eu já conseguia encontrar meu aplicativo na loja e compartilhar nas redes sociais com os meus amigos”, conta. De acordo com a empresa de pesquisas tecnológicas Gartner, no Brasil a venda de aparelhos smartphones cresceu 170% no último ano. O aumento do consumo dos aparelhos influencia diretamente no mercado de criação de programas e aplicativos.

Para Cleisson lima, 21, os aplicativos são sinônimos de simplificação e agilidade. O estudante de Jornalismo afirma conseguir acompanhar as notícias do mundo com facilidade e eficiência, o que o “deixa ligado” nas coisas que acontecem ao seu redor. Cleisson ressalta a praticidade em se manter nas redes sociais por meio das ferramentas, simplificando a área de comunicação. “Não dá para ficar desatualizado com as coisas que andam acontecendo por aí. Com os aplicativos eu vejo o que está rolando em tempo real, além de bater um papo com as pessoas”, ressalta. Para quem mora longe da família, os aplicativos podem ser um jeito fácil e econômico de matar a saudade. luana Bazzi, 19, saiu de Rondônia para realizar o sonho de estudar Odontologia no interior de São Paulo. Aplicativos de comunicação como WhatsApp, Facebook ou Skype trazem o conforto de se sentir perto daqueles que fazem tanta falta. “É muito grande a importância destes aplicativos para mim. Consigo apartar minha necessidade de manter contato com a família aonde quer que eu esteja, e a baixo custo”, conta. Além dos aplicativos de comunicação, luana utiliza diariamente ferramentas que possibilitam pedir suas refeições em seu próprio smartphone. Segundo a estudante, além da variedade de opções, o atendimento é rápido, tem várias formas de pagamento, e agiliza bastante para quem não tem tempo. “Hoje é impossível viver sem essa tecnologia”, defende.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 23


SOCIEDADE

“Geração Z” não sabe brincar Segundo sociólogo, crianças têm abandonado brinquedos e jogos tradicionais e passado mais tempo em frente ao computador, gerando uma espécie de “autismo social” Por Dayane Cristina, Henrique Coutinho e Sueli Azevedo

Onde está a amarelinha, o pega-pega, a queimada, o pião, a peteca? As crianças não brincam mais na rua? Não se divertem mais no parquinho do bairro? E as panelinhas de barro e os objetos reciclados? Elas não querem mais criá-los? As novas tecnologias chegaram para tomar o lugar desse tipo de diver-

são? Agora, as crianças preferem ficar sozinhas com o computador a se divertirem com outras? Essas são algumas das perguntas que vêm à nossa mente quando pensamos em brincadeiras e brinquedos que ficaram para trás. A psicóloga Daniela Borja explica que as crianças desta época são parte da chamada Geração Z, pois convivem com a tecnologia desde o nascimento. “É praticamente ine-

vitável que o mundo virtual não apenas marque as histórias delas, como também oriente seu processo de aprendizagem”, afirma. Para a psicóloga, o contato da criança com as novas tecnologias pode exercer um duplo papel: propicia acesso a diversas informações e contribui para a autonomia; mas, por outro lado, dificulta a postura crítica e estimula a impulsividade e o imediatismo.

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 24


Ainda segundo a especialista, o excesso de tempo em frente ao computador, por exemplo, pode promover dependência e desestimular o contato com outras pessoas. Pode, inclusive, dificultar brincadeiras, organização do tempo e a tolerância à frustração, tão fundamental para o convívio social. Em um passado não muito distante, era possível ver crianças brincando de bola na rua, fazendo roupinhas de boneca, sujando-se de tanto rolar no chão, na grama, na lama. A maioria delas ainda não tinha acesso às novas tecnologias, como celular, computador ou vídeo games. Por isso, elas interagiam mais. Uma ia à casa da outra para brincar ou várias se juntavam em um só lugar, como no parque ou na pracinha. Bola, pipa, bambolê,

varetas e bolinhas de gude estavam sempre presentes na roda de amigos. Esses brinquedos faziam a alegria da garotada, que se entrosava cada vez mais. Na escola, elas não viam a hora de o sinal para o recreio tocar para irem logo brincar com os coleguinhas. A secretária Suelen Marins é um exemplo de pessoa que aproveitou a infância brincando na rua com os amigos e familiares. Ela fala de alguns brinquedos que a divertiam, como um boneco de pano, Barbies e bambolês. “Era um boneco de cobertor. Gostava muito dele. Eu também era frenética no bambolê”. Para ela, nos dias de hoje, é quase impossível ver uma cena com crianças com esses brinquedos na rua. “Elas não vivem”, critica. Amarelinha, passa anel, jogo do

mico, da memória e quebra-cabeças. São inúmeras as brincadeiras que tanto divertiam no passado. A maioria delas precisava ser realizada entre duas ou mais pessoas. Nunca seria possível, por exemplo, uma pessoa brincar sozinha de pega-pega, esconde-esconde ou pula-corda. Portanto, era necessário interação, encontrar companheiros para brincar. Isso é nostálgico e nos leva a refletir sobre a proximidade e intensidade dos relacionamentos de amizade no passado. Realmente o mundo mudou, como prova o relato de Suelen. O avanço da tecnologia contribuiu para que tais mudanças aconteçam de maneira mais rápida. As novas ferramentas tecnológicas têm tomado o espaço das interações pessoais e, consequentemente, da socialização.

Fotos Sueli Azevedo

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 25


ainda há esperança um exemplo de lugar que ainda valoriza objetos e ações que norteavam as antigas interações sociais é o Museu dos Brinquedos. Situado em Belo Horizonte (Avenida Afonso Pena, 2564 - Funcionários), o espaço possui acervo com aproximadamente sete mil brinquedos, entre bonecas, carrinhos, bolas, peças didáticas e outros objetos. Segundo a educadora Nayara Aline de Souza, o foco do Museu é o resgate das brincadeiras. O local recebe visitas individuais e de grupos escolares. Os pais levam os filhos para ver os brinquedos com os quais brincavam na infância. A visita é dividida em três momentos. O primeiro deles é a apresentação do acervo. Em seguida, os visitantes participam de oficinas de criação de brinquedos, produzidos com materiais de baixo custo ou recicláveis. Depois, é a hora do resgate de brincadeiras antigas. Adultos podem relembrá-las e muitas crianças têm a oportunidade de conhecê-las pela primeira vez. “O principal do Museu, que a gente sempre gosta de abordar, é a oportunidade de os pais estarem brincando com os filhos”, ressalta Nayara. Não podemos negar que a chegada das novas tecnologias tem ajudado as crianças, por exemplo, nos trabalhos da escola e no processo de aprendizagem. Mas, se usada de forma errada, ela também pode ser uma arma de dessocialização, como dizem os especialistas, uma vez que isso provoca o distanciamento entre as pessoas.

interação social Pessoas de classe alta sempre tiveram acesso às tecnologias primeiro. Hoje, no entanto, o quadro parece ter mudado, pois é difícil encontrar alguém que não tenha um celular. E as crianças não ficam de fora da lista de “atualizados”. Se há alguns anos alguém ganhava um computador de presente no aniversário de 15 anos, agora uma criança ganha um tablet antes de completar um terço dessa idade. Muitos pensam que não há problemas nisso. Afinal, o mundo está em constante evolução e as crianças precisam acompanhar a tendência. Mas não é bem assim. Segundo o sociólogo e professor Rudá Ricci, há uma profunda controvérsia no meio acadêmico a respeito do impacto das novas tecnologias. Segundo ele, as crianças possuem, até os oito anos de idade, uma visão de mundo denominada paralógica, que cria uma experiência fantasiosa, uma projeção. Sem ela, não é possível desenvolver a capacidade artística, da poesia, do teatro e, inclusive, da representação social (da autoridade, por exemplo). As crianças mergulhadas no mundo matemático e binário das novas tecnologias tornam-se ansiosas, imediatistas e profundamente racionais, atrofiando as outras dimensões da inteligência e vivência humanas. Na opinião do professor, as redes sociais, por exemplo, formam comunidades fechadas de adolescentes e juvenis. Essa dinâmica gera o que os ingleses denominam, hoje, de comunidades de “pares de idade”, as quais definem comportamentos, valores, hábitos e, até mesmo, linguagem. isso resulta na diminuição do tempo de convívio familiar, verificado nos últimos anos nos grandes centros urbanos. “Passar horas na frente do computador gera uma espécie de “autismo social”, em que só há espaço para sua pequena comunidade virtual (ou até menos, quando todo o espaço é tomado pelos jogos virtuais)”, explica o sociólogo: “A intera-

ção é o processo básico de socialização”, frisa. Crianças precisam interagir com outras não apenas porque tal convívio possibilita o desenvolvimento da inteligência, mas também porque, ao se relacionarem, são aprendidas regras para a vida em sociedade. É importante deixar um pouco de lado o celular, o computador e o vídeo game, e buscar brincadeiras que requerem mais movimento e brinquedos manuais. Para Daniela, as crianças precisam desenvolver coordenação motora, tanto geral como fina. Atividades físicas e brincadeiras ao ar livre são algumas das possibilidades de desenvolvimento, como equilíbrio, força e noção de esquema corporal. Os trabalhos manuais, por sua vez, contribuem para o desenvolvimento da coordenação motora fina, essencial para a escrita. lev Vygotsky, psicólogo russo com várias publicações acerca do desenvolvimento humano e da educação, observou que as brincadeiras são exercícios que antecipam as experiências adultas. Para explicar a ideia de Vygotsky, Rudá diz que brincar com a miniatura de um veículo, por exemplo, projeta a criança para dentro do carro real. “Quantos de nós não “lutou até a morte” com um exército imaginário ou “andou na corda bamba” para atravessar um desfiladeiro”, pergunta. “todos esses exercícios ficcionais nos colocam numa realidade projetada em algo próximo da teleologia (estudo filosófico dos fins, isto é, do propósito, objetivo ou finalidade da humanidade)”.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 26


SOCIEDADE

não é para proteger “bandido”! Por que existe a concepção de que os Direitos Humanos foram criados apenas para defender criminosos? Por João Vitor Cirilo, João Paulo Freitas e Felipe Freitas

Rocinha, Capão Redondo, Pavão-pavãozinho, Carandiru, Complexo do Alemão, Guarujá, o Ônibus 174, Realengo. Eloá Cristina Pimentel, Fabiane Maria de Jesus, o menino João Hélio Fernandes, Amarildo Dias de Souza e DG. O que todos esses locais e pessoas têm em comum? Todos eles foram “palco” ou vítimas de violência. Segundo reportagem divulgada pelo jornal O Globo, o Brasil registrou, em 2012, o maior número absoluto de assassinatos da história, é o que revela a nova versão do Mapa da Violência. Nada menos do que 56.337 pessoas foram mortas naquele ano, num acréscimo de

7,9% frente a 2011. É a taxa mais alta de homicídios desde 1980, a qual leva em conta o crescimento da população, que também aumentou 7%, totalizando 29 vítimas fatais para cada 100 mil habitantes. O levantamento, ainda de acordo com o jornal, foi baseado no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, que tem como fonte os atestados de óbito emitidos em todo o país. O sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz é o autor do Mapa. As taxas são 50 a 100 vezes maiores do que a de países como o Japão. E isso marca o quanto ainda é preciso percorrer para chegar a uma taxa minimamente civilizada, argumenta o sociólogo em entrevista para o periódico.

As estatísticas referentes a homicídios em 2012, portanto, são recordes dentro da série histórica do SIM. Mas quem são os personagens desses números? Certamente não são a elite brasileira. Mesmo com a atuação de entidades defensora dos Direitos Humanos, para se ter uma ideia, a cada 100 mil negros, 36 morrem. Quando comparamos com as pessoas não consideradas negras, esse número cai para menos da metade, 15,2. Os dados são de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), baseado em números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Então, para que servem os Direitos Humanos?

Questão mais ampla Certamente, não foram criados para defender bandidos. Entretanto, essa é uma ideia altamente disseminada em nossa sociedade, onde a violência, infelizmente, já se tornou algo comum. Cansada de ver a impunidade imperar, a população se revolta cada vez mais. Capitão Nascimento, personagem do ator Wagner Moura no filme “Tropa de Elite”, soltou uma de suas pérolas relacionada ao assunto. “Só que tem muito intelectualzinho de esquerda que ganha a vida defendendo vagabundo com papo de Direitos Humanos”. Bom! Não é por aí.

Para William Santos, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), “a questão dos Direitos Humanos é muito mais universal. Em nosso país, por exemplo, é uma questão nova, só existe de 1988 pra cá. Muitas coisas precisam avançar”. Para Santos, a justificativa para a justiça com as próprias mãos é a impunidade. “Isso leva as pessoas a crerem que outros têm muito mais direitos do que os cidadãos comuns. Na verdade, é uma fala distorcida, preconceituosa. Quem não pre-

cisa de Direitos Humanos é que fala isso”, observa. Maria do Rosário de Oliveira, advogada do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Material Reciclável, também lamenta a opinião preconceituosa das pessoas. “É preocupante. Isso revela um total desconhecimento acerca do tema e uma demanda necessária e urgente a ser trabalhada nas escolas e em todos os espaços de formação, na mídia, que é formadora de opinião. Mudar essa visão é uma responsabilidade do Estado”, frisa.

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 27


Declaração universal dos Direitos humanos Proclamada e adotada pela resolução 217 A, pela Assembleia Geral das Nações unidas, em 10 de Dezembro de 1948, nela, todos os membros da família têm direitos iguais e inalienáveis. Fundamentase na liberdade, justiça e paz no mundo. Seu principal objetivo é promover o respeito através do ensino e da educação. Além disso, segundo a Declaração, todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Elas devem agir com honestidade perante seus semelhantes. E não existe distinção de cor, sexo, raça, língua, religião, opinião política ou classe social. todos são iguais, mantendo assim seu contexto de liberdade igualitária. Apesar de os Direitos Humanos existirem há pelo menos 65 anos, no Brasil ainda é novo. No entanto, seus preceitos são uma questão universal e têm relação com nossa última Constituição, em vigor desde 1988. “Aqueles dispositivos contidos no artigo 5º da Constituição, dos Direitos e Garantias individuais e Coletivos, são uma cópia dos 30 artigos da Declaração universal dos Direitos Humanos, elaborada pela ONu”, segundo o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG, Wiliam Santos. “O Brasil é signatário desde 1948 e de diversos tratados e convenções acerca do tema. A atual Constituição materializou o assunto, sobretudo nos seus artigos 5º e 6º. Quando pensamos nesses direitos, pensamos nos elementares e fundamentais, como: moradia, saúde, educação, lazer, trabalho, liberdade de ir e vir, garantia da integridade física... Sem esquecer que o respeito à dignidade da pessoa humana é fundamento da república Federativa do Brasil, assegurado em seu artigo 1º”, observa a advogada Maria do Rosário de Oliveira.

revolta Mas há aqueles que acham que Direitos Humanos é para proteger criminosos, e os argumentos para isso são muitos.

As redes sociais, por exemplo, constituem um dos principais territórios de difamação das leis de proteção às pessoas.

maioridade penal Estamos falando de uma das maiores discussões atuais da sociedade brasileira: deve-se ou não reduzir a maioridade penal para 16 anos? Seria essa uma solução? Quando perguntamos a especialistas e pessoas envolvidas na área, a resposta é sempre negativa: — As cadeias não são símbolo de recuperação e dignificação de infratores, mas, sim, escolas do crime, onde seres humanos são expostos a situações degradantes e insalubres. Desta forma, colocar jovens num sistema prisional falido seria apenas qualificar novos adultos na prática de crimes, opina a advogada Joyce Ferreira de Freitas. — Se resolvesse, seria a salvação do Brasil. Mas pensemos

em um exemplo: um menor de 16 anos que rouba uma bala, e um outro que comete latrocínio (roubo seguido de morte), terão pela justiça o mesmo tratamento. isso é ilegal, imoral, uma injustiça”, posiciona-se Santos. Santos explica que um dos problemas na questão da maioridade penal no Brasil é a utilização dos menores de idade como uma espécie de “escudo” para os mais velhos. “Na verdade, quem está por trás disso são maiores de idade, que utilizam os menores para puxarem para si a culpa de crimes para ficarem isentos, pegando pena menor. Não acredito que somente o endurecimento da lei vá apaziguar ou pacificar a sociedade”, observa.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 28


pena de morte Aqueles que cometem grandes crimes, cujas penas podem ultrapassar a pena máxima, merecem ou não pagar da forma mais dura possível? Apesar de ser um desejo de parte da população, como um espelho da revolta existente na atualidade, a pena de morte não é possível do ponto de vista legal, segundo os especialistas. Existem artigos na Constituição Federal que impedem a execução até de emendas constitucionais, ou seja, não podem ser alteradas: são as chamadas Cláusulas Pétreas. Exemplos são as questões de soberania, democracia e direito à vida, esta última encontrada no art. 5º. Segundo Santos, isso não solucionaria o problema. “É um princípio que não pode nem ser passível de emenda e não vai resolver o problema da criminalidade. Até porque, se acontecer, o mais prejudicado será aquele que sempre ficou à margem da lei, aquele que nunca teve direito a uma defesa decente”, analisa. É importante lembrar que o Brasil já adotou a pena de morte, como no caso de tiradentes, enforcado em 1792. “Não é um processo que trará benefício, porque só pobre e preto vão morrer, pode ter certeza”, reforça Santos, caso o país adotasse medidas como essa.

moradores de rua também é dever do Estado amparar as pessoas que vivem nas ruas, conforme explica a advogada Maria do Rosário de Oliveira. “O Brasil hoje conta com uma política nacional para a população em situação de rua, regulamentada pelo Decreto Federal número 7.053, de 2009. Ela traz diretrizes gerais a serem observadas pelos Estados e Municípios e vem na linha de assegurar a dignidade dessas pes-

soas, combater as violências cometidas contra elas e garantir o acesso às Políticas Públicas, sobretudo as essenciais e de emergência, como moradia, saúde, proteção, educação e alimentação”. uma pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social em 71 municípios do Brasil, incluindo capitais e cidades com mais de 300 mil habitantes, evidenciou a presença de quase 32

mil pessoas adultas em situação de rua, deixando de fora cidades como Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre e Recife. “Como pode-se perceber, as pesquisas sobre a contabilização da população em situação de rua ainda possuem fragilidades (pelos recortes realizados) e são realizadas de maneira fragmentada. Elas indicam a importância da contabilização desse grupo populacional”, avalia a advo-

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 29


trÂNsito

“tinha BeBiDo um pouco e Bati”... O drama de quem já sofreu acidente de trânsito. Para aqueles que conseguiram sobreviver, os traumas causam impactos psicológicos e até na vida social. E as leis criadas para conter os desastres automobilísticos parecem inócuas Por ana luiza gonçalves, ana Paula Moreira e João Marcelo Drumond

As estradas de Minas Gerais há tempos preocupam motoristas de todo o país que por elas precisam trafegar. Frequentemente são noticiados acidentes, e, muitos deles, quando não acontecem mortes, provocam sequelas graves nas vítimas. A BR-381, por exemplo, é considerada uma das vias com maior ocorrência de acidentes no Brasil, segundo as autoridades de trânsito. Em 2011, por exemplo, as colisões frontais e transversais somaram 70 das 115 vítimas registradas nas estradas, conforme levantamento realizado pelo Departamento Nacional de infraestrutura de transportes (Dnit), garantindo ao trecho entre Belo Horizonte e João Monlevade, portanto, o simpático apelido de “Rodovia da Morte”. Segundo pesquisas realizadas pelo Mapa da Violência, do Centro Brasileiro de Estudos latinoAmericanos, no Brasil as principais causas de acidentes relacionam-se à mistura de álcool e volante, e o excesso de velocidade. Ainda, segundo o Mapa, os casos vêm aumentando nos últimos anos e a inércia das autoridades fragiliza cada vez mais o sistema de trânsito no país. As iniciativas dos governantes, conforme a Socióloga Miriam de Alcântara, são ineficientes e pouco contribuem com a diminuição dos acidentes. “Fazer algo para a

melhoria do trânsito é algo bem caro e traz ‘prejuízos’ políticos para os interesses individuais dos poderosos. O estado não faz nada e a população está cada vez mais alienada diante da situação”, critica. A executiva luciana Bastos conhece bem o que é sofrer um acidente grave: “Eu era recepcionista e, no retorno para casa, dormi no volante. tinha bebido um pouco e bati no ônibus”, confessa. Somado a isso, ela lamenta a questão do socorro no momento da batida. — O grande problema do acidente foi que o motorista, por mais que não estivesse errado, deveria ter parado para me socorrer, e isso não aconteceu”. Segundo a psicóloga e professora Sylvia Flores, o acidente, além de afetar o estado físico do indivíduo, pode alterar o quadro psicológico da pessoa, provocando uma série de consequências na vida social. Ela observa que os acidentes estão para além de qualquer tipo de violência física ao indivíduo. “Os traumas físicos são evidentes e podem, sim, ser para a vida toda. Mas o trauma psicológico afeta diretamente a vida da pessoa em sociedade, sua socialização e adaptação ficam comprometidas”. Ainda, segundo a psicóloga, “o problema começa na educação das pessoas ou na falta dela, não podemos fazer do jeito que queremos no trânsito. Políticas públicas podem produzir conscientização desde a infância”, analisa.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 30


críticas A maioria das críticas das vítimas é direcionada ao governo, responsável pela manutenção, equilíbrio e funcionamento das estradas. O advogado leandro Augusto Deodato sofreu um acidente na marginal do Anel Rodoviário, em Belo Horizonte, quando, em uma descida, não conseguiu parar, e bateu em um outro veículo. “Foi um grande susto. Só percebemos que a situação era crítica quando ela, de fato, aconteceu com a gente”, lembra. Para o advogado, a qualificação dos motoristas e a manutenção das pistas devem ser medidas imediatas. Em 2000 entrou em vigor o Novo Código Brasileiro de trânsito, obrigando, por exemplo, o uso do cinto de segurança, aparato até então não utilizado pelos motoristas. Agora, existe a famosa lei Seca (11.705), medida das autoridades para evitar o número de acidentes devido ao consumo de álcool. Mas parece que não está sendo o suficiente. isso porque a situação é de âmbito social,

conforme as vítimas. Érica uba sofreu a violência do trânsito e compartilha o drama vivido, após acidente autobílistico no Anel Rodoviario, em 2004. Segundo ela, uma carreta com mais de 25 toneladas de minério de ferro estava desgovernada e colidiu com seu automovel e em mais 11 veículos, em um monstruoso engavetamento. Ela foi arremessada contra o carro da frente e a mureta que divide as pistas, lembra emocionada a cena. — Meu carro subiu à mureta, percorreu cerca de 100m, derrubou dois postes e capotou na contramão, parando de cabeça pra baixo. Por quase dois meses, a vítima conviveu com o pavor do cheiro de combustível; além disso, por muito tempo, ela teve pânico de parar em semáforos ou qualquer situação em que possa ocasionar uma batida traseira. Com o passar do tempo, o medo foi reduzido, contudo, diante de qualquer congestionamento, Érica fica apreen-

siva. Então, evita ser o ultimo carro. “O Brasil inteiro precisa dessa concientizção. temo pelo trânsito de todo o país, viajo muito a trabalho e, infelizmente, as pessoas se comportam como se estivessem competindo”. Érica ressalta ainda que o Anel Rodoviário é um trecho bastante perigoso, pois as carretas e caminhões simplesmente ignoram a presença dos veículos menores, e afirma ser uma grande defensora do transporte ferroviário. Érica fez algumas seções com um psicólogo com o objetivo de voltar a dirigir normalmente, já que trabalha como representante comercial e necessita dirigir para trabalhar. As seções ajudaram a externar o medo. A representante comercial acredita que a diminuição de veículos de carga seria um grande avanço, para diminuir os índices de acidentes; além disso, para ela, é preciso novas estradas e sistemas mais eficientes de controle de velocidade.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 31


saÚde

ElE nãO é O CulPaDO

O cão é apenas um hospedeiro da leishmaniose: entretanto, é o mais injustiçado. Mesmo que todos fossem extintos, o problema continuaria existindo... Apesar de existir há mais de um século, a leishmaniose ainda é pouco conhecida e assustadora. A doença atinge não só os cães, mas também os seres humanos e assusta, muito divido à falta de informação. O que muitas pessoas não sabem é que ela não é contagiosa e, sim, infecciosa. Além disso, um cão que possui o parasita, mas não apresenta sintomas clínicos, não é um animal doente, é apenas um portador do protozoário. O Brasil, juntamente com a Espanha, possui os melhores profissionais em relação a estudos sobre a doença, prevenção e tratamento. Apesar disso, é o único país que usa a política da eliminação do hospedeiro, não a do transmissor. A fim de encontrar animais contaminados, os centros de zoonoses realizam visitas para fazer testes de sangue, os quais detectam apenas se o animal é portador do protozoário ou não. Em casos positivos, o governo

incentiva os proprietários a encaminharem os animais para a eutanásia, ao invés de estimular o tratamento. Em países desenvolvidos, é proibido, por lei, a eutanásia, como forma de controle da epidemia. Belo Horizonte é a capital com maior índice de mortalidade em função da doença. Ela chega a 12%, enquanto a média nacional é de 6%. Em função disso, pesquisadores da universidade Federal de Minas Gerais (uFMG) estão caminhando para desenvolver uma vacina contra a leishmaniose, para o homem. A previsão é de que até 2015 os testes já estejam concluídos e, futuramente, a vacina poderá circular no mercado. TRanSMiSSãO Ocorre por meio da picada de insetos hematófagos — aqueles que se alimentam de sangue — conhecidos como flebótomos.

Os parasitas vivem e se multiplicam no interior das células que fazem parte do sistema de defesa do indivíduo, chamadas macrófagos. Os nomes dos insetos transmissores variam de acordo com a região, e os mais populares são: mosquito palha, birigui, cangalhinha e palhinha. Hoje já existem mais de vinte espécies de parasitas. Além dos cães, a enfermidade ataca animais silvestres e urbanos; entretanto, é imprescindível ter consciência de que eles não transmitem a doença. A contaminação ocorre apenas pela picada do inseto que estiver infectado. A leishmaniose também pode atacar os humanos. Nesse caso, a contaminação e a transmissão se assemelham à dos animal, pois ambas só acontecem através da picada do mosquito. Ela pode se desenvolver de duas formas: a primeira é a leishmaniose tegumentar que caracteriza-se por feridas na

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 32


pele, localizadas na maioria das vezes nas partes descobertas do corpo. tardiamente, podem surgir feridas nas mucosas do nariz, na boca e na garganta. Essa forma de leishmaniose é conhecida como “ferida brava”. A outra é a leishmaniose visceral, uma doença sistêmica, pois acomete vários órgãos internos, principalmente o fígado, o baço e a medula óssea, mas também pode atacar a pele, que é a maior víscera do corpo. Esse tipo acomete principalmente crianças de até dez anos. Após essa idade torna-se menos frequente. Ela é uma doença de evolução longa, podendo durar alguns meses ou até ultrapassar o período de um ano. Vale lembrar mais uma vez que leishmaniose não é contagiosa e que só a contrai quem for picado pelo transmissor. “Quando recebi o resultado do exame da minha Nina, fiquei desesperada e só pensava como isso aconteceu se ela estava tão saudável e sem nada que apontasse estar doente”, conta a cabeleireira e maquiadora ivana luzia Fernandes. Muitas vezes a doença passa sem ser percebida, pelo fato de os sinais serem assintomáticos em 60% dos casos. Já em outros casos, eles só começam a aparecer quando a leishmaniose já está avançada. Quando existe sintomas, os mais comuns são feridas em torno do focinho e da orelha, unhas crescendo em excesso, perda de apetite e queda dos pelos. Além disso, o animal pode apresentar secreção nos olhos, emagrecimento, fraqueza e desânimo. É importantíssimo acentuar que um animal pode apresentar um desses sintomas, mas não estar doente. inevitavelmente, ao receber o resultado positivo pela zoonose, a primeira reação é um choque por parte da família, e a atitude imediata vai depender do valor que o cão tem para ela. Posteriormente, serão analisados outros fatores como a vontade do dono de tratar ou não, o estado físico em que o animal e seus donos se encontram e, principalmente, se os mesmos

Fotos arquivos pessoais

“Quando recebi o resultado do exame da minha Nina, fiquei desesperada e só pensava como isso aconteceu se ela estava tão saudável e sem nada que apontasse estar doente” possuem o conhecimento do tratamento, porque se depender dos órgãos públicos responsáveis, o animal é imediatamente levado para ser sacrificado. “Nossa rotina em casa segue a mesma. Muito amor e brincadeiras. Não sinto medo dela, só sentiria a pior das criaturas se não tentasse

fazer nada por ela, e a entregasse à própria sorte”, diz ivana. Entretanto, a condição financeira é quem poderá definir o que será feito futuramente. Segundo o médico veterinário Marcelo Jácome, dificilmente se pode estimar um valor exato para o tratamento, pois cada caso é um caso. Os custos vão depender muito da saúde, peso e idade do animal, e se outras infecções se fazem presentes. A aposentada Maria das Graças Amaro da Fonseca possui três cães. um deles é a Belinha, de sete anos, que há um ano e meio vive com a leishmaniose. Segundo dona Maria, seu dia-a-dia nunca deixou de ser normal. O que mudou foi a frequência das idas ao veterinário. Agora é no mínimo mensal. Ela conta, ainda, que o preço dos medicamentos não fugiram do seu orçamento, e que ela paga por cada remédio cerca de R$ 30,00. “um fator grave e que acontece muito, é o fato de o exame ser só uma triagem e mostrar se o animal teve contato com o protozoário ou não, havendo, assim, falsos positivos em grandes números”, relata o veterinário. Para resultados mais precisos, segundo ele, é necessário um acompanhamento dos animais para a confirmação do diagnóstico. Vale frisar que existe um tratamento com medicações veterinárias de uso oral, e hoje no mercado há uma vacina que garante 98% de proteção, por isso ela é muito recomendada. Entretanto, não há distribuição gratuita pelo Ministério da Saúde e o preço atual gira em torno de R$ 95,00 por dose, sendo que são necessárias três. Associadas à vacina é aconselhável utilizar outras formas de prevenção, sendo uma das principais a coleira repelente para combater o inseto vetor. “Hoje estamos bem, amanhã só Deus sabe. Sei dos meus deveres, mas conheço também meus direitos. temos, por lei, direito garantido de tratar nossos amados e queridos cães. Nunca abandone seu amigo nesta hora”, desabafa ivana.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 33


Cultura

ExPRESSãO E SEnSibiliDaDE nO OlhaR

Além da técnica e da tecnologia utilizadas atualmente, a fotografia também é considerada uma arte. É por meio dela que momentos únicos podem ser eternizados no tempo

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 34


Por Camila Chagas, Jéssica Rayanne e Raquel Durães

As cenas captadas no momento ideal faz toda diferença para as fotografias. Isso porque elas trazem à tona lembranças de um tempo que não volta mais. A saudade de épocas passadas, das pessoas que partiram e de tantos outros momentos inesquecíveis são algo presentificado nelas. Mais do que uma simples imagem fixada no papel, o que parece importar mais na fotografia é o sentimento que ela desperta em quem as vê. Por meio das lentes das câmeras da máquina junto à sensibilidade do olhar de um fotógrafo, a fotografia permite a captação de imagens históricas que, como diz o velho ditado popular, valem mais que mil palavras. Mesmo sem conhecer o contexto social que as cercam, o fato é que podemos sentir todo o seu conteúdo expressivo. Sim! Sentir. “A Menina Afegã” de Steve McCurry,

por exemplo, fotografada em 1984, pode ser considerada uma das mais belas e expressivas da história. Imagens emblemáticas Além da foto de McCurry, outras imagens também estão no topo das que retratam fortes sentimentos e realidades sociais. Independente da época em que foram feitas, as fotografias sempre causam impacto em que as vê. Fotógrafa e jornalista, Januária Vargas ressalta as emoções que as imagens podem passar. — Essas fotos carregam múltiplos sentimentos e não foi por acaso que foram premiadas e destacadas no mundo. Mesmo sendo fotografias antigas, elas nunca foram esquecidas, pois marcaram um período que significou muito para a história da humanidade, da vivência dos retratados ou de um povo específico. Já para Tibério França, estudioso e crítico de fotografia, é preciso destacar ainda mais a atemporali-

dade dessa forma artística. — A fotografia é uma linguagem universal e atemporal. A dignidade humana é algo que percebemos, ou não, nas imagens, independente do período em que foi feita, ou em alguns casos, exatamente por isso. Sendo assim, as fotos merecem ser analisadas e contempladas de forma profunda e com olhar crítico, pois expressam os extremos, em todos os sentidos. Guto Muniz, fotógrafo e professor do Centro Universitário Newton Paiva, explica: — De formas distintas, elas são muito fortes. As fotografias têm impactos diferentes, mas todas têm uma carga emocional intensa. As imagens ainda causam diversas reflexões, porque as histórias se repetem. A guerra do Vietnã, por exemplo, passou, mas as guerras permanecem, As crianças continuam sofrendo do mesmo jeito. Todos os momentos continuam da mesma forma.

Reflexos da alma Sharbat Gula foi fotografada aos doze anos pelo fotógrafo Steve McCurry, em junho de 1984, no acampamento de refugiados Nasir Bagh, no Paquistão, durante a guerra contra a invasão soviética. Sua imagem foi publicada na capa da National Geographic em junho de 1985 e, devido à expressividade de seu rosto e dos belos olhos verdes carregados de medo, a capa se transformou numa das mais famosas da revista e do mundo. Guto reconhece que essa é uma fotografia que mais lhe chama atenção. — A expressividade do olhar

da garota é muito impactante. Parece que ela conta toda sua história de vida e submissão só com o olhar. A impressão é que ela finalmente mostrou o rosto para revelar isso para as pessoas. Como falam os olhos dessa menina! Durante 17 anos, Steve McCurry realizou uma busca pela garota e, em janeiro de 2002, achou a menina e pôde saber seu nome. Já uma mulher de 30 anos, Sharbat Gula vive numa aldeia distante do Afeganistão. É uma mulher tradicional pastún, casada e mãe de três filhos.

“A expressividade do olhar da garota é muito impactante. Parece que ela conta toda sua história de vida e submissão só com o olhar”

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 35


“Essa foto retrata o desespero, a tristeza e o desamparo das crianças fugindo do bombardeio. Sempre penso nelas sendo fruto de algo criado pelos adultos

A Menina do Vietnã Em 8 de junho de 1972, um avião norte-americano bombardeou a população de Trang Bang com napalm, produto inflamável à base de gasolina gelificada. No local estava a pequena Kim Phuc e sua família. Com as roupas em chamas, a menina de nove anos corria em meio ao povo desesperada e, no momento em que suas roupas haviam sido consumidas, o fotógrafo Nic Ut registrou a imagem. Ela ajudou ao mundo a conhecer os horrores da guerra no país asiático. E há quem diga que ela ajudou também a pôr fim no conflito tempos depois. — Essa foto retrata o desespe-

ro, a tristeza e o desamparo das crianças fugindo do bombardeio. Sempre penso nelas sendo fruto de algo criado pelos adultos (a guerra), e no sofrimento no qual elas levarão para a vida toda”, observa Januária. Após fotografá-la, Nic a levou a um hospital, onde a garota ficou internada durante 14 meses, sendo submetida a 17 cirurgias de enxerto de pele. Atualmente, Kim Phuc está casada, com dois filhos e reside no Canadá, onde preside a Fundação Kim Phuc, dedicada a ajudar crianças vítimas da guerra. Além disso, também se tornou embaixadora da UNESCO.

(a guerra), e no sofrimento no qual elas levarão para a vida toda”

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 36


Favela de Paraisópolis Um dos mais recentes trabalhos e, provavelmente, um dos mais discutidos são as fotografias de Tuca Vieira. A famosa foto da “Favela de Paraisópolis” é, talvez, o registro mais claro e preciso do contraste social de algumas cidades do Brasil. A foto foi feita há cerca de dez anos para a Folha de São Paulo e levou grande fama. Apesar disso, em relatos no seu site pessoal, o autor da imagem fala como se sentiu menosprezado. — Recentemente, encontrei uma foto minha no Facebook, sem nenhuma menção à autoria, mas com centenas de comentários. Ninguém ali se perguntava quem fez a foto. [...] Ela foi feita há cerca de dez anos e até hoje recebo pedidos do mundo inteiro para reproduzi-la em livros, revistas e material didático. Devo muito a ela. Projetou meu trabalho, me deu prêmios, me levou a exposições aqui e no exterior. Mas o fato

é que a imagem me fugiu do controle. Em 2007, ela foi mostrada na Tate Modern, em Londres, em uma exposição chamada Cidades Globais. Era o cartaz, o convite, o folder, o cartão-postal e até o crachá da exposição, que incluía gente como o fotógrafo alemão Andreas Gursky. Foi quando percebi que olhavam para essa foto como se não houvesse um autor. A foto era importante, mas eu não. Comecei a ser apresentado como ‘Tuca, the guy who took that picture’. Não pensem que é fácil tirar uma foto como essa. Ela faz parte de uma série de fotos que fiz nessa época sobre São Paulo, e não é fruto do acaso. [...] Às vezes essa foto me enche o saco. Tenho projetos novos para mostrar, mas a cena de Paraisópolis com frequência ofusca outros trabalhos. Será que tudo mais que eu fizer nunca vai ter a importância dessa única foto?”, escreve em carta.

“Às vezes essa foto me enche o saco. Tenho projetos novos para mostrar, mas a cena de Paraisópolis com frequência ofusca outros trabalhos. Será que tudo mais que eu fizer nunca vai ter a importância dessa única foto?”

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 37


“A profissão de fotógrafo é dolorosa, por ter que retratar momentos tão tristes. E, às vezes, nos sentimos culpados por registrar a cena, ao invés de ajudar as pessoas que precisam. Pelo que já li sobre o autor da

Espreitando a morte Em 1994, o fotógrafo Sudanês Kevin Carter venceu o Prêmio Pulitzer de fotojornalismo com uma foto tomada na região de Ayod (aldeia em Suam), que viajou o mundo inteiro. A figura esquelética de uma pequena garota, totalmente desnutrida, recostando-se sobre a terra, sendo vigiada por uma criatura de bicos pontudos, um abutre, à espera da morte. Esta foi uma das fotografia mais polêmicas da história, pois mostrou um dilema constante de muitos fotógrafos. Fazer a foto ou ajudar a criança? Januária explica o sentimento que muitos profissionais da área enfrentam diariamente: — Nessas horas pensamos como a profissão de fotógrafo é dolorosa, por ter que retratar momentos tão tristes. E, às vezes, nos sentimos culpados por regis-

trar a cena, ao invés de ajudar as pessoas que precisam. Pelo que já li sobre o autor da foto, Kevin Carter, ele cometeu suicídio. A discussão em torno da foto foi tão longa e séria que, de fato, quatro meses depois, tomado de culpa e dependente de drogas, Kevin Carter suicidou-se. Os prêmios que Carter levou pela foto e o reconhecimento do seu trabalho não foram suficientes para aliviar o peso em não ter ajudado a criança. — Se estivesse no lugar dele, faria a foto. Não tenho dúvida nenhuma em relação a isso. Acho que seria impossível não fotografar e não aproveitar o momento para mostrar a realidade. O que se faz depois da foto é outra história. Mas acredito que, naquela situação, eu só poderia tomar medidas paliativas, mas a morte era algo certo, afirma Guto.

foto, Kevin Carter, ele cometeu suicídio” Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 38


Fotógrafos e “fotógrafos” Com o passar do tempo, os profissionais e seus equipamentos fotográficos sofreram mudanças e, até hoje, são submetidos a constantes avanços tecnológicos. Mas, levando em conta a afirmação de Tibério, “os meios evoluem, mas a fotografia continua sendo fotografia, senão vira vídeo, gif, animação, computer graphics entre outras modernidades”. Devido à internet, muitas pessoas saem da zona de conforto e buscam seguir outras vertentes na fotografia, sejam em cursos online, criando grupos de estudos e conquistando diferentes clientelas. Isso abre os hori-

zontes e amplia a área de conhecimento de cada um. Entretanto, hoje em dia virou moda qualquer pessoa se autonomear fotógrafo, apenas por ter equipamento profissional. Mas, será que no meio dessa multidão de fotógrafos existem aqueles que ainda trabalham com a sensibilidade do olhar? “Com certeza podemos reconhecer as pessoas que exercem a profissão por amor, não somente por dinheiro ou status. Algumas, mesmo sem ter um bom equipamento, conseguem fazer imagens surpreendentes e repletas de senti-

mentos. E há pessoas com uma megaestrutura que fazem fotos superficiais”, afirma Januária. Apesar de existirem fotógrafos e ‘fotógrafos’, Tibério também pontua a importância de bons equipamentos. “Fotografia trata de representação; portanto, um bom fotógrafo é aquele capaz de transmitir a mensagem do evento naquele momento histórico, e o equipamento pode ajudar, sendo ele um iPhone ou uma Hasselblad, depende de cada caso. O que faz um bom fotógrafo é o uso que ele faz do produto de seu trabalho, onde e quando ele aparece”.

“Devido à facilidade da manipulação, os aparelhos parecem funcionar em função do homem. Devido à sua complexidade, parece que o homem funciona em função dos aparelhos. Na realidade, homem e aparelho se coimplicam, e vão formar um amarrado de funcionamento: a máquina funciona em função do fotógrafo, se, e somente se, este funcionar em função da máquina”. (Flusser, 1982)

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 39


Cultura

seriáticos, com muito orgulho As séries norte-americanas evidenciam a potência da indústria cinematográfica dos Estados Unidos; no Brasil, elas conquistam cada vez mais telespectadores Por Daniel Reis, Pâmela Matos e Shirlei Rossana

— Você viu o último episódio de Game Of Thrones? — Menina, nem te conto que o David Clarke está vivo! Essas são conversas típicas a respeito das séries, em rodas de amigos, na escola ou no trabalho. Produtos culturais com forte impacto social, elas atingem públicos distintos no mundo inteiro e, muitas vezes, refletem a realidade política, social, econômica e ideológica das pessoas. São mais de 140 produções na ativa, sem contar as reprises. Os aficionados, conhecidos como seriáticos, evidencia o boom entre pessoas, por mexer com a cabeça de jovens e adultos, devido às tramas bem elaboradas e personagens envolventes. Em praticamente todos os lugares há alguém comentando ou,

sem querer, soltando algum spoiler, ou seja, revelações do enredo. São inúmeras as páginas em redes sociais dedicadas às séries e, constantemente, os personagens viram assuntos mais comentados no twitter. FEbRE As séries norte-americanas começaram a fazer sucesso há várias décadas, graças a “SOS Malibu”, “Starsky e Hutch”, “Dallas” entre outras. Depois de uma aparente queda no consumo desses produtos, “Supernatural” parece ter impulsionado novamente a trilha de sucesso das produções de séries. Com a estrondosa repercussão na mídia, a narrativa dos irmãos caçadores de demônios ganhou espaço no SBt. Na Record, “CSi” coleciona fãs de todas as idades, quebrando, inclusive, paradigmas a respeito do que se pas-

sava no horário nobre da televisão brasileira. Mas por que assistir série virou “febre” entre os brasileiros? — Acho que o brasileiro sempre foi muito ligado em televisão, e a diversidade que as séries trouxeram só fez aumentar essa paixão em ter alguma história para acompanhar. É maravilhoso comentar com o amigo o episódio que acabou de assistir, explica a seriática Ana Souza. — Existem muitas séries, para todos os gostos, sempre tem um assunto que vai agradar a algum público. Elas também acompanham o crescimento e a vida de muitas pessoas, passam a fazer parte de suas rotinas e estão sempre nos tópicos de conversa com os amigos, fazendo com que a identificação seja muito maior, observa Stephanie Alípio, também apaixonada por séries.

CuRiOSiDaDES  lost é a série de Tv mais assistida no brasil.  a série televisiva mais assistida de todos os tempos foi baywatch, de acordo com o livro dos recordes. Ela, que ficou conhecida no brasil como S.O.S. Malibu, foi ao ar entre os anos de 1989 e 2001 e, segundo o guinness, chegou a ser assistida por cerca de 1,1 bilhão de pessoas por semana em mais de 140 países. O único continente para onde baywatch não foi transmitida foi a antártida. Para quem não se lembra, esse foi o seriado que imortalizou a atriz Pamela anderson como a sexy salva-vidas C.J. Parker. a série se passava nas praias da Califórnia e teve 11 temporadas.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 40


Ana Souza Júlia Hibrahim

Stephanie Alipio

Emily Ferreira

por que assistir séries e não novelas? — Não gosto de novela, acho que a série e a novela são duas coisas totalmente diferentes. Novela é muito sem graça, não vejo emoção, e as histórias são sempre as mesmas, diferente das séries, segundo Júlia ibrahim. Para Emily Ferreira, há uma concorrência leal entre as séries americanas e as novelas exibidas no mesmo horário em canais diversos. Hoje em dia, como está mais “popular” assistir a séries americanas, e o interesse na internet é maior, consequentemente o brasileiro mudou sua cultura. Até mesmo as novelas estão adquirindo os formatos de séries. Ainda segundo as seriáticas, o problema é que os autores de telenovelas começaram a se acomodar. Para elas, parece que se vê sempre a mesma história. Além disso, a famosa “barriga” passou a incomodar cada vez mais: uma novela com 180 capítulos pode ser, em alguns casos, resumida em não mais do que 80. Com isso, aquela sensação de tempo perdido, de não necessidade de se acompanhar diariamente começou a gerar desânimo em parte do público. As séries, por outro lado,

começaram a ganhar mais investimento, apresentando tramas complexas e inovadoras, analisam as seriáticas. Existem séries com temporadas curtíssimas, de três a 10 episódios, por exemplo. Justamente por essa duração mínima de cada ciclo, dificilmente se vê algum episódio que é pura enrolação. Assim, a falta de “barriga” na trama é um fator que atrai quem não aguenta a “enrolação” que é tão frequente em novelas. Por outro lado existem as séries cujas temporadas são maiores; normalmente, são as séries da tV aberta americana. Nesses casos, cada ciclo possui, em geral, de 22 a 24 episódios. Por causa desse número maior, é mais comum assistir nessas séries certas tramas que só servem mesmo para preencher o tempo necessário para cada episódio. Contudo, costuma-se sempre perceber que há ao menos uma preocupação com a qualidade do início, do meio e do fim de cada temporada. Assim, por mais que as séries maiores possam apresentar “barriga” (episódios filler), ela não dura tanto quanto dura as novelas.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 41


Séries de sucesso Vampiros, zumbis, guerras, dramas, policiais, musicais, amigos, risadas, teorias fantásticas. São muitos os temas abordados nas séries atuais, mas quais fatores constituem uma trama de sucesso? As seriáticas explicam: — As séries chamadas “sitcom” (comédias) fazem sucesso porque retratam situações cotidianas de um grupo de amigos de forma engraçada. Outro tipo de série que tem agradado ao público são as de fantasia, envolvendo super-heróis e seres sobrenaturais, diz Stephanie Alípio. — Para começar, a trama, além de ser bem escrita, deve apresentar personagens interessantes, com os quais o público se identifique. Mais do que simplesmente fazer o público se identificar, é preciso também dar profundidade aos personagens, destaca Miriã Paiva. Antes e depois As séries mais antigas eram marcadas por temas e abordagens bem diferentes do que se vê hoje. Os roteiros bem escritos se destacavam da produção mediana, e mesmo que as cenas parecessem “mal feitas”, todos os erros, inclusive os mais óbvios como os de continuidade, eram ignorados. Com o avanço da tecnologia, mais recursos puderam ser utilizados pelos produtores, criando uma gama infindável de efeitos espetaculares. Quais então as principais diferenças entre as séries antigas para as atuais? — Pela minha experiência com Friends, Arquivo X, ER e Will and Grace, acho que os plots eram bem mais desenvolvidos nas séries antigas, observa Júlia. — Estou “maratonando” Friends, uma série que todos sabem do grande sucesso que teve e que nesse ano completou 10 anos desde seu último episódio. Tirando-a como exemplo, posso falar que a diferença consiste na realidade que a série passava. A rotina e as dificuldades que os personagens tinham faziam com que quem tivesse assistindo se identificasse com cada personagem, diz Ana Souza.

Viciados? Não, seriáticos! Segundo o dicionário, vício é um hábito repetitivo que degenera ou causa algum prejuízo ao viciado e aos que com ele convivem. Porém, assistir séries não provoca danos, por isso, os próprios espectadores se autodenominam seriáticos. Se você não sabe o que é isso, aqui vão alguns sintomas dos nossos entrevistados: — Atualmente assisto 35 séries! Sintomas são surtar sempre com os episódios, sofrer muito com seu personagem favorito, chorar, rir, brigar por seu casal/personagem favorito, passar horas fazendo maratona das

séries, ficar revendo. Acho que esses são os principais, analisa Júlia. — Quando não tenho tempo de ver os novos episódios, assisto enquanto faço minhas refeições. Já cheguei a assistir três temporadas ou mais em uma semana. Fico ansiosa para ver os episódios novos e assisto online, pois não quero esperar saírem na televisão a cabo, revela Stephanie. — Tem épocas do ano que assisto mais de 20 episódios por semana. Por causa desse “compromisso”, quase nem acompanho nenhum programa na TV, ressalta Miriã.

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 42


TURISMO

“A dois passos do paraíso...”

Serra do Caraça, a 120 quilômetros de Belo Horizonte, é opção de passeio cultural, ecológico e de aventura

Fotos Ellus Jamar

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 43


Por Cláudia aguiar e Marcus Soares

Quer fugir do transtorno do dia-a-dia, e, de quebra, aproveitar o período de férias sem se afastar da capital e gastar tanto? Então, o trajeto é curto, e as belas paisagens recompensam. localizado a 120 quilômetros de Belo Horizonte encontra-se um dos locais mais encantadores de Minas. Conhecido como Caraça, parte da Serra está situada entre os municípios de Catas Altas e de Santa Bárbara, e compõe a chamada Cordilheira do

Espinhaço, que corta praticamente todo o estado e vai até à Bahia. Santuário de Nossa Senhora Mãe dos Homens é o nome oficial. Caraça foi um “apelido” dado devido a duas grandes hipóteses: a primeira por ser o formato de um rosto humano. Essa explicação é comentada por Dom Pedro ii, em seu diário. A segunda seria o nome de um grande desfiladeiro, segundo informação de José Ferreira Carrato, em sua tese de doutorado sobre a Serra. Além das paisagens exuberantes

e atrativas, o local tem grande relevância na história do Brasil. Das terras santificadas vieram dois presidentes brasileiros: Afonso Pena e Artur Bernardes. O colégio do Caraça foi símbolo de referência nacional, pois se caracterizou pela seriedade e disciplina, deslumbrando figuras importantes como os imperadores Dom Pedro i e ii, cujas impressões ainda podem ser vistas no museu do Colégio ou na biblioteca. “todos deveriam conhecer pelo menos um terço dessa história”, indica o historiador luiz Gontijo.

natureza e aventura Para quem gosta de esportes radicais e trilhas ligadas à natureza, o Caraça é a pedida certa. A região oferece um complexo de cachoeiras e piscinas naturais para todos os gostos. Para não ficar perdido é sempre sugerido que se contrate um guia cadastrado da reserva, que possa acompanhar o turista para curtir cada pedacinho do paraíso. Segundo os guias, a primeira aventura precisa passar pela famosa Cascatinha. localizada a aproximadamente dois quilômetros da igreja do Parque, é um dos lugares prediletos dos visitantes para banho. São várias quedas formando piscinas naturais de rara beleza. logo depois, na mesma trilha, fica sua antítese: a Cascatona. No entanto, ela fica um pouco mais longe, são seis quilômetros de caminhada até ela. Com 70m de altura, e águas límpidas, a cachoeira termina numa piscina natural ideal para banho. As caminhadas pela região também são atrações bastante procuradas. Até o Pico do inficionado, por exemplo, o turista pode se exercitar pelas trilhas até o local, em um trajeto de quase 10 quilômetros. A subida é forte, mas a paisagem é recompensadora. O cume fica a 2.032m. de altitude, oferecendo uma linda vista da região. O Pico do Sol também exige de quem quer conhecê-lo, pois a distância é a mesma. A altitude alcança 2.068m..

Nesse passeio pode-se observar a junção da Mata Atlântica e do Cerrado, ótimo para quem curte a natureza pura. Outro pondo de visitação é a Gruta do Centenário, uma das belezas do local. É considerada a maior galeria de quartzito do mundo, com 3.400m.. Para chegar até o local, são quase 10 quilometros de trilha, dos quais um pouco mais de quatro são de subida, cujo traçado só é mais suave até o segundo platô, chamado de “paraíso” pelos guias. O guia turístico túlio Borges, nascido em Santa Bárbara, admira as belas paisagens das terras do Caraça desde pequeno. Por causa disso, resolveu reunir o útil ao agradável, e a atividade é hoje seu ganha pão. Para ele é totalmente gratificante apresentar a beleza natural de sua terra natal aos visitantes, vindos, segundo o profissional, de todas as partes do mundo. “Sou realizado por fazer o que faço. Este santuário faz parte da minha história; com isso, ajudo a construir a história de quem passa por aqui”, observa. Mas umas das atrações principais do Caraça é, sem dúvida, aqueles que aparecem somente no período da noite. Segundo histórias, no ano de 1982, algumas lixeiras começaram a aparecer reviradas e outras derrubadas. irmão thomaz, padre que tomava conta da igreja

Nossa Senhora Mãe dos Homens, disse ao Padre tobias, na época, que suspeitava de cães, mas aquele não acreditava, pois os animais não subiam a serra com tanta frequência. Desde então começaram a observar, e descobriram que os cachorros eram, na verdade, lobos-Guará. Para atrair a espécie, os padres começaram a alimentar os animais. Eles, então, foram se aproximando cada vez mais até a porta da igreja. Deu certo! Muitas pessoas se hospedam na região para ter contato com os lobos. Maria Francisca, 53, é frequentadora da parque. Sempre que pode ela reúne os filhos e a família, relembrando as brincadeiras de infância. “Eu sempre fui ao Caraça, levava meus filhos para nadar, para rezar, e, até hoje, pelo menos uma vez a cada dois meses, reúno minha família e visito o local. É impossível morar tão perto e ficar longe da natureza, daquela paz, daquela beleza”, conta emocionada a funcionária pública. Nathália Soares, 22, não troca uma visita ao Caraça por nada. Se tem a oportunidade de ir, ela vai e registra todos os instantes com grandes fotografias. Gosto do santuário, por ser neogótico é muito diferente de tudo que temos na região, e por estar inserido na mata, fica mais bonito. Gosto também das cachoeiras”, destaca.

Revista ÁgoRa | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁgiNa 44


Um belo lugar para fotografias Não é segredo para ninguém as paisagens deslumbrantes. Basta fazer uma visita ao local para se deparar com um cenário de encher os olhos. Um dos locais preferidos de muitos casais para fazer fotografias de casamento é o jardim localizado ao lado da Igreja. Além dele, as escadarias do santuário fazem com que qualquer foto ganhe um toque especial. O fotógrafo Ellus Jamar conta que o que mais atrai as pessoas para o local é a beleza exuberante do parque. “As fotos feitas aqui não precisam ser retocadas.

Normalmente, a luz natural ajuda a ficar boa”. O casal Ellen Moraes e Helder Diniz escolheram o Caraça como cenário para o álbum de casamento. Ellen, de 26 anos, gosta de visitar a região desde pequena. Ela sempre dizia para a mãe que, quando casasse, escolheria a Igreja de lá para realizar o sonho. No entanto, entrar de noiva no Santuário não será possível. A jovem então resolveu se realizar de outra forma, fazendo as fotos em todos os lugares que mais gosta no Parque e no Santuário. “É a realização de um sonho”, conta.

Ricardo Moreira e Marta Soares se casaram em 2000. Escolheram o Santuário por acreditarem ser um lugar especial e abençoado. “Sempre que visito a Igreja, saio daqui com uma paz interior incrível. Então resolvi dar um passo importante na minha vida aqui, onde sempre me senti bem”, diz a enfermeira. A região conta com várias opções de pousadas e hospedarias, com boa infraestrutura. Informações sobre elas e visitas à Serra podem ser encontradas na internet. Agora é só programar o passeio... Divirta-se!

Revista Ágora | Revista Laboratório do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva | 1O SEMESTRE 2014 PÁGINA 45


Você já publicou hoje? núcleo de Publicações acadêmicas http://npa.newtonpaiva.br/npa/


massan-z, vencedora do prêmio de Melhor Agência Jr de Publicidade e Propaganda da região Sudeste no Expocom/Intercom 2014.



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.