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SEXTA-FEIRA 27 DE FEVEREIRO DE 2009
VIDA&qSUSTENTABILIDADE
Sem retorno O País produz por ano 18 bilhões de sacolas plásticas; 80% vão parar em aterros. O produto leva em média 500 anos para se decompor e a reciclagem é baixa. Opção para contornar o problema, os oxibiodegradáveis causam polêmica (págs. H3, H4 e H5)
USO DOMÉSTICO – Restos
HÉLVIO ROMERO/AE
de sacolas plásticas ficam presos em vegetação às margens do Rio Tietê, em São Paulo
7 8 9 10 11 12
Em busca de energia, governo aceita mais emissões de CO2
Com baixo impacto ambiental, ecovilas são 15 mil no mundo
Após 10 anos, Lei de Crimes Ambientais ainda gera discussão
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Notas
SUSTENTABILIDADE
EDUCAÇÃO
Encontro debate conservação aplicada
Brasil recorre à energia ‘suja’ Para aumentar produção, governo propõe construir mais termelétricas
Educação aplicada à conservação e à sustentabilidade é o tema do encontro internacional que será realizado de 27 a 29 de março na Fundação Parque Zoológico de São Paulo. O evento é voltado para educadores ambientais, biólogos, advogados e estudantes das áreas de meio ambiente. A programação inclui palestras e workshops com profissionais de institutos de pesquisa, zoológicos e centros de conservação do Brasil e de países como França, México, Colômbia e Estados Unidos. A
abertura terá a presença do secretário de Estado do Meio Ambiente, Xico Graziano, e do diretor do Centro de Inovação e Desenvolvimento para a Promoção de Práticas Ambientais Sustentáveis, Igino Mercuri Posada. Inscrições para apresentação de pôster podem ser feitas até 10 de março. Para participar do evento, as inscrições vão até 20 de março (R$ 120 para estudantes e R$ 160 para profissionais). Informações no site (www.zoologico.sp.gov.br).
FEIRAS
VALERIA GONCALVEZ/AE–3/4/2006
Leonardo Goy
EFEITO – Emissão de CO2 para gerar energia termelétrica subirá para 39 milhões de toneladas até 2017
o setor no período 2008-2017–estimaqueacapacidade total de geração do País terá de saltar dos atuais 99,7 mil megawatts (MW) para cerca de 154,7 mil MW em 2017. Desse acréscimo de 55 mil MW, cercade20,8milMWdeverão ser gerados em usinas térmicas, como nuclear, a gás, carvão, diesel, óleo combustível ou movidas a biomassa. O mesmo documento prevê que até 2017 deverão entrar em operação 40 novas usinas movidas a óleo combustível, tidas como mais caras e poluentes.Elas devemcontribuircom7,5milMWparaa expansão do sistema. Esse avanço da geração em usinas termelétricas tem seu preço. O próprio governo calcula que as emissões de gás carbônico para geração de energia por meio dessas usinas podem passar dos atuais 14 milhões de toneladas por ano para 39 milhões de toneladas em 2017. Isso geroupolêmicaentreambientalistas,quepedemrevisão doplanodecenal.Asautoridades para o setor elétrico rebatem as críticas alegando que o País tem de recorrer às térmicas porque as licenças ambientais para as usinas hidrelétricas – quesãomaislimpasdoponto de vista das emissões – demoram a ser liberadas pelos órgãos ambientais. Enquanto ambientalistas e especialistas discutem, as térmicas avançam. Há cálculos até mais pessimistas em relação ao futuro das emissões no Brasil. O Instituto Teotônio Vilela, vinculadoaoPSDB,fezumalerta no início do ano de que a geração de energia no Brasil poderá, em 2017, somar emissões anuais de gás carbônico de 75 milhões de toneladas.O maiorvolume leva em conta um cenário mais pessimista – que também é admitido pelo governo – no qual haveria atraso nasobrasde36usinashidrelétricas nos próximos anos. Mesmoassim,oplanodecenal prevê que as hidrelétricascontinuamsendoabase dosistemabrasileiro,masa participação na geração de energia cairia dos atuais 86% para 76% em 2017. ●
55
mil MW é o crescimento previsto na produção de energia entre 2008 e 2017
20,8
mil MW devem ser gerados por meio de usina térmica, como a gás, carvão e diesel
Tecnologias para construção sustentável Produtos e tecnologias para construir edificações sustentáveis estarão em exibição na feira Ecobuild, que acontece de 2 a 5 de março, em Londres. Na 5.ª edição, o evento é considerado o maior do setor e reunirá 800 expositores nas áreas de aquecimento e ventilação, energias renováveis, reaproveitamento de água, materiais naturais, entre outras. Os visitantes poderão conferir o funcionamento de uma casa com emissão zero de carbono e recentes tecnologias. Informações sobre a feira no
site (www.ecobuild.co.uk). No Brasil, a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha realiza, de 12 a 15 de março, no Transamérica Expo Center, em São Paulo, a Ecogerma 2009 – o primeiro evento na América Latina que reúne congresso e feira de negócios de produtos e tecnologias sustentáveis realizados em conjunto por Brasil e Alemanha. A Ecogerma apresentará novas tecnologias em seis áreas. Mais informações podem ser obtidas na internet (www.ecogerma.com.br).
PRÊMIO
Sustentabilidade no 14.º Jovem Cientista A 14.ª edição do Prêmio Jovem Cientista está com inscrições abertas até o dia 31 de julho. O tema deste ano, Energia e Meio Ambiente – Soluções para o Futuro, discute a utilização de fontes de energia alternativas, como a solar e a eólica. Os participantes são divididos em cinco categorias: graduado, ensino superior, ensino médio, orientador e mérito institucional. Cada um terá de desenvolver estudos que apontem caminhos para a sustentabilidade. Antes de começar, porém, o
interessado precisa escolher uma linha de estudo. Os estudantes de ensino médio podem escrever, por exemplo, sobre fontes renováveis, impactos ambientais e sociais, entre outros. O regulamento com todas as diretrizes está no site (www.jovemcientista.cnpq.br). As inscrições, gratuitas, podem ser feitas pela internet ou em agências dos Correios. Os vencedores recebem prêmios de até R$ 20 mil. Ganhadores do ensino médio recebem computador e impressora.
INOVAÇÃO
Concurso de engenhocas ‘verdes’ Qualofuturoda sustentabilidade naindústriadeequipamentos eletrônicos?Inventorescom consciênciaecológicae apaixonadospor tecnologiabuscamrespostas para essa perguntapor meiodeum concursocurioso. Acompetiçãopromovida pelosite GreenerGadgets incentivaacriação deprodutosque respeitamo ambiente.Na segundaedição doevento,um dos50 finalistassugeriu, por exemplo, ummedidorque,instaladonas torneirasda casa,calcula o gasto diáriode água.Com sistemaWIFI,ele atualiza números queajudamno combateao desperdício. Outroparticipanteprojetou uma impressoraqueutiliza como tintaa borra docafé oudochá(foto). Mas épreciso jogarumpou-
REPRODUÇÃO
O Brasil tem uma das matrizes energéticas mais limpas domundoporcausadapredominância das hidrelétricas naprodução de energia. Mas, se não houver uma mudança substancialnoqueestásendo planejado para os próximos anos,a tendência,nofuturo, é de aumento da geração mais “suja” de energia elétrica. O Plano Decenal de Energia Elétrica – documento do Ministério de Minas e Energia que traça as metas para
DIVULGAÇÃO
BRASÍLIA
codeáguaquando forusar. Osinternautasescolheram as engenhocasque acharammais interessantesnosite (www.greenergadgets.com).Asdez mais votadasserãoapresentadas em NovaYork,nos Estados Unidos, duranteuma conferênciasobre sustentabilidadeetecnologia. A plateiavai eleger ovencedor por meiodas palmas,semgastar energiaelétrica.
EXPOSIÇÃO
Estação Ciência ganha novo espaço Foi inaugurada no último dia 11 a Estação Natureza, um novo espaço permanente na Estação Ciência, em São Paulo. Resultado de uma parceria da USP com a Fundação O Boticário, a exposição foi instalada em cinco vagões de trens, sobre 100 metros de trilhos. Ela retrata de maneira didática os principais biomas brasileiros, como o pantanal, a Amazônia e o cerrado. A Estação Ciência (www.eciencia.usp. br) fica na Rua Guaicurus, 1.394.
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Leia mais reportagens que tratam de ambiente Veja o blog de Andrea Vialli sobre sustentabilidade Reveja os especiais de 2008 sobre ambiente www.estadao.com.br/h/h2
EXPEDIENTE Edição: Luciana Constantino e Sergio Pompeu Edição de fotografia: Juca Varella Diretor de arte: Fabio Sales Diagramação: Claudio Gaspar Edição de fotografia: Dalmo Sena Tratamento de imagens: Alexandre Godinho, Carla Monfilier e Edmundo Pereira
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ESPECIAL H3 ESPECIAL H3
SUSTENTABILIDADE FOTOS PAULO PINTO/AE
EXCESSO – Brasileiro usa, em média, 66 sacolas por mês – Antônia Emydio quer mudar o hábito; Jair Martins acha que distribuir embalagens de papel pode encarecer produtos
País produz 18 bilhões de sacolas plásticas De cada 10 unidades, 8 vão para aterros; pouco estudada, tecnologia alternativa divide opinião Ana Bizzotto ESPECIAL PARA O ESTADO
O Brasil produziu cerca de 18 bilhões de sacolas plásticas em 2007, a maioria fabricada com polietileno – produto derivado do petróleo que demora aproximadamente 500 anos para se decompor. Mais de 1 bilhão de sacolas são distribuídas todo mês pelos supermercados; 80% delasviramsacosdelixodomésticoevão pararematerrossanitários. Para tentar minimizar esse impacto, têm surgido no mercado campanhas com o objetivo de reduzir o uso das sacolas de plástico ou substituí-las por material oxibiodegradável, biodegradável e até retornável.
Não há, no entanto, consenso entre especialistas e pesquisadores sobre qual seria a melhor solução, seja por falta de estudos científicos conclusivos ou pela concorrência da indústria plástica, que, só em 2007, movimentou US$ 18,7 bilhões. Apresentadas como “totalmente degradáveis” pelos fabricantes,assacolasoxibiodegradáveis, por exemplo, dividem opiniões sobre as possíveis consequências de seu descarte. Feitas comamesmamatéria-primadas plásticas, elas recebem um aditivo pró-oxidante com sais metálicos, que acelera a degradação. Segundo a RES Brasil, distribuidora de um dos aditivos (o d2w) no País, a degradação ocorre em
18
bilhões de sacolas plásticas foram produzidas no Brasil em 2007
66
por mês é a média de consumo do brasileiro desse tipo de sacola
500
anos é o tempo médio previsto para a decomposição de uma sacola plástica
18 meses. Há especialistas que contestam o benefício, alegando que os aditivos também poluem. “Arealidadeéqueassacolasplásticas quase nunca são recicladas devidoaoseubaixovaloragregado”, afirma o presidente da RES Brasil, Eduardo Van Roost. Representante da cadeia produtiva do setor plástico, a Plastividacriticaousodosoxibiodegradáveis. “Mesmo os biodegradáveis precisam ser coletados e ter condições adequadas para se decompor”,dizopresidentedaentidade, Francisco de Assis Esmeraldo, que defende a reciclagem. “Um quilo de plástico equivale a um litro de diesel. Esse potencial não deveria ser desperdiçado.” Em estudo publicado no mês
passadonarevistaPolymerEngineering and Science, o professor Guilhermino Fechine, do DepartamentodeEngenhariadeMateriais da Universidade Mackenzie, contesta a tese de degradação completa dos plásticos com aditivo. Ele comparou amostras de polipropileno, uma delas com pró-oxidante, com o plástico biodegradável. As amostras foram submetidasàradiaçãoultravioleta por 480 horas e, depois, enterradas no solo por 56 dias. Segundo Fechine, o oxibiodegradável se fragmentou, mas não totalmente.Emcontrapartida,oengenheiro químico Telmo Ojeda testou os oxibiodegradáveis e obteve resultado favorável ao material.Ojedausoucritériosdiferen-
tesdos deFechine,inclusive com exposição natural do produto por 12 meses. Para a especialista LuciaMei,daUniversidadeEstadual de Campinas (Unicamp), o tema requer mais pesquisa. “Recomendaria mais estudos para termos estatísticas sobre sua decomposição final na natureza.” Produzidascomderivadosdo amido ou da cana-de-açúcar, as sacolas biodegradáveis demoram, em média, um ano para se decomportotalmentenanatureza, mas ainda não são fabricadas em escala comercial no Brasil. “As propriedades mecânicas dessespolímeroseocustodificultam a produção do plástico filme,usadoparafazeresse tipode sacola”, diz o professor Antônio Aprígio, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos. Outra opção verde é o polietileno à base de cana, já produzido no País. Ele não é biodegradável e também custa mais caro, mas sua fonte é renovável. O diretor do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente, Helio Mattar, consideraassacolasretornáveis – de pano ou plástico mais resistente – como a melhor solução para substituir as de plástico. “Com sacolas duráveis, o consumidor contribui para diminuir o lixo e evitaque se gaste energia e recursos naturais na produção de sacolas descartáveis”, diz. O brasileiro consome cerca de 66 sacolas plásticas por mês. Nessa estatística entram pessoas como a motorista Antônia Emydio de Souza, que saiu de um supermercadoda zona oeste de São Paulo com o carrinho cheio de sacolinhas. “Foi o que me ofereceram. Sou contra essa embalagem, mas temos esse comodismo.” O funcionário públicoJairMartins,quefezcompras no mesmo local, utilizou sacolas de papelão. “É a primeira vez que me oferecem essas sacolas. O ideal é que fossem oferecidas sempre, mas certamente isso se refletiria no preço.” ● † Mais informações nas páginas H4 e H5
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ESPECIAL H5
SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO AO DESCARTE Alternativas para reduzir uso de sacolas plásticas feitas a partir do petróleo começam a surgir no mercado
ENERGIA
1
ÁGUA
RECURSOS NATURAIS
Matérias-primas
PETRÓLEO
CANA-DE-AÇÚCAR
Seu refinamento resulta em polietileno para a produção do plástico
AMIDO
Utilizada para fabricar polietileno verde. Também é usada em pesquisas para a produção de polímeros biodegradáveis
ALGODÃO
Derivado de alimentos como mandioca, milho e arroz, pode ser associado a outros polímeros biodegradáveis para a produção de sacolas
Cidades buscam alternativas para embalar produtos
Resíduo fechou parte de rio em Bangladesh
Ações vão desde proibição do uso de plástico até cobrança pelo produto
Medidas adotadas por vários países ajudam a minimizar impactos Países europeus e, mais recentemente, africanos, asiáticos, os Estados Unidos e a Austrália adotaram políticas para tentar reduzir o consumo de sacolas plásticas. Apesar de recentes, algumas dessas medidas conseguirammudar ohábito dos moradores e diminuir o uso do produto. A Irlanda foi um dos pioneiros em estabelecer taxa para as sacolinhas,em2002.Comacobrança, o país conseguiu reduzir em 90% o consumo desse tipo de embalagem plástica. Bangladesh também ve-
Matéria-prima utilizada para a produção de sacolas de tecido
tou o ingresso de sacolinhas plásticas em seu território, substituindo-as pelas de juta. A políticafoi adotada depoisque a poluição provocada pelas sacolas chegou ao ponto de obstruir afluentesdoRioGanges eprejudicar o sistema de drenagem da capital Daca. Na Alemanha e Holanda, a maioria dos supermercados substitui a sacola plástica pela de papelão. Na Itália, as sacolinhas de plástico serão proibidas a partir de 2010. Os supermercados, que já cobram cerca de € 0,05 por unidade, só poderãofornecer modelosbiodegradáveis. O país sedia uma das
maiores empresas produtoras de sacolas biodegradáveis do mundo. COBRANÇA
Nos Estados Unidos, a primeiracidadenorte-americanaabanir o uso das sacolas plásticas foi São Francisco, em 2007. As únicas permitidas são as biodegradáveis, as retornáveis e as de papel reciclado. Cidades como Nova York e Seattle propuseramagora taxasparaas sacolas, mas as medidas ainda não foram aprovadas. No Estado da Columbia, o governo propôs uma lei que proíbe não apenas as plásticas, mas também as de papel. Noanopassado,aChinaproibiuadistribuição gratuitadesacolas plásticas e a produção, vendaeuso deunidades comespessurainferiora0,025 milímetros.Amedida obrigaoscomerciantes a exibir claramente e nãoadicionarovaloraosprodutos. Em Hong Kong, medida semelhante foi adotada para tentar diminuir o consumo, que chega a 8 bilhões de sacolas por ano. Já a África do Sul proibiu sacolas plásticas de espessura fina e impôs taxas para as mais espessas.Ocomerciante queinfringir as regras paga multa e pode até ser preso. ● A.B.
SAIBA MAIS Amido**
● Norma da ABNT: Para a Associação Brasileira de Normas Técnicas, um plástico biodegradável precisa ter 90% de sua estrutura transformada em gás carbônico e água em 180 dias
Plástico tradicional
Sacolas de
Sacolas
plástico
biodegradáveis
Oxbiodegradável*
2
3
retornáveis
Materiais resistentes
**Em estudo no Brasil JOSÉ LUIS DA CONCEIÇÃO/AE
*Ainda não há consenso sobre os efeitos do aditivo das sacolas oxibiodegradáveis na reciclagem dos plásticos
Sacolas Cana-deaçúcar**
RETORNÁVEIS - Feitas de material durável,
podem ser usadas várias vezes e comportam cerca de 35 kg, enquanto uma sacola plástica suporta 5 kg
Comercialização e uso As sacolas plásticas se popularizaram no Brasil na década de 1950. O hábito de utilizá-las para embalar as compras e o lixo doméstico contribuiu para o crescimento do consumo e consequente descarte das sacolinhas. Em 2008, foram produzidas 18 bilhões de sacolas plásticas no Brasil. Cada cidadão consome, em média, 880 sacolas por ano
Iniciativascomoaconscientização de funcionários para otimizar o uso das embalagens, venda de sacolas retornáveis e incentivo à coleta seletiva têm sido adotadas em São Paulo para tentar reduzir o consumo do plástico. Uma rede atacadista, por exemplo, cobra dos clientes R$ 0,12 por sacola plástica, prática comum em outros países. Situação contrária está sendo testada em Salvador (BA) e no Recife (PE), onde uma rede nacionaldesupermercadosconcededescontodeR$0,03aosclientes para cada sacola não usada. A baixa resistência das sacolas, que obriga o consumidor a utilizar duas ou três unidades sobrepostas para os produtos mais pesados, motivou a criação do Programa de Qualidade e Consumo Responsável de Sacolas Plásticas, que teve início em 2008. A proposta, apoiada porgrandesredesdesupermercados, normatiza a espessura das embalagens para que tenham capacidade de até seis quilos. O objetivo é reduzir em até 30% o consumo. “Essas medidas são necessárias, pois incentivamaspessoasatrazersacolas de casa, do jeito que era antigamente”, diz o ex-secretário estadual do Meio Ambiente José Goldemberg, presidente do Conselho de Assuntos Ambientais da Federação do Comércio do Estado de São Paulo. Em Guarulhos, na Grande São Paulo, foi sancionada em janeiro uma lei que obriga os estabelecimentos comerciais do município a utilizar embalagens plásticas biodegradáveis ou sacolas reutilizáveis para acondicionar produtos e mercadorias. “A lei faz parte de um programa
Disposição final
RECICLÁVEL
Cerca de 20% de plástico pós-consumo foi reciclado no Brasil em 2007. O plástico filme (matériaprima das sacolas) equivale a 29% desse total
EMISSÃO DE CO2
ATERRO SANITÁRIO
80% das sacolas distribuídas pelos supermercados brasileiros viram saco de lixo doméstico e tem como principal destino os aterros
USINA DE COMPOSTAGEM
USINA VERDE
Solução ideal para a decompor resíduos biodegradáveis e produzir compostos orgânicos para adubo, ainda são pouco utilizadas no País
RESÍDUO SÓLIDO
Muito utilizada no Japão e em países europeus, permite a incineração de lixo orgânico e materiais não-recicláveis com produção de energia limpa
EMISSÃO DE ÁGUA
ambiental que será implementadono município. Vamos ampliar a coleta seletiva e os pontos de entregadeentulhoepromovera educação ambiental”, diz o prefeito Sebastião Almeida (PT). Os estabelecimentos terão seis meses para se adaptar e, caso não cumpram, ficam sujeitos ao pagamento de multa de R$ 1.900. Segundo o presidente da Associação Comercial e Empresarial de Guarulhos, Wilson Lourenço, os comerciantes estão apreensivos. “O espírito da lei é bom, pois incentiva a conscienti-
Novos usos ● Sacolaplásticapode ser reutilizadaartesanalmente paraproduziralmofadas, travesseirosepufes ● Tricotadas, elas são transformadas em tapetesde banheiro ● Fios feitos do plástico, costurados com a técnica do crochê, podem render bolsas e potes
zação dos consumidores, mas há inconvenientes. Ela restringe só comerciantes, desobrigando prestadores de serviço.” Outro problemaapontadoécomosaber seassacolassãorealmentebiodegradáveis. “Será preciso identificar quem vende as sacolas e, se houver menos fornecedores, pode ser que fiquem mais caras.” Os produtos da loja de doces docomercianteFernando Costa ainda são embalados com as sacolas tradicionais. “Não somos nós que devemos nos preparar, são os fornecedores dessas sa-
colas. A partir do momento em que eles estiverem aparelhados, nós vamos nos adaptar.” RESSALVAS
Antes de assumir a prefeitura, Almeidafoideputadoestadual e autor de um projeto de lei que exigia a adoção de sacolas oxibiodegradáveis no Estado. O texto foi vetado por causa das dúvidasrelacionadasaosoxibiodegradáveis.Vereadorespaulistanos também votaram a favor de uma lei sobre sacolas, que acabou vetada. Em Curitiba e no Rio houve veto a leis semelhantes. Mas em Piracicaba e Jundiaí (SP) e nos Estados do Maranhão,GoiáseEspíritoSanto a legislação entrou em vigor. O coordenador de Planejamento Ambiental da Secretaria EstadualdoMeioAmbientepaulista, Casemiro Tércio Carvalho, diz que a obrigatoriedade do uso de uma tecnologia de degradação não vai resolver o problema dos resíduos sólidos. “Quando a sacola vai para o aterro, não se biodegrada. A última coisa que vaireceberaliéoxigênioeluz.Só seria recomendável usar esses plásticossetivéssemoscondição adequada de compostagem.” EmBeloHorizonte,umaleisemelhante à de Guarulhos foi sancionadaemdezembro.Masotexto prevê a obrigatoriedade do usode“sacodelixoecológicoede sacola ecológica”, além de estender a todos os estabelecimentos particulares e órgãos públicos da cidade. “Em média, 10% do lixo do País é composto por sacolas plásticas. Elas dificultam a compactação, entopem bueiros e provocam enchente”, diz o vereador Arnaldo Godoy (PT), autor do projeto. ● ANA BIZZOTTO
DESCARTÁVEIS - Cerca de 800 milhões de sacolas plásticas por mês viram sacos de lixo doméstico
MARCIO FERNANDES/AE
MARCIO FERNANDES/AE
INFOGRÁFICO/AE
DESTINO - Grande volume de sacolas compõe lixo jogado diariamente no aterro São João, em Sapopemba
● Sacolas plásticas tradicionais: Feitas principalmente de polietileno, material derivado do petróleo, que é uma fonte não renovável de energia. O plástico é altamente combustível, com valor aproximado de 5,5 quilowatt-hora por quilo. O lixo urbano como um todo tem poder combustível de 1,3 kWh/kg
● Sacolas oxibiodegradáveis: Recebem um aditivo pró-oxidante com sais metálicos que acelera a degradação do plástico. É classificada como ‘totalmente degradável’ pelo principal revendedor, que estabelece prazo de 18 meses para ela se degradar. Críticos alegam que os aditivos contaminam o meio ambiente ● Sacolas biodegradáveis: Feitas com polímeros à base de amido ou cana-de-açúcar, ainda não são produzidas em escalacomercial no Brasil.
● Polietileno verde: Produzido a partir da cana-de-açúcar, esse material é fabricado no Brasil. Custa mais que o polietileno comum, mas com vantagem de ser de fonterenovável ● Sacolas retornáveis: Feitas de materiais mais duráveis como tecido, lona e plástico mais resistente, começaram a ser vendidas recentemente pelos supermercados. Antes de a sacolinha plástica se popularizar, as compras eramfeitas com retornáveise carrinhos de feira
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SUSTENTABILIDADE MORAR SEM POLUIR
Casa ecológica As ecovilas se desenvolvem no Brasil e no mundo com técnicas alternativas de arquitetura, agricultura e reciclagem. Esta casa modelo , por exemplo, se integra ao ecossistema a seu redor
BANHEIRO SECO
Como eles não usam água, é preciso cobrir as fezes com serragem. Armazenado e tratado, o composto vira húmus, depois reaproveitado nas plantações
RECOLHIMENTO DA ÁGUA DA CHUVA
TETO VERDE
Um telhado de 100 metros quadrados, em um lugar com índice pluviométrico anual de 1000 mm, consegue captar 100 mil litros de água a cada ano. Filtrada, ela pode ser usada para lavar roupa, tomar banho, irrigar o jardim, dar descarga
Além de ajudar a reter água, ele regula a temperatura e diminui o efeito da erosão. A laje deve ser impermeável
COLETA SELETIVA DE LIXO São Paulo gera 9 toneladas diárias apenas de lixo domiciliar. Nas ecovilas, a produção é quase nula a reciclagem permite criar novos materiais e a parte orgânica alimenta as galinhas e vira adubo
CATAVENTO E PLACAS SOLARES:
Fontes de energia renovável não emitem poluentes e têm custo zero na conta do fim do mês
PAREDES ALIMENTOS ORGÂNICOS
São produzidos sem agrotóxicos
BICICLETA
Evita a emissão de gás carbônico
ESTAÇÃO DE TRATAMENTO
Adobe, pau a pique e bambu, por exemplo, são materiais retirados do próprio terreno, e que constroem paredes resistentes como as de alvenaria
Os resíduos dos banheiros de água passam por tratamento em contato com bactérias nas fases aeróbia e anaeróbia. E então estão prontos para serem utilizados no crescimento de árvores frutíferas, por exemplo INFOGRÁFICO: RUBENS PAIVA/AE
Minicidades sustentáveis Mundo tem 15 mil ecovilas, comunidades-modelo de baixo impacto ambiental que reúnem até 2 mil habitantes FOTOS DIVULGAÇÃO
Lucas Frasão Ana Bizzotto
Bioconstrução cria casas verdes
ESPECIAL PARA O ESTADO
Nacontramãodocaosdasmetrópoles, têm surgido ecovilas que reaproveitam recursos naturais e são reconhecidas pela Organização das Nações Unidas como modelo de sustentabilidade. Elasjásãomaisde15milnoplaneta,segundoaRedeGlobaldeEcovilas, maior entidade do setor, que tem associados no Brasil. Em tempos de crise ambientale econômica,asecovilassimbolizama busca deumnovomodo de vida, mas diferente do das antigas comunidades alternativas pela escala – têm até 2 mil moradores – e pela gestão, com venda de lotes e busca de rentabilidade. Entre os preceitos das ecovilas estão plantar aquilo que se come e adotar padrões sustentáveis de construção, que incluem sistemas de captaçãodeáguadachuva(maisinformações nesta página). Também seguem documentos socioambientais de referência, como a Agenda 21, resultado da Eco-92, realizada no Rio. Algumasdasprimeirasemaiores comunidades do mundo foramcriadasporvoltade1970,como a Auroville, no sul da Índia. A meta da ecovila indiana é se tornar uma cidade autossuficiente para50milhabitantes–hoje,são cerca de 2 mil. Outro exemplo é Damanhur, no norte da Itália. Com mais de mil moradores de diversas nacionalidades, DamanhurtemConstituiçãoeunidade monetária próprias, além de um jornal diário, escolas e uma universidade “livre”. BRASIL
As ecovilas brasileiras não são tão populosas assim. Mas as comunidades têm crescido desde que o modelo chegou ao País, há uma década. OprojetodaEcovilaClarean-
Entre os pilares das ecovilas está o uso de técnicas de construção que minimizem impactos ao ambiente. Uma dessas correntes é a da bioconstrução, que prevê a reciclagem e uso de materiais disponíveis na região. “Isso permite maior integração com o entorno, tanto nos aspectos estéticos como nos funcionais”, explica o arquiteto Daniel Quintão, especialista em bioconstrução pelo Centre Ecologique Terre Vivante, na França. A escolha das técnicas construtivas e dos mecanismos de redução de efluentes e de lixo deve considerar clima, relevo, material e mão de obra disponíveis. Para economizar energia, os projetos dão prioridade à ventilação e iluminação natural. Há também a opção do aquecimento solar e de cataventos, por exemplo, para gerar energia eólica. O recurso do “teto verde” co-
mo cobertura ajuda a regular a temperatura e a captar água da chuva, armazenada em reservatórios subterrâneos e utilizada para vários fins, como dar descarga. Os projetos sempre incluem o tratamento de esgoto. Em alguns casos, os imóveis têm o “banheiro seco”, para transformar resíduos em húmus e reutilizá-los como adubo. “Algumas pessoas não acreditam que a gente consegue viver em ecovila. Mas é uma mudança de hábito”, diz Marcelo Bueno, arquiteto e secretário executivo do Instituto de Permacultura e Ecovilas da Mata Atlântica (Ipema), em Ubatuba. As telhas da sede do Ipema foram feitas a partir da reciclagem de tubos de pasta de dente. As paredes das casas podem ter como matéria-prima adobe, tijolo de terra crua, bambu e pau-a-pique. Mas até o cimento é usado, em menor escala. ●
lis de Goiás, a 40 quilômetros de Goiânia, mostra como esse tipo de empreendimento pode ser rentável. Desde 2004, mais de 80% dos 335 lotes da Santa Branca foram vendidos. “Nosso negócio é traduzir a ideia da sustentabilidade para o mercado”, diz Antônio Zayeck, de 44 anos, presidente da associação de moradores e o primeiro a erguer sua casa no local. Para Ely Brito, idealizadora da Viver Simples, na zona rural deItamonte,sul deMinas,asustentabilidadenãoselimita aoespaço da ecovila. “Nosso projeto procurou preservar as tradições locais e trocar conhecimentocoma comunidade daregião”, diz Ely. O terreno da Viver Simples, comprado em 2006, fica na área de proteção ambiental da Serra da Manti-
queira. Os futuros moradores conseguiram licença ambiental para construir as casas, que devem ficar prontas em dois anos.
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‘TETO VERDE’ – Em Itamonte, Minas, telhado ecológico capta água da chuva e diminui os efeitos da erosão
do, em Piracaia, interior paulista, surgiu em 2001. Os 97 lotes começaram a ser vendidos quatroanosdepois.Hoje,commetade das terras comercializadas, as primeiras famílias estão se mudando para lá. “Morarem umaecovila significa passar por mudanças radicais de comportamento”, diz o engenheiro agrônomo Edson Hiroshi Seó, idealizador da comunidadeClareando.Mas, apesar de radicais, essas mudanças implicam reencontrar um estilo de vida menos distante, historicamente, do que parece. “Há apenas duas gerações, nossos antepassados viviam no campo. Erguiam as casas da própriaterraetiravamosremédios do mato. Isso se perdeu no homem moderno”, afirma Seó. Outra ecovila, em Terezópo-
RECICLAGEM – Telhas da sede do Ipema: tubos de pasta de dente
CURSOS
Para quem quer saber mais sobre o tema, o Instituto de Permacultura e Ecovilas da Mata Atlântica(Ipema)servedereferência. Localizado em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, o instituto tem um centro de treinamento. O curso mais disputado custa R$ 480 e vai de março a julho. Visitantes podem conhecer o local às sextasfeiras, pagando R$ 20. O Instituto de Permacultura e Ecovilas do Cerrado, em Pirenópolis (GO), também promove cursos e presta consultorias. Criada há dez anos, a ecovila de Pirenópolis tem cem famílias. ●
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Produto: ESTADO - ESPECIAL - 7 - 27/02/09
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SEXTA-FEIRA, 27 DE FEVEREIRO DE 2009 O ESTADO DE S. PAULO
ESPECIAL H7 ESPECIAL H7
SUSTENTABILIDADE
ENTREVISTAS NelsonBugalho e RosaRamos Dez anos após a entrada em vigor da Lei de Crimes Ambientais, a avaliação é de que o País tem uma das legislações mais avançadas do mundo,
mas ela é pouco obedecida. E já existe um debate sobre a necessidade de alterá-la. Parte dos especialistas cobra maior fiscalização e a responsabi-
Leiambientaldeve terpenamaisdura ‘Há necessidade de que o Estado se faça presente de forma vigorosa. Creio que a legislação, por si só, não seja suficiente’ Promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo desde 1987, Nelson Bugalho, de 46 anos, é responsável por um dos seis núcleos estaduais do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente. Com mais de 20 anos de experiência na área, defende a necessidade de revisão na Lei de Crimes Ambientais, mas alerta para o “risco” da presença de “oportunistas”. Qual a proporção de gravidade entre crimes ambientais cometidos por pessoas físicas e jurídicas?
Na área ambiental, os mais graves geralmente são praticados pela pessoa jurídica. É claro que, por trás da pessoa jurídica (empresas), existem as físicas. Mas os de maior magnitude geralmente têm a pessoa jurídica por trás. Os crimes ambientais podem receber o mesmo tratamento jurídico que os comuns?
A Lei de Crimes Ambientais não dispensa o mesmo tratamento. Mas, infelizmente, ela tem penalidades de pouco grau de persuasão. Há crimes ambientais que recebem tratamentos mais tênues do que os
delitos do Código Penal. Alguém que risca um carro, por exemplo, está sujeito a uma pena de 1 a 6 meses de detenção ou multa. Se o indivíduo destrói uma floresta inteira, está sujeito a uma pena mínima de 1 ano. Há um tratamento desproporcional. O ambiente não é um bem jurídico considerado menos importante em relação a outros?
A questão ambiental sempre teve uma atenção periférica do legislador brasileiro. Só por causa do que vem ocorrendo nas últimas décadas, em que estamos realmente sentindo os efeitos da crise ecológica, ela passa a ter atenção central. O senhor concorda que a Lei de Crimes Ambientais deixou lacunas no que diz respeito à responsabilização penal da pessoa jurídica?
Evidentemente. Nos crimes contra o patrimônio florestal, por exemplo. O Brasil possui algumas vegetações, mas a lei se refere ora a uma, ora a outra, deixando de lado outras igualmente importantes. Quando o legislador verticaliza muito o bem jurídico, ele acaba comprometendo a proteção. Não seria o caso de se criar mecanismos para garantir a aplicabilidade dessa lei?
Passados mais de dez anos da edição da lei, acho que já era a hora de fazer uma revisão. É
lização criminal de pessoas jurídicas por danos ao ambiente. Empresários, por seu lado, veem a lei como um entrave burocrático. ANDRE LESSA/AE
Quem é: Nelson Bugalho ● Formado em Direito,
concluiu mestrado em Direito Penal pela Universidade Estadual de Maringá, no Paraná
que há sempre um risco, e surgirão oportunistas querendo deixar a lei mais imperfeita. Mas há necessidade de revisão, inclusive no que se refere à responsabilização penal da pessoa jurídica. Uma crítica que muitos doutrinadores fazem é que, até hoje, não há legislação processual penal própria para esse tipo de responsabilidade, e deveria existir.
● Promotor do Ministério
Público de São Paulo desde 1987, atua exclusivamente na área ambiental desde 2001. É responsável por um dos núcleos do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema)
da dimensão territorial brasileira. Há situações em que a polícia ambiental está com seus carros parados na garagem por falta de dinheiro para manutenção, por exemplo. Isso acaba deixando impune grande parte dos degradadores.
Uma vez identificado o crime ambiental, como responsabilizar os componentes individuais de uma empresa, por exemplo?
A lei não permite punir criminalmente apenas a pessoa jurídica. Ela exige que seja identificada a pessoa física que tomou a decisão de realizar o comportamento criminoso. Então, há a necessidade de se apurar, o que dificulta o processo criminal. Um dos argumentos utilizados para se criar a responsabilização penal da pessoa jurídica foi justamente o fato de as pessoas físicas se esconderem atrás das jurídicas. Mas caímos na mesma situação. Os valores das multas por crime ambiental não são irrisórios para empresas com muito dinheiro?
Isso é comum e não inibe a continuidade da atividade lesiva. A empresa é advertida, sofre multas e ainda discute judicialmente a legalidade da imposição. Enquanto isso, realiza sua atividade industrial.
LEI 9.605 – Bugalho: pena de apenas 1 ano por destruição de floresta
Como calcular o valor de um reparo por dano ambiental se os danos forem irreversíveis?
Isso é difícil de responder, porque há técnicos que aplicam metodologias em cada caso. De modo geral, o senhor acredita que a existência das leis ambientais, aliada a uma necessidade mundial de se desenvolver com sustentabilidade, tem melhorado a atitude das empresas em relação aos crimes ambientais?
Tem melhorado, sim, mas nas regiões em que os órgãos de fiscalização e o Ministério Público estão atentos. Se não houver atuação dinâmica, é claro
que há um afrouxamento das regras e não haverá tanta preocupação das empresas. Há necessidade de que o Estado se faça presente de forma vigorosa. Creio que a legislação, por si só, não seja suficiente. Em que nível se consegue fiscalizar e punir os crimes de pessoa jurídica no Brasil?
Creio que a maior parte dos crimes ambientais, pelo menos em termos quantitativos, sequer chega ao conhecimento dos órgãos ambientais. A fiscalização é feita por poucos. E a estrutura de fiscalização do poder público é pequena diante
Se a sanção penal da pessoa jurídica por dano ambiental está prevista na Constituição, mas o combate a esses crimes ainda é tímido, não podemos identificar, de certa maneira, uma atitude inconstitucional, por omissão legislativa?
Apesar de não existir no direito processual brasileiro um sistema próprio para a responsabilidade penal da pessoa jurídica, ele vem sendo adaptado a uma nova realidade. As condenações vem ocorrendo. Deveria haver maior preocupação do Congresso para melhorar a legislação ambiental penal e processual, em vez de se mobilizar para alterar o Código Florestal, e piorá-lo. Hoje, a discussão que se vê no Congresso vai contra a maré. ● LUCAS FRASÃO, ESPECIAL PARA O ESTADO
MARCIO FERNANDES/AE
Empresapúblicaé amaiorpoluidora
Quem é: Rosa Ramos ● É formada pela Faculdade
de Direito de São Bernardo do Campo e faz mestrado na Unimes, de Santos ● Faz parte do Conselho de
Integrante de colegiados da Fiesp e da OAB diz que iniciativa privada já encara sustentabilidade como trunfo comercial Autora de uma tese de mestrado na qual faz um balanço de ações civis públicas ambientais nos últimos dez anos na Grande São Paulo, a advogada Rose Ramos, de 45 anos, cobra dos órgãos públicos e da sociedade maior fiscalização dos crimes ambientais. Mas também diz ser otimista em relação ao compromisso das empresas com a sustentabilidade. “A empresa que prova ser sustentável tem credibilidade comercial maior.” Integrante do Conselho de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Rose critica a “tentação” do poder público de apontar a iniciativa privada como a vilã ambiental do País. “Os maiores poluidores são as empresas públicas.” Relativamente recente no Brasil, a punição criminal a pessoas jurídicas por dano ambiental funciona?
Mesmo com um instrumento específico, ficamos à mercê dos órgãos executores. O órgão público não tem estrutura para fazer valer a lei. É de praxe, hoje em dia, os juristas dize-
rem que o Brasil possui as melhores leis ambientais do mundo. Mas a maior problemática está exatamente na hora de executar essas leis. A sanção criminal resulta em benefício para o ambiente?
Sou favorável a uma pena pecuniária mais rigorosa. Não adianta colocar o empresário na cadeia. Mas experimenta tirar dinheiro do bolso dele. Se as multas são altíssimas, ele tem problemas no fluxo de caixa, no patrimônio financeiro. Nesse caso, vai pensar melhor antes de cometer qualquer infração ambiental. A existência da responsabilização penal tem mudado de que forma o comportamento das empresas em relação ao ambiente?
Inicialmente, mudou de maneira coercitiva, por imposição legal. Mas hoje, vejo que as empresas têm preocupações. Verificaram que isso possui um marketing fortíssimo, uma bandeira de credibilidade muito forte. Do meu ponto de vista, a empresa que prova ser sustentável tem credibilidade comercial maior. Outra questão é que hoje, mesmo não havendo fiscalização contundente do Estado, existem outros mecanismos que impedem as empresas de praticarem danos ambientais. Um exemplo são as vinculações do licenciamento ambiental com a Secretaria da
Fazenda, no que diz respeito à emissão de notas fiscais. Em SP, quem precisa de notas fiscais, mas está irregular na Cetesb, não consegue autorização da Secretaria da Fazenda (porque não obteria a inscrição estadual).
Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ● Também é integrante da
Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
Como funciona o Conselho de Meio Ambiente da Fiesp?
É uma função voluntária. Todos os membros são pessoas que ocupam cargos estratégicos, vinculados ao ambiente. Nosso trabalho é discutir as questões legais e práticas de licenciamentos, por exemplo, uma vez que a indústria sofre muito com a demora dos serviços públicos. Pagam-se taxas ao pedir um licenciamento. E uma empresa em operação pode precisar de uma ampliação. Mas, enquanto o licenciamento não sai, a empresa deixa de produzir e de admitir pessoas. As leis ambientais dificultam a ação das empresas?
Há um problema seriíssimo de falta de pessoal. Se a legislação requer licenciamentos de maneira rigorosa, é preciso ter estrutura para que a documentação saia em tempo hábil. A economia pede isso. O processo administrativo também prevê um tempo para que você seja atendido. Isso está sendo totalmente desrespeitado. Nesse momento, seria primordial uma reestruturação dos ór-
algumas mudas de árvore e nunca mais alguém compareceu para saber se elas estão lá, se serviram para restabelecer o dano ambiental ou não. Quanto falta para a relação entre indústria e ambiente chegar a um ponto de equilíbrio?
MULTA – Rosa: defesa de punições que pesem no bolso dos infratores
gãos fiscalizadores e executores da legislação ambiental. Acusada de crime ambiental, como a empresa pode se defender?
A empresa presta informações. Se ela for inocente, apresenta a prova de que não cometeu crime algum. Se não tiver a prova e cometeu o crime, vai contratar um advogado para fazer a defesa. Existe previsão legal para o que chamamos de termo de ajustamento de conduta. A empresa compensa o dano ambiental de acordo com o que está na Lei 9.605, através de pagamento de multa, plantio de árvores, doação de mudas, por exemplo. Mas há
também a questão do crime ambiental. A penalização pelo dano pode ser pela prestação de serviços à comunidade ou pelo pagamento de multa. É possível citar o exemplo de uma empresa que tenha cometido crime ambiental, punido com multa e restrição de liberdade?
Que eu tenha atuado, não. Essa questão é bastante importante porque, se você perguntar para profissionais da área, poucos terão exemplo dessa natureza. Consigo lembrar de casos de compensação ambiental, como o de um infrator que teve de doar mudas. Outro acabou plantando no imóvel dele
Esta é uma pergunta difícil. Os economistas têm opiniões divididas. Mas sou entusiasta em relação ao ambiente. Tenho esperança de que a relação entre indústria e ambiente estará bem próxima do ideal em curto espaço de tempo. Isso depende da fiscalização do Estado. Se a Lei de Crimes Ambientais for devidamente aplicada, vai impedir que nosso ambiente seja degradado. Quem são os responsáveis pelos maiores crimes contra o ambiente no Brasil?
Há uma tentação, principalmente do poder público, de querer jogar essa responsabilidade para cima das indústrias. Eu discordo totalmente. Diria que os maiores poluidores são as empresas públicas. ● L.F.